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11/04/2019
1. Panorama do uso dos termos hekon e akon na língua grega (Rickert, 1989, p. 7-34, 79-90).
A. Na maior parte dos casos, diz-se na literatura grega de um agente que ele agiu de forma
involuntária quando se imputa sua ação à forca ou necessidade (bia ou ananke). Este termo, no
entanto, deve ser compreendido num sentido largo. Dentre estes casos estão incluídos as ações
que são:
a1. Feitas sob ameaça, p.ex. no começo do Prometeu Acorrentado de Ésquilo, Hefesto diz a
Prometeu que o está acorrentando involuntariamente, i.e. que só o está fazendo por estar sob
ordens e ameaças de Zeus (18-23).
a2. Feitas por medo de males maiores, p. ex. numa passagem de Tucídides os atenienses
afirmam que não violaram os costumes voluntariamente (ekontes) mas por necessidade, pois
tiveram de se utilizar dos recursos de um santuário para se defender de um ataque e evitar a
morte (IV 98, 1-6).
a3. Motivadas por paixões supostamente incontroláveis ou fortes demais, p. ex. nas linhas de
Teógnis que dizem: “Eu amo um rapaz de pele lisa que tem por hábito me expor na frente de
todos os amigos. Eu aguentarei involuntariamente (aekousia) muitas coisas sem esconder-me.
Pois não é um rapaz feio o que eu amo” (1341-1344).
a4. Sofridas de forma absolutamente passiva, tais como ser carregado (HDem 66-72, 122-125),
contido (Pr. Ac. 12-20) e golpeado (HDem 407-413).
B. Nem sempre que se reconhece um papel decisivo à necessidade em uma ação se supõe que
ela seja feita ou deva ser feita de forma involuntária, p. ex.
b1. No Agamemnon de Ésquilo o Coro roga a Cassandra que ceda voluntariamente à
necessidade e atenda ao chamado de Clitemnestra para entrar na casa de Agamemnon (1070-
1071).
b2. Numa passagem de Tucídides (IV 58, 2-3) se afirma que o povo de Platéia se rendeu
voluntariamente aos espartanos depois que seus mantimentos acabaram e eles não podiam mais
resistir ao cerco montado por seus inimigos.
C. Em alguns casos diz-se também que um agente agiu de forma involuntária quando ele
cometeu um erro causado pela ignorância, p. ex.
c1. Em As Traquíneas de Sófocles se diz por três vezes que Deianira deu veneno
involuntariamente a Hércules, pois ela acreditava se tratar de uma poção do amor (727-729,
935, 1123).
c2. No final do Hipólito de Eurípides a deusa Ártemis vem reconciliar Hipólito e Teseu dizendo
ao filho, Hipólito, que o pai, Teseu, agiu involuntariamente quando pediu a Poseidon pela
morte do filho pois achava que Hipólito tinha estuprado e causado o suicídio de Fedra, mulher
de Teseu (1431-1439).
D. Numa passagem de Tucídides (Hist. III, 40), Cleonte afirma que os atos involuntários devem
ser perdoados. Trata-se de uma afirmação que se pode encontrar também em numerosas
tragédias (p. ex. no fim do Hipólito de Eurípides, Ártemis pede a Hipólito que perdoe seu pai),
e que parece pressuposta por uma parte significativa dos usos dos termos na literatura.
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3. A teoria aristotélica do ato voluntário (EN III 1)
3.2.3 As semelhanças entre estes dois sentidos de responsabilidade (Jonas 1995, 162-163)
Estes dois sentidos dizem respeito a conta a pagar ex-post-facto pelo que é feito, mas não com
a determinação do que se há de fazer. Eu sou responsável pelo meu comportamento e por suas
consequências, mas não pela coisa que exige minha ação.
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A responsabilidade assim compreendida não põe fins, sendo a mera carga formal que pesa
sobre toda ação causal e que afirma que se pode pedir contas acerca delas. Ela é, pois, a
condição prévia da moral, mas ela mesma ainda não é moral.
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As ações deste tipo são mistas mas elas se parecem mais com as ações voluntárias, pois elas
são escolhidas no momento em que agimos, o fim da ação varia com a ocasião e nós dizemos
que as ações são voluntárias ou involuntárias em relação ao momento da ação. Fazemo-las,
portanto, voluntariamente, pois o princípio do movimento das partes instrumentais à realização
da ação reside no agente, e quando o princípio reside no agente está em seu poder fazer ou não
fazer a ação. Tais ações são portanto voluntárias, embora talvez sejam involuntárias
absolutamente, pois ninguém jamais escolheria tais ações em si mesmas e por si mesmas. (EN
1110a11-20).
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ignorando uma delas age involuntariamente. Talvez então não seja inapropriado determina-las,
quais e quantas são: quem age, o que faz, sobre o que ou em que age, por vezes com o que age
(por exemplo, com um instrumento), com vistas a que (por exemplo, com vistas à salvação) e
como age (por exemplo, calma ou violentamente). (EN 1110b25-1111a6).
A ignorância incide sobre todas estas circunstâncias nas quais se desenrola a ação; aquele que
ignora uma delas parece ter agido involuntariamente sobretudo entre as circunstâncias mais
importantes; o fim parece ser sumamente importante entre as circunstâncias nas quais ocorre a
ação. (EN 1111a15-19).
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(a) A deliberação é sobre as coisas que estão sob nosso controle, nos são alcançáveis através
de ações (EN 1112a30-35) e sobre as quais o saber não determina totalmente o rumo que deve
ser tomado (EN 1112b1-12).
(b) A deliberação diz respeito aos meios, e não aos fins, e procede da seguinte maneira: caso
se perceba que existem vários meios de alcançar o mesmo fim, considera-se qual o alcançará
melhor e mais facilmente, e se houver apenas um, por que meios este meio deve então ser
alcançado, e assim sucessivamente até que se encontre aquilo que precisa ser feito (EN
1112b13-24).
(c) Toda prohairesis é consequência de uma deliberação, e o objeto que é escolhido é o mesmo
que foi selecionado na deliberação, e que é desejado em consequência da deliberação (EN
1113a9-14).
Referências
Jonas, H. 1995. El principio de responsabilidad: ensayo de una ética para la civilización
tecnológica. Barcelona: Herder.
Platão. 2002. Diálogos: Protágoras - Górgias - Fedão. Translated by C. A. Nunes. Belém:
Editora Universitária UFPA.
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Plato. 1983. Lysis, Symposium, Gorgias. Translated by W. R. M Lamb. London: Harvard
University Press.
———. 2002. Protagoras: Translated with Notes by C.C.W. Taylor. Translated by C. C. W
Taylor. Oxford: Clarendon Press.
Rickert, Gail Ann. 1989. Hekon and Akon in Early Greek Thought. Atlanta: Scholars Press.