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25.04
Não se trata da justiça de deus com os homens, mas sim aquela que se realiza entre os
homens – essa justiça social apresenta como marco a ideia de bem como centro da
questão ética. Aquele que sofre para a ser a atenção da ética, desta forma, o bem deve
ser exercido sobre aquele que mais carece.
A miséria e a penúria passam a ser de interesse do cristianismo, pois dão substrato para
a noção de justiça.
Segundo Giovanni Reale e Dário Antiseri, a mensagem cristã assinalou, sem dúvida, a
mais radical revolução de valores da história humana.
Bittar e Assis, por sua vez, entendem que a doutrina cristã, em sua pureza originária,
está a indicar a tolerância como sendo o ratio essendi do operar cristão. Isso quer dizer
que se mede o home por suas obras, as obras dos cristão deverão assinalar
benevolência, paciência, tolerância, caridade, compreensão, amor... o que se quer grava
é que a lei do amor e caridade são os preceitos segundos os quais se deve pautar o
comportamento humano.
Assim, o outro é tido em conta, por essa doutrina, como a única condição de salvação
pessoal: se o outro não há caridade, que significa doação de si em proveito de outrem:
sem o outro não há amor, que também só se exerce dentro de uma relação humana...
em outras palavras, somente por meio do outro é que se pode realmente praticar o
amor e a caridade, de modo que o outro é mesmo o mister para o alcance da perfeição
em si.
OBS: enquanto Aristóteles diz que justo é seguir a lei da polis ou dar a cada um o que é
seu; Cristo, por sua vez, diz que o justo é a caridade e a solidariedade para com o outro.
Aristóteles vai dizer que a justiça só é possível na polis, o cristianismo diz que não é
preciso uma polis para ser justo, e nem viver em um estado democrático de direto ou
um estado autoritário platônico, para ser justo com o outro.
1.1. A ética cristã x princípio da reciprocidade absoluta (Lei de Talião)
Uma análise filológica revela que a ideia deriva do latim lex talionis (lex de lei e talis de
idêntico). Comumente a noção de justiça é reduzida à máxima “olho por olho e dente
por dente”.
Um dos exemplos mais claros da lei de talião é o Código de Hamurabi, do séc. XVIII a.C.
OBS: a importância da lei de talião é tão significativa que no próprio Antigo testamento
é possível encontrar sua referência (Êx 21:23-25).
Numa primeira visão, a lei de talião é uma autorização a vingança, retaliação, o justo
parece se confundir com uma forma de violência, mas em verdade, ela buscava
funcionar como limitar a violência, ou seja, quer que o sujeito se limite a fazer com o
agressor exatamente aquilo que foi feito com ele (controle e limitação da raiva).
A lei de talião fazia muito sentido em termos arcaicos, pois antigamente não havia um
ordem estatal.
Ouvistes o que foi dito: olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo:
não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-
lhe também a outra; e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a túnica,
deixa-lhe também a capa. Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com
ele duas.
Há uma noção de justiça que busca fazer com o outro mesmo que ele seja seu agressor.
A justiça cristã faz residir o bem no perdão, na caridade para com o outro, o que está
para além do que se pede ao homem.
Destaca-se que a noção de justiça cristã é severa e de difícil realização, não sendo fácil
para o sujeito deixando a raiava de lado e atuando solidariamente com o seu agressor.
O cristianismo mostra que ser justo não garante felicidade no mundo terreno. De um
comportamento justo não desdobra uma vida feliz, o cristianismo rompe com a noção
grega de eudaimonia.
Para os gregos clássicos a justiça só ocorre na polis e precisa dela, para a justiça cristã
isso não é necessário, desta forma há uma cisão entre a justiça da polis e a justiça da
igreja.
Segundo Franz Rosenzweig, no mundo cristão Estado e Igreja se dividiram desde o início.
Desde então a história do mundo cristão vem sendo realizada na conservação dessa
separação.
O antigo grego viva na dimensão da polis e pela polis, e só sabia pensar dentro dos seus
quadro. Destruída a polis com a expedição de Alexandre da Macedônia, o filósofo grego
refugiou-se no individualismo, sem descobrir um novo tipo de sociedade, e isso pode
ser visto no estoicismo e no epicurismo.
Já o cristão vive na igreja, que não é uma sociedade politica e nem puramente natural.
O advento dele rompe com uma aliança entre estado e religião.
Para a antiguidade clássica grega, romana e egípcia, o chefe do estado era o chefe da
religião - não havia separação entre estado e religião.
Fustel de Coulanges, desta forma, explica que Jesus Cristo ensina que seu reino não é
deste mundo, e separa a religião do governo. A religião, deixando de ser terrena,
mistura-se o menos possível com às coisas da terra. Explica, ainda, que Jesus Cristo
distingue nitidamente Deus e Estado ao dizer “dai a César o que de é de César e a Deus
o que é de Deus”, pois César, nessa época, era ainda o sumo pontífice, o chefe e principal
órgão da religião romana; era o guardião e interprete das crenças e nas mão o culto e o
dogma.
Prossegue o autor explanando que a própria pessoa de César era divina, pois era
precisamente uma das características dos imperadores que, querendo retomar as
atribuições das antiga realeza, não podiam esquecer o caráter divino que a antiguidade
da antiga realeza atribuída aos reis-pontífices e aos sacerdotes-fundadores. Mas eis que
Jesus Cristo rompe a aliança que o paganismo e império queriam renovar e proclamar,
que a religião não é mais só estado, e obedecer a César não é o mesmo que obedecer a
Deus.
O cristianismo consegue eliminar os cultos locais e não toma para si o domínio que esses
cultos tinham exercido sobre a sociedade civil. Professa nada haver em comum entre
Estado e religião e separa tudo o que a antiguidade havia confundido.
Portanto há duas ordens normativas, dois ordenamentos morais, duas ordens jurídicas,
duas sentenças, dois tribunais.
Por outro lado, a instituição eclesiástica tenta regular do mesmo modo a relação do
homem com Deus, mas intervindo na parte visível do pecado, de maneira que o homem
chegue ao verdadeiro e único juízo com uma contabilidade diferente, interior, em que
o pecado seja compensado pelos atos de penitência, pelas orações, pelos jejuns e pelas
esmolas ou ações consideradas equivalentes, impostas pela Igreja. A penitencia não
anula a infração, mas, enquanto confessar ao juiz leva a pena, confessar-se com Deus
leva ao perdão.
2. As origens do humanismo
A Grécia antiga não tinha unidade política, cada uma das cidades detinha autonomia
política e jurídica, como se cada uma delas fosse um país autônomo, desta forma, surge
a ideia de cidade-estado (tamanho de cidade, com autonomia de estado). A única forma
de ser identificar que estava na Grécia era pela língua - era o único aspecto pertinente
a todas as cidades.
Péricles é considera um dos pais da democracia ateniense, mas é incorreto dizer que
toda Grécia conheceu a democracia, a cidades-estados menores sequer passaram perto
da democracia. A primeira cidade democrática também não foi Atenas, e ela também
nem sempre foi democracia.
Em verdade a democracia foi muito criticada, a exemplo das críticas proferidas por
Platão.
Nas leis que nos regem, atenienses, contem-se prescrições tão precisas
como claras sobre todo o processo a seguir na propositura das leis. Antes
de mais, fixam a época em que a ação legislativa é admitida. Em segundo
lugar, mesmo então, não permitem a todo o cidadão exercê-lo à sua
fantasia. É necessário por um lado, que o texto transcrito e afixado à vista
de todos; por outro lado, que a lei proposta se aplique igualmente a todos
os cidadãos; enfim que as leis contrarias sejam derrogadas; sem falar de
outras prescrições, cuja exposição, parece-me, não teria interesse para nós
no momento.
Esse fragmento fala de igualdade, mas não entre todas as pessoas, pois não tinham a
humanidade como centro de sua reflexão, queriam pensar como deveria funcionar a
cidade e não o mundo. Neste sentido, Aristóteles propôs uma definição de cidadão:
Distinguir um ato justo de injusto se apresenta com imensa dificuldade, e vários sentido
foram defendidos sem que a questão perdesse suas características filosóficas.
Uma dessas características identifica o ato injusto como aquele que prejudica uma
pessoa, e uma das pessoas que defendeu isso foi Cícero.
A obra de Cícero é muito criticada pelo seu ecletismo (influência da ética estóica) e
audiência de inovações, contudo é nesse ecletismo que está a utilidade de sua obra, que
é espelho da era helenista. Sua filosofia absorveu doutrinas anteriores e renovou em
pontos determinantes e sutis a uma visão panorâmica e um desses pontos é a justiça.
A natureza é teorizada como divina em sua suprema normatividade, ela determina todas
as coisas, sendo que cabe a cada ser o fim de atuar sua própria natureza: “viver
conforme à natureza” ou “viver segundo os ditames da natureza”.
A natureza que é própria do homem é o logos, a razão. Portanto, o objetivo e o fim de
todo homem será atuar a razão, o logos, enquanto momento e fragmento do logos
divino universal. Segundo Giovanni Reale:
A razão faz do homem um ser feito para viver em sociedade e faz com que a vida social
e racional se equivalham, portanto a razão e a palavras são coordenados para a
construção da sociedade, para a edificação do universo humano; a sociedade é, pois, o
único lugar para que o homem se exercite em todos os sentido, inclusive o moral.
Mas essa sociedade não é um dado já pronto: o que é primitivo no homem é o instinto
de união, e entre a realização do instinto e a realização da sociedade há um dever ser.
Neste dever ser se insere o conteúdo da moral, enquanto conteúdo de atos que edificam
e mantém a sociedade, neste sentido, a virtude é o agir perfeito do homem que
estrutura e mantém o vinculo social natural.
Enfim, não há nenhum ato individual que não interesse a toda sociedade, toda virtude
é social. Quando o homem se torna perfeitamente humano, perfeita também é a sua
retidão de conduta.
Para atualização dessa sociedade contribuem todas a virtudes em uma unidade, como
é possível concluir quando Cícero propôs a descrevê-las em sua singularidade, isto é, ao
descrever a sabedoria, a liberalidade e em especial a justiça, acabou por demonstrar que
cada uma das virtudes se subordina ao seu fundamento social, assim a justiça participa
da perspectiva geral das virtudes de manutenção e edificação do vinculo social. Com
efeito justo é o ato que contribui para a manutenção e edificação do vinculo social –
desta forma, injusto será o ato contrário a sociedade.
Dessa perspectiva Cícero deduziu as duas regras da justiça, que nada mais são do que
formulas para a realização de um horizonte determinado pela natureza, que é a
realização da sociedade.
O primeiro ditame da justiça é ninguém prejudicar a outro, a não ser quando provocado
por um ato injusto; depois, utilizar as coisas comuns em prol das coisas comuns e as
coisas privadas em beneficio próprio.