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CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
De nada adiantaria, entretanto, esta premissa teórica, se não houvesse meios concretos de
efetivamente impor os novos valores constitucionais traçados pelo povo, ao ordenamento jurídico nacional
que surge tendo por base estes valores. A Constituição, então, não traçou apenas um modelo ideal e
abstrato, intangível e incontrolável por ações concretas. Criou, então, mecanismos factíveis para fazer valer
a supremacia da nova cultura jurídica e axiológica nacional.
Existe quem diferencie “sistemas de controle” dos “tipos de controle”, muito embora é
comum verificar que ambos são utilizados para designar apenas os tipos de controle tradicionais, em
especial os tipos concentrado/abstrato e difuso/concreto. Deste modo, é importante frisar que há uma
diferença entre ”sistemas” e “tipos”, muito embora são comumente utilizados como expressões iguais para
designar aqueles controles tradicionais.
São sistemas de controle de constitucionalidade:
Político
O controle é feito pelo próprio emissor da lei, isto é, é feito pelo Legislativo, ou por um
órgão político criado especificamente para isso.
Jurisdicional
A função precípua do controle de constitucionalidade é do Judiciário. É o caso do Brasil.
Misto
Parte da Constituição é controlada politicamente, e outra é controlada judicialmente.
Ainda é possível falar em um outro sistema: político-jurídico, como ocorre na Suíça, já que a
constitucionalidade das leis federais é controlada pela Assembleia Nacional (órgão político), mas o exame
de compatibilidade constitucional das leis locais é realizada judicialmente.
Com a criação da Suprema Corte do Reino Unido, que passou a funcionar em outubro de
2009, fala-se em um controle dialético de constitucionalidade, porque esta Corte julgará a compatibilidade
de normas perante o “Human Rigths Act”, de 1998 (incorporação, no Reino Unido, da Convenção Europeia
de Direitos Humanos de 1950), mas não revogará ou anulará a norma, em caso de incompatibilidade,
porque servirá como um espécie de procedimento prévio para que o Parlamento, sem vinculação, possa
posteriormente aprovar ou não a norma (há um processo dialético entre a Corte e o Parlamento, para se
chegar a uma conclusão).
c) Tipos de controle
A análise dos tipos de controle de constitucionalidade que existem no mundo, faz surgir
variados ângulos de visão. Isto porque pode haver controle: a) por ação ou por omissão; b) formal ou
material; c) total ou parcial; d) originário ou superveniente; e) direto, indireto ou derivado; f) preventivo ou
repressivo. Neste tino, destacam-se também várias modalidades para englobar estes tipos de controle
(quanto à extensão – total ou parcial; quanto ao momento – originária ou superveniente; quanto ao tipo de
conduta – por ação ou por omissão; quanto ao prisma de apuração – direta, indireta ou derivada; quanto à
forma – preventivo ou repressivo; quanto ao exercício judicial – difuso ou concentrado).
O importante é traçar uma visão de cada tipo de controle, pois é uma fórmula interessante
para conhecer melhor o tema controle de constitucionalidade.
Controle formal
Quando o ato normativo foi editado por meio de um processo diferente daquele previsto
no preceito constitucional. A inconstitucionalidade resultante é chamada, por vezes, de nomodinâmica,
porque decorre de irregularidades na dinâmica dos projetos dentro do Congresso Nacional.
Controle material
Quando o ato normativo foi editado em confronto aos valores, aos conteúdos do preceito
fundamental (atinge norma constitucional de fundo, substancial). A inconstitucionalidade seria material,
substancial, de conteúdo, ou ainda nomoestática, porque pouco interesse o trâmite do projeto (o
interessante é o valor estático no texto constitucional).
Controle total
O ato é todo ele inconstitucional.
Controle parcial
O ato é apenas parcialmente inconstitucional.
Controle originário
O ato inconstitucional surge após a edição do texto constitucional.
Controle superveniente
O ato inconstitucional já existia quando o texto constitucional foi editado (no Brasil não é
aceito este controle, porque as leis anteriores à CF/88 são revogadas ou recepcionadas; em Portugal, sim,
pois lá é aceita a conhecida “inconstitucionalidade superveniente”).
Controle preventivo
É o controle prévio à sanção ao projeto de lei ou à promulgação da emenda constitucional,
feito pelo Legislativo por meio da Comissão de Constituição e Justiça, ou pelo Executivo, via veto
presidencial (também há possibilidade do Judiciário fazer o controle preventivo, como se verá adiante).
Estes tipos de controle provocam diversas situações práticas e teóricas, inclusive porque
existem muitas exceções às regras. Em face disto, complementarei estes tipos de controle com algumas
questões abaixo.
É possível controle de constitucionalidade por ação, sem que exista uma norma?
É possível verificar ação inconstitucional que não seja propriamente pela edição de normas.
É o caso das decisões judiciais e dos atos administrativos, atacáveis por Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental, visto que podem ser objeto da ADPF os atos do Poder Público (art. 1º da Lei
9.882/99). Isto ocorre porque a ADPF não tem por objeto apenas as normas, como é o caso da ADC e da
ADI, mas atos, situações e fatos que acabem violando um preceito fundamental. Neste ponto, o STF vem
interpretando “cum granus salis” o §1º do art. 4º da Lei 9.882/99, que permite ADPF apenas quando não
houver outro meio eficaz de sanar a lesividade (princípio da subsidiariedade). Se levado à sua maxima
potência, este dispositivo não permitiria ADPF contra decisões judiciais, porque contra elas cabe outro meio
eficaz, que é o recurso, e acabaria relegando este instrumento ao esquecimento. Entretanto, o STF vem
permitindo ADPF contra atos que, muito embora possam ser objeto de recursos judiciais e outras medidas
acautelatórias, geram relevantes controvérsias constitucionais e insegurança, que necessitam de uma
medida direta e eficaz, como a ADPF, visto que outra medida poderia ou demorar demais ou não ter o
mesmo efeito desejado pela Constituição, de pacificar situações com a rapidez necessária para não
caracterizar ferimentos aos preceitos fundamentais.
Não parece haver dúvida desta possibilidade, em especial quando se inicia processo
legislativo para emendar a Constituição e ver abolida alguma das cláusulas pétreas (é o caso de analisar o
mérito do projeto) e quando não há seguimento às normas procedimentais previstas na Constituição (é o
caso de analisar a formalização do andamento processual). O Judiciário, neste caso, pode brecar
preventivamente o processo. Veja que apenas o parlamentar têm o direito público subjetivo de provocar o
Judiciário, nunca terceiros estranhos à atividade parlamentar, e só o parlamentar de onde está tramitando
o projeto (deputado estadual não pode impetrar contra projeto de lei em análise no Congresso, e deputado
federal não pode contra tramitação no Senado). Importante atenção para o fato de que o controle
preventivo do Judiciário só pode existir se for difuso, porque precisa analisar o caso concreto, não sendo
possível fazer controle preventivo abstrato, porque não há ataque a atos normativos (trata-se apenas de
projeto)1.
Sim, porque a decisão anterior não faz coisa julgada que impede nova análise, haja vista
que não há coincidência de objetos (analisava-se projeto, e agora, um ato normativo, e no primeiro não
havia pedido de inconstitucionalidade, sem esquecer que a primeira ação não envolvia exame do plenário
do STF).
Reserva de plenário (ou full bench dos norte-americanos) é a exigência do art. 97 da CF/88:
só pode ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei, seja pelo controle difuso seja pelo controle
concentrado, pelo plenário do Tribunal, ou por órgão especial (por órgão especial somente quando o
Tribunal tiver mais de vinte e cinco julgadores, conforme art. 93, XI), com voto da maioria absoluta dos
membros. Esta exigência, entretanto, não é absoluta, pois há casos em que o Tribunal não precisa seguir o
art. 97 da CF, para declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Se o STF já tiver declarado uma lei
inconstitucional, o órgão fracionário do Tribunal poderá declarar também, sem necessidade de seguir as
exigências do art. 97. Da mesma forma, se o Tribunal já tiver declarado a inconstitucionalidade da lei, na
forma do art. 97, o órgão fracionário poderá fazê-lo (na verdade, repeti-lo).
Por fim, veja que o art. 97 fala em reserva de plenário apenas para o caso de declaração de
inconstitucionalidade. Os órgãos fracionários do Tribunal, então, podem declarar a constitucionalidade.
Impôs uma cisão horizontal, porque não se trata de encaminhamento dos autos para outro
Tribunal superior (o que seria cisão funcional vertical), mas sim para outro “departamento” do mesmo
Tribunal (de uma das Turmas para o Plenário). A cisão vertical foi tentada, no Brasil, por ocasião da Revisão
Constitucional de 1994, apresentado pelo Deputado Jairo Carneiro, substitutivo ao PEC 96/92, onde era
proposto o chamado “incidente de inconstitucionalidade” (toda vez que se suscitasse controvérsia sobre
constitucionalidade de leis junto a qualquer Tribunal, poderia haver um incidente de inconstitucionalidade
diretamente no STF, que suspenderia o processo no Tribunal inferior e julgaria a questão constitucional),
substitutivo este que não foi acatado.
1
Entretanto, vide na p. 169 a indicação da possibilidade de controle preventivo e abstrato de constitucionalidade pelo
Judiciário. É o caso de controle incidente no procedimento de incorporação dos tratados internacionais no
ordenamento jurídico nacional, basicamente quando há ADI contra o decreto legislativo que aprova o tratado, antes,
portanto, que ele venha a integrar o nosso ordenamento quando do decreto presidencial.
decorrer de uma lide que corre, por exemplo, em um Tribunal de Justiça, onde há alegação de
inconstitucionalidade de algum ato do Poder Público que afeta diretamente a causa de pedir de uma das
partes, a questão pode ser levada diretamente para o STF (portanto, de forma vertical), se um dos
legitimados for incitado e acabar propondo ADPF justamente sobre o ato em análise na lide.
O art. 49, V, da CF/88 prevê que é da competência do Congresso Nacional “sustar os atos
normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação
legislativa”. A doutrina entende que esta competência do Congresso é uma forma de medir a
compatibilidade da lei delegada com o texto constitucional, fazendo uma espécie de controle de
constitucionalidade antes de sustar o ato.
O STF também já declarou que “O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode
apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público” (Súmula 347). O Tribunal de Contas,
como sabemos, está vinculado ao Poder Legislativo, pois é órgão auxiliar deste.
Existe uma outra hipótese, que na verdade não é um controle, e sim um descumprimento: é
a possibilidade do Chefe do Executivo descumprir uma lei que considerar inconstitucional. Boa parte da
doutrina assim entende, além do Superior Tribunal de Justiça. Para não incorrer em crime de
responsabilidade (art. 1º, XIV, Decreto-Lei n. 20167), o Chefe deverá fundamentar por escrito o(s) motivo(s)
do descumprimento, e dar publicidade. Esta posição, com exceção do Prefeito, parece que é superável, haja
vista que o STF ao fixar jurisprudência sobre a possibilidade do Chefe do Executivo descumprir as leis que
julgar inconstitucionais, assim procedeu em um momento constitucional brasileiro em que o Chefe não era
legitimado para propor ação direta de inconstitucionalidade, legitimidade esta que era monopolizada pelo
Procurador-Geral da República.
Não, porque não vincula o Legislativo, que pode novamente editar outra lei no mesmo
sentido, e nem o próprio Judiciário, que pode rever a posição anterior, por mutação constitucional ou por
simples mudança de posicionamento. Assim, se o STF declara a inconstitucionalidade, o próprio STF poderá
declarar, em momento posterior, a constitucionalidade; se o TJ/GO declara a inconstitucionalidade de lei
municipal, idem. Da mesma forma, se o STF declara uma lei “x” inconstitucional, o Congresso Nacional
poderá discutir e votar outra lei idêntica àquela anteriormente declarada inconstitucional.
Isto ocorre porque o parágrafo 2º do art. 102 da Constituição de 1988 diz que as decisões
definitivas de mérito, proferidas pelo STF, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações
declaratórias de constitucionalidade, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante apenas aos
“demais” órgãos do Judiciário e à administração pública direta e indireta. Não vincula, portanto, o próprio
STF e nem o Legislativo. Se vinculasse o Legislativo, haveria grande tensão, e não harmonia, na relação
entre os Poderes. Claro que, se o Legislativo aprovar lei idêntica àquela já declarada inconstitucional, corre-
se sério risco de presenciar nova declaração de inconstitucionalidade, anotando uma desarmonia recôndita
entre os Poderes. Vide STF, ADIN 2.675/PE; ADIN 2.777/SP; ADI 907; ADI ADI 864; Reclamação 2617).
Boa doutrina entende que o STF só poderá alterar a decisão anterior se houver mudança do
panorama fático e jurídico anterior, até porque, no Brasil, aceita-se a mudança informal do conteúdo da
Constituição diante de nova interpretação (mutação constitucional). A nova decisão, então, deverá ser
baseada na significativa mudança das circunstâncias fáticas ou na relevante alteração das concepções
jurídicas que então estavam dominantes, situação que comprova a presença implícita da cláusula “rebus sic
stantibus” nas sentenças que julgam os processos concentrados de controle de constitucionalidade;
Não. Só a pessoa que tenha interesse. Deste modo, somente se a lei ferir algum direito, ou
provocar algum prejuízo jurídico a alguém, é que ele poderá invocar a inconstitucionalidade da lei em sua
defesa. A inconstitucionalidade, então, deve ser a causa de pedir, e o objeto deve ser as consequências
benéficas da inconstitucionalidade. Lembre-se que, em casos perante o STF, desnecessária a demonstração
de interesse, já que este Tribunal é o Guardião da Constituição.
Existe até quem pense que a existência de controle difuso de constitucionalidade seria mais
uma espécie de democracia direta, porque, da mesma forma que o plebiscito, o referendum e a iniciativa
popular, qualquer pessoa poderia interferir nas decisões do Poder Público, sem necessidade de
representantes e sem necessidade de depender de iniciativa de outros legitimados, como ocorre no
controle concentrado. Sem embargo, observe que não é qualquer pessoa que pode fazer este controle, mas
apenas aquela que for prejudicada pessoalmente pelo ato normativo ou pela omissão inconstitucional, o
que difere um tanto de outro instituto reconhecido de democracia direta, que é a ação popular, porque
nesta não há necessidade de demonstrar interesse para a sua proposição (há uma presunção de que todo
cidadão tem interesse, por integrar a vida política do país, em cassar atos lesivos ao patrimônio público).
2
Vide p. 153: há uma tendência de “abstrativizar” o controle difuso, no sentido de que as decisões proferidas pelo
Plenário do STF, no controle difuso, passam a ter efeitos vinculantes e eficácia “erga omnes”, justamente porque o
Este caso se aplica quando o STF declara a inconstitucionalidade pelo controle difuso (daí os
termos “por decisão definitiva”, é dizer: por decisão que já vinha sendo analisada pelos órgãos inferiores
até chegar ao STF, e este definitivamente julgar a questão), ratificado pelo art. 178 do Regimento Interno
do STF.
A suspensão tem efeitos “ex nunc” (a partir da suspensão) e “erga omnes” (contra todos), e
engloba tanto as leis federais quanto as estaduais. A decisão do Senado é discricionária, isto é, ele não está
obrigado a suspender a execução da lei (há quem entenda em contrário, mas é uma posição minoritária).
Boa parte da doutrina, e até jurisprudência do STF, entretanto, hoje vem caminhando para o entendimento
segundo o qual a suspensão pelo Senado tem eficácia “ex tunc” e não “ex nunc”.
O Senado, neste caso, tem a discricionariedade de suspender ou não o que foi declarado
inconstitucional pelo controle difuso, mas não pode ir além da decisão, isto é, ele não pode suspender toda
a lei, se apenas parte dela foi declarada inconstitucional.
Parece não haver problema para que a Assembleia Legislativa do estado suspenda a eficácia
da lei, desde que expressamente previsto na Constituição estadual. Aplica-se o princípio da simetria, já que,
no âmbito federal, se o STF declarar a inconstitucionalidade, cabe ao Senado, reforçada a ideia porque a
nossa Federação é, via de regra, simétrica.
Esta última parece não ser a melhor expressão do espírito constitucional, já que há uma
Federação no Brasil, com respeito à organização e à ordem jurídica local, que deve definir seus rumos na
medida da possibilidade aberta pela Constituição Total, que é a Federal, tanto é verdade que várias
constituições estaduais têm dispositivo semelhante ao art. 52, X, da CF/88, sem nenhum posicionamento
contrário do STF.
Quando o Senado susta ato declarado inconstitucional pelo STF, ele realiza um controle
difuso de constitucionalidade?
Não, não há controle difuso, que é judicial. Ademais, esta espécie de atuação para dar
eficácia “erga omnes” à decisão “inter parts” do STF está concentrada no Senado, ou nas Assembleias
Legislativas, quando as constituições estaduais preveem, retirando a característica da difusão.
Toda vez que o Tribunal de Justiça for invocado, em uma de suas Turmas, para declarar a
inconstitucionalidade da lei, é obrigatório o encaminhamento ao Plenário, ou ao órgão
especial?
papel do Senado não seria mais de suspender a eficácia da lei declarada inconstitucional pelo STF no controle difuso;
passaria a ser, então, de dar publicidade a tais decisões do STF.
Via de regra, sim, nos termos do art. 97, CF, mas se o próprio Tribunal já declarou a
inconstitucionalidade da lei pelo plenário, ou se há houve tal declaração pelo STF, o encaminhamento é
desnecessário. Nestes casos, a própria Turma poderá declarar a inconstitucionalidade, o que na verdade é
apenas uma ratificação. Neste sentido, art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
Atualmente, já existe regulamentação legal de tais ações, o que ocorreu por meio das Leis
9.868/99 e 9882/99.
Universal é a competência que não se restringe aos seus próprios interesses, porque se
presume o interesse universal do legitimado em proteger a validade das leis. Por isso, na legitimidade
universal, os legitimados não precisam demonstrar pertinência temática, isto é, mesmo que o tema
levantado na ação, ou tratado no ato impugnado, não lhe diga respeito e não entre nos seus fins
institucionais, ele pode propor a ação (universal é a legitimidade daqueles previstos nos incisos I, II, III, VI,
VII e VIII do art. 103 da CF: Presidente da República; Mesa do Senado Federal; Mesa da Câmara dos
Deputados; Procurador-Geral da República; Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e partido
político com representação no Congresso Nacional). Assim, a Mesa da Câmara dos Deputados pode propor
ADIN contra lei estadual, e a OAB poderá propor ação contra lei que regulamente o Conselho Federal de
Medicina.
Especial é a legitimidade que pressupõe a pertinência temática, de modo que a ADIN só
pode ser proposta se a matéria disciplinada na norma atacada tiver relacionamento com os seus fins
institucionais (art. 103, IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional – assim,
entidade de classe que não seja a OAB, como, por exemplo, o Conselho Federal de Engenheiros e
Arquitetos, que só pode propor ação contra lei que trate de algo relacionado com as profissões).
Interessante notar que a pertinência temática era exigida pelo parágrafo único do art. 2º da
Lei 9.868/99, mas foi vetado, porém este veto foi inócuo porque a pertinência temática foi adotada por
interpretação do STF diante das normas constitucionais.
Se o partido político perde a representação no Congresso Nacional, no curso da ação, esta
não é extinta por perda da legitimidade ativa, porque o momento para que se efetive esta legitimidade é no
momento da propositura da ação. Para que ocorra a legitimidade do partido político, é preciso apenas a
decisão pessoal do seu Presidente, sendo desnecessária a intervenção do diretório, que não precisa se
reunir para este fim. Há, malgrado, a necessidade de constar na procuração outorgada pelo partido, os atos
normativos que deverão ser impugnados (STF, ADI 2.552/PR).
Não há prazo prescricional para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade. A
demora, entretanto, na propositura, poderá prejudicar a concessão de liminar, pela falta de “periculum in
mora”.
O controle de constitucionalidade não se realiza em critérios puramente jurídicos, porque
pode ser feito pelo Legislativo, como foi visto. Aliás, até mesmo o controle concentrado no STF é possível
falar em critérios políticos, porque é inegável a função política deste Colendo Tribunal (vide adiante).
Apesar do Governador de Estado não ter legitimidade universal (precisa ter pertinência
temática, que seria o mesmo que interesse de agir), não é correto que dizer que um Governador de um
Estado não pode impugnar, via ADI, uma lei de outro Estado, ou uma Lei Nacional. Assim, via de regra, o
Governador não tem interesse (pertinência temática), para impugnar ato normativo de outro Estado, mas
terá se demonstrar que tal ato poderá prejudicar a economia interna do Estado que governa. Isto ocorreu
quando o Governador de Goiás propôs ADI contra lei de Mato Grosso, que proibia comercialização e
transporte de amianto (ADI-MC 2396/GO) (o interesse de Goiás residia no fato de que a lei prejudicava a
venda de amianto produzido no Estado de Goiás), assim como no caso da ADI 3273 proposta pelo
Governador do Paraná, contra a Lei Nacional 9.478/97, que dispõe sobre a política energética e dá outras
providências (o mesmo se deu na ADI-MC 902, para o caso da “guerra fiscal” entre Estados, onde um
Governador ataca Decreto de outro Estado que regula alíquota do ICMS).
O que diferencia a entidade de classe das demais organizações sociais é que a entidade de
classe, necessariamente, deve ter um interesse comum essencial para todos daquela classe, o que não
ocorre nas demais organizações (ADI 34/DF, ADI 79/DF, ADI 52/GO, ADI 79/DF), sendo interessante notar
que o “âmbito nacional” da entidade acontece quando ela estiver presente em pelo menos 09 (nove)
Estados da Federação, isto porque o STF fez analogia com o §1º do art. 7º da Lei dos Partidos Políticos (Lei
9.096/95), vazado nestes termos: “Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter
nacional, considerando-se como tal aquele que comprove o apoiamento de eleitores correspondente a, pelo
menos, meio por cento dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não
computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo
de um décimo por cento do eleitorado que haja votado em cada um deles”. Como o Brasil tem 27 (vinte e
sete) Estados, um terço deles equivale a 09 (nove) (ADI 386/ES; ADI 108/DF).
Merece friso o fato de que, para a caracterização do âmbito nacional, não basta estar
incluso nos estatutos das instituições, como mera declaração formal. É preciso que existam, de fato,
associações ou membros em nove estados, para caracterizar a necessária disseminação nacional (STF, ADI
1.096-4/RS; ADIn 108/DF; ADI 386-MC/SP). O próprio STF já enfatizou que apenas o requisito de presença
em 09 (nove) Estados não é um critério único e objetivo, que satisfaz a legitimidade, porque é preciso que a
instituição realmente realize trabalhos de amplitude nacional, agindo em nome de interesses homogêneos
de toda classe (ADI 77-2/DF). Essa é a razão porque, apesar da regra ser a presença de no mínimo 09 (nove)
Estados, pode haver legitimidade para entidades que não têm representação nesta quantidade de entes da
Federação, como ocorre, por exemplo, no caso da Associação Brasileira de Extratores e Refinadores de Sal –
ABERSAL, que, apesar de não ter representatividade em nove Estados, atua na produção de sal, que é uma
atividade de relevância nacional porque o consumo de tal produto tem amplitude em todo o Brasil (ADI
2.866/RN). Da mesma forma, se a associação comprovar que atua em apenas alguma região, ou em alguns
estados, por uma questão até natural (imagine-se a associação de produtores de vinho, que só pode atuar
na região Sul), terá legitimidade, mesmo não estando em 09 (nove) Estados.
Em relação, ainda, à legitimidade ativa para a propositura de ADI e ADC, o STF tem
entendimentos que merecem destaques:
a) não configura entidade de classe nacional a instituição cujos membros estão vinculados a
extratos sociais, profissionais ou econômicos diversificados, até porque os objetivos individuais de um
membro ou de um grupo de membros poderiam se chocar com outro membro ou outro grupo de membros
(ADI 108/DF);
b) não se trata de entidade de classe outros segmentos da sociedade civil, como é o caso do
segmento dos estudantes, que integram membros não-profissionais (não há legitimidade para a União
Nacional dos Estudantes - UNE) (ADI 894/DF);
c) inicialmente, o STF entendia que não havia legitimidade para “associação de
associações”, onde havia congregação, na mesma pessoa jurídica, de pessoas jurídicas diversas (ADI 79/DF
e ADI 914-DF). Entretanto, o próprio STF modificou este entendimento, e hoje admite a legitimidade para
“associação de associações” (ADI-AgR 3.153/DF e ADI 2797/DF). Estas associações são chamadas de
“associações de 2ª grau”. Deste modo, Associação Nacional dos Membros do Ministério Público – CONAMP,
a Federação Nacional de Produtores de Cachaça de Alambique (FENACA) e a Confederação das Associações
de Microempresas, têm legitimidade;
d) associação criada para defesa de questões abstratas, com aspirações cívicas da cidadania,
como a Associação Brasileira de Defesa do Cidadão, não tem legitimidade para propor ADI e ADC (ADI
61/DF) e, da mesma forma, associação que reúne como associados, órgãos públicos sem personalidade
jurídica e categorias diferenciadas de servidores, como é o caso da Associação Brasileira de Conselhos de
Tribunal de Contas dos Municípios – ABRACCOM, também não tem legitimidade (ADI 67/DF);
e) apenas as organizações sindicais estruturadas com base no art. 535 da CLT, têm
legitimidade ativa. Deste modo, as federações de sindicatos não têm legitimidade, porque não há
legitimidade para as associações, federações ou outras organizações sindicais que não sejam confederações
que tenham no mínimo três federações em sua organização. Mesmo que as federações ou sindicatos
tenham âmbito nacional, não sendo confederação porque de menor hierarquia, não há legitimidade (ADI-
QO 1.006/PE; ADI 713/RJ; ADI 731/DF; ADI 745/PE; ADI 2.152/MS; ADI 2.557/MT; ADI 1.785/RJ; ADI-MC
1.003/DF).
Observo, finalmente, que o Governador tem capacidade postulatória para a propositura das
ações, não havendo necessidade de representação judicial pelo respectivo Procurador-Geral do Estado. O
STF entende que cabe ao próprio Governador firmar a petição inicial. Evidente que pode o Procurador-
Geral também assinar junto, mas se somente este a assinar, a ação torna-se inepta (ADI 1.814/DF).
d.2) Objeto
O objeto da ADI é lei ou ato normativo federal ou estadual, sem possibilidade de discutir, na
mesma ação, a inconstitucionalidade de mais de uma lei ou ato normativo, salvo excepcionalmente.
E quando é possível analisar excepcionalmente a constitucionalidade de duas leis? O STF, na
ADIN-QO 2844/PR, entendeu é possível analisar a constitucionalidade de duas leis quando:
a) a análise de uma pressupõe a imbricação substancial na outra – competência legislativa
concorrente da União e dos Estados: lei geral confundindo-se com lei específica do Estado (vide o tópico
“inconstitucionalidade por arrastamento”, onde é possível estender a inconstitucionalidade declarada
sobre a lei que tem um nexo de causalidade lógico com a lei declarada inconstitucional);
b) a inconstitucionalidade de uma lei é questão prejudicial para análise da outra lei.
Os atos normativos a serem controlados devem ter efeitos abstratos e gerais, como
emendas constitucionais, leis em sentido formal, medidas provisórias, Decretos autônomos que firam a
Constituição, resoluções da Câmara dos Deputados, do Senado e do Congresso Nacional, os atos do
Executivo com força normativa autônoma (Decretos que não regulamentam a lei, mas sim, de modo
ilegítimo, inova no mundo jurídico ao criar obrigação de fazer ou não fazer que deveria estar na lei - os atos
normativos das agências que detêm este poder também se enquadram), regimentos internos dos Tribunais
Superiores, Decreto presidencial promulgando tratados e convenções internacionais e os decretos
legislativos. Existem decretos legislativos para: a) aprovação, pelo Congresso, quanto a tratados
internacionais (art. 49, I); b) suspensão, pelo Congresso, de ato normativo presidencial exorbitante dos
poderes concedidos na lei delegada (art. 49, V); c) regulamentação, pelo Congresso, das relações jurídicas
decorrentes da Medida Provisória que perdeu eficácia (art. 62, §3º). O STF entendeu que cabe ADI contra
Decretos, quando estes são expedidos com força de lei (ADI 460/DF; ADI 519/DF).
Por isso, não podem ser objeto de ADI:
a) normas de efeitos concretos que não sejam leis formais. Importante observar que o STF
mudou seu posicionamento, ao passar a entender que as leis de efeitos concretos podem ser objeto de
controle de constitucionalidade. Antes, o STF entendia que as leis de efeitos concretos, como era o caso de
leis orçamentárias, leis concedendo título de cidadão honorífico, leis que declaram determinados imóveis
como de interesse social para fins de reforma agrária, leis que criam tombamento de determinados
imóveis, leis que dão nomes a prédios públicos, eram leis casuísticas que não tinham o caráter da
generalidade e da abstração, destinadas que eram apenas para casos específicos, com efeitos concretos,
portanto. Entretanto, o STF, na ADI/MC 4048/DF, DJ 22.08.2008, e na ADI/MC 4049/DF, valorizando a
atuação direta do legislador, passou a entender que qualquer lei formal, assim considerada aquela
aprovada por meio do processo legislativo, pode ser objeto de ADI, mesmo que tenha efeitos concretos.
Portanto, apenas as outras normas que tenham efeitos concretos é que não podem mais ser objeto de ADI,
como os Decretos, Portarias, Provimentos, Atos Regimentais etc., mesmo que sejam autônomos;
b) Decretos que apenas regulamentam a lei (neste caso, pode haver controle de legalidade
do Decreto com a lei que o autorizou), salvo no caso de Decreto autônomo (art. 84, VI), já que não se
permite o controle indireto;
c) normas “interna corporis” (atos que dizem respeito apenas às questões institucionais
internas das Casas Legislativas – regimentos internos);
d) leis anteriores à CF/88;
e) leis do DF de conteúdo municipal (no caso do DF, como não pode ser dividido em
Municípios, sua Assembleia tem competência legislativa municipal e estadual; quando legisla utilizando-se
da competência estadual, cabe ADI, mas quando legisla utilizando-se da competência municipal, não cabe
ADI – vide ADI 611 e ADI 1.375);
f) normas constitucionais originárias de 1988 (a unidade da constituição revela que não há
hierarquia entre tais normas - STF, ADI 815-4).
Observo que cabe ADI contra o direito constitucional secundário, que seriam as normas
constitucionais surgidas em face do Poder Constituinte Reformador (as Emendas Constitucionais podem ser
atacadas pela ADI, visto que elas podem ferir a CF/88).
Não se pode confundir, entretanto, direito constitucional secundário e atos secundários. A
expressão “atos secundários” é utilizada para qualificar os atos normativos que são, na verdade,
regulamentação ou interpretação de lei infraconstitucional, e que por isso não podem ser objeto de ADI. O
STF, por exemplo, não conheceu a ADI 2862/SP, que impugnava o Provimento 758/2001, do Conselho
Superior da Magistratura do TJ/SP, que autorizava o juiz de direito, responsável pelas atividades do Juizado
Especial, a tomar conhecimento dos termos circunstanciados elaborados pelos policiais militares, desde que
assinados concomitantemente por oficial da PM, assim como a Resolução 403/2001, do Secretário de
Segurança Pública/SP, que por sua vez estabelecia que o TCO de que trata o art. 69 da Lei 9.099/95, será
elaborado pelo policial civil ou militar que primeiro tomar ciência da ocorrência, e que exigia que os termos
fossem feitos pela PM e assinados também por oficial da Corporação. O entendimento foi de que os atos
normativos seriam secundários, que se prestavam a interpretar o art. 69 da Lei dos Juizados. Os atos
secundários, então, devem passar por um controle de legalidade, e não controle de constitucionalidade,
uma vez que não se admite controle indireto, ou reflexo.
Ainda, necessário lembrar que o STF entende que a tentativa de controlar a
constitucionalidade de normas constitucionais originárias se mostra impossível porque a ADIN não pode ter
objeto nomológico (Ag. Reg. Na ADIN 4.097/DF, Rel. Min. Cezar Peluzo), considerando a nomologia a
ciência que estuda as leis que presidem aos fenômenos naturais, leis que, por assim dizer, regem um país
(teoria e prática da legislação; ciência e arte de fazer leis). As normas fundamentais que regem o país,
então, são aquelas insertas na Constituição. As normas originárias são as normas de referência para o
controle de constitucionalidade, sendo impossível tal controle em face do princípio da unidade hierárquico-
normativa das normas constitucionais originárias e o caráter rígido da Constituição de 1988.
g) leis já revogadas (daí porque, se a lei atacada em ADI é revogada, há prejuízo para o
andamento do processo, mesmo se houver efeitos residuais - ADI 709; ADI 262; ADI 712. O STF, na ADI
514/PI (DJE só em 31.03.2008), enfatizou que “ A revogação superveniente do ato estatal impugnado, ainda que
tácita, faz instaurar situação de prejudicialidade, que provoca a extinção anômala do processo de fiscalização abstrata
3
de constitucionalidade”. No caso de leis revogados, o instrumento será a ADPF ;
h) atos não-normativos (é preciso que o ato obrigue a todos, com características de
generalidade e abstração);
i) atos de particulares.
Observe-se, entretanto, que “leis de efeitos concretos” não é o mesmo que “leis
autoexecutáveis”. Ambas independem de regulamentação para produzirem os efeitos desejados, isto é,
podem ser executadas e aplicadas imediatamente, independentemente de qualquer condição futura,
enquanto que se diferenciam porque a lei autoexecutável é feita com base na abstração e na
impessoalidade, aplicando-se para todo o conjunto social, enquanto as leis de efeitos concretos são
construídas com base na concretude e na pessoalidade, não se aplicando para toda a sociedade e sim para
pessoas especificamente determinadas ou pessoas determináveis. As leis penais, que descrevem a conduta
criminosa, são, normalmente, autoexecutáveis, salvo as normas penais em branco, e a lei que concede o
título de cidadão honorífico é lei de efeitos concretos (como também é a lei desapropriadora ou a lei que
cria tombamento).
Sempre que o decreto extrapolar a autorização legal, acabando por inovar na ordem
jurídica para criar obrigação não prevista ou permitida em lei, o decreto terá autonomia, e por isso boa
parte da doutrina e da jurisprudência entende se tratar de “decreto autônomo”, passível de ação direta de
inconstitucionalidade. Muitas vezes, a autonomia normativa proferida pelo Chefe do Executivo não vem em
forma de decreto, mas sim de provimento, instrução normativa, portaria ou algo do gênero, daí porque o
importante é analisar se o ato administrativo, independentemente da nomenclatura e da forma de
aprovação e publicação, criou uma obrigação legal nova, isto é, inovou na ordem jurídica. Se inovou, o ato é
autonomamente normativo e, portanto, passível de ser objeto de controle concentrado de
constitucionalidade.
3
Vide, a seguir, na p. 126, o caso onde é possível a lei revogada ser objeto da ADI.
Um exemplo de ato administrativo normativo e autônomo, que não era decreto, ocorreu no
julgamento da ADIN 3.691/MA (Rel. Min. Gilmar Mendes), onde o STF conheceu da ação para julgar
procedente o pedido e considerar inconstitucional a Portaria 17/2005 do Estado do Maranhão, que alterava
e fixava horários de funcionamento dos estabelecimentos que comercializavam bebidas alcoólicas no
Estado, justamente porque tal ato continha abstração e autonomia que se transmudava em ato normativo
autônomo, invadindo, inclusive, competência dos Municípios para legislar sobre horário de funcionamento
de estabelecimentos comerciais, por ser assunto de interesse local (art. 30, I, CF/88).
inconstitucionalidade no TJ seja julgada procedente, para declarar a lei estadual inconstitucional, em face do
dispositivo expresso da Constituição estadual. Veja que não se está analisando se o art. 3º da Constituição estadual é
ou não compatível com a Constituição Federal, o que poderia até ser aventado na ADI proposta no STF. O importante,
aqui, é verificar que pode existir distinção entre as duas normas de referência para o controle de constitucionalidade
(uma federal e outra estadual), que permitam a continuidade de duas ações de inconstitucionalidade (no TJ e no STF),
sem prejudicialidade entre elas.
Isto ocorre muito em função do efeito repristinatório5 das decisões que concedem
cautelares nas ações diretas de inconstitucionalidade, à vista do §2º do art. 11 da Lei 9.868/99 (“A concessão
da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido
contrário”). É dizer: se o STF concede a cautelar contra a lei revogadora, as leis revogadas voltam a ter vigência natural
e automaticamente, salvo se o próprio STF disser categórica e expressamente que as leis revogadas não voltarão a ter
vigor. Por isso, deve constar como objeto da ADI não só a lei revogadora, mas também aquelas já revogadas, para que
ambas sejam declaradas inconstitucionais
A figura do “amicus curiae” (amigo da Corte; amigos da cúria) foi prevista no art. 7º, §2º, da
Lei 9.868/99: “O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por
despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou
entidades”.
Houve debate inicial sobre a possibilidade do “amicus curiae” fazer sustentação oral. Hoje,
no âmbito do STF, esta possibilidade é aceita pacificamente (ADI-QO 2.675, Relator Carlos Velloso e ADI-QO
2.777, e Emenda Regimental n. 15, que inseriu o art. 131, §3º ao RISTF – Regimento Interno do STF).
Também houve discussão sobre o momento da intervenção das entidades que participam
na qualidade de amigos da Corte: podem intervir mesmo o julgamento já iniciado? O STF, em sua
jurisprudência majoritária, entende que integrantes do processo como "amicus curiae" não podem se
manifestar se o julgamento já se iniciou, isto é, após início do julgamento da liminar, não cabe a
intervenção (ADI 2.238/DF). Em caso mais recente, entretanto, o STF, na ADI 2.690/RN, possibilitou a
manifestação do "amicus curiae" em momento posterior, com nova audiência com a Procuradoria-Geral da
República.
Não pode o “amicus curiae”, ademais, interpor recurso, nem mesmo embargos de
declaração, mesmo que tenha participado do processo fazendo sustentação oral (STF, ADI 3615/PB).
A doutrina identifica o “amicus curiae” com o caráter pluralista. Entende que o amigo da
Corte dá um caráter pluralista para o processo de controle concentrado de constitucionalidade.
5
A respeito da repristinação e do efeito repristinatório, e suas diferenças, vide p. 97.
Gilmar Mendes, em sua recente obra Curso de Direito Constitucional, diz que o caráter
plural do controle de constitucionalidade existe em face da participação do “amicus curiae”. Segundo a
doutrina, então, o caráter pluralista se confunde com o “amicus curiae”, sendo que este qualifica aquele.
Entendo que na ADI e na ADC não há necessariamente o caráter pluralista, pois tal caráter
só existirá necessariamente nos incidentes de inconstitucionalidade (controle difuso), nos termos dos
parágrafos do art. 482 do CPC, incluídos justamente pela Lei 9.868/99, e assim dispostos:
“§ 1º O Ministério Público e as pessoas jurídicas de direito público responsáveis pela edição do ato
questionado, se assim o requererem, poderão manifestar-se no incidente de inconstitucionalidade,
observados os prazos e condições fixados no Regimento Interno do Tribunal.
§ 2º Os titulares do direito de propositura referidos no art. 103 da Constituição poderão manifestar-
se, por escrito, sobre a questão constitucional objeto de apreciação pelo órgão especial ou pelo
Pleno do Tribunal, no prazo fixado em Regimento, sendo-lhes assegurado o direito de apresentar
memoriais ou de pedir a juntada de documentos”.
Quando se fala em “caráter pluralista”, é porque um determinado processo terá que
conviver com outros atores, além daqueles tradicionalmente identificados como autor e réu. Por isso, este
caráter dá a possibilidade da efetiva intervenção de terceiros, que têm o direito de se manifestar por escrito
sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos, além do direito de apresentar memoriais e,
logicamente, interpor recurso. O juízo, então, sabe que terá que conviver com isso, apesar dos problemas
de tramitação processual que isto significa (intimação de todos os participantes, audiência com todos eles
sobre documentos juntados, recursos adesivos, memoriais etc.).
No “amicus curiae”, o terceiro que inicialmente não participava do processo pode ser
admitido para se manifestar, em uma participação objetiva e sem qualquer possibilidade de tumultuar o
processo e ainda sem o direito de recorrer. Há, neste caso, amplos poderes do Relator para negar sua
intervenção, inclusive por despacho irrecorrível (Art. 7º, §2º, da Lei 9.868/99). Daí porque, como decidiu o
STF, “Entidades que participam na qualidade de amicus curiae dos processos objetivos de controle de
constitucionalidade, não possuem legitimidade para recorrer, ainda que aportem aos autos informações
relevantes ou dados técnicos” (STF, ADI-ED 2591/DF).
Não há, então, direito para que os “amigos da Corte” participem do processo, ficando todos
eles vinculados ao que vai decidir o relator. O mesmo não ocorre com o Ministério Público e as pessoas
jurídicas de direito público responsáveis pela edição do ato questionado, além dos legitimados para propor
a ADI e a ADC (art. 103 da CF/88), no controle de constitucionalidade difuso, já que tal participação não é
uma faculdade do relator, e sim um direito destes legitimados, como expressamente dispõe os parágrafos
1º e 2º do art. 482 do CPC.
Daí porque entendo que o caráter pluralista só existe no controle difuso, porque neste caso
há um direito de participação de terceiros no processo, dando efetivamente um caráter plural, enquanto
que no processo do controle concentrado, o caráter plural pode ou não ocorrer, porque não é um fato
inevitável que necessariamente caracterizará o processo.
No projeto da Lei 9.868/99, o parágrafo 1º do art. 7º tinha a seguinte redação, onde previa
o caráter pluralista: “§ 1o Os demais titulares referidos no art. 2o poderão manifestar-se, por escrito, sobre o objeto
da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis para o exame da matéria, no prazo das informações, bem
como apresentar memoriais”.
Entretanto, este parágrafo foi vetado, e deixou-se apenas o parágrafo 2º, nos seguintes
termos: “O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por
despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou
entidades”.
Nas razões do veto, foi dito: “A abertura pretendida pelo preceito ora vetado já é atendida pela
disposição contida no § 2º do mesmo artigo. Tendo em vista o volume de processos apreciados pelo STF, afigura-se
prudente que o relator estabeleça o grau da abertura, conforme a relevância da matéria e a representatividade dos
postulantes”.
Pelo que se denota, o caráter plural pode ou não ocorrer no controle concentrado, porque
se o relator deferir a participação de terceiros, na qualidade de “amicus curiae”, haverá o caráter plural no
decorrer do processo, e o STF terá que manejar bem os instrumentos processuais e a pauta, para que não
ocorra tumulto no julgamento; se o relator indeferir, não haverá o caráter plural, porque o processo só será
levado adiante com o autor original da ação e as informações que forem prestadas. No controle difuso,
necessariamente haverá que se abrir audiência com os outros interessado, independentemente da decisão
do relator.
De todo modo, é preciso se render ao que já está praticamente pacificado na doutrina, que
entende que o “amicus curiae” dá um caráter pluralista ao controle de constitucionalidade, ficando a
observação para efeito de complementação intelectual e afloramento do sentimento crítico do leitor.
a) a cautelar só pode ser concedida pelo STF, não havendo aqui o mesmo tratamento nas
cautelares concedidas pelos demais processos, onde o relator poderá conceder, em agravos de
instrumento, por exemplo. A única hipótese em que o relator poderá conceder a cautelar, no processo de
controle concentrado, é quando o STF estiver de recesso (art. 10, Lei 9868/99) (na arguição de
descumprimento de preceito fundamental a liminar pode ser concedida em período de recesso e também
em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, conforme art. 5º, §1º, da Lei 9.882/99);
b) a decisão cautelar tem eficácia “erga omnes”, mas “ex nunc”. Esta é a regra. O STF
poderá, entretanto, emprestar força retroativa à cautelar (“ex tunc”);
6
Pessoalmente, entendo equivocada esta posição do STF, visto que a modulação do nascedouro da
inconstitucionalidade se dá por motivos de ordem pública, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99. Pergunta-se: se
houver razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, o STF não vai modular a inconstitucionalidade
porque não houve pedido? O interesse excepcional é pessoal do autor da ADI ou é da sociedade?
inconstitucionalidade desde a edição da Lei, de 1998, mas sim desde a publicação da declaração de
inconstitucionalidade, que se deu no dia 23.08.2006 (o julgamento final foi suspenso para colher os votos
de outros Ministros ausentes, haja vista que alguns deles não concordaram com a modulação porque não
havia sido pedida expressamente na inicial da ação).
O STF também aplicou, na ADI 3819/MG, Rel. Min. Eros Grau, a modulação temporal para
declarar a inconstitucionalidade de lei do estado de Minas Gerais que havia efetivado 126 (cento e vinte e
seis) defensores públicos sem concurso, porém a inconstitucionalidade só existiria após 6 (seis) meses da
declaração pelo STF, visto que não poderia retroagir no nascedouro porque prejudicaria todas as defesas e
atos processuais realizados, causando muita insegurança e até caos judicial e administrativo em Minas
Gerais. Os efeitos da inconstitucionalidade também não poderia ser de imediato, porque não havia como,
instantaneamente, substituir todos os defensores por outros. Daí porque o STF deu um prazo de 6 (seis)
meses para que ocorresse a substituição por outros defensores, devidamente aprovados em concurso para
tal função (aproveitamento dos que já aguardavam na lista de espera do último concurso ou realização de
outro concurso).
Preciso alertar que não se aplica a modulação temporal quando a norma atacada é anterior
ao texto constitucional, isto porque só se aplica o art. 27 da Lei 9.868/99 quando há declaração de
inconstitucionalidade, e normas anteriores não são inconstitucionais; são, quando incompatíveis com o
texto constitucionais, revogadas (neste sentido, STF RE-AgR 353508/RJ, DJ 29.06.2007).Por isso, se uma Lei
é anterior à CF/88, e este texto é o parâmetro utilizado, a Lei não pode ser considerada “revogada somente
após a CF/88”.
Finalmente, lembro que o STF admitiu a modulação temporal por meio de embargos de
declaração. Isto ocorreu nos embargos de declaração interpostos no RE 500.171, que por sua vez tinha
gerado a Súmula Vinculante n. 12 (“A cobrança de taxa de matrícula nas Universidades Públicas viola o
disposto no artigo 206, inciso IV, da Constituição Federal”). A dúvida era saber se a referida SV teria
aplicação retroativa ou só poderia ser aplicada a partir da sua publicação, em 22.08.2008. O STF julgou os
embargos para dizer que não poderia ter aplicação retroativa, aplicando-se “ex nunc”.
m) o art. 10 da Lei 9868/99 não permite que o relator defira medida cautelar em ação direta
de inconstitucionalidade, salvo em período de recesso. O referido artigo diz que a medida cautelar na ADI só
pode ser concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, após audiência dos órgãos
ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo
de cinco dias. Entretanto, o STF admite que este artigo não pode retirar o poder geral de cautela do
magistrado, em especial do Ministro do STF, que pode, em casos excepcionais, caraterizado periculum in
mora e o fumu boni iures, conceder liminar em ADI mesmo não estando o Tribunal de recesso, nos termos
do art. 21 do RISTF (vide ADI 3273/DF, e AC 01-AgR).
Qual a diferença entre efeito “erga omnes” e efeito vinculante?
A eficácia “erga omnes” tem caráter geral, porque a decisão vale para todos,
indistintamente, inclusive os particulares. O efeito vinculante tem caráter específico, porque é próprio para
aos demais órgãos do Poder Judiciário e para a administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual e municipal.
Adotando-se a tese da transcendência dos motivos determinantes, é correto dizer,
também, que o efeito vinculante se refere tanto à parte conclusiva quanto à parte de fundamentação da
decisão proferida no controle concentrado de constitucionalidade. A eficácia “erga omnes” se refere
apenas à parte conclusiva.
Finalmente, o que garante a proposição de reclamação no STF é o efeito vinculante, e não a
eficácia “erga omnes”, pois é aquele efeito que obriga aos demais órgãos do Poder Judiciário e a
administração pública ao que foi decidido, havendo, com isso, preservação da competência e garantia da
autoridade das decisões do STF (art. 105, I, “f”).
Muitas vezes, as leis têm vários significados, a depender da sua leitura e do contexto em
que é inserida (caráter polissêmico ou plurissignificativo das leis), de modo que se for lida de determinado
modo, será inconstitucional, e se lida de outro modo, será constitucional, e este último modo de leitura é
possível porque a lei é presumidamente constitucional (vide à frente, no tópico de controle de
constitucionalidade).
Como disse o então Ministro Moreira Alves, “a interpretação da norma sujeita a controle
deve partir de uma hipótese de trabalho, a chamada presunção de constitucionalidade, da qual se extrai
que, entre dois entendimentos possíveis do preceito impugnado, deve prevalecer o que seja conforme à
Constituição” (RP 1414, in RTJ 126/53).
Esta interpretação nada mais é que, na dúvida entre duas interpretações possíveis do texto
legal, sendo uma compatível com a Constituição e outra incompatível, a declaração de que a lei só pode ter
o sentido compatível.
Importante frisar que a interpretação conforme não pode ser utilizada para que o Judiciário
se transforme em legislador positivo. O então Min. Moreira Alves explicou:: “o STF - em sua função de Corte
Constitucional - atua como legislador negativo, mas não tem o poder de agir como legislador positivo, para criar
norma jurídica diversa da instituída pelo Poder Legislativo. Por isso, se a única interpretação possível para
compatibilizar a norma com a Constituição contrariar o sentido inequívoco que o Poder Legislativo lhe pretendeu dar,
não se pode aplicar o princípio da interpretação conforme à Constituição, que implicaria, em verdade, criação de
norma jurídica, o que é privativo do legislador positivo” (RP 1417, in RTJ nº 126/48).
Exemplo: determinada lei complementar diz que são inexigíveis os primos do Prefeito, em
outras cidades circunvizinhas. Se as expressões “em outras cidades circunvizinhas” forem declaradas
inconstitucionais, o Judiciário acabará criando uma outra lei, no sentido de que haverá inelegibilidade para
todos os casos, quando o legislador queria que a inelegibilidade fosse apenas para alguns casos (na
circunvizinhança).
Como se vê, existe uma condição e um limite para que ocorra a interpretação conforme a
Constituição. A condição é que a lei tenha sentido plurissignificativo ou, como queria, tenha caráter
polissêmico, de modo que contenha em si, dois ou mais sentidos, sendo um deles inconstitucional; o limite
é que não se pode utilizar a interpretação para criar uma nova lei, interpretando “contra legem” e
mudando o sentido original da norma. Enfim, não pode o intérprete, na interpretação conforme a
Constituição transmudar-se em legislador positivo. O limite é uma consequência da condição, porque se a
lei não tem mais de um sentido, não pode se dar a interpretação conforme a Constituição.
Existem casos que, sob a chancela de “interpretação conforme a Constituição”, algum órgão
fracionário do Judiciário acabe declarando a inconstitucionalidade de uma lei, porque dá outro sentido
diverso do original sem a devida provocação do Plenário, nos termos dos arts. 480 a 482 do CPC. Isto,
evidentemente, é uma burla ao art. 97 da CRFB/88 (STF: “controle incidente de constitucionalidade de normas:
reserva de plenário (CF, art. 97): viola o dispositivo constitucional o acórdão proferido por órgão fracionário, que
declara a inconstitucionalidade de lei, sem que haja declaração anterior proferida por órgão especial ou plenário ”. -
RE-AgR 502118/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 31.08.2007, p. 33).
“p.324. Em 16.12.2004, o Plenário desta Corte julgou procedente, em parte, a ADI 3.324 (rel. min.
Marco Aurélio, DJ 02.02.2005), declarando a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 1º
da Lei 9.536/1997, para assentar que a transferência de militar e seus dependentes somente é de
ser permitida entre instituições de mesma espécie, em respeito ao princípio da isonomia. Em
síntese, dar-se-á a matrícula, segundo o art. 1º da Lei 9.536/1997, em instituição privada se assim o
for a de origem, e em pública se o servidor ou o dependente for egresso de instituição pública.
Agravo regimental a que se nega provimento”(STF, AI-ED 541533/PR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª
Turma, DJ 29.06.2007, p. 139)
“EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. JUIZADOS ESPECIAIS. ART. 90 DA LEI 9.099/1995. APLICABILIDADE.
INTERPRETAÇÃO CONFORME PARA EXCLUIR AS NORMAS DE DIREITO PENAL MAIS FAVORÁVEIS AO RÉU. O
art. 90 da lei 9.099/1995 determina que as disposições da lei dos Juizados Especiais não são
aplicáveis aos processos penais nos quais a fase de instrução já tenha sido iniciada. Em se
tratando de normas de natureza processual, a exceção estabelecida por lei à regra geral contida
no art. 2º do CPP não padece de vício de inconstitucionalidade. Contudo, as normas de direito
penal que tenham conteúdo mais benéfico aos réus devem retroagir para beneficiá-los, à luz do
que determina o art. 5º, XL da Constituição federal. Interpretação conforme ao art. 90 da Lei
9.099/1995 para excluir de sua abrangência as normas de direito penal mais favoráveis ao réus
contidas nessa lei”(STF, ADI 1719/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, DJ de
03.08.2007, p. 225)
“O Tribunal, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que
indeferira pedido de medida liminar em reclamação ajuizada pela União, na qual se sustentava
que julgado do STJ — em que se entendera que a isenção concedida pela LC 70/91 às sociedades
prestadoras de serviço não pode ser revogada por lei ordinária — teria ofendido a autoridade da
decisão proferida por esta Corte nos autos da ADC 1/DF (DJU de 6.6.95). Alegava-se, na espécie,
que a decisão proferida pelo STF na citada ADC, cujo efeito é vinculante, teria considerado a LC
70/91 como materialmente ordinária, e apenas formalmente complementar, estando
legitimada, portanto, a sua revogação por meio da Lei 9.430/96 — v. Informativo 335.
Reportando-se à parte dispositiva e à ementa do acórdão proferido na referida ação
declaratória, entendeu-se que o Tribunal, no julgamento da ADC 1/DF, não decidira no sentido
de que a LC 70/91 seria materialmente lei ordinária ou apenas formalmente complementar, e
que a afirmação de que a mencionada lei complementar seria materialmente ordinária,
constante dos votos do relator e do Min. Carlos Velloso, proferidos naquele julgado,
caracterizara-se como obiter dictum, que não integra o dispositivo da decisão, nem se sujeita
ao efeito vinculante. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e
Celso de Mello que, salientando que a referida afirmação constituíra premissa essencial que
conduzira à conclusão pela constitucionalidade dos dispositivos em discussão naquele
julgamento, proviam o recurso, por entender que o alcance do efeito vinculante da decisão
não está limitado a sua parte dispositiva, devendo abranger, também, os chamados
“fundamentos determinantes”. Rcl 2475 AgR/MG, rel. orig. Min. Carlos Velloso, rel. p/ o
acórdão Min. Marco Aurélio, 2.8.2007. (Rcl-2475)
Posteriormente, o STF, em várias oportunidades, passou a rejeitar a tese da irradiação
ou transcendência dos motivos determinantes (Rcl 4875 AgR / SP, Rel. Min. Eros Grau, DJe 145,
06.08.2010, p. 409; Rcl 6319 AgR/SC, Rel. Min. Eros Grau, DJe 145, 06.08.2010, p. 425; Rcl 6204 AgR / AL
, Rel. Min. Eros Grau, DJe 96, 28.05.2010, p. 672; Rcl 3014 / SP, Rel. Min. Ayres Brito, DJe 91, 21.05.2010,
p. 372).
Correto, entender que a posição mais recente do STF é pela negativa da tese da
transcendência, até porque pesa contra ela os seguintes argumentos: a) o art. 102, §2º, da CF/88, diz
que tem efeito vinculante apenas a decisão, e não seus fundamentos; b) havendo vinculação aos
fundamentos, haveria vinculação do próprio legislador, e o próprio STF já disse e redisse que não há
vinculação do legislador quanto às decisões no controle concentrado de constitucionalidade, em
respeito à tripartição dos Poderes; c) se houvesse irradiação dos motivos determinantes, haveria
inundação do STF com infinidade de Reclamações, sempre que alguém julgasse que um determinado
fundamento, proferido em qualquer voto vencedor, englobaria sua situação pessoal.
Há diferença entre transcendência dos motivos determinantes e a inconstitucionalidade
por arrastamento?
Importante não olvidar que há semelhanças óbvias entre transcendência dos motivos
determinantes e a inconstitucionalidade por arrastamento, em face da extensão da decisão para um ato
normativo não atacado na ação direta de inconstitucionalidade.
Porém, na transcendência, a extensão é da fundamentação, e no arrastamento, a
extensão é da parte dispositiva da sentença. Outra diferença é que, no arrastamento, há uma ligação
íntima, um verdadeiro liame entre o dispositivo atacado e o dispositivo não atacado, numa relação de
dependência, e na transcendência, os dispositivos não estão ligados por dependência, sendo
autônomos, e a extensão só ocorre por analogia.
Há diferença entre a tese da transcendência dos motivos determinantes e a tese da
abstrativização do controle difuso de constitucionalidade?
Não é raro encontrar o tratamento igualitário da transcendência com a abstrativização.
Veja, entretanto, que a transcendência prega a transferência da fundamentação, e não da parte
dispositiva da decisão proferida no controle concentrado de constitucionalidade. É dizer: a tese da
transcendência deseja que a fundamentação, da mesma forma que a conclusão, tenha efeitos
vinculantes e eficácia “erga omnes”. A abstrativização ou objetivização do controle difuso prega a
transferência, para terceiros, do efeito vinculante da conclusão da decisão proferida no controle difuso.
É dizer: a tese da abstrativização deseja que a conclusão sobre a inconstitucionalidade ou sobre a
constitucionalidade de determinada norma, no controle difuso, se tomada pelo plenário do STF, vincule
a todos e não apenas as partes do processo (é uma tentativa de mudar a posição tradicional de que no
controle difuso há eficácia “inter parts”, visando valorizar a força normativa da Constituição e assentar
definitivamente a posição do STF como Guardião da Constituição, reinterpretando o art. 52, X)7.
Também há diferença entre transcendência e abstrativização porque aquela ocorre no
controle concentrado e esta no controle difuso. Existem defensores no sentido de que a transcendência
dos motivos determinantes deve existir também em relação às decisões proferidas no controle difuso.
Se se adota a transcendência no controle difuso, evidentemente que esta diferenciação deixará de
existir em relação à abstrativização.
g) Ação declaratória de constitucionalidade (ADC)
O legislador constituinte originário, em 1988, não tratou da ação direta de
constitucionalidade, até porque, em face do art. 97 da CF, as leis eram presumidamente constitucionais.
Daí porque, em tese, não seria necessário declarar a constitucionalidade de uma lei se ela era
presumidamente constitucional. O ideal, então, era declarar a inconstitucionalidade.
Entretanto, o controle difuso de constitucionalidade no Brasil, muitíssimo utilizado nos
mais variados rincões deste país, estava gerando cada vez mais instabilidade, de modo que nem mesmo
os cidadãos e os jurisdicionalizados tinham certeza no cumprimento de determinada lei. Assim, bastava
uma decisão, proferida em Codó, no interior do Maranhão, somado a uma posição de algum jurista
famoso, eram suficientes para grassar por todo país uma sensação de instabilidade e uma visão tortuosa
em relação à lei atacada, arrastando consigo todo o espírito e a conformação material contida na lei.
Por isso, para acalmar os ânimos e gerar estabilidade nas relações jurídicas e sociais, e
também para abreviar o tempo para a pronúncia do STF, a Emenda Constitucional n. 03, de 17.03.1993,
deu nova redação à alínea “a” do inciso I do art. 102 da CF/88, acrescentando a ação declaratória de
constitucionalidade, emenda esta julgada constitucional pelo STF (ADC-QO n. 01/DF).
A ADC é hoje tratada na mesma lei que regulamentou a ação direta de
inconstitucionalidade (Lei 9.868/99, arts. 13 ao 21).
Quais as principais distinções entre ADC e ADI?
A ADC se distingue da ADI em alguns aspectos: a) porque existe a presunção de
constitucionalidade das leis, a Lei 9868, no art. 14, III, cria um pressuposto a mais para a ADC, que é a
controvérsia judicial relevante, isto é, somente quando há muitas ações judiciais indicando a
inconstitucionalidade da lei como causa de pedir, é que a ADC pode ser aceita; b) o objeto da ADC é
somente lei federal, diferentemente da ADI, que pode ser lei federal ou estadual; c) na ADC, o
Advogado-Geral da União não é citado, uma vez que ele, via de regra, defende a constitucionalidade,
que é presumida.
7
Vide p. 153, onde constam maiores detalhes sobre a “abstrativização do controle difuso”.
A primeira grande polêmica, surgida com a ADPF, era saber se ela era capaz de gerar um
controle abstrato e concentrado fundamentado na constitucionalidade, isto é, se ela fazia parte dos
instrumentos de controle concentrado de constitucionalidade.
Natureza jurídica da ADPF.
Em face das semelhanças com a ADI e a ADC (a competência para sua apreciação está
concentrada no STF; a aferição é abstrata; a causa de pedir é o ferimento a preceito fundamental da
Constituição; os efeitos da decisão em ADPF são vinculantes e “erga omnes”; o processo é objetivo –
não há partes formais; os legitimados ativos são os mesmos; o processo traçado pela Lei 9.882/99 tem o
mesmo espírito do processo traçado na Lei 9868/99), hoje é aceito o fato de que a ADPF é um
instrumento do controle concentrado de constitucionalidade, junto com a ADI, com a ADC e com a
representação de intervenção (à frente). Nesta linha, Celso Bastos, Manoel Gonçalves Ferreira Filho,
Edílson Pereira Nobre Júnior.
O Min. Néri da Silveira, na na ADPF-QO n. 01, destacou, mesmo “an passant”, que a
ADPF é “instrumento de defesa da Constituição, em controle concentrado”. O STF, na ADPF 33/PA, Rel.
Min. Gilmar Mendes, DJ 27.10.2006, p. 31, considerou a ADPF como um modelo de integração entre os
modelos difusos e concentrados (“ADPF configura modalidade de integração entre os modelos de
perfil difuso e concentrado no Supremo Tribunal Federal”). Portanto, parece não haver dúvida de que o
STF acata a ADPF como mais um instrumento do controle concentrado de constitucionalidade.
Isso é importante em face das premissas a serem adotadas, em especial para as
premissas utilizadas pelo examinador, em concursos públicos.
Como se sabe, os outros instrumentos do controle concentrado repressivo (ADC e ADI),
não alcançam normas anteriores à CF/88 (limitação temporal), nem normas municipais (limitação
espacial), e também não alcançam atos não-normativos. Entretanto, na ADPF, é possível controlar
normas anteriores à CF/88, normas municipais e atos não-normativos (STF, ADPF 33/PA, Rel. Min.
Gilmar Mendes, DJ 27.10.2006, p. 31: “Cabimento de arguição de descumprimento de preceito
fundamental para solver controvérsia sobre legitimidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou
municipal, inclusive anterior à Constituição (norma pré-constitucional)”)
Assim, considerando que a ADPF é uma ação direta junto ao STF, que faz parte do
controle concentrado repressivo, é correto dizer que:
a) é possível fazer o controle concentrado de constitucionalidade de leis municipais, de
leis anteriores à CF/88 e de atos não-normativos (não através de ADC e ADI, mas sim através de
ADPF);
b) é incorreto, entretanto, falar em ação direta de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade de leis municipais, leis anteriores à CF/88 e atos não-normativos.
Mas cabe repetir: é de se esperar do examinador esta posição, que é a correta, mas é de
se esperar do examinando a maturidade necessária para entender que o examinador poderá ter ainda a
percepção tradicional e usual em provas de concursos, de que o controle de constitucionalidade
concentrado não se presta analisar a inconstitucionalidade de lei municipal e lei anterior à Constituição
de 1988. Um pouco de perspicácia não faz mal, sendo necessário o cuidado necessário para analisar, nas
questões, que o examinador ainda adota a visão usual e tradicional.
Última observação, neste ponto: é comum os examinadores entenderem que a ADPF é
controle concentrado de constitucionalidade, mas concreto, diferentemente da ADC e da ADI, que é
controle concentrado e abstrato de constitucionalidade. Assim, há premissas segundo as quais não cabe
controle abstrato de constitucionalidade contra leis municipais, leis anteriores à CF/88, leis de efeitos
concretos etc.
Feitos estes esclarecimentos, cabem algumas observações sobre a ADPF:
a) ela tem caráter subsidiário, como já enfatizou inúmeras vezes o STF, consagrando o
art. 4º, §1º, da Lei 9.882/99. Isto significa que ADPF só pode ser proposta se houver esgotamento dos
outros mecanismos judiciais inferiores de afastamento da lesividade;
b) a legitimidade ativa é a mesma para a ADC e ADI (art. 2º, I, Lei 9882/99);
c) o conceito de preceito fundamental não é objetivo, daí porque há variadas
interpretações. Contudo, o STF, na ADPF n. 01, apontou parâmetros para sua identificação: 1) direitos e
garantias individuais; 2) cláusulas pétreas; 3) princípios sensíveis (sensíveis são aqueles que, rompidos,
ferem o Pacto Federativo e permitem a intervenção federal e estadual);
d) o rol de legitimados previsto no art. 2º, I, da Lei 9.882/99 (mesmos legitimados para
ADC e ADI), é exaustivo, não se admitindo extensão, (STF, ADPF-AgR 75/SP e ADPF-AgR 11/SP);
e) pode ser objeto da ADPF ato não-normativo, mas não cabe contra atos de particulares
e nem contra atos políticos, como o veto;
f) a ADPF pode ser autônoma (art. 1º, “caput”), em ação principal junto ao STF, ou
incidental, em incidente no curso de um processo judicial;
g) a medida cautelar só pode ser concedida pelo STF, por decisão da maioria absoluta de
seus membros, mas em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou ainda, em período de
recesso, poderá o relator conceder a liminar, ad referendum do Tribunal Pleno (art. 5º, “caput” e §1º,
Lei 9.882/99);
h) apesar de não previsto na Lei 9.882, é possível o “amicus curiae” no processo de ADPF
(STF, ADPF 33/PA, Rel. Min. Gilmar Mendes: “Admissão de amicus curiae mesmo após terem sido
prestadas as informações”;
i) é também admitida a modulação temporal – inconstitucionalidade retraída ou
restringida -, da mesma forma que na ADI (art. 27 da Lei 9868/99 e art. 11 da Lei 9882/99: “Art. 11. Ao
declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de arguição de descumprimento de
preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social,
poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos
daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro
momento que venha a ser fixado”;
j) ADPF pode ser proposta contra lei de efeito concreto.
A ADPF é uma espécie de “soldado de reserva”: o objeto que não for possível de
impugnar por ADIN e ADC, pode, via de regra, por ADPF. Assim, não cabe ADI e ADC contra lei municipal,
mas cabe por ADPF. O mesmo ocorre contra leis de efeitos concretos, leis revogadas, leis anteriores à
Constituição de 1988, atos não-normativos e decretos regulamentadores, que não podem ser
impugnados via ADI e ADC, mas podem por ADPF.
Via de regra, ato de particulares também não pode, porque a Lei 9.882/99 fala que cabe
ADPF para “evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público”.
Portanto, não cabe ADPF, ADIN e ADC contra ato de particular. Entretanto, há doutrina enfatizando ser
possível ADPF contra ato de particular se este particular for concessionário ou permissionário do Poder
Público, até porque eles podem provocar ferimento a preceito fundamental da Constituição e causar
insegurança jurídica e efeitos multiplicadores. Então, aceitando esta doutrina, é possível contra ato de
particular, nestes casos.
Com a regulamentação da ADPF pela Lei 9.882/99, passou a ser possível fazer controle
de constitucionalidade das normas anteriores ao texto constitucional. Deste modo, ainda
é importante a não aceitação da tese da inconstitucionalidade superveniente? Explique.
A tese da inconstitucionalidade superveniente defende que a norma que for
incompatível com o texto constitucional surgido posteriormente, não é revogada; é, sim,
inconstitucional. Esta tese permitiria que fosse proposta ação direta de inconstitucionalidade contra
normas aprovadas antes do texto constitucional. Como esta tese não foi acatada pelo STF e pela maioria
da doutrina, a ADI não pôde ser utilizada para atacar normas anteriores ao texto constitucional. Como a
ADPF pode ser utilizada para atacar tais normas, muitos dizem que não tem mais sentido a não
aceitação da tese da inconstitucionalidade superveniente, justamente porque esta não aceitação tinha o
efeito prático de tornar impossível o ataque às normas anteriores ao texto constitucional.
Porém, a não aceitação da tese ainda é importante, porque este efeito prático não era o
único. Existem três questões práticas que o não acatamento da tese da inconstitucionalidade
superveniente provoca: a) não se pode aplicar o art. 27 da Lei 9.868/99 para as normas anteriores ao
texto constitucional. A modulação temporal só se aplica para o caso de normas declaradas
inconstitucionais. Como normas anteriores não são inconstitucionais, não se aplica esta modulação
temporal (neste sentido, STF, RE-AgR 353508/RJ, DJ 29.06.2007); b) não pode o Senado suspender a
execução de lei anterior ao texto constitucional, quando tal lei é incompatível. O art. 52, X, diz que só
pode haver suspensão quando o STF declarar a inconstitucionalidade, e as leis anteriores ao texto
constitucional não são declaradas inconstitucionais; são sim declaradas, quando for o caso, revogadas,
impedindo a atuação do Senado; c) não pode ser utilizada a ADI para atacar normas anteriores ao texto
constitucional. Das três questões práticas, apenas a alínea “c” perdeu o sentido, porque ao invés de ADI,
pode ser utilizada a ADPF, com eficácia contra todos e efeitos vinculantes, da mesma forma que a ADI.
i) Representação interventiva8
Esta é uma modalidade de controle concentrado de constitucionalidade, inclusive é a
modalidade mais antiga, porque surgiu na CF/34, art. 12. Como ação propriamente dita, ela foi tratada
somente na CF/46.
A intervenção federal da União nos Estados e no DF, será possível nos casos do art. 34,
CF/88, mas especialmente quando houver violação dos princípios constitucionais sensíveis (arts. 34,
VII).
São sensíveis os seguintes princípios:
a) forma republicana;
b) sistema representativo;
c) regime democrático;
d) direitos da pessoa humana;
e) autonomia municipal;
f) prestação de contas da Administração Pública;
g) aplicação do mínimo exigido da receita;
h) recusa à execução de lei federal (a EC 45 aumentou mais este princípio constitucional
sensível, ao dar nova redação ao inciso III do art. 36, da CF/88).
Assim, a intervenção é excepcional, porque ela rompe com a tradição de autonomia
política dos entes federativos, prevista no art. 18 da CF/88, que dá a eles capacidade de auto-
organização, autogoverno e autoadministração, além de fazer suas próprias leis dentro da competência
constitucional. A intervenção fere o Pacto Federativo, daí porque somente em casos especiais ela
ocorre, e justamente para que a autonomia não se transforme em soberania dos entes. Não foi em vão,
então, a previsão constitucional de intervenção somente quando ferir princípios constitucionais
“sensíveis”, até para manter a indissociabilidade da Federação.
Classificação da intervenção
8
Para melhor compreender o tema, veja na p. 241 os comentários sobre a Intervenção Federal.
Observações sobre a representação interventiva
Feitas estas breves considerações, é importante, no tema do controle de
constitucionalidade, as hipóteses previstas no art. 36, inciso III, da CF/88 (“A decretação da intervenção
dependerá: de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da
República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal”) e no art. 35, inciso
IV (“O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território
Federal, exceto quando: o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a
observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem
ou de decisão judicial.”
Estas representações, pelos Chefes do Ministério Público da União e do Ministério
Público estadual, são chamadas de representações interventivas, verdadeiras ações diretas de
inconstitucionalidade interventiva, e nelas se controla a constitucionalidade, em especial os valores
constitucionais dos princípios sensíveis (no caso de representação para preservar a execução de lei, ela
tem sido denominada de “ação de executoriedade de lei”, já que não seria propriamente para preservar
constitucionalidade, e sim para que uma lei infraconstitucional seja executada).
A doutrina, entretanto, não dá a característica da abstração para a representação
interventiva. É dizer: ela não é um controle abstrato de constitucionalidade; é, sim, um controle
concreto, porque ela visa proteger situações concretas, específicas, inclusive apontando situações
fáticas envolvendo um Estado ou um Município. A ação de executoriedade de lei, por exemplo, envolve
uma omissão específica em relação a uma também lei específica. Ela tem, então, um fim concreto. Ela
seria um instrumento do controle concentrado porque há concentração no STF ou nos TJ´s, mas não é
instrumento do controle abstrato, porque não se analisar apenas a questão jurídica, e sim o impacto de
determinada circunstância, fato, ato ou conduta estatal à vista dos princípios constitucionais sensíveis.
Como se vê, entre as diversas possibilidades e modalidades de intervenção, fica claro
que a Constituição deixou para a ação direta, isto é, a representação interventiva, a guarda dos
princípios constitucionais sensíveis, valorizando a correlação Ministério Público-Poder Judiciário. Daí
porque a representação interventiva ocorre: a) por ação do Ministério Público; b) por provimento, do
Judiciário; e c) para proteção dos princípios sensíveis.
Não é correto, entretanto, afirmar que o Judiciário decreta a intervenção. Na verdade, o
que ocorre é que o Judiciário decide se é caso de intervenção ou não; se decidir que é caso de
intervenção, provoca o Chefe do Executivo para que ele decrete a intervenção. Esta provocação é
vinculante, não podendo o Chefe do Executivo deixar de decretar a intervenção (representação
interventiva provocada vinculante).
Assim como o Judiciário (seja o STF, no âmbito federal, seja o TJ, no âmbito estadual)
não está obrigado a acatar a representação interventiva, daí porque pode julgá-la improcedente, o
Chefe do Ministério Público (PGR, no âmbito federal; PGJ, no âmbito estadual) também não está
obrigado a propor a representação interventiva, se entender que o caso não demonstra alguma
hipótese constitucional.
A decisão judicial, não se nega, tem características político-administrativas, mas é mais
técnica que as outras hipóteses constitucionais. Daí porque a Constituição Federal, no caso de ação de
representação interventiva, não exige que a decisão judicial, ou o decreto que a seguir, passem pelo
crivo da Assembleia Legislativa ou do Congresso Nacional (art. 36, §3º).
Como foi dito, a intervenção é uma exceção, que arrefece o Pacto Federativo. Por isso, a
Constituição utiliza de mecanismo para que a intervenção não ocorra, mesmo após o deferimento do
pedido na ação de representação interventiva. É o caso do art. 36, §3º, parte final: “Nos casos do art. 34,
VI e VII, ou do art. 35, IV, dispensada a apreciação pelo Congresso Nacional ou pela Assembleia
Legislativa, o decreto limitar-se-á a suspender a execução do ato impugnado, se essa medida bastar ao
restabelecimento da normalidade”. Assim, o Chefe do Executivo, mesmo após receber o comunicado
do Judiciário, de que foi julgada procedente a ação, e mesmo vinculando-se a ela, poderá não decretar a
intervenção. É que, em muitos casos, é possível suspender algum ato que esteja ocorrendo no Estado ou
no Município, que o ferimento ao princípio sensível cessará, e a intervenção não precisará ser efetivada.
Interessante notar que a decisão judicial, apesar de técnica, tem caráter político-
administrativo. Por esta razão, o STF sumulou: “Não cabe recurso extraordinário contra acórdão de
Tribunal de Justiça que defere pedido de intervenção estadual em Município”.
Apesar de a regra ser o Judiciário julgar a representação interventiva proposta pelo
Ministério Público, para só então encaminhar o caso para o Chefe do Executivo, no âmbito federal é
possível o Judiciário encaminhar ao Chefe do Executivo sem a prévia representação. É o caso do art. 36, I
e II: quando houver limitação de exercício às funções do Poder Judiciário, nos Estados (neste caso, a
requisição será do STF) e quando alguma ordem ou decisão judiciária não for cumprida por algum
Estado (neste caso, a requisição será do STF, do STJ ou do TST, a depender de qual juízo for a ordem ou
sentença).
Como se vê, nos Estados, o Judiciário só encaminha ao Chefe do Executivo quando julgar
procedente a representação interventiva do Procurador-Geral de Justiça.
Neste caso, a lei expressamente estendeu a legitimação ativa da ADI e da ADC para a
ADInO. Veja que o art. 103 da Constituição fala dos legitimados para a ADC e para a ADI, se omitindo em
relação aos legitimados para a ADInO. Portanto, a Lei 12.063/09 tratou de algo não dito pela
Constituição Federal.
“ART. 12-B. A PETIÇÃO INDICARÁ:
I - A OMISSÃO INCONSTITUCIONAL TOTAL OU PARCIAL QUANTO AO CUMPRIMENTO DE DEVER CONSTITUCIONAL DE
LEGISLAR OU QUANTO À ADOÇÃO DE PROVIDÊNCIA DE ÍNDOLE ADMINISTRATIVA;
II - O PEDIDO, COM SUAS ESPECIFICAÇÕES.
PARÁGRAFO ÚNICO. A PETIÇÃO INICIAL, ACOMPANHADA DE INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO, SE FOR O CASO, SERÁ
APRESENTADA EM 2 (DUAS) VIAS, DEVENDO CONTER CÓPIAS DOS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR A
ALEGAÇÃO DE OMISSÃO.”
A Lei deixou bastante claro que a omissão inconstitucional pode ser total, isto é, quando
não existe o ato que deveria existir, e também parcial, quando o ato não foi suficiente ou foi construído
fora do espírito constitucional. Muitas vezes há regulamentação do dispositivo constitucional, porém tal
regulamentação constitucional acaba desvirtuando a intenção do legislador constituinte, prejudicando o
direito ou o valor constitucional; no mesmo tino, muitas vezes o tema constitucional deveria ser tratado
por uma legislação mais ampla, acabando por determinados pontos permanecerem sem
regulamentação. Nestes casos, é possível atacar o ato, não por conta da sua inexistência, mas pela sua
“má existência”. Com o passar do tempo, a ADInO será muito mais utilizada nas omissões parciais, visto
que a cada dia surgem novas leis regulamentando os dispositivos constitucionais, e chegará um tempo
em que quase não haverá falta de regulamentação.
O autor da ADInO deverá juntar documentos. Não se trata de uma opção. Pode-se até
chegar à conclusão interpretativa de que a juntada de documentos só serve para o caso de omissão
parcial, quando existe um ato e este deverá constar da petição, não sendo necessária a juntada de
documentos quando a omissão é total. De fato, é difícil comprovar o “fato negativo”, porque o autor
provavelmente não terá o documento, ou os documentos, para comprovar a omissão, muito embora
seja possível juntar tudo que for necessário para prová-la. De toda forma, importante observar que a Lei
diz que deve sempre ser juntadas cópias de documentos.
Ao prever expressamente que poderá haver omissão inconstitucional parcial ou total,
pode-se imaginar uma possível evolução doutrinária e jurisprudencial para permitir a conversão de ADIO
em ADInO, ou vice-versa. Atualmente, o STF não admite a conversão de ação direta de
inconstitucionalidade para ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI 1442/DF, Rel. Min.
Celso de Melo, DJ 29.04.2005, p. 07). A conversão poderia ocorrer quando o autor da ação alega que o
ato normativo é inconstitucional, mas o relator percebe que se pretendia invocar não a
inconstitucionalidade por ação do Poder Legislativo, se for o caso, mas sim inconstitucionalidade pela
omissão do Poder Legislativo, pois o ato normativo não teria sido suficiente para regulamentar o
dispositivo constitucional. Imagine-se o caso do Congresso aprovar uma lei que regulamente o direito de
greve do servidor público, especificando que se aplica apenas aos funcionários públicos estatutários.
Neste caso, estaria omitindo a regulamentação para os servidores públicos celetistas, temporários e
também aqueles com vínculo decorrente de cargos em comissão. Propõe-se Ação Direta de
Inconstitucionalidade alegando que a lei é inconstitucional porque ofendeu o espírito constitucional do
art. 37, VII, já que tal dispositivo abarca todos os servidores públicos (estatuários aprovados em
concurso, contratados temporariamente e aqueles com cargos em comissão). Como a Lei 12.063/09
expressamente faz referência à inconstitucionalidade por omissão parcial, pode ser que a jurisprudência
do STF se altere, por mutação constitucional, muito embora esta Lei expressamente disponha sobre a
necessidade do autor indicar qual é a omissão inconstitucional (art. 12-B, I).
“ART. 12-C. A PETIÇÃO INICIAL INEPTA, NÃO FUNDAMENTADA, E A MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE SERÃO
LIMINARMENTE INDEFERIDAS PELO RELATOR.
PARÁGRAFO ÚNICO. CABE AGRAVO DA DECISÃO QUE INDEFERIR A PETIÇÃO INICIAL.
ART. 12-D. PROPOSTA A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO, NÃO SE ADMITIRÁ DESISTÊNCIA.”
Veja que a cláusula geral de que aplicam-se os artigos referentes à ADC e à ADI somente
no que couber. Novamente mantém-se a necessidade de interpretação para saber quais as normas que
se adéquam à ADInO.
O §1º do art. 12-E consagra o caráter pluralista da ADInO, ao prever a participação dos
“amigos da Corte” (“amicus curiae”), e ressuscita disposição que havia sido vetada na Lei 9.868/99 (art.
7º, §1º). Veja que, neste caso, não se trata de participação de “terceiros interessados”, até porque não
cabe intervenção de terceiros, mas sim daqueles que são também legitimados para as outras ações do
controle abstrato de constitucionalidade.
Parece que existe uma diferença, entretanto, entre o “amicus curiae” na ADC e na ADIn,
com o “amicus curiae” na ADInO: é que o §2º do art. 7º da Lei 9.868/99, ao tratar do tema, diz que o
relator poderá admitir a participação de outros órgãos ou entidades, a depender da relevância da
matéria e da representatividade dos postulantes, e ainda por despacho irrecorrível. Por sua vez, o §1º
do art. 12-E trata de forma diferente, não dando uma opção ao relator, e sim dando um direito dos
demais legitimados de se manifestar, independentemente da vontade do relator, repetindo, assim, a
regra do §2º do art. 482 do CPC. Portanto, os demais legitimados, previstos no art. 103 da CF/88,
conforme art. 12-E, §1º,têm o direito de manifestação, e eventuais “outros órgãos ou entidades”
dependem do despacho do relator (art. 7º, §2º).
Como se sabe, não há citação do Advogado-Geral da União nas Ações Diretas de
Inconstitucionalidades por Omissão, visto que ele não poderá defender algo que não existe, e também
porque a CF/88 (art. 103, §3º) diz que a citação do AGU existirá para que ele defenda o ato ou texto
impugnado.
E se a omissão inconstitucional for parcial, isto é, se há um ato normativo que não
regulamentou corretamente o dispositivo constitucional?
Neste caso há o ato normativo que precisa ser defendido por alguém, para se
estabelecer uma boa dialética processual e instruir o STF com mais argumentos. Por isso, a Lei deixa o
relator livre para verificar, em cada caso, se a participação do Advogado-Geral da União é conveniente.
De todo modo, parece que a regra será a participação do Advogado-Geral da União apenas quando se
tratar de parcial omissão inconstitucional, muito embora nada impeça que o AGU participe também no
caso de total omissão inconstitucional, se assim entender o relator.
O PGR poderá deixar de participar do processo relativo à Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão?
Não. Sua “participação” é obrigatória, seja por ser o autor, seja pela sua necessária
audiência como “curador da constitucionalidade”, nos termos do art.103, § 1º, da CF/88 (“O Procurador-
Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os
processos de competência do Supremo Tribunal Federal”).
Por outro lado, o PGR poderá deixar de ser chamado, nas ADInO´s, para dar parecer?
Sim, caso ele tenha sido seu autor. Pode ser aberta vista ao PGR, para dar parecer em
ADInO, antes do decurso de prazo para informações? Não, por expressa disposição legal (§3º do art. 12-
E da Lei 9.868/99, com redação dada pela Lei 12.063/09)
A Lei agora deu prazo para o “amicus curiae” se manifestar: prazo para as informações,
que é de 30 dias (art. 6º, parágrafo único, Lei 9.868/99).
Entretanto, recorde-se que, como decidiu o STF (ADI 4.071), o “amicus curiae” poderá
ser aceito até a inclusão do processo na pauta de julgamentos, já que pode fazer sustentação oral
(ADI-QO 2.777 e art. 131, §32º do RISTF).
“SEÇÃO II
DA MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
ART. 12-F. EM CASO DE EXCEPCIONAL URGÊNCIA E RELEVÂNCIA DA MATÉRIA, O TRIBUNAL, POR DECISÃO DA MAIORIA
ABSOLUTA DE SEUS MEMBROS, OBSERVADO O DISPOSTO NO ART. 22, PODERÁ CONCEDER MEDIDA CAUTELAR, APÓS A
AUDIÊNCIA DOS ÓRGÃOS OU AUTORIDADES RESPONSÁVEIS PELA OMISSÃO INCONSTITUCIONAL, QUE DEVERÃO
PRONUNCIAR-SE NO PRAZO DE 5 (CINCO) DIAS.
§ 3º NO JULGAMENTO DO PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR, SERÁ FACULTADA SUSTENTAÇÃO ORAL AOS REPRESENTANTES
JUDICIAIS DO REQUERENTE E DAS AUTORIDADES OU ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA OMISSÃO INCONSTITUCIONAL, NA
FORMA ESTABELECIDA NO REGIMENTO DO TRIBUNAL.
ART.12-G. CONCEDIDA A MEDIDA CAUTELAR, O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL FARÁ PUBLICAR, EM SEÇÃO ESPECIAL DO
DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO E DO DIÁRIO DA JUSTIÇA DA UNIÃO, A PARTE DISPOSITIVA DA DECISÃO NO PRAZO DE 10 (DEZ)
DIAS, DEVENDO SOLICITAR AS INFORMAÇÕES À AUTORIDADE OU AO ÓRGÃO RESPONSÁVEL PELA OMISSÃO
INCONSTITUCIONAL, OBSERVANDO-SE, NO QUE COUBER, O PROCEDIMENTO ESTABELECIDO NA SEÇÃO I DO CAPÍTULO II
DESTA LEI.
Os arts. 12-F e 12-G não acataram a jurisprudência do STF, no sentido de que não cabe
liminar em ADInO. Agora com a Lei, a medida cautelar em ADInO é possível.
Observe que existem três espécies de medida cautelar em ADInO: a) para suspender
aplicação de lei ou ato normativo existente, no caso de omissão parcial; b) para suspender processos
judiciais ou procedimentos administrativos, visando evitar insegurança jurídica em face de divergências
interpretativas e de aplicação; c) para determinar outra providência a ser fixada pelo Tribunal. Veja que
o Tribunal pode determinar “outra providência”, tendo bastante poder para resolver os problemas
concretos forem apresentados. Pode, por exemplo, mandar aplicar outra lei, ou parte de outra lei, já
existente e que trata de matéria semelhante, como ocorreu no STF, ao determinar a aplicação da Lei
7.783/89 para regulamentar o direito de greve dos servidores públicos (MI 712/PA; MI 670/ES).
Não se previu a ouvida prévia do Advogado-Geral da União, mas apenas do Procurador-
Geral da República, isto se o Relator julgar indispensável. A ouvida do AGU, relembre-se, pode se dar no
rito ordinário, após a fase cautelar, e ainda assim se o Relator entender que sua manifestação é
importante. Assim, pode ser que a cautelar seja concedida sem a ouvida do PGR e do AGU.
“SEÇÃO III
DA DECISÃO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
ART. 12-H. DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO, COM OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 22, SERÁ
DADA CIÊNCIA AO PODER COMPETENTE PARA A ADOÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS.
§ 1º EM CASO DE OMISSÃO IMPUTÁVEL A ÓRGÃO ADMINISTRATIVO, AS PROVIDÊNCIAS DEVERÃO SER ADOTADAS NO
PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS, OU EM PRAZO RAZOÁVEL A SER ESTIPULADO EXCEPCIONALMENTE PELO TRIBUNAL,
TENDO EM VISTA AS CIRCUNSTÂNCIAS ESPECÍFICAS DO CASO E O INTERESSE PÚBLICO ENVOLVIDO.
§ 2º APLICA-SE À DECISÃO DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO, NO QUE COUBER, O DISPOSTO
NO CAPÍTULO IV DESTA LEI.”
O art. 12-H, ao enfatizar que cabe ao Tribunal dar ciência ao Poder competente para a
adoção das providências necessárias, parece ratificar que, em ADInO, não pode o Judiciário agir como
legislador positivo, isto é, criar uma lei com efeitos “erga omnes”, substituindo o Legislativo. Por outro
lado, ratifica a posição concretista do STF, no caso do mandado de injunção, na medida em que não dá
a oportunidade de concretizar a norma ausente por meio da ADInO.
A Constituição Federal de 1988, no §2º do art. 103, diz que, em se tratando de omissão
de órgão administrativo, o Tribunal determinará, via sentença ou decisão mandamental, que ele
providencie as medidas necessárias no prazo de trinta dias. A CF/88, como se vê, não oferece outro
prazo, muito provavelmente porque o legislador constituinte parte da ideia de que a construção da
norma, pelo órgão administrativo, é algo simples, sem necessidade de passar por todo o processo
legislativo. A Lei 12.063/09, entretanto, acrescentou que o prazo poderá ser outro, diferente de 30 dias,
tendo em vista circunstâncias específicas e o interesse público envolvido no caso. De fato, parece que o
legislador constituinte não proibiu o legislador infraconstitucional de acrescentar esta possibilidade,
porque a intenção principal era que o Judiciário tivesse o poder de determinar que o órgão
administrativo fizesse a norma, de modo que o próprio Judiciário poderá verificar que o prazo de 30 dias
é irracional, impossível de ser cumprido, ou então que 30 dias é prazo muito longo diante das
circunstâncias e da possibilidade de perecimento de direitos.
Por ser uma ação abstrata, e não concreta, não importa a omissão concreta, e sim a
omissão em tese, relacionada com a norma constitucional de eficácia limitada de caráter mandatário.
Da mesma forma, a omissão deve ser de lei estadual e federal, nunca de lei municipal – parâmetro da
ADC e da ADI.
O assunto mais importante, no que tange à ADInO, é a questão dos efeitos da decisão
nela proferida. Se o STF julgá-la procedente, e entender que existe uma omissão inconstitucional, o que
ele fará?
A Constituição de 1988, no art. 103, §2º, dá a resposta: “Declarada a
inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada
ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão
administrativo, para fazê-lo em trinta dias”.
Portanto, se a omissão for de órgão administrativo, a ADInO é efetiva, porque
determina, manda, dá uma ordem para que o ato seja praticado em 30 dias, ou em prazo razoável, a ser
determinado pelo Tribunal. Entretanto, se a omissão for de órgão legislativo, a decisão em ADInO
servirá, apenas, para declarar a mora do Parlamento, porque não poderá obrigá-lo fazer a lei. A
Constituição, então, valorizou a separação de poderes, e utilizou a ADInO como um instrumento de
pressão política, já que o STF não pode ser legislador positivo e suprir a omissão, neste caso.
Correto dizer que a ADInO será efetiva se o órgão administrativo for o omisso; o mesmo
não ocorre se o omisso for órgão político.
Também não há igualdade na legitimidade ativa. A ADInO pode ser proposta pelos
mesmos legitimados da ADC e da ADI (art. 103, CF), e o mandado de injunção pode ser proposto pelo
titular do direito subjetivo ferido pela omissão constitucional.
Os órgãos julgadores da ADInO podem ser o STF e os Tribunais de Justiça dos Estados,
mas o mandado de injunção, até por ser um controle concreto e subjetivo, pode ser julgado por vários
órgãos judiciários. Nesse sentido, a CF/88, no art. 102, II, “a”, diz que cabe ao STF julgar, em recurso
ordinário, os mandados de injunção denegados pelos Tribunais Superiores; o art. 105, I, “h”, diz que
cabe ao Superior Tribunal de Justiça julgar o mandado de injunção, quando a elaboração da norma
regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou
indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça
Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal; o art. 121, §4º, V, diz que das
decisões dos TER´s caberá recurso quando denegarem mandado de injunção.
Uma outra diferença é a seguinte: na ADInO, o efeito da decisão não supre a omissão
inconstitucional; no MI, a sentença supre a omissão. Esta parece ser a intenção do legislador
constituinte originário, ao dispor, no art. 5º, LXXI, que “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a
falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das
prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.
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“No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que
faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito” (SFF, MI 712/PA, DJ 31.10.2008).
referida no §4º do art. 40, mesmo não existindo a norma infraconstitucional citada neste dispositivo
constitucional.
a) TESE CONCRETISTA: a sentença proferida no mandado de injunção concretiza o ato que deveria
ter sido editado pelos órgãos competentes;
a.1) Tese Concretista Geral: a sentença faz valer o ato omitido para todos e não só para as
partes. Decisão com efeitos “erga omnes”. Este é a tese adotada pelo STF no julgamento dos
MI´s MI 689, 670 e 712, que se referiam ao direito de greve dos servidores públicos;
a.2) Tese Concretista Individual: concretiza o ato omisso, porém só para as partes que
impetraram o mandado de injunção. Decisão com efeitos “inter parts”;
a.2.1) Tese Concretista Individual Direta: concretização do ato omisso imediata e diretamente
para o autor do mandado de injunção;
a.2.2) Tese Concretista Individual Indireta (ou Intermediária): a sentença proferida no mandado
de injunção concretiza o ato omisso para o autor, porém somente se o órgão legislativo ou
administrativo novamente não emitir a norma regulamentadora no prazo conferido pelo Tribunal
(para esta tese, é preciso, antes, conceder um prazo para que a norma seja concretizada pelo
órgão constitucionalmente previsto);
b) TESE NÃO CONCRETISTA: cabe ao Judiciário, se for o caso, apenas reconhecer a inércia
inconstitucional e dar ciência da decisão ao órgão competente, para que seja editada a norma
faltante. Não poderia concretizar a norma porque violaria a separação dos poderes
Por isso, analisando com cuidado o texto constitucional, é possível verificar normas que
estão no texto constitucional, mas que não têm importância política fundamental, e que por isso deveria
ser tratada pelo legislador ordinário. Se a Constituição é uma decisão política fundamental, o natural
seria tratar nela apenas as questões importantes, que influenciam toda a relação da sociedade com o
Estado.
É por isso que a recíproca é verdadeira: podem existir normas de índole constitucional
que não estão no texto constitucional. Imagine-se uma lei tratando da estrutura do Estado, ou
regulamentando o exercício da Democracia Participativa.
Então, as normas formalmente constitucionais podem ser analisadas sob dois enfoques:
A conclusão é que: nem toda norma materialmente constitucional pode ser utilizada
para fundamentar o controle de constitucionalidade, porque podem existem normas materialmente
constitucionais que não estão no corpo da Constituição de 1988; toda norma formalmente
constitucional pode ser utilizada para fundamentar o controle de constitucionalidade, porque norma
formalmente constitucional é aquela que está na Constituição, mesmo que lá não deveria estar.
O interessante é saber que o controle de constitucionalidade só pode ser feito com base
nas normas que estão no corpo da Constituição de 1988, inclusive no ADCT. Tais normas formam o
“bloco de constitucionalidade”, que dá referência (“normas de referência”) ao controle de
constitucionalidade. “Bloco de constitucionalidade”, então, é todo o conjunto que serve de parâmetro
para se fazer o controle de constitucionalidade.
Foi nesse sentido é que o Ministro Celso de Melo, relator da ADI 514/PI, DJE de
31.3.2008, enfatizou, na ementa, que “A definição do significado de bloco de constitucionalidade -
independentemente da abrangência material que se lhe reconheça (a Constituição escrita ou a ordem
constitucional global) - reveste-se de fundamental importância no processo de fiscalização normativa abstrata,
pois a exata qualificação conceitual dessa categoria jurídica projeta-se como fator determinante do caráter
constitucional, ou não, dos atos estatais contestados em face da Carta Política .”
Uma observação pertinente é que é errado dizer que somente pode fundamentar o
controle de constitucionalidade as normas expressas que estão na Constituição de 1988. Isto porque há
norma implícita, decorrente de uma interpretação do texto constitucional. É o caso de julgar
inconstitucional uma lei porque ela é desproporcional (neste caso, julga-se a inconstitucionalidade com
base em um princípio, um preceito constitucional implícito, pois o princípio da proporcionalidade, como
se sabe, está implícito na CF/88).
O STF entendeu que estas normas gerais internacionais sobre direitos e garantias,
acatadas pelo Brasil, entravam no ordenamento jurídico brasileiro como normas infraconstitucionais.
Deste modo, o bloco de constitucionalidade permanecia com as normas que estavam no texto da
Constituição de 1988 (não se esqueça que o STF tem a tendência de incluir os tratados internacionais
sobre direitos humanos não aprovados como as formas de aprovação da emenda constitucional, com o
status de norma supralegal – vide em hierarquia das normas jurídicas, no capítulo do processo
legislativo).
Neste caso, há uma modulação temporal dos efeitos da decisão, como ocorre na
inconstitucionalidade retraída ou restringida. Por isso, declara-se que a norma ainda é constitucional, e
se faz um apelo ao legislador para mudar a situação atual, sob pena de configurar a
inconstitucionalidade em se permanecendo a situação atual.
q) Modelo bifásico
Deste modo, o AGU não pode opinar pela inconstitucionalidade do ato normativo
atacado em ADI, mesmo que o autor da ação seja o Presidente da República, a quem cabe assessorar.
Dentro deste espírito é que a audiência com o AGU só é necessária em ADI e ADPF,
sendo dispensada em Ação Declaratória de Constitucionalidade, visto que o objetivo é justamente
convencer o Tribunal da constitucionalidade do ato normativo. Fica dispensada a participação do AGU,
também, na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, lembrando que, neste caso, que o art.
12-E, §2º, da Lei 9.868/99, com redação dada pela Lei 12.063, de 27 de outubro de 2009, permite a
manifestação do AGU nas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão, em 15 dias, quando
houver solicitação do relator. Neste caso, não há obrigação de participação do AGU, e nem é necessária
citação, mas o relator poderá analisar se a manifestação do AGU poderá contribuir para a solução do
caso.
Na ADI 3916 (Rel. Min. Eros Grau, DJe 86, 14.05.2010, p. 62), o STF mudou
significativamente o seu entendimento, ao enfatizar que a função primordial do AGU, de defesa da
União, deve prevalecer, quando estiver em análise uma lei que fira interesses da União. Nestes casos,
pode ele defender a inconstitucionalidade, até porque não há, na Constituição, dispositivo prevendo
sanção ao AGU caso ele atue em defesa da inconstitucionalidade, e nem há competência do Supremo
para impor-lhe sanção.
O que o PGR não pode fazer é desistir da ação direta proposta no STF, como, aliás,
ninguém pode (art. 5º e 16 da Lei 9.868/99).
s) Observações finais
s.1) é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que exige a pertinência subjetiva e legitimação adequada para
as Ações Diretas de Inconstitucionalidades propostas pelos Governadores, Mesas das Assembleias Legislativas
Estaduais e do Distrito Federal, Confederações Sindicais e entidades de classe de âmbito nacional, tendo-se em
vista que a Lei 9.868/99, nesse ponto, foi vetada (veto ao parágrafo único do art. 23);
s.2) o controle de constitucionalidade pode ser feito administrativamente pelo Tribunal de Contas, sendo assunto
sumulado no Supremo Tribunal Federal (Súmula 347). O TCU pode deixar de aplicar a lei, muito embora não possa
afastar a existência dela com efeitos “erga omnes”. O controle, neste caso, será concreto;
s.3) em Ação Direta de Inconstitucionalidade, o Tribunal poderá conceder a cautela sem ouvir o Advogado Geral da
União e o Procurador Geral da República, mas obrigatoriamente deverá ouvir previamente o órgão ou a
autoridade de que emanou o ato normativo ou a lei atacada, salvo em caso de excepcional urgência, quando nem
mesmo o órgão ou a autoridade responsável precisam ser ouvidos previamente;
s.4) em Ação Declaratória de Constitucionalidade, a Lei 9.868/99 não proibiu a concessão de cautelar sem a ouvida
do órgão ou da autoridade responsável pelo ato normativo ou pela lei objeto da ação, ao contrário da Ação Direta
de Inconstitucionalidade;
s.5) uma Emenda Constitucional não pode prever que o Poder Judiciário será o responsável pela reforma da
Constituição Federal, já que se trata de uma limitação implícita, ou inerente ao poder constituinte derivado
reformador, que é referente à sua titularidade. Se houver emenda neste sentido, pode haver mandado de
segurança junto ao STF, para brecar o processo;
s.6) é possível tanto o controle de constitucionalidade preventivo como o repressivo das Medidas Provisórias. O
preventivo se dá pelo Legislativo, à vista do art. 62, §5º (“A deliberação de cada uma das Casas do Congresso
Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus
pressupostos constitucionais”), e o repressivo se dá pelo Judiciário, após ser adotada pelo Chefe do Executivo;
s.7) é possível efetivar o controle de constitucionalidade de lei em “vacatio legis”? É uma questão tormentosa. A
ementa da ADI 466, por sinal, é de duvidosa interpretação, porque em determinado momento parece entender
que não é possível ADI contra lei em “vacatio legis”, ao dizer: "atos normativos ´in fieri´ supõe a existência de
espécies normativas definitivas, perfeitas e acabadas", mas em outro momento, dá a entender em sentido
contrário, ao dizer que "a ação direta só pode ter por objeto juridicamente idôneo, apenas leis e atos normativos,
federais ou estaduais, já promulgados, editados e publicados", nada falando da vigência. De todo modo, parece
ser entendimento dominante que não cabe o controle de constitucionalidade concentrado de lei em “vacatio
legis”. Exemplo: o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10.01.2002), foi publicado em 11.01.2002, com o seguinte art.
2044: “Este Código entrará em vigor 1 (um) ano após a sua publicação”. Deste modo, de 11.01.2002 até
11.01.2003, não havia como propor ação declaratória de constitucionalidade e nem ação direta de
inconstitucionalidade contra seus dispositivos, até porque o art. 102, I, pressupõe lei em vigência e, além do mais,
pressupõe a utilização do controle concentrado para ter eficácia, e a lei ainda não vigente não tem eficácia. A título
de crítica, talvez seja possível enfatizar que, com a inclusão da segurança jurídica como princípio constitucional,
verdadeiro subprincípio decorrente do Estado de Direito (vide tópico do princípio da segurança jurídica), parece
que há espaço para acatar a tese de que o controle de constitucionalidade pode ser feito em lei que ainda está em
“vacatio legis”, porque seus dispositivos, apesar de não terem vigência, acabam gerando muita insegurança e até
influenciam em diversos contratos e atos jurídicos. De toda forma, a corrente majoritária entende que não cabe
controle de constitucionalidade de lei que foi publicada mas ainda não esteja em vigência (em “vacatio legis”),
porque este controle pressupõe lei em perfeitas condições de eficácia (publicação e vigência). Então, seria o caso
de se propor ADPF;
s.8) o Supremo Tribunal Federal não acata a figura da constitucionalidade superveniente. Há quem defenda que,
se uma lei for inconstitucional, se comparada com alguma norma constitucional originário de 1988, mas vier uma
Emenda Constitucional e mudar esta norma constitucional, dando-lhe compatibilidade com a lei anterior, haveria a
transformação da inicial inconstitucionalidade em posterior constitucionalidade. No julgamento do RE
390840/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, o STF enfatizou que o art. 3º, §1º, da Lei 9.718/98 nasceu inconstitucional, e
não poderia ter se transformada em constitucional com base na Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998, já
que “O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente” (o art. 3º, §1º, da
Lei 9.718, de 27.11.1998, havia ampliado o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas
auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil
adotada, o que contrariava o art. 195 da CF/88, na sua redação original; o conceito de receita bruta só foi ampliado
em a EC 20, de 15.12.1998). No mesmo sentido, RE 346084/PR, Rel. Min. Ilmar Galvão;
s.9) inconstitucionalidade reflexa, indireta. por via oblíqua, mediata ou abstrata, é aquela que não afronta
diretamente a Constituição, de modo que não pode ser controlada no controle concentrado e abstrato de
constitucionalidade. É, na verdade, uma afronta à lei, verdadeira crise de legalidade, na medida em que há a sua
má regulamentação pelo Chefe do Executivo (regulamentação ultra, citra ou contra legem, isto é, aquém do
determinado pela lei, além dos poderes conferidos ou contra o conteúdo da lei), ou até por Ministros ou
Secretários (no caso de Instruções Normativas e Portarias). Como disse o Min. Sepúlveda Pertence, no voto da ADI
3190-2/GO: “a inconstitucionalidade reflexa pressupõe a existência, no mínimo, de duas normas
infraconstitucionais; e se configura quando ´o confronto do ato questionado com os dispositivos constitucionais da
Carta teria que passar, primeiramente, pelo exame in abstracto de outras normas infraconstitucionais, de tal
forma que não haveria confronto direto da lei em causa com a Constituição´ (ADIn 1900-MC, Moreira, DJ
25.2.2000)”.
Assim, um artigo do Decreto pode até ser manifestamente contrário à norma constitucional, mas não poderá ser
controlado via ADI ou ADC, visto que há no caso crise de legalidade, e não crise de constitucionalidade, até porque
o Decreto é ato normativo secundário, e não primário, que tem por objetivo apenas “a explicitação ou
especificação de um conteúdo normativo preexistente, visando a sua execução no plano da praxis” (Miguel Reali),
daí porque “não pode inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, medida punitivas, até
porque ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, conforme art. 5º, II da
Constituição” (Di Pietro).
No STF, vide ADI 996-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 6-5-94; ADI 365-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15-
3-91.
No caso de inconstitucionalidade reflexa, poderá ocorrer o que se denomina de crise qualificada de legalidade. Isto
é próprio para o caso do Decreto, ou o regulamento de uma forma geral (Instrução Normativa ou Portaria),
regulamentar uma lei que é inconstitucional.
O mesmo não se dá com o Decreto Autônomo, que pode gerar uma inconstitucionalidade direta, possibilitando o
controle concentrado de via ADI ou ADC, já que não estará regulamentando nenhuma lei. Ele cria a norma
diretamente, e daí porque poderá haver inconstitucionalidade direta contra a Constituição. O Decreto Autônomo
está previsto no art. 84, VI, a CF/88, inserido pela EC 32 de 11.09.2001, e acatado pelo STF (“Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Decreto nº4.010, de 12 de novembro de 2001. Pagamento de servidores públicos da
Administração Federal. Liberação de recursos. Exigência de prévia autorização do Presidente da República. Os
artigos 76 e 84, I, II e VI, a, todos da Constituição Federal, atribuem ao Presidente da República a posição de Chefe
supremo da administração pública federal, ao qual estão subordinados os Ministros de Estado. Ausência de ofensa
ao princípio da reserva legal, diante da nova redação atribuída ao inciso VI do art. 84 pela Emenda Constitucional
nº 32/01, que permite expressamente ao Presidente da República dispor, por decreto, sobre a organização e o
funcionamento da administração federal, quando isso não implicar aumento de despesa ou criação de órgãos
públicos, exceções que não se aplicam ao Decreto atacado" - ADI 2.564, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 06/02/04).
Interessante lembrar que há um caso em que é possível o controle concentrado de constitucionalidade de
decreto regulamentador. Isto ocorre quando o Decreto regulamenta uma lei publicada antes da Constituição de
1988, lei esta incompatível com o texto constitucional (lei não recepcionada ou revogada). Assim, este Decreto
acaba sendo considerado Decreto Autônomo, mesmo não estando entre aquelas hipóteses do art. 84, VI, podendo
sua constitucionalidade ser controlada via ADI ou ADC. Nesse sentido, emblemático foi o julgamento da ADI
3190/GO:
“Ação direta de inconstitucionalidade: Resolução 04, de 20.12.1996, do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de
Goiás, que dispõe sobre o aproveitamento de servidores requisitados, no Quadro Permanente da Secretaria do
TRE/GO, de acordo com a L. 7.297, de 20.12.1984: violação do art. 37, II, da Constituição Federal:
inconstitucionalidade declarada. II. Ação direta de inconstitucionalidade: cabimento. 1. O objeto da ação direta é a
Resolução 04/96 do TRE/GO, que se funda nas LL 7.178/83 e 7.297/84 - as quais, no ponto em que possibilitavam
o aproveitamento dos servidores requisitados, não foram recebidas pela ordem constitucional vigente e estariam,
pois, revogadas desde o advento da atual Constituição. 2. Essa revogação faz com que a Resolução 04/96 do
TRE/GO passe a ser o único fundamento normativo do aproveitamento atacado, não havendo, assim, problema
de desconformidade entre as leis e a resolução, nem, portanto, de inconstitucionalidade reflexa ou mediata. III.
Ação direta de inconstitucionalidade: lei anterior à Constituição: possibilidade de o Supremo Tribunal, antes do
exame da inconstitucionalidade do ato normativo inferior questionado, examinar o recebimento daquela pela
nova ordem constitucional. Precedentes. IV. Concurso público: exigência incontornável para que o servidor seja
investido em cargo de carreira diversa. 1. Reputa-se ofensiva do art. 37, II, CF, toda modalidade de ascensão de
cargo de uma carreira ao de outra, a exemplo do "aproveitamento" de que cogita a norma impugnada. 2. Se, até
no âmbito da mesma entidade federativa, assim se considera vedada pela Constituição o aproveitamento do
servidor em carreira diversa, com mais razão se há de reputar inadmissível o aproveitamento de servidor estadual
ou municipal nos quadros da Justiça Eleitoral, que integra o Poder Judiciário da União. Precedentes. 3. Incidência
da Súmula/STF 685 ("É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem
prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual
anteriormente investido")” (ADI 3190/GO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJ 24-11-2006, p. 60).
s.11) o STF não admite a conversão de ação direta de inconstitucionalidade para ação direta de
inconstitucionalidade por omissão (ADI 1442/DF, Rel. Min. Celso de Melo, DJ 29.04.2005, p. 07);
s.12) a procuração para propor ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade
deve conter poderes específicos para impugnar a norma a ser atacada (STF, ADI 2.187);
s.13) a eficácia “erga omnes” das decisões não opera uma depuração total do ordenamento jurídico, porque as
decisões não revisam ou impugnam os atos singulares, mas apenas dá condições para que eles sejam suscetíveis
a tanto, em havendo condições para isso. Os atos singulares são aqueles atos praticados com base nas leis que são
declaradas inconstitucionais, que não têm mais como serem alterados, revisionados ou impugnados. Imagine-se
que uma Lei imponha aos dirigentes da Administração Pública destruir todos os arquivos administrativos, que se
referem a processos disciplinares julgados há mais de 10 (dez) anos. Julgada esta lei inconstitucional quando os
dirigentes já tinham determinado a destruição dos arquivos, a decisão, apesar de ter eficácia contra todos, não
poderá alcançar estes atos singulares, já exauridos e que não podem mais ser alcançados;
s.14) se, entretanto, concorrem uma ADIN no STF, e uma representação de inconstitucionalidade no TJ
(representação que é, na verdade, uma ADIN, mas que tem este nome em face do art. 125, §2º, da CF/88), e o
parâmetro de controle das duas ações forem diversos, é dizer, se as normas constitucionais estaduais invocadas
na representação não forem de repetição obrigatória, tendo um alcance específico para o Estado, não há
interferência de um Tribunal no processo que corre no outro. Deste modo, se houver declaração de
inconstitucionalidade de um Tribunal, o processo junto ao outro não se subsiste porque a lei foi extirpada do
ordenamento jurídico. Em outras palavras, se uma Lei estadual “X” é atacada por representação de
inconstitucionalidade no TJ, e também por ADIN no STF, é preciso ver se o parâmetro de controle é igual, porque
pode ser que a alegação na representação junto ao TJ tenha um fundamento diferente, baseado em normas
constitucionais estaduais específicas, que não reproduzem as normas constitucionais federais, daí porque será
diferente do fundamento junto à ADIN no STF. É por isso que, se for diferente o parâmetro de controle, a eventual
declaração de inconstitucionalidade da lei estadual, no TJ, tem eficácia inclusive para o STF, fazendo com que o
processo que corre neste Tribunal não se subsista, por perda de objeto, já que a lei discutida deixou de existir em
face da decisão do TJ. A recíproca é verdadeira: se o STF declarar a lei estadual inconstitucional, porque fere
dispositivos constitucionais federais, o processo junto ao TJ estará prejudicado, por perda do objeto;
s.15) é permitido ao TJ estadual, diante da representação de inconstitucionalidade de uma lei municipal ou de uma
lei estadual, extinguir o processo por perda do objeto, por entender que o parâmetro de controle é
inconstitucional, em face da Constituição Federal. Em outras palavras: se uma Lei “X” for impugnada por
representação de inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça do Estado, porque estaria ferindo uma
norma constitucional estadual, o TJ poderá entender que esta norma constitucional estadual é inconstitucional,
porque fere a CF/88 (decidiu, portanto, que o parâmetro de controle é inconstitucional), e por isso faz com que o
processo perca seu objeto. Neste caso, o TJ encaminhará o processo, “ex officio”, para o STF, para que se
pronuncie quanto à declaração de inconstitucionalidade da norma constitucional estadual. Neste tino, se o STF
declarar que a norma constitucional estadual não era inconstitucional (repita-se: que o parâmetro de controle
estadual era constitucional), deve devolver o processo para o TJ, para que ele dê sequência e decida se houve ou
não inconstitucionalidade). Caso o TJ não suscite a questão “ex officio”, as partes envolvidas podem suscitar a
questão no STF mediante recurso extraordinário;
s.16) na ação direta de inconstitucionalidade, não é permitida uma fundamentação genérica, sob pena de não ser
conhecida. Segundo o STF, “Não se conhece da ação direta, sempre que a impugnação nela veiculada revelar-se
destituída de fundamentação jurídica ou desprovida de motivação idônea e adequada. Em sede de fiscalização
normativa abstrata, não se admite impugnação meramente genérica de inconstitucionalidade, tanto quanto não
se permite que a alegação de contrariedade ao texto constitucional se apóie em argumentos superficiais ou em
fundamentação insuficiente. Lei nº 9.868/99, art. 4º, “caput” (ADI 514/PI). Como disse o relator, “É certo que o
Supremo Tribunal Federal não está condicionado, no desempenho de sua atividade jurisdicional, pelas razões de
ordem jurídica invocadas como suporte da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pelo autor da ação direta.
Tal circunstância, no entanto, não suprime, à parte, o dever processual de motivar o pedido e de identificar, na
Constituição, em obséquio ao princípio da especificação das normas, os dispositivos alegadamente violados pelo
ato normativo que pretende impugnar. Impõe-se, ao autor, no processo de controle concentrado de
constitucionalidade, indicar as normas de referência - que são aquelas inerentes ao ordenamento constitucional e
que se revestem, por isso mesmo, de parametricidade - em ordem a viabilizar, com apoio em argumentação
consistente, a aferição da conformidade vertical dos atos normativos de menor hierarquia (...). Não cabe, desse
modo, ao Supremo Tribunal Federal, substituindo-se ao autor, suprir qualquer omissão que se verifique na petição
inicial. Isso porque a natureza do processo de ação direta de inconstitucionalidade, que se revela instrumento de
grave repercussão na ordem jurídica interna, impõe maior rigidez no controle dos seus pressupostos formais (RTJ
135/19, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RTJ 135/905, Rel. Min. CELSO DE MELLO). A magnitude desse
excepcional meio de ativação da jurisdição constitucional concentrada do Supremo Tribunal Federal impõe e
reclama, até mesmo para que não se degrade em sua importância, uma atenta fiscalização desta Corte, que deve
impedir que o exercício de tal prerrogativa institucional, em alguns casos, venha a configurar instrumento de
instauração de lides constitucionais temerárias”;
s.17) atualmente, há uma clara aproximação do controle difuso com o controle abstrato, e uma decadência do
controle difuso. Há quem defenda, inclusive, que não pode mais haver diferença entre um e outro, especialmente
quando o controle é feito junto ao Plenário do STF, porque, neste caso, a decisão deverá ter sempre efeito “erga
omnes” e vinculante, mesmo não sendo feito por meio de ADI, ADC ou ADPF. É o que se conhece como
“abstrativização”, ou “objetivização” do controle difuso, tendência doutrinária e jurisprudencial que enfoca a
possibilidade de dar efeito vinculante à decisão proferida no controle difuso junto ao Supremo Tribunal Federal.
Entendimento capitaneado, mais intensamente, pelo Ministro Gilmar Mendes, que faz uma nova interpretação do
art. 52, X, da CF/88: seria uma mutação constitucional, porque o dispositivo não quer mais dizer, como se
entendeu no passado, que o Senado suspende a eficácia por Resolução, mas sim que apenas comunica a decisão
do STF para a sociedade (o papel do Senado se limitaria a dar publicidade às decisões do STF). O STF dá claros
sinais desta tendência, como ocorreu no caso do direito de greve dos servidores públicos (a sentença foi proferida
em mandado de injunção, o que seria apenas para as partes, mas seus efeitos foram declarados vinculantes para
todos os servidores públicos), na constante aceitação da transcendência dos motivos determinantes (vinculação de
todos à causa de decidir “ratio decidendi”), também no caso da progressão de regime na lei dos crimes hediondos
(a permissão para progressão foi feita em um “habeas corpus”, o que em tese valeria só para o paciente, mas
acabou sendo declarada vinculante para todos, e acabou influenciando o legislador para alterar o §1º do art. 2º da
Lei 8.072/90, por meio da Lei 11.464/07) e do Município de Mira Estrela (houve definição do número de
Vereadores em processo que envolvia só este Município, mas foi dado efeito vinculante para todos os demais). Na
legislação, a “abstrativização” parece consagrada no parágrafo único do art. 481 do CPC, ao permitir que os órgãos
fracionários dos tribunais não submetam ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, no
controle difuso, quando já houver pronunciamento dos próprios tribunais ou do plenário do STF sobre a questão.
Assim, uma decisão proferida pelo STF, mesmo no controle difuso, sobre a constitucionalidade de uma lei que está
sendo atacada em preliminar, junto ao Tribunal de Justiça, esta decisão do STF terá efeito vinculante ao ponto de
afastar a reserva de plenário. As expressões “abstrativização” e “objetivização” são adequadas, na medida em que
demonstram que o controle difuso era, e ainda é, visto por significativa parte da doutrina, para não dizer a
maioria, como processo subjetivo e concreto: a decisão se restringe às partes (“inter parts”) e envolve alguma lide
concreta (acidente de carro, indenização por ato ilícito, direito líquido e certo etc.), de modo que, sendo concreto
e subjetivo, e não abstrato e objetivo, não poderia as decisões tomadas sobre a constitucionalidade de atos
normativos alcançar e vincular terceiros que não estão no processo;
s.18) a revogação da norma impugnada só impede a análise da ADI se esta ainda não foi incluída em pauta para
julgamento. Deste modo, se a ADI já foi incluída em pauta para julgamento, ela será conhecida e julgada pelo STF,
mesmo que a norma objeto tenha sido revogada (ADI 2006/DF, DJ 10.10.2008, ADI 15/DF, DJ 31.08.2007; ADI
3.232/TO, DJ 03.10.2008). Tenha-se em mente, então, o seguinte: a revogação da norma objeto prejudica a análise
da ADI. Esta é a regra;
s.19) a alteração substancial do texto constitucional que era a norma de referência para análise da
constitucionalidade de determinada norma impugnada, prejudica a análise da ADI. Esta prejudicialidade ocorre
porque o controle concentrado de constitucionalidade só pode ser feito com base em texto constitucional em
vigor (STF, ADI 2.159/DF, DJ 07.12.2007; ADI-MC 3.933/DF, DJ 14.11.2008);
s.20) só pode haver admissão do “amicus curiae” até a data da remessa dos autos à mesa para julgamento (STF,
ADI 4.071 AgR/DF, DJ 06.05.2009).