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A ESTRATÉGIA EMPRESARIAL EM EMPRESAS DO CONTEXTO

EMPREENDEDOR: O CASO DA INDÚSTRIA LATICÍNIO VILA NOVA

Rosane Calgaro Festinalli – PPA/UEL-UEM

Resumo

Este texto tem por objetivo fazer uma análise da definição estratégica de uma organização de
pequeno porte, a partir da abordagem da configuração exposta por Mintzberg (2001). Neste
caso, o enfoque será para o contexto empreendedor que possibilita a identificação de algumas
características do funcionamento da organização com a proposta teórica apresenta pelo autor.
Para isso, serão abordados inicialmente alguns conceitos básicos sobre estratégia, buscando
contemplar uma série de variáveis importantes na compreensão do processo de definição
estratégica das organizações. Posteriormente apresenta-se um breve histórico da organização
em questão. Na seqüência é mencionada a abordagem da configuração de estrutura, segundo
Mintzberg (2001) referindo-se especificamente ao contexto empreendedor, com a
identificação do processo da estratégia da referida organização, enfatizando os aspectos de
liderança e centralização, formação da estratégia e mecanismo de controle. As considerações
finais revelam os riscos presentes na perspectiva adotada para atuação da organização em
estudo.

INTRODUÇÃO

A realização de um estudo que procura descrever a estratégia de uma


organização implica ingressar na discussão de uma questão complexa, a compreensão do
processo da estratégia. As reflexões feitas por alguns autores (Mintzberg, Ahlstrand &
Lampel 2000; Mintzberg & Quinn 2001; Andrews 2001; Porter 1986, 1989) têm trazido à
tona uma série de variáveis não consideradas influentes em abordagens anteriores. Além
disso, uma importância maior tem sido dada às abordagens mais descritivas, que sirvam de
instrumentos para compreensão e análise, sem a preocupação com a prescrição para a
definição estratégica das organizações.
Por esta razão, há necessidade da exposição breve de alguns conceitos sobre
estratégia, tidos como base para compreensão da perspectiva adotada neste trabalho. Os
conceitos aqui apresentados procuram ver o processo da estratégia de forma abrangente, para
então ingressar na abordagem da configuração do contexto empreendedor.
A tentativa da classificação de uma organização inserida em um único
contexto representa um risco que não pode ser ignorado neste texto, pois os contextos são
apenas uma proposta para compreensão das organizações. Não é objetivo deste trabalho
rotular a organização estudada como exclusivamente empreendedora. A proposta é identificar
alguns aspectos da sua atuação presentes na literatura sobre a estratégia e o contexto
empreendedor.
A sistematização do texto prevê, inicialmente a exposição de alguns
conceitos básicos sobre a questão da estratégia que serviram de base para a sua estruturação, e
que procuram esclarecer a perspectiva de estratégia adotada na efetivação do estudo. Na
seqüência, faz-se uma descrição da empresa Laticínios Vila Nova, procurando relacionar
algumas de suas características principais aos conceitos teóricos das empresas do contexto
empreendedor de acordo com Mintzberg (2001). O texto encerra-se com a identificação de
alguns riscos relatados pelos autores e que correspondem também à realidade da empresa.
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A ESTRATÉGIA

Quinn (2001, p. 20) define estratégia como padrão ou plano que integra as
principais metas, políticas e seqüência de ações de uma organização em um todo coerente. A
estratégia quando bem formulada auxilia na alocação dos recursos de uma organização
levando em conta suas competências e deficiências internas e as possíveis mudanças no
ambiente, ou atitudes contingentes realizadas por oponentes. A essência da estratégia é
construir uma postura que seja tão forte que a organização possa alcançar suas metas, apesar
das maneiras imprevisíveis que os concorrentes possam interagir nos momentos de ascensão.
A determinação de uma vantagem competitiva para a empresa está
diretamente ligada à definição da sua estratégia genérica. Esta, a estratégia genérica,
especifica o método fundamental para a vantagem competitiva que a empresa está buscando e
fornece o contexto para as ações em cada área funcional. Assim justifica-se a estruturação de
um plano estratégico amparado pela estratégia genérica. O plano estratégico envolve relações
de ações articuladas com a vantagem competitiva que a empresa tem ou busca conseguir, sem
negligenciar o propósito da estratégia no seu processo de construção (Porter, 1989 p.22).
Mintzberg (2001) apresenta cinco definições de estratégia que podem
auxiliar a direção de pensamentos em um campo tão complexo quanto este:
a) A estratégia como um plano, um curso de ação, um conjunto de diretrizes
com duas características essenciais: o planejamento das ações e o
desenvolvimento consciente e deliberado das mesmas. “Na
Administração a estratégia é um plano unificado, abrangente e
integrado... com a finalidade de assegurar que os objetivos básicos do
empreendimento sejam alcançados (GLUECK apud MINTZBERG,
2001, p. 27)”.
b) A estratégia como pretexto reflete uma manobra específica com a
finalidade de iludir a concorrência. A ameaça, sem a efetiva
concretização, de expansão da capacidade de produção pode inibir a
concorrência que pensa em construir uma nova fábrica.
c) A definição da estratégia como padrão implica em uma seqüência de
ações integrantes de uma correnteza, com consistência no
comportamento. Basicamente, a existência de um padrão de ações que
tanto pode ser planejado como também pode surgir sem suspeita, é a
marca fundamental deste conceito de estratégia.
d) A disposição da organização em uma determinada localização no
ambiente externo caracteriza a estratégia como posição. Neste caso passa
a ser considerada a existência de vários competidores em um mesmo
“campo de batalha”.
e) Conceituar estratégia vai além de olhar para o ambiente externo, por isso,
a quinta definição vê a estratégia como perspectiva. Nesta visão, o ponto
mais importante é a mente do(s) estrategista(s), que na sua percepção e
compreensão do contexto onde está inserida a organização, define as
características e traços que molduram a personalidade da mesma.

Ao tratar de estratégia competitiva, Porter (1989) a define como a busca de


uma posição competitiva favorável em uma indústria. A estratégia competitiva visa
estabelecer uma posição lucrativa e sustentável contra as forças que determinam a
concorrência na indústria. Entenda-se indústria como a arena fundamental onde ocorre a
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concorrência entre empresas de determinado ramo de atividade. “Cada empresa que compete
em uma indústria possui uma estratégia competitiva, seja ela explícita ou implícita. Esta
estratégia tanto pode ter se desenvolvido explicitamente por meio de um processo de
planejamento como ter evoluído implicitamente através das atividades dos vários
departamentos funcionais da empresa” (Porter, 1986 p. 13).
A estratégia empresarial é um processo organizacional, de várias maneiras
inseparável da estrutura, do comportamento e da cultura da companhia na qual é realizada. A
apresentação precisa da estratégia empresarial inclui uma caracterização completa do
direcionamento futuro da organização. Prevê a especificação da linha de produtos e serviços
oferecidos ou planejados pela empresa, dos mercados e os segmentos de mercado para os
quais os produtos e serviços estão sendo formulados ou serão no futuro, assim como os canais
através dos quais esses mercados serão atingidos. Além disso, a definição da fonte dos
recursos que custearão a operação, os objetivos de lucro e a ênfase a ser dada na segurança do
capital versus o nível de retorno. A política principal, nas funções centrais, como marketing,
fabricação, pesquisa, aquisição, pesquisa e desenvolvimento, relações trabalhistas e pessoal,
será declarada, o que distingue a empresa de outras. Também serão incluídos o tamanho do
empreendimento, a forma e o ambiente da organização (Andrews, 2001).
A evolução histórica dos estudos sobre a estratégia tem mostrado que são
vários os elementos constituintes da organização, influenciadores da definição estratégica
empresarial. Aspectos como estrutura, processos, pessoas, orçamentos, ideologia, políticas e
perspectivas ambientais externas fazem parte da operação mais abrangente que envolve a
definição dos rumos da organização.
“Não existe uma “melhor maneira “ de administrar o processo de estratégia.
Uma série de fracassos tem mostrado que as organizações diferem e que, por exemplo,
sistemas de planejamento a longo prazo ou programas de desenvolvimento organizacional
funcionam para algumas empresas mas não para outras. Em virtude disso, a teoria da
administração propõe uma abordagem que defende que o processo estratégico de uma
organização depende da sua configuração (Mintzberg, 2001p. 140,141)”. Os elementos
(estrutura, processos, pessoas, orçamentos, ideologia, políticas e perspectivas ambientais
externas) devem ser integrados para formar uma figura consistente que represente a
organização.
Para compreender a abordagem da configuração é necessário conhecer o
design organizacional que envolve as seis partes básicas da organização. São elas: a) a
essência operacional, responsável pela produção ou prestação de serviços; b) o ápice
estratégico, ocupado por um gerente que coordena todo o sistema; c) a linha intermediária,
que compõe uma hierarquia de autoridade entre a essência operacional e o ápice estratégico;
d) a tecnoestrutura, composta por um grupo de analistas, especialistas que têm posição de
staff, que planejam e controlam formalmente o desempenho dos outros; e) staff de suporte,
responsáveis por serviços internos de lanchonete, seção de malotes e/ou escritório de relações
públicas; f) a ideologia, que abrange as tradições e as crenças que diferenciam as organizações
umas das outras. A configuração tende a ir constituindo-se, compondo assim a estrutura
organizacional, de acordo com o crescimento da organização. O potencial de expansão da
organização é que determina a necessidade de acréscimos em sua estrutura (Mintzberg, 2001).
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Ápice estratégico

Tecno Staff de
Staff de
estrutu suporte
ra Linha
Interme-
diária

Essência Operacional

Ideologia

FIGURA 1 – AS SEIS PARTES BÁSICAS DE UMA ORGANIZAÇ ÃO

FONTE: Adaptação de Henry Mintzberg, O Processo da Estratégia (2001, p. 141).

Esta breve compreensão da abordagem da configuração de estrutura permite


perceber que, conforme a organização evolui o seu design ganha novos componentes. Além
disso, a cada estágio de desenvolvimento o sistema encontra-se inserido em um determinado
contexto. A classificação das organizações por contexto é uma proposta de análise do
processo da estratégia, em algumas situações onde são encontradas determinadas estruturas,
relacionamentos de poder e cenários competitivos. Caracteriza-se por contexto uma situação
particular que indica comportamentos específicos de aspectos como: estrutura, mercado alvo,
pessoas, ideologia, sistema de gestão, produtos e processos (Mintzberg, 2001).

UMA ORGANIZAÇÃO DO CONTEXTO EMPREENDEDOR: A EMPRESA


LATICÍNIOS VILA NOVA

A compreensão do contexto que envolve as organizações empreendedoras


implica, inevitavelmente, mencionar a figura do empreendedor. “O empreendedor é o agente
do processo de destruição criativa, o impulso fundamental que aciona e mantém o motor
capitalista, constantemente criando novos produtos, novos métodos de produção, novos
mercados sobrepondo-se aos antigos métodos menos eficientes e mais caros” (Schumpeter
apud Degen, 1989).
A palavra empreendedor é utilizada para identificar as atividades de quem se
dedica à geração de riquezas, na transformação de conhecimentos em produtos ou serviços, na
geração do próprio conhecimento ou na inovação em diversas áreas. Contempla tanto o
empreendedor da área de negócios como o empreendedor na área de pesquisa e ensino. O
empreendedor é alguém capaz de desenvolver uma visão e persuadir terceiros de que ela
poderá levar todos a uma situação confortável no futuro (Dolabela, 1999).
Freqüentemente as organizações empreendedoras foram fundadas por
indivíduos insatisfeitos com a situação de trabalho em que se encontravam em empresas
maiores, com grandes estruturas e um considerável nível de burocracia. Outro caso, não tão
assíduo, é o de profissionais que iniciam uma pequena empresa e a partir da sua consolidação
como um negócio rentável, passam a participar de outras empresas, até mesmo em ramos de
atividades diferenciados. Assim tornam-se empresários envolvidos em vários negócios ao
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mesmo tempo, todos de pequeno porte, enxutos e flexíveis, que podem ser administrados por
um único gestor. Todavia, não são apenas as pequenas empresas que podem ser classificadas
como empreendedoras, na verdade todas as novas indústrias, que iniciam suas atividades com
uma estrutura simples e um reduzido volume de recursos, podem fazer parte deste contexto.
Mintzberg, Ahlstrand & Lampel (2000, p. 101) afirmam que, “dependendo
do ponto de vista da pessoa, um empreendedor pode ser: a) o fundador de uma organização
(seja ou não um ato de inovação e seja ele ou não um oportunista ou estrategista), b) o gerente
da sua própria empresa, ou c) o líder inovativo de uma organização de propriedade de outros”.
O Laticínio Vila Nova é uma pequena empresa que trabalha na fabricação de
produtos à base de leite, especificame nte queijos. Está no mercado à aproximadamente dois
anos, sendo administrada desde o início das atividades por um gestor que possui também um
outro negócio, em diferente ramo de atividade. A história desta organização pode ser assim
descrita.
Em 1995 iniciou o processo de criação da Associação de Produtores Rurais
de Leite de Mangueirinha. A possibilidade de união dos produtores foi percebida por um
pequeno agricultor que tinha a produção de leite como complemento da renda familiar.
Baseado em um diagnóstico obtido em conversas informais com outros produtores da
redondeza, este percebeu a existência de um problema comum entre eles, o baixo preço de
venda do produto. A partir daí iniciou-se a divulgação da idéia de criação de uma associação,
seguida de reuniões com a participação de alguns produtores.
A efetivação da Associação de Produtores Rurais do Município de
Mangueirinha trouxe benefícios tanto para os produtores como para o comprador do produto
(leite). Para o grupo de produtores, a concentração de maior volume de produto melhorou o
preço de venda, além disso, abriu a possibilidade de compra de equipamentos necessários ao
processo produtivo, para pagamento em produto, com descontos mensais programados.
Aliada à concentração de maior volume de produto está a vantagem percebida sobre o
pagamento do frete, que passou a ser menor, sendo repassado o valor da diferença,
diretamente ao produtor. Já a empresa compradora ganhou na garantia de uma quantidade
mínima de produto, comprada a um preço padrão.
Durante aproximadamente dois anos, não houve registros da atuação da
organização. As primeiras atas foram elaboradas a partir de 1997. A formalização da
Associação dos Produtores Rurais de Leite do Município de Mangueirinha ocorreu em
15/12/1997 com a participação de 26 sócios. A primeira diretoria foi eleita em Agosto/97, por
aclamação, sendo composta por um grupo de quatro sócios que se dispuseram para o trabalho.
Em 1999 houve eleição para uma nova diretoria, assumindo o cargo de presidente da
Associação um sócio que já era empresário e participante da antiga diretoria. Os outros cargos
foram redistribuídos também por alguns membros da diretoria anterior. Isto ocorreu pela falta
de interesse dos demais sócios em assumir a responsabilidade pela organização. Este gr upo
permanece como a diretoria atual, tendo acompanhado toda a estruturação do
empreendimento que se encontra em funcionamento.
Para facilitar a compreensão dos fatos, é necessário fazer um breve
comentário a respeito da situação das empresas que poderiam adquirir o produto oferecido
pela associação de produtores naquela época. Um diagnóstico informal sobre o assunto
revelou que havia cinco empresas como potenciais clientes da associação. Porém, todas elas
apresentavam várias dificuldades de atuação, pois de acordo com argumentos dos seus
proprietários relatados aos dirigentes da associação, o ramo de laticínios é muito instável e
sazonal. Os principais problemas detectados estavam presentes nas deficiências de estrutura
física, máquinas e equipamentos, altos custos de produção, falta de capital de giro, baixo
faturamento e conseqüentemente, atraso no pagamento dos fornecedores1 . Tal situação
encontra-se, inclusive, registrada na ata de reunião da associação ocorrida em 27/02/98.
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Percebe-se assim, que o grupo de associados recebia um reflexo direto da má atuação das
empresas do ramo.
Em função desta situação, os dirigentes da associação, analisando as
dificuldades apresentadas, buscaram uma tentativa de negociação com algumas empresas de
grande porte para fornecimento do produto. Mas, o contato foi apenas inicial, já que as
empresas procuradas não mostraram interesse por considerar pequeno o volume de produto
oferecido pela associação.
A partir disso, o grupo visualizou a oportunidade de um empreendimento,
uma indústria de produtos à base de leite, própria da associação de produtores. A idéia ganhou
dimensão pela percepção de que a associação, mesmo com pouco tempo de atuação, passou a
ser levada em conta no meio político e social. Segundo a visão dos dirigentes, a união do
grupo de produtores facilitaria a disponibilização de recursos para a efetivação do
empreendimento. Em 1998 iniciaram os projetos de criação da indústria. Houve uma grande
preocupação por parte dos dirigentes, para que os pontos fracos das outras empresas do ramo
fossem transformados em pontos fortes neste novo empreendimento.
A preparação da estrutura e das máquinas e equipamentos necessários para a
industrialização estiveram condicionadas, parcialmente, à liberação de recursos de uma linha
de crédito PRONAF 2 . O início das atividades ocorreu em 06/11/2000. Atualmente, o Laticínio
Vila Nova conta com dez funcionários e atua basicamente na produção de queijo, com uma
linha de cinco produtos. A distribuição abrange as regiões Leste e Sudoeste do Paraná.

A RELAÇÃO ENTRE CONFIGURAÇÃO DO CONTEXTO EMPREENDOR E A


ORGANIZAÇÃO EM ESTUDO

Mintzberg (2001) caracteriza a organização empreendedora como uma


estrutura simples, com poucas divisões e quase nenhuma hierarquia administrativa. A
formalização e o uso de planejamento e treinamento também são reduzidos. As decisões
concentram-se no executivo principal, que age de acordo com o seu perfil pessoal. Estes
traços possibilitam a classificação destas organizações como flexíveis e enxutas que atuam em
um contexto externo simples e dinâmico. Quanto à configuração destas organizações,
geralmente apresentam um design de fácil compreensão, composto basicamente pela essência
operacional, a linha intermediária e o ápice estratégico, ainda sem a presença formal da
tecnoestrutura e do staff de suporte, e com a ideologia em construção.

Ápice estratégico

Linha
Interm.

Essência Operacional

FIGURA 2 – A CONFIGURAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO EMPREENDEDORA

FONTE: Adaptado de Henry Mintzberg, O Processo da Estratégia (2001, p. 231).


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A estruturação da empresa em estudo identifica-se com o contexto


empreendedor por se tratar de uma organização simplificada, voltada principalmente para a
essência operacional, onde se concentra a maior parte dos funcionários e também a alocação
de grande parte dos recursos. A linha intermediária é ocupada por um gerente local, que
possui a responsabilidade pelas atividades de produção, sendo incluídas as atribuições de
controle de material, qualidade do produto, custo geral e unitário de produção, fornecimento
de instruções aos funcionários, seleção, contratação e demissão de pessoal e demais atividades
de suporte que se fazem necessárias para a efetivação da parte operacional da empresa.
A atenção especial dada à essência operacional caracteriza-se por, além da
empresa fazer parte do contexto empreendedor tendo uma estrutura simplificada, estar numa
fase de inserção no mercado de queijos. O tempo de atuação, cerca de dois anos, exige um
esforço concentrado na produção para garantir a continuidade equilibrada e eficiente de
produto. Há uma busca pelo alcance de um produto que atenda às principais características
exigidas pelo mercado consumidor que são: consistência, aparência, sabor e preço
competitivo.

LIDERANÇA E CENTRALIZAÇÃO

O contexto empreendedor é identificado na observação de situações em que


um único indivíduo, com uma visão clara e distinta de propósitos, administra uma
organização estruturada para atingir os seus desejos. Normalmente são organizações jovens,
especialmente indústrias novas ou emergentes lideradas por personalidade forte e visionária.
A formulação da estratégia, neste contexto, é um processo bastante informal, que independe
de negociações em grupos ou áreas da organização, não há burocracia e a sua definição fica a
cargo do empreendedor (Mintzberg & Quinn, 2001).
Liderança visionária é uma das principais características das organizações
deste contexto. O processo de liderança ocorre por uma seqüência de ações que podem ser
descritas como repetição, representação e assistência. A repetição é o resultado de um
profundo conhecimento do ramo em que o profissional atua, construindo assim uma
experiência sólida, que lhe serve de inspiração para visualizar o lugar que deseja ser ocupado
pela sua organização. A habilidade de expressar através de palavras e atitudes, a visão
formulada na intuição, reflete a capacidade de representação do líder. Esta fase implica na
compreensão, por parte das outras pessoas da organização, do que se espera deles para a
efetivação da situação desejada. A partir disso, inicia-se a etapa de persuasão e atração, só
alcançada pelo líder, que convence os aliados a trabalharem em prol da sua visão,
concretizando-se a assistência. Este momento também envolve um certo risco, pela alta
concentração de todos os envolvidos em torno de uma única direção (Mintzberg 2001 p. 234).
A visualização da possibilidade de estruturação do empreendimento,
Laticínios Vila Nova, teve influência fundamental do presidente da associação de produtores,
que já possui uma pequena empresa no ramo de comércio de móveis e eletrodomésticos com
mais de uma década de atuação. Este é um caso em que o empreendedor dirige mais de um
negócio ao mesmo tempo. A experiência como empresário lhe serviu como referência para
obter o apoio dos outros produtores participantes da associação na efetivação do novo
negócio. Além disso, os contatos que o líder possuía facilitaram a negociação com outras
organizações das quais a associação dependia para liberação de recursos e posterior instalação
da indústria, principalmente instituições financeiras e órgãos públicos.
Desde a fase de estruturação do empreendimento, bem como durante este
período de atuação, o líder esteve à frente na determinação dos rumos da organização. Mesmo
se tratando de uma associação, com uma diretoria eleita para sua administração e com
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encontros mensais para prestação de contas, as decisões refletem a visão do seu presidente,
que tem o apoio de grande parte dos sócios. Quanto aos demais membros da diretoria, têm
exercido um papel de acompanhamento das atividades, sendo responsáveis pela verificação de
alguns relatórios mensais de controle. As expectativas do líder são transformadas em palavras
e ações, repassadas ao gerente intermediário e executadas, resultando na situação atual da
organização: Uma pequena empresa, com pouco mais de dois anos de atividade, que no
momento não consegue atender a demanda pelos seus produtos, com expectativa de expansão
da capacidade de produção para o ano 2003. A expansão deverá acontecer tanto pela demanda
manifesta pelo mercado quanto pelo aumento no volume de matéria prima (leite) oferecido
pelos antigos sócios e por novos integrantes da associação.

FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA

A concepção de estratégia para as organizações inseridas no contexto


empreendedor é caracteristicamente uma questão de visão. Trata-se de uma representação
mental de estratégia, criada ou ao menos expressa na mente do líder. É uma visão que serve
de inspiração e guia para a busca de uma situação favorável, que ao contrário de um plano
formal, é flexível e adaptável às experiências do gestor. A estratégia empreendedora é ao
mesmo tempo deliberada e emergente: deliberada em suas linhas amplas e seu senso de
direção, emergente em seus detalhes para que estes possam ser adaptados durante o percurso
da organização (Mintzberg, Ahlstrand & Lampel, 2000, p. 98).
Outra característica importante da estratégia na organização empreendedora é
a procura do líder por condições de incerteza, nas quais a organização pode obter ganhos
consideráveis. O crescimento é meta dominante, pois atende ao desejo de realização do líder.
Geralmente a geração da estratégia representa a busca de novas oportunidades, tratando os
problemas como secundários (Mintzberg, Ahlstrand & Lampel, 2000, p. 105, 106).
No caso da organização em estudo, as ações realizadas para a sua efetivação
priorizaram forte atenção nos pontos fracos percebidos em outras pequenas empresas do
ramo, que eram os compradores da matéria prima oferecida pela associação. O presidente,
aqui denominado líder do grupo de produtores, concentrou os esforços da empresa, já a partir
do início das atividades, na superação das fraquezas da concorrência regional. Faz-se
necessário salientar que, por se tratar de uma associação de produtores, a organização dispõe
de algumas vantagens que não são acessíveis para outras empresas, principalmente em relação
ao levantamento de recursos financeiros e máquinas e equipamentos, através de linhas de
crédito específicas.
Um fator que auxilia na compreensão da formação da estratégia nesta
organização é o fato da comercialização dos produtos ter sido iniciada em parceira com outra
empresa da região. Foi uma oportunidade de utilizar o mesmo canal de distribuição, reduzindo
custos de transporte para as duas empresas envolvidas. Porém, a partir da constatação sobre a
excelente aceitação dos produtos no mercado consumidor, e os primeiros retornos concretos
do desempenho da indústria, o líder determinou a independência na comercialização,
passando a utilizar um canal exclusivo de distribuição. A parceria previa a abrangência
somente da Região Leste do Paraná, enquanto que a autonomia proporcionou a expansão
também para as Regiões Oeste e Sudoeste do estado.
É perceptível a preocupação do administrador com a construção de uma
base forte concentrada nos produtores associados, pois a expansão do empreendimento
depende exclusivamente da situação e colaboração destes. A organização recebe o apoio
técnico de alguns profissionais da área de produtos à base de leite, um suporte com orientação
sobre aspectos técnicos do produto e produção da matéria prima.
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De acordo com o levantamento das informações, cabe aqui, relembrando os


cinco conceitos de Mintzberg (2001), a tentativa de classificar a formação da estratégia na
empresa laticínios Vila Nova, também como uma perspectiva, que depende primordialmente
da atuação do líder principal. Os demais integrantes da associação, membros da diretoria ou
não, representam um papel passivo na condução da organização, preocupando-se
exclusivamente em averiguar com os resultados alcançados.

MECANISMO DE COORDENAÇÃO

As organizações efetuam a coordenação das atividades através de alguns


mecanismos básicos. São eles:
a) O ajuste mútuo, que obtém a coordenação do trabalho de maneira
simplificada, por um processo informal de comunicação. É utilizado nas
organizações mais simples por ser uma forma óbvia de coordenação e,
nas organizações mais complexas por ser também uma forma confiável
em circunstâncias difíceis;
b) A supervisão direta, onde um supervisor coordena quando um grupo de
pessoas precisa trabalhar em conjunto. Esta exerce presença mais
marcante nas empresas do contexto empreendedor, pela necessidade de
um líder que forneça as instruções para o trabalho.
c) A padronização, que normalmente ocorre automaticamente, pois as
pessoas seguem padrões para execução das atividades. A padronização
pode ocorrer de quatro maneiras: nos processos de trabalho, nos
resultados, nas habilidades e nas normas (Mintzberg, 2001 p. 141, 142).

A supervisão direta é o principal mecanismo de coordenação da empresa


Laticínio Vila Nova. É realizada pelo gerente local, que acompanha diariamente o andamento
da produção, auxiliando inclusive nas tarefas que requerem maior atenção aos detalhes
técnicos, pois ele é o profissional com maior conhecimento técnico na produção de que ijos
que a empresa dispõe.
Neste caso, quem realiza a supervisão não é o executivo principal, porém
este acompanha os resultados da produção, (custos, volume, oscilações, qualidade do produto,
volume médio de matéria prima recebida, manutenção de máquinas e equipamentos) através
de relatórios diários, apresentados mensalmente que também estão disponíveis para todos os
sócios da organização. É possível também identificar a presença do ajuste mútuo, através da
comunicação informal entre o líder, o gerente lo cal e os demais membros da diretoria.
Quanto à padronização, ainda não é uma realidade nesta empresa, pois o
único mecanismo estruturado para o estabelecimento de padrões, disponível, é um manual
fornecido pela Secretaria Estadual da Saúde. Além disso, a padronização dos resultados
depende essencialmente do equilíbrio da qualidade na produção da matéria prima, que exigirá
um longo trabalho de orientação e conscientização dos produtores associados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma discussão com o intuito de descrever a estratégia de uma pequena


empresa e relacioná-la a um contexto específico, torna necessária também a exposição de
alguns aspectos que colocam a organização do contexto empreendedor em risco, e a sua
relação com o empreendimento em questão.
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A escola empreendedora mostra a formação da estratégia como sendo


inteiramente calcada no comportamento de um único indivíduo, mas o processo para esta
formação é um segredo inserido na cognição humana. Além disso, não expõe uma solução
para os comportamentos descritos como gloriosos e estimulantes. A argumentação de que o
líder empreendedor vê e interpreta uma situação de forma mais positiva que outras pessoas
não está clara. Como podem surgir soluções brilhantes para problemas complexos, que tem
uma considerável dependência do ambiente externo? Será só uma questão de visões
diferenciadas entre otimistas e pessimistas? As empresas empreendedoras estão com o futuro
na imaginação do seu líder, o que as torna um tanto suscetíveis à diversos problemas como:
aposentadoria, morte acidental, transferência de uma organização para outra. Além disso, a
centralização das decisões pode afastar o líder das atividades estratégicas em função das
operações mais rotineiras. O processo contrário também pode ocorrer, com ênfase excessiva
na estratégia genérica e abandono dos detalhes operacionais, tendo reflexo direto no produto
final (Mintzberg, Ahlstrand & Lampel, 2000).
Para o caso da empresa Vila Nova, vale lembrar que a característica principal
é sua constituição como associação de produtores que têm objetivos comuns. Mesmo assim,
pode-se perceber durante o texto que há uma identificação com as empresas do contexto
empreendedor, principalmente quando se observa o comportamento do executivo principal.
Esta constatação revela um ponto positivo importante, pois de acordo com as informações
obtidas, o bom desempenho da empresa até o momento se deve em grande parte, à atuação do
líder. Todavia, isto também propicia a visualização de algumas ameaças para o futuro da
organização.
Esta constatação abre a oportunidade para as contribuições de DEMO
(1996), acerca do exercício do poder no associativismo. O aspecto da liderança exerce forte
influência na continuidade da associação. Por isso, convém esclarecer que o rodízio no poder
contribui para um processo democrático de evolução. Mas, a mudança da direção deve
proporcionar a evolução da organização, priorizando sempre os interesses dos sócios. Esta
transição deve fazer parte das preocupações sobre o futuro, podendo ser abordadas em
reuniões programadas para este tipo de discussão. A preparação de pessoas que tenham
interesse na direção é um processo um tanto longo que necessita de abertura e disponibilidade
dos envolvidos para acontecer. A administração de uma associação é algo especial, já é uma
arte construir uma associação dinâmica, mas a arte maior está em mantê- la viva e atuante.
Portanto, é possível constatar que a existência de um líder no comando da
organização, que atua de acordo com a perspectiva do contexto empreendedor pode
proporcionar resultados positivos em um curto período de tempo. Por outro lado, a
dependência exclusiva da atuação do empreendedor, principalmente no caso da organização
em estudo caracterizada como associação, traz alguns riscos que devem considerados quanto
ao planejamento de longo prazo do rumo a ser tomado. A transição do poder no Laticínio Vila
Nova não é um assunto presente nas discussões internas da associação.

Notas
1
Estas informações foram obtidas no depoimento de um dos fundadores da associação, que atuava
diretamente nas negociações com as empresas e, posteriormente passou a atuar como funcionário de
uma delas, portanto, viveu na prática o desempenho complicado da empresa.
2
PRONAF é o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar do Ministério do
Desenvolvimento Agrário.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDREWS, Kenneth. O conceito de estratégia empresarial. In: MINTZBERG, Henry &


QUINN, James B. O processo da estratégia. Porto Alegre, Bookman, 3ª ed. 2001, p. 58-64.
DEGEN, Ronald. O empreendedor – fundamentos da iniciativa empresarial. São Paulo,
Makron Books, 1989.
DEMO, Pedro. Participação é conquista – 3ª ed. – São Paulo: Cortez, 1996.
DOLABELA, Fernando. Oficina do empreendedor – a metodologia de ensino que ajuda a
transformar conhe cimento em riqueza. São Paulo, Cultura, 1999.
MINTZBERG, Henry & QUINN, James B. O processo da estratégia. Porto Alegre,
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