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Interdisciplinar

Ciência da Natureza e Realidade

Franklin Nelson da Cruz


Gilvan Luiz Borba
Luiz Roberto Diz de Abreu
Ciência da Natureza e Realidade
Franklin Nelson da Cruz
Gilvan Luiz Borba
Luiz Roberto Diz de Abreu

Interdisciplinar

Ciência da Natureza e Realidade

3ª Edição

Natal – RN, 2012


Governo Federal
Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff

Vice-Presidente da República
Michel Miguel Elias Temer Lulia

Ministro da Educação
Aloizio Mercadante Oliva

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN


Reitora
Ângela Maria Paiva Cruz

Vice-Reitora
Maria de Fátima Freire Melo Ximenes

Secretaria de Educação a Distância (SEDIS)


Secretária de Educação a Distância Secretária Adjunta de Educação a Distância
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo Eugênia Maria Dantas

FICHA TÉCNICA

COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS EDITORAÇÃO DE MATERIAIS


Marcos Aurélio Felipe Criação e edição de imagens
Adauto Harley
Anderson Gomes do Nascimento
GESTÃO DE PRODUÇÃO DE MATERIAIS Carolina Costa de Oliveira
Luciana Melo de Lacerda Dickson de Oliveira Tavares
Rosilene Alves de Paiva Leonardo dos Santos Feitoza
Roberto Luiz Batista de Lima
Rommel Figueiredo
PROJETO GRÁFICO
Ivana Lima
Diagramação
Ana Paula Resende
REVISÃO DE MATERIAIS Carolina Aires Mayer
Revisão de Estrutura e Linguagem Davi Jose di Giacomo Koshiyama
Eugenio Tavares Borges Elizabeth da Silva Ferreira
Janio Gustavo Barbosa Ivana Lima
Jeremias Alves de Araújo José Antonio Bezerra Junior
Kaline Sampaio de Araújo Rafael Marques Garcia
Luciane Almeida Mascarenhas de Andrade
Rossana Delmar de Lima Arcoverde Módulo matemático
Thalyta Mabel Nobre Barbosa Joacy Guilherme de A. F. Filho

Revisão de Língua Portuguesa


IMAGENS UTILIZADAS
Camila Maria Gomes
Acervo da UFRN
Cristinara Ferreira dos Santos
www.depositphotos.com
Emanuelle Pereira de Lima Diniz
www.morguefile.com
Janaina Tomaz Capistrano
www.sxc.hu
Priscila Xavier de Macedo
Encyclopædia Britannica, Inc.
Rhena Raize Peixoto de Lima
Rossana Delmar de Lima Aroverde

Revisão das Normas da ABNT


Verônica Pinheiro da Silva

Catalogação da publicação na fonte. Bibliotecária Verônica Pinheiro da Silva.

Cruz, Franklin Nelson da.


Ciências da Natureza e Realidade / Franklin Nelson da Cruz, Gilvan Luiz Borba e Luiz
Roberto Diz de Abreu. – 2. ed. – Natal: EDUFRN, 2012.

330 p.: il.


978-85-7273-995-5

Disciplina interdisciplinar nas grades dos cursos a distância da UFRN.

1. Ciência. 2. Tempo. 3. Terra. 4. Bioma. 5. Nordeste. I. Borba, Gilvan Luiz. II. Abreu,
Luiz Roberto Diz de. III. Título.
CDU 001.1
C955c

© Copyright 2005. Todos os direitos reservados a Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – EDUFRN.
Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa do Ministério da Educacão – MEC

Ci_Nat_pretext.indd 2 21/12/12 15:37


Sumário

Apresentação Institucional 5

Aula 1 Situando a Ciência no Espaço e no Tempo 7

Aula 2 A Terra – litosfera e hidrosfera 27

Aula 3 A Terra – atmosfera 53

Aula 4 Bioma Caatinga – recursos minerais 73

Aula 5 Bioma Caatinga – recursos hídricos 93

Aula 6 Bioma Caatinga – recursos florestais e fauna 117

Aula 7 Interação Sol-Terra: fluxos de Energia 135

Aula 8 Clima e tempo 155

Aula 9 O Homem – origens 179

Aula 10 A Hipótese Gaia 205

Aula 11 Poluição 227

Aula 12 Ciência e ética 247

Aula 13 Ciência, Tecnologia e Sociedade 261

Aula 14 Universo: uma breve apresentação 285

Aula 15 O Nordeste, o homem e a seca: natureza de uma realidade 305


Apresentação Institucional

A
Secretaria de Educação a Distância – SEDIS da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte – UFRN, desde 2005, vem atuando como fomentadora, no âmbito local, das
Políticas Nacionais de Educação a Distância em parceira com a Secretaria de Educação
a Distância – SEED, o Ministério da Educação – MEC e a Universidade Aberta do Brasil –
UAB/CAPES. Duas linhas de atuação têm caracterizado o esforço em EaD desta instituição: a
primeira está voltada para a Formação Continuada de Professores do Ensino Básico, sendo
implementados cursos de licenciatura e pós-graduação lato e stricto sensu; a segunda volta-se
para a Formação de Gestores Públicos, através da oferta de bacharelados e especializações
em Administração Pública e Administração Pública Municipal.
Para dar suporte à oferta dos cursos de EaD, a Sedis tem disponibilizado um conjunto de
meios didáticos e pedagógicos, dentre os quais se destacam os materiais impressos que são
elaborados por disciplinas, utilizando linguagem e projeto gráfico para atender às necessidades
de um aluno que aprende a distância. O conteúdo é elaborado por profissionais qualificados e
que têm experiência relevante na área, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O material
impresso é a referência primária para o aluno, sendo indicadas outras mídias, como videoaulas,
livros, textos, filmes, videoconferências, materiais digitais e interativos e webconferências, que
possibilitam ampliar os conteúdos e a interação entre os sujeitos do processo de aprendizagem.
Assim, a UFRN através da SEDIS se integra o grupo de instituições que assumiram
o desafio de contribuir com a formação desse “capital” humano e incorporou a EaD como
modalidade capaz de superar as barreiras espaciais e políticas que tornaram cada vez mais
seleto o acesso à graduação e à pós-graduação no Brasil. No Rio Grande do Norte, a UFRN
está presente em polos presenciais de apoio localizados nas mais diferentes regiões, ofertando
cursos de graduação, aperfeiçoamento, especialização e mestrado, interiorizando e tornando
o Ensino Superior uma realidade que contribui para diminuir as diferenças regionais e o
conhecimento uma possibilidade concreta para o desenvolvimento local.
Nesse sentido, este material que você recebe é resultado de um investimento intelectual
e econômico assumido por diversas instituições que se comprometeram com a Educação e
com a reversão da seletividade do espaço quanto ao acesso e ao consumo do saber E REFLETE
O COMPROMISSO DA SEDIS/UFRN COM A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA como modalidade
estratégica para a melhoria dos indicadores educacionais no RN e no Brasil.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


SEDIS/UFRN

5
Situando a Ciência
no Espaço e no Tempo

Aula

1
Apresentação

E
sta é a primeira aula da disciplina Ciências da Natureza e Realidade. Pretendemos viajar
pelo mundo, percebendo-o com um olhar físico, químico e biológico, abordando temas
relativos à natureza. Dessa forma, veremos que a ciência está presente em nosso dia-
a-dia em situações e acontecimentos dos quais muitas vezes, não nos damos conta. Durante
esse percurso, teremos o privilégio e o prazer de desenvolvermos juntos uma visão mais crítica
da realidade, ou seja, um olhar científico. Boa viagem!

Objetivos
Após estudar o material correspondente a esta aula, esperamos que
você seja capaz de:

dissertar sobre as diferenças entre as várias formas de


1 explicar a natureza;

identificar alguns dos ramos das ciências naturais e


2 suas características;

classificar e diferenciar conceitos, informações e


3 hipóteses, como sendo científicos ou não.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 9


Situando a Ciência no
Espaço e no Tempo
O que você mais gosta de fazer quando chegam as férias ou um feriado prolongado?

Se respondeu viajar, ir para outro lugar, você faz parte da maioria das pessoas do mundo.
Por isso, dispomos de tantas estações rodoviárias, aeroportos e portos.

Somos andarilhos por natureza. Gostamos, e como gostamos de nos locomover!

Esse comportamento, que vem desde a Pré-História, permitiu que ocupássemos todos os
recantos do nosso planeta: das geleiras polares aos tórridos desertos africanos, das savanas
do oeste americano aos sertões nordestinos, das florestas tropicais aos plácidos litorais.
Também nos levou a mergulhar nas profundezas oceânicas e a alçar vôos em direção à Lua; a
construir “casas no espaço”, as chamadas estações espaciais, que giram continuamente em
volta da Terra a uma altura aproximada de 400km com velocidades superiores a 15000km/h
(quinze mil quilômetros por hora); e a enviar naves para outros planetas, sonhando com
viagens interestrelares.

Viajar, conhecer lugares, falar sobre as viagens, registrar fatos e impressões... Foi e é
assim que deixamos marcas de nossa passagem pelo planeta. Graças a esse costume é que
conseguimos fazer a História. Hoje, por exemplo, podemos “rastrear” o percurso que o homem
pré-histórico fez para chegar ao nordeste brasileiro.

A citação a seguir apresenta sucintamente a questão da chegada do homem ao Nordeste.


Leia-a para ter uma idéia de quão distante é nossa provável origem.
Peabiru e Marapés A professora Maria da Conceição Beltrão, arqueóloga do Museu Nacional, afirma ser
possível reconhecer, hoje, elos fundamentais que interligam a Pré-História e a História
Caminho, primitiva via
no processo dos assentamentos humanos em nosso território, e que corresponderiam ao
indígena de comunicação
pré-colonial, era chamado
enorme sistema viário pré-cabralino conhecido como o conjunto de Peabiru e Marapés
de Peabiru ou Peabiyú, [grifo nosso]. E acrescenta: “Considerando que a entrada do homem na América do Sul
e os assentamentos ao se deu através de um corredor livre de florestas, entre os Andes e a atual Amazônia, ali
longo desses caminhos se observaram superposições humanas, bem como conseqüentes pólos irradiadores do
de marapés, pelos índios, desenvolvimento econômico. Esse processo se verifica em dois sentidos. A partir do alto
e “caminho de São
Juruá (AM), situado em pleno corredor migratório, as correntes humanas buscam o litoral
Tomé” pelos Jesuítas.
Encontrando caminhos
atlântico, alcançando-o na altura de Pernambuco; e uma segunda onda, na direção do
existentes antes da vinda Sudeste, que se estende até São Vicente. Esse grupo se encarregaria de atingir o planalto
dos conquistadores meridional e, depois, pela costa, o Nordeste (GALDINO, 2002, p.5-6).
europeus, os jesuítas o
atribuíram à intervenção Você deve ter percebido, de acordo com o texto, que o homem pré-histórico chegou ao
do sobrenatural, e nordeste vindo dos Andes através de trilhas que cortavam as florestas. As marcas dessa viagem
concluíram que foram
foram deixadas para trás e hoje arqueólogos junto com outros pesquisadores conseguem
feitos por milagres,
apenas com a passagem mapear e resgatar essa história.
do apóstolo Tomé.

10 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


ESTREITO DE BERING
5.000 km

A B

PATAGÔNIA

Figura 1

A Figura 1 mostra uma possível rota migratória para a chegada do Homem ao Continente
sul-americano. Esse modelo propõe que oriundo da Ásia e atravessando o estreito de Bering,
o Homem chega tanto ao sul do nosso continente, a Patagônia, quanto ao nordeste brasileiro.

Atividade 1 Datações

Processo usado para


identificar a idade de
materiais muito antigos.
Existem diversas formas
de datação, entre elas a
Usando a escala indicada no lado direito da figura, determine a distância
que usa o carbono. Essa
aproximada percorrida pelo Homem desde o estreito de Bering até o litoral técnica é muito usada
brasileiro. Datações com o C14 (isótopo radioativo do carbono) realizadas com para datação de material
orgânico. Os seres vivos,
material encontrado ao longo desse percurso indica que a viagem demorou cerca
ao respirar, absorvem
de 10.000 anos. Sabendo que a velocidade média de um corpo é dada pela razão junto com o Carbono 12,
entre o espaço percorrido e o tempo gasto para percorrê-lo, estime a velocidade uma fração de Carbono
14, que é radioativo. Ao
média da migração do homem pré-histórico em sua caminhada para o nordeste.
morrer, isto é, ao parar de
respirar, a quantidade de
Carbono 14 alojada nos
tecidos do ser diminui
com o tempo, quanto
mais antigo, menor a
quantidade de C14.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 11


Outros animais que compõem a fauna de nosso planeta, em maior ou menor escala,
fazem suas migrações, por exemplo, algumas espécies de baleias que se aproximam da
costa brasileira em época de acasalamento. Essas migrações, em geral, são provocadas por
mudanças climáticas ou necessidade de reprodução. O homem, porém, é motivado em suas
andanças pelo planeta por diversos fatores, além dos climáticos.

Um dos principais aspectos que nos diferencia dos outros organismos vivos é nossa
competência para resolver problemas e armazenar vivências, acumulando conhecimentos, os
quais demonstram nossa capacidade de memória e de ação sobre a realidade. Esse processo
é possível devido ao desenvolvimento de um complexo sistema nervoso em nossa espécie,
que herdamos e aperfeiçoamos de nossos ancestrais.

Atividade 2
Pesquise e responda.

Você sabe o que é migração e imigração? Procure num dicionário o


1 significado dessas palavras.

Você conhece alguém, ou mesmo uma família, que tenha vivido um


2 processo de imigração? De onde vieram? Quais foram os fatores
determinantes desse deslocamento?

E, em relação à fauna de sua região, você conhece algum tipo de animal


3 que apresenta atividade migratória? Em caso afirmativo, escreva abaixo
algumas das características desse animal e da sua rota de migração.

A capacidade da memória possibilitou-nos a percepção do transcorrer do tempo e das


mudanças espaciais. Quando acordamos, nos lembramos dos acontecimentos passados,
vivenciamos o presente e temos total perspectiva de que teremos um dia pela frente. Quando
viajamos, recordamos os lugares por onde passamos e o local deixado para trás. Hoje, isso é
banal, mas para nossos ancestrais foi fundamental para a percepção de um momento passado,
presente e futuro, levando a nossa espécie a um processo de acúmulo de experiências e a um
contínuo aprendizado.

12 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Esse acúmulo de experiências distinguiu a espécie humana dos outros seres vivos,
levando-nos a uma capacidade de desenvolver e utilizar diversos tipos de conhecimento e,
entre eles, a ciência e a tecnologia nas soluções dos problemas até então nunca vistos em
nosso planeta. Há séculos, o conhecimento adquirido com a ciência e a sua aplicabilidade
é o grande propulsor das mudanças observadas em nossa sociedade, principalmente na
qualidade de vida.

Podemos acompanhar a história da evolução do Homem através dos tempos


desde as eras Pré-Históricas, a partir de registros em pinturas rupestres gravadas em
cavernas, pedaços de ossos e cacos de utensílios, bem como restos de fogueiras que
são eventualmente descobertos em escavações arqueológicas.

As pinturas rupestres são encontradas em sítios arqueológicos espalhados por


quase todo o planeta. Por exemplo, no Brasil são famosos os registros encontrados no
Piauí, Bahia, Rio Grande do Norte, Paraíba e Minas Gerais, entre outros Estados. Em
outros países, podemos destacar as pinturas rupestres existentes na França, Espanha e
Etiópia, entre outros.

O estudo desse material indica serem esses os primeiros passos da mente humana
em direção às ciências e ao registro dos conhecimentos adquiridos a partir da observação.

Figura 2 – Pintura rupestre

Atividade 3
Observe a Figura 2. Como você descreve o que foi observado? Parece
1 uma cena comum de nosso dia-a-dia? Explique.

Pesquise e descubra qual o sítio arqueológico mais próximo de sua


2 região. Descreva-o e relate sua importância para a preservação da
cultura local.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 13


A sistematização do Conhecimento
O mundo a nossa volta pode ser descrito a partir de diversos ângulos da realidade, como
o olhar artístico e a poética. No entanto, estamos interessados em apresentar duas visões
específicas do mundo: a filosófica (do pensamento racional) e a científica (da experimentação
e do método).

Existem as descrições religiosas e míticas em seus diversos matizes, mas não trataremos
delas aqui. Ressaltemos que as verdades científicas e filosóficas não são as únicas nem são
melhores ou piores que os outros tipos de verdades ou conhecimentos. Apenas representam
um modo específico de olhar o mundo e que é muito útil quando se pretende obter um
conhecimento mais sistematizado do que está acontecendo ao nosso redor.

Filosofia
A palavra Filosofia significa “amor ao conhecimento, ao saber (philos = amigo, amante
e Sophia = conhecimento, saber). Assim, o conhecimento filosófico busca a essência das
causas reais dos fenômenos, ou seja, a origem de tudo e as suas explicações. A filosofia se
caracteriza, então, como reflexão crítica da realidade considerada em sua totalidade, bem como
tentativa de refletir sobre as formas do fazer e do agir do ser humano, também considerado
aqui como totalidade.

A interpretação das informações que nos chegam pelos sentidos é uma característica
da busca filosófica. Nesse contexto, a questão “o que é real” faz parte do projeto filosófico,
indicando, assim, a possibilidade desse conhecimento ser contraditório à medida que discute
a realidade das coisas e o que é o real, ao mesmo tempo.

Por outro lado, a sistematização do conhecimento foi um processo lento que desponta em
diversas épocas e em diversos povos ao longo da civilização. Para o caso especial da cultura
ocidental, a maior influência vem do aparecimento na Grécia de uma organização peculiar das
idéias em um corpo chamado de filosofia.

Esse saber moldou em grande parte o pensamento e a cultura da civilização ocidental,


tornando-se a fonte do que hoje chamamos conhecimento científico.

A história do conhecimento ocidental está relacionada a nomes que você já deve ter
ouvido: Sócrates, Platão e outros. Propomos um breve resgate desses personagens históricos,
sugerindo que você visite a biblioteca de sua cidade e faça uma pesquisa mais aprofundada
sobre esse assunto.

Podemos afirmar que a origem da filosofia remonta ao Séc. VI antes da Era Cristã (a.C.),
na Grécia Antiga, com Tales de Mileto.

14 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 4
Você gosta de ler? Tente lembrar e escreva o nome de pelo menos cinco
livros que você já leu. Se você não é o que se poderia chamar de um bom leitor,
até mesmo pela natureza de nosso curso, agora está na hora de começar a criar
o salutar hábito da leitura.

Ciência
As origens da ciência nos remetem a Aristóteles (384-322 a.C.) que, a partir da
obra filosófica de Platão, de quem foi discípulo, propõe um novo olhar para a realidade
objetiva.

Na visão de Aristóteles, a realidade ou aquilo que nos envolve de modo mais


imediato é o tema central do estudo científico e, para ele, a razão é a mais fundamental
característica humana. Aristóteles trata desde o problema do movimento (por que os
corpos se movem?) até a classificação dos seres que compõem a natureza. Ele acreditava
na constituição do mundo por quatro elementos (terra, água, ar e fogo), bem como na
imobilidade da Terra. Vemos com isso que mesmo as mentes mais brilhantes cometem
erros! Nem o mundo é formado por “quatro elementos”, nem a Terra é imóvel.

Aristóteles é o grande pensador e articulador de sua época na construção do


pensamento ocidental. Sua influência vai muito além da filosofia e da ciência, tendo sido
Figura 3 – Platão
inclusive preceptor de Alexandre, o Grande. Voraz leitor e notável estudioso, chegou a
merecer de Platão (de quem foi amigo e discípulo) o comentário de que sua residência
era “a loja de leitura”, devido ao vasto acervo de livros que continha.

O gosto pela leitura e a consciência da importância dos livros levaram nossos


ancestrais (Séc. III a.C.) a construir a bela e imponente Biblioteca de Alexandria,
conhecida na época como Museum, e que foi o mais importante centro cultural da
Antigüidade. Entre seus diretores, destacam-se personagens como Eratóstenes –
matemático, filósofo, pensador – a quem cabe, entre outros, o mérito de ter calculado
o comprimento da circunferência da Terra e de ter escrito uma obra chamada Geografia,
que influenciou significativamente o conhecimento de nosso mundo.

Neste livro, Eratóstenes relatou que, em uma certa hora de um determinado dia, se
comparássemos a sombra gerada por uma haste vertical à luz do Sol no fundo de um
poço, em duas cidades diferentes, no caso Alexandria e Siene (Egito) respectivamente, Figura 4 – Aristóteles

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 15


seria possível concluir que a superfície da Terra era esférica. Determinando o valor do ângulo
entre a haste e a sombra e relacionando esse ângulo com a distância entre as cidades, seria
possível determinar o tamanho da circunferência terrestre, chegando ao valor de 40.000 km,
Distância
errando em apenas 75 km o valor real da circunferência da Terra no Equador.

Eratóstenes conhecia a Eratóstenes tanto determinou experimentalmente o tamanho da superfície terrestre


distância entre Alexandria quanto intuiu a esfericidade de nosso planeta.
e Siene, pois havia
mandado um homem
medi-la, contando
os passos.
Sol

Siena
Poço Haste

Alexandria

Terra

Figura 5

Quando ocorreu sua destruição, a Biblioteca de Alexandria tinha mais de quatrocentos mil
volumes ou papiros, contendo praticamente todo o conhecimento produzido até aquele momento.

Nessa época, à frente da direção da Biblioteca estava uma mulher, Hiparca, que muito fez
pelo saber e pela Ciência, mostrando até que ponto o mundo antigo avançou, ao reconhecer e
permitir à mulher ocupar espaços relevantes nas atividades intelectuais da humanidade.

Atividade 5
Procure em um dicionário ou enciclopédia o significado dos termos filósofo e
filosofia. Exponha com suas palavras as definições encontradas, não esquecendo
de citar a fonte consultada (nome e autor).

Na sua cidade existe biblioteca? As pessoas costumam freqüentá-la? Como


ela é? Certamente muito diferente da de Alexandria, não é?

16 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


A ciência permite-nos uma visão privilegiada dos fenômenos naturais em nosso universo.
Do ponto de vista físico, químico e biológico, conseguimos visualizar, com relativa clareza,
quase todos os eventos envolvidos na manutenção e perpetuação da vida.

Conseguimos descrever, desde interações macroscópicas entre os seres vivos envolvendo


eco-sistemas de diversos graus de complexidade até comportamentos que se dão no nível
molecular e celular, passando por descrições de imensos sistemas, como o de nosso planeta,
seu lugar no sistema solar e no universo. Podemos descortinar com o auxílio de olhos
mecânicos, como os telescópios, a vastidão do meio interplanetário e intergaláctico, chegando
ao ponto de estimar com razoável precisão a idade do Universo e seu modo de funcionamento
desde seus instantes iniciais.

Apresentaremos uma breve definição de Ciência, à qual certamente ao longo de nosso


curso você irá acrescentando novos elementos e, ao final, chegará a uma definição correta
e que contemple a sua expectativa. Assim, a Ciência pode ser definida como conjunto de
conhecimentos sistematicamente organizados, com um objeto de estudo definido.

Cabe à Ciência classificar, medir, quantificar, formular e testar hipóteses, construir teorias
com as quais pode-se prever comportamentos de sistemas físicos, químicos e biológicos. A
Ciência também procura entender o funcionamento do universo e com isso produzir os saberes
necessários para tornar melhor a vida em nosso planeta.

No nosso caso, aqui no Nordeste, um problema científico importante é o da seca.


Esse é um problema que envolve várias áreas do saber, como a humanística, a exata e a
biológica. Veremos adiante, quando estudarmos o clima, que o fenômeno da chuva é bastante
complexo e que, para entendê-lo melhor, precisaremos de algumas ferramentas intelectuais,
as quais vamos encontrar na Física, na Química e na Biologia. Como o fenômeno da chuva,
existe uma quantidade imensa de fenômenos naturais que, para explicá-los, precisamos dos
conhecimentos oriundos da Ciência.

Além disso, para nós que vivemos o Séc. XX e estamos emergindo no Séc. XXI, a Ciência,
com todas as suas realizações, trouxe para nossos lares uma quantidade imensa de aparelhos
tecnológicos cujo funcionamento é entendido a partir de leis e princípios gerais que formam
um tipo de conhecimento chamado científico.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 17


Curtume

Estabelecimento onde
se curtem couros.
Indústria que se dedica ao
tratamento de peles finas e
de couros. O método científico
Barbatimão Acreditamos que lançar mão da descrição de fenômenos é a melhor forma de se perceber
Árvore leguminosa de o significado da Ciência e seu método científico.
casca rica em tanino.
No texto a seguir, adaptado do livro Grande Sertão: veredas, de Guimarães Rosa, escrito
Angico
numa linguagem muito peculiar, o jagunço Riobaldo Tatarana relata um curioso fenômeno.
Nome comum de várias
árvores da família das
A pois, um dia, num curtume, a faquinha minha, que eu tinha, caiu dentro de um tanque;
leguminosas. era só caldo de casca de curtir, barbatimão, angico, lá sei que taninos. – Amanhã eu
tiro... – falei comigo. Porque era noite, luz nenhuma eu não tinha. Ah, então saiba: no
Taninos
outro dia, cedo, a faca, o ferro dela estava roído, quase por metade, carcomido por aquela
(plural de tanino) agüinha escura azeda, toda quieta, pouco borbulhando. Deixei, mais pra ver... Sabe o que
Substância encontrada foi? Pois, nessa mesma tarde, da faquinha, só se achava o cabo... O cabo – por não ser
em vários organismos de frio metal, mas de chifre de veado galheiro (ROSA, 2001, p.39).
vegetais, que torna as
peles imputrescíveis O jagunço, ao relatar o fato, utilizou a linguagem popular que se associa a um tipo de
(que não apodrecem),
conhecimento, o conhecimento popular. Suas principais características são típicas do sujeito, do
sendo, por isso, usada em
curtume. objeto e de seu meio ambiente, hereditárias e empíricas, mas desprovidas de espírito científico.

Metal No contexto explorado, o jagunço certamente fez uso dos cinco sentidos: visão, tato,
Corpo simples, dotado
audição, olfato e paladar, nossos sensores naturais. Através deles, ele coletou as primeiras
de brilho particular, informações a respeito da sua “faquinha” e do meio de onde ela caiu. Esses sensores naturais,
chamado brilho metálico. embora indispensáveis ao homem, apresentam limitações, tornando as informações colhidas
Geralmente bom condutor
do calor e da eletricidade,
a partir deles subjetivas, falhas e quase exclusivamente qualitativas.
possuindo, além disso, a
propriedade de produzir, Por outro lado, uma re-leitura científica do texto, também pode antever fenômenos
quando se combina com o científicos importantes. Caracterizando esse conhecimento como o que resulta da assimilação
oxigênio, pelo menos um
progressiva e racional de fatos e fenômenos, a partir da observação, prática e experimentação
óxido básico: o ferro é o
mais útil dos metais. (a qual envolve medidas e seu registro).

18 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Retomemos o texto de Guimarães Rosa sob o olhar da Ciência. Na sua concepção
atual, o método científico é composto por um conjunto de etapas que, ao serem executadas
sucessivamente, auxiliam os pesquisadores no processo de produção do conhecimento:
organizar, especular e responder questões pertinentes ao seu trabalho, decorrentes de
observações, medidas obtidas das práticas e experimentos científicos, elaboração e teste de
hipóteses, teorias e generalizações.

Veja bem, tomando o relato do jagunço Riobaldo Tatarana, evidenciam-se as premissas


correlatas ao método científico. O primeiro seria ter um problema que necessita de explicação.O
problema em questão é explicar a corrosão do ferro metálico, quando ocorre a imersão da
faca no caldo, composto por água e algumas espécies de plantas da família das leguminosas,
ricas em tanino.

Serão discutidas brevemente, a seguir, cada uma das etapas do método científico.

Observação da natureza e proposição do problema


Nesta etapa, a questão a ser feita diz respeito à ocorrência do fenômeno. Isto é, por
que ocorreu a corrosão da parte metálica da faca? Portanto, busca-se uma explicação para a
questão formulada.

Formulação de hipóteses e testes


O cientista, baseado em suas observações, e levando em consideração leis e modelos
reconhecidos pela comunidade científica, propõe soluções prováveis para o problema. Planeja
a estratégia para submetê-las à prova visando sua validação. Nessa fase, várias explicações
possíveis são levantadas.

Atividade 6

Antes de continuar nosso estudo, gostaríamos de saber qual ou quais as


hipóteses que você levantaria para explicar por que a faquinha do jagunço
Riobaldo Tatarana foi sumindo até ficar só o cabo (não passe adiante sem cumprir
essa etapa.).

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 19


Você pode ter elaborado diversas hipóteses, como: “o metal ferro que compõe a lâmina
da faca é solúvel em água”. Essa é uma hipótese falsa, pois se fosse assim, ao lavar a faca
todo dia, ela acabaria por se dissolver, não é ?

Uma outra hipótese possível seria, “o caldo formado pela água e as leguminosas é ácido”.
Assim, o ácido é capaz de atacar (enferrujar) o ferro. Hipótese verdadeira.

Conclusão
Embora a explicação rigorosa do ponto de vista da Química, isto é, de como ocorre a
oxidação, seja um assunto a ser estudado no curso de estrutura atômica, podemos agora,
como conhecimento geral, apresentá-la. Então, a faca é corroída pelo fato de:

 em meio ácido, o Feo (ferro metálico) sofre oxidação, produzindo o íon Fe2+ (ferro dois mais);

 o íon H+ (íon hidrogênio) sofre redução, produzindo o gás H2 (gás hidrogênio).

Fenômenos que explicam a corrosão:


 a desaparição da lâmina de ferro; e

 o borbulhar do caldo formado pela água e as leguminosas.

Atividade 7
Com base nos conceitos de Ciência e Filosofia, complete a frase abaixo.

A Ciência é o ____________ (conhecimento/saber) parcialmente unificado;

a Filosofia é o ____________ (conhecimento/saber) totalmente unificado.

20 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Alguns ramos da Ciência
Classificar as ciências é uma tarefa extremamente complexa, até mesmo porque toda
tentativa de sua classificação sistemática deve partir de um princípio gerador, cuja essência
é a própria Ciência (esse é um problema semelhante ao enfrentado pela Filosofia, lembra?).

Na natureza, os fenômenos ocorrem desprovidos dos rótulos físicos, químicos, biológicos


ou de suas combinações. Nós, na tentativa de sistematizar nosso conhecimento, é que
classificamos os fenômenos buscando a melhor forma de explicar a natureza.

Assim, depreendemos algumas palavras e/ou conceitos embutidos na fala do jagunço


Riobaldo Tatarana que nos permitem identificar alguns dos diferentes ramos da Ciência e
perceber como eles estão de alguma forma imbricados.

Podemos identificar os conteúdos e relacioná-los com os ramos de estudo das ciências, a


fim de idealizar uma sistemática de classificação. Partindo do significado de algumas palavras
que aparecem no texto, é possível montar a seguinte seqüência:

 o jagunço utilizou o termo “agüinha” (linguagem popular), diminutivo de água, para


caracterizar o meio líquido. A linguagem de que ele fez uso, característica do seu meio
cultural, pode ser associada à Antropologia Cultural;

 ao modelo mental estabelecido pelo jagunço e utilizado para relatar a queda da faca no
tanque contendo o caldo, pode-se associar à Psicologia, isto é, como ele imagina que
se deu o fenômeno, as formas de pensar que ele elabora;

 o caldo contido no tanque é preparado com água (solvente) e algumas espécies de


plantas leguminosas, ricas em tanino (soluto). A esse caldo dá-se o nome de solução.
O comportamento da água líquida é estudado pela Física, o estudo da extração
de substâncias (soluto) por um solvente é desenvolvido pela Química e os vegetais
leguminosos são caracterizados e estudados pela Biologia;

 o tanque contendo taninos e a queda da faca pode ser sucintamente descrito pelas
ciências: Física (queda dos corpos), Química (composição) e Matemática (geometria).

Atividade 8
A cozinha de nossa casa é um bom laboratório de ciências. Descreva o processo
de preparação de um prato, relacionando em cada etapa o ramo da ciência que
está envolvido.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 21


Ciência e realidade
Como você viu no caso da faquinha, o trabalho científico envolve obrigatoriamente a
explicação de fatos ou conjunto de fatos e, para tanto, são elaborados modelos capazes de
explicá-los, como também os fenômenos observados e ainda, de prever novos resultados.
Nessa tarefa, precisamos sempre medir e quantificar as grandezas envolvidas e, quando
possível, descrever os resultados matematicamente através de fórmulas e equações. O teste
matemático é crucial na construção dos modelos que visam à representação da realidade.

Um exemplo bem conhecido é o da queda dos corpos. Comenta-se que Galileu estava
interessado em explicar o movimento de objetos que se deslocam em linha reta. Para isso, ele
elaborou um plano inclinado, como o mostrado a seguir.

B C

Figura 5

Soltou esferas de diversos pontos ao longo da parte AB do plano e verificou a altura que
as esferas atingiam no lado CD. Em seguida, alterou levemente a inclinação da parte CD e fez
novamente a experiência. Logo depois, alterou o grau de polimento das superfícies (das esferas
o do plano inclinado) até atingir uma situação de menor atrito possível. Dessa forma, observou
que quanto maior o polimento, mais distante as esferas iam antes de parar.

Com isso, ele estava preparado para responder à questão “o que faz os corpos pararem?”
e cuja resposta por ele obtida foi: a presença de forças de atrito. Concluiu também que se não
existisse atrito entre as esferas e o plano, se o percurso CD fosse na horizontal, uma vez atingido
o ponto B, as esferas continuariam se deslocando continuamente com velocidade constante e
só parariam quando terminasse a pista. Se esta fosse suficientemente grande, as esferas nunca
parariam de se mover com velocidade constante.

Após os resultados obtidos por Galileu, ficamos sabendo que “um corpo que se move em
linha reta, com velocidade constante e não sofre nenhuma interação com o meio, permanecerá
assim para sempre”, e que “tal corpo só mudará seu estado de movimento se aparecer uma
força externa atuando sobre ele”.

22 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Não precisamos repetir mais o experimento de Galileu, pois os resultados obtidos valem
para sempre, mantidas as mesmas condições. O que temos aqui é um modelo que descreve
o movimento de corpos que se movem em linha reta com velocidade constante. Para outros
movimentos, teríamos que melhorar o modelo, de modo a incluir novas situações. Esse é um
exemplo das construções que se faz em ciência. Uma expressão matemática para o resultado
obtido por Galileu é:

Essa fórmula representa um corpo se movendo com velocidade constante e em linha reta.
Na natureza, é muito difícil obtermos por muito tempo o movimento descrito. Mesmo assim,
seremos capazes de prever o que ocorre com o objeto que se move segundo essas condições.

Concluindo nossa aula, a Ciência procura elaborar modelos mais ou menos sofisticados que
permitam uma interpretação do que está ocorrendo na natureza e, além disso, que nos permita
prever o comportamento futuro dos sistemas estudados. Como produto humano, a Ciência está
sujeita a erros e enganos, mas é nela, mais do que em qualquer outra atividade humana, que
a busca pela descoberta dos próprios erros e enganos mais tem impulsionado a humanidade.

Resumo
Nesta primeira aula, aprendemos que a Ciência é uma produção humana e, como
tal, sujeita a erros e acertos. Mesmo assim, ela é uma ferramenta intelectual
de suma importância, ajudando na compreensão do mundo que nos rodeia.
Discutimos a existência de outros conhecimentos bastante relevantes para a vida
em sociedade, entendendo que o que os diferencia do conhecimento científico
é o fato deste basear-se em um método e não pretender ser um conhecimento
imutável nem conter verdades absolutas. Abordamos, por fim, que a Ciência
possui vários ramos, estando cada um preocupado em desenvolver um olhar
mais aprofundado em relação a uma dada faceta da natureza, mas cientes de que
necessitam uns dos outros para melhor descrever seu objeto específico de estudo.

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 23


Autoavaliação
Justifique a seguinte afirmativa: o conhecimento científico é aproximadamente exato
1 enquanto o conhecimento filosófico é exato.

Existem crenças populares que acabam por conter um fundo de verdade. Isto é, a
2 Ciência tem como justificar a crença. Outras não encontram apoio na Ciência.

Algumas crenças, frutos de observações, estão relacionadas às estações chuvosas


no Nordeste. Por exemplo, antigamente os boiadeiros que levavam o gado da região
do Seridó norteriograndense para o Piauí diziam que “quando o gado chega gordo no
Piauí é porque o inverno será bom e quando chega magro é porque o inverno será
ruim”. Essa é uma observação interessante, bem como interessante é a conclusão
dos boiadeiros.

Será que essa conclusão tem apoio científico? Vejamos, as chuvas na região do
Seridó têm origem na convergência inter-tropical, de modo que é comum começar
a chover primeiro no Piauí, em relação ao Rio Grande do Norte. Como a chuva
“vem” das regiões mais próximas à linha do Equador, quando, o gado saía para o
Piauí, e encontrava pasto pelo caminho e chegava lá gordo. Na falta de chuvas, o
pasto ficava mais escasso e o gado chegava magro. Então, a explicação científica da
convergência inter-tropical, no que diz respeito às nossas chuvas, pode ser verificado
pela experiência do boiadeiro.

Responda e justifique: você conhece alguma crença popular de sua região que seja
justificada pelo ponto de vista científico?

Faça uma pesquisa com os mais antigos e verifique o que eles sabem sobre as
estações chuvosas e secas no Nordeste. Anote os resultados e compare-os.

Referências
COLIN, Ronan. História ilustrada da ciência. São Paulo: Ed. Círculo do Livro, 1983. v.1.

GALDINO, Luiz. Peabiru: os Incas no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Estrada Real Ltda, 2002.

ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. 19.ed. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 2001.

24 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade 25


Anotações

26 Aula 1 Ciências da Natureza e Realidade


A Terra – litosfera
e hidrosfera

Aula

2
Apresentação

N
esta segunda aula, o tema a ser abordado é: Terra – litosfera e hidrosfera. Inicialmente,
situaremos nosso planeta no sistema solar, apresentando algumas das suas
características físicas em relação a outros planetas. Na seqüência, trataremos da sua
constituição estrutural e química enfatizando a formação de duas das suas camadas: a litosfera
e a hidrosfera. Ao final, levando em consideração a sistêmica, percebemos a necessidade de
visualizarmos a Terra como um sistema único, constituído de dois tipos de matéria: a inanimada
e a animada; e, assim, por vários subsistemas. Portanto, ao estudá-la na sua plenitude,
concentraremos a atenção na matéria que a constitui, na energia que a torna dinâmica e na
vida que a difere dos demais planetas.

A resolução de atividades e a auto-avaliação estão associadas à leitura da aula ou, em alguns


momentos, a trabalhos de pesquisa bibliográfica, na Internet ou, ainda, de pesquisa de campo.

Objetivos
Permitir que você defina a Terra como planeta, caracterize-a
estruturalmente e a veja como um amplo sistema, constituído de
vários subsistemas, dentre os quais destacam-se os reinos: animal,
vegetal e mineral.

Nesse sentido, esperamos que você:

formule definições;
1
aprecie contextos temáticos e extraia destes as informações
2 necessárias à compreensão da aula;

3 leia tabelas e gráficos;

4 manipule dados numéricos;

forneça respostas às atividades programadas.


5

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 29


Visões da Terra
Vamos iniciar nossa aula solicitando a você que reflita a respeito das questões:

 o que é a Terra?

 quais as implicações e limitações da sua resposta?

 qual o motivo que nos leva a pensar dessa maneira?

Visões do que seja a Terra, nosso planeta, exige do interlocutor não somente uma cultura
geral, mas também, noções das leis e princípios que regem a sua dinâmica. A finalidade
maior de tais conhecimentos é saber aplicá-los a diversas situações do dia-a-dia, missão
extremamente complexa de ser realizada na íntegra por qualquer ser humano, sendo, por
isso, interesse da ciência.

As primeiras tentativas a esse respeito foram feitas pelos filósofos gregos. A visão de
mundo mecânica/religiosa, decorrente de um mundo em movimento e perfeito, obra da criação
geométrica de Deus, defendida por filósofos como Pitágoras, Parmênides e Platão, suplantou
as mais antigas, defendidas pelos organicistas como Tales, Anaximandro e Heráclito, que
consideravam todo o cosmos (o Universo) como vivo.

Entretanto, já bem próximo ao final do século XX, ressurge uma das vias de construção
da ciência. Nela, a visão mecanicista do mundo, com a qual convivemos por tanto tempo,
cedeu lugar à organicista, renascida da própria tecnologia gerada pelo mecanicismo. O homem
construiu um conhecimento que o permitiu desenvolver a teoria da relatividade, elaborar o

30 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


modelo quântico que descreve a estrutura do átomo, determinar a estrutura do DNA, explorar
o espaço e elucidar o genoma humano. Esse mesmo conhecimento permite hoje, a partir da
sistêmica (nova disciplina que tem por objeto questionar, agrupar e caracterizar os sistemas),
desvendar a natureza real da Terra e descobrir que, muito embora a matéria se apresente nas
formas inorgânica (inanimada) e orgânica (viva), o planeta como um todo é vivo, sendo o único
nessas condições em órbita do Sol.

Uma das razões para se fazer uso da sistêmica com a finalidade de refinar o estudo da Terra
é que ela permite antever e pesquisar os vários micro-sistemas (subsistemas), constituintes
de macro-sistemas, na tentativa de aquisição de conhecimento do conjunto. Como exemplos
de sistemas, citamos: o homem – nervos, circulação, respiração, visão, audição, digestão,
entre outros; o carro – carburação, injeção, frenagem; os minerais – composição, estrutura,
simetria; e, até mesmo a Terra, que engloba os exemplos anteriores.

Nesta fase, três questões associadas ao sistema em estudo são essenciais:

 quantas e quais são as partes que o integram?

 como funciona o conjunto: sistema e subsistemas?

 como se dá a sua integração a macro-sistemas?

Essas questões servem também como princípio norteador para concentrarmos nossa
atenção no sistema em estudo, deixando de lado os detalhes menos importantes. Por exemplo,
ao escolhermos a Terra, perguntaríamos: quantas e quais são as partes que a integram? A
resposta quantitativa será três, enquanto a qualitativa será: matéria, energia e vida.

Assim, para caracterizar o sistema Terra devemos estudar:

 a diversidade de matéria nela presente;

 a energia responsável pela sua dinâmica;

 os organismos vivos que a tornam exclusiva em nosso sistema solar.

Como vemos, são imensas as implicações da concepção de que a Terra é um planeta


vivo e não, simplesmente, um planeta com vida em sua superfície. Elas exigirão não somente
mudanças efetivas de comportamento e práticas científicas, mas também, da sociedade
como um todo.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 31


Lendo e compreendendo os astros
Parnasianismo Que tal iniciarmos este parágrafo lendo um poema do Parnasianismo? Ele tem uma
Movimento literário
correlação muito grande com o tema de nossa aula.
surgido na França do
século XIX, em oposição
ao Romantismo, (Paráfrase)
externando a partir da
poesia o espírito positivista 1
4
e científico da época. [...]
[...]
Sou um pequeno mundo;
Por que, no céu profundo,
Movo-me, rolo e danço
Não há-de parar mais
Por este céu profundo;
O vosso movimento?
Por sorte Deus me deu
3 Astros! qual é o mundo,
Mover-me sem descanso,
Em torno ao qual rodais
Em torno de outro mundo, [...]
Por esse firmamento?
Que inda é maior do que eu. Eu sou esse outro mundo,
Eu sou o sol ardente!
Dou luz ao céu profundo...
2 Porém, sou um pigmeu, 5
Quer rolo eternamente [...]
[...] Em torno de outro mundo, Não chega o teu estudo
Eu sou esse outro mundo; Que inda é maior do que eu. Ao centro disso tudo,
A lua me acompanha,
Que escapa aos olhos teus!
Por este céu profundo...
O centro disso tudo,
Mas é destino meu
Homem vaidoso, é Deus!
Rolar, assim tamanha,
Em torno de outro mundo,
Que inda é maior do que eu.

Olavo Bilac

O Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído por uma estrela de porte médio, o Sol, e pelos planetas
Plutão Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão (ver Figura 1).

Até 2006, Plutão era


contado como um
planeta principal, mas
a descoberta de vários
corpos celestes de
tamanho comparável
fez com que a União
Astronômica Internacional
(UAI) decidisse considerá-
lo como um planetóide.

Figura 1 – O Sistema Solar: constituição e distância do planeta ao Sol (Relativas à Terra e expressas em unida-
des astronômicas: 1 UA = 149.597.890 km)

32 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Também faz parte dessa constituição, astros como os satélites dos planetas, dentre
os quais, a Lua, numerosos cometas, asteróides, meteoritos e, ainda, poeira e gases
interplanetários. O Sol é a principal fonte de energia do sistema solar e, em conjunto com
as estrelas e demais astros, orbita em volta do centro de uma das muitas galáxias que
constituem o Universo. A nossa, nomeada pelos gregos de Via Láctea, é um disco em espiral
com aproximadamente 200 bilhões de estrelas (ver Figura 2).

Figura 2 – Via Láctea

Atividade 1
A partir das leituras do poema e do primeiro parágrafo do texto, o
1 qual trata a respeito do Sistema Solar, que título você atribui ao
poema de Olavo Bilac?

2 O sujeito na primeira estrofe é:


[ ] um planeta. [ ] um satélite. [ ] uma estrela.

3 O sujeito na segunda estrofe é:


[ ] um satélite. [ ] uma estrela. [ ] um planeta.

4 O sujeito na terceira estrofe é:


[ ] uma estrela. [ ] um planeta. [ ] um satélite.

De quem fala a quarta estrofe?


5

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 33


A Tabela 1 lista alguns dados relativos ao Sol e aos planetas constituintes do Sistema Solar.

Tabela 1 – Parâmetros Físicos que caracterizam o Sol e os Planetas

Excentricidade Distância Massa Densidade Raio Excentricidade Temperatura


Astro
Orbital do Sol (km) (kg) Média (g/cm3) Equatorial (km) Orbital Média (oC)
Sol ----- 1,989 x 1030 1,409 695.500 ----- 5.504
Distância entre o centro
da órbita elíptica de um Mercúrio 57.909.175 3,302 x 1023 5,427 2.439,7 0,2056 300
planeta ou de um satélite
e um dos focos ocupados Vênus 108.208.930 4,869 x 1024 5,240 6.051,8 0,0068 462
pelo Sol ou pelo planeta
Terra 149.597.890 5,974 x 1024 5,515 6.378,14 0,0167 15
principal.
23
Marte 227.936.640 6,419 x 10 3,940 3.397 0,0934 -46
Júpiter 778.412.020 1,899 x 1027 1,330 71.492 0,0484 -148
Saturno 1.426.725.400 5,685 x 1026 0,700 60.268 0,0542 -178
Urano 2.870.972.200 8,685 x 1025 1,300 25.559 0,0472 -216
Netuno 4.498.252.900 1,024 x 1026 1,760 24.746 0,0086 -214
22
Plutão 5.906.380.000 1,300 x 10 2,000 1.151 0,2488 -228

Fonte: CALIFORNIA INSTITUTE OF TECNOLOGY. Jet propulsion laboratory. Disponível em:


<http://www.jpl.nasa.gov/>. Acesso em: 20 maio 2005.

De posse dos dados listados, podemos tirar algumas conclusões extremamente


pertinentes sobre os planetas constituintes do Sistema Solar. Tendo em mente que a
Densidade propriedade física densidade (d) varia de acordo com o estado de agregação da matéria
Vale a pena lembrar que a
na ordem: d sólido > d líquido > d gás, vamos traçar o gráfi co de Y = f(X) com X = Planeta e
densidade é a razão entre Y = Densidade Média e extrair dele algumas informações (ver Gráfico 1).
a massa de um corpo
dividido por seu volume,
ou seja, d = m/v. Gráfico 1 – Densidade do Planeta = f(Planeta)

34 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Análise gráfica
 O gráfico revela nitidamente a existência de dois grupos de planetas constituintes do
sistema solar: o primeiro composto pelos planetas Mercúrio, Vênus, Terra e Marte; e o
segundo pelos planetas Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão.

 O primeiro grupo apresenta alta densidade, o que configura a predominância em sua


constituição física dos estados sólido e líquido.

 O segundo grupo apresenta baixa densidade frente ao primeiro, o que configura a


predominância em sua constituição física, sobretudo, do estado gasoso.

A literatura comprova as conclusões resultantes da nossa análise gráfica. Os planetas do


grupo 1 são nomeados planetas telúricos pelo fato de possuírem uma superfície compacta e
rochosa. Por sua vez, o conjunto de planetas do grupo 2 é nomeado de planetas gasosos. Júpiter
e Saturno são constituídos pelos gases Hidrogênio (H2) e Hélio (He); Netuno e Urano, pelos dois
gases anteriores acrescidos de traços de Metano (CH4); e Plutão é constituído sobretudo pelo
gás Nitrogênio (N2), acrescido de traços de Monóxido de Carbono (CO) e Metano.

Atividade 2

Com base em quais parâmetros físicos listados na Tabela 1, como você


1 justifica a total ausência ou, no limite, a tênue atmosfera gasosa dos
planetas telúricos, em oposição à densa atmosfera dos planetas gasosos?

Por analogia, liste os parâmetros físicos que podem ser destacados no


2 poema de Olavo Bilac. Alguns desses parâmetros poderiam compor a
Tabela 1? Quais?

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 35


O planeta Terra

Estrutura
A Terra, dentre suas peculiaridades, é vista como um planeta ativo e dinâmico com forma
aproximada de uma esfera, constituído por três compartimentos de natureza física diferentes
e que interagem de forma complexa. São eles:

 a litosfera;

 a hidrosfera ou oceano mundial;

 e a atmosfera.

Esses três meios definem a biosfera, região do planeta que congrega os seres vivos
e onde a vida é possível em permanência. Dentre os múltiplos aspectos que caracterizam a
biosfera, dois são extremamente importantes para sua dinâmica e sobrevivência. O primeiro,
a água, deve se encontrar em permanência no estado líquido. O segundo, a luz solar, banha
a biosfera em fluxo contínuo sendo o seu único aporte de energia, a partir da qual os vegetais
e, indiretamente os animais, elaboram todas as substâncias orgânicas de que necessitam
para produzir energia química e mecânica, vitais ao seu crescimento, reprodução e as suas
funções de relações.

Atividade 3

Como você interpreta o verso do poema de Bilac: eu sou o sol ardente?


1
Expresse, através de desenho, o planeta Terra, levando em consideração
2 as suas especificidades.

36 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Componentes químicos dos compartimentos
Qual a semelhança entre o ar que respiramos, o solo sobre o qual caminhamos e a água
que sacia a nossa sede?

A resposta é bem fácil e talvez você já a conheça. Todos os objetos materiais com os quais
você tem contato no seu dia-a-dia são feitos de átomos, tijolos fundamentais, responsáveis
pela edificação da matéria. Eles são constituídos por três tipos de partículas presentes em
duas regiões distintas: a central, núcleo onde estão alocados os prótons, que são partículas
de carga positiva (+), e os nêutrons, partículas desprovidas de carga, e outra, onde estão os
elétrons, de carga negativa (-), partículas que descrevem órbitas em torno do núcleo, dando
origem à eletrosfera (ver Figura 3).

Figura 3 – A Estrutura do Átomo

Essa constituição é responsável pela variedade de átomos presentes no Universo,


perfazendo um total de 112 elementos químicos, dos quais 92 são naturais e 20 são artificiais,
e resultam de processos nucleares. Eles estão dispostos na Tabela Periódica (ver em anexo),
a ser estudada detalhadamente na disciplina Arquitetura Atômica.

Os elementos são responsáveis pela edificação material dos planetas e da vida. Dada a
nossa fértil imaginação, somos levados a acreditar numa espécie de reencarnação cósmica, a
partir da qual cada átomo constituinte do nosso corpo tenha percorrido vários astros diferentes
antes da formação do Sol, que com sua luz banha o nosso planeta. Nesse percurso, cada um
dos átomos, certamente, fez parte da arquitetura da matéria de uma série de organismos
diferentes desde a formação da Terra. Portanto, planetas, estrelas e organismos nascem e
morrem, mas os elementos químicos, reciclados de um corpo a outro, obedecem às leis da
conservação que expressam: a matéria e a energia não podem ser criadas nem destruídas,
mas apenas transformadas de uma forma em outra. Isso nos permite afirmar que os
elementos são eternos.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 37


Atividade 4
Você já é capaz de definir átomo? Escreva um texto apresentando sua definição.

A litosfera
Do grego líthos, pedra + sphere, esfera, como indica a própria etimologia da palavra, a
litosfera é parte sólida da Terra, constituída pelos continentes, ilhas e fundos oceânicos. Ela
não é contínua, mas sua crosta é formada por vários blocos de rochas chamados de placas
tectônicas, as quais se encaixam umas nas outras como na montagem de um grande quebra-
cabeça, cujo plano de encaixe é o manto, zona que apresenta certa plasticidade.

Como veremos, o núcleo da Terra, a uma temperatura elevada, aquece o material


desse manto, o qual torna-se menos denso e ascende para regiões superiores. Ao esfriar, ao
contrário, torna-se mais denso, retornando, mais uma vez, a níveis inferiores. Assim, devido
à transferência de energia por convecção, se dá o movimento do material aquecido no interior
da Terra. Estando as placas superpostas sobre esse material, elas podem se afastar umas das
outras ou colidirem entre si, buscando as suas acomodações. Os movimentos e as colisões
dessas placas liberam grandes quantidades de energia, sendo responsáveis por fenômenos
naturais como: terremotos, maremotos, erupções vulcânicas, e, ainda, pela formação das
grandes cadeias de montanhas emersas e submersas em nosso planeta.

O estudo da litosfera nos remete para várias questões. Por exemplo:

 como é de fato o interior da Terra?

 a Terra é oca?

 os continentes se movem?

 o que provoca os terremotos e as erupções vulcânicas?

Com o objetivo de responder a essas questões, vamos, em uma primeira etapa, aprender
a caracterizar a estrutura da Terra, para em seguida, de posse dos argumentos necessários,
fornecer as devidas respostas.

Partindo do centro da Terra, podemos distinguir várias regiões, descritas a seguir, que
lhe são características (ver Figura 5).

38 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


 A litosfera – camada superficial rígida, cuja espessura varia de 5 a 10 km sob os oceanos e
de 25 a 100 km nos continentes, composta por rochas aparentes que constituem a crosta
e o manto litosférico. A crosta terrestre na sua totalidade é formada por quartzo (dióxido
de silício) e outros silicatos, como o feldspato (silicatos de alumínio, com potássio, sódio
e cálcio e, raramente, bário).

 O manto – composto pelas camadas seguintes:

• Astenosfera: camada plástica, deformável, logo após a litosfera, que apresenta


uma espessura compreendida entre 100 e 700 km, sendo parte integrante do manto
superior. Faz parte da sua constituição a Olivina (Mg, Fe)2 SiO4 e o Piroxênio (Silicato
de Ferro, de Magnésio, de Cálcio e, também, de Alumínio, que caracteriza várias
espécies nas rochas eruptivas). Amostras da astenosfera chegam à superfície da Terra
na forma de lava vulcânica;

• Mesosfera: região com espessura compreendida entre 700 e 2900 km. Quase
totalmente inserida no manto inferior, constitui-se em grande extensão por Silício,
Magnésio, Oxigênio e quantidades menores de Ferro, Cálcio e Alumínio.

A temperatura do manto varia no intervalo compreendido entre 870oC, próxima à crosta,


e 2200oC, próxima ao núcleo.

 O núcleo – constituído praticamente por Ferro e Níquel, divide-se em:

• Núcleo externo, compreendido entre 2900 km e 5000 km, é supostamente líquido;

• Núcleo interno, com 1300 km de raio, é sólido em sua maior parte.

A temperatura do núcleo varia no intervalo compreendido entre 2200oC e 5000oC.

 A hidrosfera – região predominantemente líquida. Praticamente incompressível,


compreende as águas marinhas e continentais. A ela também se associa uma fase
sólida, os gelos continentais e marinhos. Por sua vez, as águas marinhas compõem
97% de sua constituição, as quais são animadas com movimentos de origem mecânica
ou termodinâmica, resultantes de ações exercidas, seja no interior de suas massas, seja
nas suas fronteiras.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 39


Figura 5 – As principais partes da Terra

 A atmosfera – gasosa e compressível, a atmosfera apresenta características e composição


química variáveis, principalmente com a altitude; ela está concentrada na razão de 80% de
sua massa na troposfera, região que ocupa uma espessura de aproximadamente 12 km,
a partir do nível do mar. A sua maior parte flutua em torno de um equilíbrio hidrostático,
por movimentos de origem principalmente termodinâmica, resultantes das transferências
de energia através de seus limites superior e inferior (solo e mar).

Atividade 5
Com quais das regiões descritas na Figura 5 você interage no seu
1 dia-a-dia?

40 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Faça uma descrição física do relevo da sua região. Junte a essa
2 descrição dados relativos ao ponto mais elevado, à temperatura média,
à pressão atmosférica e ao índice pluviométrico da região.

Rochas e minerais são domínios da Geologia e serão estudados na disciplina


Mineralogia, teoria e prática.

As definições fornecidas permitem observar que os continentes são constituídos


por massas de rochas de baixa densidade (granito), suportadas por base de massa mais Granito
densa (basalto). Sendo a densidade do granito menor do que a do basalto, os continentes Rocha cristalina
constituídos por granito sobrenadam em um fino leito de basalto. formada de uma mistura
heterogênea de quartzo,
A Tabela 2 demonstra a composição química da Terra. feldspato e biotita.

Tabela 2 – Composição Química da Terra


Basalto
Espécie Ferro Oxigênio Silício Magnésio Níquel Enxofre Titânio
Rocha vulcânica,
% em geralmente negra
34,5 29,5 15,2 12,7 2,4 1,9 0,05
massa ou parda, que forma
freqëntemente vazamentos
extensos, mostrando
às vezes uma estrutura
O Gráfico 2, por sua vez, retrata de forma clara as especificidades da composição química prismática.
da Terra. Nele, observamos a predominância do elemento ferro frente aos demais elementos.

Gráfico 2 – Composição Química da Terra

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 41


Atividade 6
Vamos agora responder às questões que seguem.

 Como de fato é o interior da Terra?

 A Terra é oca?

 Os continentes se movem?

 O que provoca os terremotos e as erupções vulcânicas?

A hidrosfera
Como já vimos, a hidrosfera forma o compartimento líquido da Terra, sendo praticamente
constituída por moléculas de água. Você sabe explicar a origem da água líquida em nosso planeta?

Na atualidade, a ciência defende o modelo de que a Terra e os demais planetas do sistema


solar se formaram a partir da aglutinação de partículas materiais no mesmo período em que se
deu a formação do Sol. A princípio, a Terra era totalmente desprovida de atmosfera e oceanos. Isso
porque, além do alto número de colisões de partículas com a sua superfície – o que provocava o
aumento da temperatura ambiente –, a pequena massa relativa do planeta era incapaz de reter em
definitivo uma atmosfera ou vapor d’água. Na realidade, a água e os gases já existiam alocados
nos poros das rochas que constituíam o planeta. À medida que estas se acomodavam, eram
comprimidas compactamente devido à atração gravitacional.

Assim, o interior do planeta se tornava mais quente e o vapor d’água e os gases se


desprendiam das rochas, fluindo para a sua superfície. As bolhas de gases, ao escaparem das
rochas e se aglutinarem formando bolhas maiores, promoviam grandes terremotos, e o calor
liberado contribuía para a ocorrência de violentas erupções vulcânicas. Durante milhões de anos,
a temperatura impossibilitava a formação de nuvens e, em conseqüência, a Terra era um planeta
onde a seca já imperava.

No entanto, com o passar do tempo, a temperatura superficial do planeta começou a


diminuir e o vapor d’água que fluía das camadas mais profundas da Terra também começou a
se condensar sobre a sua superfície. Como você pode observar, a formação dos oceanos através
da condensação da água se deu do interior para a superfície do planeta.

A hidrologia, área que estuda a dinâmica da água sobre a Terra, demonstra que, a cada
ano, evaporam-se dos oceanos cerca de 1,2 x 1014 m3 de água, os quais retornam na forma de
chuva diretamente para os oceanos ou, indiretamente, a partir dos continentes ou de outros
mananciais aquáticos.

42 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Na sua quase totalidade, a água do nosso planeta se encontra nos mares e oceanos na
forma líquida e salgada. Dados a respeito da área do planeta, terras emersas, mares e oceanos
são listados a seguir.

 Área total do planeta: 510,3 milhões km²

 Das terras emersas: 149,67 milhões km²

 Dos mares e oceanos: 360,63 milhões km²

 Do Oceano Pacífico: 179,25 milhões km², incluindo Mar da China Meridional, Mar de Ojtsk,
Mar de Bering, Mar do Japão, Mar da China Oriental e Mar Amarelo (49,7% das águas)

 Do Oceano Atlântico: 106,46 milhões km2, incluindo Oceano Ártico, Mar do Caribe, Mar
do Norte, Mar Mediterrâneo, Mar da Noruega, Golfo do México, Baia de Hudson, Mar da
Groenlândia, Mar Negro e Mar Báltico (29,5% das águas)

 Do Oceano Índico: 74,92 milhões km², incluindo Mar da Arábia, Golfo de Bengala e Mar
Vermelho (20,8% das águas)

 Profundidade média dos oceanos: 3.795 m

 Volume total das águas do planeta: 1,5 bilhão km³

Atividade 7
Com base nos dados anteriores, você é capaz de determinar os
1 percentuais das áreas correspondentes:

 às terras emersas;

 aos mares e oceanos;

 ao oceano Pacífico;

 ao oceano Atlântico;

 ao oceano Índico.

Você é capaz de representar em um gráfico de barras os dados obtidos


2 no item anterior? Quais seriam suas coordenadas?

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 43


Quanto à água doce, a maior parte encontra-se na forma de gelo ou alocada em grandes
reservatórios subterrâneos. As frações situadas sobre os continentes e a atmosfera perfazem
quantidades proporcionalmente menores, não obstante as suas importâncias biológicas.
Observe a Tabela 3 a seguir.

Tabela 3 – Volume das espécies de águas presentes na Terra

Região Volume x 103 (km3) % do Total

Oceanos 1.370.000 97,25


Calotas polares/geleiras 29.000 2,05
Águas subterrâneas 9.500 0,68
Lagos 125 0,01
Solos 65 0,005
Atmosfera 13 0,001
Rios 1.7 0,0001
Biosfera 0.6 0,00004
TOTAL 1.408.700 100

Fonte: SUSSMAN, A. Guia para o planeta Terra. São Paulo: Cultrix, 2000.

Atividade 8
Prepare uma tabela como a fornecida no exemplo abaixo.

Fonte Qualidade Vazão Utilização


Tipo Perene Volume (m3)
Hídrica da água 3
(m /s) da água

Atividade agrícola
Açu Rio Salobra Sim xxxxx 2000
e industrial
Consumo
humano e
Orós Açude Doce Não 10.000.000 xxxxx
atividades
recreativas

A partir de pesquisa, relate os dados solicitados e relativos às fontes hídricas de


sua região.

Obs.: no item Qualidade da água, classifique-a como potável, doce, salobra. E


em Utilização da água, como consumo humano, lavagem de roupa, agrícola,
industrial, recreação.

44 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Na disciplina Arquitetura Atômica e Molecular, você aprenderá que a molécula d’água é
resultante da combinação de dois átomos de hidrogênio com um átomo de oxigênio através de
um tipo de cola (elétrons) partilhada pelos átomos, em química nomeada de ligação covalente
e está representada na Figura 6, por traços unindo os átomos.

Figura 6 – A molécula de água

Ciências dos sistemas da Terra


Asociada ao estudo das estruturas física, química e biológica do nosso planeta, surge
um novo campo da ciência denominado ciências dos sistemas da Terra, que a vê de forma
integrada. Os especialistas desse novo campo de estudo combinam instrumentos e idéias
das disciplinas científicas formais, como: Geologia, Biologia, Química, Física, Estatística
e Informática, além da Matemática, como suporte essencial à elaboração de modelos que
retratam os diversos sistemas constituintes da Terra. Também fazem uso de tecnologias
modernas, visando à determinação de parâmetros físico-químicos associados ao planeta, tais
como a concentração dos gases componentes da atmosfera, a monitoração da temperatura
de continentes e oceanos, as medidas da umidade do ar, entre ouros. Produtos da tecnologia
humana, satélites artificiais em órbita da Terra, a monitoram continuamente, em tempo real,
fornecendo dados aos cientistas, o que lhes permite compreender melhor como funciona o
sistema Terra. Isso também auxilia os estudos sobre a previsão das mudanças passíveis de
se processarem e afetarem o planeta.

Assim, podemos utilizar, sempre que necessário, a palavra sistema para descrever algo
constituído de diversas partes que se juntam para formar um todo interligado. Por exemplo, o
homem, um micro-sistema, está interligado ao sistema Terra, um macro-sistema, de extrema
complexidade, conforme podemos visualizar na Figura 7.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 45


Figura 7 – O homem como um sistema integrado

Atividade 9
Como você analisa o verso de Olavo Bilac: a Terra é um todo?

Ao estudarmos a Terra como um sistema, devemos dedicar especial atenção aos seus
três constituintes mais nobres: a matéria, a energia e a vida, tríade indissociável. Portanto,
para compreendermos o sistema Terra de forma integrada, devemos dedicar a máxima atenção
a três princípios que atuam de forma conjunta e que são: os ciclos da matéria, os fluxos de
energia e as teias da vida. É isso que propomos fazer nos próximos quatro anos dos Cursos
de Licenciatura em Biologia, Física, Matemática e Química.

46 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, você foi estudou a constituição do sistema solar e, mais
particularmente, a constituição físico-química da Terra. Algumas conclusões a
respeito das características do nosso planeta foram obtidas fazendo uso de dados
coletados na literatura consultada e de gráficos correlacionando algumas das
variáveis físico-químicas listadas. Com isso, buscamos demonstrar a importância
que têm os procedimentos gráficos na análise de contextos científicos. Uma
breve introdução a respeito da disciplina sistêmica foi realizada com o intuito
de demonstrar as vias pelas quais busca-se compreender, a partir da pesquisa
científica, o comportamento dos sistemas.

Autoavaliação
A palavra TERRA, originária do latim, apresenta vários sinônimos. Aqui, listamos
1 alguns (ver Figura 8). Consulte o dicionário de língua portuguesa e anote os
significados possíveis para cada um deles.

Figura 8 – A palavra Terra e seus significados

Atenção! Você pode proceder à consulta fazendo uso do dicionário de português


on-line disponível no endereço: http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 47


Com base nas anotações decorrentes da questão anterior, proceda às associações
2 entre os números correspondentes aos termos e os círculos da Figura 9, observando
as suas dimensões.

(1) Município
(2) Estado
(3) País
(4) Continente
(5) Planeta
(6) Sistema Solar
(7) Universo

Figura 9 – Ordem de grandeza das entidades envolvidas

Partindo das associações feitas na questão anterior, e considerando o aspecto


3 “tamanho do círculo”, a que conclusão você chega?

A Tabela 4 a seguir fornece dados de agrimensura de terras.


4
TERRAS SUPERFÍCIE (km2)
Currais Novos 883,3
Macau 746,9
Nova Cruz 282,2
Rio Grande do Norte 53.077,3
Brasil 8.514.215,3
América do Sul 17.600.000
Planeta Terra 510.101.000

Confeccionando o gráfico de Y = f(X), você pode tirar várias conclusões.

a) Quem será X e quem será Y?

b) Quais informações se pode extrair desse gráfico?

48 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


5 Quais as riquezas naturais da sua região? Caracterize a sua constituição química.

6 Como você caracteriza a litosfera, a hidrosfera e a biosfera da sua região?

7 Agora, você já é capaz de definir o planeta Terra? Vamos tentar!

Referências
ASIMOV, I. Asimov explica. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1986.

ASIMOV, I. 111 Questões sobre a Terra e o espaço. 2.ed. São Paulo: Best Seller, 1991.

BILAC, Olavo. Paráfrase. Jornal da Poesia, 1996.

CALIFORNIA INSTITUTE OF TECNOLOGY. Jet propulsion laboratory. Disponível em: <http://


www.jpl.nasa.gov/>. Acesso em: 20 maio 2005.

ENCYCLOPÉDIE SCIENTIFIQUE DE L’UNIVERS. La Terre, les eaux, l’átmosphere. França:


Gauthir-Villars, 1984.

LOVELOCK, J. As eras de Gaia. Rio de Janeiro: Campus, 1991.

MARGULIS, L.; SAGAN, D. Microcosmos. São Paulo: Cultrix, 2002.

RAMADE, F. Éléments d’écologie. Paris: McGraw – Hill, 1984.

SAHTOURIS, E. A dança da Terra. Rio de Janeiro: Rosas do Tempo, 1996.

SUSSMAN, A. Guia para o planeta Terra. São Paulo: Cultrix, 2000.

TEIXEIRA, W. et all. Decifrando a Terra. São Paulo: Oficina de Textos, 2003.

TERZIAN, Y.; BILSON, E. O Universo de Carl Sagan. Brasília: UnB, 2001.

WARD, P. D.; BROWNLEE, D. Sós no universo? Rio de Janeiro: Campus, 2001.

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 49


Ciências da Natureza e Realidade
Fonte: http://www.iupac.org/reports/periodic_table/IUPAC_Periodic_Table-3Oct05.pdf

Aula 2
50
Anotações

Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade 51


Anotações

52 Aula 2 Ciências da Natureza e Realidade


A Terra – atmosfera

Aula

3
Apresentação
Nesta terceira aula, continuaremos discutindo a aplicação da abordagem científica visando
explicar o mundo a nossa volta.

Depois da superfície, nada está mais perto de nós que a atmosfera da Terra e é esse
imenso oceano gasoso no qual estamos imersos que estudaremos agora. De tão acostumados
a ela, nem a percebemos, mas através do clima e do tempo sofremos sua interferência em
nosso dia-a-dia, até mesmo na roupa que vestimos. Focalizaremos, nesta aula, as principais
características da atmosfera terrestre e algumas de suas influências sobre nossa vida.

Objetivos
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:

descrever as principais características de uma atmosfera;


1
caracterizar as etapas do ciclo da água;
2
descrever a atmosfera terrestre, em termos de
3 temperatura, densidade e pressão;

explicar a diferença entre raios, trovões e relâmpagos.


4

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 55


Será que vai chover?
Para responder a essa pergunta, costumamos procurar no céu os indícios de chuva. E
você, quais indícios procura observar quando quer saber se vai chover ou não?

Atividade 1
Faça uma relação das coisas que você observa quando deseja saber se
vai chover. Se achar necessário, consulte outras pessoas para saber o que elas
observam e por que acham que os indícios apresentados serão importantes para
lhe dar uma resposta.

Você pode ter respondido que olha o céu para verificar se está nublado ou se existem
nuvens escuras formando-se no horizonte; verifica se a temperatura mudou; dentre outros
indícios. E, com isso, faz sua estimativa quanto à probabilidade de chuva, algumas vezes,
acertando, outras, não. Outros podem fazer estimativas de longo prazo à procura de indícios
para o comportamento da estação chuvosa (assunto de nossa aula 8: Clima e tempo).

Saber a ocorrência de chuvas é um assunto de tal importância que todos os dias os


jornais, as rádios e a televisão divulgam nos espaços jornalísticos a previsão do tempo, visando
manter a sociedade informada acerca desse aspecto. E, na maioria das vezes, essas previsões
são corretas. Para subsidiá-las, são apresentadas fotos ilustrativas de satélite, conforme a

56 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


Figura 1. Nela, aparece um mapa no qual podemos visualizar o contorno de nosso país e a
distribuição de nuvens numa vasta área.

Atualmente, dispomos de meios sofisticados como satélites meteorológicos (Figura 1),


que ficam permanentemente monitorando as condições de pressão, temperatura e movimento
das nuvens sobre nosso planeta. Para receber essas informações, temos uma vasta rede de
computadores e pessoal especializado, os meteorologistas, que, a partir dos dados coletados
e da análise dos programas, procuram prever o momento, o local e a quantidade de chuvas.

Figura 1 – Imagem da América do Sul obtida pelo satélite LANDSAT disponibilizada na Internet pelo INPE/CPTE e
Imagem de um satélite de sensoriamento remoto mostrando a superfície da Terra vista por ele.
Fonte: CPTEC – Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos. Disponível em: <www.cptec.inpe.br>.

E quais os elementos principais para que tenhamos chuva?

Essa é fácil! Sol e água no solo (em lagos, rios, mares e principalmente nos oceanos).
Sem isso, a natureza não pode iniciar o processo que leva à chuva. Além da água existente nos
oceanos (os oceanos são a principal fonte de nuvens, as quais levadas pelos ventos podem se
deslocar por centenas ou milhares de quilômetros para dentro dos continentes) e no solo, o
vapor produzido pelas plantas nas florestas e matas através da evaporação também contribui
para a formação de nuvens, por isso o desmatamento, além de outros problemas ambientais,
pode reduzir a quantidade de chuvas na região.

Começaremos imaginando um lago ou um açude cheio. Você já deve ter percebido que
mesmo não tirando água desses locais eles secam gradativamente com o tempo. Aqui, vale a
pena lembrarmos de que na maioria dos reservatórios a céu aberto, perde-se mais água por
evaporação do que por consumo, foi o que ocorreu com o Itans, em Caicó/RN, por exemplo.
Isso acontece por causa da evaporação.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 57


Para onde vai a água que evapora do açude? Pense um pouco, lembre-se da aula 2 (A
Terra – litosfera e hidrosfera).

Você deve, acertadamente, ter lembrado que a água evaporada vai, ajudada pelos ventos,
ser levada para cima e acaba formando as nuvens. Assim, devido à ação do sol (calor), a água
evapora e o vento se encarrega de conduzir o vapor até uma altura em que a temperatura seja
suficientemente baixa a ponto de permitir sua condensação. Nessas alturas, que são bastante
variáveis, temos as nuvens formando-se a partir daquela água que evaporou.

A temperatura para que isso ocorra é chamada de temperatura de orvalho, que é em


torno de 12 a 15oC.

Muito bem, você sabe a que altura estão aquelas nuvens brancas que se movem no céu?

Uma dica para ajudá-lo a responder: as nuvens estão muito acima do edifício mais alto
de sua cidade. Imaginando agora que a altura de cada andar seja da ordem de 4,0 metros (a
abreviatura de metro é m), um prédio de 20 andares teria 20 × 4,0 = 80,0 m. Esse valor, 80,0 m,
é muito grande, se comparado com a altura média de um homem adulto, 1,70 m. No entanto,
ainda é muito pouco se comparado à distância das nuvens. Elas, em geral, estão a 3000 m de
altura, isto é, 3,0 quilômetros (a abreviatura de quilômetro é km).

Atividade 2
Pense e responda.

Quantos prédios de 20 andares teríamos de colocar um sobre o outro para


atingirmos as nuvens?

58 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


Talvez, você esteja indagando: “Por que não conseguimos visualizar a evaporação da água
nem a sua subida, porém vemos as nuvens? E por que elas se formam em grandes alturas?”

A resposta para a primeira parte da pergunta é: durante a evaporação, as moléculas da água


estão muito distantes umas das outras, o que torna impossível enxergá-las. No entanto, quando
elas atingem uma certa altura, começam a se condensar, se aglutinam e a distância que as
separa se torna menor, formando grandes aglomerados de moléculas. Assim, podemos vê-las.

Mas, por que a água que evaporou se condensa a uma considerável altura? Pelo simples
fato de que, à medida que subimos na atmosfera, a temperatura ambiente diminui e quando
é atingida a temperatura de orvalho (aproximadamente 15oC), o vapor d’água começa a se
condensar.

Mas, como compreender melhor essa variação da temperatura de nossa atmosfera? É esse
o próximo tópico de nossa aula.

A atmosfera terrestre
Você sabe o que é a atmosfera?

Pois bem, chamamos de atmosfera a envolvente gasosa que circunda um corpo celeste
qualquer. Podemos ainda acrescentar que a atmosfera terrestre é uma massa de ar, formada por
diversos gases presos à crosta pela ação gravitacional do planeta, incolor, insípida e inodora. Ela
é má condutora de eletricidade e horizontalmente estratificada e transparente para a radiação
visível e opaca, por exemplo, para os raios-x oriundos do espaço.

Além da Terra, outros corpos celestes podem possuir atmosfera (mas, atenção! Nem todo
corpo celeste possui atmosfera). Como exemplo, nosso satélite natural, a Lua, não possui
atmosfera, mas Titan, satélite de Saturno, sim.

A atmosfera mantém-se presa ao corpo celeste – planeta, satélite, estrela ou cometa –,


devido à força de atração gravitacional entre eles. Essa força, também conhecida como força da
gravidade, impede que as partículas que as formam escapem para o espaço exterior. No nosso
caso, presa, a atmosfera fica acompanhando o movimento de rotação da Terra.

Mas, se a Terra atrai para o seu centro as gotículas de água que formam o vapor produzido
durante a evaporação, como é que elas conseguem vencer esta atração e subir, formando as
nuvens? Certamente, era nisso que você estava pensando, não era!

Muito bem, elas sobem pelo mesmo princípio de um balão alimentado com ar quente ou
cheio de hidrogênio, ou de um pedaço de isopor quando volta rapidamente à superfície ao ser
mergulhado na água. Isso tem a ver com a densidade e com uma força chamada de empuxo.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 59


A densidade de um sólido é definida como a massa por unidade de volume.
Enquanto a densidade de um fluido é a razão entre a massa e um volume unitário.
A densidade de um corpo é uma grandeza relativa, no sentido de que estamos
tomando seu valor em relação à densidade da água. Esta é definida, em condições
normais de temperatura e pressão, pelo SI (Sistema Internacional de Unidades),
como sendo igual a 1000 kg/m3.

Como seria provável, a densidade da atmosfera é muito inferior à da água. Em


condições normais, o nível do mar, é de aproximadamente 1 kg/m3. À medida
que subimos, a densidade atmosférica vai diminuindo rapidamente, isto é, a
quantidade de gases por unidade de volume diminui. Devemos lembrar ainda:
a definição de densidade implica que para uma mesma massa, à proporção que
o volume aumenta, a densidade diminui. Existe uma equação que relaciona a
densidade da atmosfera com a altura, pressão e temperatura, entretanto, isso
é assunto para mais tarde, quando você estiver estudando uma parte da Física
chamada Termodinâmica.

Atividade 3
Uma das perguntas com a qual, muitas vezes, nós, professores e alunos, nos
defrontamos é “Por que uma moeda afunda e um navio flutua?” Para identificar
o que ocorre nesse caso, procure solucionar o seguinte desafio: como você faria
para fazer flutuar um bastão de massa de modelar sem colocá-lo sobre um outro
corpo? Tente fazer essa experiência e relate como conseguiu resolver o problema.

60 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


Você deve ter conseguido fazer a massa de modelar flutuar alterando o volume em contato
com a água, ou seja, transformando-a em um corpo com a forma de uma canoa de fundo
chato, por exemplo. Com isso, você aumentou o volume da massa e sua densidade diminuiu,
permitindo a flutuação do objeto.

Como sabemos, a água é mais densa que o ar, mas quando os raios do Sol aquecem a
água do açude, as gotinhas que evaporam, quando são aquecidas, se dilatam, aumentando de
volume sem variação de massa, logo, sua densidade diminui.

Dessa forma, com a densidade diminuindo até atingir um valor menor que a densidade
do ar é que essas gotinhas acabam subindo. E, como já dito, sobem até se condensarem.

Vejamos agora um pouco mais de ciências para entendermos a variação da temperatura


da atmosfera com a altura. Como você pode observar na Figura 2, a temperatura diminui com a
altura, assim o vapor d’água que atinge essas regiões se condensa e se transforma em nuvens.
E o que é mais importante, a densidade delas aumenta um pouco, fazendo-as flutuar em um
ambiente onde essa densidade é praticamente igual à do meio.

Figura 2 – Comportamento da temperatura da atmosfera em função da altura. Note também que de acordo com
o comportamento da temperatura (curva tracejada) a camada recebe um nome específico.

Fonte: O CÍRCULO do geógrafo. Disponível em <http://clientes.netvisao.pt/carlhenr/7ano.htm>.

Agora, já sabemos como as águas saem dos reservatórios na superfície da Terra e se


transformam em nuvens. Com a posterior queda da água das nuvens em forma de chuva temos
fechado um dos ciclos fundamentais da natureza: o ciclo da água. A esse assunto voltaremos na
aula sobre clima e tempo.

Nossa pergunta está respondida. Contudo, precisamos entender melhor a atmosfera terrestre.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 61


Atividade 4
A Figura 2 mostra o comportamento, a partir da superfície da Terra (tendo-se
como referência o nível do mar), da temperatura da atmosfera. Observando com
cuidado esse gráfico, verificamos alguns aspectos interessantes. Vamos fazer
isso juntos? Então, tente responder às seguintes questões.

Qual a temperatura na superfície da Terra ao nível do mar? (Esse é um


1 valor médio, pois o valor absoluto varia de lugar para lugar).

A partir da superfície, você pode visualizar uma reta inclinada para a


2 esquerda mostrando que a temperatura cai linearmente com a altura.
Indique o valor mínimo da temperatura e a que altura isso ocorre para
o trecho linear.

62 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


A região da atmosfera que vai da superfície (nível do mar) e envolve a faixa onde a
temperatura diminui linearmente com a altura é chamada de Troposfera, a qual é considerada a
primeira camada da atmosfera terrestre. É nessa faixa, de aproximadamente 13 km de espessura,
que se concentra a maioria dos fenômenos meteorológicos e se formam as nuvens, os ventos
e a chuva. É, portanto, uma camada que merece um pouco mais de atenção, já que faz parte da
pergunta inicial desta aula.

Em se tratando de Troposfera, a primeira questão que surge é: qual o motivo para tal
comportamento da temperatura da atmosfera, isto é, por que ela decresce com a altura?

A resposta é que a principal fonte de aquecimento da atmosfera nessa primeira parte é a


superfície, a qual absorve a radiação visível que chega do Sol, aquecendo-se e emitindo-a no
infravermelho para a atmosfera. Como em toda fonte de calor, à medida que nos afastamos
da superfície, a temperatura diminui, ou seja, quanto maior a altura (mais longe da fonte),
menor a temperatura.

Mais um mistério resolvido!

No entanto, verificando novamente o gráfico, você verá que logo acima da Troposfera a
temperatura começa a subir. Essa foi uma descoberta importante. Ela indica que existe uma
fonte de calor acima dessa primeira camada que, ao contrário, faz com que haja aumento na
temperatura com a altura atingida.

A explicação para esse fato está na existência da camada de ozônio, que ao absorver
parte da radiação ultravioleta solar incidente na atmosfera se torna uma fonte de calor,
emitindo no infravermelho.

A camada de ozônio é duplamente importante para o nosso planeta: primeiro, por absorver
radiações que são nocivas aos organismos vivos habitantes da superfície; segundo, por contribuir
para a temperatura de nosso planeta, ajudando a mantê-la nos níveis que se encontra atualmente.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 63


Variação da densidade
atmosférica com a altura
Quando a seleção brasileira de futebol joga contra a Bolívia, lá em Bogotá, nossos
jornalistas enfatizam o que eles chamam de “problema com a altitude”. Dizem que nossos
jogadores renderão menos fisicamente, que a bola adquire uma velocidade diferente.

Será que essas preocupações têm fundamento? E, o que isso tem a ver com nossa aula?

Vejamos o que foi exposto no jornal Folha de São Paulo em sua edição de 07/11/2001:

Bolívia impõe quarta derrota à seleção brasileira em La Paz

A seleção brasileira voltou a tropeçar jogando na capital boliviana, localizada


3.600 metros acima do nível do mar, ao perder por 3 a 1, hoje, pela penúltima rodada
das eliminatórias sul-americanas.
Está (sic.) é a quarta vez que os brasileiros perdem para o adversário atuando
no estádio Hernando Silles. Diante dos bolivianos, a seleção também sofreu sua sexta
derrota em nove jogos como visitante na competição.
Em La Paz, o selecionado brasileiro sofreu sua primeira derrota em eliminatórias.
Em 1993, a equipe dirigida por Carlos Alberto Parreira perdeu por 2 a 1. Os outros
tropeços foram na Copa América de 63 e 79.
Na altitude, a equipe brasileira levou a melhor apenas duas vezes: em 1981, pelas
eliminatórias da Copa da Espanha, e na final da Copa América de 97. No primeiro, o
time de Telê Santana ganhou por 2 a 1, enquanto, no outro, a vitória foi por 3 a 1.

Fonte: Folha On-Line. Disponível em: <www.folha.uol.com.br/folha>. Acesso em: 07 nov. 2001.

Verifica-se que o artigo não apresenta uma justificativa para o fato de nossos jogadores
serem afetados pela altura. Vejamos, então, qual pode ser a explicação. Agora, para
compreendermos essa relação, precisaremos dos conceitos de densidade e pressão.

Ao contrário do que ocorre com a temperatura, tanto a densidade quanto a pressão


atmosférica diminuem continuamente com a altura. A expressão matemática desse
comportamento envolve uma função chamada exponencial, que você estudará em Matemática.
No momento, não necessitamos desse conhecimento, mas olhando o gráfico a seguir (Figura
3), pode-se ter uma idéia quantitativa e qualitativa do comportamento da densidade e também
da pressão em função da altura.

Ou seja, verificamos que tanto a densidade quanto a pressão caem rapidamente com a
altura. A 25 km de altura, a densidade já é tão baixa que seria impossível para qualquer um de
nós respirar. A densidade é tão baixa que não permite que aviões voem a determinada altura.

64 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


24

20

16
ALTITUDE/km

4
12
3,5

PRESSÃO 3
8
DENSIDADE 2,5

2
4
0
0 0.6 0.7

0
0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1

Figura 3 – Gráfico da variação da densidade e da pressão em relação à superfície

Atividade 5
Como você já sabe, a densidade pode afetar a respiração. Podemos
voltar a ler o texto do jornal e observar o gráfico da Figura 3 para responder
às questões propostas.

Qual é a altura de La Paz?


1
Localize no gráfico, no eixo vertical, a altura correspondente a que
2 você encontrou no item anterior.

Localize no gráfico, no eixo horizontal, a pressão e a densidade


3 relativas à altura que você marcou no item 2. Anote abaixo
os resultados obtidos.Densidade: ___________; pressão:
___________. Esses são os valores relativos da densidade do ar e
da pressão atmosférica em La Paz.

Qual é o valor relativo da densidade do ar a 4000 m de altura?


4

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 65


Note que na Figura 3 é mostrado quantitativamente o valor da densidade para diversas
alturas. Perceba, ainda, que no eixo horizontal (eixo-x), encontramos os valores relativos de
densidade e pressão, isto é, o valor máximo é 1,0 e os valores anteriores são percentuais
desse valor máximo.

O valor 0,8, por exemplo, significa que à altura correspondente, ou seja 2,0 km, a
densidade é da ordem de 80% do valor na superfície. Assim, quando subimos 2,0 km, temos
menos 20% de oxigênio e nitrogênio disponíveis para respirar.

Como se verifica nas respostas que você deu à atividade anterior, os nossos locutores
e jornalistas desportivos não deixam de ter razão, a diferença relativa é da ordem de 30% e
nosso organismo necessita de algum tempo para se acostumar com esse ar mais rarefeito.

Uma das características mais interessantes da atmosfera, que nos passa despercebido,
é que ela possui peso e esse peso é responsável por aquilo que chamamos de pressão
atmosférica. A atmosfera exerce pressão sobre o nosso corpo, sobre a superfície terrestre e
sobre qualquer objeto que esteja em contato direto com ela. Estamos sofrendo o tempo todo
a ação da pressão, no entanto, todos os nossos órgãos internos e externos estão habilitados
pela natureza para conviver nesse ambiente. O que acontece conosco quando subimos muito
alto? Nosso ouvido dói. Isso ocorre porque a pressão externa diminui e a parte interna do ouvido
força os tímpanos para fora, provocando a sensação de dor.

Pronto, na faixa de 300 a 3000 m, começam a se formar as nuvens, dependendo da


temperatura e da pressão. Nos períodos mais frios, elas se condensam mais em alturas menores
e, nos períodos mais quentes, em alturas maiores. Existem outros fatores importantes, como os
ventos ascendentes que podem levar as nuvens até alturas da ordem de 12000 m. Esse fenômeno
é mais comum nas regiões de grandes florestas, como a amazônica.

Fenômenos elétricos na atmosfera


A chuva chega e com ela raios, relâmpagos e trovões! De repente, o tempo começa a
mudar e as nuvens se tornam escuras, pois as gotinhas de água se aglutinam, tornando-se
maiores e espalhando menos a luz do Sol. Essas gotas maiores não conseguem mais “flutuar”
e se precipitam em direção ao solo. Dessa forma, ocorrem as chuvas.

Mas, muitas coisas acontecem no interior das nuvens de chuvas, o qual é um local bastante
conturbado. Ventos ascendentes e descendentes levam gotinhas para cima e para baixo e com
elas, cargas elétricas são acumuladas em distintas posições dentro das nuvens, o que cria fortes
campos elétricos nessa região. Quando esses campos se tornam “suficientemente altos”, acabam
por provocar o movimento de cargas elétricas que tentam assim neutralizar as nuvens. Esse
deslocamento, que nos fios elétricos de nossas casas é chamado de corrente elétrica, nas nuvens

66 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


é chamado de raio. O relâmpago é a parte visível da descarga elétrica. Assim, apesar de muita
gente utilizar as palavras relâmpagos e raios como sinônimos, na verdade, os raios são descargas
elétricas que ocorrem na atmosfera, enquanto os relâmpagos resultam da luz emitida durante
essas descargas devido à ionização do ar.

E o trovão? Este nada mais é do que uma onda de choque produzida pela expansão súbita do
ar em virtude de seu rápido aquecimento, provocado pelo raio, ou seja, apenas um efeito sonoro.

O que mais sabemos sobre os relâmpagos e os trovões

Em nosso país, há grande probabilidade de ocorrência de relâmpagos. Seus efeitos podem


ser danosos para a sociedade, como também fundamentais para a vida e sua renovação. É através
dessas descargas elétricas, relâmpagos ou raios, que a Terra mantém sua neutralidade elétrica,
de modo que a cada segundo, em algum lugar do planeta, está ocorrendo um relâmpago. Além
disso, por provocar incêndios em regiões como o cerrado brasileiro, contribui para a renovação
da flora (isso é muito diferente das queimadas que, muitas vezes, são criminosas, danificam o
solo e poluem o ar).

Leia um pouco mais sobre esse assunto no trecho a seguir, extraído de uma reportagem
publicada na Revista Scientific American, Edição Nº 20 – janeiro de 2004.

Desde que a Terra iniciou um processo de resfriamento, há bilhões de anos,


descargas elétricas na atmosfera têm sido constantes. Essa fonte de energia pode estar
associada à origem da vida, na passagem da matéria inorgânica para a orgânica, como
sugerem algumas versões da teoria clássica.
Descargas entre as nuvens e o solo, os raios são a maior evidência da eletrificação
da atmosfera na Terra. Atualmente, cerca de 700 milhões de raios por ano lampejam
pelo globo terrestre. Provocam em média duas mil mortes e pelo menos 30% da falta de
energia elétrica, entre outros inúmeros prejuízos. Certamente é interessante esclarecer
que 99% dos raios são do tipo descendentes. Originam-se nas nuvens e terminam na
superfície do planeta. No Brasil, ocorrem de 50 a 70 milhões de raios todo ano. Produzem
em média uma centena de mortos e trazem perdas estimadas em R$ 500 milhões, na
maior parte ao setor elétrico. O Brasil, devido à enorme extensão territorial e posição
geográfica - a região tropical - pode ser considerado como o país de maior incidência
de raios em todo o mundo, embora a região com maior densidade de raios por m2/ano
esteja na África Central.

(PINTO JUNIOR; CARDOSO, 2005)

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 67


Atividade 6
De acordo com as informações contidas no texto da Revista Scientific
American, determine, aproximadamente, quantos relâmpagos ocorrem em média,
por segundo, no Brasil e em nosso planeta.

Indique uma conseqüência boa e uma ruim, relacionadas à ocorrência de raios.

68 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


A partir da leitura do texto, podemos tirar algumas conclusões interessantes. A primeira
delas é que o assunto tratado aqui é importante e que os cientistas se preocupam com ele.
A segunda é que além dos raios que ocorrem no interior das nuvens, os quais não oferecem
tantos riscos, também existem os raios que ocorrem entre o solo e as nuvens. Estes podem
ser das nuvens para o chão (são a maioria, como você viu na reportagem!) e uma pequena
quantidade ocorre da terra para as nuvens. E, finalmente, pode-se concluir que sem os raios
não haveria vida na Terra, pois eles participam de importantes processos químicos, como a
síntese de compostos orgânicos, fundamentais no surgimento da matéria viva.

Devemos lembrar ainda que nem todas as nuvens apresentam as condições necessárias
para que se tenha a formação de relâmpagos, os quais ocorrem basicamente em um só tipo de
nuvem: as cumulum nimbus (na aula 8, quando abordaremos clima, apresentaremos maiores
detalhes sobre esse tipo).

Além disso, assim como os raios, há três tipos de relâmpagos. O primeiro é o que ocorre
dentro das nuvens, isto é, em uma mesma nuvem ou naquelas que estão próximas. Um outro,
muito freqüente, é do tipo nuvem-solo, e o terceiro, muito mais raro, do tipo solo-nuvens.

O texto abaixo, do qual recomendamos a leitura, retirado da publicação Física na Escola,


v. 2, n.1, 2001, de autoria do Prof. Marcelo M. F. Saba, é bastante interessante e vale a pena
ser lido por todos que desejam aprender mais sobre esse intrigante fenômeno natural.

Aqueles que tocam o solo (80%) podem ser divididos em descendentes (nuvem-solo)
e ascendentes (solo-nuvem). Os que não tocam o solo podem ser basicamente de três
tipos: dentro da nuvem, da nuvem para o ar e de uma nuvem para outra. O tipo mais
freqüente dos raios é o descendente. O raio ascendente é raro e só acontece a partir de
estruturas altas no chão (arranha-céus) ou no topo de montanhas (torres, antenas). Os
raios ascendentes têm sua ramificação voltada para cima.
(SABA, 2001)

É interessante lembrarmos que entre os benefícios oriundos da ação dos raios está a
própria vida. Sabemos que a síntese de material orgânico na atmosfera terrestre primitiva se
dá na presença de descargas elétricas. Essa síntese passa pela formação dos coacervados
(sobre esse assunto, você pode consultar a Internet, por exemplo, o site www.portalbrasil.
net/educacao_seresvivos_origem.htm), tijolos fundamentais que antecedem a matéria viva.
Por outro lado, ao cair em regiões como a dos cerrados brasileiros, provocando incêndios,
os raios ajudam na renovação do solo e da vida do ecossistema. Lembre-se: os incêndios do
tipo queimada e outros são muito diferentes dos provocados por raios, pois não respeitam
os ciclos da natureza e em geral acabam poluindo o ar e empobrecendo o solo, ao destruírem
importantes nutrientes.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 69


Resumo
Nesta aula, vimos que a atmosfera é responsável pela ocorrência dos fenômenos
climáticos e por fornecer o ar que respiramos. Vimos também como se
comportam alguns de seus parâmetros físicos, como temperatura, densidade e
pressão. Aprendemos um pouco como esses parâmetros podem afetar a nossa
vida, e também como ocorrem os raios e relâmpagos. Vimos ainda que os trovões
são gerados pela expansão do ar, quando aquecido pelo raio.

Autoavaliação
Uma pessoa conta que durante uma tempestade ouviu um forte estrondo. Ela acredita
1 ter sido causado pelo maior trovão que já existiu.

Logo depois, viu um clarão que iluminou todo o terreiro e o alpendre da casa (um
relâmpago!). Essa história tem consistência física? Ou seja, a seqüência de eventos
está correta? Justifique sua resposta.

Dizemos que uma curva de temperatura apresenta gradiente positivo quando a


2 temperatura aumenta com a altura, e gradiente negativo, quando a temperatura diminui
com a altura. Com base nisso, a partir da Figura 1, complete a tabela (Figura 4).

Camada faixa de altura (km) gradiente de temperatura

troposfera Negativo

30−50 Positivo

Mesosfera 50−80
acima de 80km

Figura 4

70 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


Entreviste algumas pessoas para saber o que elas pensam acerca de como ocorrem
3 os relâmpagos e os trovões. Faça o relato dos resultados obtidos.

Supondo que a densidade do ar ao nível do mar seja de 1,2 kg/m3, qual a densidade do
4 ar em La Paz ? E a densidade do ar a 12000 m (a altura em que os aviões a jato voam)?

Siglas utilizadas nesta aula


LANDSAT: Satélite de Observação da Terra.

INPE: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – São José dos Campos SP, Brasil.

CPTEC: Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos.

NASA: National Aeronáutica and Space Administration.

Referências
CPTEC – Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos. Disponível em: <www.cptec.inpe.
br>. Acesso em: 20 jun. 2005.

FOLHA ON-LINE. Disponível em: <www.folha.uol.com.br/folha>. Acesso em: 7 nov. 2005.

GOODY, Richard M.; WALKER, James,C.G. Atmosferas planetárias. São Paulo: Ed. Blucher, 1996.

O CÍRCULO do geógrafo. Disponível em: <http://clientes.netvisao.pt/carlhenr/7ano.htm>. Acesso


em: 20 maio 2005.

PINTO JÚNIOR, Osmar; CARDOSO, Iara. Relâmpagos. São Paulo: Edusp, 1992.

_________ ; ________ . Decifrando os Raios: A fonte provável da energia que elaborou a


vida. Revista Scientific American, n. 20, jan./2004. Disponível em: <http://www2.uol.com.
br/sciam/>. Acesso em: 17 maio 2005.

SABA, Marcelo M. F. Física na escola. v. 2, n. 1, 2001.

WEINER, Jonathan. Planeta Terra. São Paulo: Martins Fontes, 1986.

Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade 71


Anotações

72 Aula 3 Ciências da Natureza e Realidade


Bioma Caatinga –
recursos minerais

Aula

4
Apresentação

N
esta aula, estabeleceremos alguns conceitos, tais como: biosfera e bioma. Em
seguida, caracterizaremos o Bioma Caatinga, que representa o semi-árido do
Nordeste do Brasil, temática de nosso curso. Abordaremos aspectos amplos desse
ambiente, com uma caracterização do solo e dos recursos minerais, denominados de fatores
abióticos. Na aula seguinte (aula 5 – Bioma Caatinga – recursos hídricos), terminaremos de
estudar os fatores abióticos com os recursos hídricos, e na aula 6 (Bioma Caatinga – recursos
florestais e fauna), estudaremos os fatores bióticos do Bioma Caatinga, representados por
sua flora e fauna. Enfoques sociológicos, econômicos, culturais, filosóficos e políticos, em
relação à Caatinga, você verá na disciplina “Educação e Realidade”.

Essa caracterização nos ajudará a ter um conhecimento mais técnico e sistematizado


sobre o ambiente em que vivemos. Espero que goste. É um assunto bastante instigante
e envolvente.

Objetivos
Você deverá, ao final desta aula, ser capaz de:

descrever o Bioma Caatinga com relação a seu solo e


1 recursos hídricos;

caracterizar e diferenciar conceitos ecológicos de Bioma


2 e Biosfera.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 75


Bioma

E
ntende-se por biomas, grandes unidades geográficas, caracterizadas por um determinado
clima e formações vegetais peculiares e neles predominantes. Os biomas são fortemente
influenciados pelo clima, sendo assim independentes do continente em que estão
presentes (Europa, Américas, África, Ásia ou Oceania). Há semelhanças entre algumas
paisagens nesses diferentes continentes, desde que sejam de climas parecidos. Os biomas
são separados primariamente pela latitude (e indiretamente, pelo clima).

São doze os principais biomas terrestres, classificados de acordo com características


climáticas, flora e fauna:

 Floresta Tropical Perenifólia,

 Floresta Tropical Decídua,

 Bosque Tropical Espinhoso,

 Savana,

 Deserto Quente,

 Mediterrâneo,

 Deserto Frio,

 Montanhas Altas (Floresta Boreal e Tundra),

 Floresta Boreal (Taiga),

 Tundra Ártica,

 Pradaria Temperada e

 Calota Glacial Polar.

Chama-se produção primária, a quantidade de biomassa produzida pelos seres


fotossintetizantes. Assim, os biomas localizados em regiões tropicais, sub-tropicais úmidas e
nas partes úmidas das latitudes temperadas são os que apresentam alta produtividade primária,
possuindo maior diversidade biológica (biodiversidade). Já os encontrados em locais de baixa
umidade, como nos desertos e nas altas latitudes, apresentam baixa produtividade, sendo
mais pobres em plantas e animais. A explicação para isso reside no fato de que a produção de
clorofila está diretamente relacionada à taxa de irradiação solar ambiente, a qual, como você
já sabe, depende da latitude.

76 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


No Brasil, encontramos uma grande diversidade de biomas, os quais de acordo com as
características de sua vegetação e clima são denominados:

 Mata Atlântica,

 Cerrado,

 Pantanal,

 Amazônia Central e

 Caatinga.

Esses tipos estão também incluídos na classificação dos biomas terrestres, mas de acordo
com o país onde ocorrem, eles podem ter uma denominação diferente, por exemplo, a savana
da África é chamada de cerrado no Brasil.

Figura 1 – Savana Africana.

Figura 2 – Cerrado Brasileiro

Fonte: UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA. A região do Jalapão no cerrado brasileiro. Disponível em:


<http://www.unb.br/ib/zoo/grcolli/jalapao/Jalapao.html>. Acesso em: 26 jul. 2005.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 77


Biosfera
A Biosfera representa o conjunto dos biomas terrestres. Ou seja, corresponde ao conjunto
dos organismos vivos, seus habitat, que podem ser: na litosfera (o ambiente de terra firme),
na atmosfera (espaço aéreo) e na hidrosfera (águas doces e salgadas). Esses espaços físicos
já foram abordados nas aulas anteriores. Dessa forma, a Biosfera inclui os seres vivos e o
ambiente físico, correspondendo ao nosso planeta como um todo. Ela provavelmente surgiu
há 3,5 bilhões de anos com o aparecimento dos primeiros seres vivos.

Os ambientes da Biosfera estão em constante inter-relação, havendo intensa troca de


energia e de materiais entre eles.

Bioma Caatinga

Atividade 1

Diversos escritores brasileiros têm descrito em verso e prosa a nossa caatinga


e o relacionamento do homem nordestino com esse bioma. Os versos a seguir,
escritos pelo poeta João Cabral de Mello Neto, é um exemplo do que estamos
falando. Leia-os e responda: como os versos caracterizam a Caatinga?

E de onde que o estais trazendo,


irmãos das almas,
onde foi que começou
vossa jornada?

Onde a Caatinga é mais seca,


irmão das almas,
onde uma terra que não dá
nem planta brava.

Trecho da obra Morte e Vida Severina de João Cabral de Mello Neto


(MELLO NETO, 2005, p. 47)

78 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Como deve ter percebido, nos versos de João Cabral, o termo Caatinga sempre vem
associado a uma terra árida e hostil aos seres vivos. Nela, há a necessidade de se lutar contra as
condições adversas da natureza. O Bioma das Caatingas é, provavelmente, o menos conhecido
de nosso país em relação a estudos de sua biodiversidade. Além disso, tem sofrido, nos últimos
400 anos, elevado grau de degradação devido ao seu uso desordenado e predatório.

As regiões naturais que formam as Caatingas são também chamadas de Sertão, Seridó,
Curimataú e Carrasco. O termo Caatinga tem origem tupi-guarani e significa mato (caa)
branco (tinga).

A Caatinga é uma região que se caracteriza por clima seco e semi-árido, com grande
fragilidade ambiental e econômica devido à escassez e distribuição irregular das chuvas,
englobando uma área de aproximadamente 1.048.957 km2 (cerca de 12,14% do território
nacional), com relevo modesto, altitude variável entre 40 e 1.100 metros acima do nível do
mar. Abrange os estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco (inclusive o Distrito Estadual
de Fernando de Noronha), Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão e o norte de
Minas Gerais (Polígono das Secas), onde estão inseridos 1.280 municípios com uma população
aproximada de 28.098.321 habitantes (IBGE, 2000).

Os conhecimentos que se tem sobre a Caatinga devem-se inicialmente aos botânicos


estrangeiros que viajaram pelo interior do Nordeste durante o século XIX. Nesses estudos,
a Caatinga é descrita como ambientalmente pobre e de pouca importância biológica, porém,
levantamentos recentes mostram que esse ecossistema possui uma das biotas mais particulares
do mundo em composição e adaptações às condições do meio ambiente, com significativo
número de espécies endêmicas, que devem ser consideradas como patrimônio biológico de
valor inestimável.

Na Caatinga, encontramos grande heterogeneidade nas suas características climáticas


e vegetais. Sendo essas diferenças relacionadas ao volume e à variabilidade das precipitações
pluviométricas, ou seja, das chuvas; e a uma maior ou menor fertilidade dos solos, que, por
sua vez, está relacionado aos tipos de rocha e ao relevo do terreno.

De acordo com as conclusões do Seminário Biodiversidade da Caatinga (SEMINÁRIO


BIODIVERSIDADE..., 2000) e Seminário de Planejamento Ecorregional da Caatinga (SEMINÁRIO
DE PLANEJAMENTO..., 2005), levando em consideração o tipo de solo, o clima e a cobertura
vegetal, a Caatinga foi sub-dividida em oito ecorregiões: Campo Maior, Ibiapaba-Araripe,
Depressão Sertaneja Setentrional, Planalto da Borborema, Depressão Sertaneja Meridional,
Dunas do São Francisco, Chapada da Diamantina e Raso da Catarina. Estando incluídos
acima, os diferentes tipos de Caatinga: arbustivas, arbórea, mata seca, mata úmida, carrasco
e formações abertas com cactáceas e bromeliáceas. Vale ressaltar que, segundo os relatórios
dos seminários, ajustes devem ser feitos nos limites dessas ecorregiões.

Você terá uma caracterização melhor da flora da Caatinga na próxima aula e quando
estudar a disciplina “Biodiversidade”.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 79


Figura 3

Atividade 2

Identifique no mapa onde é seu município, trace um perfil aproximado


em relação à altitude, índices pluviométricos e temperaturas médias mínimas
e máximas anuais.

De acordo com a sua importância biológica, muitos locais do Nordeste estão tendo
tratamento especial com programas de preservação de seus recursos naturais, incentivo
a projetos de pesquisa que visem o estudo de suas características naturais, incentivo ao
ecoturismo e trabalhos de educação ambiental com as comunidades locais.

80 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 3
Você sabe o que vem a ser ecoturismo? Ele é praticado em sua região?

As ecorregiões são denominadas de “Unidades de Conservação”. No Nordeste, existem


já instituídas cinco unidades e vinte e sete estão em processo de estudos. Isso pode parecer
muito, mas a área de todas elas somadas (aproximadamente 42 mil km2) corresponde a apenas
cerca de 4% da área total do Bioma Caatinga.

Essas unidades apresentam diferentes climas, relevos e seres vivos. Sendo que umas já
foram mais bem estudadas do que outras.

Atividade 4
Tente identificar em qual ecorregião sua cidade situa-se e verifique se em seu
município, ou próximo a ele, existem unidades de conservação do meio ambiente.

O Ministério do Meio Ambiente, em trabalhos realizados no projeto: “Avaliação e ações


prioritárias para a conservação da biodiversidade da Caatinga”, que leva em consideração a flora,
invertebrados, biota aquática, répteis, anfíbios, aves, mamíferos, fatores abióticos, estratégias
para a conservação, desenvolvimento regional, pressões antrópicas e uso sustentável da
biodiversidade, elaborou um mapa de áreas prioritárias para conservação e pesquisa do Bioma
Caatinga, quando foram definidas 82 áreas prioritárias, totalizando 19.527.534 ha (1 ha =

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 81


10.000 m2). Verificamos a existência de vários locais em que ações, no sentido de estudar e
preservar o meio ambiente, devem ser implementadas.

 Área prioritária de extrema importância biológica (27 áreas).

 Área prioritária de muito alta importância biológica (12 áreas).

 Área prioritária de alta importância biológica (18 áreas).

 Área com insuficiente conhecimento e, portanto, prioritária para pesquisa científica (25 áreas).

Caracterização dos recursos


abióticos do Bioma Caatinga
Iniciaremos agora a caracterização do solo e de seus recursos disponíveis. O solo é
importantíssimo e representa a terra, que muitas vezes chamamos de “terra mãe”, visto que
dependemos dela para a nossa sobrevivência. Do solo vêm os frutos e alimentos que garantem
a vida aos seres vivos. E é também de onde os homens retiram o barro para construir suas
casas e minerais de valor econômico, como o ouro, a turfa e o petróleo.

Sendo assim, a riqueza de um solo está relacionada a sua fertilidade e aos elementos que
possui em suas camadas superficiais ou profundas. Você já estudou, na terceira aula desta
disciplina, aspectos em relação à litosfera, porção de nosso planeta que constitui as terras.
Do uso que fazemos do solo, depende o futuro de nossa sociedade!

Solo
Quando nos referimos ao solo, imediatamente nos vem à mente a sua utilização
econômica, principalmente para a agricultura. Esse aspecto está relacionado à disponibilidade
de água (a permeabilidade do solo à água) e aos seus recursos minerais.

O solo da Caatinga é bastante variado em relação às suas características geo-biológicas,


refletindo diretamente em sua capacidade de reter água e na sua fertilidade para a agricultura.

Nas áreas de solos menos férteis, existem afloramentos de rochas graníticas, que ainda
não sofreram intemperismo, permeadas por pequenos pedaços de rochas de diferentes
tamanhos. A vegetação reflete a escassez de água e de nutrientes e ocorre em manchas de
solo específicas e até mesmo nas frestas de rochas graníticas, com numerosa variedade de
cactáceas e bromeliáceas. No interior e em torno dessas plantas, encontramos ambientes
propícios para a proliferação de outras espécies vegetais.

82 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Já nos solos férteis, encontramos espécies vegetais de porte pequeno, médio e alto,
dependentes da disponibilidade de chuvas e do teor de umidade do local. Encontramos esses
ambientes nas encostas e topos de algumas serras úmidas nos Estados do Piauí, Ceará, Rio
Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia.

A natureza da rocha é um fator importante na formação dos solos, interferindo em


sua topografia e drenagem, fatores estes intimamente relacionados com a capacidade de
armazenamento e qualidade das águas. Por esse motivo, apesar de estarmos falando sobre
solos, abordaremos aqui alguns aspectos relacionados à quantidade e qualidade da água.

Do ponto de vista geológico, no Nordeste existem dois grandes conjuntos estruturais:


Bacia Sedimentar e Escudo Cristalino.

A Bacia Sedimentar caracteriza-se por solos com profundidade superior a dois


metros, podendo chegar a seis. Possuem alta capacidade de infiltração e baixo escorrimento
superficial, possibilitando um suprimento de água de boa qualidade ao lençol freático, que,
devido a sua profundidade está totalmente protegido da evaporação. Essa bacia abrange os
estados do Maranhão, Piauí (exceto uma estreita faixa na região sudeste) e Bahia (boa parte
da região oeste, sudeste e em toda a Chapada Diamantina). Alcança, ainda, todo o litoral
de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará, incluindo neste último, a
chapada do Araripe.

Figura 4

Fonte: Figura adaptada de SUASSUNA, João. O processo de salinização das águas superficiais e subterrâneas no Nordeste brasileiro.
Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/orig2.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

O Escudo Cristalino é formado por solos geralmente rasos, com cerca de sessenta
centímetros de profundidade. Possui baixa capacidade de infiltração, alto escorrimento
superficial e reduzida drenagem natural. Possibilitando pouco armazenamento de água entre
fendas e fraturas na rocha, que se denomina de aqüífero fissural. Em regiões de solos aluviais,
formam pequenos reservatórios superficiais e de baixa qualidade (águas ricas em cloro),
sujeitos à ação da evaporação e a bombeamentos. Essas águas de fendas de rochas cristalinas
são, em sua maioria, de qualidade inferior e normalmente servem apenas para o consumo
animal; no entanto, algumas vezes, devido à escassez de água, atendem ao consumo humano
e mais raramente à irrigação.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 83


Figura 5
Fonte: Figura adaptada de SUASSUNA, João. O processo de salinização das águas
superficiais e subterrâneas no Nordeste brasileiro. Disponível em: <http://www.fundaj.gov.
br/docs/tropico/desat/orig2.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

Esse tipo de solo localiza-se em praticamente todo o interior do Ceará; na parte meridional
do Rio Grande do Norte; em todo o interior da Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Sergipe;
bem como no centro-sul do Estado da Bahia, constituindo um conjunto que corresponde a
720 mil km2, cerca de 45% de superfície do Nordeste.

Figura 6
Fonte: Figura adaptada da obra de SUASSUNA, João. O processo de salinização das águas superficiais e subterrâneas no Nordeste brasileiro.
Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/orig2.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

84 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 5
Como é o abastecimento de água de sua região? Poços? Açudes?
Barragem? Existem fontes distintas para o consumo humano, uso animal e
agrícola? Comente.

Uma das formas de se classificar os solos está associada à sua erodibilidade, ou seja,
sua susceptibilidade de sofrer erosão, a qual ocorre devido ao trabalho mecânico de desgaste
realizado por águas correntes ou ventos. Sendo assim, os solos podem possuir erodibilidade:

 baixa: latossolos amarelos e vermelho-amarelos, podzólicos distróficos, solos litólicos,


solos aluviais e areais quatzosas;

 moderada: latossolos vermelho-escuros, rendizinas e regossolos;

 alta: podizólicos eutróficos, terras-roxas estruturadas, planossolos e solonetz solodizados.

A maior parte do solo da Caatinga apresenta limitações para o uso sustentável com
atividades agrícolas. Apesar disso, agriculturas dependentes de chuva, familiares e, em menor
proporção, as empresariais, continuam presentes em áreas de solos com alta vulnerabilidade
à degradação. O uso inadequado dessas áreas pode levar à degradação, à desertificação e ao
assoreamento de rios e reservatórios de água.

Atualmente, sabe-se que o estado dos solos de alguns locais da Caatinga é reflexo de
pelo menos 57 anos de uso inadequado, principalmente nas áreas onde foram implantadas
culturas voltadas para a industrialização, como é o caso das culturas de algodão até o início
da década de 1990.

Com relação à agricultura familiar, podemos dizer que, mesmo sendo menos agressiva,
ela foi historicamente realizada em áreas mais vulneráveis e, apesar do sistema de reciclagem,
os períodos de espera foram insuficientes para a recuperação ideal desses solos.

As perspectivas de melhorias em relação à preservação e utilização sustentável do


solo são amplas. Divulgação, nos meios de comunicação, dos problemas de degradação
e desertificação; surgimento de organizações não-governamentais com atuação no Bioma
Caatinga e maior conscientização, por parte das instituições públicas, para a importância de
políticas públicas voltadas para uma utilização racional do solo.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 85


Atividade 6
Pesquise as seguintes características geológicas e procure informações
sobre as características do solo de sua cidade: erodibilidade, latossolos
amarelos e latossolos vermelho-amarelos, podzólicos distróficos, solos litólicos,
solos aluviais, areais quatzosas, latossolos vermelho-escuros, rendizinas,
regossolos, podizólicos eutróficos, terras-roxas estruturadas, planossolos e
solonetz solodizados.

Os recursos minerais
Os recursos minerais representam materiais com valor econômico presentes no solo
ou subsolo. Na Caatinga, podemos destacar pelo menos 71 diferentes minerais; destes, três
ocorrem de forma generalizada: água mineral, argila e areia. Os estados com maior riqueza
em números de substâncias são: o Ceará, a Bahia e o Rio Grande do Norte. As substâncias
de maior distribuição regional são: o caulim (em cinco estados), o berilo, o ferro, o gipsito, o
ouro, o quartzito e a turmalina (em quatro estados).

Na maioria das vezes, a utilização dos recursos minerais como fonte de renda, deve-
se principalmente à degradação da situação econômica da região. Tal prática proporciona
geração de renda, em geral, sem que fatores de preservação ambiental sejam considerados,
levando a uma rápida degradação do meio ambiente e esgotamento das possibilidades
econômicas dessa atividade.

É necessário que exista um acompanhamento dos diversos impactos que podem ser
causados ao meio ambiente na atividade mineradora através do EIA-RIMA (Estudo de Impacto
Ambiental – Relatório de Impacto Ambiental), Relatório de Controle Ambiental e Plano de
Recuperação de Áreas Degradadas, levando à utilização sustentável dos recursos naturais,
através de um manejo adequado dos recursos disponíveis no Bioma Caatinga.

A extração mineral pode causar diversas formas de impacto ambiental, como:

 remoção total da vegetação das camadas superficiais do solo;

 poluição ambiental (do ar, da água e do solo), devido à utilização de produtos químicos
nos processos de extração e processamento mineral, como o ouro, por exemplo;

 utilização de carvão vegetal e lenha como fontes energéticas na extração e processamento


mineral, causando impacto indireto, porém muito intenso sobre o bioma, como, por
exemplo, a indústria do gesso, cerâmicas, caeiras e caulim.

86 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


A utilização desses recursos é regulada pelo Governo Federal através da Companhia
de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM - http://www.cprm.gov.br/) e são levados em
consideração, entre outros, os seguintes fatores: incentivo à descoberta e aproveitamento dos
recursos minerais; priorização de acordo com as características do mineral (representatividade
econômica, significado estratégico, realce geológico-social, relevância para o controle
ambiental); programas institucionais de geologia econômica e prospecção em áreas
selecionadas (independentemente de quem sejam os detentores do local); suplementação à
iniciativa privada (empresas de mineração), fornecendo informações capazes de diminuir os
riscos inerentes aos empreendimentos.

Atividade 7
Pesquise e procure informações sobre a existência em sua cidade de recursos
minerais e os processos de exploração, buscando responder às questões seguintes.

a) Quais são eles?

b) Quais as formas e métodos da extração e exploração?

c) Quem explora? (cooperativas, garimpeiros, Estado etc.)

d) Quantos empregos gera?

e) Qual o salário médio dos trabalhadores envolvidos? Quais as categorias de


empregados?

f) Causam problemas ambientais ou de saúde para a comunidade ou para os


trabalhadores diretamente envolvidos? Quais?

g) Qual o mercado consumidor?

h) Qual o valor de mercado do material bruto? E depois de processado?

i) Qual o tamanho das reservas naturais e a previsão de tempo de sua exploração?

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 87


Resumo
Nesta aula, você teve um primeiro contato com estudos específicos sobre o Bioma
Caatinga. Foi feito desde uma localização geográfica até uma caracterização do
solo e dos recursos minerais disponíveis neste Bioma. Conceitos ecológicos de
Biosfera, Bioma e Ecorregiões também foram estudados.

Autoavaliação
1 Conceitue, diferenciando e relacionando, biosfera, bioma e ecorregião.

Caracterize o Bioma Caatinga em relação a sua localização geográfica e às principais


2 características de sua biodiversidade.

3 Caracterize os solos encontrados no Bioma Caatinga.

4 Fale sobre os recursos minerais que são importantes no Bioma Caatinga.

Caracterize em algumas linhas a região na qual você mora, em relação ao bioma e


5 aos recursos minerais.

Referências
AUDRY, Pierre; SUASSUNA, João. A qualidade da água na irrigação do trópico semi-árido: um
estudo de caso, In: SEMINÁRIO FRANCO-BRASILEIRO DE PEQUENA IRRIGAÇÃO, PESQUISA
E DESENVOLVIMENTO, Recife. Anais..., Recife: SUDENE; Embaixada da França, 1990.

BRASIL. Agência Nacional de Águas. Disponível em: <www.ana.gov.br>. Acesso em: 20 jun. 2005.

_______. Ministério do Meio Ambiente. Sistema nacional de gerenciamento de recursos


minerais. Disponível em: <http://www.mma.gov.br>. Acesso em: 05 jul. 2005.

88 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


CARVALHO, Otamar de. Plano integrado para o combate preventivo aos efeitos das secas
no Nordeste. Brasília: MINTER, 1973. (Série desenvolvimento regional, 1).

CONSELHO NACIONAL DA RESERVA BIOMA CAATINGA. Cenários para bioma caatinga. Recife:
SECTMA, 2004.

CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais. Disponível em: <http://www.cprm.


gov.br/rehi/dhid00.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. Disponível em: <http://www.euclidesdacunha.org.br/>. Acesso


em: 12 jul. 2005.

DEMÉTRIO, José Geilson Alves; DOHERTY, Frederico Roberto; ARAUJO FILHO, Paulo Frassinete
de; SCHEFFER, Simone. Qualidade de água subterrânea no Nordeste brasileiro – comunicação
oral. In: Reunião Anual da SBPC, 45, Recife. Anais da Reunião..., Recife, 11 a 16 de julho de
1993. p. 79.

FORUM ESTADUAL DA AGENDA 21 DE PERNAMBUCO. Agenda 21 do Estado de Pernambuco.


Recife: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, 2003.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Atlas nacional do Brasil: Região Nordeste:
Rio de Janeiro, 2000.

Geografia do Brasil: região nordeste. Rio de Janeiro: IBGE, 1977. v.2.

SEMINÁRIO BIODIVERSIDADE DA CAATINGA. Petrolina. Anais..., Petrolina: EMPRAPA – Semi-


Árido, 2000, 21 a 26 de maio de 2000.

MELLO NETO, João Cabral de. Morte e vida severina. Disponível em: <http://www.nilc.icmc.
usp.br/literatura/morteevidaseverina.htm>. Acesso em: 12 jul. 2005.

PURVES, Willian; et al. Vida: a ciência da biologia. Tradução Anapaula Somer Vinagre. 6.ed.
Porto Alegre: Artmed, 2002.

SAMPAIO, E. V. S. B.; GIULIETTI, A. M.; VIRGÍNIO, J.; et al. Vegetação e flora da caatinga.
Recife: Associação Plantas do Nordeste; Centro Nordestino de Informações sobre Plantas,
2002.

SEMINÁRIO DE PLANEJAMENTO ECORREGIONAL DA CAATINGA. Ecorregiões propostas


para o bioma caatinga. Aldeia/PE, 2001. Disponível em: <http://www.plantasdonordeste.org/
ecorregioes.html>. Acesso em: 12 jul. 2005. (1ª Etapa. 28-30 de novembro de 2001).

SERHID – Secretaria de Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte. Hidrologia. Disponível


em: <http://www.serhid.rn.gov.br>. Acesso em: 05 jul. 2005.

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 89


SUASSUNA, João. O processo de salinização das águas superficiais e subterrâneas no
Nordeste brasileiro. Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/orig2.html>.
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SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento no Nordeste. Disponível em: <http://www.


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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA. A região do Jalapão no cerrado brasileiro. Disponível em:


<http://www.unb.br/ib/zoo/grcolli/jalapao.html>. Acesso em: 26 jul. 2005.

Anotações

90 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade 91


Anotações

92 Aula 4 Ciências da Natureza e Realidade


Bioma Caatinga –
recursos hídricos

Aula

5
Apresentação
Euclides da Cunha, em Os Sertões, sintetiza de uma forma emblemática o drama da seca
para o homem nordestino do semi-árido (Bioma Caatinga).

O homem sertanejo é acima de tudo um forte, um herói frente às condições adversas do


ambiente em que vive. “A seca não o apavora (ao sertanejo). É um complemento à sua vida
tormentosa, emoldurando-a em cenários tremendos. Enfrenta-a estóico. Apesar das dolorosas
tradições que conhece através de um sem número de terríveis episódios, alimenta a todo o
transe esperanças de uma resistência impossível” (CUNHA, 2005).

Nesta aula, traçaremos um perfil da situação da água no mundo para então caracterizarmos
o semi-árido nordestino em relação a seus recursos hídricos e à escassez de água no período
entre os chamados “invernos”, quando ocorrem as chuvas. Com esse enfoque, concluiremos
a caracterização dos fatores abióticos desse ambiente, iniciada na aula passada com o estudo
do solo e dos recursos minerais.

Objetivos
Após estudar esta aula, você deverá ser capaz de:

caracterizar o Bioma Caatinga, focalizando seus recursos


1 hídricos, suas águas superficiais, subterrâneas e a sua
capacidade energética;

entender o problema da seca em um contexto mais amplo


2 do que apenas a escassez de recursos hídricos;

contextualizar o semi-árido nordestino em um contexto


3 global no qual o conceito de semi-árido aparece em
outros países com características semelhantes a ele.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 95


A água em nosso planeta

C
omo você deve estar lembrado da aula 2 de nosso curso, estima-se que exista 1
bilhão e 600 milhões de km3 de água em nosso planeta. Subtraindo a água cristalizada
quimicamente e a associada às rochas, o volume que resta é em torno de 1 bilhão
e 370 milhões de km3. No entanto, cerca de 97,2% desse volume corresponde à água do
mar que, como você sabe, é salgada e não serve para a maioria dos usos que fazemos dela.

Dos 2,8% restantes, quando subtraímos a água presa nas calotas e nas geleiras polares
e a que existe na forma de vapor d’água na atmosfera, que são indisponíveis para o nosso
uso, restarão apenas 8 milhões e 200 mil km3 de água doce na fase líquida. Esse valor
representa apenas 0,6% do total! Por isso, a água doce disponível é considerada um bem
indispensável e primordial para a sobrevivência dos seres vivos, devendo ser utilizada de
forma racional e parcimoniosa.

Algo que impressiona ainda mais é o fato de que os recursos hídricos superficiais
correspondem a apenas cerca de 2% de nossas reservas, ou seja 164 mil Km3, dos 8
milhões e 200 mil km3 da água doce! Ela está distribuída nos rios, lagos, barragens e
açudes. Os restantes 98%, ou um pouco mais desse volume, está “escondido” no subsolo,
representando o que se denomina de “água subterrânea”.

Existem registros indicando que desde os longínquos tempos, antes da era cristã, o
homem já utilizava essas águas. Inicialmente em nascentes e lençóis freáticos rasos, através
de escavações simples, a água era obtida para uso doméstico. Essa metodologia evoluiu
para cacimbas revestidas de pedra e posteriormente de tijolos. Novas formas de perfuração
hoje em dia consistem em sistemas mecanizados, possibilitando a construção de poços a
profundidades maiores e com maior vazão.

A partir de meados de 50 do século XX, reservatórios hídricos subterrâneos em todo


o mundo têm sido muito utilizados em regiões áridas e semi-áridas, como o Nordeste do
Brasil, Israel e Austrália; e em regiões desérticas, como a Líbia, visando ao abastecimento
de cidades e de projetos de irrigação.

Nas três últimas décadas, segundo dados da UNESCO (United Nations Educational,
Scientific and Cultural Organization – http://www.un.org/), foram perfurados mais de 300
milhões de poços no mundo. A utilização da água subterrânea varia entre os países. A
Europa, por exemplo, é responsável por 75% da água utilizada pela população (podendo
esse percentual atingir 90% em países como Suécia, Holanda e Bélgica).

Tendo em vista que os reservatórios subterrâneos são alimentados em grande parte


por águas da superfície, esse crescimento acelerado na utilização das águas subterrâneas
pode levar a problemas nos aqüíferos em várias partes do planeta. Além do que, em diversas
regiões, principalmente do litoral, o esgotamento dos aqüíferos permite a infiltração, em
direção ao continente, de águas do mar, contribuindo para a degradação da qualidade desses

96 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


reservatórios. Podemos acrescentar a esse quadro a informação de que existem no mundo
cerca de 270 milhões de hectares irrigados com água subterrânea, sendo 13 milhões destes
nos Estados Unidos da América e 31 milhões na Índia, e que parte dessa água pode retornar
ao subsolo contaminada por produtos químicos típicos da atividade agrícola. Isso sugere a
necessidade de estudarmos esse assunto tentando seguir uma das recomendações da Carta
da água, ou seja: “10 - A água é um patrimônio comum, cujo valor deve ser reconhecido por
todos. Cada pessoa tem o dever de economizá-la e usá-la com cuidado”.

Atividade 1
A Carta da água é um documento assinado pelos principais países do mundo,
visando à preservação e ao uso racional desse inestimável recurso. Ela é composta
por 12 itens. Realize uma pesquisa e escreva todos os itens dessa carta, fazendo
uma breve interpretação de cada um.

As águas superficiais
do Nordeste brasileiro
Entendemos por águas superficiais as reservas de água doce depositadas na crosta do
planeta que compõem os reservatórios na forma de rios, lagos, açudes e outros.

Entre outros fatores, a qualidade das águas superficiais está relacionada com a natureza
da rocha, o tipo de solo e com o seu modo de acomodação. Por exemplo, o tipo de solo e do
subsolo são dois dos principais fatores que explicam as variações de qualidade das águas dos
riachos. O Brasil tem nove bacias hidrográficas, as quais estão representadas no mapa a seguir.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 97


Figura 1 – Bacias do Brasil: Bacia 01 - Rio Amazonas; 02 - Rio Tocantins/Araguaia; 03 - Atlântico Norte/Nordeste;
04 - São Francisco; 05 - Atlântico Leste; 06 - Rio Paraná; 07 - Rio Uruguai; 08 - Atlântico Sul;
09 - Rio Paraguai.

Fonte: ITAIPÚ BINACIONAL. Atlas hidrológico do Brasil – Annel/1998. Disponível em:


<http://www.itaipu.gov.br/aguaboa/projeto/pg02.htm>.

A Região Nordeste é permeada por partes de três bacias, e apenas a do São Francisco é
grande o suficiente para fazer parte desse macro-conjunto de bacias hidrográficas, como se
percebe na Figura 1. Mesmo assim, no Nordeste brasileiro, de acordo com a disponibilidade
das águas superficiais, foi feita uma classificação das várias bacias hidrográficas, todas
relacionadas com os principais rios da região, destacando-se a Bacia do São Francisco e a
Bacia do Parnaíba.

A Bacia do rio São Francisco é a terceira bacia hidrográfica do Brasil. Drena uma área
de 640.000 km² e ocupa 8% do território nacional. Cerca de 83% dessa bacia encontra-se nos
estados de Minas Gerais e Bahia, 16% em Pernambuco, Sergipe e Alagoas e 1% em Goiás e Distrito
Federal. Entre as cabeceiras (na Serra da Canastra, em Minas Gerais) e a foz (no oceano Atlântico,
localizada entre os estados de Sergipe e Alagoas), o rio São Francisco percorre cerca de 2.700
km. Entre outras coisas, o São Francisco é um rio com características que o tornam apto para a
produção de hidroeletricidade, além disso é navegável em um longo trecho dos estados de Minas
Gerais e Bahia. A figura a seguir mostra um mapa da Bacia do São Francisco.

98 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


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Rio de Janeiro

Figura 2 – Mapa da bacia do São Francisco. (*mapa ampliado na página 20)

Fonte: BRASIL. Ministério dos Transportes. Transportes aquaviários: hidroviário.


Disponível em: <http://www.transportes.gov.br/>. Acesso em: 8 ago. 2005.

Atividade 2
Faça uma redação sobre a importância do “Velho Chico” abordando suas
características econômicas como fonte de energia elétrica e como hidrovia.
Discuta também aspectos culturais nordestinos relacionados a esse rio, como,
por exemplo, as carrancas do São Francisco.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 99


A segunda bacia hidrográfica nordestina é a do Rio Parnaíba, a qual apresenta uma área
de aproximadamente 327.107 km², banhando os Estados do Maranhão e Piauí. O Rio Parnaíba
tem um curso total de aproximadamente 1.334 km, sendo navegável em dois trechos, o
primeiro deles vai desde sua foz até a Barragem de Boa Esperança, a aproximadamente 749
km; o segundo parte dessa barragem e vai até a cidade de Santa Filomena em um percurso de
mais 491 km, sendo assim navegável em 1.240 km.

Figura 3 – Mapa da bacia do Parnaíba e do São Francisco. Veja que a do São Francisco é muito maior que a do
Parnaíba e que ambos desaguam no Oceano Atlântico.

Fonte: CODEVASF – Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba. Recursos hídricos subterrâneos.
Disponível em: <http://www.codevasf.gov.br/menu/os_vales/municipios>.

Atividade 3
Faça uma redação sobre a importância do Rio Parnaíba abordando suas
características econômicas como fonte de energia elétrica, de turismo e como
hidrovia. Discuta também aspectos culturais nordestinos relacionados a esse rio.

100 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


A água subterrânea
no Nordeste brasileiro
Como já falamos, as águas dos lençóis subterrêneos compõem um volume muito maior
de água do que as de superfície (rios e açudes, ainda que, para estes últimos observe-se uma
grande diversidade de comportamento), o que justifica a grande demanda por esses mananciais
existentes sob a superficie.

Na região Nordeste, perfuram-se poços desde o século XIX, mas apenas a partir da
década de 60 do século passado, com a criação da SUDENE (Superintendência para o
Desenvolvimento do Nordeste – www.sudene.gov.br), a água subterrânea começou a ser
tratada com mais seriedade.

Nesse período, a SUDENE promoveu um levantamento hidrogeológico da região Nordeste


que deu origem ao “Inventário Hidrogeológico Básico do Nordeste”, cujas informações ainda
são referências até hoje. Esses estudos, que abriram as portas para uma visualização da
potencialidade hidrogeológica da região, foram paralisados no início da década de 70 em
função da desmobilização da SUDENE como órgão executor.

A utilização da água subterrânea no Nordeste aumentou vertiginosamente no


abastecimento público e para usos diversos, tal como na pecuária e agricultura irrigada.
Estima-se hoje que existam nessa região por volta de 150.000 poços tubulares, sendo somente
cerca de 21.600 regularmente cadastrados. Além disso, os escassos registros encontram-se
dispersos e/ou inacessíveis. Outro grande problema é que não existem dados concretos com
relação à produtividade e qualidade da água dos poços perfurados. No entanto, sabe-se que
existe uma grande quantidade deles improdutiva ou salinizada.

Um dos problemas com o aumento do uso da água subterrânea é que não houve planejamento
técnico para sua utilização, sendo resultado de consecutivos programas emergenciais de combate
aos efeitos da seca e de esforços isolados de companhias de saneamento.

Tratando-se de uma região semi-árida, a água subterrânea do Bioma Caatinga torna-se


um recurso estratégico para o desenvolvimento dessa região. Assim, visando classificar esse
recurso em função das características geológicas de suas águas subterrâneas, o Nordeste
do Brasil foi dividido em quatro províncias hidrogeológicas: Escudo Oriental Nordeste, São
Francisco, Parnaíba e Costeira, cujas características são descritas a seguir.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 101


1) Província do Escudo Oriental Nordeste – Predominam rochas cristalinas e apresenta,
em geral, um potencial hidrogeológico muito fraco. Essa deficiência está relacionada
com características do clima semi-árido que provocam taxas elevadas de salinidade nas
águas. Mesmo assim, a ocorrência de água subterrânea nessas pequenas bacias é muito
importante devido à escassez dos recursos hídricos.
2) Província do São Francisco – Predominam aqüíferos com potencialidade baixa e média.
Os aqüíferos tornam-se mais amplos quando ocorrem associados com rochas porosas
por ação do intemperismo ou, em caso dos calcários ou dolomitos, onde a dissolução
cáustica atuou amplamente.
3) Província do Parnaíba – É representada pela bacia sedimentar do Parnaíba e constitui
o maior potencial de água subterrânea do Nordeste. Os principais sistemas aqüíferos,
ordenados conforme sua importância de produção, são: Cabeças, Serra Grande e Poti-
Piauí. Outros aqüíferos menos produtivos correspondem às Formações Motuca, Corda e
Itapecuru.
4) Província Costeira – Corresponde à extensa faixa litorânea do país, estendendo-se desde o
Amapá até o Rio Grande do Sul. É formada de nove subprovíncias, das quais sete ocorrem
na região Nordeste: Barreirinhas, Ceará e Piauí; Potiguar; Pernambuco, Paraíba e Rio
Grande do Norte; Alagoas e Sergipe; Tucano, Recôncavo e Jatobá; e Litoral da Bahia. Em
alguns trechos, a província apresenta-se com penetrações para o interior, como se observa
nas áreas das subprovíncias Potiguar e Recôncavo-Tucano-Jatobá.

Atividade 4
Tente identificar em qual das províncias hidrogeológicas citadas no texto o
seu município está inserido. Quais os principais rios que cortam sua cidade? Eles
são perenes? Sua cidade é abastecida por açudes, poços, por ambos, ou por rios?

102 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


Açudes no Nordeste brasileiro
Em 1992, foram catalogados 70 mil açudes com mais de mil metros quadrados e, além
disso, entre 1200 a 1500, outros com capacidade superior a 100 mil m3 (sendo 450 destes
com capacidade superior a 1 milhão de m3). Os estados que apresentaram maior número
foram: o Ceará, a Paraíba e o Rio Grande do Norte. A distribuição espacial desses açudes é
reflexo da dinâmica da urbanização dos estados. Mas, apesar desses números, aparentemente
muito altos, existem alguns fatores que podem afetar a capacidade e a qualidade dos açudes
do Nordeste, dos quais podemos destacar:

 açudes que secam açudes;

 construção de açudes hidricamente sinérgicos e com alta perda evaporativa;

 perfuração de poços tubulares de baixa relação benefício-custo pela pouca ou má


qualidade da água;

 construção de cisternas ineficientes.

Isso explica em parte o motivo pelo qual as secas continuam a afetar tanto a vida do
nordestino.

Seca
Leia a seguir um fragmento do poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de
Mello Neto.

Não desejo emaranhar o fio de minha linha nem que se enrede no pêlo


hirsuto desta caatinga.

Pensei que seguindo o rio


eu jamais me perderia:
ele é o caminho mais certo,
de todos o melhor guia.

Mas como segui-lo agora


que interrompeu a descida?
(MELLO NETO, 2005)

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 103


Podemos entender a seca como uma situação extrema em que encontramos carência de
recursos hídricos. Como no auto (box), quando o retirante deixa de ter o rio como um guia para
o seu caminho, o autor refere-se também à sua vida, à sua existência. Sem água tudo fenece,
tudo é muito triste. A seca encerra em si todas as agruras e significa o terror para os seres
vivos que subsistem sob ela, devastando as plantações, e levando as pessoas a abandonarem
suas terras, ou mesmo à morte.

O suprimento hídrico para o homem e os seres vivos na Caatinga está baseado em águas
subterrâneas de baixa e média profundidade, represadas em barreiros e açudes, e nas pequenas
reservas de água armazenadas no corpo de algumas plantas. Águas disponíveis nos aluviões
que constituem os fundos dos vales no Bioma (leitos secos e áreas adjacentes aos cursos de
água temporários) são extremamente insuficientes.

Como sabemos, na região Nordeste do Brasil, a quantidade de chuva anual está relacionada
à quantidade de meses sem chuva, levando à carência de água para o consumo humano e
animal, assim como, também refletindo na cobertura vegetal da região.

Atividade 5

Em fevereiro de 2005, o texto contido no box a seguir foi noticiado durante o


Jornal Nacional da Rede Globo. O redator conseguiu com poucas palavras narrar
uma situação de seca que vem ocorrendo nas regiões semi-áridas do Nordeste
brasileiro.

Leia o texto e assinale os elementos que você identifica como representativos


em um quadro de seca. Em seguida, com uma linguagem simples e direta,
descreva sua região em relação aos períodos secos e chuvosos.

104 Aula 51 Ciências da Natureza e Realidade


Seca castiga Pernambuco

Seca deixa quarenta e dois municípios pernambucanos em estado de emergência. Com


leitos de rios secos, as famílias apelam a cacimbas e chafarizes para não passar sede. No
agreste de Pernambuco carcaças de animais estão pelo caminho. Parte do rebanho não
resiste à sina de ir longe atrás de água e comida. O pasto desapareceu. Até a palma, que
costuma resistir à estiagem está murchando. Em um sítio, o agricultor teve que vender
seis bois para não deixar o restante da criação morrer de fome. “Sinto muita coisa ruim.
O cabra ter o que é dele e não ser dono mais e ir se acabando tudo”, lamenta o agricultor
Paulo de Moraes.
Na terra seca, Maria da Conceição gasta a aposentadoria para manter o rebanho: “Vai
levando até quando Deus quiser”.
Nos povoados, filas de latas, de baldes, de todo tipo de vasilhame. A água é cada vez
mais rara.
No leito do Rio Seco, uma cacimba é como um tesouro para as famílias. No buraco, Eva
consegue a água para matar a sede dos três filhos e cozinhar.
“Ela é salgada, bastante salgada”, diz ela.
A água com gosto de sal serve para tudo no povoado. O rio seco é a salvação.
“Se não fosse ele eu não sei o que seria de nós”, diz a dona de casa Cicera Moraes.
A luta pela água não termina nem quando o sol vai embora.
O chafariz é a única fonte para abastecer 94 famílias da comunidade de Barro Vermelho.
Lá, o movimento não pára quando o dia termina. Sem o calor sufocante do sol começa
uma nova jornada, ainda mais concorrida.
Os carros de boi começam a se juntar. Aos poucos, um congestionamento se forma em
frente ao chafariz. Há muitos tonéis para encher. Depois do dia inteiro de trabalho, o
sertanejo ainda tem disposição para buscar água. A brisa da noite serve de recompensa.
O sacrifício do sertanejo tem a duração da seca. Enquanto não chover, a maratona nas
noites vai continuar.

Fonte: REDE GLOBO DE TELEVISÃO. Jornal Nacional. Seca castiga Pernambuco. (Matéria televisiva exibida em 10 fev. 2005). Disponível em:
<http://jornalnacional.globo.com/Jornalismo/JN/0,3586-p-10022005,00.html>. Acesso em: 23 mar. 2005.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 105


A escassez de água é um problema que ocorre periodicamente no Bioma Caatinga há
muitos séculos. Por outro lado, não é um fenômeno que afeta exclusivamente o Nordeste
brasileiro, ocorre no Sul do Brasil, Argentina, Chile, México, Estados Unidos da América,
Espanha e em muitos países da África, Ásia e Oriente Médio. Mas, no nosso caso, temos essa
ocorrência em uma região densamente populosa se comparada com as outras regiões do
globo sujeitas a secas.

Atividade 6
A partir de documentos de época ou na tradição oral que as registrou,
Euclides da Cunha em Os Sertões listou as maiores secas de que se tem notícia
desde o século XVIII até meados do século XX. Consulte o referido livro e
complete a tabela a seguir.

Século XVIII 1710-11 1736-37 1777-78


Século XIX 1824-25 1877-79

Agora que você preencheu a tabela, verifique que ela apresenta


periodicidades. Quais são essas periodicidades?

Como curiosidade, conta-se que a seca que ocorreu entre os anos 1877-79, chamada dos “três
setes”, é considerada a pior de todos os tempos, isso porque, somado à estiagem, houve um grande
surto de varíola, tifo e cólera, que levou à morte cerca de meio milhão de sertanejos.

No século XX, foram registradas secas nos anos de: 1900, 1915, 1932, 1942, 1951-53, 1970
e 1979-83. A grande seca que ocorreu entre os anos de 1979-83, apesar de sua intensidade, não
culminou com uma calamidade pública devido a melhorias nos meios de transporte que facilitaram
o êxodo das populações do interior para a periferia das capitais nordestinas. Esse fenômeno social
diferiu dos anteriores registrados nesse século, que devido à crise econômica as pessoas não
migraram como antes para as capitais do sudeste e sul do Brasil.

Outro aspecto importante em relação à escassez de água diz respeito à irregularidade


das precipitações durante o ano. As chuvas além de serem poucas, ficam concentradas
em determinados meses, e grande quantidade delas cai em somente um dia. Como, por
exemplo, no Açude de São Gonçalo do município de Souza, na Paraíba, em março de 1941,
choveu 45% da chuva anual, sendo que no dia seis de março, choveu o equivalente a 40% do
mês. Essa irregularidade traz sérios problemas para a agricultura, pecuária, seres humanos
e meio ambiente.

106 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 7
Entreviste pessoas “mais velhas” e peça para contarem sobre as grandes
secas que assolaram sua região. Faça perguntas como: quando ocorreram,
quais as principais conseqüências, como as pessoas conseguiam sobreviver,
entre outras. Anote as informações colhidas e escreva um texto em forma de
reportagem (semelhante ao do Jornal Nacional), apresentando os resultados de
seu trabalho.

Problemáticas da Caatinga
A Caatinga enfrenta dois importantes problemas, o primeiro diz respeito ao processo
de salinização da água disponível e o segundo, à desertificação. Ambos podem causar sérios
danos ao meio ambiente com impactos sobre os seres vivos que habitam a região. Vejamos
cada um deles.

1) Salinização
Um problema no semi-árido nordestino é a crescente salinização de suas águas. Esse fato
deve-se principalmente a três fenômenos: dissolução ou intemperização (hidrólise hidratação,
solução, oxidação e carbonatação) dos minerais primários existentes nas rochas e no solo,
tornando-os mais solúveis; concentração dos sais pela ação do clima (nesse caso, pela taxa
de evaporação ser maior do que a precipitação pluviométrica); e através do fenômeno do
endorreísmo que não facilita a drenagem do solo.

Temos na região uma precipitação média anual entre 400 e 800 mm e uma evaporação
média anual de 1.500 a 2.200 mm! Como conseqüência, ocorre um aumento no teor de sal
das águas e do solo, fenômeno este denominado de salinização. Esses números refletem uma
situação extremamente grave, que exige das autoridades competentes providências no sentido
de minimizar os danos causados pelo homem ao meio ambiente.

A taxa de evaporação no Semi-árido nordestino atinge patamares médios anuais da ordem


de 2000 mm. Isso significa que diariamente são evaporados em torno de 6,0 mm de água.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 107


Atividade 8
Supondo que a taxa de evaporação diária no Nordeste é de 6,0 mm,
determine quanto de água evapora em três meses.

Se levarmos em consideração os efeitos da evaporação em um pequeno açude, iremos


chegar à seguinte conclusão ao final de um ano: a concentração salina pode chegar a 25%.
Isso é fácil de entender porquanto, na evaporação, o que é subtraído do açude é a água,
aumentando, portanto, paulatinamente a concentração dos sais. Esse, por sinal, é um exemplo
bem característico da região, não sendo difícil serem observados, em períodos secos, leitos
de açudes completamente desprovidos de água, com a lama endurecida, rachada e tendo em
sua parte mais profunda uma mancha branca, que nada mais é do que a deposição dos sais
da água naquele local (MOLLE; CADIER, 1992).

– Efeitos dos sais nos organismos vivos

Concentrações salinas altas podem causar distúrbios nos seres vivos. Segundo Laraque
(1991), as conseqüências causadas pela ingestão de concentrações salinas em diversos níveis
(considerar 640 mg/l de sais = CE 1000 usiemens/cm), nos organismos de animais (rebanho
e aves), podem ter as implicações a seguir.

Concentração (mg/l) Efeito

< 1000 Teor de sal relativamente fraco. Excelente para todas as categorias de rebanho e aves.

Muito bom para todas as categorias. Mas, pode ocasionar uma diarréia temporária e leve nos
1000 – 3000
animais, que não estão habituados a essa quantidade, e fezes aquosas em aves.

Muito bom para os rebanhos, mas pode causar diarréia temporária naqueles animais que
3000 – 5000 não estão habituados ou ser rejeitada por estes no começo. Medíocre para aves, originando
evacuações líquidas e uma grande mortalidade, principalmente nos perus.

Razoavelmente segura para os rebanhos leiteiros e de corte, carneiros, porcos e cavalos. Evitar
5000 – 7000 a ingestão por animais gestantes ou para aqueles que estão amamentando. Não aceitável
pelas aves.

Impróprias para aves e provavelmente para o porco. Risco considerável se for utilizada por
vacas, jumentos ou ovelhas gestantes ou que estão amamentando, ou mesmo por seus filhotes.
7000 – 10000 Em geral, é preciso evitar sua utilização pelos ruminantes e monogástricos. Os riscos ligados
à utilização dessas águas muito salgadas são tão consideráveis que torna-se impossível a sua
utilização para quaisquer que sejam as circunstâncias.

108 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


Para o consumo humano, águas com mais de 200 ppm (aproximadamente 200 mg/l) de
cloreto têm o gosto desagradável. Águas com teor de cloreto acima de 1000 ppm (partes por
milhão), quando bebidas em demasia, poderão levar a distúrbios no estômago. O Serviço de
Saúde Pública dos EUA recomenda aos sistemas municipais que o conteúdo de cloreto não
ultrapasse 250 ppm. Na figura seguinte, verificamos a deposição de sais no leito seco de um
açude no Nordeste.

Figura 4
Fonte: AUDRY, Pierre; SUASSUNA, João. A qualidade da água na irrigação do trópico semi-árido: um estudo de caso. Recife: SUDENE;
Embaixada da França, 1990. Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/estcaso.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

Como você estudou nas aulas passadas, a disponibilidade de água de determinada região
é dependente do índice pluviométrico dessa região. Se considerarmos uma área de 800 mil
Km2 com precipitação média anual de 600mm, teremos um volume anual total de precipitação
de 48 milhões de mm3. Desse valor, teremos uma perda em cerca de 88% (42.240 mm3) por
evaporação ou evapotranspiração; 8,5% (4.128 mm3) por escoamento superficial e 3,3%
(1.632mm3) por escoamento subterrâneo. Esse alto valor de evaporação e evapotranspiração
pode chegar em certas situações a 90%. Verificamos dessa forma uma enorme perda nesses
processos da água precipitada com a chuva, restando apenas cerca de 0,2% (96 mm3).

Além disso, outros fatores comprometem a água disponível para o consumo humano, a
pecuária e agricultura, entre eles: drenagem deficiente, má qualidade da água, características
físico-químicas do solo, manejo inadequado da irrigação, e erosão do solo e assoreamento
dos rios, causados pelo desmatamento das matas ciliares.

2) Desertificação
Esse fenômeno é resultado da remoção da cobertura vegetal da região, assoreamento dos
rios e baixo índice pluviométrico anual. Estudos importantes vêm sendo realizados quanto à
crescente desertificação de locais da região Nordeste, e também de outros estados brasileiros,
como no Rio Grande do Sul. No caso nordestino, esse problema é muito mais dramático pela
própria sensibilidade do Bioma Caatinga.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 109


Atividades como a produção de carvão e lenha para abastecer padarias e olarias da
região têm contribuído fortemente para destruir a flora local e com ela a fauna. Também tem
contribuído para o empobrecimento dos solos, visto que os tijolos e telhas fabricados em
larga escala por inúmeras pequenas fábricas de cerâmicas são feitos a partir do barro, um
bem inestimável para a flora nordestina.

Atividade 9
Pesquise sobre iniciativas que estão em andamento para minimizar o
1 problema da desertificação e anote algumas que tenha considerado
particularmente importantes.

Uma alternativa para enfrentar a falta de água no Nordeste é o programa


2 “Associação Programa 1 Milhão de Cisternas – AP1MC” (criado em
2001), que tem como objetivo mobilizar e capacitar um milhão de
familias para conviver com o Semi-Árido. Realize uma pesquisa sobre
esse programa e descubra como se constrói uma cisterna, fazendo no
espaço indicado a seguir a planta (desenho) de uma cisterna.

Transposição das águas


do rio São Francisco
Uma alternativa para a seca no semi-árido do Nordeste é a transposição das águas do rio
São Francisco, chamado de Projeto São Francisco. Atualmente, ocorre uma ampla discussão
entre os diversos seguimentos da sociedade sobre a viabilidade e os benefícios que irá trazer.
Esse projeto prevê a transposição para áreas carentes dos estados do Ceará, Rio Grande do
Norte, Paraíba e Pernambuco.

A ênfase é principalmente para a solução dos problemas de abastecimento urbano,


agroindústria e indústria mínero-metalúrgica. Tal projeto prevê dois pontos de captação de
água na jusante da Barragem de Sobradinho.

No entanto, existem muitas críticas em relação à viabilidade e ao custo desse projeto.


De acordo com os críticos, formas alternativas para o armazenamento de água poderiam ser
incentivadas, como o programa de cisternas, com custo bem inferior aos altos investimentos

110 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


que aquele exige; e, ainda, que essa água será insuficiente e que beneficiará somente aos
grandes produtores de frutas, pecuaristas e criadores de camarão, não trazendo benefícios
diretos ao sertanejo, que é pequeno produtor. Outro problema diz respeito ao aporte de água
necessário para o funcionamento das hidrelétricas que ficam no médio e baixo vale do Rio
São Francisco, Paulo Afonso, Itaparica e Xingó, que produzem energia para todo o Nordeste.

Será que, uma vez desviada, haverá, principalmente nos meses de seca, água suficiente
para as hidrelétricas e transposição? E o fator evaporação, será que não levará a uma redução
drástica nos volumes de água, assim como o impacto sobre a dinâmica climática do semi-
árido? Outro fator é o custo energético, já que são necessárias várias elevações de nível
de água. Por último, não devemos esquecer do impacto ambiental que um projeto dessa
envergadura pode ocasionar.

Atividade 10
Pesquise em fontes como jornais, revistas ou mesmo em conversa com
pessoas sobre as principais vantagens e desvantagens da transposição do São
Francisco. Faça uma tabela colocando de um lado as vantagens e de outro as
desvantagens e, finalmente, apresente em um breve texto sua opinião.

Resumo
Nesta aula, você estudou a presença e distribuição da água no mundo e no
Nordeste brasileiro, na superfície e no subsolo. Além disso, enfocamos
também, os problemas da seca e os impactos causados pelo clima semi-árido:
desertificação e salinização das águas.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 111


Autoavaliação
Trace um perfil do Bioma Caatinga em relação aos seus recursos hídricos, desde
1 suas províncias hidrológicas até suas águas subterrâneas.

2 Identifique a problemática da desertificação e da salinização das águas.

3 Fale sobre os recursos energéticos da região Nordeste.

4 Fale sobre o projeto de transposição das águas do rio São Francisco.

Referências
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um estudo de caso. Recife: SUDENE; Embaixada da França, 1990. Disponível em: <http://www.
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Recursos hídricos subterrâneos. Disponível em: <http://www.codevasf.gov.br/menu/os_vales/
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112 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


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LARAQUE, Alain. Comportements hydrochimiques des «açudes» du Nordeste bresilien semi-


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www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/salrede.html>. Acesso em: 12 jul. 2005.

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 113


Mapa da bacia do São Francisco

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Rio de Janeiro

114 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade 115


Anotações

116 Aula 5 Ciências da Natureza e Realidade


Bioma Caatinga –
recursos florestais e fauna

Aula

6
Apresentação
Caracterizaremos nesta aula a biodiversidade do Bioma Caatinga em relação a sua flora e
fauna. Inicialmente, apresentaremos um panorama dos tipos de vegetação encontrados nesse
ambiente e em seguida o tipo de vegetação chamado caatinga.

Objetivo
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de traçar um perfil dos
recursos bióticos do Bioma Caatinga a partir de sua flora e fauna.

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 119


Caracterização da biodiversidade
do Bioma Caatinga

V
ocê já deve ter ouvido falar em biodiversidade. Atualmente, tem sido dada muita atenção
ao meio ambiente e conseqüentemente a esse assunto. Mas, afinal, o que significa
essa palavra tão utilizada nos dias de hoje? Entende-se por biodiversidade a variedade
de espécies de seres vivos (animais, vegetais, fungos e bactérias) que habitam determinada
região geográfica.

A biodiversidade de uma região é como um espelho das condições climáticas ali


encontradas, dessa forma, em climas extremamente frios teremos espécies adaptadas ao frio,
e em climas muito quentes, espécies adaptadas ao calor e à escassez de água. É interessante
observar ainda que as regiões frias do planeta são pobres em plantas e animais, enquanto na
linha do Equador, região quente, encontram-se os biomas mais ricos, com maior biodiversidade.

Em nosso clima semi-árido da caatinga, teremos uma vegetação, e conseqüentemente,


uma fauna, adaptadas e relacionadas ao clima dessa região. Por se tratar de um local de clima
seco e com poucas chuvas, existem ali, espécies adaptadas à alta incidência solar e à baixa
umidade. É uma região muito rica em xerófitas e répteis.

120 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Flora do Nordeste do Brasil
Como você deve saber, a flora representa o conjunto dos vegetais característicos de
determinada região. Podemos subdividi-la em:

 flora silvestre, que são os vegetais naturais e nativos de uma região ou de um país. Por
exemplo, o Pinheiro-do-Paraná na Floresta de Araucária, a seringueira e a pupunha da
Floresta Amazônica e a Jurema da caatiga nordestina;

 flora exótica, vegetais não nativos de uma região, introduzidos e adaptados a ela. Em
nossa região, podemos apresentar muitos exemplos de flora exótica, por exemplo, as
mangueiras, laranjeiras, limoeiros, tangerineiras e o café, que são originários da Ásia e
vieram para cá com o europeu; a algaroba do Peru e a batata dos Andes da América do Sul.

Os vegetais, além de fazerem parte da equilibrada cadeia biológica do meio ambiente


como produtores primários e realizadores da fotossíntese, possuem importância econômica
relacionada com o fornecimento de matéria-prima, pastagem natural para a criação de animais
e fonte energética.

Atividade 1

Tomando como base nossa definição de flora e de espécies nativas e


exóticas, faça a descrição da flora de sua cidade. Tente identificar algumas
espécies silvestres e exóticas. Você pode fazer isso observando canteiros e jardins
comuns no seu município.

Se você lembrar, na aula sobre o Bioma Caatinga (aula 4) vimos que os conhecimentos
sobre a caatinga começaram com botânicos estrangeiros que viajaram pelo interior do Nordeste
durante o século XIX, tal como: Johann Baptist von Spix, Carl Friedrich Phillip von Martius,
Auguste de Saint-Hilaire e George Gardner, e a estudos realizados por brasileiros, tais como:
Joaquim Monteiro de Caminhoá, J. Mariano da Conceição, Freire Alemão e Albert Loefgren.
Mesmo assim, passados aproximadamente 200 anos, dispomos de poucas informações sobre
a caracterização e quantificação dos vegetais desse Bioma.

Estima-se que existam cerca de 8.760 espécies de plantas no Nordeste do Brasil. Cerca de
1.981 dessas espécies (aproximadamente 23%) estão presentes na caatinga, podendo chegar
a um valor entre 2.000 e 3.000 espécies. Giuliett lista 318 espécies endêmicas (16,1%) em 42
famílias; destas, 80 são de leguminosas, 41 de cactáceas, 17 euforbiáceas, 15 malváceas, 14
bromeliáceas e 451 espécies de fungos distribuídos em 203 gêneros.

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 121


Segundo o IBGE (1974), no Nordeste brasileiro existem dez tipos de paisagens florísticas
diferentes. São elas:

 Floresta Perenifólia Higrófila Costeira;

 Floresta Perenifólia Higrófila Hileiana Baiana;

 Floresta Subcaducifólia Tropical Amazônica;

 Floresta Subcaducifólia Tropical;

 Floresta Caducifólia não Espinhosa;

 Cerrado;

 Campos;

 Campo Inundável;

 Vegetação Litorânea;

 Caatinga.

1) Floresta Perenifólia Higrófila Costeira

São matas pluviais tropicais das planícies costeiras e das encostas montanhosas do trecho
norte do Nordeste. Esse tipo de vegetação faz parte da Zona da Mata Costeira, Florestas Orientais
ou Mata Atlântica. Prolongava-se paralelamente ao litoral, desde o Cabo de São Roque (RN)
até o Rio Grande do Sul. Atualmente, resta muito pouco desta floresta e algumas espécies a
caracterizam: maçaranduba (Manilkara rufula), pau-d’arco-roxo (Tabebuia avellanedae), pau-ferro
(Caesalpinia leiostachya) e o pirauá (Basiloxylon brasiliensis), entre muitos outros. Os arbustos
e ervas mais comuns são: erva de rato (espécies do gênero Psychotria), acantáceas, gramíneas,
marantáceas e rubiáceas (Basanacantha sp). Existem poucos cipós e epífitas, destacando-se:
Bauhinia radiana, Strychnos divaricans, orquidáceas e aráceas.

2) Floresta Perenifólia Higrófila Hileiana Baiana

Também é chamada de Floresta dos Tabuleiros Terciários. Suas características não diferem
muito da Mata Atlântica, já que possui árvores altas de troncos grossos. Ocorre principalmente
no sul da Bahia e norte do Espírito Santo. As espécies mais comuns encontradas são: muirajuba
(Apuleia molaris), cumaru (Dipteryx odorata), ingá-xixi (Ingá Alba), visueiro (Parkia pendula),
açaí (Euterpe oleracea), entre outras dezenas de espécies.

122 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


3) Floresta Subcaducifólia Tropical Amazônica

Ocorre na extremidade ocidental da Região Nordeste, desde o rio Mearim no Maranhão


até o paralelo 50S. Possui clima quente, úmido e semi-úmido, com três a cinco meses secos. É
um clima de transição entre o superúmido amazônico e o semi-árido nordestino. Caracteriza-se
por árvores altas com trinta a quarenta metros, troncos retos e de grande diâmetro. Apresenta
abundância de cipós e epífitas. As espécies características são: seringueira (Hevea brasiliensis),
castanha-do-pará (Bertholletia excelsa), oirana (Alchorneacastaneaefolia), entre outras dezenas
de espécies.

4) Floresta Subcaducifólia Tropical

Ocorre em áreas contínuas no extremo sul da Região Nordeste, nas


chapadas, serras do Ceará (Planalto do Ibiapaba) e no centro da Bahia
(chapada da Diamantina). Esses enclaves de floresta úmida do semi-árido
brasileiro são verdadeiras ilhas de Mata Atlântica em meio à Caatinga. Por
isso, são também denominados de Enclaves de Mata Atlântica, matas
úmidas e brejos de altitude. São encontrados sobre algumas formações
de rochas sedimentares e serras residuais cristalinas, todas com altitude
entre 700 e 1.200 m acima do nível do mar. A temperatura média anual
é de 24oC e precipitação anual de aproximadamente 1.700 mm. Possui
vegetação semelhante a outros trechos de Mata Atlântica do nordeste,
do leste e do sul do Brasil. Em termos florísticos, é muito semelhante
à Floresta Perenifólia Higrófila Costeira.

5) Floresta Caducifólia não Espinhosa

Representa uma transição entre a Mata Atlântica e a Caatinga. Corresponde ao Agreste e


à Mata Seca que acompanha a Zona da Mata do norte do Rio Grande do Norte ao sul da Bahia.
Também denominam-na de Floresta Caducifólia Costeira. Ocorre em um clima mais úmido do que
a caatinga, com quatro a seis meses de duração do período seco. Predominam espécies arbóreas
e arbustivas da caatinga, porém mais altas e de troncos mais retos. Possuem árvores que atingem
entre quinze e vinte metros, com caules longos e pouco esgalhados, como o vinhático amarelo
(Plathymenia foliosa) e o ipê roxo (Tabebuia avellanedae); e árvores de sete a doze metros, como
o pau-brasil (Caesalpinia echinata) e louro pardo (Cordia trichotoma). Nos estratos arbustivos,
são abundantes as Euforbiáceas e as Caparidáceas, no estrato herbáceo predominam Gramíneas
e Bromeliáceas.

6) Cerrado

Esse tipo de vegetação ocupa aproximadamente um quinto do território brasileiro.


Encontramos no sul e leste do Maranhão, sudoeste do Piauí e oeste da Bahia. Relacionado ao
clima quente, semi-úmido, com quatro a cinco meses sem chuvas, suas áreas mais distintas
estão associadas a um relevo de chapadas e tabuleiros. Os cerrados são formações herbáceo-

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 123


lenhosas com árvores de pequeno porte, de troncos e galhos retorcidos, revestidos por espessa
casca. As copas das árvores e arbustos do cerrado são abertas, permitindo a passagem de luz
para os extratos herbáceos. Podem ser enumeradas como espécies mais típicas os seguintes
exemplos: sambaíba (Curatella americana), faveira (Parkia platicephala), mangaba (Hancornia
speciosa), pequi (Cariocar brasiliensis), araçá (Psidium araça), bacuri (Platonia insignis), ipê-
branco (Tabebuia roseo alba) e carnaúba (Copernicia cerifera).

7) Campos

Ocorre no oeste da Bahia, na Chapada do Espigão. Caracteriza-se por ser uma transição de
campo para o cerrado ralo. Vegetação baixa de quatro a seis metros. Ocorrem muitas espécies
tais como: pau-de-terra-mirim (Qualea gardneriana) e outras características do cerrado.

8) Campo Inundável

Encontrado no litoral do Maranhão, é conseqüência das inundações dos rios: Mearim,


Grajaú, Pindaré, Itapicuru e outros menores. Vegetação constituída basicamente pelas gramíneas:
capim-marreca (Panicum colonum), capim-amonjeaba (Sacciolepis myurus), capim-mimoso
(Panicum tricanthun) e capim-açu (Andropogon minarum), entre outros.

9) Vegetação Litorânea

Incluem-se nesta categoria as diversas formas de vegetação que ocorrem nos litorais
arenosos, como os mangues, a vegetação de praias arenosas, de dunas e as restingas. A
vegetação de praia e as dunas sofrem contínua ação dos ventos marinhos, carregados de sal.
Tal combinação confere à vegetação litorânea um aspecto particular. O capim-da-areia (Panicum
racemosum), o alecrim-da-praia (Remirea maritima), a salsa-da-praia (Ipomoea pés-caprae) e
o capim-paraturá (Spartina alternifolia) estão entre as espécies vegetais encontradas nessas
áreas. Os mangues, por sua vez, constituem-se de espécies que se desenvolvem em solos de
pequena declividade, sob a ação das marés de água salgada. No Maranhão e no litoral norte, as
espécies alcançam porte bem mais elevado, formando verdadeiras florestas. As espécies mais
representativas são: o mangue vermelho (Rhizophora mangue), o mangue siriuba (Avicenia
tomentosa) e o mangue branco (Laguncularia racemosa). A vegetação de restinga caracteriza-se
pela presença de bromélias, orquídeas e cactáceas.

10) Caatinga

Tipo de vegetação que caracteriza o Nordeste Semi-Árido. Os índios, como sempre com
muita precisão, denominaram esse tipo de vegetação de Caatinga, que significa mato branco,
esbranquiçado ou ralo; aparência que esse tipo de vegetação tem no período mais seco. Martius
a denominou “silvae aestu aphyllae”, isto é, floresta sem folhas no estio.

124 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 2
Observe o ambiente em que você vive e tente identificar um ou mais tipos
de vegetação que estudou.

A caatinga é considerada por muitos como a mais heterogênea vegetação do Brasil, por
existirem muitas variáveis em sua estrutura, principalmente em relação à altura das árvores
e à densidade da vegetação, que ocorre desde a forma de moitas baixas e isoladas até como
uma mata fechada. Possui as seguintes formas: arbórea-arbustiva aberta, arbórea-arbustiva
fechada e arbórea fechada. Alguns vegetais apresentam-se como indivíduos arbóreos em certos
locais e como arbustos raquíticos em outros.

A caatinga é constituída essencialmente de árvores e arbustos espinhentos, plantas


suculentas espinhosas e plantas herbáceas, que se desenvolvem com bastante vigor depois
das chuvas. A maioria das plantas são xerófitas. As principais características desse tipo de
vegetação são: 1) perda das folhas dos arbustos espinhentos no período da seca; 2) quase
inexistência de folhas largas, predominando folhas compostas e móveis; 3) grande ramificação
das árvores e arbustos; 4) presença de plantas crassas e espinhentas. Tais características são
adaptações evolutivas ao clima semi-árido.

Segundo Egler, a caatinga em Pernambuco pode ser subdividida, para uma melhor
caracterização, em: seca e agrupada, seca e esparsa, arbustiva densa, das serras e da Chapada
do Moxotó.

k) Caatinga seca e agrupada

Ocorre ao sul do estado nas margens do Rio São Francisco onde o relevo é pouco
acidentado, a altitudes em torno de 300 m com baixa pluviosidade (média anual inferior a 500
mm), entre nove e onze meses sem chuva, e acentuada irregularidade na estação chuvosa.
Área idêntica a essa é encontrada na Paraíba e no Rio Grande do Norte (Seridó). São comuns
xerófitas (cactáceas e bromeliáceas). As plantas se agrupam formando capões de várias ou
de uma só espécie, como xique-xique (Cereus gounellei) e macambira (Bromelia laciniosa),
deixando espaços sem qualquer vegetação. Esses agrupamentos podem ser emoldurados por
cactáceas. Ocorrem também arbustos maiores de umbuzeiro (Spondias tuberosa), umburana
(Torresea cearensis), catingueira (Caesalpinia sp.), faveleira (Jatropha phyllacantha), jurema
(Mimosa sp.), marmeleiro (Combretum sp.) e mandacaru (Cereus jamacaru).

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 125


l) Caatinga seca e esparsa

Ocorre também às margens do rio São Francisco. Nesse caso, os arbustos não formam
aglomerados, são isolados e faltam as cactáceas. Possui dois estratos, o mais alto de umburanas
(Torresea cearensis) e o mais baixo de pereiro (Aspidosperma pirifolium), correspondendo a
cerca de 60%; e de faveleira (Jatropha phyllacantha), catingueira (Caesalpinia sp.) e marmeleiro
(Combretum sp.), entre outros. Não ocorre cobertura herbácea. Entre a Paraíba e o Seridó (Rio
Grande do Norte) encontramos uma vegetação semelhante, mas com uma cobertura exclusiva
de capim panasco (Aristida sp.). Essas áreas possuem alta probabilidade de desertificação.

m) Caatinga arbustiva densa

Esse tipo de vegetação recobre a maior parte do semi-árido nordestino. Ocorre em todo
o agreste e na floresta estacional caducifólia espinhosa de Pernambuco (também chamada
de Caatinga arbórea). Possui maior número de árvores e um adensamento do estrato
arbustivo, interrompido somente em locais onde há afloramento de rochas não decompostas.
Encontramos o caroá (Neoglaziovia variegata), planta de valor econômico por fornecer fibra, a
baraúna (Schinopsis brasiliensis), a aroeira (Astronium urundeuva), o angico (Anadenanthera
macrocarpa), a jurema (Mimosa hostilis), a catingueira (Caesalpinia pyramidalis), a faveleira
(Jatropha phyllacantha), o pinhão-bravo (Jathropha pohliana), o marmeleiro (Cróton sp.),
cactáceas (xique-xique e palma de espinho) e bromeliáceas (macambira e caroá).

n) Caatinga das serras

Apresenta maior número de árvores e maior densidade da cobertura herbácea, com o solo
quase totalmente recoberto pelo manto vegetal. Por ocorrer em maiores altitudes, a umidade
é maior. Os vegetais também perdem as folhas nos períodos mais secos.

o) Caatinga da Chapada do Moxotó

Área de solo arenoso muito profundo com vegetação baixa e arbustiva. Ocorrem
palmeirinha ouricuri (Syagrus coronata) e facheiro (Cereus squamosos) que podem atingir
até 5 metros de altura.

Atividade 3
A partir dos nomes populares, tente identificar espécies nativas e
representantes da caatinga em sua cidade, tentando encontrar seus nomes
científicos. Como jurema, Mimosa hostilis.

126 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Culturas agrícolas
Leia a seguir um fragmento do poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de
Mello Neto.

- Conheço todas as roças


que nesta chã podem dar;
o algodão, a mamona,
a pita, o milho, o caroá.
- Esses roçados o banco
já não quer financiar;
mas diga-me, retirante,
o que mais fazia lá?
- Melhor do que eu ninguém
sei combater, quiçá,
tanta planta de rapina
que tenho visto por cá.
- Essas plantas de rapina
são tudo o que a terra dá;
diga-me ainda, compadre
que mais fazia por lá?
- Tirei mandioca de chãs
que o vento vive a esfolar
e de outras escalavras
pela seca faca solar.
(MELLO NETO, 2005)

Como o texto retirado de “Morte e Vida Severina” nos indica, muitos são os problemas
enfrentados pelo sertanejo em relação à agricultura, desde ervas daninhas, solos improdutivos,
seca, falta de financiamento etc. Esses problemas são decorrentes de condições meteorológicas
adversas, como a falta de chuvas, passando muitas vezes por solos não apropriados ao plantio,
manejo inadequado do solo, até a falta de uma política que incentive a agricultura dessa região.

Em relação às culturas agrícolas, percebemos mudanças no panorama há algumas


décadas. Algumas culturas estão em franco declínio e outras estão começando a tomar espaço
no campo. Um dos problemas que a região enfrenta há décadas é a introdução de grandes
áreas com somente um tipo de vegetal, monocultura, tal como ocorreu com a cana-de-açúcar
e o algodão.

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 127


A seguir, faremos um resumo de como algumas delas estão nesse momento.

 Estagnadas – não está ocorrendo modificação na quantidade em seus cultivos: algodão,


café, cebola, goiaba, castanha-de-caju e arroz.

 Em expansão – culturas que começam a apresentar crescimento principalmente devido


às exportações: coco-da-baía, manga, uva, limão, laranja, maracujá, melão, mamão,
banana e soja.

 Em declínio – são principalmente as culturas de subsistência que, por não terem sido
aperfeiçoadas as tecnologias de seus cultivos e por serem predominantemente familiares,
dependem muito das condições climáticas: milho, feijão, mandioca, batata doce e mamona.

Atividade 4
Faça um levantamento em relação às principais culturas agrícolas que são
cultivadas em sua região. A maioria delas é familiar ou para fins comerciais?
Ocorre monocultura?

128 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Flora da Caatinga
ameaçada de extinção
A lista oficial do Ministério do Meio Ambiente da flora ameaçada de extinção apresenta 39
espécies para o Nordeste. Destas, apenas duas espécies são do bioma caatinga: Schinopsis
brasiliensis (baraúna) e Astronium urundeuva (aroeira-do-sertão).

Problemática da flora da Caatinga


O maior problema que a flora do Nordeste sofre é em relação ao indiscriminado uso do
solo. Inexistem, na maioria das vezes, estudos referentes ao impacto ambiental que determinada
atividade poderá causar ao meio ambiente.

Matas são cortadas para a utilização da lenha em fornos de cerâmicas, caieiras, padarias,
fabricação de carvão, retirada de estacas e mourões, implantação de pastos, ou ainda, para
projetos imobiliários. Muitas vezes, associada ao desmatamento, ocorre a queima da área,
levando à morte dos microrganismos do solo. Esses fenômenos levam geralmente à erosão, ao
empobrecimento do solo e ao assoreamento dos rios, refletindo de forma impactante no clima
da região. Grandes porções de terra, como visto na aula 4, estão em processo de desertificação
devido ao uso indiscriminado do solo.

Atividade 5
Observe no seu município quais os maiores riscos a que a vegetação
está sujeita.

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 129


Fauna da Caatinga
Como você deve saber, denomina-se de fauna o conjunto de animais de determinada
região. Esses animais estão adaptados às condições climáticas do local onde habitam. Dessa
forma, dentro da biosfera teremos diferentes faunas, todas elas adaptadas às condições de
cada local, certo?

No ano 2000, o Ministério do Meio Ambiente (www.mma.gov.br) realizou uma


sistematização e diagnóstico referente à fauna do Bioma Caatinga. Chegou-se à conclusão de
que existe a necessidade de se aumentar o conhecimento acerca dos recursos biológicos da
fauna da caatinga. No entanto, foi feita uma listagem na qual estão catalogadas muitas espécies.
Existem entre 348 e 695 espécies de aves nos estados do Nordeste. Destas, 15 estão presentes
em somente um estado (4,3%) (p. 222).

A ictiofauna, que corresponde ao conjunto de peixes, contempla aproximadamente de


191 a 239 espécies, com valores de espécies endêmicas entre 109 (57%) e 135 (58,7%).
Em relação aos répteis e anfíbios, ocorrem cerca de 167 espécies, sendo 24 destas (14,4%)
endêmicas.

Existem ainda 143 espécies de mamíferos, sendo 12 endêmicas (8,4%) e 187 de abelhas
(no Brasil, existem cerca de 3.000 espécies de abelhas). Destas, 30 espécies são endêmicas
(16%).

Atividade 6
Você observa muitos animais em sua região? Quais são eles? Em que
épocas aparecem mais? Existem espécies raras e ameaçadas de extinção?

130 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Produção pecuária
Assim, como o que observamos com as culturas agrícolas, percebemos o crescimento
e a diminuição de algumas criações, principalmente devido a dificuldades nos sistemas de
produção explorados, conforme podemos observar a seguir.

 Em declínio – A criação de gado para corte vem diminuindo gradativamente (18 milhões
para 15 milhões). Sendo os maiores criadores os estados do Ceará, Bahia e Minas Gerais.
E a caprinocultura também apresenta panorama semelhante (10 para 7,5 milhões).

 Estável – Somente a ovinocultura tem se mantido estável, mas não dispomos neste
momento de números oficiais para a região Nordeste.

 Em crescimento – Observamos crescimento na comercialização de sub-produtos da pecuária


(leite, ovos e mel) e na apicultura (de 1,6 mil, em 1990, para 5,1 mil kg, em 2002).

Resumo
Nesta aula, você estudou a flora e fauna do Nordeste brasileiro e observou que
essa região possui uma paisagem florística muito variada e rica. Com relação à
fauna, apesar dos poucos estudos, identificou várias áreas muito importantes
com relação aos animais que ali existem.

Autoavaliação
Trace um perfil do Bioma Caatinga em relação à flora, diferenciando os diversos tipos
1 de vegetação dessa região.

2 Caracterize a vegetação da caatinga.

Fale sobre a produção pecuária do Nordeste brasileiro e de sua cidade.


3
Caracterize as principais áreas em relação a sua importância biológica quanto aos
4 mamíferos, répteis, anfíbios e peixes.

Fale sobre os animais que estão ameaçados de extinção.


5
Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 131
Referências
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Disponível em: <www.mma.gov.br>. Acesso em:
13 jul. 2005.

CONSELHO NACIONAL DA RESERVA BIOMA CAATINGA. Cenários para bioma caatinga.


Recife: SECTMA, 2004.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. Disponível em: <http://www.euclidesdacunha.org.br/>. Acesso


em: 12 jul. 2005.

FORUM ESTADUAL DA AGENDA 21 DE PERNAMBUCO. Agenda 21 do Estado de Pernambuco.


Recife: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, 2003.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Atlas nacional do Brasil: Região Nordeste:
Rio de Janeiro, 2000.

MELLO NETO, João Cabral de. Morte e vida severina. Disponível em: <http://www.nilc.icmc.
usp.br/literatura/morteevidaseverina.htm>. Acesso em: 12 jul. 2005.

SAMPAIO, E.V.S.B.; GIULIETTI, A.M., VIRGÍNIO, J. et al. Vegetação e flora da caatinga. Recife:
Associação Plantas do Nordeste; Centro Nordestino de Informações sobre Plantas, 2002.

SEMINÁRIO BIODIVERSIDADE DA CAATINGA, 2000, Petrolina. Anais..., Petrolina: EMBRAPA


– Semi-Árido, 2000.

SEMINÁRIO DE PLANEJAMENTO ECORREGIONAL DA CAATINGA. Ecorregiões propostas


para o bioma caatinga. Aldeia/PE, 2001. Disponível em: <http://www.plantasdonordeste.org/
ecorregioes.html>. Acesso em: 12 jul. 2005. (1ª Etapa. 28-30 de novembro de 2001).

132 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade 133


Anotações

134 Aula 6 Ciências da Natureza e Realidade


Interação Sol-Terra:
fluxos de Energia

Aula

7
Apresentação
Nesta sétima aula, retornamos ao tema do ambiente externo ao nosso planeta e de sua
influência em nossas vidas. Voltaremos nosso olhar para o meio interplanetário e para o Sol,
como também para alguns efeitos importantes que surgem da interação do Sol com a Terra.

Discutiremos algumas conseqüências importantes da presença, em torno de nosso


planeta, de um campo magnético, o chamado campo geomagnético. Com isso, estaremos
tratando de um tema muito importante para a sociedade atual, que é o clima espacial.

Como você deve lembrar, na aula 3, aprendemos que a atmosfera da Terra funciona como
um escudo que nos protege, contribuindo para o clima e para a preservação das condições
de vida do planeta. Sem a atmosfera não haveria vida. A atmosfera também nos protege das
radiações e das baixas temperaturas existentes no ambiente interplanetário.

Mas, existe uma proteção de natureza magnética que protege a própria atmosfera e se
estende a uma distância da ordem de dezenas de raios terrestres, limitando nosso planeta com
o meio extra-terrestre. Essa região limítrofe que reduz a ação do vento solar é a magnetosfera
terrestre.

Mesmo assim, partículas do vento solar conseguem atravessar a magnetosfera e interagir


com a alta atmosfera, provocando importantes fenômenos físicos e químicos, como as auroras
e as tempestades geomagnéticas, os quais podem afetar indiretamente nosso cotidiano.

Além disso, tal interação (entre o vento solar e a magnetosfera) produz transferência
de energia para a atmosfera, de modo que algumas partículas chegam a ganhar velocidades
suficientes para fugir da atração gravitacional terrestre e escapar para o espaço exterior. Assim,
essa relação constitui-se em mais um mecanismo de perda de material atmosférico para o
espaço exterior.

Nós precisamos entender os fundamentos dos mecanismos de interação de nossa


atmosfera com o meio ambiente interplanetário para compreender como se dá a evolução
dessa envolvente gasosa planetária e sua estabilidade e seus efeitos em sistemas tecnológicos
modernos, como os de navegação. Esperamos que você goste desta aula e que ela o motive
para aprofundar-se nesse assunto. Pensando nisso, ao final, apresentamos uma lista de filmes
e referências da Internet, os quais servirão como fontes de consulta. Boa aula!

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 137


Objetivos
Após o estudo desta unidade, esperamos que você seja capaz de:

analisar as principais características do Sol;


1
conceituar campo magnético e o campo magnético
2 terrestre;

descrever o que ocorre na Terra com a energia que vem


3 do Sol.

O Sol
A partir de agora, teremos várias palavras e conceitos novos para estudar, por exemplo,
vento solar, magnetosfera, auroras e tempestades magnéticas. Apesar de serem novos, estão
relacionados a problemas típicos do homem do século XX e XXI, o qual se utiliza de satélites
artificiais e de toda uma parnafenalha eletrônica que nossos avós nem imaginavam algum dia
existir.

Vamos começar pelo Sol.

Desde o princípio da história documentada, o homem tem se dado conta do papel


gerador de vida em nosso planeta exercido pelo misterioso Sol. No entanto, além disso, ele
é também um grande agente regulador das mudanças climáticas e do comportamento da
alta e média atmosfera planetária. E é desse ponto de vista que estudaremos brevemente a
interação Terra-Sol.

Uma enorme quantidade de energia radiante é continuamente liberada pelo Sol, sendo
em torno de 1023 kJ/seg. Parte dessa energia, entre 0,5kW/m2 e 1,0 kW/m2, tem aquecido e
iluminado a Terra por mais de 4,6 bilhões de anos. O Sol também emite grandes quantidades
de matéria, ou, mais exatamente, prótons, elétrons e outras partículas. Ao fluxo de prótons e
elétrons (partículas eletricamente carregadas, como você já sabe), chamamos de vento solar.
Ele é ejetado ininterruptamente como um jato aspersor. Isso ocorre porque o Sol, assim como

138 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


a Terra, também gira. Porém, por ser um corpo gasoso, ao girar faz com que sua atmosfera
se expanda mais ainda, varrendo, dessa forma, todo o sistema solar.

Uma outra conseqüência de o Sol ser gasoso é que ele gira mais rápido na linha do equador
do que nos pólos, gerando um período médio de rotação (25 dias terrestres no equador e 33
dias próximo aos pólos), ou seja, um dia solar médio, o que equivale a 29 dias terrestres. Além
disso, o Sol apresenta outro comportamento estranho, seus pólos magnéticos mudam com o
tempo, de tal modo que a cada 22 anos completa-se o ciclo de inversão da polaridade do seu
campo magnético. Tudo indica que a Terra também apresenta esse mesmo fenômeno, só que,
no nosso caso, o período dessa inversão é da ordem de cem mil anos. Atenção, perceba que o
que muda é a polaridade magnética e não os pólos geográficos.

Antes de continuarmos nossa conversa, tentaremos caracterizar melhor a quantidade de


energia que o Sol fornece.

Atividade 1
Identifique na conta de energia elétrica quantos KWh você consome
1 em sua residência. Supondo um valor da ordem de 0,7KWh/m2 para a
energia fornecida pelo Sol, compare com ela o seu consumo.

Qual a área que um painel solar deveria ter para abastecer sua

2 casa, se convertesse apenas 15% da energia incidente sobre ele


em energia elétrica?

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 139


E o que acontece com a energia que vem do Sol? A maior parte da energia solar incidente
na Terra é absorvida pelo solo e pelo mar. Uma fração dessa energia é absorvida diretamente
pelos elementos químicos que formam a atmosfera, principalmente, pelo O2 e pelo vapor d´água
(H2O). Finalmente, uma pequena parte é re-emitida para o meio interplanetário e forma o que
chamamos de albedo planetário.

Antes, é necessário definir a palavra albedo, a qual consiste na relação entre a energia total
incidente no planeta e a energia por ele refletida. No caso da Terra, é da ordem de 35%. Por
outro lado, a quantidade de energia que atinge o topo da atmosfera terrestre oriunda do Sol é
de 1352,8 J/m2.s. Essa energia é suficiente para acender, em cada m2, 1.000.000 lâmpadas de
100 Watts. E desse total, 42% alcança a superfície, sendo responsável pelo seu aquecimento,
enquanto 13% ficam retidos na atmosfera.

Note que isso ocorre no lado do dia (o lado da Terra iluminado pelo Sol) e o destino dos
42% que ficam na superfície nesse período é o seguinte:

14% voltam para a atmosfera;

18% vão ser utilizados pelo efeito estufa;

8% contribuem com o albedo;

2% ficam na própria superfície e são utilizados, por exemplo, pelas plantas.

35%

8%

100%

13% Atmosfera

Calor
42%

2% Terra

Figura 1 – Balanço de radiação da Terra

140 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Para que isso ocorra, todos os números e grandezas relativos ao Sol são imensos. Seu
raio é da ordem de 6,96 x 105 km, enquanto o da Terra, como você já sabe, é de 6,4 x 103 km.
Sua massa é 2,0 x 1030 kg, enquanto a da Terra é 6,0 x 1024 kg. Dentre os planetas, o mais
massivo é Júpiter, com massa de 1,9 x 1027 kg, da ordem de 100 vezes menos massivo que o
Sol. Isso significa que o Sol é o objeto mais massivo do Sistema Solar.

Terra

Figura 2 – O Sol e a Terra vistos durante um evento de massa coronal. A inserção da Terra na figura é para mostrar a
relação de escala entre esses dois corpos celestes, não fazendo originalmente parte da imagem captada
pelo satélite SOHO, em 14 de setembro de 1999.
Fonte: Extraída do site.
Acesso em: http://www.achetudoeregiao.com.br/Astronomia/sol_2.htm.

A massa do Sol corresponde a mais de 99% da massa total do sistema solar. Ou seja, a
soma das massas de todos os planetas e luas que formam esse sistema corresponde a 2%
da massa do Sol. Como esses, outros números relativos ao Sol são imensos; sua distância ao
centro de nossa galáxia é da ordem de 3 x 10 16 km, enquanto sua velocidade angular em torno
do centro galácteo é 200 km/s. E nesse movimento ele carrega todos os planetas que, como
a Terra (observada Figura 2 como um minúsculo ponto), giram em torno dele.

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 141


Atividade 2

Usando os dados do texto, determine a razão entre a massa do Sol e a


massa da Terra. Faça o mesmo em relação aos raios e com isso estime quantos
planetas Terra caberiam no Sol.

Por ser ainda relativamente novo, a idade do Sol é aproximadamente 5 bilhões de anos,
enquanto a do Universo é por volta de 15 bilhões. Ele é também um astro rico em atividade (as
estrelas, quando envelhecem, acabam por exaurir toda a sua energia, cessando suas atividades
e, com isso, “morrem” ou explodem), gerando continuamente energia através de conversão
de Hidrogênio em Hélio em seu interior.

Enquanto isso, na sua superfície, encontramos um grande movimento de partículas e


campos que geram uma gama de fenômenos físicos importantes, sendo que muitos deles nos
afetam diretamente no dia-a-dia, como as explosões solares.

142 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Talvez você já tenha se informado através da televisão ou jornais que ocasionalmente
podemos observar na superfície do Sol (com telescópios especiais, pois não se deve olhar
para o Sol sem algum tipo especial de proteção) um fulgor tão brilhante que se distingue no
deslumbrante disco solar. Esse fulgor, que pode durar até 30 minutos, emite mil vezes mais
energia do que todo o resto da estrela e se concentra em pequenos pontos na sua superfície
(em áreas menores que um décimo de milésimo da área solar), sendo conhecido na
literatura como solar flares (fulguração solar).

Figura 3 – Foto do Sol obtida pela estação espacial Skylab da NASA em 19 de dezembro de 1973. No lado superior
direito, nota-se um dos maiores solar flares já gravados. A proeminência atingia, no momento dessa
foto, uma distância da superfície do Sol superior a 250 000 km.

Fonte: Extraída do site http://www.achetudoeregiao.com.br/Astronomia/sol_2.htm.

Esse fenômeno, associado a uma forte emissão de radiação e de partículas pode,


eventualmente, afetar drasticamente os satélites em órbita em torno da Terra. Isso acontece
de duas maneiras: através da interação da radiação com a parte elétrica do satélite, provocando
curto-circuitos que danificam componentes eletrônicos, e a outra é a alteração da densidade
da ionosfera, modificando a trajetória dos satélites. Em ambos os casos se provocam
transtornos para os sistemas de comunicações. Por outro lado, ao variar a quantidade de
partículas existentes na ionosfera, esta irá gerar e propagar correntes elétricas tão intensas
que os campos elétricos a elas associados podem até danificar os geradores e transmissores
de energia instalados na superfície terrestre em regiões próximas aos pólos.

Também é possível observar na superfície do Sol a existência de “manchas”, ou seja, regiões


“escuras”, conhecidas como manchas solares.

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 143


Manchas solares
Uma mancha solar é uma ampla e superficial região cuja superfície está na capa (corona)
visível do Sol. A sombra, que corresponde à região central da superfície, aparece negra
nas fotografias porque tem uma luminosidade inferior a aproximadamente um quarto da
luminosidade da área adjacente. A temperatura no interior de uma mancha solar é de apenas
3.900K, enquanto fora da mancha a temperatura é da ordem de 5.600K.

As manchas solares, como os solar flares, são interessantes, não apenas por
representarem um dos mais intrigantes fenômenos observados no Sol, mas por sua possível
interferência na dinâmica da atmosfera terrestre. No caso específico dessas manchas, existem
teorias associando sua periodicidade de 11 anos com a periodicidade das secas no nordeste
brasileiro. Um comentário interessante sobre essa correlação, encontramos na obra Os Sertões,
de Euclides da Cunha .

[...] Impressionado pela razão dessa progressão raro alterada [aqui ele está se referindo
à seca e a sua quase periodicidade de 11 anos], e fixando-a um tanto forçadamente em
onze anos, um naturalista, o Barão de Capanema, teve o pensamento de rastrear nos
fatos extra-terrestres, tão característicos pelos períodos invioláveis em que se sucedem,
sua origem remota. E encontrou na regularidade com que repontam e se extinguem,
intermitentemente, as manchas da fotosfera solar, um símile completo [...] (CUNHA,
2003, p.60-61).

Média anual de manchas solares 1610-2000


200
Nº de manchas solares

100

0
1600 1650 1700 1750 1800 1850 1900 1950 2000
DATA

Figura 4 – Série temporal mostrando a variação da atividade solar em termos do número de manchas solares

Fonte: Extraída do site http://science.msfc.nasa.gov/ssl/pad/solar/sunspots.htm.

144 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 3
Analise o gráfico anterior e indique quais os anos de máxima e mínima
atividade solar. Em quais anos as secas foram mais intensas e em quais a
estação chuvosa foi mais significativa? O gráfico mostra uma exata correlação
entre estação chuvosa e número de manchas solares? Explique.

Atividade 4
A informação em destaque refere-se aos anos de ocorrência de grande
secas, segundo relato do livro Os Sertões, ocorridas nos séculos XVII e XVIII.
Identifique qual a periodicidade delas. Compare com o gráfico de manchas solares
e identifique quais os casos em que as secas ocorreram em período de alta
atividade solar.

Secas: 1711; 1724; 1737; 1745; 1778; 1809; 1825; 1837; 1845; 1879.

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 145


Dessa forma, vemos que a idéia da influência da atividade solar sobre fenômenos terrestres
é bem antiga. Mas, essa correlação não é totalmente aceita atualmente pela comunidade
científica, em especial, a dos meteorologistas, que observam a existência de outros fenômenos,
como o El Niño, para explicar o clima e as mudanças climáticas ocorridas no nordeste brasileiro.
Bem melhor entendidas e aceitas são as perturbações de natureza elétrica provocadas pelos
flares, discutido anteriormente.

Um outro efeito muito interessante da interação do Sol com a Terra são as auroras:
fenômenos luminosos que ocorrem na alta atmosfera (entre 80 e 200 km de altura) nas regiões
polares, tanto no hemisfério norte quanto no hemisfério sul.

Figura 5 – Uma aurora boreal, fotografada por Dick Hutchinson©Shot próximo ao Círculo Polar, Alaska. A parte
inferior da aurora estava a aproximadamente 80 km de altura.

Fonte: Extraída do site http://www.exploratorium.edu/auroras.

Para compreender melhor essa ação, falaremos um pouco sobre o vento solar e o campo
magnético terrestre.

O vento solar
A região coronal do Sol, isto é, sua camada mais externa, a qual se estende para o
meio interplanetário, apresenta-se tão quente que nem mesmo a enorme força gravitacional
dessa estrela é capaz de reter as partículas que a compõem. Como já sabemos, o Sol emite
continuamente luz e calor, mas o nível dessa emissão aumenta muito durante os flares e
quando a região solar ativa é visível.

Por outro lado, ao contrário da atmosfera terrestre, a corona solar não está em
equilíbrio hidrostático. Dessa forma, parte da coroa (o mesmo que corona) está continuamente
“evaporando”, de modo que, fisicamente, o que se observa é a corona se expandindo e lançando
matéria e energia para o meio interplanetário, formando o que denominamos de vento solar,

146 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


definido como sendo uma parte da corona que se expande para o espaço exterior, varrendo todo
o sistema solar e estendendo-se para além deste.

Em outras palavras, o vento solar é formado por um fluxo de partículas carregadas


(plasma), movendo-se com velocidades supersônicas entre 300 e 800 km/s, oriundas da
corona, que envolve todo o sistema solar e que atinge constantemente a Terra, provocando
distorções (ocasionalmente fortes) no campo magnético terrestre. O vento solar, ao se
propagar, transporta partículas eletrizadas e campos magnéticos com velocidades tão altas
que produzem ondas de choque as quais interagem com o campo magnético terrestre.

O campo magnético terrestre


Conhecido desde a Antigüidade, o campo magnético terrestre tem importância
fundamental nas diversas formas de vida que aqui se desenvolveram. Animais sentem e até
se orientam através dele. Antigos navegadores perceberam sua presença e usaram as bússolas
desenvolvidas pelos chineses para se orientar no mar. Em nosso cotidiano, até a década
passada, também usávamos as bússolas para nos localizar em regiões remotas. Mas, como é
esse campo? O campo da Terra é semelhante ao de uma barra, só que de uma barra inclinada,
como mostrado a seguir.

Figura 6 – O campo magnético terrestre, visto como semelhante ao campo gerado por uma barra imantada

Fonte: Extraída do site http://www-istp.gsfc.nasa.gov/Education/MagTeach.htm.

Sua origem está nas partículas carregadas que preenchem a região próxima ao núcleo
terrestre e que, ao se movimentarem, geram campos elétricos locais e o campo magnético
planetário. Este último tem suas extremidades situadas nos pólos e é praticamente horizontal
na região equatorial. Isso tem um efeito interessante. As partículas eletricamente carregadas
que chegam à Terra são aprisionadas por esse campo, que induz uma direção preferencial ao
movimento delas. Ou seja, as partículas se movem ao longo das linhas de campo, assim, seu
movimento é norte-sul. Observando a Figura 6, percebe-se que as linhas do campo magnético
chegam à superfície terrestre nos pólos e a região geográfica onde isso ocorre é chamada de

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 147


oval auroral. A tendência das partículas presas ao campo seria migrar em direção à superfície,
como logo acima existe a atmosfera, elas acabam se “chocando” com as partículas neutras
que compõem a alta atmosfera (as maiores partes dessas colisões se dão entre 80 e 200 km
de altura).

Produto dessa colisão, átomos da atmosfera ficam excitados e acabam emitindo fótons.
Essa emissão luminosa é chamada de aurora, boreal (quando ocorre no pólo norte), ou austral
(quando ocorre no pólo sul).

Atividade 5
Tente explicar o motivo pelo qual não ocorrem auroras no nordeste brasileiro.

Talvez você não tenha conseguido responder. Mas, olhando a figura que ilustra o campo
magnético da Terra como o de um imã, verifica-se que, como as partículas eletricamente
carregadas se movem ao longo das linhas do campo magnético, elas não teriam como entrar
em contato com a atmosfera terrestre sobre a linha equatorial, pois, nessa região, as linhas de
campo passam muito distantes da camada atmosférica. Na verdade, esse contato só ocorre,
como percebemos na figura que mostra a região polar, nos dois hemisférios. Por isso, não
temos auroras no Brasil!

148 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Efeitos da atividade solar
Conforme mostramos, a Terra comporta-se, no espaço, em termos comparativos, como
um ímã (campo de dipolo), orientado quase verticalmente. Por outro lado, em um universo
vazio, isto é, sem campos interplanetários e sem raios cósmicos, as linhas do campo magnético
terrestre seriam exatamente como a de um ímã e se propagariam na forma de dipolo, sem
restrições para o infinito.

Mas, como você sabe, não estamos isolados no universo e, em função da presença do
vento solar, o campo magnético terrestre fica confinado a uma cavidade conhecida como
magnetopausa, a qual assume uma configuração semelhante a uma vasta cabeleira feminina
balançando ao vento. Isso faz com que, a uma distância de poucos raios terrestres, o campo
magnético da Terra se diferencie muito do campo de dipolo, já mencionado. A interação do
vento solar (que transporta campos magnéticos) com o campo magnético terrestre gera uma
configuração, ilustrada na Figura 7.

Figura 7 – Vista estilizada do Sol, com evento de ejeção de massa, da Terra com seu campo magnético e da
envoltória gerada pelo vento solar.

Fonte: Extraída do site http://www-istp.gsfc.nasa.gov/Education/MagTeach.htm.

Observando essa figura, você pode perceber que do lado do dia as linhas do campo
magnético terrestre são comprimidas pela ação do vento solar, enquanto do lado da noite (o
lado não iluminado) elas se estendem. Medidas realizadas por satélites indicam que no lado
não iluminado o campo tem extensão superior a 400.000 km, isto é, vai além da lua.

É através dos pólos que as partículas provenientes do vento solar penetram na atmosfera
do nosso planeta e um dos fenômenos mais belos associados a essas partículas é o das
auroras. Como você deve ter respondido na atividade 3, esse fenômeno nunca irá acontecer
em nossa região, devido à configuração do campo magnético terrestre que aqui no equador
funciona como um escudo, ao desviar as partículas eletricamente carregadas oriundas do
vento solar e impedindo-as de penetrar até a atmosfera equatorial, mas permitindo que tal

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 149


penetração ocorra na região polar. Ou seja, são prótons e, eventualmente elétrons, que se
deslocam com velocidades superiores a um milhão de quilômetros por hora. Assim, essas
partículas penetram pelas linhas do campo magnético da Terra e, ao interagir com a atmosfera,
criam os mais variados efeitos luminosos.

Seu mecanismo é relativamente simples. As partículas colidem com átomos de oxigênio


e de nitrogênio, excitando-os e, com isso, fazendo com que ocorra a emissão de fótons,
com diversos comprimentos de onda, inclusive correspondente ao visualizado no espectro
eletromagnético.

As auroras ocorrem tanto no hemisfério norte (boreais) quanto no hemisfério sul


(austrais). As auroras polares, muitas vezes, se comportam como uma cortina brilhante que
se estende por centenas de quilômetros. Ela move-se ora lentamente ora rapidamente, com
velocidades que atingem 100 km/h.

Em sua base, que se situa acerca dos 80 km de altura, a aurora costuma apresentar tom
de verde, depois um vermelho, com se fosse a barra de uma cortina, que pulsa e ondula.

Em 1621, Galileu Galilei, enquanto investigava o movimento dos astros, tentou explicar o
fenômeno dessas luzes. Por algum motivo, do qual ele não suspeitava, a luminosidade noturna,
relatada por centenas de observadores, quase sempre ocorria no Norte da Europa, assim, ele
chamou esse fenômeno de “aurora boreal”. Essa expressão, inventada para designar a aurora
polar, é usada por todos nós até hoje!

Como, de todas as camadas da atmosfera, é na ionosfera onde a densidade de partículas


portadoras de cargas (elétrons e íons) é suficientemente alta, de modo a afetar a propagação
de ondas de rádio, perturbações na atividade solar provocam problemas em nossas
comunicações via radiofreqüência. Esse é o caso dos radioamadores que usam a ionosfera
para se comunicarem a distância.

Um outro efeito particularmente importante, e que mereceu destaque no início de nossa


aula, é a atividade solar poder alterar o clima no Nordeste. Um exemplo disso, você viu quando
analisou a correlação entre manchas solares e a taxa de precipitação pluviométrica nessa região.
Esse é um assunto ainda em estudo e ao qual voltaremos na próxima aula. Associado a isso,
temos também o chamado aquecimento global, que se relaciona com a atividade humana sobre
o planeta e com o clima espacial.

150 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, aprendemos que as fontes básicas de influência sobre a atmosfera
terrestre resultante da atividade solar são a radiação solar e a emissão de
partículas energéticas do Sol através do vento solar. Mas, a Terra tem dois
importantes mecanismos de proteção, o primeiro, representado pela magnetosfera,
e, o outro, pela atmosfera. Mesmo assim, partículas mais energéticas do vento
solar conseguem atingir nosso planeta, provocando alguns efeitos importantes,
como: 1) a ocorrência das auroras polares; 2) o aquecimento da ionosfera polar
que influencia a circulação de ventos em altas latitudes; 3) a alteração da altura
da ionosfera de altas latitudes, prejudicando, assim, sistemas de orientação na
navegação oceânica; 4) a produção de distúrbios em regiões localizadas da
atmosfera; 5) a produção de campos elétricos e indução de correntes elétricas
capazes de afetar o funcionamento de dispositivos eletro-eletrônicos nas regiões
polares; 6) os danos ocasionais a satélites, espaçonaves e estações espaciais; 7)
a interferência nos telégrafos e em outros meios de comunicação via ionosfera
ou via satélite; 8) as mudanças no clima global e, localmente, até as variações na
intensidade das precipitações durante as estações chuvosas no Nordeste.

Autoavaliação
Existem, circulando em nosso meio, diversas concepções alternativas que tratam
dos conceitos abordados nesta aula, como as crenças de que o Sol é sólido ou
de que nós vivemos no interior da terra, por exemplo.
Se você já é professor, elabore uma atividade para realizar em sala de aula, com
seus alunos, visando a descobrir o que eles pensam sobre o tema e, em seguida,
discuta a abordagem científica correta. Por exemplo, comece perguntando o
que é o Sol. Proponha que cada aluno escreva, em uma folha, sua resposta.
Construa um painel com as respostas dadas. Permita agora, que todos as leiam.
Reúna a turma em pequenos grupos e solicite a cada um a elaboração de uma
nova resposta, que será a do grupo. Repita o procedimento de exposição das
respostas e de sua leitura por parte dos alunos. Proponha a formação de dois
grandes grupos para a produção de uma resposta mais elaborada e direcione
essa atividade de tal modo que a turma chegue a um conceito mais amplo do que
é o Sol e, se possível, de algumas de suas características.
Se você não é professor, converse sobre o Sol com pessoas próximas e escreva
um texto comparando as concepções de cada entrevistado com as abordadas
no texto. Com isso, identifique os conceitos errados mais comuns, se existirem.

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 151


Filmes
Existem filmes que são exibidos no canal Discovery sobre explosões e ventos solares.

Referências
BEZERRA, Arnaldo Mouro. Energia solar: aplicações práticas. São Paulo: Ed. Nobel, 1990.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. (Coleção prestígio)

DEUS, Jorge Dias de; PIMENTA, Mário; NORONHA, Ana; PEÑA, Teresa; BROGUEIRA, Pedro.
Introdução à física. São Paulo: McGraw-Hill, 1992.

WEINER, Jonathan. Planeta Terra. São Paulo: Martins Fontes, 1986.

Anotações

152 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade 153


Anotações

154 Aula 7 Ciências da Natureza e Realidade


Clima e tempo

Aula

8
Apresentação
Como você sabe, a seca no Nordeste é um problema recorrente. Nesta aula, trataremos
um pouco de assuntos que nos permitem entender melhor esse fenômeno: o clima, o tempo
e as estações do ano.

Podemos começar lembrando que nos noticiários e jornais diários, encontramos frases
do tipo “tempo bom” ou “tempo instável e sujeito a chuvas durante o período”, ou também
“clima quente e úmido”. Mas, afinal, qual o significado das palavras clima e tempo no contexto
da meteorologia?

Para responder a essa questão, temos que retomar alguns conceitos e definições que
você aprendeu nas aulas anteriores, como a Terra, a atmosfera, o bioma e o Sol, lembrando
que existem diversos ciclos na natureza e entre eles o da água, já que o clima e o tempo estão
relacionados a todos esses assuntos.

Objetivos
Ao final da aula, você deverá ser capaz de:

diferenciar clima de tempo;


1
explicar a ocorrência das estações do ano;
2
mostrar graficamente o movimento do ar;
3
elencar causas para o fenômeno da seca.
4

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 157


O clima e o tempo
Quando falamos de clima, estamos nos referindo a um conjunto de dados (temperatura,
pressão, umidade) a respeito das condições atmosféricas de um determinado local, durante um
período cronológico específico. O tipo de clima depende de uma série de fatores, como latitude,
altitude, relevo e radiação solar. Até mesmo a presença do ser humano pode alterar o clima.

A caracterização do clima de uma região é uma representação do comportamento médio


baseada em dados diários da condição atmosférica.

Figura 1 – A riqueza da diversidade da paisagem terrestre é conseqüência natural do comportamento do clima,


mas a ação do homem também pode provocar grandes alterações nessas paisagens, muitas vezes, com
resultados desastrosos, como as queimadas.

158 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


O monitoramento contínuo através de instrumentos específicos, bem como a estatística,
que você estuda em Matemática e Realidade, são fundamentais para o estudo do clima.

Por outro lado, quando falamos de tempo, estamos nos referindo à condição momentânea
da atmosfera. Trata-se de uma análise envolvendo um período de observação relativamente
curto: horas, dias ou, no máximo, semanas. Contudo, numa abordagem geográfica, o tempo
atmosférico só começa a fazer sentido se observado segundo sua regularidade a partir da
interpretação de dados derivados de anos de coleta sistematizada. Então, o que aparece nos
noticiários em geral são previsões do tempo.

O conhecimento do tempo é, pois, condição fundamental para o estudo e o estabelecimento


do clima de uma determinada área. Em resumo, quando olhamos o aspecto momentâneo,
estamos tratando de tempo; quando abordamos os aspectos contínuos, o objeto é o clima.
Temos, na verdade, dois ramos do conhecimento aqui representados, a climatologia – estudo
do clima – e a meteorologia – estudo do tempo.

Da próxima vez que você ler ou assistir a um noticiário que contenha previsões
climatológicas, preste atenção se estão usando corretamente os dois conceitos que você
acaba de aprender.

Periodicidades
Desde o começo da formação da Terra, o clima vem se modificando, ora mais
intensamente, como nos períodos glaciais, ora mais lentamente, nas eras inter-glaciais, como a
que vivemos atualmente. Essas mudanças têm diversas origens, algumas são provocadas por
agentes externos, oriundos do meio interplanetário, no caso da tremenda mudança climática
que pôs fim a era dos dinossauros; outras estão relacionadas aos movimentos do planeta,
sendo passíveis de previsão por apresentar uma razoável taxa de repetitividade. Também é
notável que a própria ação do homem sobre o planeta tem afetado o clima de uma maneira
que ainda não é possível quantificar totalmente, mas de um modo certamente não periódico.
Tudo indica que esse efeito irá aparecer como uma flutuação sobre as mudanças periódicas,
tornando-as mais intensas, ou seja, invernos mais rigorosos, verões mais intensos, cheias e
secas maiores, entre outros.

Os fenômenos climáticos apresentam, de um lado, uma forte periodicidade, a qual nos


permite dizer que no dia 22 de setembro começa a primavera no hemisfério sul e, por outro
lado, apresenta uma variabilidade tal que não é possível dizer exatamente se daqui a quatro
dias choverá ou não (principalmente nas regiões litorâneas do Nordeste).

Um dos exemplos mais extraordinários dessa mudança no tempo ocorreu no dia 22 de


janeiro de 1943, nos EUA, na cidade de Spearfish. Lá, naquele dia, às sete horas da manhã, a
temperatura era de –20oC. Às sete horas e dois minutos, a temperatura passou para 7oC. Ou
seja, houve uma variação de 27oC em apenas dois minutos.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 159


Atividade 1
Na sua cidade, há variações do tempo. Pela manhã, por volta das 07h, qual
é em geral a temperatura? E ao meio dia? E ao final da tarde, por volta das 17h?
Estime quanto varia a temperatura, em um dia, na sua cidade. Esses valores
também devem mudar de acordo com a estação do ano ou com as condições
de tempo do dia em que você vai fazer sua observação. Para comprovar isso,
preencha a tabela seguinte.

Data/ estação Horário Temperatura Existência


do ano
Nuvens Vento

07h
12h
17h
07h
12h
17h

A que conclusões você pode chegar a partir do preenchimento dessa tabela?

Você deve ter percebido que sua resposta será influenciada pela pequena quantidade de
dados que coletou, isto é, você não poderá garantir que os valores obtidos irão se repetir nas
próximas semanas ou nos próximos meses. Por isso, é preciso fazer observações contínuas
do nosso planeta para que os modelos matemáticos que permitem fazer previsões climáticas
(previsão do tempo) fiquem mais precisos, confiáveis.

Por outro lado, possivelmente, sua resposta indica que as variações são da ordem de
alguns graus, no máximo 10oC a 15oC, não ocorrendo mudança significativa nessa diferença
com a época do ano. No entanto, existem regiões no Brasil em que as condições do tempo
variam muito durante o dia, bem como durante o ano. Isso ocorre devido a nossa proximidade
com o equador geográfico, região onde a quantidade de radiação solar que chega é praticamente
a mesma durante todo o ano. É por isso, também, que não necessitamos de um horário de
verão específico.

160 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Um dos mais importantes fenômenos climáticos periódicos de nosso planeta são as
estações do ano. Como você sabe, elas são:

outono: 20 de março a 20 de junho;

inverno: 21 de junho a 22 setembro;

primavera: 23 de setembro a 21 de dezembro;

verão: 21 de dezembro a 19 de março.

Essas datas variam um pouco devido às peculiaridades de nosso calendário que


consideram a existência dos anos bissextos.

Atividade 2
Você sabe por que existem as estações do ano? Tente responder a questão
antes de prosseguir seu estudo.

Muitas vezes, pensa-se erradamente que as estações do ano estão relacionadas com a
maior ou menor distância da Terra ao Sol. Isso não é verdade. Do ponto de vista da Física,
elas estão relacionadas às faixas da Terra que são iluminadas pelo Sol com maior ou menor
intensidade. Assim, como se percebe na Figura 2, as estações do ano são simétricas em relação
à linha do equador, ou seja, quando é verão no hemisfério norte, é inverno no hemisfério sul.
Note que isso não tem relação com a distância da Terra ao Sol!

Se você recorda bem, na segunda aula, quando falamos da Terra, foi dito que seu eixo de
rotação é inclinado e devido a esse fenômeno, ocorrem as estações do ano. Sem inclinação,
não as teríamos. Isso também explica o motivo pelo qual nós, que moramos perto do equador,
praticamente não as percebemos.

No equador, todas as estações são muito parecidas: temos Sol o ano todo, que fica
visível acima do horizonte, todos os dias do ano por um período de 12 horas; por um mesmo
período de 12 horas, fica abaixo do horizonte, quando não se pode vê-lo. Portanto, a altura
do Sol ao meio-dia no Equador não muda muito ao longo do ano e, conseqüentemente, não
existe muita diferença entre inverno, verão, primavera e outono. Por outro lado, à medida que
nos afastamos do Equador em direção aos pólos, as estações ficam mais acentuadas, de tal
modo que as maiores diferenças entre as estações do ano irão acontecer nos pólos (passam
períodos de seis meses iluminados e seis meses às escuras).

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 161


Figura 2 – As estações do ano são simétricas em relação ao equador, quando é verão no hemisfério norte, é inverno
no hemisfério sul. Mas, para nós que moramos perto do equador, não existe praticamente nenhuma
diferença na incidência dos raios solares.

Fonte: Movimento anual do sol e as estações do ano. Disponível em: <http://astro.if.ufrgs.br/tempo/mas.htm>. Acesso em: 12 maio 2005.

Na verdade, no Nordeste temos apenas a estação de chuva (chuvosa) e a estação sem


chuva, sem grandes variações de temperatura ou na paisagem, como ocorre em lugares onde
chega a nevar em dezembro.

Figura 3 – Visão estilizada do movimento de transição da Terra em torno do Sol. Note que em 21 de junho temos o
inverno no hemisfério sul e verão no hemisfério norte, enquanto em 21 de dezembro ocorre o contrário
devido à inclinação do eixo imaginário da terra que no primeiro caso inclina-se para o Sol e no segundo,
contrário ao Sol.

No sertão nordestino, a estação chuvosa compreende os meses de fevereiro a maio.


No entanto, a quantidade de chuvas nessa estação varia significativamente de ano para ano.
E mesmo de cidade para cidade. Essa quantidade é medida em milímetros e a soma anual
representa a precipitação média.

162 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Assim, quando afirmamos que “ontem choveu 120mm na cidade de Santo Antônio do
Salto da Onça/RN”, estamos dizendo que a quantidade de água precipitada durante a chuva que
caiu ontem seria capaz de formar uma camada de 120mm de espessura sobre uma superfície
de um metro quadrado (1,0m2).

Ainda do Nordeste, principalmente no sertão, a quantidade anual de chuva está entre


330mm (estação chuvosa fraca, ocasionando seca) e 1600mm (estação chuvosa boa). No litoral,
esses valores são muito maiores, mesmo assim pode-se ter boas e más estações chuvosas.

Precipitação Precipitação Precipitação Número de


ANO
angicos Campo Grande Caicó(mm) manchas solares
1970 364,9 697,1 455,1 104,5
1971 954,2 1154,4 964,1 66,6
1972 333,1 844,3 979,7 68,9
1973 601,5 804,3 648,8 38
1974 1285 1427,8 1560,5 34,5
1975 754,4 860 1162,6 15,5
1976 461,9 807,8 617,3 12,6
1977 826,6 959,8 1144 27,5
1978 416,3 925,4 838,1 92,5
1979 262,4 447,4 500,6 155,4
1980 289,4 770 423 154,6
1981 446,9 462,6 519,9 140,4
1982 438,3 553,7 648,3 115,9
1983 209,5 239,2 300,1 66,6
1984 703,5 1047,3 954,6 45,9
1985 1153,7 1637,3 1558,3 17,9
1986 841,9 1375,6 1142,2 13,4
1987 380,1 524,3 629,1 29,4

Fonte: EMPARN – Empresa de Pesquisa Agropecuária Rio Grande do Norte. Disponível em: <www.emparn.gov.br>.

Antes de continuarmos, analisaremos a tabela anterior. Na primeira coluna, temos o


ano, na última, o número médio de manchas solares para o respectivo ano, e nas colunas
intermediárias, a quantidade de chuva em mm para as cidades de Angicos, Campo Grande e
Caicó, todas no RN. Pode-se perceber que a quantidade de chuva varia de cidade para cidade
e de ano para ano.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 163


Atividade 3
Faça o gráfico da precipitação em função do ano para cada uma dessas
cidades e compare. Em que cidade, em média, chove em maior quantidade?
Em que ano choveu mais em cada uma das cidades? Quando choveu em menor
quantidade? Quais os dois anos em que choveu mais em Caicó? Quais os dois
anos em que choveu menos em Angicos? Qual o intervalo de tempo entre esses
dois anos, nos dois casos?

Uma pergunta que se faz constantemente é sobre as causas da seca no Nordeste. Para
pensarmos um pouco sobre esse assunto, temos que situar o que entendemos sobre “seca”. O
Nordeste brasileiro não é, certamente, uma das regiões do planeta onde chove menos. Mesmo
no continente sul-americano temos desertos muito importantes como o Atacama, no Chile.
Por outro lado, a região amazônica é um dos lugares em que mais chove no mundo.

164 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Assim, podemos dizer que no Nordeste as chuvas são irregulares e que temos aqui
uma densidade populacional significativa, o que, associada ao desconhecimento de técnicas
de armazenamento e de uso adequado, leva ao problema da falta de água, tanto para o uso
animal quanto para o consumo humano. Então, em nosso caso, ao contrário do que ocorre
em outras partes do planeta, onde quase não chove, a nossa seca está relacionada mais ao
gerenciamento e à definição de políticas públicas do que realmente à ausência de chuvas.
Além disso, se você olhar em um “mapa mundi”, constatará que os grandes desertos de nosso
planeta se encontram próximos ao equador.

Exemplos
Suponhamos uma casa no sertão, cuja área coberta seja de 50m2. Através de calhas,
os moradores dessa casa conseguem armazenar toda a água de chuva que cai no telhado.
Imagine um ano de estação chuvosa fraca, isto é, um ano em que a precipitação foi de apenas
360mm. Determine:

a) o volume, em litros, de água que essa família teria armazenado em uma cisterna;

b) supondo uma família de quatro pessoas, em que cada uma consumisse 30 litros de água
por dia, por quanto tempo essa água armazenada duraria.

Resolução
a) A chuva que caiu em um metro quadrado foi de 1,0m2 360,0mm. Para fazer esse
cálculo, temos que transformar milímetros em metros (1,0mm = 10-3m). Assim,
o volume de água que caiu durante o ano foi 1,0m 2 360 10 -3m = 0,36 m 3.
Como o telhado da casa tem 50m2, então, o volume de chuva foi de 0,36 50 = 18m3.
Precisamos agora transformar metros cúbicos (m3) em litros ( l ). Como 1,0m3 = 1000l,
temos: 18m3 = 18 1000l = 18.000 litros. Portanto, a família armazenaria dezoito mil
litros de água.

b) Queremos determinar quanto tempo essa água poderia abastecer a família. Como são
quatro pessoas, e cada uma consome por dia 30l, o total diário seria de 30 X 4 =
120l. Como eles teriam armazenado 18.000l, dividindo-as 18.000/120 = 150 dias, isso
corresponde a aproximadamente 5 meses de consumo de água.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 165


Atividade 4
Determine a área de sua casa, considerando somente a área coberta. Em
um inverno no qual as precipitações chegam a 600mm, qual seria a quantidade,
em litros, de água que cairia no telhado durante o ano? Determine também,
considerando o número de pessoas que moram em casa, por quanto tempo essa
água poderia abastecer sua família.

166 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


O Sol e o clima do Nordeste
O texto apresentado a seguir reproduz parte de uma reportagem escrita para o periódico
“O Jornal”, de Afonso Bezerra/ RN, edição de 27 de outubro de 1997. Os autores do texto
são professores do Departamento de Física da UFRN. Este texto apresenta uma série de
informações e termos científicos que você aprendeu em outras aulas desta disciplina (aulas 3
e 7, por exemplo). Leia o texto e vá sublinhando ou anotando em seu caderno as palavras e/ou
expressões científicas que você já conhece. Esse é um bom procedimento de auto-avaliação.

Além da transferência direta de energia solar para a terra, existem outros


fenômenos com origem no Sol que modificam os parâmetros da atmosfera
terrestre. Esses fenômenos são indicativos da atividade solar, que se mede pelo
número de manchas escuras solares (manchas solares) que aparecem no Sol.
Geralmente quando o sol se encontra muito ativo ocorrem as erupções solares
em que partículas de alta energia são ejetadas em direção da terra interagindo
fortemente com o campo magnético da terra produzindo tempestades magnéticas.
[...] A estação chuvosa no sertão nordestino compreende o período entre os
meses de fevereiro a maio. Os anos considerados muito chuvosos correspondem
àqueles anos onde o número de manchas solares é baixo. Podemos citar com
exatidão os seguintes períodos: 1934-1935; 1964-1965; 1974-1975. [...] As
grandes secas no sertão nordestino ocorreram quando o número de manchas
solares era alto. Citamos como exemplo: 1950 (330mm); 1951 (150mm) 1958
(132mm) 1970 (350mm). [...] Por que essas informações são importantes?
Porque a previsão do número de manchas solares já é conhecida até o ano de
2008 e a margem de erro dessa previsão vem sendo muito pequena. [...]

Fonte: BONELLI, E; MEDEIROS, R. T.; BORBA, G. L. O Sol e a seca no Nordeste. O Jornal. Afonso Bezerra/RN, 27 de Out./1997.

Esse artigo aborda alguns pontos importantes, como a interação do Sol com a atmosfera
terrestre, assunto discutido na aula 3, que levanta a questão da necessidade de termos medidas
contínuas e por grandes intervalos de tempo, para fazermos uma análise estatística a qual
permita alguma previsão de comportamentos futuros. Afinal, como você deve lembrar, na
primeira aula aprendemos que um dos objetivos da ciência é elaborar modelos que possibilitem
a previsão de como se comportará o sistema sob estudo. No caso do artigo, os autores aventam
a possibilidade de prever a ocorrência de secas a partir de um estudo do comportamento das
manchas solares.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 167


O tempo
Voltando ao que falávamos no início desta aula... Nos noticiários, quando se trata de
informes meteorológicos, estamos acostumados a ouvir ou ler expressões como “frente fria”,
“massa de ar estacionada” e “massa de ar polar”, para explicar o tempo. Bom, tentaremos
descobrir o que existe por trás desses termos. Para tanto, vejamos inicialmente como o ar
se move.

Como você já sabe, o ar, quando em movimento provocado pelo aquecimento da


superfície e da atmosfera, é chamado de vento, que tem, portanto, sua origem nas variações
de temperatura e pressão atmosférica.

Explicaremos melhor essa situação analisando a figura a seguir na qual escolhemos uma
“parcela de ar” da atmosfera e acompanhamos seu movimento.

B C

A D

Figura 4 – Ar em movimento

168 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Suponhamos, inicialmente, uma situação em que apenas a parcela de ar situada no ponto
A é aquecida pelo Sol, com isso, sua temperatura aumenta em relação, por exemplo, à parcela
de ar situada no ponto B, ou seja, (TA>TB). Devido a esse aquecimento, a pressão em A diminui
(PA < PB), permitindo que ela suba em direção ao B.

Como não podem ficar espaços vazios, alguma massa de ar terá de ocupar aquele deixado
pela parcela que se moveu (A). Isso faz com que a parcela de ar do ponto D se desloque
horizontalmente indo ocupar o espaço que seria deixado em A. Ao mesmo tempo, a parcela
de ar que estava em C desce para ocupar a posição D, com isso, a parcela de ar que estava em
B se desloca para C. Esse movimento chama-se vento e o ciclo A, B, C e D chama-se célula de
circulação. Em nosso planeta, temos diversas células de circulação, algumas bastante grandes,
como as que levam o ar quente das regiões equatoriais para as polares, outras pequenas, como
as que levam o ar do mar para a praia e da praia para o mar.

Agora como você já sabe, as áreas de circulação do ar são criadas pela transferência de
calor na linha do equador e, além disso, pela rotação da Terra. As células de circulação definem
regiões restritas, específicas – como os trópicos, de clima temperado, ou as polares, de clima
frio – o que influencia o seu clima.

Podemos, então, enunciar uma lei geral que explica o movimento dos ventos: Primeira
Lei da Circulação Atmosférica – “os ventos sempre sopram das áreas de alta pressão para as
áreas de baixa pressão” (de Buys Ballot, cientista holandês, em 1800). Além disso, precisamos
considerar que a Terra gira e esse movimento de rotação afeta o dos ventos. Para entendermos
um pouco como isso ocorre, imagine um carrossel girando e uma pessoa querendo andar
em linha reta em direção ao seu centro. Ela seria desviada dessa linha reta devido à rotação,
porque, nesse caso, surge a força de Coriolis. Essa mesma força que ocorre em sistemas Coriolis
em movimento circular, como a Terra, irá fazer os ventos apresentarem, além do movimento A força de Coriolis aparece
meridional (norte-sul), o zonal (leste-oeste). Um dos resultados possíveis em que podemos como um componente
suplementar da força
visualizar a ação da força de Coriolis é a ocorrência de furacões como o mostrado na figura 5.
centrípeta, sendo sentida
por um corpo em
movimento relativo a um
referencial em rotação.

Figura 5 – Furacão Elena

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 169


A figura anterior mostra o furacão Elena que se movia com velocidades que alcançaram
177 km/h, devastando extensa região no Golfo do México em 1985. Em nosso país, em especial
no Nordeste, não ocorrem furacões.

Você sabe por que isso ocorre?

Para que ocorram fenômenos climáticos intensos, como tornados e furacões, é necessário
que surjam fortes mudanças na pressão atmosférica associadas a variações de temperatura e ao
aumento de umidade do ar. Aqui, o relevo de poucas montanhas contribui para que as variações
de pressão sejam modestas, não propiciando o surgimento desses eventos.

Frente fria
Foi o meteorologista norueguês Vilhelm Bjerknes (1882) que cunhou o nome “frente”
(inspirado em frentes de batalhas) para explicar o movimento de grande escala do ar. Ao vento
que se desloca dos pólos em direção ao equador, ele chamou de frente fria e, como uma
“frente de batalha”, ela pode colidir com uma frente de ar quente que se desloca em direção
aos pólos. No nosso hemisfério, as frentes frias se deslocam do pólo sul para o Equador,
enquanto as massas de ar quente se deslocam do equador em direção aos pólos. Quando
ocorre de uma frente fria interagir com uma massa de ar quente, na interface entre elas ocorrem
as tempestades. Isso se dá porque o ar frio e, portanto mais denso na frente fria, força ainda
mais para cima o ar quente, criando regiões de grandes instabilidades com ventos circulando
em diversas direções

Ar mais quente
19º 22º

Ar mais frio 20º


26º
15º
22º
12º
13º
21º
14º
11º
10º 13º

Frente Fria N

Figura 6 – Uma frente fria é uma zona onde ar frio substitui ar quente. Os valores numéricos apresentados na
figura indicam a temperatura do ar.

Fonte: Frentes frias. Disponível em:


<http://www.brasgreco.com/weather/frentes/f_frias.html>. Acesso em: 15 maio 2005.

170 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Se o ar quente levantado é úmido e instável, ele condensa e forma nuvens conhecidas
como nuvens cumulus e cúmulonimbus, que são de trovoadas e estão também associadas as
bem conhecidas de nós nordestinos, pancadas de chuva e as rajadas de vento.

Tipos e características de algumas nuvens

Imagem Nome Características

Assemelham-se a um véu
transparente, que finas e
esbranquiçadas, não ocultam nem
o Sol nem a Lua. Essas nuvens
Cirrostratus
apresentam cristais de gelo e são
boas precursoras da precipitação,
indicando que isso pode ocorrer
dentro de 12 e 24 horas.

São nuvens inofensivas que se


desenvolvem durante manhãs
Cumulus
quentes do verão, atingindo um
crescimento considerável à tarde.

É um estágio mais avançado das


Cumulus. Sua base pode estar a 300
cumulonimbus
metros acima da superfície e o topo
pode atingir 12 quilômetros.

Figura 7 – Existe uma classificação para as nuvens, a qual corresponde a dez tipos. Sugerimos que você consulte
a referência a seguir, se pretende aprofundar-se nesse assunto.

Fonte: Classificação das nuvens. Disponível em: <http://www.brasgreco.com/weather/nuvens/n_tipos.html>. Acesso em: 15 maio 2005.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 171


Quando a frente fria passa e o ar volta a ficar seco, o tempo se torna bom, com o céu claro!

Também fruto de fenômenos denominados circulação global – não totalmente explicados


até agora – temos os períodos de secas que afetam a vida no Nordeste brasileiro e em outras
regiões do mundo, os quais estão, muitas vezes, associados a palavras como el niño e la niña,
bastante comuns nos noticiários, como o que iniciou esta aula.

O El niño é um fenômeno típico do Oceano Pacífico Equatorial e se caracteriza por um


aquecimento anômalo das águas desse oceano, próximo ao Equador. O termo El niño foi cunhado
por pescadores peruanos ainda no séc. XVIII, mas somente com o desenvolvimento de técnicas
sofisticadas de sensoriamento remoto por satélites é que se pode mapeá-lo melhor. Atualmente,
sabemos que esse fenômeno, em geral, começa a se formar já no mês de maio e atinge seu
pico aproximadamente sete a oito meses depois, ou seja, por volta de dezembro, quando a
temperatura do Pacífico Equatorial pode aumentar em média 5,5oC em relação à média normal.
Isso faz com que os outros parâmetros associados à temperatura, na atmosfera, à pressão e à
umidade naquela região aumentem muito, afetando a circulação global dos ventos. Você pode
aprofundar seu conhecimento acerca desse assunto no site: http://www.cptec.inpe.br/.

Mudanças climáticas globais


Vamos começar esse tópico lembrando uns versos muito conhecidos: o dia de São José.
Para tanto, vejamos a seguinte notícia.

ANO IX – 26 DE MARÇO DE 2005 – ANGICOS/RN


MULTIDÃO Assistiu à missa após duas grandes chuvas no dia de São José
FESTA DE SÃO JOSÉ
Milhares de devotos de São José saíram às ruas na procissão e lotaram a praça da
igreja matriz para assistir missa campal
ANGICOS – O forte calor logo nas primeiras horas do dia 19, data de São José,
padroeiro do município de Angicos, anunciava que o dia seria chuvoso para fazer
valer a crendice popular de que chovendo no dia de São José é sinal de inverno.
Às 8h já se notava a presença de centenas de devotos de São José chegando à
Praça José da Penha onde se realiza a tradicional Missa do Agricultor. O sol não dava
trégua um só instante e a todo momento o olhar do agricultor estava voltado para os
celebrantes da missa e para o céu.
As preces dos devotos de São José parecem que foram ouvidas e, segundos após
terminar a celebração, próximo das 10h20, uma forte chuva começou a cair e molhar
o chão angicano mais uma vez, isso porque na véspera do dia de São José uma chuva

172 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


banhou a cidade de Angicos e várias outras da Região Central. Mesmo apesar do calor
nos últimos meses, os agricultores continuam acreditando que haverá outras boas
chuvas, conforme diz o agricultor “João de Juca”, o clima tende a mudar nos próximos
dias. Com a experiência de ter nascido e se criado no campo, “João de Juca” acredita
que haverá inverno. “Pode ser inverno passageiro ou não. Que vamos ter inverno,
disso não tenho dúvidas. Se Deus quiser”, confia o agricultor observando ainda que
as chuvas estejam acontecendo isoladas, “num canto sim, outro não”.
Fonte: JORNAL CENTRAL, v. 7, mar./, 2005. Disponível em: <www.jornalcentral.com.br>. Acesso em:12 maio 2005.

Você deve ter notado que o texto anterior apresenta critérios para a previsão de chuvas.
Esse é um assunto que já estudamos. Antes de continuar seu estudo, responda:

Atividade 5
Identifique no texto “Festa de São José” qual ou quais os critérios usados
pelo repórter para dizer se vai chover. Você concorda com esse critério?

No texto jornalístico também são apresentados critérios para prever se teremos ou


não uma boa estação chuvosa. Como você deve ter percebido, nenhum dos critérios se
baseia na ciência como vínhamos discutindo no nosso curso. Por outro lado, baseia-se na
“observação de longo prazo”, isto é, segundo o texto, tradicionalmente, quando chove no
dia de São José, se terá bom inverno. Isso não leva em conta, por exemplo, que o clima do
planeta tem, continuamente, passado por diversas e profundas alterações. Atualmente, o
clima está mudando de forma significativa. Alguns estudos prevêem que nos próximos 10
anos a temperatura média da cidade de Natal poderá aumentar cerca de 0,2oC, enquanto,
no interior do Estado, essa variação seria de 0,38oC, isso supondo as condições atuais,
ou seja, sem haver aumento do desmatamento, da poluição, da destruição dos mangues,
por exemplo. Como sabemos que isso não vai acontecer, podemos prever elevações de
temperatura muito superiores e com conseqüências muito mais graves.
Com isso, queremos dizer que a própria estação chuvosa pode ter seu início alterado
e quando há essa alteração, como já ocorreu algumas vezes, temos o fenômeno da seca
verde, o qual é caracterizado pelo atraso na chegada das chuvas ou irregularidade na sua
distribuição. Com a ocorrência desse fenômeno, o agricultor acaba tendo prejudicada sua
plantação ou, por plantar em época “errada”, ela morre, enquanto o mato começa a florescer.
A seca verde e a própria seca não são fenômenos típicos do Nordeste brasileiro, eles ocorrem
na África, na Ásia, na Austrália e na América do Norte e até em Portugal, lá na Europa.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 173


Atividade 6
Pense um pouco e responda: o que provoca as mudanças climáticas
globais?

Hoje, sabemos que existem duas fontes principais que provocam mudanças climáticas
globais. A primeira, de longo prazo, é representada pela dinâmica natural do próprio planeta,
o qual ao longo de sua história já foi tremendamente quente, já foi um mundo praticamente
tropical (na época dos dinossauros, por exemplo) e já foi um mundo gelado, durante o
período glacial. Todas essas mudanças envolveram escalas de tempo da ordem de milhares
de anos. A outra grande fonte é a atividade humana sobre o planeta. O Homem age de tal
forma que as mudanças que ele provoca em poucos dias ou anos, a natureza levaria séculos
para fazê-las. Assim, em pouco tempo, criamos ou destruímos montanhas, destruímos
florestas, alteramos cursos de rios, criamos gigantescos lagos artificiais (como aqueles
usados para as hidroelétricas) e, finalmente, jogamos na atmosfera uma tal quantidade de
gases capazes de alterar suas propriedades físicas e químicas.
Com uma ação tão intensa, não seria de se admirar que o clima de nosso planeta
sofresse mudanças significativas e cujas conseqüências fossem ainda hoje imprevisíveis e
motivo de debates entre cientistas, políticos e a sociedade.

Resumo
Nesta aula, vimos que os conceitos de clima e tempo são distintos e que o tempo
varia bastante em uma mesma região de acordo com a hora do dia e a época do
ano. Por outro lado, entendemos que o clima representa o comportamento médio
e é o parâmetro mais estável, permitindo assim, caracterizar uma dada região
geográfica. Vimos também que, fruto da inclinação do eixo da Terra, existem as
estações do ano e que a mudança de uma estação para outra é pouco notada
pelas pessoas que moram próximo ao equador geográfico.

174 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Autoavaliação
Faça uma pesquisa sobre o chamado “Protocolo de Kyoto” (consulte, por exemplo,

1 o site: www.greenpeace.org.br/clima/pdf/protocolo_kyoto.pdf) e escreva um texto


em forma de reportagem tratando desse assunto.
Protocolo de Kyoto

Em Kyoto, Japão, em
1997, foi assinado o
Protocolo de Kyoto, um
novo componente da
Compare o texto “Festa de São José” com o texto “O Sol e o clima no Nordeste”, Convenção que contém,
2 observando os pontos abaixo: pela primeira vez, um
acordo vinculante
que compromete os
c) identifique as semelhanças ou diferenças de linguagem; países do Norte a
reduzir suas emissões
de gases poluentes.
d) ambos falam de previsão de chuvas. Qual, nesse caso, é a principal diferença (GREEENPEACE, 2005)
entre eles?

Referências
CPETEC – Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos. Disponível em: <http://www.
cptec.inpe.br/>. Acesso em: 15 maio 2005.

Classificação das nuvens. Disponível em: <http://www.brasgreco.com/weather/nuvens/n_


tipos.html>. Acesso em: 15 maio 2005.

Frentes frias. Disponível em: <http://www.brasgreco.com/weather/frentes/f_frias.html>.


Acesso em: 15 maio 2005.

BONELLI, E.; MEDEIROS, R.T.; BORBA, G.L. O Sol e a seca no Nordeste. O Jornal (Afonso
Bezerra/RN), 27 de out./1997.

EMPARN – Empresa de Pesquisa Agropecuária Rio Grande do Norte. Disponível em: <www.
emparn.gov.br>. Acesso em: 20 maio 2005.

GREENPEACE. Campanha energia: protocolo de Kyoto. Disponível em: <www.greenpeace.


org.br/clima/pdf/protocolo_kyoto.pdf>. Acesso em: 15 maio 2005.

JORNAL CENTRAL, v. 7, mar./, 2005. Disponível em: <www.jornalcentral.com.br>. Acesso


em: 12 maio 2005.

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 175


Movimento anual do sol e as estações do ano. Disponível em: <http://astro.if.ufrgs.br/tempo.
mas.htm>. Acesso em: 12 maio 2005.

MIRANDA, Evaristo Eduardo. Queimadas. Disponível em: <http://www.mre.gov.br/cdbrasil/


itamaraty/web/port/meioamb/ecossist/queimada/index.htm>. Acesso em: 25 maio 2005.

The physical environment. Disponível em: <http://www.uwsp.edu/geo/faculty/ritter/glossary/


A_D/alpine_glacier.html>. Acesso em: 20 maio 2005.

Wikipedia: a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Imagem:300px-


Atacama.jpg>. Acesso em: 25 maio 2005.

SONNEMAKER, João Baptista. Meteorologia. 13.ed. São Paulo: Artes Gráficas LTDA, 1991.

Anotações

176 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade 177


Anotações

178 Aula 8 Ciências da Natureza e Realidade


O Homem – origens

Aula

9
Apresentação

A
nossa nona aula tem como título O Homem – origens. Inicialmente, estabelecemos
as condições físico-químicas necessárias à gênese da célula precussora da vida. A
seguir, a partir das teorias científicas estabelecidas, traçamos o perfil químico-biológico
da evolução da célula que deu origem à biodiversidade da Terra. Por fim, considerando as
eras geológicas e as transformações biológicas operadas, evedenciamos a evolução humana,
delineando também a árvore genealógica do homem.

A resolução de atividades e a auto-avaliação estão associadas à leitura científica da


aula ou, em alguns momentos, a trabalhos de pesquisa bibliográfica, na Internet ou ainda de
pesquisa de campo.

Objetivos
Permitir que você identifique as vias que

1 contribuíram para a origem da vida na Terra e para


a evolução humana.

Apreciar contextos temáticos e extrair destes as

2 informações necessárias à compreensão da aula.

Estabelecer as condições necessárias ao surgimento

3 da vida na Terra.

Evidenciar a importância de algumas substâncias que

4 contribuíram para a gênese da célula primordial.

Evidenciar as teorias que explicam de forma científica

5 a origem da vida e estabelecer as vias essenciais à


evolução humana.

Fornecer respostas às atividades programadas.


6

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 181


A vida

E
m uma noite de verão, de muito calor, imagine-se acampado próximo a um sítio
arqueológico a alguns quilômetros de seu município. O tempo passa, a conversa com
os amigos está animada, mas o sono chega. De repente, buscando relaxar, você deita
sobre a relva e trava contato com o céu repleto de estrelas, sendo, assim, induzido a refletir
sobre a vida. De imediato, uma questão lhe vem à mente: o que é vida? Quase que de repente
você se transfigura, busca uma resposta, mas não a encontra e se sente impotente diante
da complexidade da questão. Mesmo assim, não se entrega e, sob a luz do luar, olha para
o ambiente que o cerca e observa que tudo a sua volta constitui provas de uma Terra física,
química e biológica. As rochas, as nuvens, a água do riacho próximo ao acampamento são
provas reais da Terra física e química. Como também, os pequenos pontos luminosos que
anunciam a presença de vaga-lumes, o zumbir dos insetos, o canto da ave noturna e até mesmo
você são provas de uma Terra biológica.

Todos esses atributos são partes integrantes de um grande reator, que opera a rendimento
máximo, com um único intento: a vida. As suas fronteiras são móveis e estendem-se sobre a
atmosfera, o solo, os mares e seus abismos, os desertos, as regiões geladas e as florestas. Ele
opera em contínuo, produzindo o alimento, o ar e a água, ingredientes necessários à geração e
manutenção da vida. Não obstante a sua diversidade quanto a formas, dimensão e condições
a que está submetido, a integração das suas partes é perfeita.

Para comprovar tal integração, tomamos como exemplo a química do corpo humano.
Ela se desenvolve com base nos mesmos elementos químicos, a energia envolvida decorre
das mesmas reações e mecanismos físico-químicos de regulação semelhantes em qualquer
ser humano.

Como veremos, o corpo humano é um verdadeiro histórico da vida sobre a Terra, visto
que suas células são mantidas em um ambiente contendo alto teor de Carbono e Hidrogênio,
semelhante ao do meio que as originou. Ainda hoje, elas estão imersas em uma solução
composta por água e sais de elementos essenciais à vida, de composição semelhante à dos
oceanos primitivos.

Se a célula fosse utilizada como unidade monetária universal, erradicaríamos a pobreza


já que seríamos todos trilionários. Isso porque somos constituídos por 1 trilhão (1012) de
células animais e outros 10 trilhões (1013) de células bacterianas. Ao distribuirmos por ordem
de prioridade os vários segmentos constituintes do sistema vida, a célula ocupará lugar de
destaque. Como veremos a seguir, ela é a unidade fundamental da vida.

182 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


Origens da vida

Condições físico-químicas favoráveis à vida


Quais as condições físico-químicas reinantes sobre o planeta Terra no momento em que
a vida surgiu?

Mesmo que essas condições não tenham sido estabelecidas até a presente data, é de
extremo interesse da ciência, baseada em hipóteses formuladas a respeito das variáveis
físico-químicas que caracterizavam a biosfera primordial, determinar as condições mínimas
necessárias ao surgimento da vida sobre a Terra.

Atividade 1

Qual a estrela do sistema solar? Qual o seu tamanho, a sua massa, a sua
densidade e como ela favorece o surgimento da vida?

Na realidade, ao responder essa atividade, você estará se referindo à estrela que


possibilita através do seu dote energético as condições necessárias à vida sobre a Terra: o
Sol. Caso existisse mais de uma estrela desse porte no sistema solar, as órbitas descritas
pelos planetas seriam instáveis e a Terra seria estéril.
A massa da estrela também é de fundamental importância, visto que uma massa menor
do que a encontrada por você significaria uma luminosidade menor e, conseqüentemente,
um aporte de energia insuficiente ao surgimento e manutenção da vida sobre a Terra. Ainda
nesse contexto, uma estrela com massa maior seria também desfavorável, sobretudo, porque
teria uma duração de vida muito curta. Observamos assim que quanto maior for a massa
da estrela, menor será sua fase de estabilidade e mais rápido o seu desaparecimento. No
entanto, esse fato não impossibilita que, em torno dessa densa estrela, algum astro possa
desenvolver formas de vidas primitivas.
A composição química do Sol sofreu sensíveis mudanças quando comparada à das
estrelas mais primitivas geradas a partir do Big Bang, constituídas essencialmente pelos dois
elementos mais abundantes do universo, Hidrogênio e Hélio. O surgimento de elementos
mais pesados como Carbono, Oxigênio e Nitrogênio, essenciais à vida, é decorrência do
desenvolvimento de estrelas primitivas, dando origem às estrelas de segunda ou terceira
geração (ver Figura 1).

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 183


Figura 1 – Proporção relativa de elementos mais abundantes no Sol

Atividade 2
Forneça uma descrição qualitativa dos elementos químicos presentes no
solo da sua região.

Portanto, para a ocorrência da vida em um planeta, é imprescindível que as condições


listadas a seguir sejam atendidas:

 a dimensão de sua órbita não seja muito grande;

 a distância da estrela responsável pelo aporte de energia ao planeta esteja em acordo com
as leis da natureza, favorecendo assim as condições físico-químicas reinantes;

 por razões de estabilidade térmica, o movimento de translação do planeta em torno da


estrela deve se processar numa órbita com geometria próxima a de um círculo;

 a massa do planeta seja adequada, a fim de que a aceleração da gravidade seja capaz


de reter os elementos relativamente leves, como o carbono, o nitrogênio e o oxigênio;

 nele se origine uma atmosfera que, ao mesmo tempo, propicie os bios-processos


e, também, proteja as moléculas complexas formadas da radiação em excesso,
particularmente, dos raios ultravioletas e raios X;

184 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


 haja a presença de uma hidrosfera, já que a água é uma substância essencial às reações
pré-bióticas, e também uma molécula essencial à vida, já que o nosso organismo é
composto por aproximadamente 70% de água;

 o planeta possua uma litosfera, ou seja, uma superfície sólida, que favoreça o processo
de agregação de pequenas moléculas para formar as grandes moléculas estáveis e, então,
concentrá-las.

Atividade 3
Você é capaz de justificar cada uma das condições listadas anteriormente
e necessárias à gênese da vida em um planeta?

A célula
A gênese da vida e a sua evolução só foi possível ocorrer após a Terra alcançar a sua
estabilidade físico-química. Antes dessa fase, nosso planeta era totalmente estéril. Daí,
a necessidade de relembrarmos algumas noções básicas associadas à vida, tal como a
conhecemos na atualidade.

Muitos seres vivos são unicelulares e se constituem de uma única célula. Já nós, seres
humanos, apresentamos um número elevado de células, o que nos faz pluricelulares. Por isso,
a célula, unidade vital, difere em forma e tamanho. O ovo de avestruz, a maior célula conhecida,
é dimensionalmente superior a muitos animais, enquanto a menor, a de certas bactérias, mal
pode ser visualizada pelos modernos microscópios eletrônicos, uma vez que seu tamanho é da
ordem de grandeza de 1,0 x 10-6 a 1,0 x 10-4 metros. Cada uma das células do corpo humano
atua como uma indústria química na qual as máquinas e reatores possuem vida e são ajustados
para produzirem um rendimento máximo, tendo como funções:

 fornecer uma estrutura que suporte as reações químicas complexas decorrentes da


absorção alimentar e necessárias à manutenção da vida;

 após as reações, descartar os dejetos;

 produzir cópias exatas de si mesma, de modo que o organismo possa continuar a viver
mesmo depois das células-mãe terem morrido.

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 185


Atividade 4
Você é capaz de comprovar a afirmação de que o homem possui algo em
torno de 10 trilhões de células, sabendo que a célula humana possui o tamanho
de 2,0 x 10-5 m? Vamos tentar?

Como a indústria química moderna, cada uma das células é subdividida em vários
compartimentos por membranas. Possui ainda uma central de energia que funciona a partir
da luz solar ou da ingestão de alimentos e um centro de controle (núcleo). A central, destinada
a fornecer energia ao sistema; e o núcleo, a fornecer informações a máquinas e reatores
para que estes operem as transformações necessárias. Na linha de produção, algumas
máquinas são responsáveis pelo transporte dos reagentes. Os reatores, organelos (ou
organitos ou organóides) operam as transformações químicas propriamente ditas, enquanto
outras máquinas, as vesículas de transporte, são responsáveis pelo acondicionamento dos
produtos finais e pelos descartes de produtos secundários ao processo. Como vemos,
a célula funciona como uma verdadeira fábrica química e será estudada em detalhes na
disciplina Química da Vida.

ORGÂNULOS

8. Retículo
1. Nucléolo
Endoplasmático Liso

2. Núcleo celular 9. Mitocôndrias

3. Ribossomos 10. Vacúolo

4. Vesículas 11. Citoplasma

5. Ergastoplasma ou Retículo
12. Lisossomas
endoplasmático rugoso (RER)

6. Complexo de Golgi 13. Centríolos

7. Microtúbulos

Figura 2 – Estrutura da Célula

186 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


O Homem busca explicar
a origem da vida
A palavra origem, marco espacial ou temporal que indica o surgimento de algo, tem sido
motivo de preocupação no decorrer da história da humanidade, sobretudo quando esse algo
tem a amplitude da Terra, da vida ou das espécies, dentre as quais destaca-se o homem.

Várias tentativas de explicar a origem da vida têm sido empreendidas pelo homem desde
épocas remotas. As primeiras propostas surgiram na Grécia Antiga e até a presente data servem
de motivação ao homem moderno na tentativa de elucidar e explicar o enigma da vida. Algumas
delas são descritas a seguir.

 A Teoria do Criacionismo admite que o universo e a vida em suas origens foram moldados
a partir da intervenção de um ser primordial ou matéria primordial.

 A Teoria Teológica Judaico-Cristã baseia-se no livro do Gênesis e evidencia ser a partir


da palavra que se dá a criação. Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e
vazia, as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Então,
Deus disse: Faça-se a Luz! E a luz foi feita.

 A Teoria da Geração Espontânea (ou abiogênese), cujos traços são encontrados em


escritos das civilizações chinesa, indiana e egípcia, mas tendo Aristóteles (384 a 322
a.C.) como grande mentor da tese: as plantas, os insetos, os animais podem nascer
de sistemas vivos parecidos, mas também da matéria em decomposição ativada pelo
calor do sol.

Foram defensores da Teoria da Geração Espontânea pensadores como Roger Bacon,


Descartes e Isaac Newton.

Em 1768, Lazzaro Spallanzani (1729 – 1799), experimentalmente, constatou que em um


sistema esterilizado não ocorre a geração espontânea da vida. Um século depois, em 1860,
o cientista francês, Louis Pasteur (1822 – 1895), encerra o debate, ao demonstrar que em
ambiente devidamente esterilizado a vida não pode se originar espontaneamente da matéria
inanimada.

 Teoria Cosmozóica (ou Panspermia), fundamentada por um grupo de cientistas


alemães, dentre os quais Liebing, Richter e Helmholtz, que em 1865 busca explicar
o aparecimento da vida na Terra como resultado da queda de meteoros impregnados
com microrganismos resistentes provindos de algum ponto do Universo. Essa idéia
foi retomada de forma mais elaborada pelo químico sueco Svante Arrhenius, Prêmio
Nobel de Química de 1903. Na sua nova concepção, ela considera a vida como uma
característica fundamental do Universo semelhante à matéria e à energia e atribui o seu

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 187


desenvolvimento a microrganismos de origem extraterrestre. Arrhenius também nomeou
essa teoria de Panspermia, vocábulo grego que significa pan, total, e sperma, semente.

 A Evolução Química, desenvolvida pelos bioquímicos Alexander Ivanovitch Oparin (1894


– 1980), de origem russa, e John Haldane (1892 –1964), de origem inglesa. Visando
compreender a tese defendida por esses dois cientistas, vamos entrar na máquina do
tempo e regredir ao período de 4,5 éons a.C. (1 éon = 1 x 109 anos), período de formação
da Terra, momento a partir do qual se estabelece uma relação existencial entre a Terra
e o Sol, comparada por eles a uma reação química. Com efeito, para que isso ocorra,
torna-se indispensável a presença de três componentes básicos, sendo:

• os reativos, na atmosfera primordial, a água no estado de vapor (H2O) e os gases


nitrogênio (N2), dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), hidrogênio (H2), amônia (NH3),
sulfeto de hidrogênio (H2S);

• a própria atmosfera, se comportando como um reator esférico, homogêneo e ajustado


para operar com rendimento máximo;

• e por fim, uma fonte de energia (por exemplo: energia térmica, o sol).

As moléculas simples, geradas em meio aquoso, deram origem a uma sopa primitiva,
a partir da qual moléculas orgânicas complexas como, aminoácidos, açúcares e bases
nitrogenadas, evoluíram. Você estudará essas moléculas na disciplina Química da Vida.

Em 1953, Stanley Miller e Harold Urey demonstram experimentalmente que as reações


químicas simples podem ser a origem de diversos precursores de biomoléculas. Para isso,
eles idealizaram o reator exibido na Figura 3.

Figura 3 – Experimento de Miller e Urey

Ao balão de 500 ml, Miller adicionou um pouco de água e com o auxílio de uma bomba
de vácuo extraiu o ar residual. Adicionou ao balão de 5,0 litros uma mistura dos gases Metano

188 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


(CH4), Amônia (NH3), Monóxido de Carbono (CO), Dióxido de Carbono (CO2) e Hidrogênio
(H2), gases estes presentes na atmosfera primordial. Aqueceu a água contida no balão de 500
ml até o seu ponto de ebulição e, com a ajuda de uma fonte de alta tensão, produziu a partir
dos eletrodos de Tungstênio (W) uma faísca de 60.000 volts. Miller deixou o reator operar
em contínuo durante uma semana, observando que a água que circulava no aparelho, com o
passar do tempo, adquiria um tom avermelhado. A partir da análise de uma amostra da água,
comprovou a presença de alguns aminoácidos, produtos da reação envolvendo os gases
reagentes.Portanto, a partir do experimento desenvolvido, Miller e Urey concluíram que se a
atmosfera da Terra fosse semelhante à mistura gasosa presente no seu reator, aminoácidos
precursores das proteínas seriam formados espontaneamente. Assim, substâncias como as que
compõem os seres vivos atuais podem ter sido geradas a partir das condições físico-químicas
reinantes no ambiente primitivo. Esse foi o primeiro experimento realizado cientificamente, o
qual tenta explicar a origem da vida em nosso planeta.

Experimentos posteriores, bem mais elaborados, usando outras combinações de


gases ou radiações ultravioletas, produziram aminoácidos, açúcares e outras moléculas
essenciais à vida.

Todavia, em laboratório, ainda não foi possível produzir um sistema capaz de cumprir
cada uma das etapas mecanísticas necessárias a dar origem à vida. Sobretudo, porque,
diferentemente da Terra primitiva, os cientistas, além de desenvolverem as reações fazendo
uso de soluções diluídas, trabalham com uma escala de tempo de apenas algumas semanas.
Enquanto, na Terra primitiva, todo o oceano líquido, ainda pouco profundo, esteve exposto à
radiação solar por bilhões de anos.

De uma coisa, porém, devemos estar certos. A vida não resulta de um milagre, mas de
uma combinação de moléculas simples em condições físico-químicas favoráveis, capaz de
evoluírem para moléculas mais complexas, estas sim, suas precursoras.

O Homem busca definir e


explicar a evolução da vida
Definir a vida não é tarefa simples. Em grande parte dos dicionários, o que encontramos
na realidade é uma tautologia (repetição inútil de uma mesma idéia escrita de forma diferente)
do tipo: a vida é o fato de viver ou de estar vivendo. Entretanto, em alguns dicionários mais
tradicionais encontramos algumas definições úteis. Por exemplo:

Webster’s (1828): Em geral, estado de animais e plantas, ou de seres organizados, no


qual suas funções naturais e movimentos são executados, ou no qual seus órgãos são
capazes de executar suas funções.
(MERRIAN-WEBSTERS, 2005)

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 189


Mesmo com as múltiplas definições existentes, a vida onipresente ao nosso redor,
cientificamente, permanece indefinida.

Na Antigüidade, os filósofos gregos acreditavam que a natureza em sua integridade era


viva e o físico era aquele que se dedicava ao seu estudo. Com a divisão da matéria em animada
(orgânica) e inanimada (inorgânica), os físicos assumem a descrição da matéria inanimada, os
químicos estudam ambos os domínios e os biólogos se ocupam da descrição da matéria animada.
Os físicos acreditam que os biólogos sabem definir o que é vida, já que esta é sua atribuição. Por
sua vez, os biólogos delegam essa tarefa aos químicos, visto que eles manipulam a transformação
da matéria inorgânica em orgânica. No entanto, questões como:

 onde e quando a vida começou?


 quais as condições ambientes no momento em que a vida começou?
 como a vida evoluiu?
 o que é a vida?
Essas questões ainda são incógnitas para a ciência.

Não obstante, nomeamos de ser vivo todo o ser que para o exercício da vida, além de
apresentar uma constituição celular, sinta a necessidade de

 energia: para desenvolver o seu metabolismo;


 respirar: todos os seres vivos permutam gases com a atmosfera;
 crescer: todos os seres vivos possuem um período de crescimento antes de alcançarem
a maturidade sexual;
 reproduzir-se: todo o ser vivo se reproduz, condição essencial à preservação da espécie;
 morrer: todo ser vivo, um certo dia, cessa de viver.
Ainda, para o exercício dinâmico das suas funções, seja capaz de se:
 movimentar;
 irritar: todo ser vivo apresenta reações rápidas frente a diferentes estímulos;
 adaptar: todo ser vivo é passível de mudança de forma ou comportamento ao longo de
sua vida.

Atividade 5
Mesmo sabendo que a ciência ainda não encontrou elementos para definir
a vida, qual a sua opinião a respeito dela?

190 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


A Teoria da Evolução, como qualquer outra teoria, pode ser testada. Por isso, está sujeita
a alterações decorrentes de novas comprovações científicas. Seu princípio fundamental é:
todas as formas de vida evoluem por seleção natural.
Grande parte dos cientistas concorda com relação a um aspecto dessa teoria, aquele
que prega que a vida decorre de um processo em duas etapas: a primeira, a evolução
química, e a segunda, a evolução biológica. No entanto, o problema maior reside em explicar
a que momento e como se deu a síntese das moléculas do Ácido Ribonucléico (RNA) e
das moléculas do Ácido Desoxirribonucléico (DNA), estas precursoras das primeiras. Temos
certeza de que, quanto aos supostos requisitos para o desenvolvimento da evolução química,
você já sabe como delineá-los. Vamos tentar!

Atividade 6
Descreva os requisitos necessários ao desenvolvimento da evolução
química da vida.

Por outro lado, a evolução biológica se deu através de uma sucessão de eventos como
a geração de diferentes aminoácidos e açúcares a partir das condições físico-químicas
do ambiente, somadas à presença de algumas moléculas simples de gases constituintes
da atmosfera terciária. Os aminoácidos assim formados se combinaram, originando as
proteínas primitivas. Estas, envoltas por moléculas de lipídios, evoluíram quimicamente para
macromoléculas, protegidas das intempéries do ambiente por uma película que, no decorrer
do tempo, adquiriu a textura da membrana celular.

Uma outra teoria explica a formação da célula levando em consideração o fato das
moléculas de lipídios (gorduras), formadas nos oceanos primitivos a partir de processos
semelhantes ao desenvolvido por Miller e Urey em laboratório, se fundirem para gerar pequenas
bolhas. No interior destas, os aminoácidos formados evoluíram quimicamente, originando as
cadeias de proteínas e os açúcares semelhantes às do RNA e DNA (Figura 4).

Figura 4 – Ácidos: Ribonucléico (RNA) e Desoxirribonucléico (DNA)

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 191


Uma outra hipótese levantada a respeito da formação do DNA foi descrita no livro Vital
dust (Poeiras da vida) pelo Dr. Christian de Duve, laureado com o Prêmio Nobel de Medicina
em 1974. Segundo De Duve, há 4 bilhões de anos em nosso planeta,

Trazidos pela chuva de cometas e meteoritos, os produtos dessas misturas químicas


progressivamente formaram uma camada orgânica em torno da superfície sem vida do
recém-condensado planeta. Tudo ficou coberto por uma película rica em carbono, exposta
aos impactos da queda de corpos celestes, aos choques de terremotos, aos gases e fogos
de erupções vulcânicas, às incertezas do clima e a banhos diários de radiação ultravioleta.
Rios e riachos conduziram esses materiais até o mar, onde se acumularam até que os
oceanos primitivos atingissem a consistência de uma sopa diluída quente. Em lagos e
lagoas internos em rápida evaporação, a sopa adquiriu a espessura de um purê nutritivo.
Em algumas áreas, infiltrou-se nas profundezas da Terra, jorrando violentamente de volta
como gêiseres cheios de vapor e de jatos de água subterrânea fervente. Todas essas
exposições e agitações induziram muitas modificações e interações químicas entre os
componentes originais caídos dos céus.
(WARD; BROWNLEE, 2001)
Assim, De Duve surgere a hipótese de ocorrência de uma síntese, a princípio abiótica
(sem vida) gerando as moléculas químicas necessárias a uma síntese biótica (relativa à vida),
caracterizada pela série de eventos seguintes: os aminoácidos formados no espaço e na Terra
combinaram-se para produzir as proteínas primordiais, com estas se unindo para originar a
vida primitiva.

A primeira célula viva gerada por uma das hipóteses formuladas levou centenas de
milhões de anos para se consolidar. Além de estar isenta de toda e qualquer ameaça de
destruição, ela era exclusiva. Porém, passada essa fase, as suas descendentes povoaram em
um curto espaço de tempo os mares e consumiram grande parte da matéria orgânica da qual
se originaram, reduzindo a possibilidade de surgir um outro tipo de célula espontaneamente.
Ela é, na realidade, a grande responsável por toda a diversidade de vida na Terra: vegetais,
amebas, bactérias e o homem, decorrente do processo de seleção natural.

Charles Darwin (1809–1882), naturalista inglês, ao viajar ao redor do mundo estudando


plantas e animais, observou que:

 as espécies apresentam distinções entre seus constituintes, ou seja, elas apresentam


características que variam de indivíduo para indivíduo;

 diversas características são hereditárias: familiares altos têm descendentes altos;

 a variação e a hereditariedade dos caracteres influenciam a sobrevivência e o crescimento


em ambiente natural selvagem, a seleção natural.

192 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 7
Tomando você como referência, pesquise entre seus familiares algumas
das características que comprovem a primeira observação feita por Darwin.

Com isso, Darwin quis dizer que a vida é uma verdadeira competição por recursos
existentes, porém escassos. Para sobreviver, o indivíduo, além de vencer a competição, deve
resistir às intempéries da natureza. Por exemplo: a seca.

As críticas feitas ao trabalho de Darwin são motivadas porque ele não explica as razões
pelas quais os filhos não são idênticos aos pais, fato que os geneticistas só aprenderam a
justificar quando aconteceu a descoberta e a elucidação da estrutura do DNA. Sabe-se hoje que
as diferenças existentes originam-se de pequenos erros ocorridos no momento da duplicação
do DNA.

A evolução do ser humano


Vamos falar agora da evolução do homem. Nada melhor do que começarmos um novo
tema formulando uma questão para testar o seu nível de conhecimento.

Atividade 8
De acordo com a Teoria da Evolução de Darwin, qual a origem do homem?

Já vimos que alguns dos elementos químicos constituintes do universo, além de


comporem os seres vivos, também são fundamentais à vida. A cronologia nos informa que,
entre 3,5 e 4 bilhões de anos, esses elementos encontraram na Terra um ambiente favorável
ao desenvolvimento da vida. Com o surgimento da célula, primeiro organismo vivo, a vida
evoluiu originando milhares de espécies. A princípio, o desenvolvimento se deu na água e
depois na terra (ver Figura 5).

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 193


Figura 5 – O desenvolvimento da vida

Para se ter uma idéia a respeito da diversidade animal gerada por esse ato primordial,
basta empreendermos o senso da natureza a partir do qual contabilizamos a existência de
mais de:

 9.000 espécies de pássaros;

 350.000 espécies de vegetais, com aproximadamente 250.000 destas sendo flores;

 8.400 espécies de peixes de água doce e 13.300 peixes de água salgada, alguns dos quais
com até 18 metros de comprimento. Esses números não computam os invertebrados
(seres sem coluna vertebral) e as espécies ainda não conhecidas.

Além disso, o mais perfeito dos computadores, o cérebro humano, contém


aproximadamente 10 bilhões de neurônios, cada um desses possuindo 1000 sinapses (pontos
de contatos entre duas células nervosas).

Para que você compreenda o significado dessa última afirmação, relataremos o que se
passa com o cérebro de uma criança recém-nascida.

Uma criança nasce com cerca de aproximadamente 100 bilhões de células cerebrais,
chamadas neurônios, conhecidas por armazenar e transmitir informações. Ao nascer, a
maior parte delas não está conectada à rede nervosa, mas não tarda, após o nascimento
a se lançarem em um turbilhão de atividades e a se reunirem para formar os circuitos
neuronais. São estas conexões que permitem a criança ver, escutar, sentir, caminhar,
falar, pensar, entre outras ações.
(CCCF/CICH, 2001)

O homem, durante muito tempo, aceitou a idéia de ser parte integrante de um mundo
estacionário, material e temporalmente. A resposta dada a qualquer questionamento feito a
respeito da origem do mundo e da vida tinha como fonte de pesquisa os textos religiosos. Os
sábios, até o final do século XIII, pensavam que a aparição do homem sobre a Terra tinha uma
data (ano 3761 a.C.): a criação do mundo de acordo com o Velho Testamento.

194 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


Somente a partir do século XIX, com as descobertas promovidas pela ciência moderna
a respeito da origem da nossa espécie, o homem penetrou no mundo mutável e em pérpetua
evolução. Os físicos teóricos e naturalistas formularam novas hipóteses a respeito da origem
da vida, inclusive da vida extraterrestre e vasculharam o espaço a procura de novos astros
presentes no sistema solar. Os paleontólogos retrocederam no tempo ao habitat Pré-Histórico
na busca de conhecer melhor os animais, suas origens, seus modos de vida e, também,
justificar os seus desaparecimentos. Os antropólogos viajaram no tempo até as eras geológicas
remotas para compreender melhor os seres que nos deram origem, seus hábitos, culturas
e sociedades. Por fim, os químicos que, nas transmutações alquímicas, anteviram um novo
campo de estudo, a nucleônica, hoje física nuclear, sistematizando as técnicas de datação e,
assim, permitindo ao homem penetrar nas eras geológicas, coletar material e prever com certa
margem de segurança a sua idade. Toda essa efervescência científica, catalisada pela literatura
futurista da época, foi promovida por autores como: Júlio Verne, Paul d’Ivoi, Albert Robida,
Edgar Allan Poe, Sir Arthur Conan Doyle, entre outros.

Com a evolução da ciência, muitas teorias em relação à origem do homem foram


propostas. Entretanto, nenhuma delas levantava dúvidas a respeito do homem ser um animal
e que, portanto, com a necessidade de compartilhar das faculdades de mover-se, de comer,
de dormir, de crescer e de reproduzir-se. Tais faculdades, agregadas às características físicas,
permitiram situar o homem numa das subdivisões do reino animal: classe dos vertebrados
conhecida como mamíferos.

Os mamíferos são animais de sangue quente e caracterizam-se pelos seus métodos de


parição, pela faculdade de amamentar seus filhos, por possuir pêlos e duas filas de dentes
na boca. No entanto, o homem é melhor caracterizado se incluso numa ordem de mamíferos
chamada Primatas, grupo que inclui animais como musaranhos arborícolas, os lêmures, os
pongídeos (macacos antropóides) e os símios em geral.

Os primatas, ou seja, os primeiros em posição ou ordem, apresentam as seguintes


características:

 vivem ou viveram no período primitivo em árvores;

 apresentam mobilidade dos dedos, capacidade preênsil nas mãos e cinco dedos nos pés;

 unhas planas e almofadas táteis extremamente sensíveis;

 fácil mobilidade nas árvores, tendo em vista a sua facilidade de agarrar-se nos galhos;

 aumento de crânio com córtex enrugado;

 redução de face, declínio do olfato e visão binocular;

 clavícula robusta, cintura pélvica e braços longos;

 menstruação e um filho por gestação.

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 195


Atividade 9
Com base na descrição acima, você é capaz de esboçar o desenho de um
primata?

Atividade 10
Você já tem conhecimento suficiente para definir o homem. Vamos tentar?

O conhecimento do ser humano exige um estudo das diferentes fases pelas quais a
humanidade passou, desde a sua fase mais primitiva, Hominídea, até a fase presente, a do
homem atual. Para isso, precisamos responder à pergunta: onde e quando surgiu o homem?
Os antropólogos e paleontólogos modernos, consensualmente, admitem que o berço da
humanidade é a África. A descoberta de fósseis humanos no vale da garganta de Olduvai, no
Quênia (Tanzânia), na África Oriental, reforça ainda mais essa idéia.

Agora, visando empreendermos uma incursão à Pré-História, em uma primeira etapa,


vamos conhecer as eras geológicas (Gráfico 1, no final da aula).

A segunda etapa diz respeito ao momento em que se dá a divisão entre a História e a


Pré-História. A escrita, surgida há 3.500 anos a.C., é tida como a interface que separa esses
dois momentos distintos da evolução humana:

 o Paleolítico, do grego paleos, antigo, e lithos, pedra: primeiro período da era quaternária,
durante a qual apareceram os primeiros homens a trabalhar a pedra;

 o Neolítico, do grego neo, novo, e lithos, pedra: fase do desenvolvimento da humanidade,


caracterizada pela utilização da técnica da pedra polida e por profundas transformações
econômicas nas sociedades (agricultura, criações de animais, novas indústrias), que
antecedeu a Idade dos Metais.

196 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


A árvore genealógica humana
Toda família tem a sua árvore genealógica e, quanto mais antiga for, mais extensa se torna
Taxonomia
a árvore. No caso da hominização, processo de evolução física e intelectual do homem, desde
a sua origem primata até o estágio de desenvolvimento atual, a construção é delineada pelo Refere-se à classificação
das coisas e a seus
genealogista e seus traços são apresentados no Quadro 1 e na Figura 6. A distribuição obtida
princípios subjacentes.
resulta de pesquisas desenvolvidas por antropólogos. Quase tudo – objetos
animados, inanimados,
Quadro 1 – O Processo de Hominização lugares e eventos – pode
ser classificado de acordo
GRUPOS STRUTURAIS GRUPOS TAXONÔMICOS CARACTERÍSTICAS ANATÔMICAS com algum esquema
Homem moderno Homo Sapiens Sapiens taxonômico.

Dentes e maxilares modernos; presença


de queixo. Cérebros grandes (variação de
1.000 a 2.000 cm3 com média e 1.300 cm3).
Bipedalismo. Agarramento de força e de
precisão. (Instrumentos de pedra, de osso e,
mais tarde, de metal; uso do fogo)

Homo sapiens neanderthalensis

Dentes menos modernos; ausência de queixo.


Cérebros grandes (variação de 1.200 a 1.600
(homem sábio) cm3). Bipedalismo razoável. Agarramento de
força; talvez também agarramento de precisão.
(Somente instrumentos de pedra; uso do fogo).

Fase humana Homo erectus


Dentes maiores, menos evoluídos; ausência de
queixo. Cérebros menores (variação de 550 a
(homem de pé) 1.200 cm3). Provavelmente, bom bipedalismo.
Desconhece-se o seu tipo de agarramento.
(Instrumentos rústicos de pedra; uso do fogo).
Fase humana primitiva Homo habilis

Dentes maiores, menos evoluídos; ausência de


queixo. Cérebros pequenos (aproximadamente
(homem hábil) 670 cm3). Bipedalismo avançado. Agarramento
de força. (Primitivos fazedores de instrumentos
de pedra).

Fase pré-humana Australopithecus africanus

Dentição hominídea. Cérebro muito pequeno


(500 cm3). Bipedalismo primitivo. Agarramento
(austral, sul; pithecus,
de tipo desconhecido. (Usuários de ferramentas;
macaco)
possivelmente, primitivos fazedores de
instrumentos).
Ramapithecus
Punjabicus
Hominídeos primitivos
Kenyapithecus africanus
Kenyapithecus africanus (?)
Características dentárias hominídeas.

Fonte: Extraído de One life. Disponível em: <www.onelife.com/envolve/manev.html>,

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 197


Figura 6 – Árvore Genealógica do Homem

Atividade 11
Construir a árvore genealógica da sua família.

198 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


A classificação do
Homem Moderno
O mundo é constituído por uma variedade muito grande de organismos. Para se estudar
e compreender tamanha diversidade animal, foi necessário o estabelecimento de critérios que
propiciassem uma classificação objetiva, simples e compreensível dos seres vivos. Aristóteles
(século IV a.C.) foi um dos primeiros naturalistas a se preocupar com a classificação dos
animais, sendo na sua época conhecidas cerca de 1000 espécies, das quais 450 eram animais.

O grande idealizador de critérios na área de classificação de seres foi o naturalista sueco


Carl Lineu (1707–1778). O antropólogo Loren Eiseley (BRODY, 2000, p. 227) descreve o amor
de Lineu pela diversidade de vida como “uma fome poética da mente por experimentar cada
folha, flor e pássaro [...] Ele foi o gênio nomeador por excelência [...]”. Em 1735, ao publicar
Systeme Naturae, Lineu criou um método claro e eficiente de nomear todos os animais e
plantas. Aperfeiçoado pela biologia moderna, esse método envolve os sete níveis de todos os
seres vivos, a começar pelo maior e mais geral. Aqui apresentamos a classificação do homem
moderno (Quadro 2):

Quadro 2 – Classificação do Homem Moderno

Reino Animália (Animal)

Filo Vertebrata (vertebrados)

Classe Mammalia (Mamíferos)

Ordem Primate (primatas)

Superfamília Hominoidea (hominóides)

Família Hominidae (hominídeos)

Subfamília Homininae (homininieo)

Gênero Homo (homem)

Espécie Sapiens (Homem Moderno)

Fonte: LEWIN, R. Evolução humana. São Paulo: Atheneu, 1999. p. 96

A sistemática de classificação de Lineu será estudada de forma mais detalhada no


terceiro semestre, através da disciplina Fauna, Flora e Ambiente, a partir da qual você tomará
conhecimento da diversidade animal e vegetal que povoa a Terra.

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 199


Resumo
Nesta aula, tratamos a respeito do homem e da sua origem. Para isso, estudamos
as condições físico-químicas necessárias à manutenção da estabilidade do planeta
e que concorreram para o surgimento dos seres vivos. No contexto explorado, a
célula é definida como sendo a estrutura fundamental da vida. De onde ela surgiu e
como surgiu são questões ainda em estudo e campo fértil para o desenvolvimento
da pesquisa científica, já que, levando em consideração o número de variáveis
envolvidas, algumas das respostas são empíricas, advindas da ciência, enquanto
outras são frutos da imaginação humana. Por sua vez, o homem, oriundo da
célula fundamental aperfeiçoada pela própria natureza, evoluiu assumindo ares de
Homo Sapiens e graças a sua curiosidade fez da ciência a sua obra mais marcante.

Autoavaliação
O que é um sítio arqueológico? Na sua região existe algum? Caso a sua resposta
1 seja afirmativa, faça uma breve descrição do sítio.

2 Qual o papel desempenhado pela principal estrela do sistema solar na origem da vida?

3 Qual a sua opinião a respeito das teorias que buscam explicar a origem da vida?

4 Por que a escrita é tida como a interface que separa o período paleolítico do neolítico?

5 Caracterize as principais espécies que constituem a flora e a fauna da sua região.

200 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


Referências
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BRODY, D. E.; BRODY, A. R. As sete maiores descobertas científicas da História. São Paulo:
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HAZEN, R. M.; TREFIL, J. A grande aventura da ciência. Portugal: Fórum da Ciência, 1991.

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LEWIN, R. Evolução humana. São Paulo: Atheneu Editora, 1999.

LOVELOCK, J. As eras de Gaia. Rio de Janeiro: Campus, 1991.

LYNN MARGULIS, L.; SAGAN, D. Microcosmos. São Paulo: Cultrix, 2002.

MARCONI, M. A.; PRESOTTO, Z. M. N. Antropologia: uma introdução. 3.ed. São Paulo:


Atlas, 1992.

MERRIAN – WEBSTER on line. Disponível em: <http://www.m-w.com/>. Acesso em:


10 fev. 2005.

ONE LIFE. Disponível em: <http://www.onelife.com/envolve/manev.html>. Acesso em: 05


fev. 2005

SAHTOURIS, E. A dança da Terra. Rio de Janeiro: Rosas do Tempo, 1996.

SUSSMAN, A. Guia para o planeta Terra. São Paulo: Cultrix, 2000.

TEIXEIRA, W. et al. Decifrando a Terra. São Paulo: Oficina de Textos, 2003.

TERZIAN, Y.; BILSON, E. O Universo de Carl Sagan. Brasília: UnB, 2001.

ULLMANN, R. A. O homem e a cultura. Petrópolis: Vozes, 1991.

WARD, P. D.; BROWNLEE, D. Sós no universo. Rio de Janeiro: Campus, 2001.

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 201


Gráfico 1

202 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade 203


Anotações

204 Aula 9 Ciências da Natureza e Realidade


A Hipótese Gaia

Aula

10
Apresentação

N
esta aula, você verá como houve uma modificação, ao longo dos séculos, na maneira
de entender o mundo. Se no início predominavam visões fantásticas e mitológicas da
Terra e do universo e depois passamos para uma descrição de um mundo subordinado
aos nossos desejos e do qual éramos donos, hoje, entendemos nosso planeta como um sistema
dinâmico e integrado, com capacidade de responder a modificações em suas partes. Essa
abordagem retoma uma discussão holística conhecida como Hipótese Gaia, muito parecida em
sua abordagem com a do índio Seatle, cuja carta nós já discutimos. As implicações desse novo
olhar é um assunto muito interessante que faz parte da história da ciência e do pensamento
do homem.

Objetivos
Após estudar esta aula, você deverá ser capaz de:

delinear as diferentes formas com que o homem, através


1 da história, tenta entender nosso planeta;

compreender a hipótese Gaia como uma teoria em que a


2 Terra é um sistema vivo e dinâmico.

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 207


Visões de mundo

A
maneira como nós, os seres humanos, entendemos o mundo tem mudado incrivelmente
através dos tempos. O homem primitivo tinha uma visão limitada de tudo. Seu universo
resumia-se às imediações de onde habitava. Com pouco conhecimento sobre os seres
vivos e o meio ambiente que lhe cercava, tinha uma descrição mágica e mítica, como você viu
em nossa primeira aula.

No entanto, nossa espécie sempre se destacou por possuir uma grande curiosidade,
capacidade de experimentação e aprendizado. Quando analisamos as inscrições rupestres,
percebemos um acurado modo de observação e registro da realidade pelos nossos ancestrais,
sendo esse processo o início do acúmulo de conhecimentos sobre o mundo em que vivemos.

Figura 1 – Pintura rupestre encontrada em uma caverna na França, mostrando cena de animais em movimento.
Tais pinturas foram produzidas por nossos ancestais que ali habitaram há milhares de anos, durante
o período Paleolítico.

Fonte: FRANÇA. Ministère de la Cultere et de la Comunication. La grotte de lascaux. Disponível em: <http://www.culture.gouv.fr/culture/arcnat/lascaux/en/>.
Acesso em: 10 maio 2005.

208 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 1
Faça um desenho simples da Terra, do sistema solar e de uma pessoa
situada no nordeste brasileiro, de uma no pólo norte e de outra no pólo sul.

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 209


Com o transcorrer da história, o homem foi formulando prováveis descrições de como o
mundo é e de como funciona. Durante a Antigüidade Clássica, cerca de 1000-500 a.C., nossa
visão de mundo era muito diferente da atual. Imaginava-se que nosso planeta fosse plano!
O pensador grego Anaximandro (c. 610-545 a.C.), considerado o pai da astronomia grega,
achava que sobre a terra, que era um cilindro plano, havia um vento que trazia o calor do fogo
existente no céu. Por outro lado, acertadamente, ele achava que a vida tinha se iniciado no
meio aquático e que o homem descendia de animais de outras espécies.

Posteriormente, Heráclito de Éfeso (c. 510-450 a.C.) formulou o que poderíamos


considerar as bases do evolucionismo ao afirmar que a única coisa constante na vida é a
mudança. No entanto, sua visão de mundo ainda deixava a desejar, coincidindo com a de uma
terra plana. Empédocles (c. 492-430 a.C.) imaginava o mundo como duas esferas: uma interna,
que fazia com que existisse o dia e a noite, e outra externa, onde estavam contidos os astros
que se via no céu. (A Figura 2 mostra como Empédocles imaginava o mundo).

Anaxímenes (c. 525 a.C.) afirmou que a Terra flutuava no ar e que o Sol se escondia
atrás de partes altas da terra, tal como atrás de grandes montanhas. Por isso, tínhamos uma
variação de dia e noite. Uma representação dessa idéia está mostrada na Figura 3.

Figura 2 – As esferas de Empédocles.

Fonte: Empedocles double sphere system: day and night. Disponível em: <http://
www.perseus.tufts.edu/GreekScience/Students/Ellen/Empedocles.jpg>.

Acesso em: 10 maio 2005.

210 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Figura 3 – O mundo flutuante no ar de Anaxímines.

Fonte: Anaximines: the earth floots on air. Disponível em: <http://www.filosofos.net/temas/tema_47/t_47_4_clip_image008_0000.jpg>.


Acesso em: 10 maio 2005.

Aristóteles (384-322 a.C.), um dos maiores gênios que já existiu, imaginava que o
mundo era constituído, na verdade, por três mundos:
 o terrestre (formado pelos quatro elementos: água, terra, fogo e ar);

 o lunar (os astros vistos no céu);

 o celestial ou supra-lunar (divino).

E a sua “física” vai explicar os fenômenos naturais levando em conta esses três mundos,
cada um com suas próprias leis naturais. Por exemplo, ele dizia que o fogo tinha sua chama
sempre subindo porque seu estado natural era o espaço. Uma pedra caía pelo simples fato de
que era esse seu estado natural e, por isso, quanto maior sua massa, maior sua tendência a
permanecer nesse estado. Em conseqüência, ele acreditava que uma pedra mais pesada caía
mais rápido do que uma mais leve (esse engano passou quatrocentos anos para ser corrigido,
e o foi por Galileu).

Mesmo durante a Idade Média, ainda pensava-se que existia o mundo dos mortos abaixo
de nós, o Hades; o Paraíso ou Éden, acima, residência dos deuses e eleitos; e que a terra era
plana e cercada por águas.

Figura 4 – Visão mitológica do mundo onde a Terra era plana e envolvida por uma campândula de cristal na qual
estavam fixadas as estrelas.

Fonte: The mytological world view. Disponível em: <http://nrumiano.free.fr/Images_cg/Anccosm_E.gif>.Acesso em: 10 maio 2005.

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 211


Mas, já no final desse período, na Europa, ressurgiu uma das teorias astronômicas mais
belas e eficazes: o sistema geocêntrico ptolomaico. Formulado por Cláudio Ptolomeu (c.100-
170), astrônomo e geógrafo que viveu em Alexandria (lá, trabalhou na famosa biblioteca,
lembra da nossa primeira aula?), esse sistema explica com grande simplicidade e eficiência a
evolução e organização dos astros, tendo sido essa teoria ensinada por mais de dez séculos
(mil anos!). No entanto, erroneamente, colocava a Terra como centro do universo, ao redor
da qual os outros astros giravam.

Em nossa história, posteriormente, existiram alguns grandes cientistas que mudaram


definitivamente nossa forma de entender o mundo: Copérnico, Galileu, Darwin, Freud, Marx
e Nietzsche.

Nicolau Copérnico (1453-1543), em 1543, demonstrou que a Terra gira em torno do Sol
e que não é o centro do universo, derrubando, assim, o geocentrismo e substituindo-o pelo
heliocentrismo. Com essa teoria, inicia-se o processo de conduzir o homem ao seu devido lugar
no cosmos. Essa mudança de referencial da Terra para o Sol representa o que para muitos foi
a primeira grande revolução científica na história da humanidade.

Posteriormente, Galileu Galilei (1564-1642) apontou seu rudimentar telescópio para


o céu, fez observações do Sol, no qual encontrou manchas e, portanto, indícios de que o
mundo supra-lunar de Aristóteles não era tão perfeito (comprando uma grande briga com a
Igreja Católica da época); da lua, onde descobriu vales e montanhas; de outros planetas, onde
descobriu luas (caso de Júpiter); e até da Via Láctea, que revelou-se um berçário de estrelas
muito maior do que o simples céu noturno observado a olho nu. Suas observações e análise
crítica o levaram a adotar o sistema heliocêntrico de Copérnico.

Das revoluções nos céus, passamos agora para as terrestres. Charles Darwin (1809-1882)
derrubou mais um grande mito que nos colocava como o centro da criação, o antropocentrismo.
Com sua teoria da evolução, demonstra a origem animal do homem, a qual descende de seres
tidos, até então, como inferiores, derrubando junto a teoria criacionista cristã.

Outra grande revolução deu-se quando deixamos de ver nosso planeta como algo inerte,
estático, ou seja, como um planeta onde coexistem organismos vivos e uma porção inanimada
e independente formada pelos continentes, montanhas, nuvens e oceanos. Por incrível que
pareça, até o início do século XX era assim que pensávamos.

Aquela forma limitada de ver a Terra foi auxiliada pela separação das ciências em suas
áreas específicas. Os geólogos e biólogos (para ficar só com essas duas especialidades), em
sua maioria, possuíam visões restritas sobre nosso planeta. Do ponto de vista dos geólogos,
a Terra era uma bola de rochas sobre um núcleo líquido, umedecida pelos oceanos e com uma
tênue camada de ar nos isolando do espaço sideral. Já para os biólogos, os organismos vivos
eram entidades isoladas tão adaptáveis que estavam preparados para quaisquer mudanças
materiais que pudessem ocorrer durante a história do planeta.

212 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Hipótese Gaia
Somente na segunda metade do século XX, após as viagens espaciais, a nossa forma
de ver o mundo sofreu uma modificação muito grande, graças ao surgimento da hipótese
revolucionária chamada de “Hipótese Gaia”. Ela foi formulada por James Lovelock (1919),
químico britânico independente, com doutorado em Medicina e Biofísica.

Figura 5 – James Lovelock (1919), químico britânico independente com doutorado em Medicina e Biofísica, é o
formulador da Hipótese Gaia.
Fonte: James Lovelock. Disponível em: <http://www.makingthemodernworld.org.uk/stories/the_age_of_ambivalence/02.ST.06/img/IM.0208_zl.jpg>.
Acesso em: 10 maio 2005.

O nome da teoria foi sugerido pelo escritor britânico William Golding (1911-
1993), amigo de Lovelock, e é o nome da Deusa da mitologia grega Gaia ou Geia,
a personificação da Terra, que representa o elemento primordial do qual saíram as
raças divinas. Nasceu depois do Caos (personificação da vida primordial, anterior
à criação) e antes de Eros (Deus do amor). Sem o auxílio de nenhum elemento
masculino, engendrou o Céu (Urano), as Montanhas e o Mar. Os antigos gregos
consideravam que Gaia possuía o segredo dos destinos.

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 213


Apesar de não ter formulado a teoria com James Lovelock, muitos outros cientistas se
referiram ao assunto antes de Lovelock. Entre outros, podemos destacar:

 James Hutton (1726-1797), geólogo escocês, considerado pai da Geologia, em


uma reunião da Royal Society de Edimburgo, afirmou em 1785 que a Terra era um
superorganismo e que a ciência mais adequada a ela era a Fisiologia;

 Yevgraf Maximovitch Korolenco, cientista e filósofo ucraniano independente, que viveu


na Cracóvia, afirmava que a terra é um organismo vivo.

 Vladimir Vernadsky (1863-1945 – primo de Korolenco), mais tarde notável cientista


soviético, ficava impressionado com a idéia de se pensar a terra como um superorganismo.
Vernadsky é o responsável pela, até então, mais completa teoria sobre a biosfera do nosso
planeta. Realizou estudos de cristalografia, mineralogia e geoquímica, além de trabalhos
sobre cosmoquímica, radiologia, biogeoquímica; esta última, traçando uma interação
entre os solos, oceanos, lagos, rios e a vida que há neles.

Posteriormente, Lewis Thomas (1913-1993), médico norte-americano, sugeriu ser nosso


planeta uma célula, com toda a sua complexidade.

Outro marco no desenvolvimento desse pensamento foi em 1900, com a teoria das placas
tectônicas formulada pelo geólogo, meteorologista e explorador alemão, Alfred Wegener (1880-
1930), afirmando que os continentes movem-se envolta do planeta como cubos de gelo em
um copo. Dessa forma, foi formulada a teoria da deriva continental, isto é, os continentes
não possuíam no passado a conformação como vemos hoje em dia e continuam afastando-se
uns dos outros.

Mas e o nosso James Lovelock, quando começou a pensar sobre o assunto?

Foi na primavera de 1961, quando trabalhou na NASA (Agência Espacial Norte-Americana)


no projeto das sondas Viking, que pretendiam verificar a existência de vida em Marte. Nessa
época, ele chegou à conclusão de que a melhor maneira de se pesquisar a vida em outros
planetas seria estudando a composição química de sua atmosfera, o que se poderia fazer
daqui mesmo da Terra, observando os espectros atômicos do Albedo do corpo celeste a ser
investigado. Sendo assim, não havia a necessidade do envio de sondas espaciais a Marte, visto
que já nessa época se dispunha de telescópios de luz infravermelha, necessários para a análise
de gases atmosféricos. As expedições seriam então desnecessárias. Isso desagradou seus
pares como um desestímulo aos objetivos do projeto. Uma vez realizada a missão espacial em
1975, não foi comprovada a existência de vida em Marte.

214 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 2

Pesquise na Internet sobre o projeto Viking, tentando descobrir:

a) qual o seu objetivo;

b) que experimentos ele propôs para cumprir seu objetivo;

c) qual o resultado desse projeto.

Segundo Lovelock, a atmosfera de um planeta onde não existe vida deve estar em
equilíbrio, isto é, todas as reações químicas possíveis já ocorreram e os gases da atmosfera
estão relativamente inertes. Por outro lado, se existe vida, os gases não estão em equilíbrio e
muitas reações acontecem. A exceção seria o início e fim da existência de organismos vivos,
quando poderia haver uma atmosfera em equilíbrio químico mesmo na presença de vida.
Levando isso em consideração, podemos traçar um paralelo entre as atmosferas de
Vênus, de Marte, da Terra atual e primitiva (tabela a seguir). Observe que Vênus e Marte
possuem atmosferas em equilíbrio químico, ricas em dióxido de carbono, com pouco
nitrogênio e praticamente sem oxigênio.
O planeta Terra possui atualmente uma atmosfera rica em nitrogênio, pobre em dióxido
de carbono e com bastante oxigênio, mas no passado, quando ainda não existia vida, possuía
uma atmosfera muito parecida com as dos outros dois planetas.

Tabela 1 – Composição das Atmosferas Planetárias da Terra, de Vênus e de Marte

Gás Vênus Marte Terra sem vida Terra atual


Dióxido de carbono 96,5 98 95 0,003
Nitrogênio 3,5 1,9 2,7 79
Oxigênio Vestígios 0,0 0,13 21
Argônio 70 0,1 1,6 1
Metano (ppm) 0,0 0,0 0,0 1,7

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 215


De acordo com suas composições, Marte, Vênus e a Terra sem vida possuem uma
atmosfera sem reações químicas com um gás caracteristicamente redutor, o dióxido de
carbono (CO2).

A Terra atual, rica em vida, possui uma atmosfera altamente oxidante e reativa devido à
presença de oxigênio (O2). A atmosfera de hoje é constituída por uma rara e instável mistura
de muitos gases, indicando que não está em equilíbrio químico, estando, no entanto, bem
adaptada às necessidades da vida. Por essa óptica, espera-se que exista vida na Terra, o que
todos nós sabemos ser verdade.

Os níveis atuais de oxigênio e dióxido de carbono em nossa atmosfera são ideais. Menos
oxigênio comprometeria a respiração dos seres vivos; mais (por exemplo, 25 ao invés dos
21%), o planeta arderia em chamas espontaneamente. Sem o dióxido de carbono não haveria
a fotossíntese e uma quantidade maior levaria a um aquecimento do mar e da atmosfera. Ao
consumir e exalar esses gases, os seres vivos ajudam a mantê-los em equilíbrio. Lovelock
sugere que a vida em si mantém a composição da atmosfera.

No caso da atmosfera terrestre, foram necessários aproximadamente dois bilhões de


anos para que o nível de oxigênio livre imerso nela atingisse valores próximos ao observado
hoje em dia. Sendo que somente há cerca de 600 milhões de anos, a quantidade de oxigênio
disponível na atmosfera terrestre e nos oceanos tornou-se suficientemente alta, possibilitando
o surgimento dos animais. Foi o surgimento da vida vegetal que possibilitou a produção de
oxigênio em quantidade suficiente para permitir a eclosão de vida animal!

Um novo olhar
Ao voltar o olhar do espaço sideral e dos planetas do sistema solar para a Terra, Lovelock
lançou uma nova forma de ver nosso planeta como até então ninguém havia feito.

A primeira vez que Lovelock expôs essa teoria foi em 1972, em uma nota na revista
Atmospheric Environment, com o título “Gaia vista através da atmosfera”. Utilizou como
embasamento a composição química da atmosfera e seu estado de desequilíbrio químico.
Posteriormente, ele publicou artigos juntamente com a bióloga e evolucionista americana Lynn
Margulis (1938). Em 1979, publicou o primeiro livro sobre o assunto, Gaia, um novo olhar
sobre a vida na Terra. Esse livro começou a ser escrito em 1975, quando o módulo espacial
Viking estava para aterrissar em Marte.

216 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Figura 6 – Foto da sonda Viking envida para marte.

Fonte: Viking landers. Disponível em: <http://cmex.arc.nasa.gov/CMEX/Viking%20Landers.html>.


Acesso em: 10 maio 2005.

O ponto chave da hipótese Gaia é que esta prevê que o clima e a composição química
da Terra são mantidos em equilíbrio. Nosso planeta age como um sistema que se auto-
regula, sendo estabilizado por mecanismos físicos, químicos, geológicos e biológicos que
interagem para manter o que podemos chamar de homeostasia. Assim, precisamos ver o
planeta Terra como uma entidade complexa envolvendo a biosfera terrestre, a atmosfera,
a hidrosfera e a litosfera. Através de Gaia, a Terra mantém um equilíbrio com condições
relativamente constantes.

Lovelock chamou essa ciência de Geofisiologia, a fisiologia da Terra ou de outro planeta.


Gaia pode ser entendida como o estudo da fisiologia de nosso planeta em que os oceanos
e rios são o sangue, a atmosfera, os pulmões, a terra, os ossos e os organismos vivos, os
sentidos. Podemos imaginar o homem como o sistema nervoso?

Essa teoria deixa de lado a visão de nosso planeta como um monte de rochas resfriadas
na superfície e líquidas em seu interior, como até então se considerava, e a descreve como
uma espécie de superorganismo, que funciona como um sistema dinâmico capaz de regular
a composição atmosférica, o clima e a salinidade dos mares, o que manteria esse sistema
sempre adequado para a vida.

A hipótese Gaia pressupõe que nosso planeta esteja vivo, levando-nos ao conceito de vida.
Essa é uma tarefa difícil. Todos nós sabemos o que ela é, mas como objeto de investigação
científica, que exige uma definição precisa, fica muito difícil de formular.

Segundo o dicionário Aurélio, vida significa: “Conjunto de propriedades e


qualidades graças às quais animais e plantas, ao contrário dos organismos
mortos ou da matéria bruta, se mantêm em contínua atividade, manifestada
em funções orgânicas, tais como o metabolismo, o crescimento, a reação a
estímulos, a adaptação ao meio, a reprodução, e outras; existência...”

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 217


Mas, como definir nosso planeta Terra como uma entidade viva? Lovelock acredita que
o sistema associado de vida e ambiente em Gaia inclui:

 organismos vivos que crescem explorando oportunidades ambientais que apareçam;

 organismos sujeitos às regras da seleção natural, sobrevivendo os mais aptos a se


reproduzirem;

 organismos que afetam o meio ambiente físico e químico. Os animais, através da


respiração, quando inspiram o oxigênio e expiram o gás carbônico e as plantas e algas
fazendo o inverso. E de outras maneiras específicas;

 a existência de restrições e limites para a vida, tais como os fatores: temperatura,


concentração de compostos químicos, entre outros.

Atividade 3

A Terra é um planeta muito especial e, ao compararmos com os outros de


nosso sistema solar, vemos que ele se destaca por sua diversidade de tons e
movimentos. Girando na imensidão do cosmos, ela nos carrega, nos sustenta
em seu ventre como “uma mãe”. À luz dos conhecimentos adquiridos até agora,
dentro do contexto desta aula, faça uma interpretação do seguinte trecho da
música Terra, de Caetano Veloso, que compôs em 1978, após observar fotos de
nosso planeta tiradas do espaço.

De onde nem tempo nem espaço


Que a força mande coragem
Pra gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas no nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne
Terra, Terra
Por mais distante o errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Fonte: VELOSO, Caetano. Terra [letra de música]. Disponível em: <http://www.caetanoveloso.com.br/>. Acesso em: 10 maio 2005.

218 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Uma analogia interessante para se entender Gaia é levarmos em consideração uma grande
árvore. Nela, cerca de 97% dos seus tecidos estão mortos, as células vivas resumem-se a uma
pequena porção periférica de células ao longo do tronco. Essa situação é similar à litosfera
terrestre, que possui uma fina camada de organismos vivos espalhados ao longo de sua
superfície. Nossa atmosfera protege os tecidos vivos como as folhas da árvore e permite uma
importante troca biológica de gases como dióxido de carbono e o oxigênio. No entanto, as
partes não vivas da árvore são imprescindíveis para a manutenção de sua vida. Dessa mesma
forma, as partes não vivas do nosso planeta estão envolvidas em muitos processos, sugerindo
que toda a Terra é viva como uma grande árvore.

Outro aspecto interessante é em relação à temperatura. Nossos corpos, através


de um conjunto complexo de fatores, verifica e equilibra nossa temperatura corporal em
aproximadamente 37ºC. Por isso, se estamos em um local de baixa temperatura, trememos de
frio para aquecer nosso corpo, e se estamos em um local quente, suamos para resfriar a pele.
Nosso planeta se aquece com a energia do Sol e, como conseqüência, temos o fenômeno do
Albedo. Ele interfere na cor do nosso planeta e em sua capacidade de absorver e refletir luz,
influenciando também em sua temperatura.

Note que a temperatura de uma superfície escura é maior do que de uma superfície clara,
como acontece quando pisamos descalços sobre o asfalto ou sobre uma calçada branca. Isso
ocorre porque superfícies escuras absorvem mais do que refletem os raios do sol, fato que se
dá inversamente nas superfícies claras.

O mundo das margaridas


Numa tentativa de exemplificar como nosso planeta funciona, Lovelock sugere que
imaginemos um mundo em que só existam três formas de vida: margaridas brancas, margaridas
pretas e vacas cinzentas.

As margaridas pretas, devido a sua cor, absorvem mais energia solar e se aquecem
mais rápido do que as margaridas brancas. Imaginemos que o mundo das margaridas esteja
inicialmente muito frio. Nessa condição, as margaridas pretas teriam vantagem biológica
sobre as brancas e cresceriam mais rapidamente, aumentando sua população e escurecendo
a superfície do planeta.

Com a superfície mais escura, o planeta absorve mais energia solar e começa a se aquecer.
O aumento da temperatura faz com que as margaridas brancas comecem a ter vantagem sobre
as pretas e cresçam mais depressa, aumentando sua população. Brevemente, haverá mais
flores brancas do que pretas e a superfície do planeta irá refletir mais energia solar e voltará

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 219


a se resfriar. E as vacas? Bem, as vacas estarão sempre comendo as margaridas, sejam elas
pretas ou brancas.

Segundo Lovelock, esse modelo pode ser representado com muito mais espécies de
matizes intermediários. Mas, sempre obedecerá aos mecanismos adaptativos postulados por
Charles Darwin.

Voltando à Terra, áreas escuras, como montanhas, florestas ou o oceano, tendem a


absorver energia do Sol. Ao contrário, as áreas claras, tal como desertos, áreas nubladas ou
calotas polares, tendem a refletir a energia solar para fora da Terra. Você já percebeu que o
Albedo não é idêntico e constante em todo o planeta? Uma das coisas é que as nuvens auxiliam
na regulação da temperatura global. Quanto mais nuvens, mais luz será refletida pela Terra, a
qual resfriará. Menos nuvens, mais energia solar atinge a superfície terrestre, que esquentará.

Que fatores controlam a


abundância de nuvens?
Quando você estudou o ciclo da água na aula 5, viu a relação existente entre os fenômenos
de evaporação e precipitação da água, sendo as nuvens o elemento intermediário entre esses
fenômenos. Outros aspectos importantes são as frentes frias e os efeitos das chuvas sobre a
camada de nuvens do nosso planeta.

Visto que os oceanos cobrem dois terços da superfície terrestre, eles têm uma
importância fundamental na formação das nuvens e são o principal elemento na regulação da
temperatura do nosso planeta. Principalmente devido à produção do gás carbônico produzido
por organismos marinhos do fitoplâncton, que através do efeito estufa mantém a Terra na
temperatura à qual estamos acostumados. Assim, aumentando artificialmente a quantidade
de CO2, estamos contribuindo para o aumento do efeito estufa e, portanto, para a elevação
da temperatura do planeta.

Atualmente, estamos assistindo a um aumento da temperatura na Terra. Você estudou


isso na aula 8, sobre clima, e deve se lembrar que esse fenômeno é devido à emissão de gases,
principalmente dióxido de carbono, na atmosfera terrestre. Segundo alguns cientistas, esse
aquecimento age como uma armadilha para Gaia: o calor proveniente do efeito estufa gera ainda
mais calor, num círculo vicioso. No entanto, Gaia tem como dar resposta e se adaptar.

220 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


O destino da Terra
Muitos povos já tentaram imaginar, ou mesmo prever, como será o destino do planeta
Terra. Os astecas achavam que o Sol morreu e ressuscitou quatro vezes e que, caso morra
novamente, não mais ressuscitará. Com facas de pedra, os sacerdotes desse povo trinchavam
corações humanos em sacrifícios, tentando manter o Sol e o mundo vivos.

Os indus acreditam que não existe fim, e que a morte é sempre seguida pelo renascer,
sendo o Deus Brama o responsável pela destruição e renascimento. Os antigos islandeses
acreditavam que Odim, ainda jovem, teve a visão de que o mundo terminaria em uma grande
batalha quando homens e deuses sucumbiriam. Uma tribo do gabão, os Fang, imaginam que
um dia o Sol caçará as estrelas e a Lua e as comerá.

Os cientistas hoje acreditam que uma estrela média como o Sol, que tem cinco bilhões
de anos, vive em média dez bilhões de anos. Como você já estudou na aula sobre o Sol, o
processo de extinção de uma estrela ocorre porque, devido à alta pressão e temperatura em
seu interior, ocorre a fusão do hidrogênio, que ao se fundir transforma-se em hélio. Nesse
processo, a massa inicial é menor que a final e essa diferença é transformada em energia. Por
outro lado, o He assim gerado é mais denso e impede que a energia do Sol se dissipe, levando
a um aquecimento progressivo da estrela, que culmina com a sua explosão. Nesse momento,
a temperatura solar chegaria a 100 milhões de graus centígrados, expandindo-se violentamente.
Nesse caso, a Terra será carbonizada pela alta temperatura. Mercúrio e Vênus, por estarem mais
próximos, serão os primeiros a sucumbirem à catástrofe.

Mas, não se deprima. Isso provavelmente ocorrerá daqui a cinco bilhões de anos! Até
lá, caso nossa espécie ainda exista, provavelmente teremos desenvolvido tecnologia que nos
permita colonizar planetas fora de nosso sistema solar.

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 221


A terceira grande extinção
Cenários atuais e não menos fatídicos que a explosão solar podem levar à destruição de
nosso planeta. Isso deve-se ao fato de que a Terra está viva, podendo sofrer alterações.

Mais preocupante são os acontecimentos atuais que dizem respeito a extinções de seres
vivos. Na história de nosso planeta, já ocorreram várias extinções. Destas, pelo menos duas
foram em grande escala. A primeira ocorreu há 250 milhões de anos, quando cerca de 90%
de todos os seres vivos do planeta pereceram (alguns autores se referem a um número entre
92-95%). A segunda grande extinção ocorreu há 65 milhões de anos, quando 50% de todas as
espécies morreram, incluindo os últimos dinossauros. Para nosso alívio, e por isso estamos
aqui agora, os primeiros ancestrais mamíferos do homem sobreviveram à primeira catástrofe
e nossos ancestrais primatas, à segunda.

No entanto, para nosso desespero e preocupação, a terceira grande extinção em massa


está em progresso. Tudo começou há 100 mil anos, quando nosso planeta começou a sentir o
impacto causado por uma nova espécie, o Homo sapiens. Hoje, estamos sujeitos a mudanças
climáticas, devido à exploração dos recursos naturais de forma desordenada, causada pela
grande explosão populacional que nossa espécie vem sofrendo.

Dez mil anos atrás a população mundial era de cerca de cinco milhões de habitantes.
Em 1850, havia 1 bilhão, em 1950, 2,5 bilhões. Acredita-se que em 2020 haverá pelo menos
8 bilhões de seres humanos no planeta. Nossa espécie alcançou esse sucesso graças ao
somatório de alguns aspectos, desde uma forma impressionante de adaptação ao meio
ambiente, ao desenvolvimento de um sistema nervoso altamente eficiente. Aparentemente,
somos os únicos seres vivos capazes de olharmos criticamente para nosso passado e presente
e sonharmos com nosso futuro.

Encontramo-nos hoje em uma encruzilhada nunca dantes atingida por nenhuma das
civilizações que nos precederam. De um lado, temos a ciência e a técnica necessárias para
levar nosso planeta adiante, preservando ao mesmo tempo o ambiente, a vida e a sociedade.
Por outro lado, temos o poder, a ambição e o fanatismo suficientemente aguçados para utilizar
essa mesma ciência e técnica para provocar a destruição do meio ambiente e de nossa própria
espécie. Desse modo, é pertinente afirmar que o nosso futuro depende cada vez mais das
decisões individuais e coletivas que tomamos hoje.

222 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, você estudou como, no decorrer dos anos, os seres humanos
modificaram a sua forma de ver o planeta Terra, inicialmente como uma entidade
estática até a Teoria Gaia, que o descreve como uma entidade dinâmica e interativa.

Autoavaliação
Sistematize o pensamento do homem em relação ao nosso planeta no decorrer dos
1 anos, desde a Antigüidade Clássica até os dias de hoje.

Sintetize a forma da Teoria Gaia de ver o mundo.


2
Explique o “Mundo das Margaridas”, segundo Lovelock.
3
Relacione as formas através das quais nossa sociedade atual vem interferindo no
meio ambiente.
4

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 223


Referências
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Acesso em: 10 maio 2005.

224 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade 225


Anotações

226 Aula 10 Ciências da Natureza e Realidade


Poluição

Aula

11
Apresentação

N
esta aula, trataremos de um tema que afeta a todos nós enquanto seres humanos e ao
planeta como um todo: a poluição. Esse é, provavelmente, o maior problema enfrentado
por nossa sociedade. O estudo de suas causas e de ações que buscam minimizar seus
efeitos envolve, atualmente, grandes somas de recursos e tempo em pesquisa. Nesse contexto,
estão envolvidos desde o pneu velho que é atirado no rio e o lixo jogado na rua, ao reator
nuclear que, por um mau funcionamento, libera material radioativo para o meio ambiente.

Objetivos
Após estudar a presente aula, você deverá ser capaz de:

conceitualizar poluição e seus diversos tipos;


1
explicar quais as principais conseqüências da poluição
2 para o ser humano e para o ambiente;

descrever ações capazes de minimizar a poluição.


3

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 229


Atividade 1
Tente você mesmo responder a esta questão, antes de iniciar a aula:
o que é a poluição?

Poluição
Vejamos uma resposta técnica. Do ponto de vista científico, “a poluição pode ser definida
como a introdução no meio ambiente de qualquer matéria ou energia que venha a alterar as
propriedades físicas, químicas ou biológicas desse meio, afetando, ou podendo afetar, por isso,
a ‘saúde’ das espécies animais ou vegetais que dependam ou tenham contato com ele, ou que
nele venham a provocar modificações físico-químicas nas espécies minerais presentes”. (Gil
Portugal citado por GPCA - Meio Ambiente, 2005a)

Assim, muitas de nossas atividades cotidianas são potencialmente poluentes. Além disso,
existem atividades profissionais que envolvem um alto potencial poluidor e que, portanto,
deveriam estar subordinadas a rígidos controles sociais.

Atividade 2
Com base na definição anterior, como você responderia à seguinte questão:
no ambiente em que você mora ou trabalha, existe poluição?

Para respondê-la, você deve ter pensado em algum critério para definir se uma coisa
representa ou não poluição. Ou seja, que impacto ambiental ela provoca. Uma primeira
observação é que a poluição costuma afetar um ou mais de nossos órgãos sensitivos, como
o olfato e a visão que são afetados pela poeira e fumaça. Substâncias tóxicas prejudicam a
pele, provocando, por exemplo, coceiras e outros sintomas. Mas, cada pessoa responde de
modo diferente a tais estímulos. Ao se fazer um estudo sistemático da poluição, precisamos
classificá-la em categorias e analisar seus efeitos e formas de controle.

230 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Tipos de poluição
Podemos olhar a poluição de acordo com a natureza do agente principal envolvido. Nesse
sentido, podemos classificá-la como causada por agentes físicos, químicos ou biológicos.

Um exemplo do tipo provocado por agente físico é a sonora; por agente químico, a
contaminação do ar pela fumaça expelida pelos ônibus, carros e caminhões; e biológico, por
introdução em um dado ambiente de plantas e animais que não pertencem ao ecossistema.

Um caso interessante de poluição por agente biológico é o do caramujo giganta, oriundo


da África (Achatina fulica), o qual, no final da década de 80, foi intensamente disseminado
no Brasil devido ao seu atrativo potencial econômico, por ser um substituto do escargot
(uma espécie de caramujo muito apreciada na França). Essa iniciativa não deu bons frutos
econômicos e muitos criadores se desfizeram de seus animais, soltando-os na fauna e flora
brasileira, ambiente onde não tinham inimigos naturais (fato típico das espécies exóticas, isto
é, não nativas) e, com isso, rapidamente se proliferaram tornando-se uma praga e logo um
problema de saúde pública.

Também se pode abordar o problema da poluição a partir do efeito ambiental mais próximo,
nesse caso, teríamos a atmosférica, a hídrica e a dos solos. Vejamos cada uma delas.

Poluição atmosférica
Quando falamos de poluição atmosférica, estamos nos referindo a mudanças provocadas
na qualidade do ar. Já sabemos, desde a aula 3, que o ar é, entres outras coisas, inodoro,
transparente. Assim, quando se trata da poluição do ar, estamos falando de alterações de uma
ou mais dessas características. Essas alterações podem ser de curta, média ou longa duração e
seus efeitos são atualmente sentidos em escala cada vez maior nos grandes centros urbanos.

Atividade 3
Pesquise e identifique o tipo de poluição do ar (se existir) mais comum em
sua região. Existe alguma atividade local com o objetivo de controlar tal agente
poluidor?

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 231


Tendo em vista a definição de poluição e aplicando-a ao caso do ar, podemos defini-la
como a introdução na atmosfera de qualquer matéria ou energia que venha a alterar algumas
propriedades, afetando, ou podendo afetar, a “saúde” das espécies animais ou vegetais que
tenham contato com esse ar. Seus efeitos podem ir desde a provocação de leves incômodos
a modificações físico-químicas nas espécies minerais que tenham contato com ela.

Um dos efeitos globais relacionados com esse tipo de poluição é o chamado “aquecimento
global” que vem alterando a temperatura do planeta e, com isso, afetando os ciclos biológicos
importantes. Por exemplo, o pássaro “papa-mosca-preto” todos os anos, migra da África em
direção à Holanda, onde se reproduz. Nessa mesma época, na região de nidificação desses
pássaros, a mariposa Operophtera brumata começa a nascer das lagartas. Essas mariposas são
o alimento dos filhotes do “papa-moscas”. Com o aquecimento global, a época de reprodução
desses pássaros foi alterada por algumas semanas e, assim, quando eles nascem, já não
encontram mais seus alimentos, visto que a reprodução das mariposas não foi alterada.
Sobre esse assunto, consulte a excelente reportagem “O calor aumenta”, dos repórteres Tim
Appenzeller e Dennis R. Dimick, da revista da National Geographic – Brasil, publicado em
setembro de 2004 na página 68.

Atividade 4
Você já notou alguma mudança na flora, na fauna ou no clima de sua região?
O que mudou? Explique.

As fontes de poluição atmosférica são inúmeras e compreendem desde a emissão de


gases por veículos automotivos (carros, ônibus, caminhões e motos) aos provocados pelas
queimadas (bastante comuns em nossa região), como também a fumaça emitida através das
chaminés das grandes fábricas. Podemos incluir nesse contexto a poluição atmosférica por
material radioativo emitido, eventualmente, por usinas nucleares, em casos de acidentes.

Vemos assim que são inúmeras as fontes de poluição atmosférica. E que por se propagar
livremente no ar e ser levada pelos ventos, esse tipo de poluição não respeita fronteiras
geográficas e não fica circunscrita à região da fonte poluidora. Assim, devido aos fenômenos
de circulação global (veja a aula 3), a poluição gerada em uma casa pode atingir toda uma rua
ou a produzida num país pode atingir outro ou mesmo atravessar continentes.

Um exemplo bastante grave foi verificado por cientistas atmosféricos ao detectaram no


continente Antártico vestígios do inseticida DDT (abreviatura do composto químico Dichloro-

232 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Diphenyl-Trichloroethane, cujo nome fantasia, no Brasil, é Detefon) em animais e no ar, o
qual não era utilizado nesse continente, concluindo-se, portanto, que chegou lá através das
correntes de ar que fluem de um continente para outro. Por outro lado, esse inseticida e
pesticida foi usado intensivamente tanto nos lares quanto nas lavouras por todo o mundo até
a década de 1970, quando seus efeitos nocivos foram denunciados e sua comercialização
proibida mundialmente. (A esse respeito, veja o artigo de SLADEN; MENZIE; REICHEL; 1966,
p. 670-673).

Um outro tipo de poluição atmosférica provocada por agente físico é a poluição


sonora, a qual é muito presente em nossa cultura. Seus efeitos sobre os seres humanos
são bastante preocupantes, pois vão desde o estresse à surdez permanente. Discutiremos
esse assunto a seguir.

Poluição sonora
Quando o homem surgiu há mais de 100.000 anos, nosso planeta já era um mundo
de sons e, por isso, foi dotado de um sistema auditivo adequado para tais sons, que na sua
maioria, eram provocados por seres vivos, na faixa de 60dB (dB = decibéis, unidade de medida
da intensidade de uma onda sonora).

E, por outro lado, no mundo antigo, o intervalo de tempo em que nossos ouvidos “podiam
descansar” sem serem submetidos a ruídos significativos era muito grande. Podemos, então,
definir a poluição sonora como o conjunto de todos os ruídos provenientes de uma ou mais
fontes sonoras, manifestadas ao mesmo tempo, num ambiente qualquer.

O limite de tolerância do homem a ruídos contínuos e intermitentes, estabelecido pelo


Ministério do Trabalho, é de 85 decibéis (85 dB) por 8 horas diárias. A poluição sonora, hoje, é
tratada como uma contaminação atmosférica proveniente da energia mecânica (transformada
em som audível) que gera ruídos.

Esse tipo de poluição tem reflexos em todo o organismo e não apenas no aparelho auditivo.
Ruídos intensos e permanentes podem causar vários distúrbios, alterando significativamente
o humor e a capacidade de concentração nas ações humanas. Provoca interferências no
metabolismo de todo o organismo com riscos de distúrbios cardiovasculares, inclusive a
perda auditiva.

Alguns efeitos da poluição sonora são: perda da concentração; perda dos reflexos; irritação
permanente (mau humor); dores de cabeça; fadiga (sensação permanente de cansaço).

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 233


Atividade 5
Responda brevemente às seguintes questões.

1 Quais as principais fontes de poluição sonora existentes na sua rua?

Quais as principais fontes de poluição sonora existentes em seu


2 ambiente de trabalho?

3 Você já sentiu algum tipo de desconforto associado à poluição sonora?

Em geral, hoje nas grandes cidades, as maiores fontes de poluição sonora são veículos
com motores pesados, automóveis, fábricas, construção civil, aeroportos, carros de
propaganda, entre outros.

Ao contrário do nosso antepassado das cavernas, praticamente não damos descanso


aos nossos ouvidos. Veja abaixo uma tabela dos sons de nosso cotidiano e sua intensidade.

Fonte sonora Nível sonoro em dB


Silêncio absoluto 0
Interior de uma igreja antes da missa 10
Pessoa cochilando 20
Carro bem regulado 50
Bar movimentado 70
Avenida com trânsito intenso 90
Britadeira funcionando 110
Banda de rock e trios elétricos 120
Buzina de automóvel 120
Decolagem de um avião 150

Na faixa de até 90dB, o nosso ouvido reage bem e qualquer dano é de natureza
psicológica. Por exemplo, pessoas que moram em cidades grandes, quando se deslocam
para o interior apresentam, nos primeiros dias, dificuldade para dormir, pois o cérebro está
acostumado a um alto nível de ruído e sente quando esse nível cai. O mesmo ocorre com
uma pessoa acostumada com o ruído baixo do campo e vai para uma cidade movimentada.

234 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Poluição das águas
Mais uma vez, a poluição hídrica (dos rios, lagos, oceanos ou qualquer outro reservatório
de água, natural ou artificial) pode ser definida como a introdução na água de qualquer matéria
ou energia que altere suas propriedades, afetando, ou podendo afetar a “saúde” das espécies
animais ou vegetais que dela dependam ou com ela tenham contato; ou mesmo que venha a
provocar modificações físico-químicas nas espécies minerais contatadas. (Gil Portugal citado
por GPCA-Meio Ambiente, 2005b).

Ao contrário da poluição do ar, a das águas afeta a região próxima das fontes poluidoras,
podendo eventualmente também se propagar por muitos quilômetros, acometendo regiões
relativamente distantes dessas fontes.
Fundamental para a vida, nosso próprio corpo é composto fundamentalmente por água (70%).
Ela é um bem precioso e raro que apresenta distribuição geográfica não uniforme na superfície
terrestre (lembre-se da aula 2 desta disciplina). Observe como se dá a distribuição da água na Terra,
descrita nos próximos parágrafos.
Quase 96% de toda a água do planeta está concentrada nos oceanos (portanto, água salgada).
Restando, assim, apenas uma pequena fração da ordem 4% que seria potável e disponível para a
vida. Desses 4%, temos 3%, ou seja, a maior parte, na forma de gelo, neve ou abaixo da superfície
compondo as águas subterrâneas e os chamados lençóis freáticos.
Assim, só resta para alimentar praticamente todas as espécies vivas do planeta uma pequena
fração de cerca de 1% de toda a água terrestre, a qual se encontra armazenada em lagos e rios como
umidade presente no solo ou na atmosfera formando as nuvens e o vapor d´água.
Dividindo esse 1% com o restante do planeta (animais e plantas), fazemos uso da água de uma
forma muito mais intensa e diversificada que as outras espécies vivas, pois, no nosso caso, além de
indispensável à vida, a água é também indispensável em praticamente qualquer atividade humana,
seja nas indústrias, na agricultura, na pecuária, nos lares ou no lazer. De tão importante, a água é um
critério básico utilizado pelos cientistas que procuram indícios de vida fora da Terra. A não existência
de água significa a não existência de vida.

Distribuição da água no planeta

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 235


Atividade 6

Antes de continuar a leitura, indique os agentes poluentes da água mais


comuns em sua região.

Atividade humana e poluição das águas


Quando se pensa em poluição das águas, um primeiro exemplo que nos vem à mente são
os desastres envolvendo navios petroleiros. Na verdade, a exploração e o transporte marítimo
de petróleo e seus derivados é uma atividade de grande risco ecológico e alto poder de poluição.

A canavieira, muito comum em nossa região, é uma atividade que envolve sérios riscos
ambientais. A começar pelo plantio da cana-de-açúcar, caracterizado como uma monocultura,
que ocupa vastas áreas e que provoca sérios desequilíbrios na flora e na fauna da região onde
é plantada. Assim, inicia-se o processo pelo desmatamento.

Nessa atividade, animais e plantas nativos são mortos e destruídos. Logo em seguida
prepara-se a terra com material químico de natureza diversa procurando adequar o solo às
necessidades da cana. Nesse processo, ele é poluído quimicamente. Na colheita, as queimadas
poluem o ar e enfraquecem o solo ao destruir, pelo fogo, nutrientes e microrganismos.
Finalmente, na fase industrial, os efluentes líquidos dessa atividade, como a vinhaça, são
atirados em rios e córregos, matando peixes e deixando a água contaminada com resíduos
químicos típicos do preparo do açúcar e do álcool.

Muitas vezes, a própria água de chuva contribui para a disseminação, no solo e nas águas,
de resíduos poluentes através do escoamento pluvial, sendo o material deixado no solo levado
até os reservatórios aqüíferos.

236 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Poluição dos solos
Esse tipo de poluição ocorre quando há disposição sobre o solo de materiais orgânicos
e/ou inorgânicos. A passagem de massa fluida sobre o solo também provoca alterações em
sua constituição básica, modificando suas propriedades originais benéficas e o seu uso pelas
espécies que dele dependem ou com ele se contatem. Isso influencia a qualidade das águas
sob esse solo, caracterizando, assim, a chamada poluição dos solos. (Gil Portugal citado por
GPCA-Meio ambiente, 2005c).

Geralmente, sob a denominação de resíduos industriais se enquadram sólidos, lamas e


materiais pastosos oriundos do processo industrial, que não guardam interesse imediato pelo
gerador, o qual deseja, de alguma forma, se desfazer deles.

No Nordeste, está surgindo uma atividade comercial que tem um extremo potencial
poluidor do solo e da água: a carcinocultura (criação de camarão em cativeiro). A preocupação
com essa atividade já ultrapassa os limites da nossa região e do Brasil, inquietando inclusive
pesquisadores de outros países, por exemplo.

Fazendas de criação de camarão causam danos ao meio ambiente


e dão poucos empregos

Um estudo da Fundação para a Justiça Ambiental (EJF), da Inglaterra, alerta


que o crescimento da indústria do camarão no Brasil poderá ter conseqüências
devastadoras para o meio ambiente costeiro, como já vem sendo observado em
países como o Equador e o Vietnã. “Nós estamos muito preocupados com o
Brasil porque acreditamos que ele vai ser um dos próximos lugares no planeta
a sofrer o impacto devastador da crescente indústria do camarão”, disse à
BBC Brasil Steve Trent, diretor da EJF. A produção de camarões no Brasil vem
crescendo mais de 50% ao ano. O objetivo da Associação Brasileira dos Criadores

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 237


de Camarão é alcançar uma produção equivalente a US$ 500 milhões até o ano
2005, e, em 2010, ser líder do mercado mundial com exportações no valor de
US$ 1,5 bilhões. O governo brasileiro diz que também está muito preocupado
com o crescimento desta atividade e que está fazendo políticas para controlar
e monitorar o crescimento das fazendas. De acordo com o Grupo de Trabalho
Amazônico (GTA), o sub-secretário para o Desenvolvimento da Aqüicultura e
Pesca, Manuel Jesus da Conceição, confirmou que a prioridade para o governo
é buscar um entendimento com o setor para que essa atividade se desenvolva de
forma sustentável. Um dos problemas das fazendas que criam camarão é que, na
maioria dos casos, elas são insustentáveis. Segundo Trent, uma típica fazenda de
camarão dura, no máximo, cinco anos. A degradação do ambiente e o surgimento
de doenças causadas pelos produtos químicos utilizados ilegalmente acabam com
a produtividade das fazendas. As fazendas são fechadas deixando a população
local sem empregos e sem benefícios. “A expansão de fazendas de camarão
implica a destruição de manguezais e portanto a destruição de ecossistemas
muito frágeis típicos de áreas costeiras”, disse Trent. “As espécies marinhas
dependentes dos manguezais são postas em perigo, afetando outras indústrias
locais, como a da pesca”, acrescentou. Os manguezais servem também como
barreiras fluviais, e a destruição das mesmas pode gerar enchentes ameaçando
as populações locais.

REDE DE JUSTIÇA AMBIENTAL. Relatoria nacional para o direito humano ao meio ambiente.
Disponível em: <http://www.justicaambiental.org.br/conteudo.asp?conteudo_id=1944&sec=destaques>. Acesso em: 20 jun. 2005.

Como você pode perceber, apesar de bons frutos financeiros, a criação de camarões,
se não respeitar o meio ambiente, pode se tornar uma grande fonte de degradação do meio
ambiente e, portanto, de poluição. Não se pode ignorar os manguezais e sua importância para
o ciclo da vida em regiões costeiras.

Atividade 7
Pesquise na Internet a importância dos mangues e as pessoas que tiram
seu sustento a partir desse ecossistema.

238 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Formas de impedir ou de aliviar a
poluição e seus efeitos
Como você aprendeu, existem muitas formas de poluição, mas todas têm em comum
o fato de serem fruto da interação desordenada do homem com o meio ambiente. Assim, se
evitarmos o uso de inseticidas, reduzirmos o barulho, estaremos contribuindo para a redução
da poluição ambiental. E ainda se tratarmos adequadamente o lixo doméstico, não jogando
plásticos e outros materiais em vias públicas, sem deixar na praia o lixo que produzimos lá,
seremos aliados no combate à poluição do solo, e mais, ao evitarmos desmatamentos nas
beiras de rios, olhos-d´águas, açudes e lagos estaremos reduzindo a poluição das águas.

Outra atividade comum é a de queimar lixo. Essa tanto polui o ar quanto o solo. Deve ser
evitada e, na medida do possível, totalmente combatida.

Por outro lado, em vários países, existe em andamento leis que tentam combater a
poluição e regular o consumo. No Brasil, poderá chegar em breve a chamada Lei das Águas,
que obrigará a todos os usuários o pagamento de taxas pelo volume tomado do copo d’água
e pelo acréscimo de poluentes que a atividade acrescentou à água originalmente tomada.

Dessa forma, para amenizar esse ônus extra que está por vir, os controles da carga
poluidora e do consumo deverão ser bem cuidados. Os tratamentos dos efluentes líquidos
deverão ser eficientes e a busca da recirculação das águas servidas deverá ser permanente.

Atividade 8

Que ações você pode propor e levar adiante, visando à preservação do seu
meio ambiente mais próximo?

Escreva uma carta de intenção, explicitando essas ações. Dentro de algum


tempo, quando você voltar a ler esta aula, poderá verificar ao que, de fato,
conseguiu dar continuidade.

Para verificar os diferentes olhares sobre a natureza, os recursos naturais e o que


fazemos deles, vale a pena lermos o documento a seguir, que aborda diferentes visões por
parte de dois líderes. A seguir, carta que o índio Seattle, cacique da tribo, escreveu em
1855 para o então Presidente dos Estados Unidos, Franklin Pierce.

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 239


240 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade
Fonte: [CARTA do índio Seattle]. Disponível em: <http://www.casadopsicologo.com.br/public_html/boletim/03/carta/>. Acesso em: 20 jun. 2005.

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 241


Atividade 9
Após ler o texto anterior, responda às seguintes questões.

1 O que pretendia o Presidente dos Estados Unidos da América?

2 O que responde o índio em relação à proposta do Presidente?

O cacique compara a visão de mundo do índio com a do homem branco.


3 Quais as principais diferenças entre eles?

4 Em que pontos você concorda com a posição do índio?

Existem atualmente diversos grupos sociais que se congregam em organismos não


oficiais, conhecidos como ONG´s (Organizações Não Governamentais), que se dedicam à
preservação do meio ambiente. A mais famosa destas é o Greenpeace, mas no Brasil existem
muitas outras, como a Associação Mata Atlântica. Estas são em geral fontes a partir das quais
o cidadão pode desenvolver e exigir ações que melhorem a qualidade do nosso meio ambiente.

Resumo
Aprendemos nesta aula o que vem a ser poluição, seus tipos e alguns de seus
efeitos. Aprendemos também que existem ações legais que visam à preservação
do meio ambiente, e também que cada um de nós pode desenvolver ações que
individualmente colaborem para a melhoria do nosso planeta.

242 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Autoavaliação
Leia o texto seguinte e responda às perguntas propostas.
1
Há dez anos, embalada pela Rio 92, a Unesco, o braço cultural da ONU, publicou o que
pretendia ser o corolário do futuro: “Cada geração deve deixar os recursos da água, do solo
e do ar tão puros e despoluídos como quando apareceram na Terra. Cada geração deve a
seus descendentes a mesma quantidade de espécies de animais que encontrou”. A realidade
virou tudo isso pelo avesso. O que se viu nos anos 90 foi um avanço descontrolado sobre
ecossistemas frágeis, que não suportam a exploração agrícola intensiva, como as áreas de
cerrados, savanas e de vegetação semi-árida. Essas regiões correspondem a quase 40% da
superfície total do planeta, ou cerca de 190 milhões de quilômetros quadrados, e respondem
por 22% da produção mundial de alimentos. A superexploração leva o esgotamento do solo
a seu limite, um processo conhecido como desertificação. A FAO, o órgão da ONU para a
agricultura, estima que 250 milhões de pessoas em mais de 100 países são afetadas pelo
esgotamento do solo. “Esse problema está criando um novo tipo de migrantes, pessoas que
não têm mais nada a perder e estão dispostas a embarcar em navios de traficantes de pessoas
e até mesmo nadar oceano afora, no desespero de achar um lugar melhor para viver”, disse
à VEJA o argelino Rajeb Boulharouf, diretor de relações externas do Secretariado das Nações
Unidas da Convenção para o Combate à Desertificação (UNCCD).

Fonte: MADOV, Natasha; SAMPAIO, Flávio; COUTINHO; GRECO, Alessandro. Leonardo. A Terra pede socorro. Revista Veja, n. 1765, ago. 2002.

a) De que trata o texto?

b) Ele é otimista ou pessimista em relação ao nosso cuidado com o ambiente?

c) No contexto, o que significa esgotamento do solo? Em nossa região, existe esse


problema? Explique.

d) Compare o texto com a carta do índio Seattle. Podemos dizer que, de algum modo,
o cacique estava prevendo o que está acontecendo hoje?

e) Compare as formas de poluição implícitas no texto com as discutidas na aula.


Quais as que estão presentes no texto, quais as ausentes e quais os riscos a elas
associados? Justifique.

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 243


2 Leia o texto a seguir e responda às questões propostas.

A Terra pede socorro


Num mundo em desequilíbrio, até a boa notícia embute riscos para o futuro. O consumo de
alimentos cresceu nas últimas três décadas. Nos países em desenvolvimento, a quantidade
de calorias consumidas diariamente foi de 2.100 para 2.700. Nos ricos, passou de 3.000 para
3.400. Isso exige maior quantidade de alimentos. Hoje, 11% da superfície do planeta é usada
para agricultura. A Europa, os países do sul e do leste da Ásia já usam todo o seu estoque de
terras agrícolas. O norte da África e a Ásia Ocidental são desertos impróprios para a lavoura.
Só a América Latina e a África Subsaariana ainda têm potencial de expansão agrícola –
mas novas fronteiras agrícolas significam novos avanços sobre as florestas e sobre outras
áreas intocadas. Pela presença do homem em seu habitat, animais estão sendo extintos
num ritmo cinqüenta vezes mais rápido que o do trabalho seletivo da evolução natural das
espécies. Metade das espécies de grandes primatas, nossos parentes mais próximos na
árvore da evolução, deve desaparecer nas próximas duas décadas, se nada mais consistente
for feito para salvá-los. Individualmente, as agressões citadas acima seriam absorvidas pelo
ecossistema global, acostumado a desastres naturais. O problema é a orquestração. Sem se
dar conta, 6 bilhões de seres humanos se tornaram um fardo pesado demais para o planeta.

Fonte: MADOV, Natasha; SAMPAIO, Flávio; COUTINHO; GRECO, Alessandro. Leonardo. A Terra pede socorro. Revista Veja, n. 1765, ago. 2002.

Por que o texto afirma que “num mundo em desequilíbrio, até a boa notícia embute
riscos para o futuro”?

a) Qual é a boa notícia que o texto apresenta e qual é o risco que ela traz?

b) Dizemos que o Brasil pode vir a ser o celeiro do mundo. No contexto apresentado,
que vantagens trariam essa postura política e quais os seus riscos?

c) Compare as formas de poluição implícitas no texto com as discutidas na aula.


Quais as que estão presentes no texto e quais as ausentes? Justifique.

244 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Referências
APPENZELLER, Tim; DIMICK, Dennis R. O calor aumenta. National Geographic – Brasil, set.
2004, p.68.

[CARTA do índio Seattle]. Disponível em: <http://www.casadopsicologo.com.br/public_html/


boletim/03/carta/>. Acesso em: 20 jun. 2005.

GPCA – Meio Ambiente. Poluição atmosférica. Disponível em: <http://www.gpca.com.br/


poluicao1.htm>. Acesso em: 20 jun. 2005a.

________. Poluição hídrica. Disponível em: <http://www.gpca.com.br/poluicao2.htm>. Acesso


em: 20 jun. 2005b.

________. Poluição do solo. Disponível em: <http://www.gpca.com.br/poluicao3.htm>. Acesso


em: 20 jun. 2005c.

MADOV, Natasha; SAMPAIO, Flávio; COUTINHO; GRECO, Alessandro. Leonardo. A Terra pede
socorro. Revista Veja, n. 1765, ago. 2002.

REDE DE JUSTICA AMBIENTAL. Relatoria nacional para o direito humano ao meio


ambiente. Disponível em: <http://www.justicaambiental.org.br/conteudo.asp?conteudo_
id=1944sec=destaques>. Acesso em: 20 jun. 2005.

SLADEN, W.J, MENZIE, C. M, REICHEL, W. L. DDT residues in Adelie penguins and a crabeater
seal from Antarctica. Nature, v.210, n.37, maio, 1966, p.670- 673.

Anotações

Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade 245


Anotações

246 Aula 11 Ciências da Natureza e Realidade


Ciência e ética

Aula

12
Apresentação
Como você deve ter percebido, desde o início de nosso curso, temos enfatizado a ciência
como produção humana, e como tal, subordinada às características sociais, culturais e aos
anseios da mente.

Nesse sentido, a construção do conhecimento aparece delimitada, tanto por fatores


individuais quanto sociais. Isto é, relacionada ao meio onde se estrutura o conhecimento e
as ferramentas mentais que permitem aos indivíduos (cientistas) decidir o lugar, o modo e
os instrumentos necessários para observar a natureza, propor problemas, definir objetivos e
metas. Assim, a ciência sempre irá em frente sem saber seu rumo nem quando, timidamente,
a natureza mostrará parte do véu que encobre suas verdades.

No entanto, em uma sociedade complexa como a atual, na qual temos condições de


alterar, a partir do conhecimento gerado em instituições de pesquisa, não só a face de nosso
planeta e as características das espécies que nele vivem, mas também a de outros mundos, ou
até destruí-los, parece ser fundamental discutir em que bases filosóficas se dão a produção do
saber e os eventuais mecanismos de controle e financiamento da atividade científica.

Nesta aula, discutiremos alguns aspectos relacionados à produção do saber, de seu uso
social através das tecnologias e as ações políticas visando delimitar sua ação.

Objetivos
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

conceitualizar moral e ética;


1
explicar como a ética está envolvida nas relações da
2 sociedade com a ciência;

fundamentar seu discurso sobre a questão do


3 controle social sobre a ciência e a tecnologia.

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 249


O conceito de ética
Do ponto de vista conceitual, ética é a parte da filosofia que estuda a moral, ou a ciência
dos costumes, aquela que visa entender a natureza moral da ação e aspirações do homem.
Portanto, moral e ética são conceitos distintos, mas correlacionados.

Esse tema remete nosso estudo mais uma vez à Grécia (berço do conhecimento ocidental,
vide aula 1), ao encontro dos grandes filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles, os quais
colocaram o tema da ética e da felicidade no centro da discussão filosófica. Para o primeiro
deles, o homem só é feliz quando é bom e só é bom quando conhece. Por isso, a maldade
seria fruto da ignorância, enquanto o bem, a suprema virtude.

Platão amplia o conceito socrático, afirmando que não basta ao indivíduo ser eticamente
bom, mas ser um bom cidadão, e que cabe ao Estado harmonizar a sociedade de forma que
esta possibilite o desenvolvimento da virtude do bem. Para tanto, o Estado deve conter em
seu cerne a suprema virtude coletiva: a justiça.

O conceito aristotélico de ética vai influenciar a sociedade ocidental como um todo ao


fazer da felicidade o supremo bem, sendo esta própria da natureza humana. O homem sempre
irá procurar a felicidade a qual se encontra através do bem.

O que caracteriza a ética aristotélica e dos seus seguidores é que ela estuda o agir a partir
de uma concepção do homem como sendo: um animal político, que tem linguagem e
muitas vezes age logicamente (ou deveria fazê-lo) e que precisa desenvolver-se dentro de
uma sociedade concreta, num período de tempo, dentro de formas concretas de governo
de uma cidade, se quiser ser feliz.

Fonte: VALLS, Álvaro L. M. Ética na contemporaneidade. Disponível em: <http://www.bioetica.ufrgs.br/eticacon.htm>. Acesso em: 10 ago. 2005.

Atividade 1
Segundo o texto que você acaba de ler, qual a principal diferença do discurso
sobre a ética em Sócrates, Platão e Aristóteles?

250 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


A Ciência e seu poder
Em 1945, logo após a explosão da bomba atômica, Albert Einstein (físico alemão, nascido
em 1879 e morto em 1955, um dos homens mais conhecidos do séc. XX) assim se manifestou:
“a ciência perdeu a ingenuidade, nunca mais seremos os mesmos”. De fato, a partir daquela
data, o mundo tomou conhecimento dos devastadores
poderes do saber científico e o centro das atenções políticas
mundiais teve seu eixo deslocado. Os cientistas deixaram de
ser vistos como seres exóticos, socialmente aceitáveis, que
passavam os dias em esquisitos laboratórios pesquisando
curas de doenças, fórmulas químicas mágicas e equações
indecifráveis, para se apresentarem como detentores de um
poder capaz de alterar os rumos do planeta.

Nesse contexto, um
exemplo importante de ética na ciência pode ser tirado de um
famoso diálogo entre os físicos Niels Bohr (físico dinamarquês,
1885-1962, reconhecido como um dos criadores da física
moderna) e Albert Einstein, nos momentos que precederam a
implantação, nos E.U.A., do projeto Manhattan. Como se sabe,
o início desse projeto se deu a partir de duas cartas que Einstein
enviou ao Presidente Roosevelt, alertando-o da necessidade da
construção da bomba atômica. A seguir, reproduzimos parte
desse diálogo.

– O que estão fazendo da ciência? – murmurou Einstein – O que estão fazendo


de nós?
Caía a tarde no parque de Princeton. Os edifícios da Universidade, do outro lado
do gramado, estavam dourados pelo último raio de sol.
– Agora somos obrigados a corrigir nosso erros, professor! Criando um erro
talvez ainda maior!
– Sim, o senhor tem razão – disse Einstein – Um erro muito maior!
Acendeu seu cachimbo, tossiu, depois olhou Bohr diretamente nos olhos.
– O senhor também faz parte do Projeto Manhattan?
– Sim – disse Bohr – Estou aqui para pedir sua ajuda nesse erro ainda maior...
Einstein levantou-se, brandindo o cachimbo como uma espada.
– Não, professor Bohr! Absolutamente não! Para mim, chega... Alertei o presidente
sobre a situação, já escrevi duas cartas a ele, sabia? Agora não farei mais nada.
Eu sou inimigo de Hitler, mas também sou inimigo de qualquer matança.
Fonte: GAROZZO, Filippo. Albert Einstein. São Paulo: Editora Três, 1974. p. 117. (Os homens que mudaram a humanidade).

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 251


(Se você ficou motivado, poderá ler mais sobre esses importantes cientistas, tanto no
livro citado quanto em diversas fontes existentes na Internet).

O dilema e a angústia que os dois cientistas deixam transparecer no texto refere-se ao fato
de que a energia nuclear, a qual havia se beneficiado da famosa equação de Einstein (E=mc2),
cujo objetivo era a geração de energia para melhorar a vida das pessoas, estava agora sendo
transformada na mais mortífera das invenções humanas – a bomba atômica – capaz, inclusive,
imaginava-se na época, de destruir toda a humanidade.

Atividade 2
Tente descobrir, na história do Brasil, uma outra invenção feita por um ilustre
brasileiro que inicialmente tinha fins pacíficos, voltados para o transporte e lazer,
mas que acabou servindo para a guerra.

Dica: existe um caso muito importante envolvendo esse tema, e que acabou,
inclusive, em suicídio.

Aparentemente, o trabalho científico visa muito mais à verdade última das coisas do
que benefícios à sociedade. Mas, muitas vezes, o desdobramento das descobertas, como no
caso anterior, mostra ao mundo as mais belas facetas da alma humana. Um exemplo típico
está, mais uma vez, ligado à física e à química nuclear e a uma mulher extraordinária, Marie
Curie, que descobriu o elemento químico rádio e o polônio, descobertas que lhe valeram um
dos maiores reconhecimentos que a sociedade científica mostra aos seus pares: o prêmio
Nobel. Mas, se sua pesquisa científica a levou ao topo, sua grande tarefa humanitária ainda
estava por vir. Em 1914, ela acabava de criar o Instituto de Rádio da Universidade de Paris.
No mesmo ano, começou a I Guerra Mundial, e encontramos Marie empenhada totalmente

252 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


no esforço de guerra. Politicamente correta, ela fez campanhas internacionais visando obter
recursos para a instalação de equipamentos de raio-X em hospitais e em veículos especiais,
chegando inclusive a trabalhar em um desses veículos que prestam socorro a soldados feridos
nos campos de batalha na França.

Mas, antes disso, seus trabalhos provocaram intensas polêmicas na sociedade européia, a
qual acreditava que os raios-X poderiam ser usados para ver “através das roupas” das pessoas,
invadindo suas intimidades. Felizmente, a ciência ignorou a pressão social e continuou sua
tarefa. Hoje, não podemos imaginar consultórios odontológicos e hospitais funcionando sem
aparelhos de raio-X.

Atividade 3
Pare um pouco, pense e responda: quais das modernas tecnologias mais
têm afetado sua vida? Você poderia listar alguns possíveis benefícios e malefícios
dessa tecnologia?

É possível que você tenha respondido aparelho celular, televisão ou até computador. Tenha
sentido alguma facilidade em apresentar os benefícios trazidos por tais aparelhos, mas nem
sempre tenha clareza de que existem transtornos que podem ser provocados pelo uso indevido
dessa tecnologia, como dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo (ao contrário do que se pode
pensar, não existem evidências científicas de que o uso de aparelho celular provoque câncer)
ou o fato de ficar horas em frente a um aparelho de TV ou computador reduzir a sociabilidade
das pessoas.

Um exemplo interessante em que a sociedade se volta contra a ciência está na luta do


médico e sanitarista Oswaldo Cruz para erradicar a varíola e a febre amarela no Rio de Janeiro
no período de 1903 a 1905. O texto apresentado no box seguinte relata parte dessa história.

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 253


ABAIXO A VACINA OBRIGATÓRIA!

[...] Mas a ignorância não desarma e a guerra continua. Se a febre amarela


atacava no Verão, a varíola ataca no Inverno. É doença trazida para o Rio por
imigrantes estrangeiros e retirantes de outros Estados do Brasil. Armas para
combatê-la são as vacinas e estas já as mandei produzir, em grande quantidade,
no Instituto de Manguinhos. Todas as entradas no Rio passarão a ter postos
de vacinação. Nos finais de 1903 e princípios de 1904, na capital recrudesce a
epidemia de varíola. Insisto com a Comissão de Saúde Pública da Câmara para
que edite lei que obrigue toda a população a vacinar-se. A lei tarda a ser publicada
mas eu avanço: em maio de 1904 vacino mais de 8 mil pessoas, em Junho, mais
de 18 mil e, em Julho, mais de 23 mil. É quanto basta para que a imprensa e a
Oposição a Rodrigues Alves tornem a espicaçar a opinião pública contra mim:
atentado contra a liberdade individual, contra o pudor da mulher brasileira que
será obrigada a mostrar a coxa para ser vacinada, abaixo a tirania, abaixo a vacina
obrigatória!

Respondo: “Quem não quer vacinar-se poderá ser infectado. E, ao sê-lo,


transmitirá a doença a quem não deseja ser doente. Se colidir com o bem comum,
aí sim! a liberdade individual converte-se em tirania”.

Mas a imprensa não publica a minha argumentação. E quando, em Outubro de


1904, finalmente é publicada e entra em vigor a lei da obrigatoriedade da vacina,
essa é a gota de água que faz transbordar a antipatia popular contra Rodrigues
Alves, o qual não conseguira nem deter a carestia da vida, nem promover a oferta
de empregos. Há tumultos, greves e motins. A multidão enfurecida ataca a minha
casa, mas eu, com a minha família, consigo escapar pelos fundos. Por influência
do Apostolado Positivista também ocorre a insurreição da Escola Militar, tiroteio
em vários bairros, cartuchos de dinamite explodindo pelas ruas. Teme-se a queda
do Governo. O Presidente entra em negociações, apazigua os ânimos, concilia.
Mas paga um preço: revogação da obrigatoriedade da vacina. Mais uma vitória
da ignorância contra o saber [...]
Fonte: SILVA, Fernando Correia da. Osvaldo Cruz: médico, cientista: 1872 – 1917.
Disponível em: <http://www.vidaslusofonas.pt/osvaldo_cruz.htm>. Acesso em: 10 ago. 2005.

254 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 4
Após ler o texto anterior, faça uma pesquisa no seu ambiente social e de
trabalho sobre o uso da vacina. Tente descobrir quantas pessoas se vacinam
ou vacinam seus filhos regularmente e também o motivo pelo qual os que não
vacinam assim procedem.

Do texto, surgem algumas questões bastante atuais que passaremos a abordar, no


contexto da Bioética. Antes, perceba que no texto temos, de um lado, o cientista que sabe que
só a vacina poderá salvar vidas, impedir epidemias e suas trágicas conseqüências, e, de outro,
a sociedade, bem informada ou não, que questiona quanto ao seu direito de não se submeter
a uma exigência que implica permitir a invasão do seu corpo por anticorpos. No embate,
momentaneamente, a ciência perde e a ignorância vence.

Certamente, hoje essa discussão está obsoleta e a vacinação, financiada pela própria
sociedade, é um dos poderosos instrumentos de cidadania.

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 255


Bioética
Conceitualmente, a Bioética é o ramo da Filosofia que estuda a aplicação dos conceitos
morais às tecnologias e pesquisas na área da saúde. Esse é um tema palpitante e podemos
começar com a pergunta: pode-se obrigar uma pessoa a permitir que um agente de saúde
entre em sua casa para aplicar o defensivo que combate o mosquito da dengue?

Para respondê-la, temos que pensar bastante. Primeiro, quando se fala em poder, se está
falando em nós enquanto sociedade. Ou seja, a sociedade para se defender de uma eventual
epidemia, pode “invadir a privacidade de um lar”?
Não, essa não é uma questão fácil de ser respondida e ela é um pequeno exemplo dos
problemas enfrentados pela Bioética. Nela, aparece a dicotomia entre os deveres e direitos
individuais e os direitos e deveres coletivos, como também os motivos que levam uma pessoa
a tomar essa ou aquela atitude, tanto individual quanto coletivamente.
Em um âmbito maior, temos os problemas relativos às atividades de pesquisa no campo
da saúde, envolvendo desde as cobaias humanas até portadores de doenças, como a AIDS
(Síndrome da Deficiência Imunológica Adquirida) socialmente estigmatizadas.
Comumente, questões associadas à Bioética acabam atingindo grandes proporções e
são exploradas pela mídia. Um caso interessante é o de pessoas que são mantidas vivas,
em estados chamados vegetativos, em hospitais, graças à ação de “aparelhos” os quais, se
desligados, levam o paciente à morte.
E o que se pergunta é se se deve ou não desligar tais aparelhos, quem pode ou deve tomar
esse tipo de decisão e se é socialmente aceitável manter ou não um indivíduo indefinidamente
inconsciente preso ao leito hospitalar.
A questão fica ainda mais complicada quando se sabe que em países como o Brasil o
número de leitos hospitalares é insuficiente e os custos da assistência médica muito altos, tendo
o próprio Estado limitações nessa área. Por outro lado, se está tratando da vida das pessoas
e das emoções e crenças de seus familiares em uma cultura na qual se deseja conservar a
vida a todo custo.
Assim, o desenvolvimento de toda uma tecnologia médica voltada para a preservação da
vida é colocada em xeque. Mas, nessa mesma linha, acontecem situações bastante complicadas,
como a da preservação de corpos congelados (criobiologia – um ramo da criogenia) à espera
de que a ciência descubra a cura para a doença da qual o indivíduo era portador para, então,
ressuscitá-lo e proceder posterior tratamento do mal.
Mais comum é o caso da inseminação artificial, não pela reprodução assistida, mas pelo
contingente de embriões congelados que acabam sendo destruídos sem que a sociedade
tome conhecimento. No entanto, sem os embriões congelados, não é possível a reprodução
assistida, uma técnica fundamental para casais que não conseguem ter filhos.

256 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


Ciência, sociedade e ética
Do que estudamos até agora, parece que fica muito difícil se impor limites ao saber ou
à produção científica, o que leva na direção de que a ciência seria um saber não ético, no
sentido de que a ética, por definição, impõe limites. Eis o cerne de nossa aula: pode-se ou
deve-se impor limites à produção do conhecimento? Existe algum conhecimento que seja
naturalmente danoso?

Se somos pacifistas – e aqui vale à pena citar Einstein: “A paz é a única forma de nos
sentirmos realmente humanos” –, a produção do conhecimento para fins bélicos seria
naturalmente danosa. Armas químicas e biológicas ou nucleares representam para a sociedade
atual uma verdadeira Espada de Dâmocles, em que só a sua produção já implica um perigo Espada de Dâmocles
tremendo, pois existe o risco de “cair em mãos erradas”, como bem nos mostram os atentados
Quando se diz que alguém
terroristas que invadem os noticiários. Por outro lado, nações que não investem em sistemas “está sob a espada de
de segurança correm o risco de serem invadidas por potências hostis ou mesmo sofrerem Dâmocles” se quer dizer
os famigerados atentados terroristas. Desse modo, a decisão de realizar ou não pesquisas que, a qualquer momento,
algo de muito ruim pode
relacionadas com armamento envolve mais que posturas morais. acontecer a ela.

Como foi dito no começo, ao iniciar seu projeto de pesquisa, o cientista, em geral, não
pode garantir os rumos que esta irá tomar, ocorrendo que muitas vezes o projeto parece ganhar
vida própria, levando o cientista em direções totalmente distintas da que ele pensava. Mas,
existem também os projetos que envolvem grupos de pesquisadores os quais, de um modo
geral, sabem como guiar seu trabalho e aí ocorre que geralmente eles tentam atrair a simpatia
da sociedade, de grupos políticos ou de corporações para o seu trabalho. A parte visível dessa
atividade aparece algumas vezes nas propagandas que recheiam as revistas que lemos, na
forma de remédios mágicos, cremes irradiantes e bebidas rejuvenescedoras, tudo sob o selo
da ciência. Será que as propagandas que apregoam efeitos fabulosos são éticas?

Finalmente, podemos olhar o que ocorre com as ciências que estudam o espaço exterior.
De suas pesquisas, resultaram todo o sistema de satélites e comunicações que permite o
trânsito global das informações que varrem o planeta quase à velocidade da luz. Também
permitiu chegarmos a Marte e pensar em projetos mirabolantes, como torná-lo habitável
mudando sua atmosfera a partir da introdução em sua superfície de algas ou outros seres
que produzam oxigênio em grande escala. Mas, é lícito mudar outro planeta, quando não
resolvemos nossos problemas ambientais? Mesmo sabendo que “as intervenções no meio
ambiente exigem agora uma percepção científica e filosófica da sua organização acrescida de
preocupações éticas”? (CARVALHO, 1994, p. 47).

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 257


Atividade 5
Como você imagina o ambiente de trabalho de um cientista? Tente visualizar
a figura de um cientista. Faça um esboço (desenho) de como você o imagina e
escreva ao lado algumas características relacionadas à ética que esse profissional
deve ter.

A grande e, muitas vezes, questionada história de sucesso da ciência foi construída


por pessoas com características comuns (persistentes, pacientes, ambiciosas, inventivas e
intuitivas, preguiçosas, enérgicas, egoístas, de sorte, honestas), outras nem tanto, mas que,
tendo algo em comum, fizeram de fato as observações relatadas em seus escritos, o que
permitiu que outros, seguindo seus passos, reproduzissem seus resultados, acrescentando
novos dados e novas conclusões. Eram feios, bonitos, gordos, magros, portadores de grandes
habilidades manuais ou um desastre com as mãos que escolhiam instrumentos simples ou
sofisticados para suas observações. Procuraram desvendar o muito pequeno, o muito grande,
o que está por perto, o que está longe, o que tem vida, o que é inerte. Enfim, nos conduziram
a este porto em que agora nos encontramos. Foram salva-vidas, bons marujos, não muito
bons em bússola, pois na maioria das vezes não sabiam para onde iam, e isso nos tem dado
a sensação de que o barco muitas vezes esteve para afundar.

Olhamos a placa e vemos que o nome do “porto” é razão, poderia ter sido outro o nome
do “barco”, curiosidade, ou poderia ter sido outro, mistério; mas este é o nome do próximo
porto, ou será o nome do mar?

258 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, aprendemos o significado dos termos ética e moral e suas implicações
para a ciência e para a sociedade. Vimos também que a decisão do que é certo
ou não em ciência é muito difícil e que, finalmente, não podemos impor amarras
ao saber e ao conhecimento, pois eles não possuem donos.

Autoavaliação
Podemos dizer que a sociedade atual é uma sociedade tecnológica em que os
valores da ciência ocupam cada vez mais espaço em detrimento de outros valores
sociais. Escreva um texto (prosa, verso, conto, ou outro que você escolha) com
aproximadamente 30 linhas sobre os perigos de uma sociedade dependente da
tecnologia e da ciência sem as “rédias” da ética.

Referências
CARVALHO, Adalberto Dias. Utopia e educação. Porto – Portugal: Ed. Porto, 1994.

ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional: volume 9. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do


Brasil Publicações, 1981. v. 9.

GAROZZO, Filippo. Albert Einstein. São Paulo: Editora Três, 1974. p. 117. (Os homens que
mudaram a humanidade).

KITTEL, Charles; KNIGHT, W. D.; RUDERMAN, M.A.. Curso de física de Berkeley: mecânica.
Brasília: Editora Universidade de Brasília / Editora Edgard Blucher, 1965.

SILVA, Fernando Correia da. Osvaldo Cruz: médico, cientista: 1872 – 1917. Disponível em:
<http://www.vidaslusofonas.pt/osvaldo_cruz.htm>. Acesso em: 10 ago. 2005.

VALLS, Álvaro L. M. Ética na contemporaneidade. Disponível em: <http://www.bioetica.ufrgs.


br/eticacon.htm>. Acesso em: 10 ago. 2005.

Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade 259


Anotações

260 Aula 12 Ciências da Natureza e Realidade


Ciência, Tecnologia
e Sociedade

Aula

13
Apresentação

E
studaremos a tríade Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS). Para atenuar as dificuldades
de compreensão do tema proposto, consideramos pertinente abordar isoladamente
cada um dos itens nele implicados. Isso porque a sociedade atual, superficial e
consumista, vive imersa em uma ciência irreal para a grande maioria, a qual envolve átomos
e seus constituintes, moléculas, vôos espaciais, genes, DNA, chips, buracos negros, todos
decorrentes de descobertas científicas. Assim, enquanto a ciência busca através das suas
pesquisas a verdade, a tecnologia se rende à eficiência de suas máquinas. Enquanto a ciência
procura incessantemente formular as leis que regem a natureza, a tecnologia faz uso dessa
formulação para criar as ferramentas que permitam ao homem reger a natureza. No entanto,
ciência e tecnologia buscam caracterizar os sistemas que constituem o universo complexo
a partir das ações de agentes, instituições, produtos, conhecimentos, técnicas, entre outras,
tendo a frente o ser humano, principal articulador na busca por desvendar a natureza como
representante da sociedade.

Objetivos
Permitir a você:

discernir e evidenciar a interdisciplinaridade existente


1 entre Ciência, Tecnologia e Sociedade;

identificar as diferentes revoluções que conduziram a


2 sociedade ao estágio atual de desenvolvimento;

conhecer os diferentes modos de conceituar Ciência,

3 Tecnologia e Sociedade, a fim de que possa idealizar


suas próprias definições;

evidenciar a evolução da tríade abordada.


4

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 263


Compreendendo a Ciência, a
Tecnologia e a Sociedade
Essa tríade é ao mesmo tempo anciã e moderna, relativa à evolução cultural, científica e
tecnológica vivida em diferentes épocas pela humanidade.

Com o intuito de aferirmos seu grau de discernimento a respeito do tema em questão,


solicitamos que você leia com bastante atenção a reportagem a seguir, extraída do jornal A Seca,
pois será importante para compreendê-lo melhor. Em seguida, responda às atividades propostas.

No Município de Imagens, sertão do Brasil, a água extraída dos poços perfurados


apresenta alta salinidade, o que a torna imprópria ao consumo humano. Após a visita
de técnicos, o Ministério dos Recursos Hídricos anunciou a liberação de verbas para a
Fundação Pró-Água, a fim de que ela constitua uma comissão de profissionais capazes
de: comprovar, caracterizar e resolver definitivamente o problema que há muito tempo
vem prejudicando a população do Município.
Repórter a Distância: NilknarfFonte: Fictícia.

Atividade 1
Existe um problema? Caso a sua resposta seja afirmativa, caracterize- o.
1 Ele exige solução imediata? Como se pode resolvê-lo?

Um profissional da Química contratado pela Fundação Pró-Água coletou


2 amostras da água e comprovou a sua salinidade através de métodos
físico-químicos de análises. Em seu relatório, falou da existência de
vários métodos de purificação da água e caracterizou alguns deles.
Mas, recomendou a utilização do método de osmose reversa para
dessalinizar a água do Município, por sua eficiência e custo reduzido.
O que fez o químico para chegar a essa conclusão?

Devido à extensão, à densidade populacional e ao número de poços


3 perfurados pela prefeitura com o intento de beneficiar a todos os
cidadãos do Município, a Fundação Pró-Água contratou os serviços de
dois profissionais da engenharia: um químico e um mecânico. De posse
do parecer do primeiro, os dois desenvolveram o projeto de construção
de um dessalinizador para ser testado em um dos poços. O que você
conclui a respeito do trabalho desenvolvido pelos engenheiros?

264 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Como o teste realizado realmente transformou a água salobra em água
4 potável, os engenheiros patentearam o dessalinizador e negociaram
a sua produção em escala industrial. Qual o objetivo dessa última
etapa do trabalho?

O que você conclui a respeito do conjunto de atividades


5 trabalhadas anteriormente? Sucintamente, que denominação você
atribui a sua conclusão?

Mapa conceitual das atividades

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 265


Evolução da Ciência, da
Tecnologia e da Sociedade
Três características distinguem o homem dos animais: o pensamento abstrato e sua
capacidade conceitual; a linguagem; e o uso de ferramentas. Todas decorrentes do aumento
progressivo do seu cérebro. No entanto, essas características não evoluíram ao mesmo tempo,
sendo o primeiro impulso da progressão humana a adaptação à locomoção bípede, de ordem
puramente anatômica.Os paleontólogos reconhecem como eventos fundamentais da evolução
humana a origem da terrestrealidade (migração das árvores para o chão), a bipedia (andar
ereto apoiado em duas pernas), a encefalização (aumento do volume do crânio em relação
ao tamanho do corpo) e a cultura (hábitos, costumes e socialização, que deram origem às
grandes civilizações).

Passados milhares de anos, a utilização de ferramentas, a linguagem e o pensamento


intelectual do homem evoluíram, inicialmente, de maneira imperceptível. Mas, no decorrer
dos séculos, os indivíduos aprimoraram-se de forma contínua e rápida, o que não aconteceu
em relação às demais espécies. Como vemos, o desenvolvimento biofísico de uma única
espécie animal, a Homo sapiens, se deu devido à utilização de elementos exteriores ao reino
animal, como: o uso do fogo e a produção de ferramentas (facilmente substituíveis, passíveis
de aperfeiçoamento e utilizadas na luta pela preservação e manutenção da vida). Devemos,
ainda, acrescentar a última etapa da evolução humana: a invenção da escrita – símbolos
visíveis, permanentes e correlacionados aos sons breves e decorrentes da linguagem falada.
Esses eventos marcam o início da primeira era da civilização, as origens da ciência e as bases
de um progresso técnico e ininterrupto, a ponto de consolidar a humanidade como unidade
organizada, responsável por sua própria vida.

266 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Assim, ao evoluir, o homem, motivado pela sua curiosidade, desenvolveu a capacidade
de observar, problematizar, estabelecer hipóteses, experimentar, analisar resultados e propor
soluções para os problemas com os quais se depara – atributo da ciência. Ao implementar
a produção e o uso de ferramentas, dominar o fogo e desenvolver práticas metalúrgicas,
desencadeou a primeira revolução tecnológica. Ao passar por processos, adaptativos, sofreu
transformações que o levaram de um primata desenvolvido ao homem moderno. Também,
no decorrer da evolução humana, a mulher ganhou status na sociedade emergente, devido
não somente a sua capacidade de fecundar, mas, sobretudo, por ajudar o homem na luta
pela vida, permitindo o surgimento da família. A expectativa de vida do homem ampliou-se
e o crescimento populacional evoluiu, originando grandes aglomerados, o que configurou a
expansão da sociedade.

Origens da Ciência
A ciência sempre existiu?

A resposta para essa questão pode assumir ares afirmativos ou negativos. Ela só depende
do que você entende por ciência. As primeiras civilizações estudavam os temas que hoje são
considerados científicos. Por exemplo, a revolução Neolítica ocorreu há cerca de dez mil
anos e, com ela, se deu a invenção da agricultura e de outras atividades artesanais. Hoje, os
agrônomos, profissionais qualificados que trabalham com a agricultura, são considerados
cientistas. No entanto, há 700 anos a.C., o poeta grego Hesíodo, em sua obra Os Trabalhos
e os Dias, fez uma mítica narrativa de como a agricultura se desenvolvia na sua época, aqui
resumida nos versos que seguem:

Ao despertar das Plêiades, filhas de Atlas, dá início à colheita, e ao seu recolher, à


semeadura.
Ordenai a vossos escravos que pisem, em círculos, o trigo sagrado de Deméter, tão logo
surja a força de Orion, em local arejado e eira redonda.
Quando Orion e Sirus alcançarem o meio do céu, e que a Aurora dos dedos de rosa conseguir
enxergar Arcturo, então, Perseu, colhe e leva para casa todos os cachos de uvas.
(SIMAAN; FONTAINE, 2003, p. 16)

Observe que ainda hoje, em muitos recantos do mundo, o processo de colheita e de


beneficiamento do trigo segue os passos descritos nos versos de Hesíodo. Portanto, podemos
afirmar que a ciência existia não como método, mas como prática.

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 267


Atividade 2
Na sua região, a agricultura é comparável à descrita nos versos de Hesíodo
ou está mais próxima da agricultura moderna que utiliza tratores e colheitadeiras
computadorizadas? Você é capaz de justificar sua resposta?

Você já experimentou pensar em ciência? Em penetrar, ser parte integrante e ativa do


mundo científico? No texto a seguir, adaptado do livro A Tabela Periódica (LEVI, 1994, p. 226),
veremos o quanto esse mundo é mágico.

Nosso personagem, pois, jaz há centenas de milhões de anos ligados a seus amigos
mais íntimos, Oxigênio e Cálcio [...]. A certo momento da história, um golpe de picareta
o destacou e o encaminhou para o forno de cal, precipitando-o no mundo das coisas que
mudam. Foi aquecido a fim de separar-se do Cálcio, ainda firmemente agarrado a dois
daqueles três amigos Oxigênios de antes, escoou pela chaminé e tomou o caminho do
ar. Sua história, de imóvel, fez-se tumultuosa.
[...] Dissolveu-se por três vezes na água do mar, uma vez na água de uma torrente
em cascata, e ainda foi expulso. Viajou com o vento por vários anos: ora alto, ora baixo,
sobre o mar e entre as nuvens, sobre florestas, desertos e imensidões desmedidas de
gelo; depois se viu capturado na aventura orgânica.
De fato, trata-se de um elemento singular: é o único que liga-se a si mesmo
formando longas cadeias estáveis sem grande dispêndio de energia, e para a vida na
terra (a única que até agora conhecemos) se necessita justamente de longas cadeias.
[O átomo de que falamos, na companhia de seus dois satélites, foi então conduzido
pelo vento, ao longo das videiras do vale do São Francisco. Teve a fortuna de roçar uma
folha, nela penetrar e ser fixada por um raio de sol.]
Adere a uma grande e complicada molécula que o ativa, e simultaneamente recebe
a mensagem decisiva do céu sob a forma fulgurante de um feixe de luz solar: num
instante, como um inseto prisioneiro da aranha, é separado de seu oxigênio, combinado
com o hidrogênio e (acredita-se) o fósforo, e por fim inserido numa cadeia; longa ou
curta, não importa, é a cadeia da vida. Tudo isto acontece rapidamente, em silêncio, sob
a temperatura e a pressão da atmosfera, e grátis: caso você desvende como operar essa
transformação, terá resolvido o problema de fome no mundo.
[...] esta química fina e elegante se deu pela primeira vez, há dois ou três bilhões
de anos [...]. (LEVI, 1994, p. 226)

268 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 3
Após a leitura científica do texto de Primo Levi, responda às seguintes
questões.

De qual elemento o texto fala?


1
Que título você atribui ao texto lido?
2
Você caracteriza esse texto como científico? Justifique sua resposta.
3
Estabeleça em termos de ciência as diferenças existentes entre o texto
4 de Primo Levi e os versos de Hesíodo a respeito da agricultura.

Conceito de Ciência
A ciência é apenas uma fração da tentativa da humanidade de compreender o mundo em
todos os seus aspectos. Descreveremos a seguir algumas das suas definições gerais.

 Sentido usual: toda espécie de conhecimento.

 Sentido antigo: conhecimento racional que versa sobre a essência do real (por oposição
à opinião).

 Sentido moderno: conhecimentos discursivos que estabelecem relações ou leis necessárias


entre os fenômenos estudados e reúnem nas teorias essas relações ou leis.

Por sua vez, Russ, em seu Dicionário de Filosofia (1994, p. 35), apresenta afirmações de
alguns filósofos sobre a ciência.

 Platão: “A ciência não reside nas impressões, mas no raciocínio sobre as impressões,
pois é por esta via, parece, que se pode atingir a essência da verdade.”

 Descartes: “Toda ciência é um conhecimento certo e evidente.”

 Bernard: “A ciência [...] consiste em encontrar as causas próximas dos fenômenos, isto
é, suas condições materiais de existência.”

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 269


 Russel: “Ciência, como a palavra indica, significa antes de tudo conhecimento; por
convenção, entende-se por ciência um conhecimento de espécie particular, notadamente
o que pesquisa as leis gerais que unem certo número de fatos particulares. Pouco a pouco,
contudo, a concepção de ciência, enquanto conhecimento, foi posta em segundo plano, para
dar lugar à concepção de ciência como meio que confere o poder de manipular a natureza.”

 Lutzenberger (2005), por sua vez, afirma

A Ciência – com C maiúsculo – é um diálogo limpo com o Universo, ou seja, com


a Natureza. Ela se apóia no postulado de que o Universo não é caótico. Não existem
milagres, mistérios insondáveis sim. As leis do comportamento da Natureza são
universais, imutáveis e intransgredíveis. Quer dizer que as leis da física são as mesmas
na galáxia longínqua que está a bilhões de anos-luz de distância, eram as mesmas quando
partiu de lá a luz que hoje observamos e que levou bilhões de anos para aqui chegar, e
serão as mesmas enquanto durar o Universo. E, se alguém nos contar que conhece um
lugar onde os rios correm montanha acima e a chuva sobe do solo ao céu, não precisamos
perder tempo para ir verificar.

Nesse contexto, o homem esforça-se por descobrir, compreender e estabelecer uma


ordem no fluxo de experiência, quer essa ordem seja observada, como em um fenômeno natural
(a repetição das estações do ano ou os períodos de seca no Nordeste, por exemplo), quer seja
postulada por teorias refinadas, como as da relatividade, mecânica quântica e evolução. Ela
pode ser visualizada sob dois pontos de vista: ciência in posse (ciência já feita, já construída)
e a ciência in fieri (ciência em movimento, em construção). Você, certamente, já está
familiarizado(a) com a primeira forma – é a disciplina ministrada pelo professor. Nesse caso,
cabe ao aluno assimilá-la com a finalidade de submeter-se aos processos de avaliação: trabalho
escrito, seminário, prova oral e escrita, entre outros. Por sua vez, a ciência em construção é
aquela desenvolvida pelo cientista a partir de processos investigativos, observando o método
científico. Normalmente, quando da sua conclusão, os resultados obtidos são apresentados
em congressos e publicados em revistas de divulgação científica na forma de artigo escrito.

Origens da Tecnologia
A tecnologia sempre existiu?

Sim, a tecnologia sempre existiu. Logicamente, a partir do momento em que o ser


humano povoou a Terra. Ela pode ser vista como o empreendimento decorrente da construção
de artefatos e organização de trabalho para satisfazer às necessidades humanas. Portanto,
as ferramentas simples utilizadas pelos homens das cavernas são vistas como artefatos
tecnológicos.

O fogo foi outro elemento essencial à evolução da tecnologia humana, obtido pelo homem
primitivo através de um dos modos mencionados a seguir (CASCUDO, 2004, p. 168):

270 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


 um raio incendiou a árvore e ele aproveitou a chama, prolongando a sua existência com
material combustível;

 retirando-o das lavas ardentes de um vulcão e perpetuando-o, a partir de materiais


combustíveis de origem vegetal;

 percutindo pedra sobre pedra para fazer uma acha.

O domínio do fogo pelo ser humano foi a origem da primeira grande revolução tecnológica.
Lembramos que ainda hoje, em pleno século XXI, o fogo continua sendo a principal fonte de
energia do mundo. Ele foi conhecido pelo homem primitivo há quatrocentos mil anos. O
primeiro ancestral a conhecê-lo foi o Homo erectus, que deixou vestígios do seu uso nas
cavernas do Homem de Pequim. A verdade é que quando o homem apareceu na sua versão
sapiens, o fogo já assava a carne e clareava as grutas por ele habitadas há mais de 8 mil
séculos. Assim, o fogo serviu como elemento de agregação da raça humana e foi utilizado
para fixar, auxiliar e defender os primeiros agrupamentos humanos.

Por sua vez, o homem, na versão batizada por Bérgson (JANET, 1935 p. 7) de Homo faber,
passou a tirar proveito da iluminação das cavernas para execução de trabalhos noturnos como:
tratamento de peles e couro, o fabrico de armas e colares, pinturas rupestres, entre outros.

Com o decorrer dos séculos, uma outra revolução tecnológica estava prestes a acontecer,
como descreve o soneto Lápide, do poeta e escritor paraibano Ariano Suassuna, citado por
Trancoso (2005).

Lápide (com tema de Virgílio, o Latino,e de Lino Pedra-Azul, o Sertanejo)


Quando eu morrer, não soltem meu Cavalo
nas pedras do meu Pasto incendiado:
fustiguem-lhe seu Dorso alardeado,
com a Espora de ouro, até matá-lo.

Um dos meus filhos deve cavalgá-lo


numa Sela de couro esverdeado,
que arraste pelo Chão pedroso e pardo
chapas de Cobre, sinos e badalos.

Assim, com o Raio e o cobre percutido,


tropel de cascos, sangue do Castanho,
talvez se finja o som de Ouro fundido

que, em vão – Sangue insensato e vagabundo —


tentei forjar, no meu Cantar estranho,
à tez da minha Fera e ao Sol do Mundo!

(SUASSUNA, 2005)

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 271


Atividade 4

De qual revolução trata o soneto lido?

Ainda hoje, em nossa região, como também em várias outras regiões do mundo, o fogo
é bastante utilizado como fonte de aquecimento, de cozimento de alimentos, como forma de
afugentar animais, limpar terrenos (as queimadas), em processos de secagem e endurecimento
de madeira, no cozimento de cerâmicas e em vários outros processos.

Outra grande revolução tecnológica se dá quando o fogo é casualmente posto em contato


com uma classe de material, até então desconhecida, os metais. Os três metais inertes com
maior possibilidade de ser encontrado em estado natural na crosta terrestre são o cobre, a
prata e o ouro. Não estamos com isso afirmando que é fácil encontrá-los, já que, até mesmo
entre os metais, eles são raros. Entretanto, associamos as suas raridades a própria palavra
metal, que em grego significa procurar. Tal descoberta representa um salto sem precedentes
na escalada tecnológica do homem. A extração de metais a partir de suas escórias se deu há
mais de 7 mil anos na Pérsia e no Afeganistão, em torno do ano 5 mil a.C. O primeiro metal a
ser extraído, o cobre, fluía a partir de pedras verdes de malaquita [Cu2CO3(OH)2] submetidas
diretamente ao fogo. Dada a ductilidade do cobre, o homem vivenciou ansiosamente a etapa
seguinte dessa revolução tecnológica: a obtenção de um metal duro com fio da borda cortante.
Surgiu, assim, no Oriente Médio, em 3800 a.C., o bronze, liga metálica constituída de cobre,
podendo conter até 15% de estanho.

A fundição do ferro se deu posteriormente à do cobre. Evidências da sua utilização


prática foram encontradas nas pirâmides do Egito, o que lhe confere uma idade anterior a
2500 a.C. Os grandes difusores desse metal foram os hititas, habitantes de região da Anatólia,
próxima ao Mar Negro, por volta de 1500 a.C. A importância do ferro como metal foi marcada
pelo surgimento do aço (liga de ferro e carbono) em torno de 1000 a.C., na Índia. Assim, o
homem conseguiu dar maior consistência ao ferro dopando-o com carbono para produzir a
liga metálica, ainda hoje, mais utilizada no mundo.

Hoje, quando falamos de tecnologia, pensamos em máquinas complicadas como o


computador, foguetes, celulares, como também na instrumentação cirúrgica que permite a
realização de cirurgias a distância, entre outros. No entanto, a tecnologia sempre fez parte do
mundo do Homo sapiens, mesmo antes das máquinas mencionadas neste parágrafo serem
inventadas. Na realidade, as máquinas com as quais interagimos hoje, decorrem da evolução
dos feitos tecnológicos de ontem.

272 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 5
Quais são as utilidades do fogo na sua região? Qual a fonte combustível
mais utilizada? Trata-se de uma fonte renovável?

Conceito de Tecnologia
A palavra tecnologia (do grego: techne) significa arte ou habilidade. Percebemos, assim,
que a tecnologia é uma atividade essencialmente prática que consiste mais em alterar, com o
objetivo de aperfeiçoar, do que em compreender os sistemas.

Ao consultarmos Lalande (1993, p. 1111), verificamos que tecnologia é o estudo


dos procedimentos técnicos, naquilo que eles têm de geral e nas suas relações com o
desenvolvimento da civilização.

Segundo Lutzenberger (2005),

a Tecnologia aproveita-se dos conhecimentos, das informações que o diálogo limpo deu
à Ciência para fazer artefatos, instrumentos. Ora, todo artefato serve a alguma vontade, a
do inventor ou de seu patrão. Isto tem a ver com poder, por pequeno ou grande que seja.
É uma atitude impositiva, é o contrário da atitude básica da Ciência, que é contemplativa.

Muito embora no mundo atual vivamos envoltos pela tecnologia, a sua definição é tarefa
extremamente complexa. Por exemplo, podemos dizer que tudo aquilo que é fabricado pelo
homem, e não pela natureza, é tecnologia. No entanto, essa definição torna-se muito simples
em uma discussão envolvendo profissionais da Engenharia Genética. Se os genes de certa
variedade de cana-de-açúcar são fabricados por um cientista, esta cana será natural ou
artificial?

A tecnologia também pode ser definida como todo utilitário fabricado pelo homem para
ajudá-lo nas tarefas a serem empreendidas no seu ambiente natural. Essa definição permite
a inclusão de instrumentos, como: parafusos utilizados na construção de casas, móveis e
equipamentos em geral, assim como um simples zíper, componente dos jeans e de vestimentas
diversas.

O principal objetivo da tecnologia é aumentar a eficiência da atividade desenvolvida, hoje,


pela máquina comandada pelo homem em todas as esferas, incluindo a da produção.

Na atualidade, sempre associamos a palavra tecnologia a invenções modernas como:


computador, celular, DVD, satélites, entre outros. Entretanto, também devemos associá-la a
invenções simples, como: o abridor de latas, o martelo, a cunha e muitas outras. Algumas
dessas tecnologias serão trabalhadas nas disciplinas de Física e Química a serem cursadas
nos semestres vindouros.

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 273


Atividade 6
Identifique, dentre as riquezas de seu município, as que podem ser utilizadas
na geração de tecnologia.

A Sociedade: origem e conceitos


A palavra sociedade, do latim societas, tem como significado uma associação amistosa
entre pessoas que constituem um grupo. Visto que societas se deriva de socius, cujo significado
é companheiro, observamos que o termo sociedade tem correlação com o que é social, o que
faz com que seus membros compartilhem as facilidades ou dificuldades mútuas, decorrentes
de um objetivo comum.

Tendo em vista que grande parte dos seres não conseguem sobreviver isolados, mas
unicamente em sociedade, e que as sociedades humanas são compostas por redes complexas
de ritos e costumes, desde muito cedo, os pensadores orientais e ocidentais se pronunciaram
a respeito do termo sociedade. Alguns deles apresentamos a seguir:

 Aristóteles (s.d., p. 18): definiu o homem como um animal sociável;

 Rousseau (FURLAN, 2004, p. 17): definiu a sociedade como um conjunto de grupos


fragmentários, de “sociedades parciais”, onde a vontade de todos nasce do conflito de
interesse, em contraposição ao Estado que se exprime numa vontade geral, originária
da relação Estado-indivíduo e por ele considerada como única autêntica, sem nenhuma
interposição ou desvirtuamento por parte dos interesses representados nos grupos
sociais interpostos.

 Auguste Comte (1852, p. 154): “a sociedade repousa permanentemente sobre uma livre
concorrência, nela não existem transações duráveis e modificações legítimas, exceto
as que resultam de consentimento voluntário de diversos cooperadores.” Quanto a sua
organização, pode ser: igualitária, totalitária, permissiva, religiosa ou laica; quanto a sua
acessibilidade a outros grupos: fechada ou aberta.

Esse último conceito nos faz viajar no tempo e antever que as criações humanas são
produtos de uma estrutura genealógica complexa decorrente de influências culturais e esforços
conjugados pela sociedade. Do ábaco ao computador, do 14 Bis à nave espacial, é à sociedade
humana que devemos atribuir a capacidade analítica de criar e inventar e que a torna distinta
das outras sociedades animais.

274 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 7
Trabalho de Pesquisa na Internet.

Levando em consideração a afirmação de Auguste Comte, busque


1 o significado de sociedade quanto a cada uma de suas formas de
organização e acessibilidade.

Como você caracteriza a sociedade da qual faz parte quanto à


2 organização e à acessibilidade?

Em sentido concreto e amplo, a sociedade é definida como um grupo de indivíduos


que primam entre si pelo estabelecimento de relações organizadas e serviços recíprocos.

Atividade 8
Levando em consideração o sentido concreto de sociedade, forneça alguns
exemplos de agrupamentos sociais.

Em sentido estrito: uma sociedade é constituída por um grupo de pessoas que


compartilham propósitos, sentimentos, preocupações, usos e costumes, e que efetivamente
interagem entre si, dando origem a uma comunidade. A sociedade é o objeto de estudo das
ciências sociais, especialmente da Sociologia.

Pessoas de nações distintas, unidas por tradições, crenças, ideais ou valores políticos e
culturais comuns, em certas ocasiões são vistas como uma sociedade (por exemplo, Judaico-
Cristã, Oriental, Ocidental etc.). Quando usado nesse contexto, o vocábulo tem por objeto
comparar duas ou mais sociedades, cujos membros representativos se caracterizam por
possuírem visões de mundo alternativas, competidoras e conflitantes.

Algumas definições particulares dadas ao termo sociedade são fornecidas a seguir


(RUSS, J., 1994, p. 276):

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 275


 Saint-Simon: “A sociedade não é uma simples aglomeração de seres vivos, cujas
ações independentes de todo objetivo final não têm outra causa senão o arbítrio das
vontades individuais [...]; a sociedade, ao contrário, é, sobretudo, uma verdadeira
máquina organizada, cujas partes contribuem de uma maneira diferente para a marcha
do conjunto.”

 Morin: “A sociedade, concebida como organização complexa de indivíduos diversos,


fundada ao mesmo tempo na competição e na solidariedade, comportando um sistema
de comunicações rico, é um fenômeno extremamente difundido na natureza.”

As revoluções
industriais modernas
A idéia de ciência como empreendimento social surgiu com a Revolução Industrial, na
Inglaterra, iniciada por volta de 1750, perdurando até 1880. As invenções decorrentes dessa
revolução foram resultantes de experimentos empíricos, produtos do engenho artesanal e de um
trabalho árduo e intenso de pessoas comprometidas com o desenvolvimento industrial. Durante
esse período, as invenções não foram tantas, mas foram determinantes para o desenvolvimento
tecnológico do mundo, sobretudo, no que diz respeito ao seu principal implemento, a máquina
a vapor, desenvolvida por empresários habilidosos que só empregaram ocasionalmente os
métodos científicos, já que seus conhecimentos científicos eram limitados. A medicina, por
sua vez, progrediu principalmente no que diz respeito à higiene a ao combate das epidemias,
fazendo surgir a vacina contra a varíola e aumentando a esperança de vida.

Foram características dessa revolução:

 a utilização de carvão como fonte combustível;

 o surgimento de transportes e, portanto, de uma economia regional;

 a emersão da racionalidade e o recuo dos mitos e da religião como referência social;

 a supremacia do capital, o que acentua as desigualdades sociais;

 os primeiros êxitos da medicina no campo de vacinação.

276 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


O paradigma aqui em evidência é o da representação, o homem conhece e observa a
realidade do meio em que está inserido. Ele é o ser dominante, tem a solução para os problemas
reais que surgem no seu dia-a-dia.

Uma outra revolução industrial se dá entre 1880 e 1975, tendo como característica as
primeiras utilizações da informação. O homem aprende a lidar com a energia elétrica, o que faz
da máquina a vapor um instrumento obsoleto. As principais características dessa revolução são:

a utilização da eletricidade como fonte de energia;

 o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos transportes e o surgimento de economias


nacionais;

 a racionalização sistemática;

 o aumento da produtividade industrial e a diminuição das desigualdades;

 o desenvolvimento da medicina preventiva com diagnósticos precisos e dos tratamentos


médicos.

Nesse caso, o paradigma dessa revolução liga o desenvolvimento social à ascensão de


uma indústria agora movida a energia elétrica sem levar em conta as alterações impingidas à
natureza. Trata-se, pois, do domínio da natureza pelo homem.

A partir de 1975, uma nova revolução se processa, a da Informação, evidenciada por


Goordon Moore, um dos fundadores da Intel, em 1968. Em um artigo publicado na revista
Eletronics Magazine, no final da década de sessenta, ele evidencia, após a invenção do circuito
integrado em 1958, a duplicação anual do número de transistores por unidade de superfície
do processador, principal constituinte do computador (DELAHAYE, 2001). Estimou, ainda, que
essa duplicação perduraria dez anos.

Moore, em 1975, refez seu prognóstico. A partir da análise das dificuldades tecnológicas
presentes, anunciou que daquele momento em diante, uma duplicação do número de
transistores por unidade de superfície dos processadores se daria a cada dois anos.

Essas afirmações ficaram conhecidas como Leis de Moore. Não se trata de leis
matemáticas ou físicas, mas de simples regras hipotéticas que permitem avaliar a evolução
dos computadores. Elas foram marcantes para o desenvolvimento da informática, visto
que serviram como desafio a ser vencido pelos fabricantes de microprocessadores e, mais
particularmente, para a Intel.

Vamos agora desenvolver um pequeno cálculo para testarmos a veracidade da Lei de


Moore, na sua segunda versão. O processador Intel-4004, de 1971, possuía 2300 transistores
por unidade de superfície. Por sua vez, o processador Intel-Pentium 4, lançado no final de 2000,
já possuía 42 milhões de transistores. Da relação 42.000.000/2.300 resulta o fator 18.261, que
demonstra a ocorrência da evolução dos processadores em 29 anos e que nos permite estimar
o fator: 18.261(2/29) = 1,97; valor bem próximo do fator 2 previsto por Moore.

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 277


Atividade 9
O que você conclui a respeito da lei de Moore?

A revolução da informação caracteriza-se pelo fato de ter motivado a ocorrência de fatos


extremamente significativos, como:

 priorização e valorização da informação em todas as áreas de atuação;

 surgimento de uma economia globalizada hiperconcorrida;

 aumento do grau de complexidade dos sistemas e das tomadas de decisões;

 aumento das desigualdades sociais;

 melhoria da saúde (expectativa de vida) e do conforto (moradia), bens ainda não acessíveis
à classe pobre.

O paradigma associado à revolução da informação arrola o mundo virtual das imagens e


dos dados globais, disponíveis a qualquer momento. Eles representam a realidade a partir da
qual se estabelece o tipo de estratégia a ser desenvolvida na resolução de problemas.

Podemos, assim, associar o desenvolvimento tecnológico do mundo moderno a quatro


períodos distintos da evolução humana, sendo estes:

 < 1750 – desenvolvimento de uma tecnologia não científica;

 1750 – 1880, no qual o homem começa a manipular tecnicamente a energia;

 1880 – 1975, no qual o homem através da tecnologia começa a manipular os mecanismos


associados à produtividade;

 >1975, desenvolvimento de uma tecnologia associada à informação.

278 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Ciência, Tecnologia e Sociedade
Quem não se encanta com o professor Pardal, conselheiro científico do Tio Patinhas,
que com as suas invenções protege a famosa moeda número um, pertencente ao velho pão
duro, dos meliantes irmãos Metralha? Dentre suas patentes, duas merecem especial atenção,
seu assistente Lampadinha, robô que pensa e age como ser humano, considerado sua maior
invenção, e o oralicóptero, engenho cuja propulsão se dá a base de “quacs” do Pato Donald,
sobrinho dileto do quaquilionário Patinhas. A evolução dos inventos de Pardal, no decorrer
das várias edições da revista Tio Patinhas, pode servir como marco fundamental na idealização
da imagem mental estabelecida pelo público leitor a respeito da relação que envolve a tríade
CTS, da qual passaremos a falar.

A Ciência e a Tecnologia evoluíram eficazmente a partir da segunda metade do século XX,


fruto, entre outras coisas, da Guerra Fria ocorrida entre os Estados Unidos e a União Soviética,
o que contribuiu para o surgimento de um novo campo de investigação científica associado ao
domínio da Sociologia denominado Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), amplo movimento
de repercussão mundial que vem influenciando a metodologia do ensino de ciências há mais
de três décadas. A sua finalidade maior é instruir o cidadão, visando a sua participação efetiva
em assuntos correlacionados à ciência e à tecnologia que contribuam efetivamente para a
promoção do bem-estar social.

Muito embora tenhamos falado de ciência, tecnologia e sociedade separadamente,


observamos em diferentes momentos da história que essa tríade sempre evoluiu em conjunto.
Isso nos permite concluir que a separação entre as Ciências da Natureza e as Ciências
Humanas, cultuada no início do século XX, é forçada, e se efetivamente quisermos evoluir
cientificamente, devemos pregar uma assimilação de conhecimento sistêmica e voltada para
um desenvolvimento sustentável.

Interdisciplinar, esse domínio é extensamente explorado por cientistas de todos as áreas


da ciência, sejam eles filósofos, especialistas em ciência da natureza, historiadores, sociólogos,
algumas vezes, até mesmo por políticos e economistas. Porém, grande parte da sociedade vive
alheia aos fatos científicos do dia-a-dia. Para se ter uma idéia, Candotti destaca que mais de
cem milhões de brasileiros não são alcançados por nenhum método de divulgação científica,
situação que é preciso reverter (INVERNIZZI, 2005, p. 1). No entanto, para atenuar o quadro
descrito não basta disseminar a informação científica no seio da sociedade. Antes de tudo,
é necessário alfabetizá-la cientificamente, a fim de que ela possa interagir com a informação
científica de forma significativa.

Para compreendermos melhor o significado do que seja alfabetização científica, vamos


praticá-la fazendo uso do texto que trata a respeito de duas boas razões para se tomar banho,
extraído do livro A ciência na vida cotidiana (INGRAM, 2004, p. 55). Diz o texto:

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 279


Ao se baixar para entrar na banheira Arquimedes, um dos grandes matemáticos
ocidentais, compreendeu que estava experimentando a solução de um problema que
muito lhe afligia, gritando Heureka! Heureka! (Achei!). Ele não poderia nem de longe
imaginar que seria mais lembrado pela exclamação de euforia do que pela resolução do
problema. Imagino que ele tenha corrido para casa para escrever a solução, mas essa
parte da história nunca foi narrada.

O problema lhe tinha sido apresentado pelo rei Hierão, soberano de Siracusa
e seu amigo íntimo. O rei havia recebido de presente uma coroa de ouro, mas tinha
certa desconfiança de que o ourives o tinha enganado e colocado prata na liga. Essa
contaminação não teria sido visível e o problema era como determinar se, de fato, havia
prata na coroa.

Presume-se que Arquimedes tenha descoberto a resposta enquanto entrava no


banho, compreendendo que o volume de água que extravasou a banheira quando da
sua entrada tinha de ser igual ao volume da parte do seu corpo que estava submersa.
Supostamente, esse momento de discernimento inspirou Arquimedes a pensar no teste
crucial que confirmaria ou negaria a pureza da coroa.

Arquimedes sabia que o ouro é mais denso do que a prata, de modo que o volume
de uma coroa feita de ouro puro seria menor que o de uma coroa de mesmo peso que
contivesse ouro e prata. Visto que havia uma única coroa, a que estava em discussão, com
o que ela poderia ser comparada? É daí que a banheira se torna útil já que uma peça de
ouro que pese um quilo, quando depositada em uma banheira, deslocará o mesmo volume
de água, seja ela uma massa informe ou uma coroa delicadamente trabalhada. Arquimedes
precisava apenas encontrar uma peça de ouro que tivesse o mesmo peso da coroa e depois
comparar o volume de água deslocado por cada uma delas.

Assim, Arquimedes comprovou a fraude do ourives que fabricou a coroa.


Provavelmente você já deve ter imaginado a pena estabelecida por Hierão para o
famigerado meliante.

HEUREKA!!

280 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Atividade 10
A partir da leitura realizada, verificaremos seu grau de discernimento quanto
à compreensão do texto. Para isso, assinale a resposta correta correspondente
às duas primeiras questões.

1 Qual a nacionalidade de Arquimedes?

a) Egípcio;
b) Grego;
c) Romano;
d) Árabe.

A propriedade física que permitiu Arquimedes comprovar a adulteração


2 da coroa real foi

e) a viscosidade da água;
f) a densidade da água;
g) a densidade dos metais;
h) a dureza dos metais.

3 Justifique literalmente a resposta dada à questão anterior.

Buscamos com isso demonstrar que a exclusão social em relação à informação e à


cultura ainda é grande o suficiente para que a sociedade assimile os progressos científicos e
tecnológicos que têm ocorrido no mundo em evolução. Dessa forma, assimila e externa melhor
a ciência quando chamada a opinar a respeito dos temas científicos em evidência, com base
nos conhecimentos adquiridos através das práticas educativas tão bem expressas nos PCN’s
para os Ensino Fundamental e Médio.

Por fim, lembramos que a educação e a alfabetização científicas são processos voltados
não somente para a aquisição do conhecimento acumulado pela ciência. Mas também, para
a auto-afirmação do cidadão autônomo, capaz de visualizar em escala histórica os grandes
problemas que vêm assolando a sociedade, como também tomar parte no debate e se empenhar
em resolvê-los.

Desde já, esperamos que a partir deste momento você seja capaz de formular a sua
própria definição do que seja Ciência, Tecnologia e Sociedade.

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 281


Resumo
Nesta aula, você tomou conhecimento das origens e conceitos associados
à Ciência, à Tecnologia e à Sociedade. Ao ler a respeito do desenvolvimento
intelectual do homem, aprendeu que as duas primeiras grandes revoluções
tecnológicas desencadeadas por ele foram as associadas ao domínio do fogo
e ao domínio da produção de metais. Atingida a sua maturidade científica,
o homem foi capaz de produzir a máquina a vapor, dominar a eletricidade e
evoluir progressivamente para o domínio da informação através do fabrico de
computadores. Muito embora a ciência no último século tenha evoluído mais
do que em toda a existência da humanidade, e com isso tenhamos alcançado
níveis tecnológicos importantes nas áreas de medicina, comunicação, biologia,
novos materiais e na indústria armamentista, grande parte da sociedade padece
de necessidades básicas, como alimentação e saúde.

Leitura complementar
CASCUDO, L. C. Civilização e Cultura. São Paulo: Global, 2004.

Autoavaliação
Assistir ao filme Tempos Modernos (Charles Chaplin) e fazer as anotações necessárias
1 à preparação de um resumo que retrate a mensagem dele. Após assisti-lo, como
você conceitua tecnologia?

Com base nos conceitos trabalhados nesta aula e no resumo preparado na atividade
2 anterior, estabeleça as diferenças existentes entre ciência e tecnologia.

3 Tecnologia e técnica são sinônimos?

Qual o papel a ser desempenhado pela sociedade frente à Ciência e à Tecnologia?


4 Você acha que ela desempenha seu papel a contento?

282 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Referências
ARISTÓTELES. A política. Livro I. Rio de Janeiro: Edição de Ouro, [19__?].

BRONOWSKI, J. A escalada do homem. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

CASCUDO, L. C. Civilização e cultura. São Paulo: Global, 2004.

COMTE, A. Catechisme positiviste. Paris: Chez l’auteur, 1852.

DELAHAYE, J-P. Jusqu’où l’ordinateur calculera-t-il? Revue Pour la Science. n. 283, 2001.
Disponível em: <http://www.pourlascience.com/php/pls/article_integral.php?idn3=1500>.
Acesso em: 16 mar. 2005.

FABIAN, A. C. (Org). Evolução – Sociedade, Ciência e Universo. Bauru: EDUSC, 1998.

FURLAN, F. M. Integração & soberania: o Brasil e o Mercosul. São Paulo: Aduaneiras, 2004.

INVERNIZZI, N. Jornal da Ciência, n. 2769, maio 2002.

INGRAM, J. A ciência na vida cotidiana. Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S. A., 2004.

JANET, P. Les débuts de l’intelligence. Paris: Ernest Flammarion, 1935.

JARROSSON, B. Humanismo e técnica. Lisboa: Instituto Piaget, 1998.

KNELLER, G. F. A Ciência como atividade humana. São Paulo: Zahar/Edusp, 1978.

LALANDE, A. Vocabulário técnico e crítico da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

LEVI, P. A tabela periódica. Rio de Janeiro: Relume – Dumará, 1994.

LUTZENBERGER, J. A. Ciência e tecnologia – onde está a mentira? Disponível em: <http://


www.fgaia.org.br/texts/t-cietec.html>. Acesso em: 26 fev. 2005.

RUSS, J. Dicionário de filosofia. São Paulo: Scipione, 1994.

SIMAAN, A.; FONTAINE, J. A imagem do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

SUASSUNA, Ariano. Lápide. Disponível em: <www.secrel.com.br/jpoesia/ari05.html>. Acesso


em: 20 ago. 2005.

TRANCOSO, B. Sonetos.com.br. Disponível em: <http://www.sonetos.com.br/famosos.php>.


Acesso em: 20 mar. 2005.

Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade 283


Anotações

284 Aula 13 Ciências da Natureza e Realidade


Universo: uma
breve apresentação

Aula

14
Apresentação

D
urante todo o nosso curso de Ciências da Natureza e Realidade, abordamos o estudo
do ambiente em que vivemos, ora olhando o que mais proximamente nos cerca, ora as
realidades mais distantes. Nessa penúltima aula do curso, enfocaremos o tema mais
geral de todos os que até agora tratamos: a origem do universo. Aqui, mais uma vez, você se
deparará com termos e palavras que estão na mídia, como “buracos negros”, “super-novas”,
“expansão do universo”, “big-bang”, telescópio espacial Hubble, entre outros. E, como tem
sido característica de nossas aulas, não pretendemos esgotar o tema, mas apenas mostrar
um quadro geral do que sabemos sobre o Universo. É importante lembrar que alguns pontos,
quando pertinentes, serão aprofundados, e outros, quando aguçarem sua curiosidade, podem
ser encontrados com mais profundidade em textos específicos e em filmes técnicos.

Objetivos
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

descrever o sistema solar e suas origens;


1
explicar qual a origem do Universo segundo os modelos
2 cosmológicos atuais;

expor sobre os avanços tecnológicos relacionados à


3 pesquisa espacial e seu significado para a sociedade
atual;

entender as escalas temporais e espaciais relacionas com


4 o Universo.

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 287


Nós e o Universo

N
osso sistema solar, como mostrado esquematicamente na Figura 1, é formado por uma
estrela de porte médio, o Sol, e pelos planetas: Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter,
Saturno, Urano, Netuno e Plutão. Juntamente com os satélites naturais e artificiais que
circundam esses planetas (Mercúrio e Vênus são os únicos que não possuem satélite e a Terra
é o único que possui satélites artificiais), temos ainda centenas de cometas, um cinturão de
asteróides (este situado entre Marte e Júpiter) e meteoróides (meteoros e meteoritos), além,
é claro, do próprio meio interplanetário, rico em campos e partículas.

Figura 1 – Uma visão estilizada dos planetas que formam nosso sistema solar, mostrando o curioso comportamento
do eixo de rotação de cada uma deles.

Fonte: The Solar Systems. Disponível em: <http://www.solarviews.com/eng/solarsys.htm>.

Sua origem remonta há pouco mais de 5 bilhões de anos, quando na periferia da Via
Láctea uma nuvem gasosa formada por, entre outras coisas, restos de explosões estelares
do tipo super-nova começa a se condensar, isso acontece ao mesmo tempo em que inicia o
processo de rotação em torno de um eixo. Esse processo, alimentado pela força gravitacional
leva, por um lado, à concentração de massa e, por outro, ao aumento de temperatura. Desse
sistema turbulento e catastrófico surge inicialmente o Sol. Depois, a partir de restos de matéria
que ficaram presos em torno da estrela, vão surgindo aglomerados que formarão os planetas.
Aglomerados esses que não possuem massa suficiente para se transformarem em estrelas,
mas velocidades suficientes para permanecer em órbita em torno das estrelas nascentes. Foi
assim que surgiu o Sol e todo o sistema solar e é assim que, ainda hoje, nossos telescópios
observam o nascimento de estrelas em vastos berçários estelares, como as nuvens gasosas
na nebulosa de Órion.

Relembrando um pouco sobre nosso planeta Terra, sabemos que é um pequeno corpo
celeste se movendo em um sistema planetário periférico, o sistema solar, situado em um dos
braços de uma das inúmeras galáxias que existem no Universo, a Via Láctea, a 2/3 de seu
centro. A estrela mais próxima do Sol, nossa vizinha, é a Alfa da Constelação do Centauro,
que se situa a uma distância de 4.3 anos-luz (ano-luz é unidade de distância e não de tempo).

288 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


É daqui que olhamos o Universo, na heróica tentativa de explicá-lo e também a nós mesmos.

Quando, em uma noite escura e sem nuvens, olhamos para o céu, o primeiro sentimento que
nos envolve é o de admiração. Mas, o que de fato estamos vendo é apenas uma pequena fração
do Universo, algo da ordem de 3000 estrelas! E isso é muito pouco, pois na nossa galáxia existem
aproximadamente 400.000.000.000 (quatrocentos bilhões) desses objetos celestes.

A palavra universo vem da junção de dois termos do latim, como ocorreu com filosofia,
lembra da primeira aula? Ela é formada por unus, que significa um, e por versus, particípio
passado de vertere, que significa gira. Portanto, Universo quer dizer “girar tudo junto”.
Atualmente, essa palavra tem uma conotação um pouco diferente: “tudo o que existe”. Assim,
tanto nós como as estrelas que observamos no céu noturno, bem como o pequeno inseto que
passa desapercebido ou a grande montanha que nos desafia faz parte do Universo.

No entanto, quando falamos em estudar o Universo, estamos nos referindo a uma


abordagem astronômica e cosmológica. Assim, trataremos o Universo como sendo composto
de estrelas, planetas e satélites, outros objetos celestes massivos, como cometas, nuvens de
material interestelar etc.

Em relação à nomenclatura, um conjunto de estrelas que forma, segundo nossa


imaginação, uma figura qualquer é chamado de constelação. Por exemplo, o Cruzeiro do
Sul é uma constelação. Ele é uma constelação aos nossos olhos, mas nem todos os povos
enxergam nesse conjunto a forma de outros objetos ou nem o observa.

Atividade 1

Procure localizar, no céu, o Cruzeiro do Sul. Você conhece alguma outra


constelação, por exemplo, as Três Marias?

Pois é, elas correspondem, fazem parte de uma constelação identificada


pelos gregos como Órion, o caçador. Na verdade, elas formam o cinturão de
Órion.

Escreva no espaço a seguir o resultado de sua observação do céu. Você


pode também fazer uma busca na Internet e encontrar belas imagens do céu e a
descrição de algumas constelações.

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 289


Por outro lado, as estrelas formam gigantescos aglomerados chamados de galáxias,
e os planetas, com seus satélites, ao orbitarem em torno de uma estrela, formam os
sistemas planetários.

Até meados dos anos 90, só conhecíamos um sistema planetário: o nosso. Hoje, graças
aos sofisticados satélites e vigorosos cálculos matemáticos, já identificamos mais de uma
dezena de sistemas planetários em nossa galáxia.

Desse modo, podemos inclusive indicar nosso endereço no Universo, o qual seria:
moramos em um planeta chamado Terra, que pertence a um sistema planetário chamado
Solar, que faz parte de uma galáxia denominada Via Láctea. Assim, como será mostrado na
Figura 2, dissemos como somos, indicamos o nosso endereço e o colocamos em duas naves
chamadas Pioneer 10 e Pioneer 11.

Silhueta dos seres


que enviaram a Equivalente binário de
Transição Hiperfina do
sonda um número decimal
Hidrogênio neutro

Nosso
sol Posição relativa do Planeta de onde a sonda foi
sol em relação ao lançada
centro da via lactea

Figura 2 – Placa de ouro enviada pela NASA visando comunicar a eventuais culturas extraterrestres quem
somos, o que sabemos e onde moramos.

Fonte: NASA – National Aeronautics and Space Administration.


Disponível em: <http://www.nssdc.gsfc.nasa.gov/nmc/tmp/1972-012A.html>.

290 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Como gostamos de dizer não só quem somos e onde moramos, mas também o que
fazemos, em outras duas espaçonaves, lançadas pela NASA, as sondas Voyager 1 e Voyager
2, foram colocados discos com sons, músicas e línguas que permitiriam identificar nossos
hábitos e costumes. Esses veículos, com essas importantes informações, foram enviados em
direção ao espaço exterior do nosso sistema planetário, mas não sem antes passarem por
quase todos os nossos planetas, fotografando-os e fazendo sondagens que nos permitiram
um entendimento melhor da evolução de cada um deles, bem como de nosso sistema.

Se, por um lado, o envio desse recado indica que, de alguma forma, reconhecemos a
possibilidade de não estarmos sozinhos no Universo, por outro, até agora não temos nenhuma
prova objetiva de que não estamos sós.

Seguindo os caminhos das sondas Voyageres, foram lançadas duas naves da série Pioneer:
a dez e a onze. A 10, que foi lançada pela NASA em março de 1972, mandou sua última mensagem
em 31 de março de 1997, quando se encontrava a uma distância da ordem de 70 vezes a distância
da Terra ao Sol, dela não mais tivemos notícias. Já a 11, lançada em 5 de abril de 1973, mandou
sua última mensagem em novembro de 1995, momento em que estava se dirigindo para a
constelação de Áquila, onde deverá chegar daqui a 4 milhões de anos.

Atividade 2
Antes de prosseguir, tente decifrar algumas das informações
1 contidas nos elementos gráficos representados na Figura 2 e anote
as suas descobertas.

Posteriormente, tente produzir uma mensagem cifrada como a


2 da fi gura, indicando de onde você é e o que você faz. (se você
é professor, lembramos que esse tipo de atividade pode ser
desenvolvida em sala de aula e permite a discussão de temas
interessantes, como as formas de comunicação e os registros
históricos, vistos na primeira aula – Pinturas rupestres – e até outras
culturas como a do Egito Antigo, a qual utilizava uma linguagem
cheia de figuras, chamada de hieróglifos). Na próxima aula, você
receberá a resposta dessa pergunta com a interpretação que os
cientistas que fizeram essa figura deram a cada elemento dela.

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 291


No dia 05 de janeiro de 2005, a Voyager 1 completou 10.000 (dez mil) dias de viagem.
Essa marca também foi alcançada no dia 21 de janeiro pela Voyager 2. Assim, após 27 anos no
espaço, a primeira já percorreu mais de 14 bilhões de quilômetros e se encontrava a 94 vezes
a distância da Terra ao Sol, enquanto a segunda se encontrava a 11 bilhões de quilômetros
da Terra, ambas caminhando em direção ao espaço interestelar, para longe de nosso sistema
solar, sendo agora os objetos humanos mais distantes de casa. Essas sondas espaciais ainda
possuem energia para continuar documentando sua viagem até o ano 2025, quando estarão
a mais de 26 bilhões de quilômetros da Terra. Ainda assim, mesmo sem energia, continuarão
vagando pelo espaço (lembre do experimento de Galileu, que foi assunto de nossa primeira
aula) e, se não sofrerem nenhuma colisão, só encontrarão a estrela mais próxima em suas
trajetórias em 40.000 anos, a qual será uma estrela da constelação da Girafa.
Em algum momento, daqui a 296 mil anos, a Voyager 2 passará perto se Sírius, a
estrela mais brilhante de nosso céu noturno (o objeto mais brilhante depois da Lua é Vênus,
mas este é um planeta). E, nesse momento, ela estará a uma distância tão grande, que um
sinal enviado por ela para a Terra levaria 4,3 anos para ser recebido por uma das antenas dos
radiotelescópios instalados em nosso solo.

Atividade 3
Como você sabe, a luz gasta pouco mais de 8,0 minutos para se propagar
do Sol até a Terra. Quanto tempo levaria uma mensagem para vir da Voyager até a
Terra quando ela se encontrava a uma distância equivalente a 18 vezes a distância
do nosso planeta ao Sol? E, em 2025, quanto tempo gastará a mensagem para
chegar até nós?

De toda essa nossa conversa anterior, deve ter ficado em você a idéia de que o Universo
é muito grande, que contém tudo o que existe (espaço, tempo, matéria e energia). Nele, como
nos átomos, existe “mais vazio que matéria”, isto é, as distâncias interestelares (entre estrelas)
e intergalácticas (entre galáxias) são da ordem de centenas ou milhares de anos-luz.

Como você já viu, mesmo uma nave espacial, viajando a mais de vinte mil de quilômetros
por hora, levaria alguns milênios para chegar à estrela mais próxima.

No entanto, com a vasta informação que colhemos até agora, através das sondas como a
Voyager ou a Pioneer, e por imagens geradas pelo telescópio espacial Hubble, o COBE (satélite
Explorador da Radiação Cósmica de Fundo, lançado em novembro de 1989 pela NASA) e mais
recentemente pelas Cassini-Huygens (essas naves atingiram o planeta Saturno e sua lua Titã
em julho de 2004), podemos descrever com relativa segurança como se deu a evolução de
nosso sistema solar e do Universo.

292 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Terminaremos esse tópico mostrando na Figura 3 o que seria visualmente nosso lugar
na Via Láctea. O Sistema Solar se encontra em um dos braços da espiral, a aproximadamente
30.000 anos-luz do centro e, 20.000 anos-luz da borda.

Figura 3 – Nossa posição dentro da Via Láctea.

Fonte: ASTRONOMIA. La Vía Láctea. Disponível em: <http:www.astromia.com/universo/vialactea.htm>.

A Via Láctea tem aproximadamente quatrocentos bilhões de estrelas, incluindo o Sol.


Dessas, em uma noite de céu sem nuvens e sem lua, em condições de pouca luminosidade
(comum, por exemplo, em sítios e fazendas de nosso sertão), podemos contar no máximo
3.000 (na verdade, só com muito treino chegamos a contar um terço desse valor).

A Via Láctea – nome dado pelos gregos, por imaginarem que o rastro de estrelas no nosso
céu se parecia com um caminho leitoso – tem uma dimensão fabulosa: algo como 100.000
anos-luz de diâmetro.

Atividade 4
Agora você já sabe: um ano-luz é uma medida de distância muito usada em
astronomia e corresponde ao espaço percorrido pela luz no vácuo ao se propagar
durante um ano.

Sabendo que a luz no vácuo se desloca com uma velocidade de


aproximadamente 300.000 km/s e supondo que a distância entre Natal e São
Paulo seja de 3.000 km, quantas vezes um raio de luz faria esse percurso em
um segundo?

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 293


Hoje, nosso país conta com uma clara política para o espaço, coordenada pela
Agência Espacial Brasileira (AEB) e a pesquisa espacial também é desenvolvida
em Universidades como a UFRN, a UFPB, entre outras. O Brasil se tornou uma
potência espacial e conta com satélites, foguetes civis e militares de fabricação
nacional, fazendo parte do restrito grupo de países a dominar tal tecnologia.
Talvez você não tenha ainda percebido, mas possuímos um vínculo histórico com
a pesquisa e exploração espacial. Já em 1638 durante o processo de ocupação
holandesa, o conde Mauricio de Nassau traz a Pernambuco o cientista alemão
Georg Markgrave, o qual se tornaria o primeiro astrônomo da América Latina,
fazendo memorável observação de um eclipse em 1640. O tempo passa e em
1825 pouco tempo depois do início do uso militar de foguetes, o Brasil começa
a fazer suas próprias experiências a partir da aquisição de alguns modelos do
tipo “a Congreve” e, ao que se sabe, em 1827 ocorreu o primeiro uso militar
desses artefatos em solo brasileiro, lá na cidade de Bagé no Rio Grande do
Sul. Naquela ocasião também iria ocorrer o primeiro acidente “espacial” com
vítima. O cap. Siegner, responsável pelo lançamento, acaba por ser atingido por
estilhaços, devido à explosão do foguete no momento do lançamento. Uma nota
importante é que tal foguete foi de fabricação nacional (vide sobre esse assunto,
por exemplo, o texto Foguetes no Brasil: do foguete Congreve ao VLS 1ª parte
http://www.defesa.ufjf.br/fts/Foguetes%20no%20Brasil%201.pdf). Nessa mesma
época (1827), agindo em outra direção, Dom Pedro I criou no Rio de Janeiro
o Observatório Nacional. E, por muito tempo, vamos conviver com a pesquisa
em foguetes direcionada principalmente para fins militares e a pesquisa do
espaço, para fins pacíficos, ocorrendo no interior dos institutos de Pesquisa.
E, de fato, esses interesses começam a confluir na década de 60 com a criação
do Centro Técnico da Aeronáutica (CTA) pelo lado militar e do Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (INPE) pelo lado civil. Geograficamente vizinhas estas
duas instituições iniciaram um vasto programa de pesquisa científica visando
o espaço, em uma parceria em que de um lado tinha-se o desenvolvimento dos
veículos e do outro, das cargas úteis científicas que seriam lançadas a bordo
desses veículos. Um dos grandes frutos desse trabalho, junto com o CTA, foi o
desenvolvimento da série de foguetes SONDA, e da parte do INPE um completo
estudo da dinâmica e morfologia da alta atmosfera equatorial e de baixa latitude,
isto é, sobre o território nacional.

294 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Origens do Universo
Estamos agora diante da grande pergunta, e que, como não poderia deixar de ser, abre
espaço para as mais diversas indagações. Vejamos no esquema a seguir:

Dos caminhos indicados anteriormente tem um que se apresenta, do ponto de vista


científico, bastante promissor: SIM, HOUVE UM COMEÇO, o qual se deu A PARTIR DE ALGO.

Existe atualmente uma teoria muito forte que trata da origem do Universo, segundo
essa lógica. A teoria do Big-Bang (grande explosão), proposta pelo físico russo, naturalizado
americano, George Gamow (1934-1956), afirma que o Universo surgiu de uma grande explosão.
A força dessa teoria está em que suas previsões sobre algumas das características fundamentais
do Universo têm sido comprovadas a partir de cuidadosas medidas de velocidade das galáxias,
temperaturas do meio intergaláctico e sínteses de substâncias químicas e emissões de sinais
de radiofreqüências realizadas com o auxílio de instrumentos colocados em satélites.

Segundo essa teoria, no início, toda a matéria do Universo estava contida em um


minúsculo ponto, tão pequeno quanto se possa imaginar, e tudo era energia, não existindo
nem espaço nem tempo. Assim, em algum instante, há aproximadamente 15 bilhões de anos,
esse ponto explodiu liberando quantidades imensas de energia, a temperaturas de milhões de
graus. Não sabemos o motivo de tal explosão nem as condições do Universo naquele instante,

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 295


mas sabemos que milésimos de segundo após a explosão já existiam elétrons e anti-elétrons
(pósitrons).

Essa história é mostrada no gráfico a seguir:

Na representação gráfica mostrada anteriormente, temos os instantes iniciais do Universo,


conhecido com era de Planck (esse nome é em homenagem ao famoso Físico Alemão, pai da
teoria quântica moderna), intervalo de tempo entre a explosão e o início do comportamento
do Universo explicável pelas leis da Física (essa era durou 10-43segundos). Depois, no primeiro
minuto, temos a formação do hidrogênio, e, assim por diante, até os dias atuais.

Um Universo de números
Talvez a melhor forma de nossa mente se apropriar das imagens relativas ao Universo
seja através dos números e de comparações numéricas. Observe: se chamamos a distância
da Terra ao Sol de 1 UA (uma unidade astronômica), então nossa distância ao belo planeta
dos anéis (Saturno) seria de 10 UA e ao limite de nosso sistema seria de 39 UA. Ainda nessa
escala, a distância entre o Sol e Alfa de Centauro seria 20.000 vezes a distância Sol-Saturno,
ou seja, de 200.000 UA. E, à medida que nos afastamos, maiores se tornam os números com
os quais representamos o Universo.

Existem aproximadamente 50 estrelas brilhando a uma distância da ordem de 17 anos-


luz da Terra. Se continuarmos nessa viagem, começaremos a encontrar as galáxias, também
conhecidas como “imensos Universos-ilhas”, muitas das quais bem maiores que a nossa. E,
o que é mais extraordinário, já foram identificadas mais de 100 bilhões de galáxias.

296 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Figura 4 – Uma visão de uma pequena fração do Universo, obtida pelo telescópio espacial Hubble, mostrando
centenas de Galáxias.

Fonte: LAROCCO, Chris; ROTHSTEIN, Blair. The big bang: it sure was big. Disponível em: <http://www.umich.edu/~gs265/bigbang.htm>.

Você poderia agora estar se perguntando: Qual deve ser o tamanho de um Universo capaz
de conter mais de 100 bilhões de galáxias, cada uma com mais de cem bilhões de estrelas,
afastadas umas das outras por mais de 4 trilhões de quilômetros?

Para responder a tal pergunta, precisaremos solucionar uma outra questão tão difícil
quanto aquela: Qual seria, então, a idade do Universo?

Como você já sabe, o Universo deve ter em torno de 15 bilhões de anos. O modo de se fazer
essa conta começa com a estimativa de sua temperatura. Uma visão bastante simplificada do
problema seria: se nos aproximamos de um local onde foi feito uma fogueira, pela temperatura
do local podemos estimar se ela é recente ou não. Assim, a temperatura pode ser usada para
determinar a idade da fogueira, dentro de um certo intervalo de tempo. Uma outra informação
importante, e que complementa esta, é que os corpos a uma dada temperatura, de qualquer
que seja, desde que não seja zero absoluto, emite radiação. Seu comprimento de onda é
proporcional à temperatura. Assim, conhecendo a temperatura inicial de um dado objeto,
sabendo quanto tempo ele leva para esfriar, medimos sua temperatura e então podemos dizer
quando ele começou seu resfriamento. Podemos ainda determinar a temperatura de corpos
distantes, como as estrelas, medindo seu espectro, ou seja, o comprimento de onda da radiação
emitida por ele.

É possível estimar a temperatura inicial do Universo imaginando que no instante da


explosão ele começou a criar as partículas elementares. Para que isso ocorresse, era necessário
temperaturas da ordem de 10.000,000,000,000K.

Por outro lado, em 1964, dois astrônomos, Arno Penzias e Robert Wilson, trabalhando
nos EUA, detectaram microondas oriundas do espaço exterior, descobrindo assim um ruído
de origem extraterrestre. Posteriormente, descobriu-se que, na verdade, esse ruído nada mais
era que o resto da radiação originada durante a grande explosão e que corresponde hoje ao

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 297


comprimento de onda de um objeto cuja temperatura seria aproximadamente de 3 K (3 graus
Kelvin). Com isso, conseguiu-se estimar a idade do Universo em 15.000,000,000 de anos.

Para saber, então, o tamanho do Universo, seria necessário multiplicar sua idade (em
segundos) pela velocidade da luz e como o Universo, acreditamos, é simétrico, podemos
multiplicar o resultado por dois.

Atividade 5
Determine, usando as informações do texto, o tamanho do Universo.

Um pouco de evolução estelar


O fim do mundo sempre apareceu, com maior ou menor intensidade, em diversos
momentos de nossa história. São as chamadas teorias escatológicas, as quais, muitas vezes,
foram alimentadas pela religião em seus diversos matizes e, muitas outras vezes, alimentadas
pela própria ciência. Mas o que de verdade temos em tudo isso? Do ponto de vista de nosso
planeta, em sua história de mais de 4,6 bilhões de anos, diversas catástrofes ameaçaram
seriamente a vida, chegando inclusive a levar à extinção espécies inteiras, como no caso dos
dinossauros. Em geral, tais eventos estão associados a fontes extraterrestres, como a colisão
com meteoritos e outros objetos celestes.

Ao longo de sua jornada diária em torno do Sol, a Terra é bombardeada por centenas
de meteoros que, ao atingirem nossa atmosfera à altura de 82 km, sofrem abrasão devido ao
atrito com esta e se incendeiam em um espetáculo, ao qual chamamos de estrelas cadentes,
quando acontece à noite. Assim, mesmo que uma eventual colisão com um objeto celeste de
grandes proporções não seja um evento impossível, hoje, mais que em qualquer outro momento
da história de nossa civilização, estamos preparados para detectá-los e prever trajetórias com
dezenas de anos de antecedência, tendo, em princípio, tecnologia para impedir sua eventual
queda sobre nosso planeta. No entanto, certamente, em alguns milhares de anos, nosso planeta
se extinguirá, seja por esgotamento de suas reservas, por uma colisão inevitável ou até pela
expansão da atmosfera solar. Sobre essa última possibilidade, vamos tratar a seguir.

Como você já sabe, o Sol, nossa fonte de energia, uma estrela gasosa, se mantém em
equilíbrio pelo balanço entre a força de atração gravitacional – que tenta reduzir seu tamanho
– e a forte pressão – que tenta fazê-lo expandir-se. Assim, de um lado, temos a massa e, de
outro, a temperatura.

298 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Para gerar esta fabulosa quantidade de energia, o sol, qual uma fornalha, está consumindo
centenas de toneladas de sua massa, a qual é transformada em energia.

Um dos resultados mais importantes da física moderna foi o da equivalência entre massa
e energia. A famosa equação de Einstein:

E = mc2
Em que
E é a energia do corpo,
m, sua massa e
c, a velocidade da luz.
Isso significa que se a massa m de um corpo for convertida em energia, a
energia obtida terá uma quantidade que é igual ao produto da massa pela
velocidade da luz elevada ao quadrado. Por exemplo, se nós conseguíssemos
converter uma massa de 1,0 kg de água em energia, a quantidade de energia
que seria fornecida por esse quilograma de água seria:
E =?
m = 1, 0kg
c = 300.000.000m/s → c2 = 9 × 1016 m2 /s2
Ou seja,
E = mc2 = 1, 0 × 9 × 1016
E = 9 × 1016 J
Como 1, 0KW h = 3 × 106 J e como o Brasil produz da ordem de
4, 8 × 107 kW então, a energia liberada na transformação de 1,0 kg de água
seria suficiente para abastecer o Brasil durante uma hora.

Ao perder energia mais rapidamente que a taxa de resfriamento, a pressão (mais


exatamente, o gradiente de pressão) irá, em alguns bilhões de anos, vencer a gravidade e o
Sol se expandirá, e será tão grande que engolirá a própria Terra.

Após esse período de expansão, ele sofrerá uma grande queda de temperatura, permitindo
que mais uma vez a gravidade vença e, então, voltará a se contrair, ficando menor do que antes.
Durante a contração, a temperatura do Sol irá aumentar, ficando nesse movimento de expansão
e contração, até extinguir sua energia, quando se transformará, em dezenas de bilhões de anos,
em uma estrela morta. Esse é o destino de todas as estrelas semelhantes ao Sol.

Outras, mais massivas (isto é, com massa maior), durante o processo de contração,
acabam atingindo tão grande densidade que se transformam em um objeto super-massivo,

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 299


com tal poder de atração gravitacional que “nada” consegue escapar de sua superfície. A esse
tipo de objeto, chamamos de buraco negro.

A origem desse nome deriva do seguinte fato: quando se aponta um telescópio para
um local no Universo onde existe um desses objetos (um buraco negro), de lá, não vem
nenhum tipo de radiação e o que se observa é uma verdadeira escuridão em toda a faixa do
espectro eletromagnético.

Assim, vemos que o destino das estrelas e planetas é semelhante, mas se dá através de
processos físicos muito diferentes. É através desses processos, entretanto, que o Universo
e a vida se renovam, pois se não fossem as explosões de estrelas, as super-novas, não
existiria, por exemplo, o oxigênio, já que essa substância química, como muitas outras, é
gerada em ambientes de temperaturas muito altas, como os que existem nas estrelas em
processo de explosão.

Próximos passos
No dia 20 de julho de 1969, o Homem chegou à Lua. Essa façanha foi muito bem resumida
na frase de Neil Armstrong “Esse é um pequeno salto para o Homem, mas um grande salto para
a Humanidade”. De lá para cá, não enviamos seres humanos para longe da Terra, o mais que
fazemos é enviá-los para estações espaciais que giram em torno da Terra, a atual é a estação
internacional. No entanto, nosso conhecimento sobre o Universo tem se expandido em escala
astronômica. Atualmente, veículos robôs deslizam sobre a superfície de Marte, nos revelando
a cada dia um planeta surpreendente onde a água já jorrou em abundância e hoje é um mundo
árido e inóspito. Chegamos a Saturno, atravessamos seus anéis com a sonda Cassini-Huygens,
uma missão espacial desenvolvida em conjunto pela NASA e ESA (Agência Espacial Européia,
envolvendo ao todo 16 países) e, de lá, mergulhamos com a sonda Huygens através da densa
atmosfera de Titã, a maior lua de Saturno, e atingimos sua superfície, gerando, durante a descida,
uma quantidade fabulosa de dados e imagens sobre essa Lua distante (visite o site http://esa.
int/SPECIALS/Cassini-Huygens/SEM696HHZTD_0.html para obter maiores informações sobre
essa missão espacial).

Vasculhamos com diversos satélites (como o COBE e o telescópio Hubble) os recônditos


do Universo, em busca de seus segredos mais íntimos, descobrimos novos planetas que giram
em torno de estrelas distantes e descobrimos que, ao contrário de todas as nossas expectativas,
o Universo está em expansão acelerada e a fonte dessa aceleração é o que chamamos de matéria
e energia escuras. Não sabemos ainda a forma do Universo nem seus limites, se é que existem.
Não sabemos como essa história acaba, mas para quem ainda ontem estava em cavernas
tentando fazer fogo, percorremos um belo caminho. Entretanto, para continuar, precisamos de
mais gente, de pessoas como você, que começam a trilhar a senda do conhecimento científico.
Esse é um trabalho de gerações e um legado para as gerações.

300 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, fizemos um passeio intergaláctico. Aprendemos sobre uma parte
significativa de nossa história espacial, sobre naves interplanetárias, sobre a
origem e evolução do Universo. Vimos que o planeta Terra um dia acabará, o que
acontecerá também com o Sol e que isso é comum no Universo. Aprendemos
também que já saímos da Terra e que visitamos a Lua e os planetas de nosso
sistema solar, nos preparando agora para viajar além, para mais longe, aonde
nos leva nossa imaginação. Quando, um dia, a Terra chegar ao seu fim, é possível
que já estejamos habitando outros planetas, outros sistemas, outras galáxias,
mostrando, com isso, como a vida é capaz de se superar a cada desafio.

Autoavaliação
O filme Cosmos, documentário apresentado pelo famoso biólogo da NASA, Carl Sagan,
trata do Universo, de nosso lugar nele e na Terra, nos alertando sobre a importância e a
singularidade do nosso mundo no Universo conhecido. Esse documentário, dividido em 12
partes e produzido ainda nos anos 70/80, merece ser visto por todos os que têm interesse em
ciências, desde a Física e a Astronomia até a Biologia e a Ecologia.

Assista ao filme Cosmos Episódio 01 e responda às seguintes questões.


1
a) Carl Sagan afirma que somos feitos de restos de estrelas. O que ele quer dizer
com essa afirmação?

b) O que acontece quando estrelas explodem? Em que elas se transformam?

c) O filme apresenta ainda um calendário da evolução do Universo. Qual a escala


desse calendário? Nessa escala, há quanto tempo a espécie humana existe? Qual
nosso papel na história natural do planeta?

O Brasil desenvolve atividade espacial desde a década de 60. Faça uma pesquisa na
2 Internet sobre o “Programa Espacial Brasileiro”. Veja, por exemplo, o site www.aeb.
gov.br ou www.inpe.gov.br.

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 301


Leia o poema de Ferreira Gullar abaixo e o contextualize dentro da abordagem desta
3 nossa aula.

dizem que
em algum ponto no cosmos
(le silence éternel de ces espaces infinis m’effraie)
um pedaço negro de rocha
– do tamanho de uma cidade –
voa em nossa direção
perdido em meio a muitos milhares de asteróides
impelido pelas curvaturas do tempo e do espaço
extraviado entre órbitas e campos magnéticos
voa em nossa direção.
e quaisquer que sejam os desvios
e extravios de seu curso
deles resultará, matematicamente,
a inevitável colisão
não se sabe se quarta-feira próxima
ou no ano quatro bilhões e cinqüenta e dois
da era cristã.

(GULLAR, 2005)

302 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


Referências
ASTRONOMIA. La Vía Láctea. Disponível em: <http://www.astromia.com/universo/vialactea.
htm>. Acesso em: 15 maio 2005.

BEZERRA, Arnaldo, M. Aplicações práticas da energia solar. São Paulo: Ed. Nobel, 1990.

ESA – European Space Agency. Disponível em: <http://www.esa.int/SPECIALS/Cassini-Huygens/


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em: maio de 2005.

Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade 303


Anotações

304 Aula 14 Ciências da Natureza e Realidade


O Nordeste, o homem e a seca:
natureza de uma realidade

Aula

15
Apresentação
Esta é a última aula da disciplina Ciências da Natureza e Realidade. A partir de uma
perspectiva sistêmica, você aprenderá a caracterizar e correlacionar a região Nordeste, o
homem que a habita e a seca, seu problema mais eminente, a conceitos e apreciações físicas,
químicas e biológicas já descritas nas aulas anteriores.

Objetivos
Permitir a você:

conhecer um pouco da história de criação e oficialização


1 da região Nordeste;

discernir melhor os aspectos físicos, químicos e


2 biológicos da região;

tomar conhecimento de como o Homo Sapiens migrou


3 para a região, gerando as etnias que miscigenadas ao
homem branco deu origem ao sertanejo;

evidenciar as variáveis que contribuem para a ocorrência


4 do fenômeno da seca.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 307


Natureza de uma realidade
O estudo a ser empreendido nesta aula, tendo como título O Nordeste, o homem e a
seca: natureza de uma realidade visa à aquisição dos subsídios necessários à compreensão
das questões:

 o que é o Nordeste?

 o que é a seca?

A primeira, de âmbito geral, tem por objetivo situar e caracterizar a região sob o ponto
de vista físico, químico e biológico. A segunda, mais específica, tem como intento distinguir
as variáveis que contribuem para ocorrência do fenômeno da seca e discuti-las de forma que
no decorrer de nossa progressão científica possamos apontar soluções que contribuam para
atenuar o problema em foco.

A região Nordeste
A divisão do Brasil em regiões no decorrer do Império (1822-1889) até a República Velha
(1889-1930) era pouco precisa, constando das províncias e Estados do Norte, do Pará à Bahia;
das províncias e Estados do Sul, do Espírito Santo até o Rio Grande do Sul. Até então, inexistia
a Amazônia brasileira e as regiões Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul.

O quadro que caracterizou o Nordeste como região principiou com as secas que abateram
a região no final do século XIX e início do século XX e que motivaram dois atos de extrema
importância para a região emergente: o primeiro sendo a criação da Inspetoria Federal de Obras
Contra as Secas (IFOCS), em 1906, pelo então presidente do Brasil, Nilo Peçanha; o segundo,
a delimitação, em 1936, do polígono da Seca, compreendendo uma área de 936.993 km2.

Oficialmente, somente em 1942, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)


define a primeira regionalização oficial do Brasil, compreendendo a seguinte distribuição de
estados:

 Norte – Amazonas, Pará e os Territórios de Acre, Rio Branco e Amapá;

 Nordeste Ocidental – Maranhão e Piauí;

 Nordeste Oriental – Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas e o


Arquipélago de Fernando de Noronha;

 Leste – Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo;

 Centro Oeste – Mato Grosso, Goiás e os Territórios de Guaporé e Ponta Porã;

308 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


 Sul – São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

A incorporação dos estados da Bahia e Sergipe ao Nordeste se deu no final de 1969 e


início de 1970, quando o IBGE adotou para fins estatísticos a atual divisão regional na qual se
destacam as grandes regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Nessa divisão,
o Nordeste é composto dos Estados: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,
Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e o Arquipélago de Fernando de Noronha.

O Nordeste físico

O espaço e a localização do Nordeste


O Brasil possui uma área de 8.514.877 km2 na qual se insere a região Nordeste ocupando
uma superfície de 1.554.257 km2, correspondente a 18,3% do território Nacional, o que
permite acomodar com folga os países França, Itália, Reino Unido, Alemanha e Polônia, como
demonstra a figura a seguir.

Gráfico 1 – Superfície de Países e da Região Nordeste

Situada entre os paralelos de 01o02’30’’ de latitude norte e 18o20’07’’ de latitude sul, entre
os meridianos de 34o47’30’’ e 48o45’24’’ a oeste de Greenwich (Figura 2), a região Nordeste
limita-se a norte e a leste com o Oceano Atlântico; ao sul com os Estados de Minas Gerais e
Espírito Santo e a oeste com os Estados do Pará, Tocantins e Goiás.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 309


Figura 1 – Mapa da Região Nordeste

Duas são as características que marcam essa região. A primeira, a vasta extensão litorânea
banhada pelo Oceano Atlântico que atesta o alto grau de maritimidade da região, 2,5 vezes
maior que o brasileiro; e a segunda, a grande extensão semi-árida interior que se estende desde
o Piauí à Bahia e que representa 62% da área total da região (ALBUQUERQUE, 2005, p. 08).
A maior parte da sua extensão é constituída por um planalto de formação geológica antiga.
No entanto, devido à diversidade de características físicas da região, ela é dividida em quatro
sub-regiões: Zona da Mata, Agreste, Sertão e Meio Norte (ANDRADE,1998, p. 25).

Atividade 1
Fazendo uso da Internet, site (http://www.heavens-above.com/), determine
as coordenadas geográficas do seu município.

310 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


A estrutura geológica
Parte integrante da placa tectônica Sulamericana, o território brasileiro apresenta uma
complexa evolução geológica originária do período Arqueano ou Arcaico, éon (1 éon = 1 x
109 anos), compreendido entre 3 bilhões e 850 milhões de anos e 2 bilhões e 500 milhões de
anos, definido pelas características geoquímicas e geofísicas exibidas pelos constituintes
primordiais: minerais e rochas. Antes de darmos continuidade, vamos aprender a diferenciar
um mineral de uma rocha. Um mineral nada mais é do que um composto inorgânico de
propriedades físicas e de composição química definida. São exemplos de minerais: ouro,
prata, cobre, grafita, pirita, quartzo, opala, entre outros. Por sua vez, rochas são materiais
constituídos por um agregado natural de minerais e, segundo suas composições, origens ou
suas formações classificam-se em (TEIXEIRA et al, 2003, p. 27):

 rochas magmáticas, também nomeadas de ígneas ou eruptivas, formadas pela


solidificação de magmas, abrangem as

• rochas plutônicas, que ao serem formadas sofreram um resfriamento no seio da câmara


magmática, nomeada por isso de holocristalinas (estrutura completamente cristalizada);

• rochas vulcânicas, originadas a partir de um resfriamento superficial rápido, logo


após uma erupção vulcânica, sendo por isso caracterizadas de hemicristalinas (estrutura
cristalizada e vitrificada);

 rochas sedimentares, produzidas superficialmente na terra ou no leito dos mares por


acumulação progressiva em camadas de matérias a partir da ação do vento e da água;

 rochas metamórficas, geradas pela recristalização e deformação de rochas sedimentares


ou magmáticas a partir da ação da temperatura e da pressão crescentes com a
profundidade da litosfera.

Por sua vez, a classificação dos minerais é feita de acordo com critérios químicos e
cristalográficos, a partir dos quais estes são agrupados em nove famílias a serem trabalhadas
brevemente na disciplina Mineralogia.

Os minerais e, sobretudo, as rochas, são partes fundamentais da litosfera, compartimento


sólido responsável pela formação de ilhas e continentes do planeta. As rochas ígneas ou
magmáticas, as mais antigas componentes da arquitetura do planeta, precedidas das
metamórficas, são denominadas de rochas cristalinas em função da cristalização dos seus
minerais. Já as sedimentares, mais recentes, correspondem a cerca de 5% da litosfera,
constituindo uma espécie de manto protetor da superfície terrestre.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 311


Três são as estruturas geológicas que
compõem o globo terrestre. A primeira,
constituída pelas rochas cristalinas, se
caracteriza pela regidez, resistência e idade,
sendo datadas da era Pré-cambriana. A
segunda, nomeada Bacia Sedimentar, resulta
da acumulação progressiva de detritos,
originando as rochas sedimentares oriundas
das eras Paleozóica, Mesozóica e Cenozóica.
A terceira, resultante dos Desdobramentos
Modernos, ascendência vertical do terreno,
decorrente da elevação da pressão interior do
planeta, datadas da era Cenozóica, período
terciário. São exemplos: os Andes, os Alpes,
o Himaláia, entre outros.

Figura 2 – Estrutura Geológica do Nordeste


Fonte: BIBLIOTECA VIRTUAL DE TROPICOLOGIA. Disponível em: <http://www.tropicologia.org.br/conferencias.html>.

No Brasil, 1/3 da estrutura geológica é formado pelo escudo cristalino, constituído de


rochas ígneas e metamórficas, enquanto os 2/3 restantes compreendem a Bacia Sedimentar.
A Figura 2 retrata a estrutura geológica da Região Nordeste, caracterizando as áreas cristalina
e sedimentar.

O Nordeste hidrográfico
Como já sabemos, a hidrosfera é a parte da biosfera correspondente ao meio líquido que
recobre sete décimos da superfície planetária. A ciência que estuda a ocorrência, a distribuição
e a dinâmica da água na Terra é nomeada de Hidrologia, do grego hýdor, água + lógos, tratado.

A Hidrogeologia, do grego hýdor, água + gê, terra + logos, tratado, é o ramo da geologia
que estuda a circulação das águas no solo e subsolo e as interações da geologia com as águas
da superfície terrestre.

312 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


1 2

Bacias Hidrográficas

1 Amazônica

2 São Francisco

3 3 Platina

Figura 3 – Mapa Hidrográfico do Brasil

Por sua vez, a Hidrografia, do grego hýdor, água + graph, resíduo de graphein, descrever,
é o ramo da Geografia associado ao estudo dos diversos lugares ocupados pelas águas, na
superfície da Terra.

As três principais bacias hidrográficas do Brasil são, segundo VESENTINI (1990, p. 184):
a Amazônica (AM), a Platina (PT) e a do São Francisco (SF) (ver Gráfico 2a). São bacias
secundárias as das regiões Nordeste (NE), Leste (LE) e Sudeste-Sul (SS) (ver Gráfico 2b).
Gráfico 2 – Brasil – Bacias Hidrográficas

gráfico 2a

Fonte: IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA.


Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/>.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 313


gráfico 2b

Fonte: IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA.


Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/>.

A dinâmica da água no planeta é caracterizada pelo seu ciclo biogeoquímico (ver Figura
4). Como sabemos, são os estados de agregação que caracterizam a matéria, e a água co-
existe nos estados: líquido, sólido e gasoso. Portanto, ela circula facilmente entre os três
compartimentos que caracterizam a biosfera terrestre, dentre os quais o que armazena maior
volume de água é a hidrosfera, 363 milhões de km2 sobre um total de 510 milhões de km2,
seguido da litosfera e, por fim, da atmosfera (RAMADE, 1984, p. 239).

Condensação
Sol

Atmosfera

Chuva, Granizo, Neve Precipitação


Evaporação Transpiração Evaporação Gelo
Áreas urbanas

Fusão

Rio Lago Infiltração

Oceano Filtração
Escoamento Lençol
d’água freático

Figura 4 – Ciclo Biogeoquímico da Água

314 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


Na região Nordeste, devido às condições climáticas, a água circula naturalmente nos
estados líquido e vapor. A caracterização do seu ciclo biogeoquímico ocorre da seguinte
forma: sob a ação do Sol, a água da hidrosfera se evapora e difunde para as camadas altas
da atmosfera, originando as nuvens, massas visíveis de gotas d’água ou de cristais de gelo
em suspensão. A partir da diminuição de temperatura, esse vapor se condensa e se precipita
sob a forma de chuva nos oceanos e na Terra. Por outro lado, o ser humano e os vegetais
também exercem influência marcante sobre o ciclo da água. As raízes das plantas, atuando
como verdadeiros vasos capilares, captam água do solo e a devolvem em parte à atmosfera.
Portanto, o processo de desflorestação, tendo como principal artífice o homem, tem modificado
sobremaneira o ciclo biogeoquímico da água, provocando inundações marcantes em várias
regiões do planeta.

Na litosfera, a água circula segundo as vias (ver Figura 4):

 por escoamento, seguindo o relevo do ambiente;

 por infiltação, através de fissuras naturais dos solos e rochas;

 por percolação (filtração, sob pressão, de um líquido através de um meio sólido), migrando
lentamente através dos solos.

A partir das vias de circulação da água por infiltração e percolação, ocorre a alimentação
dos lençóis freáticos (reservatórios de água subterrâneos).

A interação da água com o meio litosférico ocorre de duas maneiras: a primeira, lenta,
contribuindo quimicamente para a fertilização do solo; e a segunda, rápida, a partir da qual
observa-se a erosão progressiva do solo, fato extensivamente comum na região Nordeste.

O clima
De acordo com o Glossary Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC – (Painel
Intergovernamental sobre Mudança de Clima),

Clima, em sentido restrito é definido como a descrição estatística de quantidades


relevantes e mudanças do tempo metereológico num período de tempo, que vai de meses
a milhões de anos. O período clássico, definido pela Organização Mundial de Metereologia
(OMM), é de 30 (trinta) anos. Essas quantidades são geralmente variações de superfície
como temperatura, precipitação e vento. O clima em sentido mais amplo é o estado,
incluindo as descrições e estatísticas do sistema meteorológico IPCC Glossary 2001.

Durante a era Cenozóica, período quaternário, ao final da época Pleistocênica, início


da halocênica, compreendidas entre 10.000 e 2.000.000 de anos, o Cerrado, a Caatinga e o
Agreste do Brasil, também conhecidas como savanas tropicais, assemelhavam-se como são
nos dias atuais, algumas vezes permeadas por massas de ar seca e fria, o que tornava a sua
vegetação pouco densa, outras pelo ar úmido e quente, condições propícias para a eclosão de
uma vegetação mais densa. A região anualmente se caracterizava por possuir duas estações

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 315


bem definidas: uma de chuva e outra seca. Tais características permitem afirmar que o Nordeste
sempre foi mais árido do que as demais regiões do país (SCHMITZ, 1990, p. 9-32). Como
vemos, no Nordeste, o clima, além de exercer uma influência marcante sobre a paisagem, é o
elemento natural que mais preocupa o homem.

De acordo com a classificação de Arthur Strahler, predominam no Brasil, os climas:

Climas controlados por massas de ar


equatoriais e tropicais

Clima Equatorial Úmido da convergência dos


Alísios.
Clima Litorâneo Úmido exposto às Massas
Tropicais Marítimas.
Clima Tropical alternadamente Úmido e Seco.
Clima Tropical tendendo a seco pela
irregularidade das massas de ar.

Climas controlados por massas de ar tropicais e polares

Clima Subtropical Úmido das costas orientais e


subtropicais dominado Largamente por Massa
Tropical Marítima.

Figura 5 – Climas do Brasil

Com relação às médias anuais de temperatura, grandes variações se registram na região


Norte. Parte do interior do Nordeste apresenta temperaturas superiores a 25°C, enquanto a
região Sul e parte da Sudeste apresentam temperaturas da ordem de 20°C.

Um fenômeno natural resultante da interação entre a atmosfera e o oceano contribui para


os longos períodos de estiagem da região Nordeste. El Niño, como é conhecido o fenômeno,
dura de 12 a 18 meses em média e se repete em intervalos de 2 a 7 anos com intensidades
diversas. Ele decorre do aquecimento das águas superficiais do oceano Pacífico Tropical,
produzindo alterações significativas não somente no clima regional e global, mas também nos
padrões de deslocamentos das massas de ar do planeta alterando os regimes pluviométricos
das regiões tropicais.

Como vemos, a região Nordeste sofre a influência de fenômenos de natureza física como
El Niño, além de ser uma zona de confluência de climas, tais como:

316 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


 o Litorâneo Úmido exposto às Massas Tropicais Marítimas – estende-se pelo litoral
brasileiro desde o Rio Grande do Norte até São Paulo, recebendo a influência da massa
de ar Tropical Atlântica (mTa);

 Clima Tropical tendendo a Seco pela irregularidade das massas de ar (Clima Semi-
Árido) – abrange o Sertão Nordestino, sendo ponto de convergência das massas de
ar Equatorial Continental (mEc), Tropical Atlântica (mTa), Equatorial Atlântica (mEa),
e Polar Atlântica (mPa), ver Figura 6;

 Clima Tropical alternadamente úmido e Seco – no Nordeste abrangendo trechos dos


estados da Bahia, Maranhão, Piauí e Ceará e ainda os Estados de Minas Gerais, Goiás,
parte de São Paulo, Mato Grosso do Sul, parte do sul de Mato Grosso. Clima tropical
característico, ele é quente e semi-úmido, decorrendo dessa característica um período
chuvoso (o verão), no qual prevalece a massa de ar Equatorial Continental e outro seco
(o inverno), com o recolhimento dessa massa de ar e a penetração da massa Tropical
Atlântica e, algumas vezes, da Polar Atlântica.

mTa = tropical atlântica

mEp = equatorial pacífica

mPp = polar pacífica

mEc = equatorial continental

mPa = polar atlântica

mTp = tropical pacífica

mEa = equatorial atlântica

mTc = tropical continental

Figura 6 – Massas de Ar na América do Sul

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 317


Atividade 2
A aula 8 desta disciplina tem como tema Clima e Tempo. Com base

1 na sua leitura, você é capaz de definir clima e caracterizar o clima da


sua região?

A partir do poema “O Clima”, de Rui Pais, http://www.vaniadiniz.pro.

2 br/asp/textosamigos.asp?cod=1509, você é capaz de selecionar os


fatores que influenciam o clima da sua Região?

No inverno o Sol quando aparece Num ápice formo um manto de neblina


Nesta estação que quase o desconhece Com uma espessura assaz consistente
Até a alma rejubila de alegria Bloqueando a visão de qualquer vidente
Como num sonho ou numa fantasia. Até o Sol o escondo de repente.

Não é a brisa que chega do mar Aqui posso levantar uma tempestade
Mas um frio húmido de rachar Mais além um enorme furacão
Até nosso corpo todo se arrepia Em qualquer lado provoco um terremoto
Quando agredido por forte ventania. Crio o fogo das entranhas dum vulcão.

É o clima da natureza a actuar Eu sou o clima, sou eu que governo


Como com o homem querendo comunicar Mereço vosso respeito e consideração
Todo este espaço é meu reino Se não gostam do Outono e do Inverno
É meu o direito de o administrar. Deixo-lhes a Primavera e o Verão.

Sou o clima, meu pai é o tempo


Tudo controlamos no espaço com alento
Com apenas uma forte rajada de vento.
Nas nuvens transporto a chuva ao relento.

Fonte: Texto extraído do site <http://www.vaniadiniz.pro.br/asp/textosamigos.asp?cod=1509>.

318 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


O Bioma Nordeste

A Flora
A região Nordeste possui uma cobertura vegetal diversificada. Na sua diversidade,
encontramos resquícios da Mata Atlântica, o cerrado que campeia o sul do Maranhão, o
sudoeste do Piauí e oeste da Bahia, a caatinga que tão bem caracteriza o semi-árido, as dunas
e os mangues, partes integrantes do litoral da região.

A Mata Atlântica, a mais extensa, se estende desde o cabo de São Roque, no Rio Grande do
Norte, até o Rio Grande do Sul. Ela avança do litoral para o interior do continente, estendendo-
se por uma faixa média de 200 km, compreendendo a Zona da Mata litorânea (ver Figura 2).

O Cerrado, cobertura vegetal que no Nordeste permeia os estados já descritos


anteriormente, apresenta como característica fitogeográfica o fato de ser constituído por
gramíneas com árvores e arbustos dispersos isoladamente ou em pequenos grupos.

A Caatinga, que etimologicamente significa mata branca, é constituída por variedades


de vegetação que se destacam pela pouca folhagem, quase que exclusivamente composta de
espinheiros, cactos e gravatás, adaptadas às condições da aridez ambiental. Segundo a região,
a caatinga se caracteriza pelas seguintes coberturas: seca e agrupada, seca e esparsa, arbustiva
densa e ainda caatinga das serras e do litoral. Estima-se que a flora nordestina possui de 2000
a 3000 espécies de plantas, das quais apenas 1000 possuem registro.

Por sua vez, a restinga, formação vegetal pouco densa, apresenta como característica
árvores de troncos finos que eclodem normalmente em terrenos arenosos do litoral. Em meio
a costa associada com a vegetação típica das praias e dunas encontram-se gramíneas, salsa
de praia, capim de areia, entre outras, submetida à ação contínua dos ventos impregnados de
spray salino provindos do mar. Com aspecto peculiar resultante da combinação envolvendo
água e areia salgada, essa vegetação com características arbustiva e herbácea praticamente
se estende por quase todo o litoral tropical do mundo.

O mangue é visto como um ecossistema costeiro comum nas regiões tropicais


e subtropicais. Interface entre a terra e o mar, ele permeia as margens das baías, barras,
enseadas, foz de rios e lagunas ou ainda onde se produza o encontro da água doce com a
salgada. Sujeitas ao regime das marés, a sua vegetação é constituída por espécies que se
desenvolvem em terreno com pequeno declive, sendo dominada por espécies típicas como
o mangue vermelho (Rhizophora mangle, Rhizophora racemosa e Rhizophora harrisonii),
conhecido como verdadeiro, bravo, sapateiro e gaiteiro; o mangue preto (Avicennia germinans e
Avicennia shaueriana), também chamado de sereíba ou siriuba e o mangue branco (Laguncularia
racemosa), conhecido como tinteira ou manso.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 319


Divisão das Plantas

• Árvore: Vegetal lenhoso que apresenta mais de três metros de altura constituído por
tronco, galhos, ramos e folha.

• Arbusto: Vegetal lenhoso, desprovido de tronco que tem ramificações desde a base.

• Erva: Vegetal pequeno, de talo macio, cujas partes verdes morrem em menos de um ano.

Atividade 3

A partir dos versos de “Matança” escritos por Jatobá, você é capaz de identificar
algumas das espécies vegetais presentes na sua região? Faça um inventário das
espécies mais comuns da sua região.

Matança
Elomar Figueira De Melo - por Jatobá; Interpretes: Elomar, Geraldo Azevedo, Vital Farias e Xangai

Cipó caboclo tá subindo na virola E a clorofila das matas virgens


Chegou a hora do pinheiro balançar Destruídas bom lembrar
Sentir o cheiro do mato da imburana Que quando chegar a hora
Descançar morrer de sono na sombra da É certo que não demora
barriguda
Não chame Nossa Senhora
De nada vale tanto esforço do meu canto
Só quem pode nos salvar
Pra nosso espanto tanta mata haja vão matar
É caviúna, cerejeira, baraúna,
Tal mata atlântica e a próxima amazônica
Imbuia, pau-d’arco, solva,
Arvoredos seculares impossível replantar
Que triste sina teve cedro nosso primo Juazeiro, jatobá,

Desde menino que eu nem gosto de falar Gonçalo-alves, paraíba, itaúba,

Depois de tanto sofrimento seu destino Louro, ipê, paracaúba,


Virou tamborete mesa cadeira balcão de bar Peroba, massaranduba,
Quem por acaso ouviu falar da sucupira Carvalho, mogno, canela, imbuzeiro,
Parece até mentira que o jacarandá Catuaba, janaúba, aroeira, araribá,
Antes de virar poltrona porta armário Pau-ferro, angico, amargoso, gameleira,
Morar no dicionário vida eterna milenar Andiroba, copaíba, pau-brasil, jequitibá.
Quem hoje é vivo corre perigo
E os inimigos do verde da sombra Fonte: MELO, Eliomar Figueira de. Matança. [música], [199_?].

O ar que se respira

320 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


A Fauna
O Brasil, país tropical, é conhecido por ser possuidor da maior biodiversidade do planeta.
Sua macro-fauna apresenta aproximadamente a seguinte constituição.

Tabela 1 – Relação da biodiversidade do Brasil e de seus principais biomas.

Brasil Amazônia Caatinga Cerrado Pantanal Mata Atlântica Campos Suplinos


Grupo
Taxiconômico
Total Total End. Total End. Total End. Total End. Total End. Total End.

Flora (1) (2) >56.000 ... ... (3) 932 380 ... 4.400 ... ... ... 8.000 ... ...

Mamíferos 518 320 174 148 10 195 18 132 2 250 82 102 5

Aves 1677 550 32 107 60 180 29 113 ... 197 188 ... 2

Répteis 468 (4) 1.000 340 348 ... 837 20 346 5 (5) 849 60 476 ...

Anfíbios 517 163 12 47 ... 113 32 ... ... 340 87 ... ...

Insetos 10.000.000 ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Invertebrados 13.320 ... ... ... 14.425 ... ... ... ... ... ... ...

Peixes H2O
3.000 ... ... 185 106 ... ... 283 ... 350 133 50 12
Doce

END. = Endêmicas; (1) O número de espécies da flora dos Biomas Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica é estimado entre 10.000 e 21.000
espécies fanerogãmicas. (2) Para os Biomas Cerrado e Mata Atlântica são apresentados números estimados de espécies vegetais endêmicas.
(3) O número de espécies da flora do Bioma Caatinga corresponde às espécies vegetais, já registradas e catalogadas cientificamente. (4) Valor
aproximado. (5) Exclui as espécies citadas como acidentais, marinhas, insulares, introduzidas e visitantes.

Fonte: IBGE – Indicadores de desenvolvimento sustentável – Brasil 2004 Dimensão Ambiental - Biodiversidade.

Muito embora a caatinga aparente ser um bioma pobre, de acordo com a Tabela 1,
ela revela ser um celeiro de espécies endêmicas e de múltipla constituição vegetal. Além
disso, enfatizamos que dentre os ecossistemas brasileiros, a caatinga é o menos conhecido,
fato atestado pela descoberta e caracterização de novas espécies, com base em trabalhos
desenvolvidos por botânicos e zoólogos.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 321


Atividade 4

A partir do Cordel Fauna Nordestina, escrito por Daniel Fiúza, Usina de Letras, http://
www.usinadeletras.com.br/, você é capaz de identificar alguns dos animais presentes
na sua região? Faça um inventário dos animais mais comuns da sua região.

Fauna Nordestina
Autor: Daniel Fiúza

No sertão nordestino A linda ararinha azul Lavadeira ou noivinha


Tem a sua flora típica O canoro sonhaçú Abre e fecha ou tico-tico
E mesmo na caatinga E o carcará gavião. O galinho de campina
Bela e exuberante fica Tem o soim que é mico
O feio calango-cego
Entre o cacto e o juazeiro Frango dágua e juriti
Lagartixa e calanguinho
Angico e marmeleiro Raposa, gambá e paturi!
Tem tamanduá mirim
Vive sua fauna rica. Nesse sertão tão rico.
João bobo ou rapazinho
Tem anu preto e zabelê Caçote e sapo cururu Cobra preta e cobra-cega
O gato maracajá E pra carniça o urubu E a verdadeira coral
A onça suçuarana E azulão o passarinho. Cascavel e corre campo
Tem tatu peba e preá A Papa ovo não faz mal
Borboleta da caatinga
Irara e porco caititu Jararaca e caninana
Fogo-pagou a rolinha
Graúna e branco anu Cobra verde e muçurana
No lago o pato de crista
Borboleta-maracujá Tem a jibóia anormal.
Pato preto e marrequinha
O bonito mico estrela Asa branca do sertão
Tem tejo e camaleão Cantou o rei do baião
De bando tem avoante Currupião e coroinha.
E o passarinho cancão

Fonte: Texto extraído do site <http://www.usinadeletras.com.br/>.

322 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


O Nordeste social

Os primeiros habitantes do Nordeste


A teoria mais aceita a respeito da origem do homem americano é partidária de que os
primeiros habitantes a povoarem o continente migraram da Ásia, passando pelo estreito de
Bering, atingindo a América no decorrer da última Era Glacial há 21.000 anos, quando um
terço dos continentes do planeta estavam imersos em massa de gelo e a temperatura média
da superfície era de 5°C (cinco graus centígrados) (ver Figura 7). A história do nosso planeta
contempla avanços e recuo de massas de gelo em grandes extensões dos continentes. Ao
movimento dessas massas frígidas, dá-se o nome de Glacinação e atribui-se a denominação
de Era Glacial aos períodos nos quais o gelo ocupa grandes áreas em que reinam temperaturas
excessivamente frias. Segundo o sérvio Milutin Milankovitch (1879 – 1958), matemático e
especialista em astronomia e geofísica, as Glacinações decorrem de alterações na órbita da Terra.

Figura 7A Figura 7B

Fígura 7 – A Terra durante o período glacial e na atualidade (A e B, respectivamente)

Fonte: POUR LA SCIENCE - N° 300 OCTOBRE 2002

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 323


Entre 28.000 e 23.000 anos a.C., uma grande quantidade de água retida nas geleiras do
ártico induziu o abaixamento do nível das águas do mar, gerando uma ponte natural ligando o
extremo leste do que viria a ser a Ásia, região além Sibéria, com a região isolada e rochosa do
atual Alasca. Assim, o homem migrava para o Novo Mundo, para a América. Após um novo
período submerso, a ponte emergiu e perdurou durante 14.000 e 10.000 anos a.C. Foi fazendo
uso dessa rota que os asiáticos migraram para o continente americano. Admite-se que o
homem, ao chegar ao novo Continente já tinha evoluído a Homo Sapiens, fato comprovado pela
antropologia, etnografia e lingüística, ciências defensoras da teoria da migração via estreito de
Bering. A ele coube a tarefa de explorar o novo continente e povoar as suas diferentes regiões,
uma destas, o Nordeste do Brasil. Além do mais, ele foi o precursor das primeiras comunidades
agrícolas no território onde hoje se situam países como México, Guatemala, Honduras, Equador,
Bolívia, Peru, Chile, berço das civilizações Maia, Asteca e Inca.

Quanto à migração humana para as terras brasileiras, entre 12.000 e 9.000 anos
a.C., duas áreas férteis em dados arqueológicos são levadas em consideração, a primeira
compreende a Bacia Amazônica e a segunda ao Planalto Central, ambas ocupadas por incursões
sucessivas do Homo Sapiens. Por sua vez, a ocupação do nordeste brasileiro ocorreu ao final
do Período Pleistoceno, dando-se a partir do Planalto Central por incursões de caçadores
que se estabeleceram próximos aos mananciais aquáticos, o que possibilitou a adaptação
progressiva da espécie às condições áridas da região. Nesse mesmo período, coabitavam
a região espécimes como o tigre dente-de-sabre, o mastodonte, a preguiça e o tatu gigante,
componentes da mega-fauna local (MARTIM, 1999, p. 24-26).

Na futura região Nordeste, o homem primitivo evoluiu a homem do sertão, sertanejo,


mestiço resultante da miscigenação entre brancos e índios, até hoje convivendo com as
intempéries do seu habitat e assumindo o perfil tão bem descrito por Euclides da Cunha em
sua obra-máxima, Os Sertões (CUNHA, 2002, p. 115).

O sertanejo é, antes de tudo, um forte. [...] A sua aparência, entretanto, ao primeiro


lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, [...]. É desgracioso,
desengonçado, torto. [...}. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso,
aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-o a postura normalmente
abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um carater de humildade deprimente. A
pé, quando parado, recosta-se invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra
[...] . Caminhando, mesmo a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança
celeremente, num bambolear característico, de que parecem ser o traço geométrico os
meandros das trilhas sertanejas. E se na marcha estaca pelo motivo mais vulgar, para
enrolar um cigarro, bater o isqueiro, ou travar ligeira conversa com um amigo, cai logo –
cai é o termo – de cócoras, atravessando largo tempo numa posição de equilíbrio instável,
em que todo o seu corpo fica suspenso pelos dedos grandes dos pés, sentado sobre os
calcanhares, com uma simplicidade a um tempo ridícula e adorável.

De acordo com o censo de 2000, realizado pelo IBGE, a população da região Nordeste
foi estimada em 47.819.334 habitantes, valor correspondente a 28% da população nacional,
sendo a sua taxa média de crescimento anual igual a 1,1%. Ela está distribuída nos estados
conforme mostra a Tabela 2.

324 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


Tabela 2 – População dos Estados do Nordeste.

Estado População
Maranhão 5.660.255
Piauí 2.847.489 Nos Estados que compõem a região
Ceará 7.444.000 Nordeste do Brasil, encontra-se inserida
a região semi-árida (969.589,4 km²) mais
Rio Grande do Norte 2.780.176
populosa do planeta, com 19.343.579
Paraíba 3.445.125
habitantes, assim distribuídos: 10.936.851
Pernambuco 7.930.964 habitantes na área urbana e 8.406.728
Alagoas 2.826.575 habitantes na área rural.
Sergipe 1.788.747
Bahia 13.096.003

Fonte: IBGE

Por ser dentre as regiões semi-áridas do planeta a mais populosa, o Nordeste brasileiro
enfrenta problemas sérios que interferem efetivamente no seu desenvolvimento, os mais
comuns são: a distribuição de terras, a concentração de renda, a seca e, sobretudo, o
analfabetismo.

A Seca
Evoluindo em meio ao Nordeste brasileiro, a região Semi-Árida (o Sertão) apresenta um
balanço hídrico deficitário, decorrente das precipitações médias anuais inferiores a 800 mm
de água. O seu clima se caracteriza por apresentar temperaturas médias anuais no intervalo de
24° a 30°C, enquanto a insolação média que permeia o ambiente, tempo durante o qual o sol
está descoberto irradiando localmente, situa-se entre 2800 e 2900 horas/ano. Outro fenômeno
a ser enfatizado é a evapotranspiração resultante de duas contribuições: a primeira, sendo a
evaporação direta (evolução física sofrida pela água ao passar do estado líquido para o estado
de vapor) que se dá a partir da água dos solos humidos e dos diferentes mananciais aquáticos
da região; e a segunda, a transpiração dos vegetais. Relatamos que boa parte do vapor d’água
presente na atmosfera resulta da transpiração das plantas. As raízes dos vegetais captam a
água presente no solo e a conduz por osmose através dos seus vasos capilares; nas suas
folhas, através de seus estômatos (microporos), parte da água se evapora e parte é utilizada
pelo vegetal para a realização do processo de fotossíntese.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 325


Atividade 5
Acessar o site http://www.agritempo.gov.br/index.php, selecionar o Estado
e o Município onde reside e estabelecer através da leitura dos mapas disponíveis
no link «Mapas de Monitoramento»:

a) as coordenadas do município (Latitude e Longitude);

b) os valores médios dos parâmetros seguintes: número de diascorrespondentes


ao período de estiagem; percentagem de água disponível no solo; valor da
precipitação acumulada no período em milimetros de água; porcentagem de
reposição de chuvas para o seu Município.

Por tratarmos inicialmente a respeito de precipitação, da temperatura média ambiente, da


evapotranspiração, somos induzidos a pensar que a seca é um problema de origem puramente
climático. Isso porque algumas vezes a água proveniente da chuva é suficiente apenas para
fazer florescer a caatinga, enquanto outras, mais intensas, acumulam-se em barreiros e açudes
da região sem, no entanto, permitir o aflorar dos plantios agrícolas, fenômeno popularmente
conhecido como seca verde. Há muito tempo, a repetição do fenômeno seca nos tem mostrado
que períodos de estiagens excessivamentes prolongadas provocam distúrbios hidrológicos
significativos associados ao equilíbrio físico envolvendo a água no estado líquido e a água no
estado de vapor (H2O(l) H2O(v)).

Quando estudada de forma mais detalhada, a seca é um fenômeno complexo tendo em


vista que resulta de múltiplas variáveis físico-químicas, algumas das quais externas à região,
como a circulação das massas de ar, as correntes oceânicas, que associadas ao movimento
atmosférico inibem a formação de chuvas sobre a região, outras, internas, como a sua vegetação
xerofítica, caducifoliar e aberta, adaptada a pouca água, a topografia e a refletividade do solo.

Porém, as variáveis sociais, como o êxodo rural, a fome e a desnutrição, as moléstias e a


alta taxa de mortalidade e, sobretudo, o analfabetismo são barreiras que têm se mostrado quase
intransponíveis ao desenvolvimento da região, sendo estas, até então, as formas encontradas
pelo Homo Sapiens de isentar-se de culpa e penalizar a natureza.

326 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


Resumo
Nesta aula, passamos a conhecer melhor o Nordeste brasileiro. Aprendemos
que a sua criação foi decorrência de um fenômeno que, pela sua amplitude, a
distingue de todas as demais regiões do Brasil: a seca. Também, evidenciamos
a região quanto a sua localização espacial, estrutura geológica, hidrografia e
seu clima. Em breve relato, descrevemos a sua flora, diversificada próxima ao
litoral e característica na região semi-árida – a caatinga, além de traçarmos
o perfil estatístico da sua fauna. Retratamos, ainda, a origem do homem do
sertão, o sertanejo, resultado da miscigenação entre o homem branco e os
nativos, índios das diferentes etnias. Por fim, traçamos o perfil físico e social
do principal fenômeno que assola a região Nordeste, a seca.

Autoavaliação
Acesse a Internet, no endereço http://earth.google.com/, e grave a versão livre (free) do
programa Get Google Earth, em seguida, instale-a em seu computador. De posse do programa,
visualizando o globo terrestre, mais especificamente, a América do Sul:

visualize o Nordeste e trace um perfil global do relevo, hidrografia e preservação


1 da flora da região;

localize cada uma das capitais dos Estados da região Nordeste descrevendo-as
2 brevemente a partir da imagem visualizada;

localize o município onde você mora fornecendo as suas coordenadas e preparando


3 uma breve redação a respeito dos aspectos físicos que lhe são característicos.

Nesta atividade, o aluno, além de já ter o programa GET Google Earth instalado no
computador em que trabalha, deverá contar com a ajuda do tutor com a finalidade
de aprender a manipular as opções oferecidas pelo programa.

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 327


Referências
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SCHMITZ, P. I. O povoamento pleistocònico do Brasil. Revista de Arqueología Americana,


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TEIXEIRA, W. et al. Decifrando a Terra. São Paulo: Oficina de Textos, 2003. p. 27 – 42.

VESENTINI, J. W. Brasil Sociedade e Espaço: geografia do Brasil. Ed. 11. São Paulo: Ática,
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328 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


Anotações

Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade 329


Anotações

330 Aula 15 Ciências da Natureza e Realidade


Esta edição foi produzida em mês de 2012 no Rio Grande do Norte, pela Secretaria de
Educação a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (SEDIS/UFRN).
Utilizando-se Helvetica Lt Std Condensed para corpo do texto e Helvetica Lt Std Condensed
Black títulos e subtítulos sobre papel offset 90 g/m2.

Impresso na nome da gráfica

Foram impressos 1.000 exemplares desta edição.

SEDIS Secretaria de Educação a Distância – UFRN | Campus Universitário


Praça Cívica | Natal/RN | CEP 59.078-970 | sedis@sedis.ufrn.br | www.sedis.ufrn.br
Interdisciplinar
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Ciência da Natureza e Realidade


Ciência da Natureza e Realidade

Franklin Nelson da Cruz


Gilvan Luiz Borba
Luiz Roberto Diz de Abreu

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Gilvan Luiz Borba
Franklin Nelson da Cruz
ISBN 978-85-7273-995-5

9 788572 739955

Ci_Nat_capa_abert.indd 1 21/12/12 16:37

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