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aula
02
Governo Federal Revisoras de Língua Portuguesa
Presidente da República Janaina Tomaz Capistrano
Luiz Inácio Lula da Silva Sandra Cristinne Xavier da Câmara
Diversidade química do ambiente / Ademir Oliveira da Silva, Otom Anselmo de Oliveira. – Natal, RN, :
EDUFRN, 2006.
292 p. : il
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da UFRN -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Apresentação
N
a aula anterior, analisamos alguns aspectos sobre os ácidos e as bases que são
produzidos por reações entre a água e os óxidos e, certamente, você já conhecia
muitos desses compostos, além de outros também classificados como ácidos ou
básicos. Mesmo assim, talvez você ainda não tenha percebido como é amplo o número de
substâncias, elementos ou íons que podem funcionar como ácidos ou bases.
Assim, nesta e em aulas subseqüentes, discutiremos vários aspectos relativos a esses
compostos, envolvendo suas definições, propriedades e princípios físico-químicos
determinantes dos seus comportamentos.
Inicialmente, apresentaremos as diversas formas de definição dessas espécies
químicas, quase sempre seguindo a cronologia das suas formulações. À medida que tais
definições forem sendo apresentadas, você perceberá que cada vez mais espécies químicas
podem ser classificadas como ácidas ou básicas, de modo que, ao final da aula, você
possa se perguntar: “Existirá alguma reação que não seja do tipo ácido-base?”. Estude
com atenção e poderá responder.
Objetivos
Ao terminar esta aula, você deverá ser capaz de: identificar espécies
químicas ácidas e básicas, de acordo com os critérios estabelecidos
para defini-las; classificá-las em função das suas ações ou das
suas características; e interpretar, fazer previsões e equacionar
reações características de cada tipo de ácido ou de base.
Generalidades
M
uitas espécies químicas classificadas como ácidas ou básicas estão presentes no
cotidiano, seja nos laboratórios, nas indústrias (como componentes dos processos
de fabricação ou integrando os produtos fabricados), na vida doméstica (em
produtos de limpeza, por exemplo), nos alimentos (especialmente nas frutas), no interior
das células (constituindo a base da vida) ou nos fluidos (suco gástrico, sangue, seiva, dentre
outros) dos organismos vivos.
Por essa presença tão marcante, há muito tempo se procura descrever os ácidos e as
bases e, desse esforço, surgiram vários conceitos ou definições para tais substâncias.
No caso dos ácidos, talvez a forma mais simples de defini-los seja dizer que ácidos
são substâncias de sabor azedo. Esse conceito vem da ação causada por tais substâncias
sobre um dos sentidos humanos, o paladar. É certo que essa forma não é suficiente para
descrevê-los, mas não deixa de ser usada sempre que alguma fruta cítrica é experimentada,
especialmente se não estiver bem amadurecida.
Já as bases, freqüentemente, são associadas à sensação saponácea que tais substâncias
provocam em outro dos sentidos humanos: o tato, o que, também, não é suficiente para
descrevê-las, embora possa funcionar como indicação preliminar.
Outra forma usada para classificar uma substância como ácida ou básica é verificar a
ação desta sobre os indicadores. Sabe-se, por exemplo, que o papel de tornassol é vermelho
na presença de um ácido e azul em contato com uma base. Esse método de classificação – que
depende de outro dos sentidos humanos, a visão – continua sendo útil, com resultados práticos
importantes em análises químicas. Porém, definir ácidos ou bases com uso de indicadores é
uma tarefa limitada, aplicando-se, somente, a um grupo de substâncias não muito numeroso.
No século XIX, alguns químicos observaram que, em determinadas substâncias, o aumento
do conteúdo de oxigênio fazia crescer a acidez dessas substâncias. Entre esses químicos, estava
Lavoisier, que chegou a propor uma primeira definição, com alguma base científica, para os
ácidos. Na época, os ácidos clorídrico, bromídrico e iodídrico já eram conhecidos, mas, não se
A
o longo do tempo, têm aparecido várias formas para a definição dos ácidos e das
bases. Todas essas formas – que muitos livros apresentam como teorias ou conceitos
– continuam sendo utilizadas, pois, podem ser aplicadas em sistemas apropriados com
bastante proveito, dependendo de cada situação particular. Além disso, as definições mais
restritas, mesmo aquelas emitidas preliminarmente, são compatíveis com as mais abrangentes.
Ácidos são substâncias que possuem hidrogênio e reagem com água liberando íons hidrogênio
(H+) e bases são substâncias que reagem com água liberando íons hidroxila (OH-).
Nessa auto-ionização (ou nas soluções aquosas em geral), o produto das concentrações
dos íons hidrônio e hidroxila é igual a uma constante, denominada produto iônico da água
(Kw), a qual pode ser expressa pela equação:
Kw = [H 3O+][OH-].
O valor de Kw é sempre igual a 10-14, a 298 K. Porém, as concentrações dos íons H3O+
ou OH– variam de acordo com as características e com as concentrações das substâncias
que sejam adicionadas à água.
Com base nesse fato, a definição de Arrhenius pode ser ampliada, incluindo como
ácidas as substâncias que, ao serem adicionadas à água, fazem aumentar a concentração
de íons hidrônio (H3O+) nas soluções formadas.
Como ilustrações, podem ser citadas as reações:
Da mesma forma, as bases podem ser definidas como substâncias que, adicionadas
à água, formam soluções, fazendo aumentar a concentração de íons hidroxila (OH-).
Nesse caso, podem ser citadas, como exemplos, as reações:
amônia amideto
Nesse solvente, ao se adicionar o gás clorídrico, ocorre uma reação, com o aumento da
concentração do íon NH4+ (amônio):
N aOH(s) + amômia(l) → N a+ −
(am) + N H2 (am) + H2 O
.
2CH3 COOH CH3 COOH2+ + CH3 COO− Khac = [CH3 COOH2+ ][CH3 COO− ].
Em equilíbrios desse tipo, podem ser definidos parâmetros, como os que estão
apresentados na Tabela 1, os quais correspondem ao produto iônico (Ksolv), à faixa de
concentração do cátion (pCátion, semelhante ao pH) ou do ânion (pÂnion, semelhante ao
pOH), e ao ponto neutro (pCátion/2 ou pÂnion/2) de cada solvente.
CH3CCOH 10 -13
0 – 13 6,5
KN H2 + amômia(l) → K(am)
+
+ NH+2(am) ,
cloreto de amônio (NH4Cl) é um ácido, já que faz aumentar a concentração do cátion (NH4+)
formado pela auto-ionização do solvente (amônia), e o amideto de potássio (KNH2) é uma
base porque faz aumentar a concentração do ânion (NH2-) originado na auto-ionização do
mesmo solvente.
Analisando-se agora a reação do cloreto de amônio com o amideto de potássio:
N H4 Cl + KN H2 → KCl + 2N H3 ,
Ácido Base Sal Solvente
pode-se dizer que esta é uma típica reação ácido-base, uma vez que o ácido (cloreto de
amônio) neutraliza a base (amideto de potássio), formando um sal (KCl) e regenerando o
solvente (amônia).
Atividade 2
Já a amônia, uma base fraca, ao ser adicionada à água, reage com esta, que agora
funciona como um ácido fraco, formando um ácido forte (NH4+) e uma base forte (OH-),
conforme é indicado na equação química:
É interessante notar que na primeira dessas reações, a água funciona como base e na
segunda funciona como ácido, sendo, por essa razão, classificada como uma substância
anfótera ou anfiprótica.
Mesmo que as definições de Bronsted-Lowry se refiram a reações com transferência
de prótons em qualquer situação, é conveniente fazer algumas considerações sobre o
comportamento dos ácidos e das bases em meio aquoso, em virtude do grande número de
reações que se processam nesse meio.
Atividade 3
O comportamento ácido-base dos ácidos fórmico, acético ou qualquer outro
ácido orgânico é semelhante ao de qualquer ácido inorgânico. Usando as
definições já estudadas, mostre que essa afirmação é verdadeira.
ácidos como sendo espécies químicas receptoras de íons óxido e bases como
sendo espécies químicas doadoras de íons óxido.
Essa definição é bastante útil quando se estudam algumas reações que acontecem
(não exclusivamente, mas) principalmente em altas temperaturas, o que é encontrado, por
exemplo, em processos cerâmicos e em metalurgia.
Um fato importante é que tais definições não contrastam com as demais. Apenas usam
um referencial diferente, e as espécies classificadas como ácidos ou como bases, segundo
Lux-Flood, são, também, ácidos ou bases segundo as outras definições.
Outra observação a destacar é que, nessas reações, normalmente as espécies que
contêm elementos metálicos funcionam como doadores do íon óxido (são básicas) e as
espécies que contêm elementos não metálicos funcionam como receptores do íon óxido
(são ácidas), como pode ser visto na reação seguinte:
M gO + H2 O → M g 2+ + 2OH − ou (M g(OH)2 , ou
(M g 2+ + O2− ) + H2 O → M g(OH)2
Base Ácido
Atividade 4
Mostre que pelas quatro definições de ácidos e bases já apresentadas:
a) na reação do CaO com a água, o CaO sempre funciona como base e a água
sempre funciona como ácido;
b) na reação do SO3 com a água, o SO3 sempre funciona como ácido e a água
sempre funciona como base.
H + + : OH2 → [H : OH2 ]+
Ácido Base
H+ + : N H3 → [H : N H3 ]+
Ácido Base Íon
Da mesma maneira, pode ser dito que na reação da amônia com BF3, este recebe um
par de elétrons do NH3 e, portanto, funciona como um ácido, enquanto a amônia, doadora
do par de elétrons, funciona como uma base.
H3 N : + BF3 → H3 N : BF3
Base Ácido Aduto
Isso ocorre porque o BF3 é uma espécie deficiente de elétrons, tendo somente seis elétrons
no seu nível de valência. Assim, na presença de um doador de pares de elétrons como o NH3, o BH3
pode completar o seu octeto ligando-se a esse doador e dele recebendo um par de elétrons.
Utilizando-se essa definição, muitas espécies químicas passaram a integrar o conjunto de
substâncias classificadas como ácidas ou básicas, conforme apresentamos nos itens seguintes.
a) Cátions metálicos
Estas espécies químicas podem receber pares de elétrons em típicas reações ácido-
base de Lewis, formando os chamados compostos de coordenação, que serão estudados a
partir da aula 7 (História e nomenclatura dos compostos de coordenação). Como exemplos,
podem ser citadas a hidratação e a aminação dos íons cobalto(III) e platina (II).
Co3+ + 6H2 O → [Co(H2 O)6 ]3+
H3 N : + B(CH3 )3 → H3 N : B(CH3 )3
AlCl3 + Cl− → [AlCl4 ]−
Mesmo espécies com octetos completos podem rearranjar seus orbitais de valência e
receber pelo menos um par de elétrons a mais, como ocorre nos casos:
CO2 + OH − → HCO3 −
SO3 + H2 O → H2 SO4
Espécies químicas com átomos ou íons centrais volumosos podem receber pares de
elétrons, assumindo configuração superior à de octetos:
M n+ + 6CO → [M n(CO)6 ]+
N i + 4CO → N i(CO)4
F e + 5CO → F e(CO)5
V − + 6CO → [V (CO)6 ]−
Moléculas com ligações pi (π) podem usar seus orbitais antiligantes para acomodar
pares de elétrons. Um exemplo desse comportamento é a habilidade das moléculas de
tetracianoetileno (TCNE) em aceitar pares de elétrons nos seus orbitais π* (pi antiligante) e
assim agir como um ácido.
Orbitais π∗
CN CN
C C
CN CN
Atividade 5
Equacione quatro reações do tipo ácido-base de Lewis, diferentes das apresentadas
nesta aula. Após cada uma delas, mostre que os seus exemplos estão corretos.
Definição de Usanovich
Em 1939, M. Usanovich propôs uma definição que elimina a restrição contida no
referencial usado por Lewis (pares de elétrons), tornando ainda maior o universo de espécies
químicas que podem ser classificadas como ácidos ou bases.
Em sua proposta, Usanovich define
ácidos são espécies químicas que reagem com bases, fornecendo cátions ou
aceitando ânions ou elétrons e as bases são espécies químicas que reagem
com ácidos, fornecendo ânions ou elétrons ou se combinando com cátions.
Essa definição, além de incluir todas as espécies químicas classificadas como ácidos
ou como bases pelas demais definições, inclui, ainda, as reações de oxi-redução, nas quais
números ímpares de elétrons podem ser transferidos.
Como exemplos de reações ácido-base de Usanovich, podem ser citadas:
HCl(aq) + N H3(aq) → N H4 Cl
F3 B + : N H3 → H3 N : BF3
F e(CO)5 + 2N O → F e(CO)2 (N O)2 + 3CO
O-
HO- + O C O HO C
O
C5 H5 N : + O → C5 H5 N : O
Nessa reação, o nitrogênio doa um par de elétrons para o oxigênio, o que a caracteriza como
uma reação ácido-base de Lewis. Ao mesmo tempo, essa é uma típica reação de oxi-redução,
com o oxigênio (oxidante) recebendo elétrons do nitrogênio (oxidante). Já as equações:
não podem ser classificadas como sendo ácido-base de Lewis, pois, nelas, apenas um elétron
é doado de um átomo para outro. Mas, o princípio reacional é o mesmo: transferência de
elétrons. Então, por que não classificá-las como sendo do tipo ácido-base com transferência
de um elétron (Usanovich)?
Bronsted e Lowry
Arrhenius Solvente
Lewis
Lux
Flood
Usanovich
Generalização
Figura 1 – Síntese das definições dos ácidos e das bases, mostrando as correlações existentes entre elas
Atividade 6
A Figura 1 tem sido utilizada (pelo prof. Ótom) como síntese das relações
Veen
1 entre as definições dos ácidos e das bases. A Figura 2, a seguir, é um
diagrama de Veen também usado para sintetizar essas definições. Analise
Jensen, W. B.; The Lewis as duas figuras e veja se existe algum aspecto conceitual diferente entre
Acid-base Concepts; John elas. Caso exista, descreva-o.
Wiley & Sons; New York,
1980.
Faria, E.; Dicionário Você deve ter observado que o termo espécie química foi muito
Escolar Latino-português
(6a ed.); FAE-MEC; Rio de
2 usado nesta aula. Que razão pode justificar tal fato? Não seria
mais simples ou mais conveniente o uso dos termos substância,
Janeiro, 1994.
elementos ou compostos?
Usanovich
Eletrônica
Ionotrópica
Protônica Sistemas
Arrhenius solventes
Lux
Auto-avaliação
Faça um resumo sobre o comportamento dos óxidos sob o ponto de vista da acidez
1 ou basicidade de Arrhenius.
Qual a diferença entre um ácido e a sua base conjugada ou entre uma base e o seu
3 ácido conjugado? Apresente dois exemplos para ilustrar sua resposta.
Referências
COTTON, F. A.; WILKINSON, G. Química inorgânica. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e
científicos, 1978.
HESLOP, R. B.; JONES, K. Química inorgânica. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulvernkian, 1976.
HUHEEY, J. E.; KEITER, E. A.; KEITER, R. L. Inorganic chemistry: principles of structure and
reativity. New York: Harper Collins College Publishers, 1993.
SHRIVER, O. F.; ATKINS, P. W. Química inorgânica. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2003.