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PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

MÓDULO RECURSOS E AÇÕES AUTÔNOMAS DE IMPUGNAÇÃO

Professor: Rogerio Schietti Machado Cruz

1. Material pré-aula

a. Tema

Teoria Geral dos Recursos e Recursos Extraordinários.

b. Noções Gerais

b.1. Aspectos introdutórios, conceito e duplo grau de jurisdição

No ordenamento jurídico em que se estabelece um sistema de


julgamento por um terceiro, mesmo que juiz e imparcial, surge como
consequência a possibilidade de irresignação de uma das partes, ou
seja, a não conformação com a decisão proferida. Desse inconformismo,
justifica-se o exercício do direito ao duplo grau de jurisdição e a
construção de mecanismos de impugnação denominados recursos.
A doutrina conceitua recursos sinteticamente como instrumento
processual manejado voluntariamente pela parte, “destinado à obtenção
do reexame de decisão proferida na mesma relação jurídica processual,
passível de provocar esclarecimentos, integração ou invalidação da
decisão judicial impugnada”1. “Excepcionalmente, o recurso pode não
ser um ato de parte, senão do ofendido, que venha ao processo como
assistente não habilitado, exclusivamente para recorrer”2.
A revisão das decisões judiciais através da reapreciação do problema
discutido inicialmente surge por diversas razões, seja na intenção de
buscar a melhoria dos provimentos jurisdicionais ou de sanar eventuais
erros cometidos pelo terceiro imparcial (juiz), seja também na intenção
de se alcançar uma nova uma decisão do que se entenda por ser justa.
Verifica-se, portanto, que o fundamento do nosso sistema recursal tem
como base dois argumentos: a falibilidade humana e inconformidade do
prejudicado.


1
José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 5, p. 233. Apud MOUGENOT,
Edilson. Curso de Processo Penal. 13ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2019.
2
LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 2019.

Os mecanismos que surgem como meios de impugnação para a
reapreciação da matéria e de revisão das decisões desdobram-se em:
1) recursos propriamente ditos, utilizados antes da preclusão e na
mesma relação jurídica, e
2) ações autônomas de impugnação, que se formam através de uma
nova relação jurídica.

O Habeas Corpus e a Revisão Criminal, apesar de constarem no título II


do Código de Processo Penal de recursos, são considerados como ações
autônomas de impugnação, assim como os mandados de segurança.
Neste título do CPP, nos artigos 574 e seguintes, deparamos com um rol
taxativo de recursos: Recurso em Sentido Estrito, apelação, embargos,
recurso extraordinário, carta testemunhável, agravo em execução, além
também do recurso especial, previsto na Lei 8.038/90, e do agravo
interno, previstos nos regimentos internos dos tribunais.
Ademais, a doutrina é uníssona no sentido de não considerar o reexame
necessário como recurso:

o conceito de recurso vincula-se à ideia de ser um meio processual


através do qual a parte que sofreu o gravame solicita a modificação, no
todo ou em parte, ou a anulação de uma decisão judicial ainda não
transitada em julgado, no mesmo processo em que ela foi proferida.
Excepcionalmente, o recurso pode não ser um ato de parte, senão do
ofendido, que venha ao processo como assistente não habilitado,
exclusivamente para recorrer. O que não se pode admitir é tratar como
recurso – em sentido próprio – os chamados reexames necessários (no
nosso sistema, ainda denominados recurso de ofício), previstos no art.
574 do CPP.3

Sinteticamente, a doutrina divide os recursos propriamente dito em dois


grupos: os recursos ordinários e os recursos extraordinários.

“Recursos ordinários: são aqueles que têm por objeto provocar um novo
exame (total ou parcial) do caso penal já decidido em primeira instância,
por um órgão superior (ad quem), alcançando tanto as matérias de
direito como também fáticas, com possibilidade de decisão sobre a
determinação dos fatos, sua tipicidade, a prova, dosimetria da pena etc.
Exemplo típico de recurso ordinário é a apelação, do art. 593 do CPP.


3
LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 16ª Edição. Editora Saraiva, 2019.

Recursos extraordinários: onde os tribunais superiores entram no


exame, unicamente, da aplicação da norma jurídica efetuada pelo órgão
inferior, sendo assim um juízo limitado ao aspecto jurídico da decisão
impugnada. Em última análise, limitam a discussão a questões de
direito, expressamente previstas em lei. São exemplos o recurso
especial (art. 105, III, da Constituição) e o recurso extraordinário (art.
102, III, da Constituição).”4

O rol extenso destes mecanismos (tanto de recurso como de ação


autônoma) possibilita um “amplo exercício do direito ao processo, do
direito à proteção da Justiça, da tutela do direito”5, e garante ao sujeito
que sua irresignação seja atendida por órgão colegiado. Em
contrapartida, incrementa a morosidade do judiciário e deturpa a
finalidade da pena, vez que o seu cumprimento, por diversas das vezes,
apenas se inicia anos depois do cometimento da infração penal.

Há movimento por parte de setores da sociedade que pretende limitar


os recursos no âmbito do direito processual penal. Este movimento atua
em duas vertentes: primeira vertente vem no sentido de pretender
dotar de eficácia, desde logo, a sentença do juiz em primeiro grau.
Segunda vertente pretende dotar de eficácia imediata os julgamentos
dos Tribunais, sem que haja necessidade de se aguardar o trânsito em
julgado.
A primeira vertente mostra-se inconstitucional e inconvencional.
Inconstitucional por violar a presunção de inocência (art. 5.º, LVII, da
CF) e inconvencional por violar o Pacto de São José da Costa Rica (art.
8, 2, caput).
Ora, a antecipação da execução da pena mostra-se violadora da
presunção de inocência na medida em que o acusado deve ser tratado
como inocente até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória. Qualquer prisão antes do trânsito em julgado é prisão
processual e, como tal, demanda motivação adequada. (...)
A segunda vertente, com todo o respeito das posições em contrário,
apresenta-se como a manifestação mais pura do punitivismo penal e de
como muitas vezes achamos que estamos trabalhando contra a
impunidade quando, na verdade, trabalha-se apenas com o mais puro
sentimento de vingança e de ilusão de eficiência.


4
LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 13ª ed. Editora Saraiva. p.1122.
5
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21ª ed. Atlas. p. 403.

Pretende-se nesta segunda vertente que os julgados proferidos pelos
Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais sejam executados
imediatamente, sem necessidade de trânsito em julgado. Não
bastassem as críticas anteriormente feitas, tem-se aqui a crítica da
mudança de todo o sistema que gera tão somente ilusão de eficiência.6

Apesar da pretensão constante que surge em limitar os recursos no


processo penal com a finalidade de “desafogar” judiciário, deve ser feito
um sopesamento entre a vontade de recorrer manifestada pelo réu e/ou
seu defensor, o princípio do duplo grau de jurisdição e também da
presunção de inocência do réu, motivo pelo qual a doutrina explica que
“a liberdade individual ameaçada pela sanção penal deve prevalecer
sobre a busca da realização de uma Justiça célere e ágil.”7
No intuito de desafogar o judiciário, porém, sem retirar os recursos
previstos no ordenamento jurídico, foram implementados diversos
institutos, tais como a criação de súmulas, sejam vinculantes ou não,
recursos repetitivos, assunção de competência, e, agora, com o novo
Código de Processo Civil, os incidentes de resolução de demandas
repetitivas.
A força normativa destes institutos tem sido relevantes no processo
penal. Tanto que no que tange aos incidentes de resolução de demandas
repetitivas (do CPC), o STF decidiu em sede de repercussão geral (RE
966177) sobre a possibilidade de sua aplicação nos casos processuais
penais, com a suspensão (das ações penais com réu solto) do prazo
prescricional em processos penais sobrestados.
Observa-se, com isso, que existem meios próprios no ordenamento
jurídico que podem ser utilizados pelo judiciário afim de abater a
quantidade de recursos interpostos, ou pelo menos para facilitar no
julgamento, por isso, torna-se desnecessário impor obstáculos e
suprimir os direitos de recorribildiade das partes. Nos dizeres do
Guilherme Madeira:

Precisamos ser maiores do que ambos estes sentimentos que tanto mal
causam ao direito. Não podemos sucumbir seja ao senso comum, seja a
tentações autoritárias. Um dos grandes problemas da efetividade da
justiça está no escasso material humano nos tribunais (e na sua, por
vezes, má utilização). Precisamos alterar o modelo de administração.


6
DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal. 2ª ed. RT, 2018.
7
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21ª ed. Atlas. p. 403

Esta alteração de recursos humanos irá gerar alteração na produtividade
e, isto sim, irá atuar de maneira eficaz contra a impunidade. Tentações
punitivistas e autoritárias são, no fundo, apenas isso mesmo, ou seja,
ilusões de justiça e concretude de vingança.8

b.2. Natureza jurídica dos recursos

Quanto à natureza jurídica dos recursos, Hélio Tornaghi entende que há


três definições:
a) desdobramento do direito de ação dentro do mesmo processo
b) ação nova dentro do mesmo processo
c) qualquer meio destinado a obter a reforma de uma decisão9.

A maioria doutrinária compreende o recurso como um direito de ação


dentro do mesmo processo, o que os diferencia das ações autônomas de
impugnação10. Nesse sentido, é o entendimento de Aury Lopes Jr:

Recurso vincula-se à ideia de ser um meio processual através do qual a


parte que sofreu o gravame solicita a modificação, no todo ou em parte,
ou a anulação de uma decisão judicial ainda não transitada em julgado,
no mesmo processo em que ela foi proferida. Excepcionalmente, o
recurso pode não ser um ato de parte, senão do ofendido, que venha ao
processo como assistente não habilitado, exclusivamente para recorrer.
O que não se pode admitir é tratar como recurso – em sentido próprio –
os chamados reexames necessários (no nosso sistema, ainda
denominados recurso de ofício), previstos no art. 574 do CPP (...) Os
recursos são uma continuidade da pretensão acusatória ou da
resistência defensiva, conforme a titularidade de quem o exerça. Assim,
o recurso interposto pelo Ministério Público não instaura uma nova
situação jurídica processual, um novo processo, senão que constitui uma
continuidade do exercício da pretensão acusatória. Quanto à defesa, o
recurso é um importante instrumento de resistência, na busca de uma
sentença favorável. Isso porque é o processo um instrumento de
satisfação jurídica de pretensões e resistências, de modo que, enquanto
não houver o provimento jurisdicional definitivo (o trânsito em julgado),


8
Op. cit. p. 432.
9
Apud DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal.
10
“Quanto à natureza jurídica dos recursos, deve-se ter presente a distinção entre eles e as ações
autônomas de impugnação (revisão criminal, habeas corpus e mandado de segurança), pois, ao contrário
delas, os recursos não são “ações processuais penais”, não instaurando uma nova situação jurídica
processual. Os recursos são uma continuidade da pretensão acusatória ou da resistência defensiva,
conforme a titularidade de quem o exerça”. (LOPES Jr., Aury. 2019)

o que se tem é a utilização de instrumentos legais para obtenção da
sentença favorável pretendida por cada uma das partes.11

b.3. Efeitos dos recursos

Quanto aos efeitos dos recursos processuais penais, estes podem


possuir efeito suspensivo, devolutivo, iterativo, misto e extensivo.

i) Efeito suspensivo
O recurso que possui efeito suspensivo tem o condão de suspender a
eficácia da decisão da qual se recorre, não permitindo que se irradie
efeitos na constância do recurso. Se não houver recurso, com o trânsito
em julgado a decisão passa a ter efeitos.
Acerca deste efeito, o Superior Tribunal de Justiça sumulou
entendimento no sentido de que “o mandado de segurança não se
presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo
Ministério Público” (Sum. 604).

ii) Efeito devolutivo


O referido efeito se relaciona com o envio da matéria debatida para que
o órgão ad quem realize um novo julgamento sobre a matéria
impugnada.

iii) Efeito interativo ou regressivo


Há exceções em que o recurso é efetivamente devolvido a quem
prolatou a decisão, como acontece nos embargos de declaração, cujo
juiz que prolatou a decisão deverá reanalisar o que foi suscitado pelo
recorrente no recurso. Neste caso, matéria é devolvida para o juiz ou
câmara/turma esclareçam a contradição, ambiguidade, obscuridade ou
omissão constante da decisão.

iv) Efeito misto


Neste efeito, o juiz poderá reexaminar sua própria decisão e alterá-la, e
se não fizer, devolverá a matéria impugnada ao órgão superior, como o
recurso em sentido estrito e o agravo em execução.


11
LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 13ª ed. Editora Saraiva. p. 1118.

v) Efeito extensivo
Este efeito é aquele que permite a matéria se estendida aos outros réus,
como nos casos em que os agentes agem em concurso. Logo, a decisão
favorável a um dos agentes poderá ser aproveitada pelos demais,
mesmo que não tenham recorrido, desde que não sejam de cunho
exclusivamente de caráter pessoal.

b.4. Princípios recursais

No que se refere aos princípios que regem os recursos, apontam-se os


seguintes: duplo grau de jurisdição, o princípio da voluntariedade, da
disponibilidade dos recursos, da unicidade, da irrecorribilidade das
decisões interlocutórias, da taxatividade, dialeticidade e, por fim, o
princípio da proibição do reformatio in pejus.
O duplo grau de jurisdição, é, por excelência, o princípio de maior
relevância acerca dos recursos. Consiste na necessidade de reanálise da
decisão proferida no juízo a quo por um órgão diverso e
hierarquicamente superior, e que, embora não consagrado pelo texto
constitucional expressamente, tem previsão no art. 8.2, h, da
Convenção Americana de Direitos Humanos.
Acerca da efetiva aplicação do referido princípio e desta convenção,
esclarece Aury Lopes:

Os direitos e as garantias previstos na CADH passaram a integrar o rol


dos direitos fundamentais, a teor do art. 5º, § 2º, da Constituição,
sendo, portanto, autoaplicáveis (art. 5º, § 1º, da CF). Logo, nenhuma
dúvida paira em torno da existência, no sistema brasileiro, do direito ao
duplo grau de jurisdição. Recordemos, contudo, que a posição atual do
STF sobre o tema (HC 87.585/TO) é a de que a CADH ingressa no
sistema jurídico interno com status “supralegal”, ou seja, acima das leis
ordinárias, mas abaixo da Constituição.12

Os fundamentos jurídicos do duplo grau de jurisdição é baseado no


inconformismo da decisão por parte do recorrente, visando alcançar
uma decisão mais justa, e também baseado em um fundamento de
ordem subjetiva, relativo ao julgador, que é compelido a julgar de forma
mais cautelosa, sabendo que sua decisão poderá ser revista por um


12
LOPES, 2019. op. cit

órgão jurisdicional superior, perfazendo a busca do controle judicial de
todo ato estatal.
Suscita-se neste momento que, diante da relevância deste princípio,
surgiram dois grandes debates enfrentados na doutrina sobre esta
temática que merecem reflexão:
(i) a possibilidade de aplicação do duplo grau de jurisdição nos casos de
competência originária nos tribunais
(ii) a necessidade de implementação do duplo grau de jurisdição nos
acórdãos condenatórios que reformem sentenças absolutórias.
Apesar dessa garantia prevista implicitamente ou expressamente em
âmbito internacional, há, no ordenamento jurídico brasileiro, um certo
“limite” de incidência deste princípio relacionado à pessoa e função que
ocupa: as pessoas que possuem foro por prerrogativa de função não
têm direito de apelar da decisão emanada.
Apesar de não terem direito de interpor recurso de apelação e de
exercerem o duplo grau de jurisdição, não significa que não terão direito
de recorrer. A questão que se coloca em pauta é de que aqueles que
possuem foro de prerrogativa de função poderão recorrer, no entanto,
não incidirão nestes recursos interpostos o duplo grau de jurisdição. Ou
seja, poderão interpor recursos de direito apenas, que não se prestam
ao direito da parte, mas à uniformização das interpretações das leis.
Ou seja, estes acusados poderão se socorrer, por exemplo, dos
embargos de declaração e do Recurso extraordinário, no entanto, estes
recursos não dão concretude ao duplo grau de jurisdição, vez que não
devolvem a matéria fática, de direito e probatória ao Supremo Tribunal
Federal.
De toda forma, é conveniente ressaltar que o sujeito com foro por
prerrogativa de função é julgado originariamente pelos Tribunais, ou
seja, por um órgão colegiado dotado de maior experiência, em tese, que
o juiz de primeira instância. E por ser um órgão colegiado, a falibilidade
humana já é mitigada com relação àqueles casos julgados em primeira
instância.
Ademais, pelo fato da Constituição Federal ter silenciado acerca do
cabimento de recursos ordinários nos casos de competência originária
dos Tribunais, por mais que haja previsão na Convenção Americana, não
poderia o direito infraconstitucional institui recursos provenientes de
análise probatória aos que possuem foro por prerrogativa.
Por fim, a despeito da controvérsia entre os Ministros, acabou
prevalecendo a orientação de que o conhecimento dos embargos

infringentes atenderia à exigência do duplo reexame constante do Pacto
de São José da Costa Rica.
O Princípio da Fungibilidade, que permite ao juiz conhecer o recurso
mesmo quando a parte apresentar um recurso distinto do que seu
provimento jurisdicional determinava (exceto nos casos de má-fé),
fundamenta-se no art. 579 do Código de Processo Penal: “salvo hipótese
de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso
por outro. Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a
impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará processá-lo de
acordo com o rito do recurso cabível”.
Este princípio está relacionado estritamente com o da
unirrecorribilidade, pois para este último, em todo o ordenamento
jurídico, a regra é que para cada decisão, apenas um único recurso é
cabível, de forma a evitar que uma única decisão enseje a interposição
de vários recursos. Ressaltando que, em regra, as decisões
interlocutórias não são passíveis de recurso, com exceção das hipóteses
previstas em legislações especiais e no recurso em sentido estrito. Por
serem irrecorríveis, podem ser alegadas como preliminares nos recursos
de apelação quando não preclusas e quando prejudicarem o recorrente.
Por fim, dentre esta lista de princípios, expõe-se o da proibição da
reformatio in pejus e permissão da reformatio in mellius. Conforme
preconiza o art. 617 do Código de Processo Penal: “o tribunal, câmara
ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e
386, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena,
quando somente o réu houver apelado da sentença”, diante disso,
determina-se que situação do réu não poderá ser agravada por um
recurso exclusivo da defesa, e nem mesmo poderão conhecer matérias
cognoscíveis de ofício como as nulidades absolutas para prejudicar o
réu.
Por fim, dentre esta lista de princípios, expõe-se o da proibição da
reformatio in pejus e permissão da reformatio in mellius.
A proibição da reformatio in pejus direta encontra fundamento no art.
617 do Código de Processo Penal: “o tribunal, câmara ou turma
atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 386, no
que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando
somente o réu houver apelado da sentença”, diante disso, determina-se
que situação do réu não poderá ser agravada por um recurso exclusivo
da defesa, e nem mesmo poderão conhecer matérias cognoscíveis de
ofício como as nulidades absolutas para prejudicar o réu.

O ordenamento jurídico não tem regra expressa, quer admitindo, quer
vedando, a reformatio in pejus indireta. Explica Badaró:

A reformatio in pejus indireta é a modificação da decisão recorrida, para


pior, mas numa comparação que se dá entre duas decisões que foram
intermediadas por um ato anulatório do primeiro termo da comparação.
Mais especificamente, é a comparação, como paradigma, de uma
decisão inicial que será posteriormente anulada, por força de recurso
exclusivo do acusado (primeiro acordão, que representa decisão
intermediária), em comparação com a nova decisão que substitui a
anteriormente anulada, ou mesmo o acórdão posterior que dela decorra.
Exemplificativamente, o acusado foi condenado em primeiro grau, a
uma pena de 3 anos de reclusão. Somente a defesa apela, alegando um
error in procedendo. O tribunal dá provimento ao recurso, anula o
processo desde o ato viciado e, consequentemente, a sentença
condenatória, determinado o retorno do processo a primeiro grau.
Depois de retomado o seu curso de forma regular, nova sentença
condenatória é proferida, desta vez, condenado o acusado a uma pena
de 4 anos de reclusão. Como facilmente se percebe, o prejuízo será
indireto: somente resultando da comparação da primeira sentença, não
com o resultado o julgamento da apelação (que anulou a sentença),
mas com a segunda sentença, que também condenou o acusado, mas a
uma pena maior. Aliás, neste exemplo, o julgamento do recurso em si
considerado, isto é, diretamente, não prejudica o recorrente. Ao
contrário, anulando a decisão condenatória, melhora-se a situação do
acusado. Entretanto, o acórdão, ao possibilitar que seja proferida uma
nova sentença, acabou por permitir que o recorrente sofresse uma pena
mais grave que a imposta no primeiro julgamento. Tem prevalecido,
corretamente, o posicionamento que veda a reformatio in pejus indireta.

O problema da admissão ou não de reformatio in pejus indireta


apresenta peculiaridades, em duas situações: (1) os recursos contra
decisões do tribunal do júri; (2) os recursos que anulam decisões de
órgãos jurisdicionais constitucionalmente incompetentes.

A proibição da reformatio in pejus indireta no Tribunal do Júri


No caso do julgamento do Tribunal do Júri, a particularidade que dá
colorido especial ao problema da reformatio in pejus indireta é a
soberania dos veredictos. Se a decisão do primeiro Tribunal do Júri, que
veio a ser posteriormente anulada, tivesse o efeito de limitar a decisão

do segundo Tribunal do Júri, a posição do primeiro Conselho de
Sentença, ainda que anulada, estaria a limitar a decisão do segundo
Conselho de Sentença. Este, portanto, não seria soberano, mas, ao
contrário, estaria em posição de sujeição ao primeiro. Por exemplo, no
primeiro julgamento, o acusado foi condenado, por homicídio
qualificado, a 14 anos de reclusão. Apelou por ser a condenação
manifestamente contrária à prova dos autos. O tribunal de justiça deu
provimento ao recurso e mandou o apelante a novo julgamento. Nesta
segunda sessão de julgamento, o Tribunal Popular não poderia condená-
lo a mais de 14 anos, embora a pena para o homicídio qualificado fosse
de 12 a 30 anos. Tem prevalecido o entendimento de que, no caso de
julgamentos pelo Tribunal do Júri, não se aplica a vedação da reformatio
in pejus indireta. Se a proibição vigorasse, balizando a segunda
sentença, os jurados do segundo julgamento ficariam vinculados à
decisão proferida no primeiro julgamento, tendo afetada sua soberania
dos veredictos, assegurada constitucionalmente (CR, art. 5.º, XXXVIII,
c). Consequentemente, no segundo julgamento, não se aplicando a
vedação da reformatio in pejus indireta, a pena poderá ser maior ou
mais grave do que a pena imposta no primeiro julgamento, mas que
acabou sendo anulado em razão do provimento de recurso exclusivo da
defesa. Não é a melhor solução. A resolução da questão não pode se
basear num tudo ou nada. Se o elemento complicador é a soberania dos
veredictos, é necessário que se distinga, na sentença subjetivamente
complexa do Tribunal do Júri, qual matéria é de competência dos
Jurados – e, portanto, acobertada pela soberania – e qual matéria é de
competência do juiz-presidente – despida, pois, do atributo da
soberania. Como aos jurados cabe decidir sobre a existência do crime,
incluindo qualificadora, e a autoria delitiva, somente no tocante ao que
for decidido sobre estas questões, a soberania dos veredictos poderá ser
justificativa para a não aplicação da vedação da reformatio in pejus. Por
outro lado, como a fixação da pena, dentro dos limites mínimo e
máximo cominados ao delito, é matéria afeta ao juiz-presidente, e não
aos jurados, em tal aspecto deve ser vedada a reformatio in pejus
indireta. Além disso, eventual problema de soberania dos veredictos
somente poderá surgir, se a decisão dos jurados do primeiro julgamento
for diferente da do segundo julgamento, sendo esta mais gravosa. Por
exemplo, no primeiro julgamento foi excluída a qualificadora, sendo o
acusado condenado por homicídio simples, e no segundo, tenha sido
mantida a qualificadora. Se a decisão dos jurados for igual em ambos os
julgamentos (p. ex.: homicídio simples e homicídio simples; ou

qualificado e qualificado), não haverá nenhum prejuízo à soberania dos
veredictos, devendo ser aplicada a vedação da reformatio in pejus
indireta.85 Assim, por exemplo, se no primeiro julgamento houve
condenação por homicídio simples (fixada a pena em 8 anos de
reclusão), e no segundo julgamento os jurados também reconheceram o
homicídio simples, o juiz-presidente, ao fixar a pena no segundo caso,
não poderá impor pena mais grave que a do primeiro julgamento (p.
ex.: poderá fixá-la entre o mínimo abstrato de pena, de 6 anos, e o teto
estabelecido no primeiro julgamento, de 8 anos) anulado em virtude de
recurso da defesa. A proibição da reformatio in pejus no Tribunal do
Júri, somente não poderá ser aplicada, no caso de veredictos diversos,
sendo o segundo mais severo. Por exemplo, se pronunciado por
homicídio qualificado, houve condenação por homicídio simples, fixada a
pena em 6 anos, tendo os jurados respondido negativamente ao quesito
da qualificadora, mas o julgamento foi anulado, em recurso exclusivo da
defesa. Nesse caso, no segundo julgamento, se os jurados acolherem a
qualificadora, poderá surgir o problema da soberania dos veredictos,
porque a pena mínima para o homicídio qualificado é de 12 anos, não
poderá o juiz-presidente impor pena inferior a tal limite, para que a
soberania dos veredictos seja respeitada. Ao decidirem que o crime foi
de homicídio qualificado, os jurados estão aceitando – e isso costuma
ser sempre explorado em plenário – que a pena mínima será de 12 anos
de reclusão. E nesse ponto, são soberanos. Todavia, neste caso, entre
os limites mínimo e máximo de pena, isto é, de 12 a 30 anos, caberá a
fixação da pena em concreto ao juiz-presidente, que não é soberano, e
a quem cabe considerar as circunstâncias judiciais e as circunstâncias
agravantes e atenuantes. Logo, neste caso, a forma de conciliar a
soberania dos veredictos, com a proibição da reformatio in pejus, na
medida em que poderá ser aplicada, será determinado que a pena se
aproxime, ao máximo, do teto do primeiro julgamento, no caso, 12
anos.

A proibição da reformatio in pejus indireta no caso de nulidade


por juiz constitucionalmente incompetente
Outra situação em que a questão da proibição da reformatio in pejus
indireta apresenta acesa controvérsia é na hipótese em que o processo
foi anulado por incompetência constitucional. Tem prevalecido o
entendimento de que, em tal situação, não há a proibição de reforma
para pior, de modo indireto. O fundamento para que não se considere
haver o óbice é que a decisão anterior, que serviria para fixar o teto da

pena, não seria simplesmente nula, mas inexistente. A incompetência
constitucional acarretaria a violação da garantia do juiz natural, que
seria um pressuposto de existência do processo. Sendo inexistente o
processo, igualmente inexiste a coisa julgada, não se podendo cogitar
de imutabilidade da sentença quanto ao limite máximo da pena.90
Discorda-se de tal premissa. A violação da garantia do juiz natural apta
a gerar a inexistência do processo é aquela decorrente da falta de
investidura, o que se verifica no caso de tribunais de exceção (CR, art.
5.º, caput, XXXVII). Já no caso de um juiz incompetente, ainda que
constitucionalmente incompetente, há investidura. A investidura é
pressuposto de existência do processo, mas a incompetência, mesmo
absoluta e violando critério constitucional, acarreta nulidade. O juiz
competente é pressuposto de validade do processo, e não de sua
existência. Assim sendo, a sentença proferida pelo juiz
constitucionalmente incompetente será absolutamente nula, mas não
inexistente. Sendo nula – ao invés de inexistente – a sentença, poderá,
assim como nos demais casos, gerar o efeito de fixar o teto de pena
para o segundo julgamento, sob pena de caracterizar reformatio in
pejus indireta. Em suma, a vedação da reformatio in pejus indireta
também se aplica em casos de incompetência constitucional.13

Parte da jurisprudência tem admitido a reformatio in mellius para o


acusado que, na verdade, é uma reformatio in pejus para o Ministério
Público, isso porque encontramos um caráter parcial da vedação do art.
617 do CPP.
Há que sustente que erros materiais do dispositivo da sentença podem
ser alterados em qualquer circunstância, mesmo que em face de recurso
exclusivo da defesa, por exemplo, erro de cálculo do juiz na soma da
pena.

c. Legislação

- Constituição Federal, art. 5º, LV, LXVIII e LXIX


- Constituição Federal, art. 102 e 105
- Código de Processo Penal, Livro III, Título II
- STJ, Súmula 604: o mandado de segurança não se presta para atribuir
efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público.


13
BADARÓ. op. cit.

- STF, súmula 602: Nas causas criminais, o prazo de interposição de
recurso extraordinário é de 10 (dez) dias.
- STF, súmula 705: A renúncia do réu ao direito de apelação,
manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento
da apelação por este interposta.
- STF, súmula 707: Constitui nulidade a falta de intimação do
denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da
rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.
- STF, súmula 708: É nulo o julgamento da apelação se, após a
manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi
previamente intimado para constituir outro.
- STF, súmula 709: Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o
acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde
logo, pelo recebimento dela.
- STF, súmula 710: No processo penal, contam-se os prazos da data da
intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta
precatória ou de ordem.

d. Julgados/Informativos

Informativo STJ nº 626: Extinção de medida socioeducativa de


liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade. Decisão
favorável ao menor infrator. Não unânime. Complementação de
julgamento. Artigo 942 do CPC/2015. Inaplicabilidade. Procedimento
mais gravoso que o adotado no processo criminal. Afronta às normas
protetivas que regem o ECA.
A questão posta em deslinde está em definir se a técnica de
complementação de julgamento nas decisões colegiadas não unânimes
de segunda instância, prevista no art. 942 do CPC/2015, é cabível nos
casos em que o decisum for favorável ao menor, tendo em vista o
princípio do favor rei. Inicialmente, cumpre afirmar que o sistema
recursal da lei processual civil é aplicável aos procedimentos afetos à
Justiça da Infância e da Juventude, inclusive os relativos à execução das
medidas socioeducativas, nos termos do artigo 198 do Estatuto da
Criança e do Adolescente. E, no caso de decisão não unânime em
segunda instância, a lei processual civil vigente ao tempo da edição do
Estatuto Menorista previa o cabimento de embargos infringentes,
medida processual que também era induvidosamente aplicável aos
procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude. Com o
advento da Lei nº 13.105/2015, foi editado novo Código de Processo

Civil que, no artigo 942, ao tempo em que extinguiu os embargos
infringentes, adotou técnica de complementação de julgamento nas
decisões colegiadas não unânimes de segunda instância com o propósito
de atender aos reclamos de maior efetividade e celeridade no processo.
É cediço que doutrina e jurisprudência são unívocos em assegurar ao
menor infrator os mesmos direitos de que gozam os penalmente
responsáveis perante a justiça criminal, admitindo, inclusive, a aplicação
subsidiária do Código de Processo Penal, nos termos do artigo 152 do
Estatuto da Criança e do Adolescente. Registre-se, também, que nos
procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude não há
pretensão punitiva estatal, nem reprimenda de natureza criminal, mas a
jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça vem admitindo uma
inegável natureza sancionatória das medidas socioeducativas. Assim,
ainda que não se trate de processo criminal regido pela proibição de
reformatio in pejus e, conquanto que não se cuide de recurso ou meio
autônomo de impugnação, em estando o menor infrator sujeito a
medida socioeducativa de natureza inegavelmente sancionatória, é
incabível a complementação do julgamento segundo a técnica do artigo
942 do novo Código de Processo Civil quando em prejuízo do menor. Se
a decisão não unânime for favorável ao menor infrator, a
complementação do julgamento nos termos analisados, com a eventual
modificação do julgado em prejuízo do menor implicaria, em última
análise, em impingir ao menor infrator tratamento mais gravoso que o
atribuído ao réu penalmente imputável já que os embargos infringentes
e de nulidade previstos na legislação processual penal (art. 609, Código
de Processo Penal) somente são cabíveis na hipótese de o julgamento
tomado por maioria prejudicar o réu, por se tratar de recurso exclusivo
da defesa. Dessa forma, se não se admite revisão pelo mesmo colegiado
de acórdão não unânime favorável ao réu punido com pena de natureza
repressiva e punitiva, com maior razão não se pode admitir incidente
processual que produz efeitos semelhantes ao menor cuja reprimenda,
apesar da carga sancionatória, possui natureza preventiva e
reeducativa. REsp 1.694.248-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis
Moura, por unanimidade, julgado em 03/05/2018, DJe 15/05/2018

Informativo STF nº 866: O Plenário do Supremo Tribunal Federal


(STF), por maioria de votos, decidiu que é possível a suspensão do
prazo prescricional em processos penais sobrestados em decorrência do
reconhecimento de repercussão geral. Conforme os ministros, a
suspensão se aplica na ação penal, não se implementando nos

inquéritos e procedimentos investigatórios em curso no âmbito do
Ministério Público, ficando excluídos também os casos em que haja réu
preso. O Plenário ressalvou ainda possibilidade de o juiz, na instância de
origem, determinar a produção de provas consideradas urgentes. A
decisão se deu no julgamento de questão de ordem no Recurso
Extraordinário (RE) 966177, na sessão desta quarta-feira (7). Os
ministros definiram que o parágrafo 5º do artigo 1.035 do Código de
Processo Civil (CPC), segundo o qual uma vez reconhecida a
repercussão geral, o relator no STF determinará a suspensão de todos
os processos que versem sobre a questão e tramitem no território
nacional, se aplica ao processo penal. Ainda segundo o Tribunal, a
decisão quanto à suspensão nacional não é obrigatória, tratando-se de
uma discricionariedade do ministro-relator. A suspensão do prazo
prescricional ocorrerá a partir do momento em que o relator
implementar a regra prevista do CPC. O RE 966177 foi interposto pelo
Ministério Público do Rio Grande do Sul contra decisão do Tribunal de
Justiça local que considerou atípica a exploração de jogos de azar,
prevista na Lei das Contravenções Penais (Lei 3.688/1941). O tema foi
considerado de repercussão geral pelo STF em novembro de 2016. A
questão de ordem suscitada pelo Ministério Público Federal (MPF) e
levada a julgamento pelo relator, ministro Luiz Fux, tem como objeto a
suspensão do prazo de prescrição enquanto o tema não é apreciado em
definitivo pelo STF. Na sessão desta quarta-feira (7), o ministro Luiz
Fux, a partir das propostas surgidas nos debates durante o julgamento,
reajustou questões pontuais em voto proferido na quinta-feira (1º). Ele
avaliou que a aplicação da suspensão do trâmite dos processos deve ser
discricionária ao relator da causa no STF. Segundo seu entendimento, a
partir da interpretação conforme a Constituição do artigo 116, inciso I,
do Código Penal – até o julgamento definitivo do recurso paradigma pelo
Supremo – o relator pode suspender o prazo de prescrição da pretensão
punitiva relativa a todos os crimes objeto de ações penais que tenham
sido sobrestadas por vinculação ao tema em questão. O relator
consignou ainda que cabe ao juiz da ação penal a prática de atos
urgentes no período da suspensão. Além disso, a suspensão da
prescrição só ocorre a partir do momento em que o processo é suspenso
pela sistemática da repercussão geral. “Entendo ainda que o juiz de piso
[da origem], mesmo com o processo suspenso, pode decidir com relação
a prisão”, ressaltou. Divergências Os ministros Edson Fachin e Marco
Aurélio foram os únicos a divergir do voto do relator e rejeitaram a
questão de ordem. Para Fachin, impor barreiras ao fluxo do prazo

prescricional legalmente estabelecido significa ampliar o poder punitivo
estatal, o que só pode ocorrer, segundo o ministro, por edição de lei. “À
mingua de uma previsão legal em sentido formal, a suspensão do fluxo
do lapso temporal prescricional não pode ocorrer”, destacou. Segundo o
ministro Marco Aurélio, a possibilidade de suspensão da jurisdição no
território brasileiro mediante ato individual de ministro é conflitante com
o inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, pois inviabiliza o
processo e sua tramitação. Ainda segundo seu entendimento, o artigo
1.035, parágrafo 5º, do CPC não pode ser aplicado ao processo penal.
“O processo-crime pressupõe instrução e há elementos a serem
coligidos que podem se perder no tempo, principalmente quando se
esperará o julgamento do recurso extraordinário em que admitida a
repercussão geral pelo Plenário do Supremo”, ponderou. O ministro
posicionou-se ainda em seu voto pela inconstitucionalidade do parágrafo
5º do artigo 1.035 do CPC. Processos relacionados RE 966177.

Ementa: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO


RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA EM CURSO NO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ART.
121, § 2º, IV, DO CÓDIGO PENAL - CP. 1) INDEVIDA APLICAÇÃO DA
SÚMULA N. 568 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. NÃO
VERIFICAÇÃO. JULGAMENTO DE AGRAVO REGIMENTAL QUE SANA
EVENTUAL VÍCIO. 2) VIOLAÇÃO A DISPOSITIVOS OU PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE DESCABIDA EM SEDE DE RECURSO
ESPECIAL. 3) VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 619 E 620 DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL - CPP PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. OMISSÃO SOBRE
INÉPCIA DA DENÚNCIA, FALTA DE JUSTA CAUSA PARA AÇÃO PENAL E
INVIABILIDADE DO REFAZIMENTO DE PROVAS. PRETENSÃO DE
REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. 3.1) OMISSÃO SOBRE NULIDADE DE
PROVA PERICIAL PRODUZIDA NO INQUÉRITO CONSTATADA.
PREQUESTIONAMENTO CONFORME ART. 1.025 DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL - CPC. TESE DEFENSIVA DE VIOLAÇÃO LEGAL
ANALISADA NESTA CORTE. 3.2) OMISSÃO SOBRE RECEBIMENTO
PARCIAL DA DENÚNCIA PARA RECONHECER HOMICÍDIO PRIVILEGIADO
OU ATENUANTES (ART. 65, III, C, ÚLTIMA PARTE, E ART. 66, AMBOS
DO CP). AUSENTE PREJUÍZO, CONFORME ART. 563 DO CPP.
CAPITULAÇÃO JURÍDICA QUE NÃO INFLUENCIA NA REGRA DE
COMPETÊNCIA E NO RITO PROCEDIMENTAL. RÉU QUE SE DEFENDE DOS
FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA. 3.3) CONTRADIÇÃO.
INOCORRÊNCIA. DIVERGÊNCIA ENTRE VOTOS EM JULGAMENTO

COLEGIADO. 4) VIOLAÇÃO AO ARTIGO 6º, CAPUT, DA LEI N. 8.038/90,
E AO ARTIGO 414 DO CPP. INOCORRÊNCIA. ÓBICE DO REVOLVIMENTO
FÁTICO-PROBATÓRIO, VEDADO CONFORME SÚMULA N. 7 DO STJ. 4.1)
RECURSO ESPECIAL QUE NÃO SE CONFUNDE COM RECURSO DE
APELAÇÃO OU RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. AÇÃO PENAL
ORIGINÁRIA. AUSÊNCIA DE DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. 5)
VIOLAÇÃO AO ART. 395, III, DO CPP. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ÓBICE DO REVOLVIMENTO FÁTICO-
PROBATÓRIO, VEDADO CONFORME SÚMULA N. 7 DO STJ. 6) VIOLAÇÃO
AOS ARTIGOS 41 E 395, I, AMBOS DO CPP. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO
DEMONSTRADA. 7) VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 6º, I, II e VII, 157,
CAPUT, e § 1º, e 158, TODOS DO CPP. IRREGULARIDADES NA FASE
INVESTIGATIVA. NÃO CONTAMINAÇÃO DA AÇÃO PENAL. ELEMENTOS
QUE DEVEM SER RENOVADOS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO. 8)
PEDIDO PARA ATRIBUIR EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO ESPECIAL.
PREJUDICADO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE URGÊNCIA E DE
PLAUSIBILIDADE JURÍDICA. 9) PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL EM
AGRAVO REGIMENTAL. ARTIGO 159 DO REGIMENTO INTERNO DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RISTJ. 9.1. APLICAÇÃO ANALÓGICA
DO ART. 610, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP, DESCABIDO. 10) AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Cumpre destacar que não há que se falar
em ofensa ao princípio da colegialidade em razão do julgamento
monocrático do recurso especial. Isso porque, nos termos da súmula
568, desta Corte, "o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal
de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver
entendimento dominante acerca do tema". 1.1. "A decisão monocrática
proferida por Relator não afronta o princípio da colegialidade e
tampouco configura cerceamento de defesa, ainda que não viabilizada a
sustentação oral das teses apresentadas, sendo certo que a
possibilidade de interposição de agravo regimental contra a respectiva
decisão, como ocorre na espécie, permite que a matéria seja apreciada
pela Turma, o que afasta absolutamente o vício suscitado pelo
agravante" (AgRg no HC 485.393/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, DJe 28/3/2019). 2. "A violação de preceitos, de
dispositivos ou de princípios constitucionais revela-se quaestio afeta à
competência do Supremo Tribunal Federal, provocado pela via do
extraordinário; motivo pelo qual não se pode conhecer do recurso
especial nesse aspecto, em função do disposto no art. 105, III, da
Constituição Federal" (AgRg no REsp 1759904/SP, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJe 26/11/2018) 3. Sem a

demonstração das hipóteses de cabimento, escorreita a rejeição dos
embargos de declaração pelo Tribunal de origem, notadamente quando
o embargante pretende a rediscussão da questão controvertida para
modificar o provimento anterior. 3.1. Conforme artigo 1.025 do Código
de Processo Civil - CPC, considerada existente omissão, tem-se o
prequestionamento que, via de regra, permite a análise da violação
legal, inexistindo razão para retorno do feito à origem para novo
julgamento dos embargos de declaração. 3.2. A omissão sobre o
recebimento parcial da denúncia constatada no julgamento dos
embargos de declaração pelo Tribunal de origem não ensejou prejuízo
ao agravante (art. 563 do CPP) apto a determinar novo julgamento dos
embargos de declaração, porque a pretensão deduzida na origem foi de
emendatio libelli, medida que excepcionalmente se admite na fase de
recebimento da denúncia em casos de alteração de competência ou de
rito procedimental, o que não é a hipótese dos autos. 3.3. Não há
também contradição no julgado, uma vez que esta só se configura entre
as proposições da própria decisão, ou seja, entre os elementos que
compõem a estrutura do decisum, não podendo ser estendida aos
dizeres dos julgadores quando do julgamento no colegiado. 4. O pleito
de improcedência da acusação, previsto no art. 6º, caput, in fine, da Lei
n. 8.038/90, foi rechaçado pelo Tribunal de origem porque somente é
cabível se a decisão não depender de outras provas, conforme expressa
previsão legal, sendo certo que para se concluir pela improcedência da
acusação nesta Corte seria necessário o revolvimento fático-probatório,
vedado conforme Súmula n. 7/STJ. 4.1. Cabe ressaltar que a ação penal
originária, decorrente do foro especial por prerrogativa de função, não
conta com o duplo grau de jurisdição, motivo pelo qual é descabido
julgamento do recurso especial como se tratasse de um recurso em
sentido estrito ou recurso de apelação. 5. A falta de justa causa para a
ação penal foi rechaçada por maioria pelo Tribunal de origem porque
presentes indícios de autoria e materialidade, notadamente diante do
evento morte da vítima e da fundada dúvida sobre a autoria apta a
configurar o delito de homicídio ou suicídio, sendo certo que para se
concluir de modo diverso seria necessário o revolvimento fático-
probatório, vedado conforme Súmula n. 7/STJ. 6. "Nos termos da
jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, não há como reconhecer
a inépcia da denúncia se a descrição da pretensa conduta delituosa foi
feita de forma suficiente ao exercício do direito de defesa, com a
narrativa de todas as circunstâncias relevantes, permitindo a leitura da
peça acusatória a compreensão da acusação, com base no artigo 41 do

Código de Processo Penal" (RHC 46.570/SP, Rel. Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 20/11/2014, DJe
12/12/2014). 7. Eventuais irregularidades ocorridas na colheita de
provas durante a fase investigativa não contaminam a ação penal,
momento em que os elementos colhidos devem ser renovados sob o
crivo do contraditório. 8. Pedido de efeito suspensivo ao recurso especial
veiculado nas razões do agravo regimental fica prejudicado pela perda
do objeto com o julgamento do agravo regimental que põe fim ao feito.
Ainda que se entenda por cabíveis novos recursos, no caso em tela não
ficou demonstrada a urgência da medida e a plausibilidade do direito. 9.
Pedido de sustentação oral em agravo regimental descabido, conforme
art. 159 do RISTJ. 9.1. Pedido de sustentação oral em agravo
regimental por aplicação do art. 610, parágrafo único, do CPP,
descabido, porquanto o julgamento do recurso especial não se equipara
ao julgamento do recurso em sentido estrito, inclusive no âmbito de
ação penal originária. 10. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp
1737252/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA,
julgado em 25/06/2019, DJe 05/08/2019)

Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. INADEQUAÇÃO DO HABEAS


CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO ILÍCITO DE
ENTORPECENTES. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA APÓS O
EXAURIMENTO DA JURISDIÇÃO ORDINÁRIA. POSSIBILIDADE. MÃE DE
MENOR DE 12 ANOS. PRISÃO DOMICILIAR. CABIMENTO. ART. 318-A DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE QUE
IMPEÇA O DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. INTEGRIDADE FÍSICA E
EMOCIONAL DE MENOR DE IDADE. NECESSIDADE DE PROTEÇÃO.
CONSTITUCIONALISMO FRATERNO. PREÂMBULO E ART. 3º DA CF.
PARECER MINISTERIAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DA ORDEM. HABEAS
CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM, NO ENTANTO, CONCEDIDA DE
OFÍCIO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento
firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, não tem
admitido a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso
próprio, prestigiando assim o sistema recursal vigente. 2. Admite-se,
entretanto, em casos de flagrante ilegalidade, a concessão da ordem, de
ofício. Assim, embora o presente habeas corpus não possa ser
conhecido, passo à análise das teses suscitadas pela defesa, a fim de
verificar se é o caso de flagrante constrangimento ilegal hábil a justificar
a atuação, de ofício, deste Superior Tribunal de Justiça, em respeito ao
princípio constitucional da ampla defesa. 3. Caso em que, sem noticiar a

oposição de embargos declaratórios, de recurso especial ou
extraordinário, a defesa sustenta: i) a ilegitimidade da execução
provisória da pena, argumentando que o seu cumprimento só deveria
ocorrer depois do trânsito em julgado da condenação, no exaurimento
das eventuais instâncias especial e extraordinária; e ii) a possibilidade
de que a paciente, que teve sua condenação a 5 anos de reclusão em
regime inicial fechado confirmada em segundo grau, cumpra a pena em
regime domiciliar, no interesse de sua filha de 3 anos, com fundamento
no art. 318, III, do CPP. 4. O Plenário do Supremo Tribunal Federal
entende que a execução provisória de acórdão penal condenatório
proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou
extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção
de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal
(STF, HC n. 126.292, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, DJe
17/5/2016). 5. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar Habeas Corpus
coletivo n. 143.641/SP, de relatoria do Ministro RICARDO
LEWANDOWSKI, em 20/2/2018, concedeu comando geral para fins de
cumprimento do art. 318, V, do Código de Processo Penal, em sua
redação atual. No ponto, a orientação da Suprema Corte é no sentido de
substituição da prisão preventiva pela domiciliar de todas as mulheres
presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, nos
termos do art. 2º do ECA e da Convenção sobre Direitos das Pessoas
com Deficiências (Decreto Legislativo n. 186/2008 e Lei n.
13.146/2015), salvo as seguintes situações: crimes praticados por elas
mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou,
ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser
devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício. 4.
O art. 318-A do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.
13.769/2018, estabelece um poder-dever para o juiz substituir a prisão
preventiva por domiciliar de gestante, mãe de criança menor de 12 anos
e mulher responsável por pessoa com deficiência, sempre que
apresentada prova idônea do requisito estabelecido na norma (art. 318,
parágrafo único), ressalvadas as exceções legais. Todavia, naquilo que a
lei não regulou, o precedente da Suprema Corte (HC n. 143.641/SP)
deve continuar sendo aplicado, pois uma interpretação restritiva da
norma pode representar, em determinados casos, efetivo risco direto e
indireto à criança ou ao deficiente, cuja proteção deve ser integral e
prioritária. 5. A fim de proteger a integridade física e emocional da filha
menor e pela urgência que a medida requer, mister autorizar a
substituição da prisão da paciente, ainda que se tratasse de execução

provisória da pena, pela prisão domiciliar, com fundamento nos arts.
117, inciso III, da Lei de Execuções Penais e no art. 318, inciso V, do
Código de Processo Penal, com alicerce, ainda, no Preâmbulo e no art.
3º da Constituição Federal. Resgate do princípio constitucional da
fraternidade. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem, no entanto,
concedida de ofício, para conceder prisão domiciliar à paciente, sem
prejuízo da fixação de outras medidas cautelares, a critério do Juízo a
quo. (HC 487.763/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA,
QUINTA TURMA, julgado em 02/04/2019, DJe 16/04/2019).

Ementa: AÇÃO PENAL. CONSELHEIRO DE TRIBUNAL DE CONTAS


ESTADUAL. PECULATO-DESVIO. ART. 312, CAPUT, DO CP. EMISSÃO DE
PASSAGENS AÉREAS SEM FINALIDADE PÚBLICA. PRELIMINAR.
INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. EFETIVIDADE E RACIONALIDADE DO
SISTEMA PENAL. CREDIBILIDADE DA JUSTIÇA. PRORROGAÇÃO DA
COMPETÊNCIA. HIPÓTESE EXCEPCIONAL. ENCERRAMENTO DA
INSTRUÇÃO. CONCURSO DE AGENTES. PARTICIPAÇÃO. ART. 29 DO CP.
INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PRELIMINAR.
REJEIÇÃO. ISONOMIA. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE. AÇÃO PENAL
PÚBLICA. NÃO SUBMISSÃO. EFEITO EXTENSIVO. ART. 580 DO CPP.
QUESTÃO OBJETIVA. INEXISTÊNCIA. PRELIMINAR. REJEIÇÃO.
TIPICIDADE. CONFIGURAÇÃO. DOLO NATURAL. FINALISMO. ELEMENTO
ESPECIAL DO INJUSTO. DESVIO EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO.
MÁ-FÉ. IRRELEVÂNCIA. PECULATO CULPOSO. ART. 312, § 2º. DO CP.
DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PARTICIPAÇÃO.
CUMPLICIDADE. ACORDO PRÉVIO DE VONTADES. DESNECESSIDADE.
ANTIJURIDICIDADE. EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO. APLICAÇÃO
SISTEMÁTICA DO ORDENAMENTO. NÃO OCORRÊNCIA.
ARREPENDIMENTO POSTERIOR. ART. 16 DO CP. REPARAÇÃO DO DANO
POR TERCEIROS. POSSIBILIDADE. VOLUNTARIEDADE. PRESENÇA.
CRIME CONTINUADO. ART. 71, CAPUT, DO CP. SITUAÇÕES
HOMOGÊNEAS. PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVA DE DIREITOS.
INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA. ART. 47, I, DO CP. EFEITO SECUNDÁRIO DA
CONDENAÇÃO. PERDA DO CARGO. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. 1. O
propósito da presente fase procedimental é determinar se o réu atuou
com influência na conduta de funcionário público, o qual teria expedido
passagens aéreas a terceiros sem interesse público e às custas do
erário, e se essa conduta é capaz de configurar sua participação no
crime de peculato-desvio, previsto no art. 312, caput, segunda figura,
do CP, em concurso de agentes (art. 29 do CP) e em continuidade

delitiva (art. 71 do CP). 2. Em julgamentos recentes (AgRg na Apn
866/DF e Questão de Ordem na Apn 857/DF), esta Corte Especial,
reconhecendo estar entre suas prerrogativas examinar o alcance de sua
própria competência, restringiu a interpretação do art. 105, I, a, da
CF/88, delimitando sua competência penal originária exclusivamente ao
julgamento dos crimes atribuídos a Governadores e Conselheiros de
Tribunais de Contas que houvessem sido cometidos durante o exercício
do cargo e relacionados ao desempenho de referida função pública. 2.
Todavia, se a produção probatória já se encontra encerrada, com a
prolação do despacho que intima as partes para a apresentação de
alegações escritas, não haverá modificação da competência, pois as
atribuições do órgão até então competente devem ser prorrogadas,em
prestígio à efetividade e à credibilidade do sistema penal, para o exame
de mérito da acusação. 3. Essa é a circunstância verificada na hipótese
em tela, na qual a nova interpretação restritiva do art. 105, I, a, da
CF/88 é superveniente ao despacho do art. 11 da Lei 8.038/90,
devendo, assim, ser rejeitada a preliminar de incompetência absoluta,
haja vista estar configurada a excepcional causa de prorrogação da
competência desta Corte. 3. O oferecimento da denúncia, na ação penal
pública, não se submete ao princípio da indivisibilidade, razão pela qual
o não oferecimento de denúncia em relação a um dos supostos
envolvidos na prática de um crime não interfere na situação jurídica dos
demais. 4. A extensão dos efeitos de uma determinada decisão penal
favorável a um coautor ou partícipe depende de referir-se a decisão a
aspectos objetivos relativos ao fato criminoso e de a decisão afetar
substancialmente a situação do outro acusado, o que não ocorre na
hipótese em apreço, em que a rejeição da denúncia pelo TJ/RO decorreu
de aspectos pessoais. 5. O dolo exigido para a incidência do peculato-
desvio eì a consciência e a vontade definitiva de desviar a coisa
(dinheiro, valor ou qualquer outra coisa móvel) pertencente ao Poder
Público de sua finalidade. O elemento subjetivo especial do tipo ou do
injusto é o de que que se faça o desvio em proveito próprio ou alheio. 6.
No finalismo, o dolo é natural, porquanto a consciência da ilicitude
passou a ser averiguada na culpabilidade, e não mais na tipicidade. Por
essa razão, para a configuração do dolo exigido para a tipificação de
uma determinada conduta, não é necessária a demonstração da má-fé,
ou da intenção de conscientemente infringir um mandamento legal. 7.
Na hipótese concreta, ao formular os pedidos ao Presidente da
Assembleia Legislativa, o réu tinha consciência da existência de todos os
elementos objetivos e subjetivos componentes do tipo objetivo do art.

312, caput, segunda figura, do CP, e, igualmente, teve a vontade de dar
às verbas públicas aplicação diversa da que lhe é determinada, em
benefício de outrem e em atendimento a interesses privados. 8. In casu,
o réu requereu a expedição das passagens de forma consciente e
intencional, não tendo deixado desatentamente de cuidar de patrimônio
sobre o qual tinha a posse em razão do cargo, permitindo, com isso, a
prática de crime doloso por terceira pessoa, não havendo, assim,
adequação típica de sua conduta ao crime de peculato culposo. 9. A
configuração do concurso de agentes não exige a existência de acordo
prévio de vontades, o pactum sceleris, bastando que um agente saiba
que está cooperando na ação comum que resultará na violação do bem
jurídico protegido pela norma penal. 10. Para que o exercício de um
direito seja regular e exista a exclusão da ilicitude, não podem ser
ultrapassados os limites, determinados ou explícitos, com que o
ordenamento jurídico extrapenal faculta o seu exercício. Na presente
hipótese, a interpretação dada ao réu à norma interna permissiva é
abusiva e contrária aos princípios administrativo-constitucionais da
legalidade e da impessoalidade, não sendo, assim, possível o
afastamento da antijuridicidade. 11. Embora somente no peculato
culposo o ressarcimento do dano seja capaz de excluir a punibilidade, a
restituição dos valores ao erário no peculato desvio pode configurar o
arrependimento posterior. 12. A causa de diminuição de pena do
arrependimento posterior pode incidir nos crimes cometidos sem
violência ou grave ameaça à pessoa quando houver a reparação
integral, voluntária e tempestiva do dano, mesmo que realizada por
terceiros, por se tratar de circunstância objetiva que se estende a todos
os coautores ou partícipes do crime. 13. Na hipótese em exame, a
participação do réu atingiu bens jurídicos uniformes e se utilizou de
semelhante processo executório para, mediante mais de uma ação,
participar da prática de crimes de peculato-desvio, o que permite a
caracterização de sua conduta como crime continuado. 14. O cargo,
função ou mandato a ser perdido pelo funcionário público como efeito
secundário da condenação, previsto no art. 92, I, do CP, só pode ser
aquele que o infrator ocupava à época da conduta típica. 15. Ação penal
julgada procedente. (STJ, APn 629/RO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
CORTE ESPECIAL, julgado em 28/06/2018, DJe 10/08/2018)

e. Leitura sugerida

- DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal. Revista dos


Tribunais, 4ª ed. 2018.

f. Leitura complementar

- AVENA, Noberto. Processo Penal. 11ª Edição. Editora Forense, 2019.

- Aranha, Adalberto José Q. T. de Camargo. Dos recursos no processo


penal. São Paulo: Saraiva, 2010.

- BADARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais. Revista dos


Tribunais.

- BADARÓ, Gustavo Henrique. Recursos. Revista dos Tribunais, 2017.

- BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. 6ª Edição. Revista dos


Tribunais, 2018.

- BRITO, Alexis Couto de., et al. Processo Penal Brasileiro. 4ª Ed. Editora
atlas. 2019.

- CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários


consolidados e crítica jurisprudencial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

- FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. São


Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

- GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães;


FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal. 7ª edição.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

- LOPES Jr. Aury. Direito Processual Penal. 16ª Edição. Editora Saraiva,
2019.

- MANZANO, Luís Fernando de Moraes. Curso de processo penal. São


Paulo: Atlas, 2013.

- MANZANO, Luís Fernando de Moraes. Recursos nos tribunais
superiores. In: Estudos de Processo Penal. Org. ASF – Instituto de
Estudos Avançados de Processo Penal. Vários autores. São Paulo:
Scortecci, 2011, p. 266 e ss. Disponível em
http://www.institutoasf.com.br/dcms/uploads/arquivo_0711201100351
8.pdf

- MOUGENOT, Edilson. Curso de Processo Penal. 13ª Edição. São Paulo:


Saraiva, 2019

- NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução


Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

- OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal. São Paulo:


Atlas, 2017.

- TOURINHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 18ª Edição,


2018.

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