Você está na página 1de 5

Por que os jovens ignoram os dados e a história e insistem

em ser de esquerda
gazetadopovo.com.br/ideias/jovens-dados-historia-insistem-esquerda/

Nem a crise atual na Venezuela nem os regimes totalitários do século XX parecem capazes
de apagar a visão romântica que aproxima os jovens da esquerda| Foto: Marcelo
Camargo/Agência Brasil
Gazeta do Povo
[22/06/2019] [17:33]

Quase trinta anos após a queda da União Soviética, após a abertura da China e, mais
recentemente, o agravamento da crise na Venezuela, a esquerda ainda levanta bandeiras
como maior controle governamental, prevalência do Estado sobre o mercado e outras
medidas que causaram a ruína de países socialistas no último século. E os jovens ainda são
atraídos por ideologias de esquerda – não importa o quão falhas elas tenham se mostrado
ao longo da história.

Um estudo recente da Pew Research Center indica que a maioria dos adolescentes e jovens
da Geração Z têm convicções de esquerda e acreditam em um Estado maior. A Geração Z
engloba os jovens nascidos após 1996, que estão se aproximando ou entrando na vida
adulta. Em 2020 boa parte deles irá votar, o que significa que suas ideologias políticas
poderão contribuir para o cenário político.

1/5
Outra pesquisa da Pew Research Center aponta que a parcela de progressistas também
está crescendo: em 2016, 21% dos americanos se identificaram como democratas e
progressistas, o número mais alto desde 2000. Naquela época, apenas 12% do público se
descrevia como democrata e progressista.

Na pesquisa de 2016, pessoas até 34 anos foram as mais propensas a se identificarem


como progressistas: 55% deste recorte se identificou como democrata e 27% como
democratas progressistas.

Participação política
Ao mesmo tempo em que se tornam mais progressistas, os jovens estão mais
entusiasmados com as eleições e deverão aumentar a participação política, o que poderá
ser decisivo para o cenário político.

Um levantamento do Instituto de Ciência Política da Kennedy School da Universidade


Harvard (IOP) aponta que os jovens eleitores estão mais entusiasmados com a eleições
americanas de 2020 do que com as eleições de 2016. A pesquisa mostra que 43% dos
jovens de 18 a 29 anos disseram que provavelmente votariam nas primárias de seu estado,
em comparação a 36% que afirmaram que votariam em 2015.

A pesquisa foi realizada com mais de 3 mil jovens entre 18 e 29 anos. Neste grupo, a ânsia
eleitoral foi maior entre os jovens democratas, cujo entusiasmo aumentou 14%, passando
de 44% em 2015 para 58% em 2019. Enquanto isso, o entusiasmo entre os jovens
republicanos caiu.

“Quase todo o entusiasmo adicional em relação a quatro anos atrás vem de jovens
democratas”, diz John Della Volpe, diretor de pesquisas do IOP. “Os jovens não estão apenas
mais engajados, mas estão se tornando mais engajados e mais progressistas ao mesmo
tempo.”

A onda progressista entre os jovens está sendo expressada nas urnas: as eleições
americanas de 2018 registraram um número recorde de jovens (31%, o maior desde 1992,
quando Bill Clinton venceu a disputa com George H. W. Bush) escolhendo candidatos
democratas.

“Estamos vendo uma crescente divisão entre os eleitores mais jovens e mais velhos nos
Estados Unidos”, pondera Della Volpe. “Pessoas com mais de 50 anos e mais velhos apoiam
os republicanos em uma proporção de dois para um, enquanto as pessoas na geração
millennial apoiam democratas em uma proporção de dois para um”, analisa.

2/5
O crescimento da participação é atribuída a um sentimento de ansiedade entre os jovens:
entre aqueles que se definem como progressistas, 66% disseram estar preocupados com a
direção moral do país – um aumento considerável quando comparado com dados de 2015
(42%).

Para o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a atração desta geração pelo
socialismo acontece porque são “jovens” e “idealistas”. “Bem, acho, em primeiro lugar, que
eles são jovens, idealistas. Se os chamamos de idealistas, acredito que o capitalismo é mais
um ideal”, afirmou Trump respondendo a uma pergunta da apresentadora da Fox News,
Laura Ingraham, sobre por que americanos mais jovens parecem estar gravitando em
direção a políticas progressistas. Mesmo assim, para Trump, os EUA nunca se tornará uma
nação socialista.

Realidade nacional
No Brasil, os últimos anos mostraram crescimento da parcela que se posiciona com
ideologias da esquerda. Pesquisa do Datafolha divulgada em 2017 apontava que 41% da
população se identificava com posicionamentos de esquerda. O levantamento avaliou as
opiniões dos brasileiros sobre uma série de questões envolvendo valores sociais, políticos,
culturais e econômicos e a partir daí os posicionou em escalas de comportamento e
pensamento econômico, dentro das quais eles foram segmentados em esquerda, centro-
esquerda, centro, direita e centro-direita.

A identificação com a esquerda também pode estar relacionada ao comportamento, e não à


economia, indica a mesma pesquisa: entre 2013 e 2017 houve aumento na parcela de
pessoas que acreditam que “boa parte da pobreza está ligada à falta de oportunidades
iguais para que todos possam subir na vida”, enquanto a avaliação de que a
“homossexualidade deve ser aceita por toda a sociedade” passou de 64% para 74% no
período, opiniões identificadas com ideologias de esquerda.

Por outro lado, o percentual daqueles que se identificam como “esquerda” é muito maior
entre professores de História. Uma dupla de pesquisadores realizou um levantamento com
288 professores de História de países do Mercosul – Brasil, Argentina Uruguai e Paraguai –
mais o Chile. Uma das perguntas do questionário foi em qual partido os docentes
costumam votar nas eleições. Ao todo, 84,5% dos professores brasileiros disseram preferir
siglas de esquerda ou centro-esquerda. Já centro, centro-direita e direita, somados,
corresponderam a 15,5% dos entrevistados.

Um relatório mais antigo, elaborado em 2004 pela Unesco, chegou a conclusões


semelhantes. Quando perguntados se concordam com a afirmação “A liberdade e a
igualdade são importantes, mas se tivesse que escolher uma das duas, consideraria a
igualdade como mais importante, isto é, que ninguém se veja desfavorecido”, 75,5% dos
entrevistados responderam que “sim”. Embora o relatório da Unesco evite usar os termos
3/5
esquerda e direita, a opção por “igualdade” em detrimento da “liberdade” costuma ser
usada para mapear pensamentos mais à esquerda.

Capacidade crítica
Para Tom Switzer, diretor executivo do Center for Independent Studies em Sidney
(Austrália), uma das causas principais para a atração dos jovens pela esquerda é o
desconhecimento.

“Parte do problema é simplesmente ignorância. Apenas 26% dos millennials estão


familiarizados com Vladimir Lenin e 34% com Joseph Stalin. Apenas 21% dos entrevistados
disseram que sabiam quem era Mao. Não importa que esses homens tenham sido
responsáveis pela morte de dezenas de milhões e pelo empobrecimento de centenas de
milhões”, diz Switzer.

“Eles deveriam pelo menos saber sobre a Venezuela, onde o regime socialista nas últimas
duas décadas levou à repressão, uma economia em queda livre, doença generalizada e
fome e emigração em massa”, completa.

Ainda de acordo com a pesquisa do CIS, 58% dos jovens australianos têm uma visão
favorável do socialismo, com apenas 18% deles tendo uma visão desfavorável. A pesquisa
revela que a exposição limitada dos jovens australianos aos horrores do socialismo pode
estar levando-os a romantizar a ideologia: quase dois terços dos jovens entrevistados
acredita que o capitalismo falhou e que mais intervenção do governo é necessária.

“Os experimentos fracassados do século XX com o socialismo servem como uma grande
lição que, apesar de suas promessas idealistas de igualdade, a ideologia levou a nada além
de opressão e pobreza. No entanto, os millennials australianos permaneceram
relativamente não afetados pelas deficiências do socialismo”, diz Switzer.

A opinião é compartilhada por Jean-Marie Lambert, doutor em Ciências Políticas pela


Universidade de Liège e professor emérito da PUC-Goiás. Para Lambert, o sistema
universitário está formando gerações incapazes de compreender o que é socialismo e com
ausência de capacidade crítica.

“Em uma universidade você precisa repetir comandos para ser aceito: minorias, feminismo,
misoginia... Em geral, não há capacidade de recuo crítico, tampouco de análise filosófica.
Então fica fácil manobrá-los para votarem em candidatos de esquerda”, diz.

“Estamos vivendo, desde então, uma ‘colonização educacional’. Esses quadros ideológicos,
os chamados progressistas, nascem basicamente no sistema universitário americano, para
propagação periférica. São gerações que são formadas nessa ideologia progressista e hoje
estamos colhendo os frutos dessa política educacional”, crítica o professor.

4/5
Contradições
Por outro lado, um levantamento da Gallup, empresa de pesquisa de opinião nos Estados
Unidos, mostra que os jovens têm visões que na prática contradizem a crença no
socialismo. Segundo a pesquisa, 90% dos jovens entre 18 e 29 anos tem uma visão positiva
dos empreendedores, e 98% veem positivamente as pequenas empresas.

“Jovens de vinte e poucos anos não querem que o governo administre pizzarias, mas
querem mais controle governamental sobre alguns setores da economia”, escreveu
recentemente Edward L. Glaeser, professor de economia na Universidade de Harvard.

Segundo ele, para evitar que os jovens caiam no socialismo de fato, é necessário fortalecer
o empreendedorismo e melhorar as oportunidades de ascensão social dos jovens: “Por
mais imperfeito que seja o livre mercado, o histórico moral e econômico das economias
dominadas pelo Estado é muito pior”.

5/5

Você também pode gostar