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Cultura do Cancelamento: a pandemia do ódio.

LUIZ ANTONIO LOUREIRO TRAVAIN


2020
Copyright © 2020
Todos os direitos reservados.
ISBN: 9798672992174
Selo editorial: Independently published
São Paulo | Brasil.

“Aquele que é íntegro em sua conduta e pratica a justiça, que de


coração fala a verdade e não usa a

língua com maledicência, que nenhum mal faz a seu semelhante


nem lança calúnias e afrontas contra seu companheiro.”

Todos os direitos reservados nos termos da Lei Federal nº 9.610 de 19 de fevereiro


de 1998 e Lei 9.609 de 19 de fevereiro de 1998.

De acordo com normas APAs.


(Salmos 15:3)
Como citar: Travain, Luiz Antonio Loureiro (2020). Cultura do Cancelamento: a
pandemia do ódio. São Paulo. Amazon Sobre o autor:

Luiz Antonio Loureiro Travain


Doutorando em Direito Econômico e Empresarial | Universidad Internacional
Iberoamericana do México.
Mestre Internacional em Máster Universitario en Resolución de Conflictos y
Mediación | Universidad Europea Del Atlántico, Espanha.
Pós-graduado em Conciliação, Mediação e Arbitragem
Pós-graduado em Direto Educacional
Formado em Direito.
Autor de vários projetos premiados em edições do Conciliar é Legal, Conselho
Nacional de Justiça – CNJ.
Instrutor de mediação premiado na X Edição do Prêmio Conciliar é Legal,
Conselho Nacional de Justiça – CNJ

Diretor de Sec. do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Resolução de


Disputas do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – São Paulo | Brasil.

Dedicado àqueles que buscam a disseminação da cultura de paz.


Agradeço à Deus, à minha família e a todos os amigos que
contribuíram para o desenvolvimento dessa obra. Sumário
Sumário
1. Introdução 09 2. Cultura do cancelamento 11 2.1 Cultura de paz e
de ódio 11 2.2 Conceito de cultura de cancelamento 19 2.2.1 Quanto
ao campo de atuação 21 2.2.2 Quanto aos motivos (de origens), a 25
cultura do cancelamento pode ser
2.3 Semiótica social e a cultura do 37 cancelamento
2.4 Guerras de narrativas e a cultura de 45 cancelamento
2.5 A psicologia social e comunitária e a 53 cultura do cancelamento
2.6 Interesses sociais e cultura do 57 cancelamento
2.7. Teoria Realista do Conflito em Grupo 68 e Teoria da Identidade
Social aplicadas a cultura do cancelamento
2.8 A Cultura do Cancelamento e a 84 psicanálise social
2.9 A Estratégia do mal nas redes 99 sociais
Inbound marketing e a cultura do cancelamento
2.11 Stop Hate for Profit – um paradoxo? 103 3. Conclusão 107
Bibliografia 109 Introdução

Nas mais diversas searas da sociedade nos deparamos com as


constantes práticas de “cancelamentos” de pessoas, opiniões,
interesses e de posições mediante plataformas digitais.

A cultura do cancelamento é recente, e nasceu baseada claramente


como vertente ou faceta da cultura do ódio e da intolerância.

Como veremos em nossos estudos, a cultura do cancelamento é um


grave equívoco social que fomenta a constante escalada de conflitos
de várias tipologias, inter/intra pessoas, inter/intra grupal, dentre
muitos tipos de conflitos.
O fomento ou retroalimentação dessa cultura social tão danosa
transparece socialmente como algo positivo na visão de muitos. Com
isso ganha-se cada vez mais adeptos.

Na mente desses “canceladores”, o politicamente correto é um dos


lados de uma mesma moeda que contempla a cultura do ódio. É, de
fato, um paradoxo. Conviver com a mente “leve”, porém, “lacrando”
nos cancelamentos sob o fino véu moral de sua opinião, com ou sem
sustentáculos argumentativos, sobre o que acha politicamente
correto.

Muitas vezes, grandes empresas praticam esse paradoxo. Para


defenderem a sua imagem, condenam sumariamente a pessoa que
supostamente teria agido em descompasso com o arcabouço moral
defendido pela empresa.

Ora, será mesmo que a cultura de cancelamento é viável?


A que ponto chegará essa escalada negativa de retrocesso do
desenvolvimento social?
Estes pontos críticos, muitos deles baseados em guerras de
narrativas, desconexas com a realidade, inclusive, mas que causam
graves danos à vítima do cancelamento.
É certo que muitas celebridades do mundo artístico, esportivo e
político, são constante e sumariamente atacadas pela prática do
vício social do cancelamento.
Em nossa observância técnica, serão analisados nesta obra
elementos que possam alterar a polaridade dessa escalada de
conflito na internet (e fora dela) e aqui incluem-se os mecanismos
eletrônicos que atuam no ciberespaço (como softwares robôs, contas
digitais falsas, IDs alterados, dentre muitos outros rótulos eletrônicos
que intitulam as facilidades para a realização dessa prática, muitas
vezes calcada no anonimato e na sensação de impunidade (mas
como veremos, o canceling poderá ser realizado no mundo off-line).
Outros, porém, sentem o sadismo na prática do cancelamento,
sendo-lhe motivo de orgulho ou pertencimento a um grupo
determinado.
Mas, há também aqueles que simpatizam com a cultura do
cancelamento pelo fato de entender que a prática é inocente, ou
porque, adequou-se a uma normose1 social inadequada, ou melhor,
cibernose.
E isso, estamos presenciando em todo o mundo atualmente.
O cancelamento é uma forma de expressão do ódio na sociedade,
ainda que de forma virtual.
1
Vide: Weil, Pierre (2000). A normose informacional. Brasília. Vide: Weil, Pierre
(2000). A normose informacional. Brasília.
19652000000200008

A sociedade digital necessita de uma forma adequada de gestão de


sua política estrutural para que seja voltada para a transformação da
cultura do cancelamento para uma cultura de paz e conciliação. 2.
Cultura do cancelamento

Antes de conceituarmos a cultura do cancelamento, é preciso


compreender o que são as estruturas sociais e o que é uma cultura
de paz e de ódio.

2.1 Cultura de paz e de ódio

Cultura é um termo decorrente da antropologia e da sociologia e tem


por objetivo dar identidade às sociedades humanas, desde as mais
rústicas às mais evoluídas.

Cultura, portanto, poderá se apresentar sob muitas vertentes, seja


religiosa, conjunto de hábitos sociais, técnicas ou conhecimentos de
uma determinada sociedade. A Cultura, também, por outro viés,
poderá se configurar por vertentes artísticas, literárias musicais,
dramaturgia, dentre outros elementos, como a culinária ou
vestimentas, que possam identificar os costumes habituais de um
povo ou nação. Até mesmo a linguagem era fator de sustentação de
uma identidade no tempo, como ensinou Max Muller, ao definir a
“relação espiritual”.

Sob esse enfoque, cultura é a cultivação por grupos, povos ou


nações, no tempo e no espaço, desses elementos para que estes
subsistam como identidade desse grupo, povo ou nação. Por isso,
podemos afirmar que a cultura está intimamente ligada às Ciências
Sociais (conjugando-se a geografia, a história, a sociologia e
antropologia). Atualmente incluiríamos o direito e a psicologia como
ciências que também circundam o estudo da cultura. Alguns autores,
como Herbert Spencer, desenvolveram teses eurocêntricas,
baseadas na teoria evolucionista, na medida em que a evolução
humana seria proporcional à evolução das suas respectivas
produções e evoluções culturais. Todavia, as teorias de Spencer
(século XIX) pecaram ao dar peso aos fatores étnicos como
elementares da evolução humana.

Edward Burnett Tylor (século XIX), por sua vez, trazia um enfoque de
que havia uma hierarquia social que eram consideradas conforme a
evolução de suas produções culturais, criando-se uma pseudo
hierarquização entre os povos, grupos e nações.

Para Tylor (1873)2 a linguagem refletia também um fator cultural e,


ainda assim, uma sobreposição de raças dominantes em detrimento
de outras:

“Ainda assim, sob circunstâncias comuns, a conexão da fala indica


mais ou menos a conexão de raça ancestral. Como um guia para
rastrear a história da civilização, a linguagem fornece evidências
ainda melhores, para linguagem comum envolve, em grande medida,
cultura. A raça dominante é o suficiente para manter ou impor sua
linguagem e geralmente mais ou menos mantém ou impõe sua
civilização também.” Nesse contexto, cultura era, na realidade, um

fator de juízo de valor entre os povos e suas culturas. Há nesse


contexto uma anulação de uma cultura por outra.
2Tylor, EDWARD B. (1873). Primitive culture: researches into the development of
mythology, philosophy, religion, language, art, and custom. University Oxford.
Tradução livre do autor:

“English as their mother-tongue. Still, under ordinary circumstances, connexion of


speech does indicate more or less connexion of ancestral race. As a guide in
tracing the history of civilization, language gives still better evidence, for common
language to a great extent involves common culture. The race dominant enough to
maintain or impose its language, usually more or less maintains or imposes its
civilization also.”

As teorias de Tylor foram, obviamente, suprimidas no que tange essa


hierarquização de raças e culturas. Percebemos que até hoje há
resquícios de pensamentos de hierarquização de culturas, o que tem
sido grande fator gerador de conflitos e até mesmo confrontos
violentos.

Franz Boas, um alemão naturalizado americano realizou um famoso


estudo sobre tribos indígenas nos Estados Unidos da América.
Baseou seus estudos em uma nova ressignificação do termo cultura,
fomentando-se a co-existência entre várias culturas. Aqui se
finalizava a hierarquização de culturas (e povos). Passou-se a
analisar a cultura com outra ótica. Criou-se, então, o eestruturalismo.

Estruturalismo baseia-se na ideia de que toda a cultura deve ser


analisada sob um enfoque maior, abrangendo-se variados pilares,
como relação com o meio, linguística, enfim, como se socializam. É,
portanto, o conjunto que caracteriza as inter-relações internas de um
grupo, povo ou nação.

Simon (2008)3, ensina que:


"a crença de que os fenômenos da vida humana não são inteligíveis
exceto através de suas inter-relações. Estas relações constituem
uma estrutura e, ainda por trás das variações locais dos fenômenos
superficiais, existem leis constantes do extrato cultural."
Então dispomos de estrutura já construídas na

qual aos comportamentos, atitudes e tomadas de decisões se


baseiam e, há também, estruturas sociais que surgem, como, por
exemplo a estrutura social adepta da cultura do cancelamento.

Esse desenvolvimento social baseado nas estruturas sociais pode se


apresentar de forma sutil na sociedade. Àquele que cancela ou ao
que adere ao comportamento de massa para destruir a reputação ou
imagem do alvo, muitas vezes não há qualquer pensamento crítico
quanto ao fato, ao comportamento que está realizando e, muito
menos, a um raciocínio crítico baseado na empatia.

A Cultura do cancelamento surge de uma estrutura social que aceita


e fomenta isso.
Esse pacto social invisível manifestado em plataformas digitais,
como uma “modinha” social voltada a ignóbil conduta de destruir
pessoas ou seus caminhos de carreira, por exemplo, mostra
cabalmente o que essa estrutura social reflete: uma cultura do ódio,
da intolerância, sob o rótulo de “lacração” ou de cultura do
cancelamento.
3
Blackburn, Simon (2008). Oxford Dictionary of Philosophy, second edition revised.
Oxford: Oxford University Press

Essa estruturação social com o objetivo de fomentar a cultura de


cancelamento é, indubitavelmente, um erro.

Cumpre afirmar que, historicamente, houve muito erros nas


construções das estruturas sociais, gerando o desenvolvimento de
culturas equivocadas, tais como as vertentes da cultura de ódio:
cultura do racismo, da violência, da vingança, do preconceito e
tantas outras.

De outro lado, não se pode olvidar que existe mecanismos


específicos de gestão de conflitos voltados para a desconstrução das
estruturas sociais como forma de reconstruir novos pilares sobre o
qual fundamentam a nova cultura, de paz ou de ódio. Assim, o efeito
transformador de cultura depende da transformação das respectivas
estruturas sociais. Estes mecanismos são essenciais para retificação
da linha do desenvolvimento harmônico da sociedade. Ações
afirmativas, decisões judiciais, decisões de grandes CEOs de
empresas importantes, manifestações artísticas, manifestações
sociais, protestos e tantas outras formas de reestruturar a sociedade.
Mas, o sufrágio universal é o mais importante, pois com esse
elemento poder-se-á refletir a vontade do povo, inclusive, das
minorias sociais através de seus representantes.
2.2 Conceito de cultura de cancelamento
A cultura do cancelamento, s sob o enfoque atual4, surgiu na década
passada com grupos de internautas contrários a uma conduta, fala
ou prática resolvem cancelar uma pessoa. Essa pessoa, muitas
vezes, é uma celebridade do mundo esportivo, artístico ou político.

Cancelar é, em si, o ato de tronar sem efeito, de anular, de retirar a


validade, de eliminar, abortar invalidar, rescindir ou infirmar.

Mas, essa política de cancelamento, como cultura, mostra-se


bastante usual. Ultimamente, acompanhamos inúmeros casos da
aplicação da cultura de cancelamento, algumas fomentadas por
fakenews ou mesmo por atos de destruição de reputações.

Muitas vezes, a cultura de cancelamento é realizada de forma


organizada, manipulada ou mesmo, por computadores robôs,
acompanhada ou não de fakenews ou agressões de outras
naturezas (como hackers, bloqueios indevidos de contas, calúnias,
injúrias e difamações e, em alguns casos, utilização de blogs e sites
remunerados para compor um cenário desfavorável para a vítima).
4
Em nossa opinião, a cultura do cancelamento é uma vertente da cultura de ódio.
Por essa razão, entendemos que sua origem se perde ao tempo. Um exemplo de
cultura do cancelamento, baseado no boicote, nada mais foi que o ato nazista de
marcar as lojas de judeus de modo a prejudicar sua economia. Assim, como
veremos adiante, a cultura do cancelamento independe do meio digital.

A cultura do cancelamento, ainda, tem íntima relação como a


intolerância de argumentos ou posições opostas. É uma forma de
tentar calar ou destruir um pensamento ou crença e tolher a
liberdade de expressão ou de culto (respectivamente).
2.2.1 Quanto ao campo de atuação:

Em nossa opinião, quanto ao c campo, a cultura do cancelamento


pode ser praticada:
a) No mundo rreal: exercida de forma presencial

ou não (carta, jornal, etc) com o objetivo de calar uma posição, um


pensamento, uma crença, tolhendo o exercício do direito de
liberdade de expressão ou de culto (exemplo: um aluno levanta a
mão para responder uma questão à professora e todos os alunos o
vaiam e a professora alimenta as vaias com um a gargalhada,
buscando-se tolher por completo o pensamento do aluno sobre um
tema. Um caso interessante, foi o caso da escola Modelo, que, em
razão de uma fakenews, um boato, foi cancelada no âmbito
consumerista, levando-a a encerrar as atividades. Depois de muito
tempo, descobriu-se que tufo foi um engano. Mas, os impactos do
canceling permaneceram de forma indelével); Um exemplo
emblemático e recente, foi o caso do segurança de um hipermercado
na região metropolitana de São Paulo que assassinou um cachorro
que vivia no estacionamento da loja. Houve uma série de boicotes e
protestos em frente à loja onde
os fatos ocorreram. Foi uma nítida política de
cancelamento que objetivou o boicote à loja.
Dessa forma, discordamos cabalmente de
alegações no sentido de que o cancelamento
(canceling) somente possa ocorrer no mundo
virtual. Em nossa opinião, a prática do
cancelamento, por ser uma vertente da cultura
do ódio, pode ocorrer de variadas formas.

b) No mundo vvirtual; exercida de forma virtual,


com uso de plataformas digitais (facebook,
instagran, Twiter, dentre outros), e-mails,
mensagens eletrônicas ou outras formas que
possam haver a comunicação destrutiva de
forma virtual, com o objetivo de calar uma
posição, um pensamento, uma crença,
tolhendo o exercício do direito de liberdade
de expressão ou de culto (exemplo: as
chamadas MAVs – Militância em Ambientes
Virtuais ou mesmo as chamadas Tropas Tron,
baseadas em robôs de internet);

c) No campo eeconômico: a cultura de


cancelamento pode decorrer de imposição
econômica que buscam controlar as
estruturas sociais ou mesmo seus interesses d) próprios, como
proteção da imagem da
marca, maiores lucros, dentre muitos outros
(exemplo: empresa cancela contratos com um artista ou garoto-
propaganda baseado em julgamento sumário de parte da sociedade.
Aqui o cancelamento atinge, inclusive, os aspectos financeiros.
Exemplo: consumidores boicotam a empresa até atingir a falência.
Mas, não se pode olvidar também, de que a cultura do cancelamento
poderá refletir uma forma de ataque controlado e manipulado em
face dos concorrentes. Isso porque, se houver a manipulação
econômica ou mesmo o seu fomento para que exista essa ignóbil
prática poderá gerar graves prejuízos aos concorrentes, criando-se
uma forma de concorrência desleal. Os ataques decorrentes da
cultura do cancelamento podem levam uma empresa, por exemplo, à
falência com a destruição de sua imagem ou marca. Essa aparente
pulverização da responsabilidade não deve ser aceita pela
sociedade. Aqui estamos diante do que denominados de óódio
monetizado, ou seja, a política do ódio poderá gerar lucros de
diversas formas, e, também, graves prejuízos à suas vítimas.
No campo mmisto: com a junção de um ou mais campos descritos
nos itens anteriores. Exemplo: boicote realizado por militantes
virtuais contra uma marca, acumulado com pichações de protestos
em suas lojas que, por conseguinte, cominam no cancelamento de
um contrato econômico com um prestador de serviços terceirizado
que se utiliza de mão de obra escrava ou infantil.

Em todos os casos a cultura do cancelamento poderá se dar


mediante boicote, chacotas, redução de poder (desempoderamento),
invalidação dos sentimentos e dos argumentos, dentre muitos outros
métodos de se praticar essa ignóbil cultura.
2.2.2 Quanto aos motivos (de origens), a

cultura do cancelamento pode ser:

a) Por razões iideológicas: um exercício da supressão arbitrária da


opinião alheia. Um tolhimento da liberdade de expressão por não
admitir sequer analisar a opinião alheia. Completa falta de empatia e,
por isso, há vedação ao diálogo cooperativo. O objetivo é calar as
vozes contrárias a ideologia defendida pelo “cancelador”. Ex.; meio-
ambiente, racismo, comunismo e capitalismo, dentre outros. Aqui,
faz-nos frisar que o canceling pode se dar, inclusive por parte do
estado. Imagine um país de viés comunista que busca a todo custo
cancelar as pessoas que tentam se manifestar contra a ideologia
pregada.

b) Por razões políticas: exercida em razão da intolerância de


posições políticas que não atendam aos interesses do “cancelador”.
Aqui o sentido de política é amplo, como o comum (influencia no
modo de governo ou político-partidário), erudita (meios adequados à
obtenção de qualquer vantagem – Hobbes, conjunto de meios para
consecução de efeitos desejados – Russel ou a arte de se manter do
poder – Maquiavel, além de todas as formas de concepções políticas
defendidas pela filosofia e ciências sociais.

c) Por razões rreligiosas: Tão ou mais grave que as razões


anteriores, o exercício da prática de cancelamento baseado em
aspectos religiosos atinge, talvez, o âmago mais profundo do
indivíduo: sua liberdade de crença e exercício de culto. Aqui, o
tolhimento muitas vezes é mais severo, e as técnicas de
cancelamento baseadas na intolerância religiosa tendem a ser
acompanhadas por violências. Ex. cancelamento de uma pessoa ou
grupo por serem adeptos a uma religião cristã em países
mulçumanos, chegando ao ápice das atividades de terrorismo ou
genocídio contra religiosos.

d) Por razões cconsumeristas: baseada em violações de qualquer


ordem que impacte na imagem do prestador ou fornecedor de bens
ou serviços acarretando boicote contra seus produtos. As razões
consumeristas são muitas vezes organizadas com o intuito de
boicotar a marca ou produtos a ela relacionados. E, em alguns
casos, o boicote decorrente à empresa tem origem em outra
empresa que lhe fornece serviços ou produtos de forma terceirizada.
Por exemplo: uma empresa vende produtos que em sua cadeia
produtiva tem trabalho infantil, mão de obra escrava ou destruição do
meio ambiente. Esses são os exemplos mais comuns e visualizados
atualmente. Aqui, entram também os exemplos de empresas que
exploram ou enganam os consumidores. A origem dos motivos ou
razões do cancelamento tendem a ser da cadeia da relação de
consumo em si. Imagine um CEO de uma grande empresa do mundo
têxtil que passa a defender abertamente o desmatamento da
Amazônia. Provavelmente a empresa que este CEO atua sofrerá
algum tipo de boicote.

e) Por razões ppuramente econômicas: aqui entram em cena o ódio


monetizado, a lucratividade decorrente da cultura do ódio, na
vertente cultura de cancelamento. Em sistemas de redes sociais, de
pesquisas eletrônicas e, em especial, marketing direcionado e
interativo (marketing 4.0), com o que empresas detentoras dessas
redes digitais ganham com excesso de publicidade, em especial,
diante do grande número de engajamento eletrônico sobre um
determinado assunto. É aí onde entram os espaços publicitários com
grande público, com os quais desenvolve-se o mmarketing de
conteúdo, inclusive. Com isso, é plenamente possível que diante de
um grande número de engajamento digital nas redes sociais ou sites
de pesquisas, estes promovam seus espaços de publicidade em
meio a destruição de outrem (pessoa física ou jurídica, marca ou
produto). A técnica inbound marketing pode ser utilizada com esse
objetivo, inclusive.

Assim, é preciso a criação de mecanismos que possibilitem um


adequado controle dos engajamentos digitais de modo a combater
as políticas de ódio de toda espécie, inclusive as fakenews,
desinformações e, claro, as técnicas de cancelamento. A venda ou
seleção de espaços publicitários por essas redes sociais e sites
(marketing direcionado ou interativo, por exemplo) baseados em
visualizações e engajamentos eletrônicos (“curtidas”,
compartilhamentos, comentários, palavras ou assuntos mais
pesquisado, dentre outros) deveriam passar por uma gestão de
compliance digital efetiva, com o desenvolvimento de inteligência
artificial relacionada a identificação, conscientização ou punição
àqueles que realizam essas práticas de política de ódio. O canceling
digital, por gerar grande fluxo de engajamentos e visualizações, tem
potencial de gerar lucro ás empresas que vendem anúncios e
também aos anunciantes que “pegam carona” no grande número de
visualizações sobre o tema que carreia e exterioriza a cultura do
cancelamento. Fato é que a cultura do cancelamento, baseadas em
fakenews ou não, é o campo propício e fértil para a mineração de
dados de modo a conduzir o marketing 4.0.

Sob o aspecto do direito econômico, essas origens da prática do


canceling também podem ser realizadas de forma artificial, como
controle ou manipulação de capitais (destruição de reputação de
uma empresa, produto ou marca, de modo a derrubar os preços de
uma ação cambial, por exemplo). Aqui os impactos econômicos
negativos podem atingir os investidores de uma determinada
empresa. A título de exemplo, imagine uma empresa que, em sua
publicidade, promova o combate a homofobia. Pessoas mal-
intencionadas e, muitas vezes, calcadas em interesses econômicos,
providenciam o ataque maciço em face dessa empresa de modo que
suas ações mercantis sejam derrubadas significativamente. É
possível que nesse mecanismo sejam introduzidas práticas de
desvalorizações artificiais de preços de mercado, pump na dump
(supervalorização e superdesvalorização) e spoofing, por exemplo,
na medida em que as ações estão sob o foco dos ataques e,
portanto, passível de maiores níveis de volatilidade onde podem ser
encobertadas estas terríveis práticas do mercado de capitais. Além
disso, poderá impactar na tomada de decisões dos consumidores,
influenciando, dessa forma, sua liberdade de consumo, inclusive.
Isso porque, se o indivíduo não tiver o desenvolvimento de um
pensamento crítico sobre o tema ou que seja efetivamente enganado
pela mídia que carreia, por exemplo, uma desinformação ou
fakenews, esse consumidor terá, na realidade, sua liberdade de
consumo prejudicada. A liberdade de informação (acesso a
informação verídica e adequada) é premissa para o exercício de
muitas outras liberdades, inclusive a liberdade de consumo.

f) Por razões ppsíquicas: é o cancelamento baseado em sentimentos


pessoais que encontram identidade em grupos. É o caso, por
exemplo, de pessoas com elevado nível de inveja ou ódio buscam
destruir ou cancelar a pessoa, suas atividades, seus resultados ou
sua personalidade. Aqui, é um fenômeno comumente encontrado
quando se trata de conflitos organizacionais ou familiares.
A inveja, por exemplo, em seu conceito psicanalítico nada mais é
que a frustação geradora de rancor, raiva e ódio perante uma
vontade não realizada, mas realizada por outrem. Na semântica do
cognato in-veja, é exatamente o não querer ou não tolerar ver. Daí o
canceling ganha um certo potencial para a sua prática. Aqui o
sentimento é irracional e puramente instintivo como a fome, por
exemplo.

O indivíduo cancelado pode sofrer uma espécie de bullying, com


boicotes virtuais ou reais que tem por objetivo tolher as opiniões,
manifestações do pensamento e ideias da vítima, anulando-a de
modo a não participar, não lhe validando os seus sentimentos ou
vontades. O boicote tende a destruir ou impedir realizações ou
mesmo a própria pessoa, vítima.

Importante ressaltar que, em regra, a violência/cancelamento


individual é diversa da violência/cancelamento grupal, pois a
violência individual tem razões mais apuráveis, como características
da pessoa, suas condutas, seus pensamentos ou suas expressões.
Isso, por si só, não impede que um conflito intrapessoal encontre
sintonia com outras pessoas formando-se um grupo. Daí, a razão da
violência manifestada pela prática do cancelamento é coesa e de
origem comum. Mas, na realidade a formação do grupo é baseada
nas identificações e sentimentos mútuos de pertencimento. É a
chamada identidade social. O problema dos conflitos grupais é o
falso véu do anonimato. Por essa razão, os limites éticos e legais são
atravessados, podendo gerar atividades à margem da lei, inclusive.

Em todos os casos há tolhimento da liberdade de expressão, das


opiniões, de crenças e de posicionamentos, baseados na
intolerância, na completa falta de empatia, na falta de diálogo
cooperativo, na completa ausência de separação de pessoas do
problema e, pior, muitas vezes baseados em julgamentos sociais
sumários, ainda que baseados em uma premissa falsa.

Por esta razão, a política ou cultura de cancelamento é


demasiadamente injusta, hipócrita e imoral.
É injusta porque sequer há oportunidade de defesa e, ainda que haja
defesa, sequer é reconhecida ou analisada.

É hipócrita, pois o indivíduo que adere à essa cultura de ódio, usa o


pseudo-argumento de defesa de uma posição do politicamente
correto.

É imoral, pois reflete, muitas vezes, infringências que o indivíduo


jamais realizaria se estivesse agindo por si, apenas. É imoral, pois é
um ato covarde, grotesco, sumário e áspero.

A cultura do cancelamento é, na realidade, uma mera vertente do


exercício da cultura do ódio e da violência.

Não há diferença. Cultura do cancelamento é um gênero da espécie


cultura de ódio e violência. Por essa razão, na dialética das
estruturas sociais e suas culturas desenvolvidas, temos que ter a
noção de que a cultura do cancelamento, embora pareça para
alguns, algo elogiável, é na realidade uma atitude ignóbil e
desprezível.

Como uma vertente da cultura do ódio e da violência, a cultura do


cancelamento e da “lacração” mostram-se como desvios no
desenvolvimento da harmonia social. Aliás, sob o ponto de vista
desenvolvimentista de cultura de paz e de políticas sociais de
harmonização e tratamento de conflitos de interesses, a cultura de
cancelamento é um verdadeiro desastre social. Isso porque atinge
centenas de milhões de pessoas em todo o mundo, fomentando os
“canceladores” ou “lacradores”.

Cancelar alguém reflete algo como “deletar” uma pessoa do meio de


forma sumária. Esse é um equívoco que mostra, na verdade, o quão
falta a empatia ao “cancelador” que tenta impor, fomentado pelo fato
de pertencer a um grupo, uma débil tirania de sua posição contra a
do outro.

Se não há empatia, muito menos há diálogo cooperativo, exceto se


houver a adoção de políticas públicas ou privadas (políticas de
redes, regras de usuários de plataformas) que possam identificar e
vedar essas ocorrências, ao menos, no meio digital.

Um dos focos dos canceladores é remover a vítima para o


ostracismo. Ostracismo, nada mais foi que a punição de dez anos de
exílio ou banimento existente em Atenas, a qual era imposta a
políticos por votação de seus cidadãos. Esse mecanismo era
utilizado no século V a/C e foi criado por Clistenes, o “Pai da
Democracia”. Era dado um óstraco (concha ou pedaço de cerâmica),
onde os cidadãos escreviam o nome do “condenado”.

Ostracismo, na realidade, embora pareça um ato democrático, não


era em sua prática, tanto é assim que os políticos atenienses,
Alcibíades e Nícias, utilizaram a pena de banimento ou exílio para
expulsar Hipérbulo da cidade de Atenas.

Dessa forma, o que temos é um julgamento sumário ao estilo


ostracismo, com penas de “banimento social” baseadas em
julgamentos sumários e, em muitas vezes, em fatos inverídicos. Não
há direito de defesa, pois a disseminação do animus puniendi na
sociedade é voraz, ainda mais, se calcado na autossatisfação5 de
sentimento de pertencimento a um grupo que assim age.

Mas, há algo muito pior. Na cultura do cancelamento há completo


cancelamento dos sentimentos do outro. Há a invalidação dos
sentimentos e emoções do outro.

Logo, a cultura do cancelamento busca aniquilar vários espectros ao


mesmo tempo: a manifestação ou expressão do pensamento, a
pessoa física em si, a sua moral, seu âmbito econômico e
profissional, bem como, as emoções da vítima, mediante o integral
boicote incidente sobre todos, alguns ou um desses fatores, apenas.
5
AUTOSSATISFAÇÃO in Dicionário infopédia da Língua Portuguesa [em linha].
Porto: Porto Editora, 2003-2020: “satisfação que uma pessoa sente relativamente a
si mesma, ao seu comportamento ou às suas ações”
As vítimas podem ser pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou
internacionais.
Estes dois espectros de análise são atingidos.
Assim, conceituamos a cultura do cancelamento como:
A prática cultural conflitiva de cancelar, premeditadamente ou não,
uma pessoa ou suas manifestações, tolhendo-lhe a liberdade de
expressão, de pensamento, de ideologias, de culto e de crença (por
exemplo) e invalidando seus argumentos, sentimentos e emoções,
buscando-se a imposição de um ostracismo cultural. A cultura de
cancelamento (cancel culture) é uma vertente da cultura do ódio, da
violência, da intolerância e da vingança. Seus pilares de estruturas
sociais são similares aos pilares da cultura de vingança e de ódio.
2.3 Semiótica social e a cultura do cancelamento

Com a evolução tecnológica, podemos falar também em cibercultura,


onde o espaço virtual delineado pela internet é palco de forças que
podem promover os movimentos nas estruturas sociais mencionadas
no capítulo anterior. É certo, contudo que a prática do canceling, não
é restrita ao universo digital. Ela se exterioriza de variadas formas e
métodos e por diversas razões. O fundamento: o ódio e a
intolerância. Logo, analisar as estruturas sociais é fator elementar,
condição sine qua nom, para a evolução adequada das culturas
sociais.

Sim. A semiótica social tem tudo a ver com esse sistema mórfico
social.
Ora, se as culturas refletem as estruturas sociais e seus
enraizamentos, é certo e lógico que a atuação das políticas públicas
e privadas devam incidir nessas estruturas com o objetivo de se
alterar a cultura de um povo ou grupo social.
Em todos os casos a semiótica social é um dos elementos chave da
metamorfose de culturas. A semiótica social (ou ssociosemiótica),
deve ser equilibrada e focada nos anseios maiores de uma
sociedade livre, igualitária e fraterna. Semiótica, em suma, nada mais
é que a ciência dos sinais dentro de uma sociedade.
Pela semiótica social, entende-se que os significados e sistemas
semióticos são manipulados por fatores e relações de poder. Assim,
conforme o poder se desloca dentro de uma sociedade os
significados podem ganhar variações.
A cultura de cancelamento não foge dessa dinâmica social.
Aliás, a cultura do cancelamento nada mais é que o exercício
irregular do poder, da força que busca tolher e calar a liberdade de
expressão alheia. Aqui, cumpre ressaltar que nos movimentos de
transformação de uma Cultura de não-paz (inclusive cultura de
cancelamento), para uma Cultura de Paz muitas vezes é necessário
o exercício do poder democrático. Daí a razão de surgirem muitos
“coletivos” (grupos com identidade de anseios políticos ou sociais) de
modo a ganhar poder e com isso pautar as ressignificações sociais.
E esse movimento das estruturas nem sempre é pacífico, havendo,
muitas vezes, graves confrontos. Confrontos, aqui, tem a vertente de
aniquilação da ideia do outro, acarretando, inclusive violências ou até
mesmo guerras.
A cultura do cancelamento, mesmo que aparentemente se mostre
como democrática pelo mero fato de ser a maioria, não o é. Na
realidade, a cultura do cancelamento busca aniquilar as posições
contrárias, em especial. Busca aplicar uma pena de banimento ou
exílio social.
É preciso que esses novos pilares da cultura de ódio, representada
pela vertente da cultura do cancelamento, sejam reprogramados na
sociedade. Esses pilares estruturais, como mencionado
anteriormente, atinge grupos, povos e nações, ou seja, pode ser
nacional ou internacional, inclusive. Compreender os movimentos
das estruturas de poder é fatos de suma importância, pois é esse
que poderá com maior probabilidade ditar os significados semióticos,
impactando diretamente na estrutura (de paz ou não-paz) de uma
sociedade. Se não houver conteúdo educacional adequado para
coibir esse modismo da cultura de cancelamento, estará a sociedade
a beira de um colapso democrático. Isso porque, diante da notória
polarização que se manifesta atualmente, teremos em um futuro não
muito distante, constantes conflitos decorrentes dessa ignóbil cultura
de cancelamento.
Assim, para que as estruturas sociais sejam movimentadas de forma
evolucionista e harmônica, entendemos que a educação se mostra
elemento chave para esse desenvolvimento social, baseado na
pacificação social e sustentabilidade, isso porque ao receber
educação de qualidade a pessoa poderá ter maiores chances de ter
pensamento crítico e com isso mobilizar-se em grupos sociais para
aprimorar ao poder democrático de forma adequada, com debates,
com validação dos sentimentos alheios, com diálogos cooperativos,
e com os adequados mecanismos sociais de adequada gestão de
conflitos. Com isso, além de fomentar o conhecimento, o
pensamento crítico, fortalece a cidadania e, em especial, o poder
democrático.
Um fato interessante sobre o poder democrático e suas estruturas
está no parágrafo único do artigo 1º, da Constituição Federal de 1988
ao preconizar que:
“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição”. É esse poder que movimentará as estruturas sociais
para o bem ou para o mal.
Logo, a desconstrução e reconstrução de pilares sociais e de
estruturas sociais em prol do convívio harmônico social decorre,
logicamente, do exercício do poder democrático.
A educação potencializa o exercício desse poder. Potencializa,
também, a conscientização de seus direitos e de sua cidadania e
com isso, fomenta maiores êxitos o exercício do poder democrático.
Lembre-se, quem detém o poder (grupos, partidos políticos,
ideólogos, por exemplo) poderá manter ou modificar os significados
da semiótica social.
Sob essa ótica, torna-se um pouco perigoso quando encontramos
entidades políticas ou mesmo políticos atuando ou fomentando a
cultura de cancelamento.
Isso porque, assim agindo estará exercendo o poder concedido pelos
eleitores para aniquilar pensamento opositores ou ideologias
contrárias ou não simpatizantes. É o uso da democracia para a
imposição tirânica de uma posição sobre a outra. Cancelar uma
pessoa ou uma posição, em regra é algo negativo. É positivo quando
se tratar de extremismos com resultados graves (exemplo: nazismo).
Cultura de Paz não é tão simples assim como se mostra no papel.
Decorre historicamente de muitas lutas e conflitos baseados no
poder.
Essa dinâmica do poder é a mesma que reflete na cultura de
cancelamento. Há uma unidade de desígnios no sentido de cancelar
uma pessoa ou sua expressão.
Poder dita o significado. Assim, um movimento virtual organizado
poderá impor um poder democrático falso, em especial, com o
cancelamento de opositores.
O enraizamento de culturas de não-paz, mostra-se um mal nnão
necessário. A sociedade pode e deve evoluir. Essa evolução social
em prol de uma cultura de paz necessita de uma educação de
qualidade com o que os indivíduos de uma sociedade poderão ter
suas autodeterminações de forma crítica e racional.
Sob esse aspecto, já há um ressignificado: o poder, na verdade,
decorre do próprio conhecimento, da educação.
Uma cultura de cancelamento pode, pelo incrível que pareça, atingir
até mesmo os pilares da educação. E isso é natural quando se fala
em movimentos de estruturas sociais. Ora, se dispomos de
estruturas que fomentam uma cultura de ódio que beneficie um ou
outro político, essa mostra-se eficiente para destruir os pilares da
cultura de paz, em especial, a educação, o conhecimento e a
informação adequada. Disparar fakenews ou destruir reputações, por
exemplo, é uma forma de enfraquecer os pilares fundamentais de
uma cultura de paz.
Metaforicamente, portanto, podemos afirmar que a manipulação das
estruturas de paz e não-paz podem ser artificiais, dolosas, de modo
a manter uma situação não evolutiva em sintonia avessa à harmonia
social.
Lutas e conflitos entre poderes constitucionalmente instituídos
seguem a mesma lógica, pois, quem tiver mais poder, ditará os
significados. Aqui entram em jogo as rressignificações. As
ressignificações dos fatos e as revalorizações impostas à uma
sociedade, devem ser trabalhadas ou combatidas no universo
democrático lícito, baseados em informações corretas e verídicas
com amplitude de debates e validação mútua entre os polarizados.
Quando o poder decorrente do conhecimento e da informação não é
o suficiente dáse margem, infelizmente, aos conflitos e confrontos.
Daí a gravidade da cultura de cancelamento: aniquilar a
manifestação ou pensamentos contrários – atitude claramente
antidemocrática. A política de cancelamento ou “lacração”
(popularmente reconhecida) impede o progresso adequado da
construção dos pilares da cultura de paz que garantirá o convívio
harmônico social.
Os conflitos podem ser construtivos, mas os confrontos serão
sempre destrutivos, pois representam a completa aniquilação da
posição do oponente e não é dado qualquer margem de escuta
empática a parte adversa. Isso ocorre claramente no julgamento
sumário advindo da cultura de cancelamento. O resultado do
confronto é sempre com perdas, seja de informação, de valores
patrimoniais ou mesmo inestimáveis, como os direitos da
personalidade, a moral, a honra e a vida. Há situações em que o
desequilíbrio de poder faz com que uma estrutura cultural de não-paz
seja enraizada em uma sociedade. A título de exemplo, podemos
citar as políticas nazistas que promoveram a cultura do ódio com
estruturas notoriamente desumanas. Aqui houve, na realidade
confronto e não um conflito bélico por si só. No plano das ideologias
aquele que estava no poder da Alemanha, Hitler, teve a possibilidade
de dar um novo ressignificado no sentido que lhe interessava,
gerando perseguições étnicas, religiosas e políticas.
Ora, a cultura de cancelamento nada mais é que uma vertente da
cultura de ódio, de intolerância, enfim, de não-paz.
As narrativas são ferramentas cruciais para o desenvolvimento e
construção de pilastras das estruturas sociais para o bem ou para o
mal. Mas, para uma adequada tomada de decisão, realmente
democrática e voltada ao bem-comum, é necessário o diálogo, a
compreensão mútua, a troca de ideias, a empatia e a tolerância. No
mesmo sentido, defendemos que a validação dos sentimentos e das
vontades devam ser preservadas. A cultura do cancelamento
cancela exatamente esses pontos essenciais.
2.4 Guerras de narrativas e a cultura de cancelamento

Quando falamos em cultura do cancelamento, falamos também em


guerras de narrativas. Mas, conforme a metodologia de tratamento
aplicado na situação, poderá haver uma escalada do conflito para um
grau elevado de confrontos. Sob o aspecto da conflitologia, é
importante conhecer as origens, a natureza e os reais motivos e
interesses nos quais se fundamentam as narrativas, que podem ser
multiparte. Guerras de narrativas podem, por exemplo, ser baseadas
em diversas naturezas, política, econômica, religiosa, filosófica,
ideológica ou tantas outras. Mas, além da natureza, deve-se
observar a origem, se é confiável, se é averiguável, se há
comprovações ou se é mero fakenews, guerras de narrativas
calcadas em premissas falsas.

O analista deverá observar também os reais interesses que motivam


as narrativas. Há casos que as narrativas são criadas com interesses
de utilização de um poder democrático baseado em ilusões,
falsidades, com interesses escusos de modo a induzir os indivíduos
ao conflito e ao confronto. Nesse caso as guerras de narrativas
podem se mostrar como elementos de controle de massas sociais
(inclusive com fundamentos relacionados a psicologia social,
psicologia das massas). Isso implica até mesmo em casos de falsos
conflitos, como, por exemplo, indivíduos que adentram em uma
escalada de conflito baseados em um fato falso ou até mesmo
inexistente. Sob esse enfoque, é interessante também identificar os
reais interesses que existem de forma explícita e, principalmente,
implícita. Há guerras de narrativas que têm por objetivo desviar fatos
importantes, ofuscando a transparência de fatos realmente
importantes. Outro ponto, dentre inúmeros, é o fomento à
polarização, seja para domínio ou mesmo para obter algum outro tipo
de vantagem.

A cultura do cancelamento é uma das diversas ferramentas utilizadas


para o desenvolvimento da escalada de conflitos e confrontos
baseadas em guerras de narrativas.

Em todos os casos é importantíssimo ressaltar que a adoção de


meios adequados para a resolução ou gerenciamento dos conflitos é
de suma importância. Isso porque a cultura do cancelamento é
fundada, tecnicamente, em pontos de perfis comportamentais de
competição com alta tendência de escalada do conflito. As técnicas
de resolução e gestão de conflitos poderão viabilizar o stop na
escalada do conflito e, até mesmo, trazer a desescalada do conflito
(espiral inversa do conflito).
Com isso, o campo fenomenológico de transformação do status do
conflito destrutivo em construtivo passa a ser descortinado, inclusive
com a transformação dos perfis de competição quanto às narrativas
para perfis de cooperação baseada no diálogo empático, alterando-
se a heurística relacionada a tomada de decisões. Bases genéricas,
como ensino e pensamento crítico, por exemplo, são elementos
essenciais para um adequado desenvolvimento social baseado em
uma cultura de paz.

Cumpre ressaltar, ainda, que as guerras de narrativas surgem, em


algumas situações para apuração da verdade sobre um fato. Nesse
caso, há maior abertura dos envolvidos para o diálogo cooperativo e
potencialmente empático. Mas, a cultura do cancelamento não se
mostra como o caminho para esse diálogo. Ao contrário, é um start
para possíveis escaladas de conflitos destrutivos. Por isso, a cultura
do cancelamento é uma das vertentes da cultura do ódio, fundada na
não aceitação de versões opostas.

A cultura do cancelamento tem por característica a busca da


aniquilação de qualquer forma de exercício da liberdade de
expressão advinda do polo oposto. Por isso, a cultura do
cancelamento tende a aniquilar primeiramente o próprio canal do
diálogo. E isso pode ocorrem de forma “pandêmica”, contagiante
entre os envolvidos no conflito. Ora, se a cultura do cancelamento
busca calar a liberdade de expressão, por lógica, tende a aniquilar
naturalmente a liberdade de expressão e manifestação do
pensamento.

Guerra de narrativas é uma coisa e cultura do cancelamento é outra.


É preciso compreender isso.
Repita-se que a cultura do cancelamento é uma das ferramentas
com as quais as guerras de narrativas podem se materializar e se
exteriorizar no mundo real, de forma eletrônica ou não. Nesse
prisma, a cultura do cancelamento é naturalmente exclusiva, focada
na imposição da “pena” de ostracismo baseada na intolerância.
Ainda sobre o tema, em razão de todo o exposto, podemos afirmar
que a Cultura de Paz depende do movimento, desenvolvimento e
conscientização de toda a sociedade e, para isso, é preciso a
instauração de políticas públicas inclusivas que fomentem a cultura
de paz como pilar de sustentabilidade.
A propósito, esse é um dos vieses da Agenda 2030 da ONU –
UNESCO para o desenvolvimento sustentável, ao preconizar em seu
preâmbulo que: “Estamos determinados a promover sociedades
pacíficas, justas e inclusivas que estão livres do medo e da violência.
Não pode haver desenvolvimento sustentável sem paz e não há paz
sem desenvolvimento sustentável”.
Cancelar alguém ou sua manifestação, representa nítida forma de
intolerância à própria democracia, pois apenas escolhe-se ouvir um
dos lados, com nítido viés de exclusão do oposto. Com o
cancelamento social, banimento, não há qualquer escuta, muito
menos a chamada escuta ativa, reflexiva, muito menos, empática ou
compassiva. O prejulgamento, o ódio e a intolerância são algumas
características bem claras nos atos que exteriorizam a cultura de
cancelamento. Prejulgamento de valores, de fatos e de imposição da
pena de banimento (ostracismo). Isso impede a adequada tomada de
decisão, especialmente, por parte daquele que realiza o
cancelamento, pois é esse que por algum motivo se recusa a escutar
até mesmo a defesa ou explicação sobre o fato. Ainda que o fato que
tenha motiva o cancelamento seja fakenews, o “cancelador” manterá
a sua posição, isso porque, muitas vezes, não tem ouvidos para
posições diversas, principalmente se houver polarização ou
imposição de estigmas sociais.
Ora, políticas públicas de fomento à Cultura de Paz, decorrem, a
prima facie, do exercício do poder mediante seus representantes ou
diretamente na forma da lei. Estes exercem as tomadas de decisões
por parte do povo.
Assim, bandeiras e ideologias muitas vezes são elementares
decisivas para a seleção de um candidato em eleições. Nascem as
guerras de narrativas políticas, por exemplo, com a emissão de
fakenews, movimentos organizados digitais, exército de robôs e
militantes digitais.
Mas, todo esse movimento de poder pode gerar polarizações, com
fomentos ainda mais evidentes às guerras de narrativas, que, se não
houver um diálogo cooperativo entre os atores sociais, tenderá a
aumentar a competitividade social entre os polarizados, inclusive
ganhando ou perdendo adeptos. Polarizar, em regra, é o avesso ao
gerenciamento de conflitos sociais.
A polarização, em nossa visão, é um problema democrático, pois, ao
se polarizar os grupos sociais, o indivíduo “cancelador”, em regra,
não se mostra empático para a escuta da parte adversa,
prejudicando o seu próprio desenvolvimento heurístico de tomada de
decisões. Sequer tolera ouvir ou ver os argumentos expostos. Não
há, muitas vezes, quaisquer possibilidades de diálogo cooperativo.
Ao contrário, muitas vezes há escalada dos conflitos, inclusive com
picos de violência real contra os oponentes, criando-se estruturas de
confrontos (ou quase-confrontos), baseados no estigma “nós contra
eles”, demonstrando, assim, que a cultura do cancelamento, na
verdade, uma vertente da cultura do ódio.
Com isso, a cultura do cancelamento parece ganhar mais força. O
clima fica previamente preparado pela cultura do ódio e violência
(cultura de não-paz) e o cenário é perfeito para a aniquilação
imediata do mais fraco, impondo-lhe a pena de ostracismo, com seu
sumário cancelamento.
Fomentar a polarização com guerras de narrativas, em especial no
campo da semiótica social, é um grave erro, pois tende a coadunar
as posições antagônicas em uma crise democrática. Ou seja, todo
poder emana do povo, mas se o povo não consegue exercê-lo de
forma consciente poderá acarretar colapsos democráticos, uma vez
que os significados de fatos e revalorizações destes fatos serão
constante motivo de desentendimentos e instabilidades sociais. O
resultado poderá ser danoso ainda nos campos da economia, da
segurança pública e até mesmo dos direitos e liberdades
fundamentais. Nesse “campo de batalha” entram as motivações para
a luta por direitos, o que tende a acarretar escaladas de conflitos e
confrontos.
E, nessa escalada, os canceladores (ainda que robôs digitais ou
contas falsas) aniquilam as posições contrárias e dissonantes.
Há graves riscos de confusões na coleta de informações e, por
conseguinte, no desenvolvimento heurístico da tomada de decisões.
Há riscos, por exemplo, de se polarizar ciência com política, política
com religião, ou religião com ciência, levando os indivíduos à prática
do cancelamento como forma de opressão, muitas vezes, baseadas
em notórios equívocos decorrentes de uma inviável (ou surreal)
polarização.
2.5 A psicologia social e comunitária e a cultura do cancelamento

Ainda sob o enfoque Cultura de Paz e estruturas sociais,


entendemos que a ppsicologia social (seja o viés psicológico ou a
sociológico) ee comunitária têm especial valia nesse contexto, pois
dará maiores enfoques nos conflitos iintrapessoais de modo que os
indivíduos de uma sociedade possam romper suas barreiras
psíquicas rumo a sua reinserção nos movimentos do poder
democrático, além de viabilizar o adequado empoderamento
individual com foco nos reflexos sociais e coletivos.

Romper uma cultura de cancelamento não é nada fácil. Garantir voz


e escuta ativa ao cidadão é essencial para o desenvolvimento social
harmônico.

Empoderar a sociedade contra a política de cancelamento é de suma


importância, pois é essa que detém, por força constitucional, o poder
democrático.

Impor o ostracismo à celebridades, ídolos nacionais, políticos, muitas


vezes, por conta de supostas violações de tabus ou de temas ligados
ao politicamente correto não é a solução. O “desempoderamento” ou
enfraquecimento psíquico social é evidente quando se trata do
assunto de cancelamento social.

Ao apresentar sua opinião contrária a um grupo, todo esse grupo


social se volta contra a pessoa que manifestou a opinião. Isso não é
democracia. Aniquilar uma pessoa (enfim, milhares de pessoas
canceladas em razão de sua opinião) representa uma forma de
“desempoderar”, de retirar o poder (inclusive democrático) de uma
pessoa, de enfraquecer sua voz, de anular a sua voz, seus
argumentos, e até seus direitos de personalidade.

É preciso retomar ou reconstruir o empoderamento social para essas


pessoas e isso pode ser feito com base em estudos relacionados à
psicologia social.
Assim, os estímulos sociais devem ser respondidos e identificados
com seus indivíduos, gerando alternativas e potencialização para o
remodelamento corretivo ou afirmativo de culturas de paz, de
diálogo. Isso porque, os conflitos têm sua essência nos conflitos
intrapessoais que transcendem para conflitos interpessoais, podendo
atingir intergrupais ou até mesmo internacionais.

Calar alguma voz, impondo-lhe o banimento (cultura do


cancelamento) é um dano à sociedade como um todo, pois reflete
um ataque ao próprio poder democrático. A origem essencial dos
conflitos, indubitavelmente, é a mente humana. E nesse mesmo
contexto e inteligência, as alterações de culturas de não-paz para
cultura de paz (e vice-versa) dependem muito da relação indivíduo-
sociedade. A sua inserção consciente nas ramificações sociais, seja
em grupos não organizados ou em coletivos poderá trazer grandes
ganhos nessa transformação socialcultural, desde que seja um grupo
consciente e que esteja disponível ao diálogo cooperativo e
evolucional. Algo próximo ao que ocorre com a sororidade. Ora, se
uma mulher for cancelada pelo simples fato de ser mulher, a
sororidade, entra em campo. A ideia é a mesma em relação ao
cancelamento de opiniões e de atos antidemocráticos. A título de
exemplo, poderia um grupo organizado calar os moradores de um
bairro economicamente necessitado de modo a não atrapalhar a
campanha de um prefeito. É preciso que seja garantido o
empoderamento desses cancelados.

Observar o cancelamento apenas de celebridades não é a solução.


Há cancelados por toda a parte. Há relatos de ataques de militantes
digitais contra dissidentes políticos, contra apoiadores de ideologias
diversas, e tantos outros casos de imposição de cancelamento.

Há casos, também, em que os canceladores denunciam perfis de


redes sociais de modo a suspende-lo e bani-lo de forma e motivos
injustos e deliberados. Ou seja, é uma forma de calar qualquer
movimento ou manifestação oposta à dos canceladores. É uma de
estancar as possibilidades de diálogo.
Os canceladores não podem subjugar aqueles que se manifestam de
forma diversa. O ato de cancelar incide não só contra a pessoa, mas
a todo o seu espectro de pensamento e condutas. O impacto não é
só contra o indivíduo cancelado, mas contra toda a sociedade, pois
há uma política de exclusão (ostracismo) e não de inclusão social.

Daí a razão de erigimos a psicologia social como um dos mais


importantes pilares de evolução humano-social. A sua correlação
com o autoconhecimento, inserção e inter-relação com o meio social
bem como a possibilidade de conscientização política e social podem
ter reflexos diretos na iinclusão efetiva social, sentimento de
pertencimento, identidade sociocultural e, enfim, o empoderamento
individual com reflexos sociais baseados na interdependência dos
indivíduos e na coinfluência dos indivíduos de uma determinada
massa possibilitando-se a manifestação e opção dos interesses que
realmente lhe satisfazem.
2.6 Interesses sociais e cultura do cancelamento

Outro ponto bastante interessante quando estamos diante de uma


política de combate à cultura de cancelamento é reconhecer os
grupos a que pertencemos, de modo, ao menos, de desenvolver o
empoderamento baseado na identidade e sentimento de
pertencimento.

Nessa ótica, a identificação dos iinteresses individuais e a sua


correlação com o grupo social que será incluído é de suma
importância, pois as pposições ou manejos populares, sociais e
políticos apresentados pelo grupo ou suas lideranças podem não
atender as expectativas do iinteresse subjacente do indivíduo. Por
isso, conhecer a fundo os grupos sociais em que está inserido o
indivíduo se mostra como essencial, pois do contrário, poderá
fomentar um posicionamento que não reflete seus interesses. É
preciso uma identidade de interesses ao ingressar em um grupo
social.

Essa identidade de interesses interrelacionais havidos entre pessoa-


grupo garante melhores adequações na legitimidade, no sentimento
de pertença e, enfim, em melhores resultados e fortificações dos
pilares democráticos para a satisfação dos interesses perseguidos
pelo indivíduo.

Isso viabiliza maiores potenciais para lidar com as políticas de


cancelamento social. Isso porque, além do empoderamento, há
fortalecimento das manifestações de pensamentos. Aliás, o núcleo
do alvo dos ataques da cultura do cancelamento é, precisamente, a
liberdade de pensamento e a manifestação de pensamento de modo
a aniquilar, baseado no ódio e na intolerância, o posicionamento
diverso.

Grupo organizado gera, de uma forma ou outra, um certo poder


democrático. Isso por si só, não impede que exista a política de
cancelamento, mas possibilita ao indivíduo pertencente ao grupo
saber lidar com essas situações, inclusive, empoderando-se. Por
exemplo: um indivíduo, em uma reunião aberta, em praça pública,
sugere ao prefeito de uma cidadezinha hipotética uma ideia que vai
contra aos interesses políticos dos grandes empresários da cidade,
mas benéfico aos interesses do povo. Os canceladores darão um
jeito de cancelar este homem, seja com intimidações, insultos, vaias
ou com um nítido cale-se, excluindo-o do cenário da discussão. A
participação, porém, desse homem em um grupo de oposição àquele
que o excluiu, por exemplo, poderá lhe garantir maiores chances do
exercício de manifestação, eis que o grupo poderá lhe possibilitar a
sua inclusão social, um antídoto ao efeito danoso do ostracismo a ele
imposto. Mas, ressalte-se, o grupo acolhedor ou que figure a
identidade deve ser aberto ao diálogo. Do contrário, estaremos
diante, apenas, da continuidade da escalada do conflito. Com a
atuação grupal, há maior poder e, com isso, podem dizer os
significados (semiótica social) em seus círculos e meios sociais. Isto
é, recupera-se a voz ativa que sempre deveria ter sido garantida ao
pobre homem, ainda que sua ideia estivesse equivocada. Daí a
necessidade do diálogo cooperativo, do pensamento crítico e, claro,
meios técnicos de gestão e resolução dos conflitos.

É claro que, socialmente, a atuação em grupo se mostra muito mais


viável sob o aspecto de poder. Assim são os movimentos sindicais,
coletivos partidários, coletivos de minorias, e tantos outros que se
agrupam para o fim de buscar seus interesses legítimos. O problema
nasce quando esses grupos decidem cancelar os demais indivíduos
ou grupos que têm pensamentos diversos ou que estejam sob
controle de algo ou alguém que lhes impeça o pensamento crítico.
Dessa forma, havendo conflitos de interesses, é inegável que as
ferramentas de gestão e resolução de conflitos devem ser facilitadas,
fomentadas, e se necessário, acionadas.

Cumpre ressaltar que o indivíduo que em sua coletividade forma ou


ingressa em um grupo, deve observar a identidade e legitimidade de
causas e propósitos suas e do grupo (aspectos individuais e
coletivos) como forma de verificação de adequação dos interesses.
Lideranças partidárias e inclusão sócio-partidárias podem ser
importantes para as melhorias nas mudanças das Culturas de não-
paz para uma cultura de paz, pois se adequadamente gerenciados
os conflitos, possibilitar-se-á paridade no diálogo e com isso, certa
abertura para transformação dos comportamentos competitivos em
cooperativos em prol dos interesses benéficos à sociedade e,
logicamente, pautados na democracia. E para ter democracia exige-
se o diálogo.

Mas, esses agrupamentos podem, se mal gerenciados, criar graves


escaladas de conflitos ou, até mesmo, tornar os canceladores mais
hostis.

A psicologia social, portanto, se adequadamente trabalhada,


possibilita o rompimento dos muros psicológicos rrepressivos sociais
de forma socializada (política de cancelamento), coletiva e
consciente. Note que o inconsciente social, desenvolvido por Erick
Fromm que pode conter as repressões psíquicas (ainda não
aclaradas e com resultado de desempoderamento, por exemplo)
deve ser abundantemente trabalhado nos indivíduos sociais para a
mudança de um status cultural. Mas, para isso, entendemos que é
necessário a alteração e aclaramento dos inconscientes pessoais
desenvolvidos por Freud.

Aqui não podemos olvidar os ensinamentos de Gustav Le Bom, na


memorável obra Psicologia das Multidões, com a qual demonstrava
que uma multidão organizada tem o condão de alterar a
racionalidade do comportamento, gerando atos que o indivíduo não
inserido na multidão não o realizaria. Esse é um dos efeitos
perigosos no desenvolvimento das alterações culturais e sociais.
Aqui dispomos também da chamada tteoria do contágio, oou efeito
manada, na qual o pseudo-anonimato aparentemente escondido
atrás do véu da multidão tende a aumentar com o tempo e com a
intensidade da autoalimentação dos indivíduos do grupo, ou mesmo
das inter-relações grupo-grupo. Daí a clara necessidade de análises
relacionadas a gerenciamento de conflitos para a condução à paz
social.

A cultura do cancelamento ganha muitos adeptos nessa dinâmica


social, viabilizando a multiplicação de conflitos sociais.

Nesse ponto, é crucial termos em mente que há grandes riscos de


escaladas de conflitos ou confrontos sociais, alguns com riscos de
efeito manada.

Muitos casos de cultura do cancelamento, porém, trouxeram à tona


temas que necessitavam ser aclarados. Talvez, esse seja o único
ponto “positivo” dessa cultura. Porém, ressalte-se que existem
muitas outras formas de trazer pontos obscuros ao debate social,
com respeito à tolerância, no compartilhamento de ideias, com a
escuta ativa e reflexiva social e, assim, transformação social e
cultural baseada na não-violência.

Ainda nessa esteira, cumpre-nos não olvidar que, diante de uma


necessidade de transformação sócio-cultural, por exemplo, é preciso
uma análise de revalorização e ressignificação social, podendo
atingir esferas internacionais, inclusive. E isso pode ser realizado
mediante protestos, passeadas, sistemas midiáticos, dentre muitas
outras formas baseadas em movimentos pacifistas.

Tivemos na história, diversos exemplos de movimentos pacifistas


que geraram protestos contra a cultura de violência e em favor da
defesa dos direitos humanos em vários países.
Inegavelmente, houve tentativas de cancelamento das vozes que
ecoavam nesse mesmo sentido, seja pelo próprio estado ou mesmo
por políticos ou seus adeptos políticos. O que essas vozes ecoam,
em regra, representam o clamor social em prol da paz. Estado que
não dialoga com a sociedade ou não lhe dá voz ativa ou não a
escuta, é um estado cancelador.

Note que quando se iniciou os protestos Vidas Negras Importam,


houve a tentativa clara de cancelar as manifestações. A repressão
policial pode expressar essa dinâmica de cancelamento, também.
Estamos num movimento de estruturas sociais. A repressão sempre
buscará calar a liberdade de expressão dos que se manifestam de
forma diversa. Repressão é a própria característica da cultura do
cancelamento, eis que fundamentadas no mesmo pilar, da
intolerância.

A intolerância, por exemplo, passa a ser uma força motriz das


atividades de repressão à liberdade de expressão ainda que sob a
máscara de necessidade do controle das massas. De fato, a perda
do controle das massas, em especial no que tange a transformação
dessas culturas de não-paz para uma cultura de paz, historicamente,
passam por graves perturbações da ordem social. Aplicar o
canceling aos que se manifestam é uma atitude clara de imposição
da força. O protesto é a própria liberdade de manifestação. A
repressão é o cancelamento dessa liberdade de manifestação. Mas,
certo é também, que do caos nasce uma nova ordem social, novos
significados, novos valores e novos parâmetros de justiça. Note, por
exemplo, que de início, os policiais que assassinaram Floyd seriam
denunciados por um crime menos grave e, após as manifestações,
houve uma reavaliação dos significados e valores daquele fato
homicida, gerando novas diretrizes de Administração da Justiça,
acarretando impactos mais severos ao infrator da lei com nova
tipificação do delito para um mais grave.

As massas, ainda que com efeito manada (com situações


descontroladas pelo mundo todo) geraram: uma nova narrativa que
foi ouvida em razão do empoderamento social; uma nova
ressignificação; uma nova valorização e, por isso, uma nova cultura
de paz, com ou sem desenvolvimento ou alteração do direito
positivado. Essas valorizações e significações são mutantes
conforme a sociedade também o é.

Nesse ponto, tangencia de certa forma com a Teoria Tridimensional


do Direito, de Miguel Reale, pois há fontes materiais com reanálise
conjunta dos fatos, valores e normas.

Por isso, as mutações na sociedade impactam diretamente (ainda


que com o descompasso temporal), na mutação das culturas de paz
e não-paz. Como mencionado em itens anteriores, aquele que tem o
poder poderá ditar os significados sociais (semiótica social). O poder
poderá mudar de mãos em mãos, mas se o povo for empoderado,
com pensamento crítico, com fundamentos informativos e
educacionais adequados para a heurística da tomada de decisão, o
poder será do povo e para o povo, trazendo-se eficácia ao texto
constitucional de que todo poder emana do povo em suas diversas
formas de exercício. Se os governantes estão completamente
empoderados em detrimento da voz do povo, os cidadãos poderão
não ser ouvidos. Porém, se o povo estiver devidamente empoderado,
este terá maiores chances de ser ouvido e, por essa razão, dizer os
significados sociais com remodelações nas estruturas sociais e
impactando na transformação da cultura social. Aqui o poder estará
verdadeiramente com o povo, que ditará os significados de forma
democrática.

A título de exemplo, algumas dessas remodelações das estruturas


sociais decorreram de revoluções mundiais populares, tais como:
Revolução Francesa, Revolução Russa, Revolução Industrial, as
duas Grandes Guerras Mundiais, Revolução ou movimento
Feminista e Movimento Pacifista. No Brasil, a título de exemplo,
podemos citar alguns casos emblemáticos, como a Revolta de
Carrancas (1838), Revolta das Vassouras (1838), Revolta das
Vacinas (1904), Guerra do Contestado (1912 a 1916) o Comício na
Central e a Marcha da Família (1964), Marcha dos Cem Mil (1968),
Grande Greve dos metalúrgicos (1979), Movimento Diretas Já
(1984), Movimento Caras-pintadas (1992), Movimento Passe Livre
(2013), Movimento Vidas Negras Importam (2020), dentre muitos
outros.

Reafirmamos, portanto, que desenvolvimento social democrático e


as respectivas mutações benéficas e positivas das estruturas sociais
(objetivando a construção de uma Cultura de Paz) dependem, em
muito, da educação, da conscientização democrática (racionalismo
social e jurídico), da defesa dos direitos humanos (direitos naturais,
jusnaturalismo), do desenvolvimento do pensamento crítico (com
análise do desconstrutivismo, inclusive) e do empoderamento
individual e social.

Ações afirmativas que promovam a valorização do indivíduo, o seu


reconhecimento, seus direitos, sua voz ativa, a democracia e
inclusões sociais são de suma importância para a evolução
transformativa da cultura de não-paz para uma cultura de paz.

Interessante ressaltar, apenas por curiosidade, que a peacebuilding


da ONU, busca construir as pilastras da pacificação social baseadas
nas estruturas sociais com reflexos na disseminação da cultura de
paz transformativa.

Estes movimentos, remodelações e adequações das estruturas


sociais com impacto e reflexos diretos na cultura vinculada à paz
social são essenciais para a evolução do poder democrático, do
fortalecimento das instituições democráticas e, com isso, viabiliza
maiores chances de sucesso em prol do bem-estar social.

2.7. Teoria Realista do Conflito em Grupo e Teoria da Identidade


Social aplicadas a cultura do cancelamento

A cultura do cancelamento tem certa relação com as teorias de


conflitos grupais. Isso porque a cultura do cancelamento, sendo uma
vertente da cultura do ódio é naturalmente fato gerador de conflitos.

As teorias dos conflitos são de suma importância para a análise


conflitológica, o diagnóstico do conflito e seu adequado tratamento.
A primeira, é a teoria realista do conflito em grupo ou teoria do
conflito realístico (RCT, Realistic conflict Teory). Por essa teoria há
objetivos reais e incompatíveis com o grupo oposto. É uma
disposição de escalonamento do conflito baseada na mais clara
competitividade.

Essa teoria foi desenvolvida pelo psicólogo turco, Mazafer Sherif6 e


demonstra a existência de competitividade entre grupos e a
explicação de sentimentos em comuns, como preconceito e
discriminação tanto endogrupo como exogrupo. As relações positivas
apenas são aceitas se houver identidade de objetivos. É algo muito
próximo a chamada polarização que hoje vivenciamos. A
incompatibilidade, a divergência de interesses são a base dos
conflitos reais intergrupais. Há possibilidade de ameaças reais, com
hostilidades, por exemplo. Nestes casos, as ameaças reais tendem a
escalonar o conflito. Mas, dentro do grupo, há sentimento de
solidariedade mútua e aversão contra o oposto. Há o
desenvolvimento de posições antagônicas intergrupais.

A Teoria do Conflito Realístico demonstrou explicações quanto as


atitudes negativas entre grupos e sua negatividade quanto a
integração racial e para a promoção da diversidade, consoante
estudos realizados pela Michigan National Election Estudies7.
6
Sherif, Muzafer (1966). Group conflict and co-operation: their social psychology.
Londres: Routledge & Kegan Paul.
7Bobo, Lawrence (1983). "Whites' Opposition to Busing: Symbolic Racism or
Realistic Group Conflict?". Journal of Personality and Social Psychology. 45: 1196–
1210

Ora, de fato. A cultura de cancelamento, atualmente assim


concebida, reflete parâmetros muito similares a pesquisa de Sherif,
em especial quando há essa polarização com sentimento de
hostilidade, em especial.

Porém, a Realistic conflict Teory preconiza a ideia de completa falta


de cooperatividade entre os grupos e sinaliza de que todo conflito é
ruim e deve ser evitado.

Entretanto, apenas nesse ponto, discordamos e coadunamos com a


proposição de Simmel (1993)8 ao descrever o conflito como
mecanismo de socialização ou sociação. Vejamos:
8
SIMMEL, Georg, O conflito como sociação. (Tradução de Mauro Guilherme
Pinheiro Koury). RBSE – Revista Mauro Guilherme Pinheiro Koury). RBSE –
Revista 573. ISSN 1676-8965. http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html

"O significado sociológico do conflito (Kampf), em princípio, nunca foi


contestado. Conflito é admitido por causar ou modificar grupos de
interesse, unificações, organizações. Por outro lado, pode parecer
paradoxal na visão comum se alguém pergunta se
independentemente de quaisquer fenômenos que resultam de
condenar ou que a acompanham, o conflito é uma forma de
sociação. À primeira vista, isso soa como uma pergunta retórica. Se
todas as interações entre os homens é uma sociação, o conflito, -
afinal uma das interações mais vivas, que, além disso, não pode ser
exercida por um indivíduo sozinho, - deve certamente ser
considerado como sociação. E, de fato, os fatores de dissociação -
ódio, inveja, necessidade, desejo, - são as causas da condenação,
que irrompe por causa deles. Conflito é, portanto, destinado a
resolver dualismos divergentes, é uma maneira de conseguir algum
tipo de unidade, mesmo que seja através da aniquilação de uma das
partes em litígio.
(...)
Os fenômenos sociais aparecem sob uma nova luz quando visto sob
o ângulo do caráter sociologicamente positivo do conflito.”
Mas, para que haja a transformação de um

conflito social destrutivo em construtivo, ou seja, positivo, é preciso


que haja mecanismos de gestão e resolução de conflitos. Quando se
trata de cultura do cancelamento, por si só, estamos falando de uma
cultura de ódio, de conflito. A dinâmica de tratamento desses
conflitos tem vindo à tona com certa regularidade ultimamente.
Contas de usuários de plataformas que foram derrubadas pelos
“canceladores” ganham mecanismos para a sua recuperação.
Pessoas que foram canceladas, em algumas raras situações tem um
momento de direito de defesa, ainda que rarefeito em suas mídias
sociais. Mas, o problema está na escuta ativa dos “canceladores”
que sequer analisam os argumentos e já os anulam.

Assim, diante da teoria do conflito realístico, podemos aprimorar os


mecanismos de resolução de conflitos manifestados sob a crescente
forma da cultura do cancelamento. O tratamento do conflito deve
buscar a conscientização e educação quanto a conduta ético-social,
baseado numa escuta reflexiva e compassiva.

Teoria da Identidade Social, de outro lado, foi criada por Henri Tajfel
(1972)9, psicólogo polonês.

Por esta teoria, os conflitos intergrupais se patenteiam em raízes


comuns, baseadas na necessidade humana básica de iidentidade.
Essa teoria tem os seguintes fundamentos:
- Identidade social por meio da categorização social: a própria
pessoa faz a análise e define com qual grupo melhor se identifica,
tendo a comunicação como eficiente meio para essa seleção.
9
Tajfel, H. (1972). La catégorisation sociale. In S. Moscovici (Ed.), Introduction à la
psychologie sociale (pp. 272-302). Paris : Larousse.

- O conflito intergrupal surge a partir do momento em que as


diferenças havidas entre os grupos diversos passam a aflorar,
podendo-se atingir status de polarização, inclusive, com a escalada
de conflitos e confrontos;
- A constância do conflito no tempo ou o potencial de seu
enraizamento, surgem ideologias intergrupais de modo a patentear
as posições apresentadas.

Quanto aplicada a cultura do cancelamento, a teoria da identidade


social, inclusive digital, ganha mais adeptos, potencializando as
atuações maléficas advindas do cancelamento social.

Exemplo fictício: Militância Virtual Pró Governo e Militância Virtual


Contra Governo.
Os dois casos, refletem a situação científica defendida por Tajfel
(1978) como comportamentos intergrupais de polarização.
De plano, antes mesmo da aplicação da Teoria da identidade Social,
podemos flertar com a Teoria da Auto-categorização (self-
categorization theory), de Jhon Turner1011, pois essa prediz sobre a
auto seleção em grupos, a busca e reconhecimento de identificação
própria e com o grupo.

O mesmo ocorre com a teoria da autoestereotipagem


(autostereotyping), defendida por Hogg e Turner (1987)12. Aqui,
defendem os autores que na auto-estereotipagem, os indivíduos
selecionam as caracterítiscas positivas e negativas, e buscam
rechaças as negativas.
10Turner, John; Oakes, Penny (1986). "The significance of the social identity
concept for social psychology with reference to individualism, interactionism and
social influence". British Journal of Social Psychology. 25 (3): 237– 252.
11Turner, J. C. (1999). Current issues in research on social identity and self-
categorization theories. In N. Ellemers, R. Spears, & B. Doosje (Eds), Social
identity: Context, commitment, content (pp. 6-34) Oxford, UK. Blackwell

12Hogg, MA, e Turner, JC (1987). "Comportamento intergrupal, auto-


estereotipagem e relevância de categorias sociais". Jornal Britânico de Psicologia
Social .

Mas, nesse processo de auto reconhecimento há uma sobreposição


de identidades do grupo sobre o indivíduo. Ou seja, ocorre o efeito
da despersonalização ao que adere ao grupo. Passa-se a ter uma
identidade única e como tal, unificam as forças contra o que é
diverso ou oposto a essa identidade.

Nasce, assim, o sentimento de pertencimento ao grupo.


A cultura de cancelamento muitas vezes encontra eco nessas
teorias, isso porque podemos perceber claramente que há uma certa
identidade entre os “canceladores”, há uma unidade de desígnios e
objetivos em comum. Mas, há um certo agravante.
Com base nessas teorias, adentramos às abordagens sobre a
influência social ou também conhecida como teoria da influência
informacional, também desenvolvida por Hogg e Turner (1987).

Kruglanski e Webster (1991), preconizam a possibilidade de


utilização do denominado collective cognitive closure, uma forma de
eliminar as ambiguidades do endo ou exogrupo. Ora, nesse ponto,
observamos a potencialidade de que as motivações que envolvem os
participantes do grupo sejam criadas, inclusive, de forma artificial,
moldada. Assim, Kruglanski e Webster (1991) ensinam13:

“ motivação dos membros do grupo para em conjunto, forjarem uma


‘realidade social’ (Festinger, 1959, p.272) genuína, em vez de
concordarem superficialmente por motivos de desejabilidade social
ou relacionados com as características da tarefa (...) A necessidade
de collective closure pode representar a motivação individual de cada
membro para um acordo autêntico no grupo, ou seja, para a
consistência interpessoal entre as opiniões dos membros
relativamente ao tópico de discussão.”
13
Trecho citado em dissertação de mestrado de Eunice Cristina do Nascimento
Castro Seixas, Universidade do Porto, Portugal. P.

Porém, entendemos que nem todo grupo é limitado ou tem seus


membros devidamente reconhecidos. Atualmente, com o advento
das plataformas digitais e redes sociais percebemos que as
identidades endo e exogrupais podem ser por mera simpatia ou
similaridade de ideias e objetivos.

Portanto, nesses dois pontos: grupos formalizados ou específicos e


grupos difusos que ganham e perdem adeptos a todo o tempo.

A cultura do cancelamento parece transitar nesses meios. Percebe-


se que há grupos organizados para a disseminação da cultura do
cancelamento e, percebe-se que existem aqueles que apenas
simpatizam com o ato de cancelar. Outros, porém, agem de forma
mais irracional que a própria irracionalidade do ato grupal, cancela
sem ao menos ter qualquer objetivo, apenas para acompanhar o
modismo de destruição de reputações.
Com isso tudo, faz-nos pensar que a cultura do cancelamento é algo
tão natural quanto a formação de grupos sociais. E de fato, até o
momento, nos parece ser.

Bremer (1993)14, defende dois pilares importantes para a ativação


da identidade social: a necessidade de fazer face aos interesses
opostos; a necessidade de sentir-se incluído.

Há, em nossa opinião, estrita relação entre a formação de grupos


praticantes do canceling, ainda que de forma difusa. Há uma
identidade social que pode ser facilmente encontrada pelos usuários
em suas redes sociais.

O Sleeping Giants é um exemplo atual desse movimento. Trata-se de


um coletivo virtual, um grupo cibernético que visa impor pressão ou
até mesmo boicote às empresas de comunicação que promovam
fakenews ou discurso de ódio.

O principal objetivo foi boicotar o site Breitbart News que atuava com
posicionamentos de extrema direita.

Em todos esses casos, o que percebemos foi que existe uma certa
identidade de desígnios endogrupal e uma diversidade de desígnios
exogrupal. O conflito intergrupal apenas se utiliza da ferramenta
disponível que é o cancelamento, como cultura, portanto.
14
Brewer, M. B. (1993a). Social Identity, Distinctiveness, and Ingroup Homogeneity.
Social Cognition.

As técnicas de gestão e resolução desses conflitos intergrupais


necessitam de novos avanços que acompanhem a dinâmica das
redes sociais, inclusive. Mas, as redes sociais, por exemplo, apenas
são o campo para a prática da cultura do cancelamento, que podem
extrapolar as redes cibernéticas e atingir o universo físico, inclusive.

Quanto a resolução de conflitos baseados na Teoria do Conflito


Realístico temos a seguinte situação:
(Ajuste de página) Teoria do conflito realístico15:
Imagem A.

15
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/94/Teoria_do_conflito
_realistico.jpg

O organograma acima demonstra um fluxo da dinâmica do conflito


intergrupal.
Porém, acreditamos que, atualmente, dispomos de novos tipos de
conflitos: intergrupais difusos.
Nesse ponto, é preciso que exista algum tipo de controle do peculiar
julgamento sumário advindo da cultura do cancelamento, em
especial, nas redes sociais onde muitas situações surgem por
causas remotas inverídicas, ou seja, oriundas de fakenews, por
exemplo.
Em outros casos, devido a polarizações, muitas vezes artificialmente
produzidas, geram constantes discursos de ódio que retroalimentam
a cultura de cancelamento. Há culpados, mas também há inocentes
que sofrem essa ignóbil cultura. A cultura do cancelamento não
pertence a cultura de paz, pelo simples fato de não produzir qualquer
meio eficaz de transformação do conflito negativo em positivo. Ao
contrário, enraíza discursos de ódio concentrados contra suas
vítimas selecionadas. Ademias, em momento algum a cultura de
cancelamento prevê uma forma de implementação de metas e
objetivos comuns. Apenas aniquila a liberdade de expressão alheia.
A cultura do cancelamento se fundamenta na repressão social que
de forma sumária impõe o banimento ou exílio social à vítima.
Essa repressão social parece fazer parte de um direito natural de se
opor à uma pessoa física ou jurídica, palavra, gesto ou qualquer
conduta que julguem os canceladores passível da punição, ainda
que oriunda de uma fakenews ou mesmo sem qualquer oportunidade
de defesa.
2.8 A Cultura do Cancelamento e a psicanálise social

Primeiramente, atendando-se à tipologia dos conflitos, cumpre-nos


recordar que todo conflito nasce na esfera intrapessoal.
A própria constituição da UNESCO, em seu preâmbulo, explicita que:
“"já que as guerras nascem na mente dos homens, é na mente dos
homens que devemos erguer os baluartes da paz".

De fato, o nascedouro dos conflitos é a mente dos indivíduos e é aí


onde se deve trabalhar os pilares da paz, a conscientização e a
educação para o convívio harmônico não só social, mas consigo
mesmo. Daí o porquê defendemos que a psicanálise, dentre outros
fatores, seja um dos grandes fatores para o adequado progresso
humano, seja sob a ótica do indivíduo ou da própria coletividade.
Isso porque, nascido o conflito internamente na pessoa, ele poderá
evoluir a um conflito interpessoal, intergrupal, intragrupal, ou, até
mesmo, internacional.

A busca pela paz, em muito, depende do autoconhecimento.


Acreditamos que as sociedades mais evoluídas, num futuro não
muito distante, poderão alcançar essa característica. Mas, para isso,
os conflitos intrapessoais devem ser trabalhados, ainda que sob o
enfoque de massa, em especial, diante da Era da Informação.

O grande problema é que, embora a sociedade desfrute da


possibilidade de uma Era de informação, o que estamos vendo
cotidianamente e de forma crescente exponencial, é uma EEra de
Desinformação. A regressão da sociedade, sob esse enfoque,
parece conduzir a maior potencialidade de geração de conflitos.
Assim o é a própria cultura do cancelamento e as demais vertentes
da cultura do ódio. O que denominados de Era da Desinformação,
tem por objetivo trazer desconexões entre a realidade dos fatos e as
narrativas impostas. Aqui, na psicanálise podemos aplicar os
conceitos de aalienação social inclusive quanto aos seus desejos e
interesses, lembrando que a não satisfação dos desejos/interesses
pode ser uma premissa para a origem dos conflitos (conflitos de
interesses). Aqui, diante da alienação social, passa a sociedade pelo
fenômeno da normose e ainda, com ausência ou sentimento
enganoso de pertencimento às entidades sóciopolíticas que ditam as
narrativas e significados. A alienação social pode gerar a aceitação
das narrativas com passividade ou ainda, criar sentimentos de
rebeldia fundadas nas narrativas (de qualquer origem, ideológicas,
políticas, religiosas e tantas outras). Por essa razão, a alienação
social, seja oriundas de fakenews ou guerras de narrativas, por
exemplo, servem para controlar a sociedade por aqueles que
manipulam o poder para si. Com a alienação social, é possível
ganhar adeptos a narrativa, pois o pensamento crítico está, de
alguma forma, prejudicado, seja pela desinformação ou pela própria
ausência de desenvolvimento intelectual suficiente para criação de
um pensamento crítico. Nesta esteira, a cultura do cancelamento
pode ganhar forma e força.

De fato, com isso estamos diante de uma verdadeira pandemia do


ódio, com exponencial crescimento de atos moral (no sentido de
causar danos morais) e materialmente violentos que geram danos
constantes, muitos deles indeléveis nas vítimas, sejam físicas ou
jurídicas.

Por essas razões, optamos em descrever esse pequeno tópico


buscando, resumidamente, trazer alguns pontos da psicanálise que
possam refletir ou impactar na cultura do cancelamento.

Como analisado anteriormente, a identidade e identificação são


pontos importantes para o desenvolvimento da cultura do
cancelamento, pois tem o potencial de conglomerar os indivíduos em
massas. Freud (1891), em sua célebre obra, Psicologia das massas
e a Análise do Eu, bem descreve que:
“Quando se fala de psicologia social ou de massas, existe o hábito
de abstrair dessas relações, e isolar como objeto de investigação a
influência que um grande número de pessoas exerce
simultaneamente sobre o indivíduo, pessoas às quais ele se acha
ligado de algum modo, mas em muitos aspectos elas lhe podem ser
estranhas. Portanto, a psicologia de massas trata o ser individual
como membro de uma tribo, um povo, uma casta, uma classe, uma
instituição, ou como parte de uma aglomeração que se organiza
como massa em determinado momento, para um certo fim. Após
essa ruptura de um laço natural, o passo seguinte é considerar os
fenômenos que surgem nessas condições especiais como
manifestações de um instinto especial irredutível a outra coisa, o
instinto social — herd instinct, group mind [instinto de rebanho,
mente do grupo] —, que não chega a se manifestar em outras
situações. Mas podemos levantar a objeção de que é difícil conceder
ao fator numérico um significado tão grande, em que somente ele
seria capaz de despertar, na vida psíquica humana, um instinto novo,
normalmente inativo. Nossa expectativa é então desviada para duas
outras possibilidades: a de que o instinto social pode não ser
primário e indivisível, e de que os primórdios da sua formação podem
ser encontrados num círculo mais estreito como o da família.”
Num sentido bem aproximado, mas, que se

encaixa em nossa análise, Durkheim bem explicita que:


“Tal é, aproximadamente, o estado de um
indivíduo que participa de uma massa. Ele
não é mais consciente de seus atos. Nele,
como no hipnotizado, enquanto certas
faculdades são destruídas, outras podem
ser levadas a um estado de exaltação
extrema. A influência de uma sugestão o
levará, com irresistível impetuosidade, à
realização de certos atos.”
Esse a nosso ver, é um dos grandes fundamentos de análise quanto
ao comportamento do indivíduo quando integrante de uma massa.
Suas condutas podem ser completamente dissonantes de suas
condutas se considerada a sua individualidade destacada do grupo.
A psicologia das massas, também debatida por Lacan e muitos
outros doutrinadores da psicologia social, demonstra que claramente
que o efeito rebanho ou rebanho social possa caracterizar uma força
motriz para condutas que o indivíduo não a praticaria
individualmente. O mesmo, na Era digital, pois o indivíduo, além de
integrar um grupo, ou pensar que integra um determinado grupo seja
pelo sentimento de pertencimento ou pela sua própria análise de
identidade e identificação, o dá empoderamento suficiente para a
realização de práticas e condutas que não o faria na forma individual
ou presencial.
Esse talvez, seja um ponto de “catarse” com o que o indivíduo
consegue emergir suas fraquezas, traumas, recalques, opressões e
outros limiares do inconsciente, tornando-o consciente para, sob o
frágil véu do enganoso anonimato, expressar condutas que jamais
faria presencialmente. A internet e o movimento em grupo, são
caminhos simétricos com o qual essa catarse poderá emergir, seja
potencializada ou empoderada pelos meios midiáticos e redes
sociais, seja pelo manto da interface eletrônica.
Esse a nosso ver, é o real problema a ser debatido, talvez a real
origem da cultura do cancelamento.
Note que ao conjugarmos esses dois elementos: comportamento em
grupo e interface eletrônica (internet), o indivíduo toma para si o
comportamento de instinto social ou de sobrevivência dentro de um
grupo. Nasce assim, a necessidade de curtir, compartilhar e
comentar, por exemplo, em situações que caracterizam a prática da
cultura do cancelamento.
É uma espécie de cartarse digital, com o que são aliados os
afloramentos dos comportamentos de rebanho. Seguir assim, um
líder com o qual se identifica, ainda que seja um mero robô, traz ao
indivíduo a necessidade de adequação do comportamento como
forma de satisfazer a sua necessidade de aceitação e pertencimento.
Aqui, nasce o grave risco de que um líder conduza à prática de atos
de canceling.
Analisando os estudos de Durkheim, Freud e Lacan, notamos que o
indivíduo no grupo, em brevíssimo resumo, parece atuar de forma
hipnótica diante do líder do grupo.
Assim, para Freud há uma identificação do indivíduo com o líder
(identidade vertical) e com os seus pares (identidade horizontal).
Logo, sob esse enfoque, é preciso que tenhamos líderes que tragam
significados de moderação do comportamento social de modo a
combater a prática do cancelamento.
Parece-nos que o problema esteja no comportamento de lideranças
que promovem esses ataques virtuais, por exemplo.
O desenvolvimento de novas lideranças, aliadas a uma
conscientização social de que a prática do cancelamento reflete uma
cultura de ódio e de que isso é fato gerador de conflitos, bem como o
fomento ao sentimento de empatia e humanização das redes sociais,
por exemplo, poderá representar o início da alteração e
transformação da cultura do cancelamento para uma cultura de paz,
baseada, agora, na sustentabilidade das relações e alinhadas à um
progresso social harmônico. Os conflitos, em sua natureza, podem
ser construtivos ou destrutivos. O que precisamos é combater os
conflitos destrutivos e transformá-los em conflitos construtivos, com
os quais as opções de solução possam conduzir ao retorno da paz
social.
Resumindo: os conflitos originam-se de forma intrapessoal e
emergem para conflitos interrelacionais. A internet e o
comportamento em grupo são caminhos ou portais propícios para
que os conflitos de natureza intrapessoal sejam emergidos e até
conduzidos por um líder com o qual se identifique. Estes conflitos
intrapessoais podem encontrar eco com os conflitos intrapessoais de
outras pessoas, gerando o sentimento de pertencimento, ainda que
difuso na sociedade, possibilitando-se a formação doe grupos.
Surgem atos que o indivíduo, em sua individualidade ou
presencialmente jamais realizaria, mas que, inserida no grupo e/ou
“escondida” numa interface eletrônica (como uma catarse emergida
em um confessionário), o pratica, até mesmo em detrimento próprio,
pelo líder ou pelo grupo.
Essa simetria psíquica do comportamento do indivíduo dentro do
grupo poderá ser manipulada pelos líderes. Daí ser tão importante a
análise dos tipos de lideranças para uma adequada gestão de
conflitos sociais.
O desenvolvimento de lideranças que satisfaçam as necessidades
dos indivíduos pode se mostrar como uma ferramenta adequada
para, ao menos, gerir um conflito.
Assim, adotar a cultura do cancelamento, sob o codinome de “ódio
do bem” não é ferramenta hábil para a gestão ou resolução dos
conflitos. Trata-se, sim, de má gestão de conflitos pois não há
qualquer construção, ao contrário, há destruição de reputações, de
vínculos e até mesmo de meios econômicos, dentre muitos outros
danos materiais e morais. Além disso, a cultura do cancelamento,
por ser uma vertente da cultura do ódio, representa a completa falta
de empatia e compromete significativamente o diálogo, não
possibilitando, sequer, o direito de uma justa defesa. Os ataques, em
casos de cultura do cancelamento, são muitas vezes organizados e
em outras semi-organizados, erigidos pela eclosão de catarses
múltiplas que levam o indivíduo a um grupo, ainda que difuso,
pulverizado na sociedade.
Metaforicamente, o comportamento de rebanho é como uma isca
para a eclosão de catarses nos indivíduos, levando-os a busca de
satisfações de suas necessidades profundas, gerando, assim,
identidade e identificação com o grupo ou lideranças grupais.
Nesse sentido, Freud (1920-1923)16, citando Lacan explicita que:
16
Freud, Sigmund (1920-1923) Obras Completas de Freud, Volume 15, Psicologia
das massas e a Análise do Eu, tradução: Paulo César Souza. São Paulo.
Companhia das Letras.

“A massa é impulsiva, volúvel e excitável. É guiada quase


exclusivamente pelo inconsciente. Os impulsos a que obedece
podem ser, conforme as circunstâncias, nobres ou cruéis, heroicos
ou covardes, mas, de todo modo, são tão imperiosos que nenhum
interesse pessoal, nem mesmo o da autopreservação, se faz valer
(p. 20). Nada nela é premeditado. Embora deseje as coisas
apaixonadamente, nunca o faz por muito tempo, é incapaz de uma
vontade persistente. Não tolera qualquer demora entre o seu desejo
e a realização dele. Tem o sentimento da onipotência; a noção do
impossível desaparece para o indivíduo na massa.

A massa é extraordinariamente influenciável e crédula, é acrítica, o


improvável não existe para ela. PPensa em imagens que evocam
umas às outras associativamente, como no indivíduo em estado de
livre devaneio, e que não têm sua coincidência com a realidade
medida por uma instância razoável. Os sentimentos da massa são
sempre muito simples e muito exaltados. Ela não conhece dúvida
nem incerteza.”

Esse enfoque nos conduz a um ponto de salutar importância, o efeito


de legitimação ou busca de legitimação dos líderes, com o que
podem conduzir o grupo a extremos ou a prática de atos extremados
em termos de canceling. Quando falamos em cultura do
cancelamento, temos que ter em mente que essa cultura ou prática
não se limita aos meios digitais (como muitos alegam). Ela pode,
facilmente, extrapolar o universo digital e atingir o meio físico, com
agressões de todas as ordens, físicas, morais e patrimoniais.
Assim, a psicologia social e a sociologia têm fundamental
importância para a identificação e tratamento dessa patologia social
do ódio, com o que denominamos pandemia do ódio.

E é uma pandemia pois tem efeito contagiante e com multiplicação


exponencial de conflitos destrutivos.

Os prejuízos sociais a curto, médio e longo prazo serão


imensuráveis. Por isso, é preciso que sejam desenvolvidas políticas
públicas, desde a primeira infância até os graus mais elevados da
intelectualidade humana de modo a estipular landmarks sociais de
comportamento e de compliance empático-social.

Ressaltamos que não há o denominado “ódio do bem” que tentam


fundamentar ou legitimar a prática do canceling. A prática do
cancelamento é um equívoco social, pois decorre de uma catarse
perigosa por ser acrítica quando inserida no grupo. Os resultados
podem ser imprevisíveis e o pior, controlados por alguém ou algo
(robôs, por exemplo).

Um caso interessante de dinâmica desse impressionante fenômeno


foi a Tay Tweets (@tayandyou), uma personagem que atuou em
redes sociais por poucas horas, baseada em inteligência artificial e
desenvolvida pela Microsoft. Ocorre que a personagem, que tinha
por objetivo desenvolver a inteligência, ao contrário, passou a atuar
por espelhamento social digital. Passou a atuar em linhas
características de uma cultura do ódio, com práticas racistas,
antissemitas, dentre outras. O projeto foi “cancelado” e está em
manutenção.

Mas, o experimento nos traz algo muito construtivo. Parece ser esse
o “termômetro social” desse espelhamento social. E, por ser
espelhamento social, tem potencial de refletir identidades e causar
identificações.

O problema passa a ser mais severo se fosse o oposto. Se a


máquina de inteligência artificial, atuando com técnicas de inbound
marketing, por exemplo, identificasse e formasse os grupos sociais e
os manipulasse. Aqui, a identidade pode ser erigida por catarses,
também, ainda que lideradas por uma inteligência artificial (robôs),
com ou sem fakenews17, conduzindo os pertencentes ao grupo a
tomadas de decisões que não o fariam em sua individualidade ou na
forma presencial.

Tudo isso gera um potencial de crescimento exponencial de conflitos,


com risco de escalada, inclusive. E pior, potencial dominação do
poder democrático por aqueles que detém o poder de ditar as
significações.
2.9 A Estratégia do mal nas redes sociais Inbound marketing e a
cultura do cancelamento

Inbound marketing é uma técnica de gestão de marketing que tem


por objetivo identificar e atrair clientes, seja com marketing de
conteúdo, de mídia social, otimização de mecanismos de conteúdo
ou do denominado branding.

Mas, qual a importância desse tema para a cultura do


cancelamento?
Sim, a cultura do cancelamento é, majoritariamente, concretizada
nos meios digitais. A utilização de ferramentas e técnicas de
marketing digital para a identificação dos indivíduos e também para a
formação de grupos (ainda que estes não saibam que estão
agrupados, metaforicamente, como insetos seguindo uma mesma
luz) podem representar uma estratégia malígna para disseminação
da prática do canceling.
Marketing inbound tem sua essência positiva. Mas, a sua má
utilização poderá trazer danos à democracia e a tomada de decisões
pelos indivíduos ou grupos.
17
A propósito, consideramos que fakenews não é conditio sine qua nom para a
cultura do cancelamento. Ao contrário, são pontos independentes, mas um poderá
potencializar o outro, agravando-se os conflitos sociais, com polarizações.

Por exemplo: Se um político pretende implementar uma determinada


narrativa criada, ainda que desconexa com os fatos reais, poderá se
utilizar dessa ferramenta digital para que os indivíduos identificados
possam ser atingidos e “manipulados”, com sistemas de
comunicação, como blogs, plataformas sociais e mídias digitais.

O marketing inbound tem por objetivo a fidelização do indivíduo-


cliente. Porém, o mesmo poderá ocorrer no marketing político, por
exemplo.

Enfim, aqui ressaltamos que todo o gênero marketing na internet


poderá ser utilizado para finalidades boas ou más, de liberdade ou
de manipulação, inclusive com a dinâmica da programação de
Otimização de Mecanismos de Buscas, com o que de forma
indexada poderá canalizar o indivíduo à apenas uma vertente da
informação (ou desinformação). O direcionamento de informações e
motores de busca, por exemplo, podem induzir à prática do
cancelamento, fomentando, assim, uma cultura de ódio em escalada.

Por isso, quando tratamos da cultura do cancelamento, não podemos


nos esquecer desses pontos essenciais nos tempos atuais, pois
poderão ser os divisores de águas na dinâmica do comportamento
humano relacional e, até mesmo, no exercício “sóbrio” da
democracia.

Quem tem o poder dita os significados e isso se aplica também


àqueles que detém o poder midiático e nas mais diversas vertentes
da internet.

Um episódio bastante interessante ao tema, deu-se nos EUA,


quando Donald Trump publicou em suas redes sociais que: "Eles [as
redes sociais] têm poderes para censurar, restringir, editar, moldar,
esconder e mudar virtualmente qualquer forma de comunicação
entre cidadãos e a grande audiência do público”.

Editou, ainda, o decreto alterando a Communications Decency Act


(CDA) de 1996, especialmente, no que tange a seção 230 que
dispõe sobre a comunicação na internet.

Note aqui que o poder das mídias sociais (empresas provedoras ou


gestoras de conteúdo digital) poderiam manipular informações.
Da mesma forma, baseando-se no exemplo acima, podemos ter
clara noção de que a utilização do marketing digital de forma
manipuladora quanto a narrativas políticas, por exemplo, é possível,
e ainda, com elevado potencial para fomentar a cultura do
cancelamento inclusive com técnicas de leads landing pages.

2.11 Stop Hate for Profit – um paradoxo?


Talvez uma das maiores expressões da cultura do cancelamento e
paradoxalmente contra a cultura de ódio, foi o evento Stop Hate for
Profit, com o qual mais de 1000 empresas boicotaram o facebook por
não censurar uma postagem de Trump. Alegaram que o facebook
não promovia a censura quanto a cultura do ódio. Fato gerou críticas
dos dois lados.

Aqui, vemos, claramente, uma dinâmica equivocada onde o poder


econômico, de uma certa forma, tenta calar também a voz de
outrem. Estaria correta essa ação, sob o ponto de gestão de
conflitos?

Acreditamos que a cultura do cancelamento, como já dissemos


anteriormente, é sim uma vertente da cultura do ódio. No caso em
tela que selecionamos, vemos a cultura do ódio sobrepondo a
própria cultura do ódio. Ou seja, dentro do gênero cultura do ódio, as
empresas com poderio econômico realizaram o boicote econômico
ao facebook (cultura do cancelamento) para que esta empresa de
mídia social providenciasse a censura de postagens relacionadas a
cultura de ódio. Um paradoxo, portanto.

Não temos quaisquer dúvidas de que a cultura do cancelamento


equivale a uma chantagem com o que tenta se impor uma vontade e
satisfação sobre o outro. Isso impede um diálogo aberto e mais
profundo quanto aos temas. A dinâmica de reflexão social, com
informações precisas poderia garantir melhores meios para a gestão
desses conflitos de interesses sem, contudo, tolher manifestações ou
impor censuras de ambos os lados dessa polarização.

Talvez, o desenvolvimento de meios educacionais por parte das


empresas de mídia digital poderia trazer bons frutos, em especial,
para fins de conscientização e fornecimento de informações
relevantes e verdadeiras para que o indivíduo possa em sua
heurística, realizar uma tomada de decisão sensata. Isso acarretaria
uma promoção e evolução do indivíduo na sociedade que como um
todo só teria a ganhar. A título de exemplo, poderia haver maior
conscientização nas redes sociais, com ensinamentos e dicas
fornecidas com o objetivo de combater o hate speech (discursos de
ódio). Além disso, em se tratando de cultura de cancelamento, é
imprescindível que as empresas de mídias e redes sociais
desenvolvam meios eficientes para evitar ou minorar a criação de
conflitos, garantir um stop da escalda dos conflitos e sua reversão,
prevendo técnicas informativas e de conscientização com fins de
gestão e tratamento adequados de conflitos, em especial,
decorrentes da cultura do cancelamento.

3. Conclusão

Em termos genéricos, interpretando-se todo o exposto como um todo


lógico, percebemos que a cultura do cancelamento é, na realidade
uma mera vertente da cultura do ódio, podendo se expressar em
inúmeros campos de atuação, por diversas origens e motivos, com
ou sem guerras de narrativas, mas sempre para atacar alguém. A
cultura do cancelamento não trata o conflito como deve ser tratado.
Contrapõe-se a, praticamente, todas as técnicas de gestão de
conflitos, em especial pelo fato de não separar pessoas do problema.
O problema pode até não existir e ser baseado em narrativas falsas
como fakenews ou decorrente de lideranças que pregam a
desinformação ou sistema de educação de baixa qualidade que
incapacitam os indivíduos de terem pensamentos críticos
suficientemente necessários para lidar com os conflitos.

Além disso, as ferramentas digitais, em especial as ligadas ao


marketing digital, se mal utilizadas, podem fomentar ainda mais a
prática da cultura do cancelamento e suas escaladas conflituosas.
Porém, se utilizadas com um viés neutro, informativo e educacional,
poderá ser uma ótima ferramenta para a evolução social nas redes
sociais.
É preciso, portanto, que exista dinamismo e pró-atividade das
empresas de internet (redes e mídias digitais) para que componha o
grande círculo da educação, informação e pensamento crítico de
modo que todos possam ter uma heurística positiva para as tomadas
de decisões que realmente lhe agradam e que estejam em
consonância om bem-estar individual e coletivosocial.

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