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Projeto

PERGUNIE
E
RESPONDEREMOS
ON-LlNE

Apostolado Veritatis Splendor


com autorização de
Dom Estêvão Tavares Bettencourt, osb
(in mamariam)
APRESENTAÇÃO
DA EDiÇÃO ON-LlNE
Diz São Pedro que devemos
estar preparados para dar a razão da
nossa esperança a todo aquele que no-Ia
pedir (1 Pedro 3,15).
Esta necessidade de darmos
conta da nossa esperança e da nossa fé
.. . ' .
,
hoje é mais premente da que outrora.
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrárias à fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crença católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste slle Pergunte e
Responderemos propOe aos seus leitores:
aborda QuestOes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristão a lim de que as dúvidas se
.' dissipem e a vivência católica se fortaleça
_l ... no Brasil e no mundo. Queira Deus

abençoar este trabalho assim como a


equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.
Rio de Janeiro, 30 de Julho de 2003.
Pe. Emevlo s.nencoul'l. aSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATlS SPLENDOR

Celebramos eonv6nio eom d. Estevão Benencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
oonteúdo da revista teológico - filosófica ·Pergunte e
Responderemos· , que conta com mais de 40 anos de publicação.
A d. Estêvão Betlencourt agradecemos a conllaça
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
·

- ;..
-.;:::" .

:J••

ANO XX - N9 238
Sumário
....
A IGREJA E o MOMENTO NACIONAL. ........ . " . ..•.. . ...•. 3"
um doc:umenlo d. Santa S. :
"CREIO NA RESSURREIÇAO DOS MORTOS" 399

Um Ilno ,Iet), q" delx. q ....16es aberll. :


·'CRIAÇ}.O E MITO" por OswaJd loralz 4"
Nos plimóldlos da hl.16rla di uluçlo :
A JUSTIÇA ORIG INAL ; I:XISTIU? OUE SERIA.? 410

Um sociÓlogo t.t. l obr.


"MANICOMIOS, PRISOES E CONVENTOS" (Eryin; Gollman) .. .. 4:tO

No cinema :
"O MILAGRE DA FE"

LlVAOS EM ESTANT E 438

COM APROVAÇÃO ECLESIASTlCA

• • •
NO PRÓXIMO NOMERO :

Luta d. clo'le. e Cristianismo. - Que ê um Apocalipse? - Reuvr·


rei(:ão dos mortos , quando? - E tIS (orre,,18, de oloeões?

--- x
« PERGUNTE E RESPONDEREMOS .
Número avulso de qualquer mês . .... .. .... CrS 18.00
AssInatura anual .. . ... .... ... ............. . CrS 180,00
Direção e Redação de Estêvão Bettenoourt O.S.B.
ADl\lINISTRACAO REDAÇAO DE PR
LlVl'lU'Is l'lIsalonArlA Editora CltIXII. Postal Z. 600
Rua l'IêXJco, lll-B (CoRte lo)
20 .091 Rio de Jo.neJ ro (IL)) 20.aoo nio de JlUlell'O (RJI
Te!.: 224-0039
CENTI

---'~:=..U:
A IGREJA E O MOMENTO NACIONAL e~
Os jornais notielaram que, em principio de sel:emb 'O.\pp.,
a ConCerêncla Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e'fft.re.
gcu ao Sr. Presidente da República mais um documento c sua·
lavra, Intitulado "Subsídios para uma PoUtica Soclab.
I!'.: compreensível que então mais uma vez se tenha posto
a pergunta: com que direito a Igreja faz isso?
- Por certo. a Igreja não é nem tem partido poDUco.
Também nãG é uma agremia(ão de técnicos ou espeelallstas em
economia. sociologia, polltlca. .. Mas é"o Corpo de Cristo pro-.
longado ou a continuadora da obra ele Cristo atraWs dos
séculos. Ora acontece que
- o Reino de Deus apregoado pelo Senhor Jesus nlo é
algo de meramente futuro, mas deve·se Iniciar já no rtecurso
da hlstórla deste mundoj
- todas as atividades do ser humano estão sujeitas 805
critérios da moralidade. Nada hA, na conduta humana Ondfv1.
dual e coletiva), que seja moralmente neutro: OS atos humanos
ou se coadunam com o Fim Supremo do homem (e, neste caso,
sáo moralmente bons) ou não se conciliam com o mesmo (e
são moralmente maus). Em outros termos: as atividades hu.
manas ou são aptas a constnJlr o Reino de Deus na terra (e
são moralmente boas) ou, ao contrirlo, destoam dOs princpios
desse Reino (c sAo moralmente mAs) .
e predsamcn(~ como porta-voz do Reino de Deus que a
Igreja se In (el'essa pela ordem temporal em suas dive-rsas
racetas e ousa pronunclar·se a respeito. Não lhe compete ofe·
recer às autol'idndes civis planejamentos de poJltlca et'onOmtca,
habitacional ou cscohu', mas, sim, as grandes linhas de cons·
trução da sociedade que decorrem da mensagem do Evange.
lho. Se a Igreja não fizesse Jsto, seria omissa pernntc Deus
c os homens.
Esta partlclpa~o da Igreja na l.>struturação da vida na·
donnl ndo significu qu~ os bispos C!Stejan, esquecendo Os Inte·
resses da cspirituallclade ou os valores eternos. Na verdade, a
atenção ao plano horizontal (na medida em Que este Interessa
ao ~cino de Deus I não exclui. mas supõe, o zelo pelo relacio·
numento direto c Intimo do homem com Deus na oração, na
vida sacramental c na ascese. Estes valores devem ser assi·
duamente fomentados pelos pastores do Reino. O cristão que
os esquecesse, correria o risco de se deixar apaixonar mesqul·
nhamente.
É pl'inclpalmcnle por SCllS fiéis leigos que a Igreja se
torna pl'\?S<,nte nas estruturns da sociedade. Por Isto se deve
- 397-
dizer que o momento atual, em que o Brasil repensa as suus
linhas·mestras sociais, é a hora dos leigos. A estes, e não ao
clérigos, compete colaborar diretamente na configuração cristã
da economia, da democracia. da sociedade, etc. Eis o Que pro-
põe o ConclUo do Vaticano Ir:
"O Concilio exorta os crl.tlos, cldadlo. de um. li outra cldado, a
proc;u!'er dnempenluu 'Ielmenle as lua lara'a, terrestre., guiado. pelo
esp'rlto do Evangelho. AllSlam.,a de verdarle os que, sabendo nlo termos
aqui cidade permanente, mas bulcarmos a fUlur., lulgam poder negligenciar
os .eus deve," .e,rest,es, Iam perceber que eslAo mais obrigados •
eumpl"l08 por cau .. d. própria ", da aeordo cem a voeaelo .. quaJ eed.
um ,O{ ehamado" (Con.'. GaudlUlln et ' ' ' ' n9 43).
Ainda uma ponderacão se impõe:
Nâo nos deve surpl'eendel' o fato dc que os cristãos não
pensem igualmente a respeito da estruturação da sociedade
clvll e politlca. As divergénclas sAo compreensiveis e legitimas.
Com efeito; imaginemos alguém na rua posto diante de um
semáforo: o sinal verde e o vermelho tém significação inequi.
vaca. não deixando margem a hesltaCães da parte do obseIVa·
dor. Mas •• , o sinal amarelo? - Ê o sinal de transição, que
alguns Interpretarão como derradeira autorização para passar,
enquanto outros o entenderão como advertência negativa. Qual
das duas atitudes contraditórias ê a correta? - Difícil se torna
deflnl·lo, Tanto os que dizem sim como os que dizem não têm
razões válidas para fazê-lo; tanto WlS como outros são since·
ros e prudentes, visto qUe a prudência é a virtude mais subje.
tiva do ser humano: dc(X!nde da escola, das experiências, do
temperamento, da idade. .. que caracterizam cada pessoa. ~
o que exJge respeito (que não é relativismo) de cada disclpulo
de Cristo aos seus semelhantes sinceros.
Por isto, os cristãos não se espantam por obsen'ar diver·
gências entre os innãos na fé com relação â política. A situa·
ção nacional é tão varlegada e complexa Que sugere aos homens
retos mais de uma tentativa de solução compntivel com a fe
cristã. O que Importa, é nno pcrdcnnos o amor fralerno e a
Wlldade nos valores essenciais; importa·nos outrossim pl'O.
curar discernir, na posição de quem diverge, os principios de
verdade e de bem que nela estejam latentes. Esta é a hora
de somarmos, evitando aumentar divergências e divisões.
Possam estas grandes verdades orientar os passos do povo
brasileiro ne!ita hora Importnntel .. _ Hora que, com especial
carinho, colocamos sob a tutela da Santa Mãe de Deus neste
mês do Rosérlo. que lhe é dedicado!
Estêvão Betfenoourl O. S. B_
/'
- ~98-
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XX - N~ 238 - Outubro d. 1979

Um documento da Santa Sé :

"creio na ressurrei<ão dos mortos"


Publicamos, a seguir, o texto oficial português da carta-
-instrução emanada da S. Congregação para a Doutrina da
Fé (Roma) aos 17/ 05/79, com referência a certas Questões
atinentes à ressurreição dos mortos e aos Novíssimos (aconte-
clmento~ finai s) do IlIdlvlduo e da humanidade como tal',

Oferecemos o texto, por ora, sem comentários, a fim de


que se possa tornar conhecIdo como ta l, vista a sua impor.
tância. Servirá para eluci dar questões e d irim ir possivels dú'
vidas existentes entre os Ciéis. Dado o estilo conciso dos pro-
nunciam entos de tnl carta, v()ltul'C'mos oportunamente ã mesma
nesta revista, propondo um .comentá rio teológico dos seus
di1.eres.
Possam os sacen:lotes e os agentes de pastoral responsâ.
v('is pela Ctltcquese utilizar o documento, conscientes da corres-
ponsabllidadc qlle lhes toea na preservacão e na transmissão
da fé confiada por Cristo à. sua Igreja em lavor de todos os
homens!
cEu vim para que tenham a vida, e a tenham em a bun-
dância !., dizift o Senhor (Jo 10,10).

SOBRE QUESTOES CONCERNENTES A ESCATOLOGIA


A TODOS OS BISPOS
MEMBROS DAS CONFEReNCIA S EPISCOPAIS
ali mais recentes SlnodoJ dos Bispos, d&dicadOIi à Evangclira(áo
e ti Catequesç relipectJ'Iomente, conlrlb\llrom poro s e tomar uma tons-

I Embora datado de maio pp., o texto lallno onelal do documento em


.pauta 86 foi publicado pela primeira \16% n. edlçlo de "L'Ossarvalore Ro-
mano·' d. 18-17 do lulho PI).

-399 -
.'-_ _ _ ~~qUNTE E RESPONDEREMOS) 238/1979

06ntl0 moi. vivo da necessidade d. uma perfeito fidelidade às ver·


dades fundamentdi. da f'-, sobretudo em nOUa tempo, em quo
mudancos profundas no ambiente humono e a preocupação d. fo:zer
peneirar o fé nos dlvenas culturas humanos obrigom o um esforco
moior do que em tempos panados, parg que o mesma fé pano :er
tornado mois Clcouivel e melhor posso !ef comunicado. EstQ úrtimo
exigincia. fõo premente na atualidade, requer tlm cuidado m~ior
do que nunca poro se (uteouro, (I verdadeiro sentido ti o in'egri-
dade da fé.

Por "isto aq",el•• IObf'. quem incumbe a IlIsponsabilidode, devem


IIslor mvila ol.nlos a tudo aquilo que pollo porvenlur.a vir (I cau-
sar, no conscilndo comum do. fiéis, umo lento degrodocão li o
progressivo ulincão d. quolquer . ~.m.n'o do Simbolo boti~mol,
indispensável poro o coerêncio da fé e imeparovelmente Ii;odo
o cerl05 usos importantes na vida da Igrejo.

Para um de"e' pontos precisamente, pore~eu oportuno e tlr.genl_


chamar o olenc;ão daqueles o quem Deul confiou o encargo de
promover e de defender a f6, (I fim de serem prel:cl'vidos os perigos
que poderiam vir -o pSr em caUtO eslo mesma fé no alma das fiéis.

Traio-s. doquel. orllgo do Credo que di;&: respeito õ vida eterna


e, por conseqüência e de modo ,geral, 6qul!o que estâ poro além
do morte. Quonlo o este problema, o ensino não pode permitir que
se lhe subtraia coisa algumol mais Cllndo. ele nao pode permanecer
deficiente! ou incerto sem p6r em perigo a fé e o ~o fvoção dos fiéis.

A ninguém pano despercebido a importância deue ultimo


ortigo do S(mbolo boli: mol ; ele exprime o lermo e a finalidade do
des1gnio de Deus, cuJo desenrolar-se é descrito no mesmo 51mbolo.
Se não há fluurreicôo, desobo lodo o estrutura do fé, como Clfirma
vi;orotomente sao Paulo (d. leor 1S). Se os cristãos niio estive-
rem em condições de ligar os polovros «Vida Eterno » o um conteúdo
certo, entôo a s promeuCls do Evangelho e o senlido do criac;õo e
da Redencão esvatT'll-u, e CI pr6prlo vida presente fico privada de
todo .'perança (d. Hb 11,11.

Sendo onim, como la podem ignoror o mal_estar li o perturbaçoSo


de que muito. ficam ponuldos em r.!ol;õo o esle ponto? Quem nõo
vi que o Rf'vlda se Insinua sutilmente e chega a atin;ir mesma o
mais pro'fundo do. esplritos? E, multo embota as cri,llÔol no maior
porte dos COlai, fe lizmente, nao ~heouem à dúvida positivo, sucede
que muitos le ClbJtêm de pensor no destino que os espera poro além

- 400-
_CREIO NA RESSURREICÃO OOS MORTOS ~ 5

da morte, porque comecom a pressentir problemas a que receiam


ter de dClr \Imo r.,poslo; Existirá alguma coisa para ol~m do mor •• ?
Sub.htir6 algumo coi1<1 d. n6. mesmos depois do morte? Não teró
porvenh,llo o nado que nOI espe ro?

A cou'o disto h6 que bU1CÓ· lo, em porte pelo menos, no reper·


cussão quo, sem se quer.r, têm nos uplritos os controvérsias teol6 .
gicos, hoje e'" dia lorgoment. difundidos enlre o grOl'ldo público, •
dOI quais Q moiO'r porle do. fiéi. nõO' el16 em c;ond(ções de dis c ~rn"
o ob jeto preciso nem de medir o alcance. Assim ouve' le di ~ cutir o
8xistincia da olmo e o sionificodo de uma lobrevivência e fazerem·.e
interrogatões quanlo ao que se po:sa enlre a morle do cristão li
a ressurreição urtiversol. Oro com todas estas coisas o povo cri:lão
fico desorientado, uma VIII. que já nco encontro o seu vocobulbrJo
11 as noções que lhe sõo familiares.

Não 111 Iroto, obviamente, de cooretar ou enlão de irrlpedir o


invesligaçõo leol6g1co, do qual o fê do Igreja tem necessidade e
de (\ljos resultados, portanto, há de poder aproveilarj iSIO', porém,
de maneiro nenhuma permite descuror o dever de tempeslivamente
salvaguardar a fé dos crislão, quanto àquele. ponlos q'Ue .ão postos
em dúVida.

I: deUe duplo e dificil dever que queremos r(!cardar sumaria·


mente a nalurC1C1 O 05 v6rios (upoetos, neslCl situClção d elicada.

e neces!ório. antel de moi, noda, q"'e oq\leles que eXCltcem os


' uncõel de ensinelt laibClm discernir bem aquilo qUI a Igreja con·
sidera como faze ndo porle da e ssência da suo fe. o invesligoção
teol6gica não pode vi! or a oulro obietiva qlIe não seja o d . apro·
fundar iuo mesmo e de me lhor o explicar.

Esla Sagrado Con.9 rogoção, que lem o responsabilidade de


promover e de de1ender o daulrino do fé, propõe. le haje recordclf
aquilo que o Igreja ensino, em nome de Crista, especialmente quanto
ao que ~ obrovém entre o morle do cristão e o ress\lrroiçãa universal.

11 A Igreja cri numa reuurreiç60 dOI morlOI Id. 51mboto


do. Apóstolos I .

2) A ~greio entende e sta ressurreiçôo refe,ido 00 homem


todo; e:lo, para o . eleitos, não é oulra coisa senôo o extensão, aos
homens, da prõpflo Reuurreieco de Cristo.

- 401
~ _ _ ._ ....!ft:RGU ~:fE r": ~ESPONOEn.:t:MOS~ ..238/1!J79 ___ •."_ ._

3) A Igreja ofirmQ g sobrevivendo e a subsistência, depois


do morle, de um . Iemenlo espiritual, dotado de conscilndo e de
vonlade, de 101 modo que o c.u humano. lubsislo. Poro designor
eue elemento. a Igreja emprega o palavra calmo_, conlollTodo
pelo 1,110 que delo fazem o Sagrado Escrituro e a TradiçÕo. Sem
Ignoror que ."e termo é tomado na e lbrio em div.nos significados,
Elo iulgo, não obsto"I•• que não e ... isle qualquer ralão sé,io poro
o rejeitar e considera Mesmo IlI!r absolutamente indispensável um
indrumento verbal poro suster o fé dos mslãos.

-41 A Igreja ';lIdui lodol os formas de penlcunen10 • do


expressão que, se adotadas, to rnariom obs.urdo$ ou ininteligíveb a
lua orocão. es ..us rite, fúnebres li! e seu culto des marias, reoU-
dodes que, no lua subllôndo, conltituem lugQre~ teológicos.

SI A Igreia, em conformidQde com o Sagrado Escrituro, Clpera


«o glorio$a manife, taçõo d. Nono Senhor Jesus Crilfo ~ Id. Cons·
tiluicão cO.i Ve,bum ,. I, AI , que Elo considera como dhtinto e
diferida em reloção ãquelo condlcêlo pr6pria do homem imediato-
mente depois da morte,

6) A Igleia, 00 el\por o suo doutrino sebre (I sorte do homem


apól a morte, exclui qualquer explicação que tirQ ~ I. o 'entldo li
Allunçõo de Nona Senhora naquilo qve ela tem de único: ou
seja, o folo de ler a glotificaçCio corporal da Virgem Sontís,sima
umo antecipoçõe do gloriflco(õo que est6 deslinado o todol os
outros .felto •.

71 A Igreja, em adesõo fiel 00 Neyo Teltamente e li Trod j·


Cão, oaedito no felic;idade dos JUltos que c esfarõo um dia com
Cristo»-, Ao mesmo tempo Elo cr6 numo peno que hb de castigor
poro sempre o pecador quo for p rivado do visõo de Ceus, e a inda
no repercussõo desta peno em lodo o ser do mesmo peC'Odor. E,
PCW' fim, Elo cri e.iltir poro OI .Ieitos limo eve ntual purificaçõo
pr'yio li vi.60 de Oeul, o qual no enfonto i absolutame nte diverso
do pena dOI ccndenCldol. E Islo que a Igreja enfende qvond o Elo
fola de Inferno e de Purgot6rio.

!"elo qUe r•• peita ô condlç60 do homem op61 a morte, há que


pr.ca.... r~le part'icularm.nte contra e perigo d. ,ep.elen'O(Ões fun ·
dodol apeno, no Imaginaçõo e orbilr6rlal. porque o e.ceno dOI
mesmo. enlro, .m grande porte, nOI dificuldades qlle muitos vezes
(:I f~ cri.tã .ncentra. No entonlo, ai Imogen, de qve le se,.,e o
Sagrada E.critura ",.,ec. ", todo o r,'peito. MOI t. proó,o copto, o

- 402-
. CREIO NA RESSURREICAO DOS MORTOS. 7

seu sentido profundo, evilClndo o risco de os alenuar demasiadamente,


o que equivale não raro o esvaziar do pr6pna ,,,b.tância os rooli-
dades q\le são Indicadas por lois ima;ens.

Nem (J Sagrado Et.cri'ura nem a Teo losia nos proporcionam


luus suficientes para \Imo representação da vida futura poro al4m
da morle. Os cri,taol devem manter-se firmes quanto a dois pontos
euenciais , de-vem ocr. dilar, por \Im lado, na continuidad. funda"
menlal que existe, por virtude do Espirito Santo, entre a vida pre-
senle em Cristo e a vida futura la caridade, efetivaMente, é a lei
do Reino de Deus, e , pela nossa caridade aqLli no lerrel q!Je há
de .er medida a nas ~ a participação no glória do Céu). Por outro
lado, os mesmas cristãos devem saber bem que existe uma ruptura
radkol entre o presente e o "Uluro, p elo fato de que à ttCOnomlo
do f6 sucede o economia da plena luz, ou seja , nós estoremos com
Cristo e everemOI Deus:. Id. 1Jo 3,2 ), promessa e m ist ~r lo ;na..,..
ditos nos quais consi:!e enenáalmente o nona esperança. Se ,
certo que a naueI eClpacid(lde de Irnoginar não allnge iuo, o nono
coração instintiva e profundamente tende et chegetr 16.

Cepols de se terem record(ldo eS'.1 dadol, seja permitido agor(l


evocar os principais olpeclo. da re.ponsabUidade pastoral, foi como
ela s. deve traduzir na pr61ica, nas clrcunst~ncios atuais e lo! IUl: d(l
prudlncla cristã.

As d ificu ldades que andam cone.ol com elles prob'emas,


impMm gro..,o, d everes 00. te610gos, cuia missão ~ indispensóvel.
A ssIm eles têm o dirf'jto ao nouo Incitamento, bem como ~quel(l
mor pem de liberdade que @xiiam lepltlmamenl e os seus método. de
troballlo. Por nosso parle, todavia, 6 nece' sório lembr,gr incoss(lnle·
mente aos fiéis os ensinamentos da Igreia que constituem a base
quer do vida cri.lã, que .. do s in",estigaç5es dos especialislo«. I: ne·
cenórlo també m envidor esforço' poro que o s le61090s comparti.
Ihem os nossos p reocupocães posloroll, o fim de evilar que as ~ eus
estudos e o s .suos inldal ivos de pesquiso selam le me rariamente di.
fundidos enlre OI fiéis, (ut(l fê, hole mais do que nunca, está sujeito
a ,:.origol.

o último Slnodo tornou claromente m(lnif."ta a atenta0 que


o Episcopado consagra 0 0 conteúdo es"e nciol da Q;lteque~e. lenda
em visto o moTor be m do. fiéi •. e neceu6rlo, pois, que todos oque'es
a que m está confiado o ofldo de tra nlmilir ene conteúdo, htnhom
do melMO uma Td6ta muito claro. A:dm n6s devemos proporcionar-
·Ihel o. meiol paro que ele. se monle nham muito firme. quanto

-403 -
8 ,PERGUNTE E RESPONDEREMOS, 238/ 1979

ao essenciol da doutrino e, 00 me:imo lempo, bem alenlos pora não


d.iJtor quo represenlações infantis ou orbilrórios se confundam COIII
Q ..... 'dade do fi.

Deve ser exercida uma vj9i1gn~cio continuo e coraJosa, mediante


uma Comissão doutrinai diocesano ou nadonal, sobre Q produção
literária, não apenos pore! prennir a t.mpo os fiéis conlra as obras
que le opresenlem pouco seguros quanto à doutrina, mos sobretudo
poro lhe, dor o conhecer oQuelas oulras q\l8 se de monstrem copo:ru
de alimentar e de opoior a sua fé. Isto constitui umo farefo órduo
e de ,grande importância, que se apresento urgente, .quer pelo vaslo
difusão do imprensa, que r poro aquela descentralizaçõo dos respon-
sabilidades que as circunl16ncios atuai, tornam necouário e que foi
de.eiodo pelos Podr., do Concilio Ecuminico.

Esla carla, lobre cuio leor havia deliberado em reuni lia ordinâ-
,ia o Sagrada Congrevocóo porg a DoutrIno do Fé, no decurso de
uma audiêndg concedida 00 abaixo-auinado Cardeal Prefeito, foi
aprovada por Sua Santidade (I Papa Joõo Paulo li, qUI! orde nou (I
suo pubticotão.

Roma, sede da Sagrado Congregacao poro G Doutrina da Fe,


ao, 17 de moia de 1979.

Froncllco, Card eal Seper


Prefeito

Fr. Jer6 nima Hamor O . P .


Ârcebispo titulor d. lorium
Secretário

Como dito, tomaN!mos ao assunto oportunnntcnt~ .

- 404-
Um Itvro rico . . . , que deixa quest6... abertas :

"criação e mito"
por Oswald Laretz

Em Ilntese : o livro de Oawald Loratz Inllluledo "Crlaçlo a Mito"


' 1luda os lrês primeirol capitulos do Glnalll do ponto de vlall IIlar6rlo :
cita numerosos 1&:1(101 d i IlIeralura orlenlal anllga. que o aulor aproxima
cio 181110 Illblico. mostrando llemelhanç.s • dl5semelhanças exlst.ntes antra
aqu.la• • astl. A BlbUa. nesses prlm.lros capitulas, as!arla multo ch.gacla
ao glnaro lIIerârlo do mIto. isto é, de uma mensagem doutrln;'rl. sem
grande base ou cont.Lldo histÓflco.

Ora tal maneira de antender Gn 1-3 I lneulfclente. O uegata cat6-


llce "lo se pode Umltar a uma anAlise me ramanta lIterAria do texlo blbllco,
mas compela-Iha levar em conta outrossim os pronunclamantos do magia-
t6rlo da Igreja a respe ito de determinadas pusagens que têm valor capital
para a doulrlna da fé; asta se acha estruturada de modo que " lo pode
presclndlt da hisló'la•. . . hbl6rla que os anllgos escreviam sagundo ,eg ras
de .stllo llvr., nlo compar6vels b das crOnlcas contemporl"au .

• • •

Comentário: O livro cCriacão e Mlto:t de OswaJd Lorea I


aborda os três prImeiros capítulos do Gênesls. Já sumaria·
mente apresentado em PR. 235/ 1979. 48. capa, voltamos 8
considerá-lo, desta vez com mais ponnenores, v isto que é
obra momentosa. O autor é ca tólico e publicou seu original
alemão na Editora Vr.rla~ KathoIL-.chr.s nibt~lwcrk em
Slullgnrt 1968.

Como se compr eende, Loretz estuda separadamente a


narra'Cão sacerdotal P (Gn 1,1-2,48) e a javista J (Gn 2,4b-
-3,24). Interpreta-as. porém, do mesmo modo_ Segundo Loretz,
as duas peças vêm 8 ser um tecidO de trechos e Imagens

'C,J.çlo e mito. Homam a mundo .egundo o:t c. pllulo. Inlcklfa do


QIMib. Coleçlo "Blbllotaca de Estudos BlIlllcos" "t 6. Traduçlo de
Jo,ê Amérlco de Msl, COullnho. Ed. Paull"a., 510 Paulo 1979, 145x 210mlllll.

- 405-
10 G:PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 238/1919

mitlcas usuais nas Uteraturas e tradições orientais antigas


(sumêrlca, babilônica, ugaritioa, cananéia . .. ). Assim a se·
mana da criação, o repouso de Deus, os astros que regem o
culto religioso, a produção do homem a partir do barro, a
costela na origem da mulher, as árvores do paraíso, a fruta
proibida, a serpente, os querublns . . . Os autores blblicos ter-
-se-ão servido dessas peças míticas; eliminaram, porém, os
elementos politeístas, Incompat:vels com a fé de Israel num sô
Deus; desta forma a Bíblia desmitizou os fragm entos míticos
utilizados. Em conseqUêncla, as narrativas que hoje se encon·
tram em Gn 1-3, nada referem que destoe da mensagem
geral monoteista dos livros sagrados de Israel, mas também
nada contêm de hlstórico ou cientifico.
Para chegar a tal conclusão, Loretl: cita numerosas pas-
sagens das literaturas orientais pré-cristãs que ele bem conhece.
Também dta uma série de ~egetas e teólogos contemporâ-
neos, medievais e antigos, comparando entre 51 as interpreta-
cães que tenham dado a Gn 1.3. A documentação e a erudição
de Loretl impressionam, sem dúvida, o leitor.

Todavia duas obsexvaçées parecem oportunas diante do


estudo de Loretz.

1. Que deseja o autor afirm.cr propriamente?


1) Loretz confronta e discute opinIões diversas ... Nega
com facilidade e freqUêncla . .. , mas deduz poucas conclusões
positivas; O fio das suas exPlanações é, por vezes, um tanto
confuso. Tenham-se em vista, por exemplo, as seguintes
passagens :
a) À p. 109, lé·se :
"SeGundo a nar,..IIva da c,la,lo , Deua lIS3ume. depoll da crlaçlo
do mundo. ume atltuda clara par. com a lua obra. Ele lhe apn"enla,
como modelo, o próp rio repoulo, E 1110 Indica. conrome lodo o conlaMlo,
qua DaUI .. li .ompro voUado pari! o aeu povo. para cuja aarvaç'o a ,.11·
cldadlt, Ela. como Ollador. pode lampr. Int.,....lr • qualquer momento. Esta
repouso a, portanto. antendldo ICOmo uma continua açlo de 0.1,11 am
prol do lau povo".

:t legitimo perguntar: qual a base de Loretz para inter-


pretar o repouso blbltco como ccontinua ação de Deus em

-406 -
"CRIACAO E MITO.

prol de seu pOVO.? - O fundamento para uma assertão tão


contraditória não aparece no contexto da obra analisada.
b) À p. 105, sobre o mesmo tema encontra-se:

" Oe us assume. face*, obra condu Ida, uma atitude de repouso. Porêm
O repouso de Deus Irlduz..se por um 'ItI1.r conllnuo sobre o povo .NadO
para prOI.g.... Io, ainda que lato nlo exclUA a possibilidade de que ele
possa, eventualmente. rallr. roSe no silêncio .. _ Sobre esle plano de encon-
Iro. no I mblto da cliaçlo. fln lre Daus e os seul, li sempre posslY81 um.
ulla rlor crlaçao. uma Inl8rvençlo geradora de uma vida potente e divina
a que, por Isso, li uma nova crlaçlo. Na espera desla IntervençAo dlvlni.
estA a esperança dese!!'a pela Blblla. Só neste sentido real falia verdadel-
rl menle a ctlaçJo e, conforme a esperança 9Xptes.sa no Anllgo Ttsl~
mento, somente no futl,llo pode ela ser aguardada:'·.

A propósito, maJs uma vez não se vê bem por que . o


repouso de Deus signiflque necessariamente «o velar con~nuõ
sobre O povo aliado para protegé-lo:t-.

c) À p. 109, acham·se Os segulntes dizeres :


"Considerando quo, :58gundo as Escrituras, a crlaçlo , um ~'io
parllcular de Deus que consis te ne doaçlo de uma nova forma de vida,
ser' preciso ranunclar a Interpretar a canllnua Inlluêncla de Ceul lotlre
o mundo como crea110 cOlllllnue. Neste çaSQ, • açlo cllador., "nlca no
eeu gCln.ro, executada por Deus desde o Inicio, perderia o carllter de
excepclonaUdade que lhe' próprio, enquanto seria eludldo em subalAncla
o problema parUcular d. ,ellçAo da Deus com 11 sua crleçlo no CU I100
cios tempos".

Pergunta-se: por que negar que a continua influência


de Deus sobre o mundo l!eja uma erea.tio continua! Se Deus
subtraisse sua acão sustentadora ou conservadora do mundo,
este não subsistiria por 51 mesmo. Eis por que se diz com
razão que a conservaC4o do mundo equivale a uma crlagi.o
continuada..

Ademais o texto transcrito é obscuro; aOnne ou Insln~


p roposlçôes semas provar.
dI À p. 106 lê-se:
" No que re,peUa ao nascimento do esplrfto humano, poder-se·la
dlz.e r da concreto que o comparecimento do que é novo na reelldade,
partlcularmante O nascimento do "plrlto, graças à aulo-superaçlo de
caulas crlalu,..I" .e tornaria posll....1 dentro da torça divina".
:t: justo Indagar: que significa esta passagem?
- 407-
12 ~ ~t;HG1JNTF.: F; '~PON/)f~R":Mo.."i .. :~l~/l,"!I'7!".e.' _ _
e) À p. 150, encontra-se a seguinte afirmação:
" 00 ponlo de V151' brbllco, o paral50 ut' mels no futuro quO' no
pllSSildo".

Que significa o m.aJs da frase acima'! - Quer dizer que


o paraiso estava um pouco no inIcio, e estará mais realizado
no fim da história do gênero humano?

Na verdade. dlr-sc-ia que. segundo Loretz, o paralso a


nada corresponde no passado. mas vem a ser a maneira de
descrever o estado ideal a que terá chegado a humanidade
quando consumada a história, Diz Loretz :
"0 paralao, na verdade, ,er6- criado apenas no momento em qu. o
próprio DeU5 for, em plenltud., a vld. dos seus (Ap 22, 15)" (p. 1!i0).

Em suma, sio estcs alguns trechos em que a obra de Loret2


parece confusa. De resto, Quem a lê atentamente. experimenta
dificuldades para distinguir o que o autor atribui à mitologia
(ou o que o autor apresenta como sendo a paráfrasa ou o
comentário dos mitos, qua t:'le não endossa) c o que o autor
afirma como sendo o seu modo de ver ou a sua posição pes-
soal. Lorea. propõe e debate tantas sentenças que não se per-
cebem facilmente as frases que afinal ele assume como válidas
e plausíveis.

2. E a palavra aficiClI da Igrela?

No tocante à descrição das origens do mundo e do homem,


tanto na narracãa P como na J, pode.se tranqüilamente reco--
nhcccr que nndn tem de CrGnlstlco (em sentido moderno) ou
clentiflco. Os autores SDgrados não pretendiam saber e narrar
como apareceram as diversas criaturas nos primórdios da his-
tória; nio tinham m~ios para tanto. visto que escreviam a
enonnes distAncias dos primórdios. nem Deus lhes quis reve-
lar, por mUagre, a maneira como surgiram os Sõeres inani-
mados e animados nas origens do mundo. Os hagiógrafos ape-
nas se Interessavam por apresentar uma visão saplenclnl ou
fUosóf'lCO_teo16gica do mundo, do homem e das relações das
criaturas com o Criador. Quiseram, sim, Incutir que hã um
SÓ Deus, a cujo poder criador se devem todos os seres Que
na antiguidade eram adorados como deuses {astros, animais.
- 108-
tosques e plantas). O mundo é bom, não é eterno. Ao homem
toca um lugar de primazia: deve ele, por seu trabalho, rema-
tar a obra de Deus, levando as criaturas inferiores ao serviço
do próprio homem ~, assim, à glorificação do Criador.

Contudo não se pode dizer que a narração concernente


ao estado original (com as suas imagens de paraJso, ãtvores,
fruta proibida. serpente •. . ) nada tenha de histórico: cf.
Gn 2,8.3,24. Esta seccão não J?Ode ser anallsada sem Que se
levem em canta os dadas da TradlcA.o e do magistério da
Igreja, citados no próximo artigo deste tascfcu1o. Uma exegese
puramente literária e fIIo16glca, que abstraia da luz da fé e
da voz oficial da Igreja, nAo s~rla completa nem fiel à ver.
dade. Ora quem conhece os documentos da Tradição e da
Igreja, reconhece que a secçAo em foco apresenta, em Uno
guagem simples e fjgurada. fatos reais, ou seja, a elevaçio
dos primeiros pais (dois ou mais? ... Isto não vem ao caso)
ao estado de justiça ou santidade original. Assim enriquecidos
por dons divinos, os primeiros homens foram convidados por
Deus a d~er Sim ou Nio à graça recebida (o que é fIgurado
peJa narração do preceito relativo à á.rvore da clêncla). Posto
ante a opção, o ser humano se afirmou auto-suflclente. re·
cussmdo o modelo ou o programa. de v:l.da proposto pelo Senhor
Deus. Cairam, pois, os primeiros pa.1s, perdendo, em conse·
qüêncla. o estado de santldad~ original que lhes havia sido
oferecido. A queda nada tem a ver com pecado sexual, mas
hi de ser entendida como ato de IOberba. que se exterlorizc:lu
em desobediência ou em recuaa a Deus. Estes dados do de
fê -c supõem fatos hist6r1cos ocorridos nas origens da história
do gênero humano atual. Um exegetá católloo qUe nã() os
leve em consideração, nlio pod(' ser tomado como padrão.

Eis por Que julgamos que o livro de Loretz não preenche


a finalidade de expor ao público o significado de Gn 1·3; serve
como repertório de documentos e citações interessantes, que
necessitam de uJterior elaboracão por parte do exegeta católico.

- 4<)9 -
,Nos prlm6rdios dI! hlslória da .alv29Io:

a justi<a original: existiu? que seria?

Em ,lnleS8 : O presente ar1lgo propOe o que a Escrfture Sallrada,


Interpratada pela Tradição ti o magistério ollclal da Igreja, ensina a
respello do .stado da Justiça o riginai, do qual, conforme a fé, gozavam os
pllmalrcs pais. Eram, sim, doladOl da .graça santlficanta e dOlll dona pre-
ta /natu rais.

A ",aça .lnUllclnle lornava o homem fllno de Oeua, chamaoo ..


YIsIo do Sanhor lace-...face. Ta' graça I' tua a .graça do e dato; com
elello, H Este' o Centro ou c.beça de tOdaa BS crlaturu, antanda-se
qua todal, Inclusive OI primeiros hemens, lha .10 deWtdoras da lua voca·
,!o , vida eterna. A graça santlftcanle, elevendo o homem • 11I1a,lo
divina, , dite aobranalural, pois ela ull1'p"" aI exigência, d, qualq uer
nalureza criada.

rÁ graça 'antlflcanla era complementada pelos dons pretematurals. ...


dons qUI lperfelçolvam a oelurna como lal ou sem a elevar a um
plano aupe rlor. Tais dons alo certamenta dois : o podar nao morre r a e
Imunidade de concupiscência. Algunl ' aólogos, propondo santença ptau-
.'.... 1, "nutneram outros dois: a Im unidade de sofrimenlo e a clôncia
moral Infusa.

o po6er nlo morrer nlo quor dlzor que, no oSlodo do )usUça 011--
glnllll, os primeiros homens seriam lsenlos da morle. Significa, porém, que
e mono nlo 18Ila o çaráler da arranco dOloroso que hoje \t,e loça. A
morte atualmante 6 o sina' da rulna a do despoJamenlo com que o pecado
orlgrnal arelou • natureza humana.

A Imunidade de çoncuplscêncla tornav8 os afetos ti Instlnlos Infe-


norel do homem l ubordtnados A l ua rado, da modo a criar harmo nia
no ser humano.

A Imunidade de sofrimento . correlatl"a ao poder nao morrer. visto


que os pracursores d. mor1e .tu.'menle slo dolorosos.

A d ' ncl. moral Infusa nada tem qua ver com saber t"cnlco, mil
era tio somenle 11. l1umlnaçlo da mente dOI primeiros homena, para qua
puda.. em responder, com ptana conectancla e re.ponsabllldade, ao apelo
de Oaua significado pelo preceito paradlalaco.

Admitindo laia dona no astado orllllnal, • leologla nlo apregoa deter'


ml nedo .. pacto ffslco dO I primeiros pata nem a e)(lst6ncla raa' do pararlO
terreslre. A doutrina da 'é se conclUa perfeitamen te com a Imagem do
homam primitivo daa cavernas.
• • •
410
A JUSTIÇA ORlGlNAL 15

Comentário: Nos últimos decênios, as condições (:m que


se achavam os primeiros pais do gênero humano têm sido
objeto de pesquisas e debates: a arqueologia, e antropologia,
a paleontologia têm evidenciado que os primeiros homens
eram de configur8çio rudimentar e viviam precariamente nas
cavernas. Isto vem abalando certas concepções (aparentemente
fundamentadas na Biblla.) que apresentavam os primeiros pais
como seres de bela estatura e de grande riqueza espiritual.
Os próprios teólogos têm revisto certas teses 8 respeito da
chamada c:justlça origlnab ou do relacionamento dos primeiros
homens com o Senhor Deu!. Em conseqUênc1a,

1) há aqueles que nada de especial admitem no tocante


àquele estado origl.nal. As descrições de Gn 1-3 n lo se refe·
ririam ao passado do gênero humano, mas tão somente ao
ruturo; não seriam motivo de saudades. mas o objeto de
esperanca; seriam uma descrição do Ideal a que os homens
deverão chegar na medida em que se afastarem do pecado, ...
pecado que entrou no mundo quase naturalmente, sem que
se deva dar ImportAncia ao primeiro pecado. Entre outros,
parece defender tal tese o exegeta Oswald Loretz, cujo livro
.Criação e Mitoll é comentado às pp. 405·409 deste fasciculo;
2) há aqueles que, auscultando um pouco mais o magis-
tério da Igreja e a voz da TradJcão, admitem. sim. um estado
original singular, sem o qual não se entenderia a obra de
Cristo. Negando tal estado, o cristão nec;aria um artigo de fé.
Em vista. destas hesitações, vamos, a seguir, elucldar o
que seja a justiça original, tal como a fé catóUca hoje a pro-
feS$8. baseando-nos. sem dúvida. em dados do texto blbUco.
Antes. porem. de entrarmos na matéria, proporemos três obser·
vacÕes.

1. Três observações p.wias


1. No presente artigo não abordaremos a Questão: . PaU·
genlsmo ou monogenlsmoh !'! Uclto, aos olhos da fé, admitir
Que Adão não seja nome própriO no texto de Gn 1. mas signi-
fique o homem como tal, visto que 'Adam em hebraico quer
dizer simplesmente homem. Por conseguinte, o texto bIblico
de Gn 1·3 refere-se ao hom.em ou aOs prlmeiros homens ou
ainda aos primeiros pais, sem pretender definir se esses pri-

- 'Ill-
Jti___ ___.. .:.PERGUNTE } : RESPONDEREMOS .. 238/ 1919

melros antepassados eram em numero de doIs ou mals_ Por


isto também falaremos, a seguir, de Adão e do primeiro
homem sem tencionar dirimir as dúvidas relativas a pollge-
nlsmo ou monogenlsmo_ Qualquer qu~ seja o número dos pri-
meiros homens, o relato bíblico conserva o seu pleno sentido,
pois afirma que os mesmos foram convidados por Deus à
filiação divina, mas preferIram diZêr-lhe o Não do pecado
(como se tenha dado esse pecado, é questão que vai sumaria-
mente abordada à p. 409 deste fascículo).

2 . O temo. _justiça originah ou «relacionamento dos pri.


meiros homens com Deus. ~ nüo pode ser penetrado metUantc
os critérios das ciências naturais apenas, poIs estas ainda
estão à procura da estaca zero da história do gênero humano.
Nem 8. filosofia, com seu mêtodo dedutivo, ê suficiente para
tanto. Somente os docwnentos da ré dizem algo a respeito.

A S. Escritura (Gn 1.3), porém, que é precisamente uma


das Contes de Informação para o fiel cristão, não pode ser
interpretada segundo critérios meramente literários ou elen.
Uficos, mas há de ser ilustrndn também pelos pronunciamentos
da Tradição cristã c do magislcrio da Igreja sobre a jUSliÇ-d
original; em caso contrãrlo. não se faria uma exegese com·
pleta e autêntica do texto hlbliC(l.
3. Seria oontrârfo à doutrina da Escritura c da Igreja
entender Gn 2.4b-3.24 (o relato javista) 1 em sentido mera.
mente simbólico. Estas primeiras páginas bibllcas referem um
acontecimento único, ocorrido nos ln:cios da história humana.
Todavia a mensagem é reUgiosa: ela relata como o homem
se comportou frente a Deus, sem pretender ensinar qual o
estado físico das criaturas: por conseguinte, não tem valor
literal u descrição do porniso (jardim ameno banhndo por
qua tro riOS), nem se pode deduzir do texto blblico qual o tipo
corpóreo dos primeiros pais: nada impede que estes tenham
&1c1o de configuração primitiva. O que importa admitir, ó que
tenham sido ca pazes de dialogar com Deus e de tomar uma
decisão diante do Senhor_ Para tonto. bastava Que fossem
pessoas ou que fossem animados por uma alma espiritual.
Passemos agora ao exame da doutrina da fê l'C!ferente ao
estado original.
1 J8Wlsta 6 a deslgnaçAo do documento que descreVI! _ lu_Uç .. orl·
g!nal e _ queda dos pllmel/os pai s.

- 412 -
_ _ _ .•_ .• __ -". JUSTICA ORIGINAL 17

2. O .stado originaI
A S. Escl'itura, Interpretada pela Tradição e expllcltada
autenticamente pelo magistério da Igreja, atesta que os prl.
melros pais loram dotados da graça santiflcante (sobrenatu.
ral) P. de dons pretematurals. I
Vejamo~ cada qual desses elementos de per si.

:Z . 1 . A graça santificante

1. E doutrina de lé que os primeiros homens foram


chamados à comunhão de vida com Deus ou â filiação divina
mediante a graça santiflcante. Como filho. o homem era her·
deiro da consumaçÃo cscatoJõgica ou da vocação a ver 8
Deus fa ce-a-face.
2. Esta afirmação tem grande importAncia, pois significa
que, antes mesmo de qualf)uer decisão da parte do homem,
este eslava destinado a um fim sobrenatural. O pecado OU a
recusa proferida pelo homem a este desígnio de Deus nao
extinguiu a vocação eto homem à ordem sobrenatural. Ainda
hoje Dctl~ continua a con.c;idcrar o homem sob fi Juz da ordem
sobl"cnahu'nl n que Ele o chnnlou. O estado orlginol ê, por·
tanto. critério permanente para se 8\'allar a história da sal·
vtl'~ão : ~I~ não se ju~l a9Õc âs outros fas~, da história da sal·
vação no mesmo nivC'J, mas tem \'rltor constitutivo. Nunca
existiu. nem exist e. o estado de natur(>2<'l pura ou n ordem
meramente nat\.lral, em que o homem serin consicleraclo por
Deus simplesmente como animal racional (conceito filosófico),
não destlnorlo à Yl.~iio face· o-fa ce deconente da filiaçli.o divina.

3. Note-se tumbém que ti graça dos primeiros pais é a


própl'ia R;rac;a de Cri~to vindouro ou é a graça adqulricla por
Cristo J)3ra ' os homens e antecipadamente outorgada aos prl.
melro~ pni!\. E....,a as"c;(>rcão (lecorro da doutrinA bibllca SObM

, Por ,obrenaturat e ntenele-s8 o que el16 e elme ou além d,. exlg6n--


elas da qualquer nat ureza criada. Aa, lm li partlelpaçlo na vida d ivina ou
" IIIlaçlo divina 6 algo de estrllamenll so brena tur.l.
Pral.rnalura' é o dom Qua prolonoa l i pertelç&es de determinada
n.'ureu ellada . u m, porém. ale v.r ...a crialura • um pl.no superior.
t preler.... lur.1 para o homem. por elCemplo. o "poder nlo morrar" ou o
·'.scapar 11 morle dolorosa".
18 ~ PERGUNTE E RESPONDEREMOS:.. 238/1979

a criação em Cristo e do primado absoluto de Cristo sobre


todas as criaturas (cr. CI 1.15·22; Jo 1.3; Hb 1,1·4). O pri-
meiro homem foi criado à Imagem do Cristo vindouro; por
Isto estava «em Cristo» ou era «membro de Cristo». conforme
a linguagem paullna; Cristo. na plenitude dos tempos, veio
ao mundo como Imagem.modelo para restaurar e consumar
a imagem-cópia subvertida pelo pecado.
se a grata de Adio não tivesse sido concedida por Cristo,
Jesus, como Salvador, teria entrado numa ordem de coisas
que haveria subsistido independentemente dele. Já não seria
o absolutamente Primeiro, para o qual c por causa do qual
tudo teria sido criado.

Eis por que somente em Cristo se manifesta o autêntico


significado do estado original. A consumação da história da
salvação revela o sentido dos respectivos primórdios; o comero
e a plenitude devem ser da mesma indole. Toda 8 história
da salvacão desde OS seus Inicias é dirigida pai' Cl;sto e para
Cristo; qualquer das suas etapas. anterior a Cristo é prepara·
ção para a vinda do Senhor.

4. Os primelros pais possulam a graça santiflcante, não,


porém, de maneira definitiva, e, sim, como peregrinos. Deus
lhes pediu que dissessem um Sim livre ao dom recebido, pois
Deus não salva o homem scm o Jlvre consentimento deste. A
situacão de Adão se dlstingUla da dos homens pós.adnmhJcos
pelo fato de que as condl(Ões nas quais se achava, eram isen.
tas da herança da eulpa original ; eram, pois, de maior luclde-z
da mente _ o que tornava mais grave a culpa de Adão.
Observamos agora que a graça. santincante, nos primeiros
homens. implicava outrossim a posse dos dons preternarurals.
Estes, como se dirá abaixo, aperfeiçoavam a natureza humana
em vista de uma opção que fosse significativa do PI'Óprio
homem.

2:.2 . Os don, prelemahlrol,


A filiacão divina, nos primeiros pais, era acompanhada
por dons preternaturais,... dons que ape.rfelçoavam a natu·
reza humana como tal, de modo que o homem pudesse fazer
uma opção mais profunda e radical sem sofrer obstáculo ou

-414 -
A JUSTICA ORIGINAL

de maneira mais livre e espontânea do que nós. A vontade


'"
imprimiria o cunho da sua decisão a todas as camadas do
seu sujeito, fazendo destas um puro espelho de si mesma.
Assim os dons preternaturais criavam wn clima propicio à
livre opção que Deus pedia 80 homem.
Os dons pretematurals, segundo clássico modo de definir,
eram quatro; a imortalidade (ou o poder não morrer), a
Jntegridade (ou a imunidade de concupiscência). a impassi·
bilidade (ou a ausência de sofl'imento) . a ciência moral infusa.
Hoie em dia os teólogos não Insistem tanto sobre os dois
últimos; julgam, porém, que a Isenção de morte c a Integridade
eram dons inerentes ao estado original.
Penetremos agora no sentido de cada qual dos referidos
dons.

2 .2 .1 . A Imortalidade (poder não mOrTerl

A S. Escritura associa constantemente pecado e morte,


apresentando esta como conseqüência daquele; tenham·se em
vista os textos seguintes :
Gn 2,1f,: "O Senhor Deus deu esta ordem ao homem: f " , NIo
ItOMas do fruto da Arvora da cl6nda do bem e do mal, I)Orque no dia
em que o comerei, cerlamenle morrera' ...
Gn 3,10: ApOs o pec.do, disse o Senhor Deus ao homem: "Com ..
rts o pio .0 suor do teu rosto, até que 'IOlIes 1 lerra donde ' osle tirado,
porque tu h p6 e em pó le hts de tornar".
Sb 2,23.: "Deu. criou (I homem para e Imortalidade, I 16-10 1
Imag.m d. lua pr6prle netureza, Por InveJI do demónlo 6 que I morte
entrou no mundo, e prova-l.-Ao o. que pertencem .0 demônio",

Rrn 5,12: "Assim como por um s6 homem entrou o pecado no


mundo e, p.lo pecado, a morte, assim também a morte penetrou em lodoe
os homens, pol3 todos pecaram",

A propósito O magistério da Igreja emitiu algumas decla·


racões que, embora cIrcunstanciadas pelas controvérsias pela·
glann (séc, V) e protestante (séc. XVI), conservam o seu
valor definitivo através dos tempos.
Assim o Concilio de Cartago XV (418) se pronunciou:
"Se alguém disser quo Ad!o. o primeiro homem. foi criado mortal,
de medo que, Independentemente do pecado, morreria corporalmenle, !aIO

- 415-
20 ,PERGUNTE E RESPONDEREMOS .. 138/ 1979

6, deixaria o corpo nlo por .'elIO do pecedo, ma. por nKcnldede nlllu-
fll, sefa an'II~·ma" {Dentlnger·Schlinmelzer, Enqulridlo do. 51mbolo• •
o.lIlIl~s n9 222 (1011).1

No Concilio de Ornnge n (529) a Igreja declarou:


'·s. alguém disser qua a prevarlcaçlo preJudicou Ip.na. "'dlo, e
nAo a descendência desle, ou •• alouém disser que apenas a morte do
corpo (que 6 11 pene do pecado), n60, porém, o pecado (que' li morle
da lima), passou para lodo o g'nero huma no medlenla um .6 homem,
comelerá InJu.Uça contra Deu, e conlradlr. ao Ap6sl0lo, que afirma:
'Por um só Ilomem o pecado entrou no mundo, a, pala pecado, • morla ;
desta maneira li morta passou para lodo. os homens, porque todo. paca·
ram' ( Rm S,12)" (OS 372 (1751).

Em Trcnto (1545.1563), o Concilio ecumênico definiu :


"s. alguém nlo confessar qua o primeiro homem, Adio, tando
Iransgredldo o mandamenlo de Deu. no para r.a, Imedlal8mente perdeu a
sanlldade e a JuSllça nas quais lora eonstlluldo .. . e, por Islo, Incorreu
na morta, que o Senhor lhe propusera, . . . e se alguém n60 confeSSAr que
Adio. por afeilo da sua prevarleaçio, 101 _Ungido por mlle. do corpo e
di alma. seja anlteme" (OS 1St' [78sl).

Os textos blblicos e ccleslâstiros atrás citados não slgnl.


ficam que a morte não seja um (enômeno natural. Do ponto
de vista biológico, é muito compreensivel que o ser humano
se desgaste c morro fisicamente. O que a mensagem hiblics
significa., f! que no e,.;lndo nriglnnl n m0l1c seria um
rcnômcno
tranqüilo; o hO!n(!m, guardanuo n amlznde com Deus, tc.la u
vida ... vida no sentido de salvação eterna; em conseqüência,
e cessação das (unções biológicas não teria significado senão
Qcldcnlal ou soolndíklo. Após n queda ol'lginnl, n morte
ocorre com outra significação; é a expressão da rulna, da
perda da salvação que o pecado acarretou para a humanidade;
conseqüentemente, ela tem rombém um aspecto doloroso, de
dUaceração ou de arranco, Assim a morte física, como ela
ocorre, geralmente penosa, vem a ser Imagem e sinal do aras·
tnmento do homcm rm reloção '" Deus. Snbe·sc, aUns, que n
morb~ física tem seus precursores, também angustiAntes: as
moléstias e enrermldades, o desgaste fisico, o trabalho penoso ....
Não se poderia deixar de mencionar aqui o fato de que
Cristo quis assumir a morte do homem, doJorosa como c, a
flm de transflgurâ.la, faendo da mesma um caminho de volta
l Doravante citaremos o Enqurrldlo mediania a sigla OS. OI ne)mafOl
enlra colchala. Ilg ntllcam o me, mo 11)(10 na edJçlo do EnqulrJdlo publlcadl
outrora eel culdlda. do Danzlnger apenas.

- 416-
A JUSTICA ORIGINAL

ao Pai. Assim a promessa dJvlna de levar o homem à vida


não foi ab-rogada. Ela é proposta de novo ao homem, não
como fruto da cobedlência:. do primeiro Adão, mas como
resultado da imltacão de Cristo, que se fez obediente até a
morte, a IIm de transfonnar a morte em passagem para
a vida.

2 .2 .2 . A Integridode (Imunidade de- tonatpiscênclal

A imunidade de concupiscência signüica a submissão dos


Impulsos da carne ao esplrito do homem, espírito que, por sua
vez, se achava submisso a Deus. :e, pois, a auséncla de ten-
dências sensuais opostas ao esplrlto e inclinadas ao mal ; t al
ausência devia-se ao domínio do I!'Splrlto sobre a matéria e,
em última análise, à sujel~ão do espirito a Deus.

A presença desse dom nos primeiros pais é insinuada pelas


Escritul'as, quando dizem que ambos, antes do pecado, esta-
vam nus, mas não experimentavam rubor por causa disto
(cf. Gn 2. 25) ; no contrnrio. logo após o pecado, sentiram a
vergonha e se r cx:obrlrom (cf. Cn 3,7). O magistério da Igreja
pronunciou-se a respeito, como se depreende dos textos se·
guintes:
No lnclil' ulu atribuido n S. Celestino I Papa (431?) lê-!!e:
"Pela prevar/caçlo de Adio todes os homens perderam 8 . . . Ino-
dne/a original. de moda que I'1lngutm •• pode levanter do abtsmo dequet,
ruln. por '..,3 própria vontode a n'o Slr que a graça da Deu, mla.rlcor·
dloso O soe'g," (OS 239 11301) .

O Concilio de Orange n (529) declarou:


"A vontade, enfraquecida no primeiro ho mem, nlo poda I.r 1.llauf.d.
sonlo pela graça do eaUamo. O Que o homl!!m perdeu, nfto pode ser dl!!Vol-
vldo senlo por Aquele que o pOde dar. Por Isto diz a própria Verdade :
'S. o Filho vos IIl)&rlar. $erela raalmante livres'" (OS 383 (186J) .
"Ninguém se pode 'lIlv,r a n'o ser por mlserlcórdle de Deus. A
nalureza humana, mesmo aua guardas.e a Integridada em que for. criada,
nlo perseveraria .e o Criador nlo a aJudasse. Por Isto, ae o homem sem
li graça de Deus nlo pode conS.lVar a anll/'açlo que recebeu, como
podem Iam a graçl da DeuI raperar o que perdeu?" (OS 389 [1921) .
Em 853 assim se exprimiu o Concilio de Quierzy (Gãlla) :
" Peto primeiro homem perde mos li liberdade da arbltrlo. e por Crl,la
nossa Sanhol • ,ecabemol de novo. Temos e liberdade pare prallc.r o

- 417-
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS,. 238/1979

bem, prevenida e aJudada pela graça, • temol a liberdade pera çemelar


o mal, quando nlo SomOI fortalecidos pela glaça. Temos, porém, o nosso
IIvI8 arbltrlo, POiS foi libertado pela alaça e, dll c::onuplo que a.a, sanado
pela graça" (OS 622 (3171).

Após O pecado, o homem sente que jã não é hannonioso


em suas tenaencias, mas. ao contrário, traz impUlSOS nn tagô.
nicos dentro de si, como adverte o próprio Apóstolo :

"O bem que au quero, nlo o faço; mas. o ma. que nlo quero, eu
o pratico .. . Sinto pUlZer na lei do Dous, de ecordo com o homem Interior.
MIS vejo ouha lal nos meus mamo.os, a Iull' conlla • lei da minha lulo
• a laler-me calivo na lai do pecado, que $fi enCOfllra nos meus membros"
(Rm 1. 19-23).

A fê afinna, pois, que no estado orIginal O homem tinha


a plena posse de s1 mesmo, de tal maneira que suas aspirações
superiOres nao eram suplantadas por instintos interiores. ato,
porém, não quer dizer que o homem não fosse livre para
escolher o mal: a sua vontade que, por especial dom de Deus,
optava pelo bem, conservava a faculdade de contradizer a
esse dom e optar pelo mal.

2.2 . 3 . Impcmibilidad. e ulnda

Estes dois dons são objeto de controvérsia por parte dos


teólogos modernos. Assim, por exemplo, Wolfgang Seibel os
rejeita em cMysterium Salutis> m /2, p. 259. A Tradição, 80
contrário, ()s afirma, emborn tl'!nha exagl'!l'ado o seu alcance.

Pode·se dizer que os primeiros pais possuíam também esses


dois dons no sentido seguinte:
A tmpassibilidad~ ou a auscncia de sofrimento 6 col'olâl'io
da isenção da morte dolorosa ou da ruinn, que o homem des·
frutava no paraíso. A morte está naturalmente associada 11
sofrimentos e dores. ·01'8, dispensados da morte.ruina, os pri.
meiros pais eslllvam tambCm dispensados dos precursores do·
lorosos da mesma. Isto 6 Insinuado pelo texto b!blico, quando
propõe, como conseqüénclas do pecado. os espinhos e abro·
lhos, o trabalho penoso (eao suor da fronte.; cf. Cin 3, 17·19")
e o parto doloroso (= as funções da maternidade dolorosas).
Em outros termos, quer dizer o texto sagradO: o homem e a
mulher não cumprlr.nm a respectiva mi ssão senão através de
sacriflcios e lutas.
- 418-
______________~A~JU~SIT~Ç~A~O~R~I~GIN~A~L~. ___________ ~

Quanto 80 dom da ciência, nada significa na Unha do


saber clentIfico ou técnico, mas tinha sJgni.ficado exclusiva.
mente moral. Consistia, sim, na Uuminação, comunicada pelo
Senhor Deus ao homem. para Que este optasse oonsc!t!ntementc
dJante do modelo de vida proposto pelo Criador; a decisão do
homem assim tomada seria representativa do próprio homem.

2 . 2 .4 . Questõo ulterior
O Batismo aplica ao homem os efeitos da Redcn~ão, ou
seja, restitui. lhe a filiação divina mediante a gra~:a santifi-
cante. Ora, se esta é a causa dos dons preternaturais. por
que não são estes devolvidos ao homem por oeaslão do Batismo?
Respondemos que os dons pretematumis serão restltufdO$
ao ser huma no quando estiver completo o seu Batismo ou
a sua R.edenção. Com efeitoj um dia ohamem alcançará a
bem.aventurada liberdade dos filhos de Deus (= a Integri-
dade. a Imunidade da concupiscência desordenada) e a plena
posse da vida (~ lmortalldade), A dlferenca entre o homem
no estado original e o homem hoje, após o pecado dos pri.
meiros pais. consiste em que no paraJso o ser humano con·
se)roirla :r.er confinnado na graça e na santidade após uma
decisão cabal e definitiva. ao passo que hoje ele caminha para
o mesmo objetivo através da lenta superaCão dos obstáculos
que se opõem à. graça durante a sua peregrinação t er'restrc.
O conteúdo deste artigo Col concebido com complemento à
apreciação do livro de Oswaldo Loretz pUblicada às pp. 405-409
deste fascfculo.

A propóSito :
COTHNET. E•• paradls, In Dfello"nl l'a da la 1I1b1o. Suppllment vi 1980,
1171·1220.
FEINER. J. - LOEHAER, Mo, Uyt;terlum Sllutls 11/ 2 . Ed. Vonl, P ..
Ir6poll' 1\172. pp. 2.'-263.
LABOUAOETTE, M.-M., Le pOet.• ocl;tnel I ' ' " orlulnel d e I'homm ••
Paris 1953,
MICHEL, A., Jusllçe 0119m.lle, In Dldlonnelre de Thiologle Calhollqul
VIII/2, 1925, 2020-2042.
SCHMAUS, M., Du PlredllC. Münehon 1965.
IDEM, A Fê da IsreJII, vol. 2. Ed. VOles, Pel rópolls 1"976.

- 419--
Um sociólogo '.1. .ob,.
"manicômios, prisões e (onventos"
(Erving Goffman)

Em ,Intese: o livro "Manlebmlos, PrlsOes • Conventos" dle ENlng


Co/lman reune 115 Irés Irulltulç6es em paula sob o r61ulo de ·'Instltul. . .
lotais": seriam Imblante. em que os cldadios donnem. trabalham e 11m
suas recreaçOe, nos mesmo' hor6rlos, segundo o mesmo planeJamanto •
sob la mnmu autoridades, lO Invb do que acontece com os demal.
homens. Oollman Julga qUe taFs 3mblenlea despersonalizam, humilhando e
ridIcularizando os Indlvlduos suJeltOl li tal regime.

InfelIZmente, o lutor, que li sociólogo, refare-se aos conventos e


mosteiros eom exlguo eonheelmar'llo da eausa; da Imensa blbllogralla .U..
nente .. vida "laUlhal cita apenas Irê. obru. daa Regras religiosa cUa
uma só _ • de Slo Bento - , escrita no ,lIe. VI segundo as calegerlas
cultural! daquola época.

Na verdado, en tre manicômios e prisões. da um lado, a convenlos,


do oulro I.do, ed,tem dllaren ..as essenciais: as clinicas e os c6rcere.
nlo eorrespondem a algum Ide,' de vldo nem a uma livre escolha por parte
dos seus Intamos, 10 P<lSSO Clua a vida rallgloJa regular é a a"presslo
de um Id.at livremente abraçado, Enqu.nto nos manicômios fi ellre.res o
cldadio eUmenla fi .verslo 011 o 6dlo ;li tnslllulçlo, !UI v1d. elaus1ral o(a)
Rellgloso{.) se 11)(1 por 11M'.
Nlo "i dúvida. o amor a Deus e ao pr6,dmo que anima 0(.) Rel~
gI05O(a), e~lge mOflll1caçlo li! renUnd . .. As m.nllesta'Ç&ls dnsa penJ..
ttncJ1I ltm variado no decorrer dos s~culos _ Nem lodas 8S que outrora
eram pratlcad••. alo ho}e compreenslvals: por Isto vê,tes del.s vtm
sendo subslltuldas por oulr.s.
Nlo 50 pode negar que nem sempre o(a )s Rellgloso(a)s contribui-
rem para abrll"anlar o Ideal d. vida consagrada; foram, 6s vezes, vJthrias
da fraqueza humana - o que nlo Invalld•• grandeza singular e noblmanta
d. vida convenlu.I,
• • •
Vomentá.rio : El"Vlng Goreman é cientista social. profes-
sor da Universidade da CaliCórnla em Berkcley. tendo v'árias
obras publicadas. Do outono de 1954 ao fim de 1957. dedl·
cou.se ao estudo do comportamento de pacIentes internados
em enfelmarias nos Institutos Nacionais do Centro CUnico de
SaMe, De modo especial. em 1955p56 fez um trabalho de

- - 420 -
~MANICOMIOS, P1USOES E CONVEN'TÇ.~ _ .__ . :lá

campo no Hospital Saint·EllzabethJ WashIngton, D. C., instI·


tulção federal com um pouco mais de 7.000 internados; foi
assim chegando a conclusões que foram redigidas nos anos
subseqüentes e publicadas no livro As)'hun.s. Fasays Oh the
social. situaüon of mental patlents and otber Inmate8 (1961) .
Esta obra foi finalmente traduzida para o português e edi·
tada em 1971 com o tituJo : alaaleô~ IIrüõ.es e conventM
(Ed. Perspectiva S. A., São Paulo 1974).
Ora tal escrito tem sido adotado u1timamente em cursos
superiores. disseminando Idêias errôneas a respeito da vida
conventual. Este efeito nocivo começa a ser desencadeado pelo
titulo mesmo do livro, titulo que excede wn tanto o conteúdo
do original Inglês, como veremos adiante. - Vamos, a seguir,
resumir alguns tra("O~ ctn obrA. e propor breves comentário!'!
80S mesmos.

1. O conteúdo do livro
O livro consta de quatro artigos ou ensaios. que podem
ser lidos lso1adam('nte. Somente o primeiro, Intitulado «A ..
caracteristlcns das Instituições totais:., entra propriamente em
assuntos de Vida Religiosa; os demais versam apenas sobre
doentes mentais e hospitais. Ora, temos em vista abordar tão
somente os aspectos do l1vros atinentes à fé e aos conventos:
eis por que nos limitaremos à consideração do primeiro ensaio
da obra Cpp. 13·108) .
o autor entende por instituição total cum local de resl·
dência e trabalho onde grande número de indivíduos, com
sitU8-:ão semelhante •.. . levam vida fechada e fonnalmente
admlnistradu (p. 11) . Seriam exemplos disto as prisões, os
campos de concentração, os hospitais, os manicômios, os con·
ventos O). O que, segundo o autor, essas instituições têm em
comum, é o regime de Internato e fechamento, ... fechamento
que às vezes é manifestado por portas trancadas. paredes altas,
arame farpado, pAntanes ...
Mais explicitamente observa Goffrnan : o cidadão nonnal
tende a habitar, trabalhar e dlvertir·se em lugares diferentes,
com diferentes co·partlclpantes, sob diferentes autoridades e
sem plane'amento geral. Ora nas instituições totais o individuo
habita, trabalha e tem suas recreações no mesmo local, sob
uma (mica autoridade, na companhia das mesmas pessoas
(todas elas obrigadas a f82er as mesmas coisas em conjunto).
_ 421-
~_ «PERGUNTE E RESPONDEREMOS~ 238/1979

dentro de horâr1os rigorosamente pré·estabelecidos, segundo


planejamento traçado por um grupo de diligentes autoritários.
Estes não estão sujeitos a Internato; trabalham apenas oito
horas por dia na instituição.
Geralmente os individuas SUjeitos ao internato tendem
a ver os membros da equ.pe d,rigente como arbitl'ãrios e mes·
quinhos, ao passo que estes vêem seus subalternos como amar·
gurados e não merecedores de confiança. Via de regra, os
indiv:duos Internados não têm conhecimento das decisões dos
dirigentes que lhes dizem respeito: o soldndo ignora o des-
tino da sua viagem; o médico oculta o diagnóstico ao paciente;
o doente mental é tratado como criança ",
Conceituada a instituição total. Goffman passa a apontar
alguns dos absurdos (reais ou aparentes) da vida que ai é
levac!a.
o que mais lhe chama a aten-;ão, são as diversas formas
de humUha-:ão, rebaixamento, padronização e despersonalIza·
tão dos indlviduos internados.
Por exemplo. o uso do uniforme. geralmente Imposto
dcsde que o indivíduo Qntrc numa Instituição total, contribuI
para ap.ngnr muitas das caraclctistlcns próprins d e cada pes-
soa ; cada qual assim esquece um pouco ou muito do seu pas·
sado e dispõe·se a assimilar melhor o novo mundo unlConne
em que I!ntra, Goffrnan não hesita em citar, a respeito. a
Regra de São Bento. que lhe paJ"'eCl!' contribuir para a des·
figuração dos monges Quando manda:
"Sela o noviço. no orll16rfo. despido da suas roupas e ve~lldo c om
as do moslel:o. As V1Isles que despiu, sejam colocadas num IrmArlo •
ai gualdadas para que. se per acoso (o que Deus nlo perml1l1) algum
dia for convencido pelo demOnle a obandonar o mo,lelto, poss a deix ar
8S vestes do mosteiro e Ir embora" (c. 58) .
O Indlv!duo Internado numa Instituição total costuma ser
despojado de seus bens materiais ; nada pode guardar nem
ganhar para sI. Os objetos que ele usa, são distl'lbuidos pelas
autoridades e iguais aos dos colegas; vêm caracterizados como
próprios da instituição fechada, cujas iniciais e emblemas
eles trazem. Para receber novo lápis, a pessoa pode ser Obl'J·
gada a devolver os restos do lápis gasto, De vez em quando,
OS autoridades inspeccion am os leitos e os equipamentos pró-
prios de cada Interno, à procura de algum eventual objeto
illc1to; ora isto desfigura as pessoas. A propósito Goffman cita

- 422-
.. 1\IANICó".lIOS, PRISÕES E CONVEN1'OS, 21

mais UDla vez a Regra de São Bento, que, escrita no século VI.
prescreve o seguinte:
"Para dormir. os monge. devam ter apenas um cOlchlo, um cobertor,
uma colcha li um Irlvesselro. Essa, camas devem ser IrOQQonlamol1le
examinadas pelo abad., por causa da propriedade particular que poderia
el estar guardada. Sa algu'm for descoberto com elgo que nAo lenhe
recebido do abade, dever' &ar uv.rarl1énte u~llgado. E, para q ue esse
'VIcio da propriedade par1lcvlar POUI aer completamente allmlõlado, lodls
as colsl' neceu.rla. devem •• r dadas pelo a~d.: capuz, lunlc., mel u,
sapatos, clnlo, laca, canala, agulha, lanço e tabuletas para a escrita.
Assim seri posalvel eliminar tOdas as Queixes de necessidade. No enlanto,
considere sempre o abado aquala senlança dos Atos. dos Apóstolos qv.
diz: ·Cava·se a coda um da acordo com as suas necessidades' (".35)"'.

Até mesmo o nome do Individuo Internado é substituido


por um número ou por um apelido (por vezes pungente ou
ofensivo).
O autor se reft'1'e outrossim a tratamentos duros, aviltan·
teso punitivos . .. , Que humilham as personalidades: espanca·
mentos. choques elétricos, prostrações, penitências como bel·
jar os pés e outras ... são Impostas aos Internos das Instltul-
cóes fechadas, Goffman não deixa de citar de novo a Regra
de São Bento, que prescreve:
"0 monge ell(comungado nque prcstrado diante das porta. do or.·
10110. (tm 5110nclo: com 11 lace no chio e o corpo estondldo, del/O parma·
necllr lias pés de Iodos os quo .aem do or8Ió,lo" (c . ... ) .

Aos Internados podem.se pedir serviços depreciativos como


os da cozinha. E mais uma vez é mencionada a Regra de São
Bento. que, em seu capitulo 35, prevê que os monges traba-
lhem na cozinha e sirvam aos seus irmãos no refeitório.
Existem tambem, nas inst1tul~ fechadas, práticas de
autoacusacão ou de confissão públiCa. de faltas pessoais. Eis
como Gofrman entende este costume:
" Na medida em Que o estabelecimento espera, oficialmente, alie r.'
8S tendêncla:ll auto-reguladoras do Intemado, poete haver conllsslo Indlvl·
dual ou de Vrupo - pslqul6trlca, polftlca, mlHlar ou rellglo •• - de acordo
com o Upo da Inalllulçlo. Nasaas oeaal(l.es, o Internado precisa expor •
novos Iipoa de audlêncl .. falos e unllmantos sobra o eu. Os exemplol
mels espetacuta re. deua axpo.lçio nos alo dados pelos campos comu-
nistas de conllsslo a pelas sessOes de ma. culpa que consllluem pa"e
da reUna du Instllulç~u calóllcel rellglcsas" (p. 31) .
Enumerando este e vários outros costumes das institui·
cões totais, o autor se vale do livro de Kathryn Hulme Intl·
tulado «The Nun's Story, (Hlst6rla de uma freira), publl.
-423 -
cada em 1956 e traduzido para o português em 1959 com o
título cEntre Dois Mundos~ (Ed. Agir) . Essa obra retere OS
dados biográficos e o drama intimo de uma Religiosa belga
chamada Gabrlelle Van Der Mal (no convento, Ir. Lucas).
Após dezesseis anos de vida regular, essa Irmã se julgou Im-
possibilitada de continuar na Congregação e obteve a dispensa
dos votos, voltando então para o sécu1o. Em 1945 contou sua
histór ia religiosa à escritora. norte-americana Kathryn Hulme,
que, onze anos mais tarde, apresentou ao pUblico o drama de
Gabrielle sob fonna de biografia dita cThe Nun's Stary~. Este
livro, ã plimeil'a vista. dá a impressão de que a vida religiosa
,.'onventus! é ~tcreotipada, redw.inrlo·se a limA ~rie de ob~l··
vâncias destltuldas de csplrlto.
As pAginas de Go(fman são extremamente vivazes e puno
gentes na medida em que tentam descrever os costumes das
instituições fechadns; sem discernimento, fazem o leitor passar
dos hospitais para os manicômios. para os prisões, parn os
campos de concentração, para os quarteis e. .. para os mos-
teiros e conventos, como se esses diverso!> nmblcntes pude!>sem
fados ser nivelados entre si.
Não nos deteremos em citar ulteriore~ passagens em que
o sociólogo pretende retratar tais Instituições. O que até aqui
foi dito, é !iuficiente parn ~ per«>ber o ponto de vista do
autor: tenciona ccn!;'\Jrar 011 mc~mo condenar O!õi mOl'iI-ciros t~
conventos como pretensas tontes de despersonalização, à se·
me1hança do qUe são 8S prisões, os campos de concentraçã.o e
nutros ambientes .. .
E.c::ta tese sugere

2. Algumas ponderações
Cinco são as obSt'rtacõcs que n~ ocorre propor <10 livrn
de Erving: Gorfman :

2. 1. Trtulo. co"l~do

O titulo, mencionando (!m seqüêncln manicómios, pri:li)cs c


l'Onventos, corresponde melhor ao primeiro ensaio (pp. 13-108)
do que aos restantes do livro (pp. 109·312). Somente a terça
parte deste, aproximadamente, aborda cá e lá a vida conven·
tual. Goffman, na verdade, pouco se refere aos conventos
(todavia as suas poucas referênciac; indicam suficientemente
o seu pensamento).
- 424 -
_ _ _~,,,MjI.~lCO~~OS. PRlSOES E CONVENTOS..

o Butor, no pref4do (pp. 7·9), diz ter feito estágio em


hospitais para poder escrever a respeito. Pergunta-se, porém:
fez também estágio em conventos {lU mosteiros para ter con·
dições de comentar a vida regular? Tem experiência para
dlssertar sobre tais InstituIções? Da vasta blb1lografla sobre
a vida conventual. cita apenas uma Regra - a de São Bento
(séc. VI) l _ e três C<lmentários: cThe Seven Slorey Moun·
tain:. (A montanha dOs sete patamares) de Thomas Merton =,
cA Righl lo be MerryJ (Um direito de ser feliz) de Slstcr
Mary Francls P. C. ", _The Nun's StoTy1& de Kathryn Hulme' ,
80 paSSO que sobre psIquiatria e sociologia são multo nume-
rosos os livros aduzidos por Goffman. Dlr-se·ia, pois, que
este autor carece de noções adequadas e, por conseguinte, de
autoridade para julgar a vida religiosa regular; as suas afiro
macões a respeito são as de Quem não conhece sufjcientementc
o tema que aborda.

2.2 . VIda Religiosa: sentido • Ideal


Scm dificuldade, vê·se quão errôneo seja nivelar manlcô·
mios. prisões e conventos. Com efeito; fi vida em hospital.
clínica c prisão não correspond~ a algum Ideal, mas, aO con·
trário. opõe.se a todo Ideal: via de regra, ninguém estA em
manicômio 011 cárCt'rc pcr livrc escolha. Quanto à vida reli·
glosa regular, é essencialmente (l realização dc um ideal; cor-
responde a uma livl"e opção. Ninguém professa definitivamente
uma Regra rellglcsa senão depois de alguns anos de expe-
riência (postulontado, noviciado. junlornto ... ); 0(8) cnndi·
dalo(a) ao convento deve primeiramente examinai' os termos
concr~tos da vida regular, com tudo que ela tenha de renún-
cia e morUficac:iio. Caso decida finalmente emitir seus votos
religiosos, Cá.lo com todo a liberdade, numa autêntica aflr·
mação 11e sua personalidade; a vivência conventuftl Que dccol're
dessa livre escolha ou da profissão religiosa, nâo é senâo a
reafinnatão constante da liberdade do(a) Rcligioso(a); Mcsmo
Quando renuncia e se mortifica, o(a) Rellgiosc(a) reafirrr.8
a sua livre opção inicial e fortalece o seu caráter. A Vida
Religiosa • .assim entendida. vem a ser uma escola de formação
, CI. p. 28 (cap. 55) . p. 29 (cap. 56). P. 30 (cap. ""). p. 83
(cap. 68). p . 10. (Cllp. 21. p . 105 (cap. 63). P. 106 (cap. 57), p. 184
(cap. 045) .
: CI. pp. 27. 048. 204 .
~ CI. pp. 82. 83.
'CI. PP. 31 . 37. 311 . • 0. .044 . 51 . 105.

-- 42;; -
30 cPERGUNTE E RESPONOERl:MOS. 238/ 1979

e enobrecimento das pessoas. Especialmente nos últimos tem·


pos, os Institutos religiosos têm procurado submeter seus cano
didatos ti. testes de saúde física e psíquica. de modo a s6
recebel" pessoas sadias tanto no pl ano somático como no psí.
QUico. Mais do que nunca, em nossos dias acentua.se a neces·
sldade de uma oPCão consciente e livre para que alguém abrace
a vida religiosa regular.
Com outras palavras: o que fixa detenninada peSSOa numa
comunidade rel1glosll, são vlnculos morais (vãlidos para per-
sonalidades fortes c bem formadas) e não vínculos físicos ou
policiaIs (estes exlstem nas prisões, nos campos de concentra·
ção e nos manicômios). :€ a consciência moral Intima que
leva o(a) Rellgloso(a) a cumprir os deveres de sua Regra,
e não alguma autoridade ou força coercitiva extrlnseca. Em
outros termos: é a convicção de que vale a pena dar·se total·
mente a Deus ou ao Bem Infinito, com renúncia a bens tran·
sitórios e ao egoismo.
Equivalentemente, diremos: o(a) Rellgioso(a) entra no
convento, e aí pennancce, por amor:... amor a Deus e ao
próxImo 1; tem, pois, a mais nobre das motivações para jus-
tificar a sua vida. No dia <-m que esse amor arrefeça, oCa)
Rellgioso(a) entra em crisc e é propenso n pedir dispensa
dos votos. Pode.se, pois, comparar o vinculação dos Religiosos
li vlnculaeão que une os cônjuges entre si: hã, slm. um para·
leIo entre a fidelidade dos Religiosos li sua Regra e a fIdell·
dade dos cônjuges ao seu matrimônio. Assim como os esposos,
para ser fiéis ao seu amor e ao casamento, t êm que saber
renunciar, um pouco ou multo, a si mesmos e adaptar-se a
um tipo de vida comum ou ccon.jugab 2, também os Religiosos,
para se[' fiéis ao seu Ideal de doa~ão IncondicIonal, ~m que
renunciar aos parlicularismos e adaptar.se à Regra de vida
comunitária ou conventunl que professam. Ou ainda: assim
como o grande dínamo da vida matrimonial é o amor, a grande
força propulsora da observância religiosa é também o amor .
• Mesmo os Religioso. de vida dlla "c:onlemplatlva" ou de ellrlla
c:laUlura exerçltem o MU amor ao próximo pelo falo ele se Idenllllc:arem
mal. e mal. eom Crl.to: mediante a eomufthlo doa untos, contribuem
para .. selYaç.lo dos MUI Innlo.. Dizia multo apropriadamente El1zabelh
le.eur : "Uma alma qua .e aleva. eleva o mundo Inlllfo" .
t,." palavra "çon"'ugal" Inclui o voç6bu lo 'uIIO,. .. Jugo <lue o.
elpolOt IIssumam çom plena IIbardada e amor profundo, porque vêem
nlllo um bam ou li r••llnçlo das respaetlv•• ~eraonalld.de •.

- 426 -
31

Quem tenha consciência disto, jamais cairá na aberração


de comparar os conventos com manicômios e prisões:! . . .
Nestas duas últimas Instituições as pessoas se acham geral-
mente contrariadas e coagidas - o que nelas provoca aversão
ou mesmo ódio ao seu regime de Internato. A doença mental
e o crime é que explicam a existência de tais estabeJeclmentcs,
nos quais .a violência encontra um clima prop:cio. Ao contrário,
no convento ninguém pennanece senão porque o quer, " .. e
o quer em vJrtude de amor a Deus e ao próximo.
Impõe·se agora uma palavra sobre

2.3. As expr.ssõ•• cultural. do Ideal lIIonástlto-conventual


Diziamos que a Vida Religiosa é essencialmente o cultivo
do amor a Deus e aos Jnnãos, que procura libertar-se de tOdÓ
entrave das 'paixões desregradas e do egoismo. Em cor;u;e:
qUêncla, compreende.se que, para ravorecer este Ideal. haja
nas comunidades religiosas um regime de ascese ou mortlfl~
cação, regime caracterizado preponderantemente pelos votos
de pobreza, castidade c obediência.
A pobreza voluntária é um valor que liberta o cristão do
apego oc)!; bens mntQrillis e lhe dilata o ~ração para se entre·
gar no pro:dmG e aspirar aos bens definitivos.
A castidade ou o celibato consagrado isenta oCa) ReU~
gioso(a) de preocupações com a sua famllia. a fim de que
possa voltar-se mais desimpedidamentc para Deus e servir n
muitas famlllas, procurando amar, como irmão(ã), a todos os
homens.
A obediência voluntãria é a renúncia ao individualismo
que atrofia a personalidade. Sendo voluntariamente escolhida,
s obediência religiosa não dcspersonaJiza o cristão, mas, ao
contrário, oferece-lhe a ocasião de cultivar continuamente os
valores de seu carâter e de sua vontade firme.
Dito isto, deve·se reconhecer que as expres.<;Ões da ascese
religiosa têm variado atravês dos séculos, assumindo outrora
fonnas que hoje parecem despropositadas.
Assim, por exemplo, no século VI a Regra de São Bento
pt'MerM8 o recurso li. pancadas (cf. capo 23. 28. 30). li. jejuns
(cf. eap. 30), a prostracões (c!. capo 44) .. . ; tais procedi.
mentos eram usuais e compreensivels naquela época; enquadra.

-427 -
32 rPERGUNTE E RESPonDEREMOS. 238/1979

vam·se tranqUllamente nas categorias culturais da população


romana mesclada de gados em meio aos quais se fundavam
mosteiros. Essas prAticas punitivas durante séculos continua·
ram em vigor nas com\Ulldades retigosas (beneditinas e não
beneditinas), porque condizentes com as linhas culturais de
épocas passadas. 1: preciso, porem, diferenciar tais costumes
daqueles qUe ocorrem nas priSÕês, nos ~mpos de concentra.
cão e em instituições semelhantes: nestas o sadismo e o me·
nosprezo sarcâstlco muitas vezes Imperam; os chefes têm,
não raro, o prazer de humilhar e espezinhar os seus subalternos
(como minuciosamente rerere Cofrman) . Ao l..'Ontrário, nas
comunidades rellgiosa!'i (salvo po!\Síveis excec,.'ÔCs, devidas à
fraglUdade humana). a Intenção da Regra e dos Superiores
era a de a1udar os Innãos a vencer as paixões e habUiter.se
a um amor mais livre e generoso. Apraz citar, por exemplo,
o abade Annand Jean Le Bouthillier de Rancé, que, no sê.
cuJo XVII. restaurou a Ordem de Clster no Mosteiro de Nossa
Senhora da Trapa, Incutlndo.lhe a obsen.'ância literal da
Regra de São Bento; era homem de ardente zelo religioso.
que se caracterizava por extrema severidade para com os
monges ... O seu rigor é expllcado ~los escritos e cartas que
deixou e nos quais revela grande amor 80S Irmão!'i. - Ao es·
tudloso moderno compete não considerar apenas as prât1cas
d~ morti(jca~.i'io do~ antepassados. ma!'i levar em conta tam·
hém as Inten~ c o ünlmo que n!'l In!;pirarnm: vC'riClcarâ
então que diferem radicalmente de todos os tratamentos Infll·
gidos aos Internos de prisões c manicômios.
Em particular sobre a confissão de faltas pessoais, nole·se
que nos eampos de concentração esta prática pode fa:zer parte
do processo de lavagem de crAnlo Intencionada pelas autori.
dades do campo. Nos mosteiros e conventos, o seu significado
é totalmente outro ; ela tem por objeto tâo somente falhas
de foro externo. ou !;CJn. InfraÇÕC5 à observância regular (faJ.
tas contra o silêncio, contra a pobreza, contra a pontuallda·
de ... ); tal confissão é inspl rada pela humildade e pelo desejo
de reparação pública que cada Religioso deve à sua comunl.
dade. Em nossos dias, esta prática, também ehamada t:apifulo
de culpas, ê menos usual do Que outrora.
De resto, hoje em dia, sendo outras as expres~ões da
cultura contemporAnea. o Ideal de renúncia e doação dos mon·
ges e Religiosos manifesta-se de maneiras diferentes das dos
antigos. A Igreja Incute novas formas dê mortificaCio, em
substltul~lio a algumas daquE!las qUE! perderam o seu slgnlfi.

- 428-
__ _ .___ __~ÇOMIOS. PRIS08S to: CONVENTOS: 33

cada em nossos dias. Nã.o se podem, portanto. julgar OS qua-


dros da vida monástica ou da Vida Religiosa hoje por aquilo
que estA escrito na Regra de Sio Bento (datada do século VI) l,
As prãticas punitivas e ascéticas, na Vida Religiosa, são
meios, e não fins; por conseguinte, têm valor não como tais,
mas tão somente na medida em que contribuam para fazer
crescer nos Religiosos o amor a Deus e 80 próximo. O mesmo
não se diga dos campos de concentração. das prisões e de
In,stituições CQng~neres, onde hã a intenção de degradar os
sÍldltos por antipatia e ódio.
Convém ainda Dcenar à

2.4. Fraq"uG humana


Como dito. a fraqueza humana. no decorrer do. tempo;,
:POde ter eoncorrido para deturpar certas. lnstltulCôeS, vaIJosas
em si, da Vida Religiosa. Hou.e Ce poderá haver sempre)
SupeI10res prepotentes, que, por seu autoritarismo arbitrário,
obscureceram (c obscurecerão) o Ideal da observância reU.
glosa. Tais pessoas e seus reitos não são autênticos espéclmens
da vida regular; por conseguinte, não hão de ser tomados
como padrões para se avaliarem conventos e mosteiros.
O Concílio dt) VnUcano n promulgou o decreto ePerfcctne
CarUnUs» sobre 11 Vida R(>lIglosn, no qual chama n atenção
para a obediência religiosa e o papel dos Superiores no caso.
Verlfica.se. através desse texto, que é precisamente lntençlo
da Igreja evitar que ocorram nas comunidades rellglosas os
abusos que Goffmnn denuncia em !;eu livro. Eis a passagem
que mais vem a propósito:
"Os Superior., . .. ravelem-se dóceis • vonlade da o.UI no eMer-
elelo do c.rgo. Em esplrito de serviço exerçam • autoridade em flvor dM
Im'os, de lorma • exprimirem I caridAde pela qual Deus o. Ima. Dirijam
OI sudilos como !!lhos de Dlul:I e com respello à pesaoa humana . ..
Leyem os colrmlos a cooperarem cem obedlOncla ativa ti res[)ons6vel nas
l arelas • cumprir e Inleletlvo I lomar, Os Superiores eseulem, pois, de
boa vontade os conlradU, li promovam Igualmente aua coopereç'o par.
o bem do Inslllulo • da Igreja" (n9 14) .
Merece; especial atenção nesta passagem a recomendação
de respeito à pessoa humana,
I Allh. 6 curlolQ qUI, dlnlre .5 numerosas Regras e Cal'l5t11ulç6es de
10tn lUaa religIosas, Oollman cite apenas a Regra de Slo Bento (16ç. VI).
Pallce nlo conheceI documento algum de llipoca POsh,rlor ou cloe. tem-
t=lo. reclntes.

- 429 -
34 .:PERGUNTE E RESPONDEREMOS,o 238/ 1979

Notemos, aJiás, que não somente os Superiores podem


contribuir para desfigurar o ideal da vida regular; também
os slmples Religiosos, na medida em que arrefe ~a m em seu
entusiasmo, são capazes de dar lamentâvel contra-testemunho.
Por último, Interessa ainda considerar de mais perto

2. S. A bibliografia eI, E. GoHman


Como já observamos. o autor do livro pretende caracteri-
zar os conventos ou a Vida Religiosa na base de exiguos conhe.
cimenlos do assunto. São quatro apenas 8!> obras que a pro-
pósito Gorrman cito.:
a) A. R~ de SOO Bt-.nto (sec. VI), cujo teor literal não
pode ser totalmente posto em prática no século XX, pois as
expressões culturais são hoje bem diversas das de outrora.
A Santa Regra, porem, deu extrnol'dinârlos frutos não 50 no
campo religioso e eeleslal. mas também na história da eivlli·
zação ocidental. Por isto São Bento, mediante os seus mostei·
ros, mereceu o titulo de cPatriarca do Ocidente.. O espIrIto
que vivifico. n sua Rô'!;rn, ainda hojc (o de grande ntuaU<1Cdé,
pois é o espírito da discrição Oll do discernimento, que leva
a distinguir em tudo o essencial e o acidental; foi justamente
a oarnclerístlca da discrição que pcrmltJu n Regra beneditina
atravessar os séculos até hoje, guardando os valores essen·
ciais da vida consagrada a Deus e trocando sucessivamente as
expressões acidentais dOs me!>mo!':, de acordo com a evolução
dos tempos.
Poucos livros são tão beneméritos na história do Ocidente
quanto a Regra de São Bento devidamente entendida. Foi -ela
que formou gerações e gerações de crist ãO$ corajosos e cultos.
b) Thomas Mcrton, em sua obra cThc Seven StOl"C)'
Mountain c(New York 1948), é cilado três vezcs por Gorrman.
Ora tnl autor é um dos mestres dn espiriturlUdnde monástica
de nossos tempos. Procedente do agnosticismo esquerdista,
Marton fez·se católico e, finalmenta, monge trapista nos Es~
tados Unidos. Os seus escritos são uma apologia do mona.
qulsmo e da vida consagrada para o homem do século XX.
Goe(man, às pp. 47 e 48, cita uma passag~m de Merton que
apresenta a mortificação cristã como condição de vida mlstica.
Ora Ervlng Goffman parece não entender que, para descobrir
mais plenamente a Deus. o ser humano se deve purificar de
paixões e afetos dpsregrados. Quanto às referências qul' o
- 430-
___ _ . __ ~1ANICOMIOS. PRlSOES E CO~VENTOS:&

sociólogo faz a Merton nas pp. Z1 e 204, são lacônicas e


pouco significativas.
c) Si!ter Mary Frtincl! P. C., em eThe Right to be
Merry:t, também ê citada por Goffman às pp. 82 e 83. Os
dois trechos adu:ddos aflnnam que o valor do trabalho, diante
de Deus. não consiste na lucratJvldade do mesmo, mas, sim,
no grau de amor que anima a quem trabalha; wna obra
modesta, como varrer ou costurar, pode ser altamente pre-
ciosa, aos olhos da fé, se realizada numa atitude de amor a
Deus e ao próximo. - bra tais proposições são plenamente
válidas numa perspectiva cristã. Golfman talvez não com-
preenda devidamente tal julgamento; este poderia ser precária
consolação para as Religiosas que, vivendo em clausura, não
se dedicam a obras vistosas e aparatosas! Todavia, à luz da
fé, mais vale o ser do que o ter, ou seja, mais vale identifl·
car-se com a vontade de Deus em coisas pequenas do que pro-
duzir grandes coisas sem adesão ao Senhor.
d) O livro cThe Nun's StOry20 de Kathryn Hulme tam-
bém é citado por Gottman , .. Esta obra narra as peripécias
de uma ex-Religiosa belga durante os seus d~esseis anos de
vld.o. consngrndõl. Ê pungente e satiriC8. Reduz a Vida Reli·
giosa a uma série de observâncias destitu'das de espírito; as
Regras, em vez de fomentar a expansão do amor e o descn·
volvlmento das personalidades, seriam motivo de depaupera.
mento interior. Os Superiores ReJigloscs. através do livro, apa-
recem como pessoas que por suas ordens mortlf1cam os súdl·
tos de maneira arbJtrârts, sem procurar averiguar se seus
preceitos estão ou não adaptados às circunstâncias próprias
de cada caso.
O livro logrou sucesso extraordlnêr1o, atingindo a tiragem
de três milhões de exemplares nos Estados Unidos; foi tradu-
zido para treze idiomas. Por conseguinte, também foi multe..
analisado pelos críticos. Ora comentaristas de bom nome jul-
garam que a escritora Kathryn Hulme .estIlizou:. a sua nar-
ração. exagerando alguns traços do eformallsmo:t da Vida
Rellglosl!l, e omltlndo outros. que os contrabalançariam: de·
sejosa de fazer critica eo~tlva. a falhas que realmente
ocorrem entre Religiosos, K. Hulrne teria, antes, produzido
uma caricatura da vida consagrada. São estas as palavras de
H. Holsteln na revista eEtudes:D, dezembro de 1957, p. 427:
"O livro ti penurbador paio Quadro Que ele oferece da Vida Reli·
glosa. exalo na aparência, mas fal,o no fundo: male,lalmenle verOSllmll,
• obra, na verdade, faz. carlcalura. Pois • Vida Aell'<llou que ela .pre·

-431-
36 d ' ERGUNI'E E RESPONDEREMOS, 238/1979

ssnta, , demulado clronte do olma : ol»ervên<:le perfeltamenle correta,


mas destllulde de Inlerlorldlde ...
Se lei' li; Vida Religiosa, :le o culto da Regra pOe de lado fi eart-
dade ev.ngéllca, eompreende..e bem que a IrmA L.VCiil!!I nao fi lenl1a podido
sustentar. Mas compreende-lO menos bem que era lenha su~le:"lh!ldo dezes-
seis anO$ ". Ora Justamente reC:Ln'o-me li eceltar esse quedro da Vkfa
Religiosa. Rejello-o, porquo nlo 111 cr~110. Nlo me venl1am dizer que I'
co/su em tal ou tal Congreg.çlo nio se apresentam tio oslérels fi
formalistas. Tanho caneta de Que em parte alguma as coisas SfI dAo como
o livro as descreve".
Na verdade, cada um dos quadros particulares descrito!;
por K. Hulme pode ser considerado veross'mi1; ninguem pode
negar falhas de orientação cometidas por Superiores Religio-
sos. Falta de inteligência e de generosidade pode existir em
toda parte onde haja criaturas humanas. Contudo o conjunto
que resulta dos quadros e episódios particulares referidos por
K. Hulme, é demasiado seco e formalista para que se possa
crer corresponda à realidade de alguma das comunidades exls·
tentes nas décadas de 1940 ~ 1950. Em particular, foI averi-
guado que a Congregação Religiosa (mantida no livro sob
anonimato) oà qual pertencia Gabrlelle Van Der Mal, longe
de ser esplrlrualmcnte estéril, era, no contrário, movIda por
autêntico fervor.
Aliás, 45 importante ainda observar o !;Cgulnte: o livro
de Kathryn lHulme foi convertido em filme cinematográfico
da Warner Brothcrs. Ora a prôpria Gabriela, de volta ao
século, após haver a.sslatido três vezes ao filme-enredo da SUIl
vida passada, declarou :
" NIo tornarei a \lê-lo. po,qua, le o lil:flUO, ,agrassarla ao convento.
Ao avlst.r a cepeta e 111 R.lIglou.s, ... nlio posso delxor de OCI' cem-
templando e de chora, amargamente, nAo por .nependlmenlo nem por
motivo semelhanle. mas porquI me .Inlo avasaalada por lanla beleza. "
uma vida btlla, • Vida Rel1glosa, pa r. que m reslmente a vive, pall quam
a pod& eceltar Mm murmurar. Dlzam que nAo 101 Iracono o lalo de tcr eu
dehl.ado O convento. Nlo me compreendem. Tanles oullas Religiosas per-
severam 8 realIZam d....ldamente essa ..,Ida; sabem /evâ-tl. Eu nlo o
soube fi tracassal" (transcrito da revtsta "Ufa" em espanhol, 13 de Junho
d. 1959, p. 38) .

Se este testemunho é autêntico (e não há sérios motivos


para duvidar dIsto), as criticas contid<ls no livro de Kathryn
Hu1me perdem muito do seu alcance e significado. - tnterio-
res conside.raç~s sobre esta obr<l encontram·se ern PR 31/ 1960,
pp. 294·300.
Passemos a~ora a uma
432 -
d\I.\NICOillIOS. PRiSõES E CONV~NTOS: 37

3. Conclusão
O titulo do livro de Erving Goffrnan anuncia muito mals
do que o llvro contém. No toeante nos conventos ou à vida
religiosa regular, ê extremamente pobre em dados e mal InCor·
mado. .e o que lhe tira autoridade para falar sobre tal assunto.
O sociólogo teria feito obra melhor se houvesse estudado um
pouco mais a sua temática religiosa.
A vida regular poderâ parecer absurda aos olhoa <la
razão ou do bom senso meramente naturais, pois ela ê conce-
bida em vista de va10res transcendentais. Por isto ela ultra·
passa a escala de valores Que a prudência humana tende a
estabelecer. Ela assim participa do escândalo e da loucura da
cruz que estão no âmago da mensagem cristã (cf. lCor 1.23) .
Todavia a experiência e a história eomprovam que essa loucura
é suma sabedoria. Sim ; a cultura greco-romana foi transml·
tida aos bárbaros pelos monges i a cIvilização ocidental nasceu
sob o signo · do Cristianismo, que OS monges anunciaram aos
povos europeus. Durante séculos as Ordens e Congregações
Religiosas (oram as principais intltulcões que se Interessa·
ram pela lavoura, pela Instrução e a cultura e, principalmente,
pela assistência aos desamparados (enfermos, crianças, ano
ciãos, pobres ... ).
O Ideal monástico suplie grandeza dalma e generosidade
{embora. n fraqucza humana tenha, por vezes, sufocado tais
vaJoresl, ao passo que os manicômios e os cárceres foram
estruturados para personaUdades deficientes, seja no plano
mental, seja no plano moral. Dever.se.la, pois, concluir após
uma leitura critica do livro de Goffman: empenhemo. nos por
Que haja menos necessidade de manicômios e cârceres e para
que o ambiente dessas InstituIções (que Infelizmente sempre
existirão) seja mais humano e mais impregnado daque1e es·
pirita de amor qUI! deu origem aos mosteiros e conventos!
8lbllog,ana :
AUBRY. J .• Teologl. era Vldl AIllglosL Ed. Dom Bosco, Slo Paulo 1911 .
GAMBARI. E.. Mllu,rd.dII RI"glosa em Cristo. Ed. Paullnalll, Slo-
Paulo 1970.
HA.RIN:;. a ., Oa Rellg!Ol08 do Futuro. Ed. Paullnas. Slo Paulo 1973.
MARTINEZ, H., Tn'.mvn_ e Sln.... Ed. Paullnas, Sao Paulo 1969.
PAULO VI, Sln.1 do Reino. Ed. Paullnl!;, 510 Paulo 1972.
RtGAMEY, P.-R•• A Voz d. D.us ,... Vozes do Mundo. Ed. PaullnQ,
510 Paulo 1976.
IDEM. Rlnov.,... no E.. plrllo. RIldHeObrlr a Vida Religiosa. !d.
Paull na~, $10 Paulo 1976.
TILLARD. J . M. R.. -nellgtol08 Ho)e. Ed. Loyola. Sto Paulo 1970.
IDEM. Rellgloloo, Vlvancl. e Evangelho. Ed. Layola, Sio Paulo 1973.

- 433-
No çlnema:

"o milagre da fé"

eu atnla.: o IIIme " O Milagre da Fé" ridiculariza de maneira


86rdlda a rellglosldad. popular. Inslnuaodo qua os milagres. a devoçJo
dos IJéb aos santos nlo do senil) fen6manos resultantes da IgnorAncla
e da clendlce.
Em resposta, observamos Que a Igreja nAo Idenlfllca vida de fé e
pIOCU~ da milagres ou de cura. mllagl()$a•• A Igreja 060 se praocupa
com a obtençlo de por1enlos; • mesmo s6brla e cautelosa sempre que
, apregoado algum ten6tr\ano milagroso. pois ube quanto di lácll con-
fundll-se mlJag re çom lanOmeno par'palcol6glco e exp ressA0 de (;tedu-
lidada. Oa mllagr•• alo admlUdo., . Im, pala Igrela ma, dent ro da CODo
dlçOaa bem delJnldas.
Da re,to, quem fera a vida de fé, fera o próprio homem, como InsI-
nuam os lextos do lamoso psicólogo Carl Gu.tav Jung. ciladas no 11m
deste arllgo.
• • •
Comentário: Tem despertado comentários calorosos e
protestos do público em geral o filme nacIonal cO Milagre
da Fê., de curta metragem, e1Clbido em vârlos cinemas do
Brasil. E fortemente agressivo aos sentimentos religiosos do
povo brasileiro, recorrendo à ironia de baixo calão. ~ o que
nos leva a propor sumarIamente {J conteúdo dessa película,
seguido de algumas ponderacões.

1. O filme
A história, breve como é. se abre com a cena de dois
meninos que se divertem lançando papagaios (ou pipas) ao
ar. Acontece Qtlc os fios destes se cruzam no ar; assim os
papagaios caem sobre o telhado de uma capela. onde r:cam
presos. Então os meninos: resolvem subir sobre o telhado, va·
lendo·se de uma esca.da. Enquanto lá se achavam tentando
reaver os papagaios. um dl!les removeu uma telha e pôs.se a
urinar para dentro do recinto sagrado.
Logo depois vê-se Que a capela se abre e os fi éis vão
entrando. Uma devota se ajoelha aos pés de uma estátua de
Nossa Senhora e, de repente, verif1ca que esta lacrimeja;
julga ver um cmllagre •• que na verdade nada mais era do
que o resultado da atitude do menino posto sobre o telhado.
-434 -
..o Mll..AGRE DA FÊ) 39

A crença no _milagre:t se espalha de tal modo que muitas


pessoas. inclusive doentes, acodem ao santuário; julgam-se
beneficiados ou mesmo curados por via portentosa! A película
mostra mas de ônibus de peregrinos, barraquinhas e todo o
movimento habituaI junto aos santuários.
Assim tennina o enredo, que vem a ser chocante peja
sátira e peja baixa maneira de apresentar a tese. Esta, em-
última análise, ridiculariza os milagres c, indiretament e, tam-
bem a fé e suas ntitudes populares. 1t o que sugere a per-
gunta. :
2. Que diz.er?
"~ar'cmos qual 1'0 ponderações ao filme em paula :
1) Existem sátiras nobres ou finas e sátiras gl'osselras.
Ora O enredo do tIIm~ vem a ser grosseiro ou sujo. .. Além
do que, é pouco verossimll ou carece de gosto e finura. pois a
urina que caissc do telhado, passaria pela testa da estátua
antes de lhe escorrer dos olhos; quem contemplasse o sem-
blante da imagem, perceberia claramente! que não se tratava
lie lágrimas.
Os críticos de cinema têm observado que o qualidade de
tal filme é péssima, revelando indigência intelectual e precari.
dade de instrumentos. A producão denota lament{lVel falta de
:w.nsibilidadc estética.
2) A Igreja Católica não faz quest§.o de apregoar mlla·
gres. Antes. Ela se mostra cautelosa frente às noticias de
ocorrência de portentos, pois sabe muito bem que a fantasia
humana tende facilmente a proclamar milagres onde há 8petU1S
fenômenos parapsicológicos ou fatos corriqueiros (como no
caso do enredo do flIme). Para que a Igreja reconheça a
flutenticldade de determinado milagre, requer que
_ o fenômeno em causa seja portentoso realmente, e
não apena.<: segundo a Imaginação Innamada ou o vozerio
do povo;
- o fenómeno seja Jnexplicâvel aos olhos da ciência con·
temporânea, que deve tentar todas as vias possivels para elu·
ciciA-lo cientUicamentc;
_ o fenômeno tenha ocorrido em contexto reliJitioso ade·
quado. Na verdade, o mllagre é sempre um sina. ou uma
palavra cforte:t de Deus; por conseguinte. ele supõe um con-
texto digno de resposta ou de interveneão do Senhor Deus
(contexto de orsu;ão humilde e flUal).
- 43., -
'10 d"t:RGUNTE E Rfo:5PONDEREMOS, 238/1979

Ora o episódio exibido pelo filme está longe de preencher


tais condições. Jamais seria tido oficialmente pela Igreja como
«milagre da fb.
3) Em alguns casos, a Igreja desabona formalmente
certas noUcIas de cmilagre»: 10i o que se deu ainda recente-
mente nos casos de Garabandal e El Palmar de Troya (Es-
panha), onde alguns devotos disseram ter visto a Virgem
Maria aparecer. As autoridades eclesiásticas rejeitaram tal
interpretaçãeJ dos fenômenos ocorridos.
Em outros casos, a Igreja pCI",ite que os fiêis apregoem
determinado milagre e se mostrem especialmente devotos em
dado santuarlo. A Igreja aceita Isto por não haver evidência
de que haja Ilusão ou fraude; hê. mesmo em certas situações
lnd!c!os de verossemelhnnça.
Deve-se reconhecc!' que não rnro a Igreja exert:e solít!ita
ação pastoral em santuários muito procurados pelos fiéis (tal
é o caso de Porto das Caixas, RJ). Com isto as autoridades
eclesiásticas não tencionam pronunciar-se em favor da auten·
ticidndc dos fnt~ tidos como milagl'Osos, mns apcnn!t têm
em mira aproYf!ilnr R nrlucncin d~ fiéis pnrn orcrCCCI'-lhes
evangeliza~ão e catequese ou para os ajudar a se estruturar
na fê e a se converter a uma vida nova.
A Igreja não dá sempre grande valor ílOS fcnOmcnos
ditos «de curas fískas. que constumam acontece r nos principais
santuários. pois é notório CJue freqüentemente os <!evotos ima-
ginam ter sido curados, quando na verdade estão apenas su-
gestionados ou Isentos de bloqueios psicológicos. Por isto não
se deveria eonfundir a re1igiosidade crédula e nãG critica oom
a fé. Esta Indepmde de milagres. Os portentos. quando genuI·
nos, são algo de contingente na vida cristã.
4) A fé não é um ato regG ou um~, . atlludC' deslll=tadn da
luz da raz.i.o. Para crer ndultamente, devo exigir crcclcnciais,
ou seja, tituJas que evidendem n credibilidade do objeto da
fé. Para crer, portanto, devo pôr (!m exercido a minha InteU·
géncla; esta, tendo eXDmlnado os nrtilZos dc fé. me dlrã que,
embora transcendam os limites da inteligência, não são absur-
dos, mas, ao contrário, vêm apoiados em credenciais ou tes-
temunhos fidedignos. Na base desta conclusão, crerei, se quiser;
crerei livremente, usando da minha Inteligência e da vontade.
Uma tal atitude merece o nome de fé e distingue-se nitida-
mente de crendice e superstlcão.
-436 -
------ (o MILAGRE nA n::.
- - - =-"""'''''''''-''''-'-'''--_ .
InfeUzmente, porém, não poucas pessoas tenclem a lc1ent;i·
ficar sentimento religioso e credulidade com fé no sentido p.s·
trito desta palavra. Tal é o caso do autor de q:Milagre da Fê».
Confundindo as coisas, o autor agride indiretamente a fé.
Muitos dos espectadores do filme poderão concluir que a Reli·
gião é crendice, fruto da Ignorância e do sugestionamento,
quando na realidade as atitudes religiosas são as que mais
dignifioam o homem; são aquelas que decorrem da intuição
de que a Verdade é mais ampla do Que os limites da minha
inteligência, A Religião é o valor que, por excelência, leva o
homem ao heroísmo, à magnanimidade, à paciência. forte e,
ao mesmo tempo, humilde. Nio há. pois, vantagem em degra-
dã-Ia ou desmoralizá-la aos olhos do público não critico; quem
fere a Religião, fere o próprio homem,
A propósito, desejamos citar um trecho do Prefá cio da
edição alemã. da obra de Carl Gustav Jung intitulada cPslco-
logja e RelJgião. :
cNumo entrevista doda à televisão Inglela, 00 lhe perguntarem
se ClcreditClvo,em Oeul, Jung rllJpondeu : 'j do not belleve, I know'
(Não creio; eu lei) , Esto curto frase desencadeou uma avalanche
de perguntas de 101 propotçõO que ele foi obrIgado a manifestar-se
o respeita numa corfo dirigido 00 jornat Inll"s de ródia 11 ler.visõo
' lhe lhlener', e di'tlno de nolo q\le o enlomologisto Jeon·Henri Fabre
11823-1915) exprimira lua convicçõo religiosa em lermos qUOI.
Idênticos , 'Nllo acredito em Deus J ou o velo', Tania Jung como
fobre adquIrIram foi cerlezo no troto com o Natureza . Fabre, c.am
a nalureza dOI instintos, ob:ervondo o mundo dos insetol; Jun.g, no
Iroto com CI natureza psrquica do homem, observando ti sentindo ai
manifestoções do inconlciente:. Cp, VIII do trClduç5a brolllelro, .d.
Vozes, Petrópolis 1978).
Apraz tam bém citar o fato de qUe .Jung fe2 gravar eu.
pedra, no alto da porta de sua casa de Küsnacht, as palavras
do oráculo de Delfos: cInvocado ou não Invocado, Deus estará
presente. (el. NISE DA SILVEIRA, Jung: vida e obras li.
Ed, paz c Terra, Rio de Janeiro 1978, p. 153),
Estas poucas considerações parecem suficientes para evl·
denclar quão despropositado e maldoso vem a ser o breve
filme .. Milagre da Feit, Não somente o senso religioso, mas
t ambém a inteligência e a dignidade do povo brasileiro, não
tém senão por que repudiá. lo.
Estêvã10 Bcttenoourt O. S . B.
- 437 _
livros em estante
A Pal.,u do Ganhor, NClYO Te,lamento. TraduçAo baseada no Ilt.llto
originai grego e anotada por Mona. Llncoln Ramos. 3" .alçlo relllsla. Ed.
Dom Bosco, Slio P au lo 1979, 115 lC 180 mm. 991 Jlp.

Eis mal~ uma edlçlo do Novo Testame nto que, por lIUIS caraclerf...
IIc8s próprlas. mereca destaque. Tra'.s. da anllga Itaduçlo de Mona.
llnceln Ram os, outrora edU.da patas VOl.es, hoje intelramenl. revisla por
blbllslas do Inslilulo PIO XI e publicada pela Editor. Dom Bosco.
'A Iraduçlo 18m Intuitos pastor.ls. Por isto, acompanham o 'exto blbllco
numefosas 8 ülel. nol.s explicativas, uma Introduçlo em cada livro sagrado
e algumas tabelas cronol6gICIS, que '1<:llIIlm o lISO do Novo Testamento.
PefCOH.ndo o 'alllo, sem prol.neler ,eallzar uma crlllcl exaustiva,
observamos:
_ o Iralamento da tu • v6I (com Ixcluslo da ... ocê[s), qua mell'lor
pareca reSI31vllr a dlgnldada e singularidade do texlo blbllco;
_ fi plllavra epl.copo em ve x de .,llpo (FI 1,1; AI 20, 28 . .. l, !laUan·
tando a pacullarldade de uma funçio que se dosdobrou postflrlorMflnlfl fim
eplsco!)ldo e prlll tJllertldo ;
_ em Jo 7, 37., e pontueçlo 111 e heblluel, dando « enlendar que
o 'fiei é lonta de rios de água ViVI, quando na verd:lde o Messias 6 tal
fonle. Te;!a sido nece usrlo pontusr de modo a respeitar o paralelo entra
"Quem tam .ed., venha" e "8eba, aquele que crê em mim";
- em MI 19, 12, a 1'1014 expllclltlva Interpreta "eunucos por CIIUS.
do Ralno do c' u" no senlldo do c allbato yolunt6,lo sacordotal ou religioso.
Ora, segundo Jacques Duponl. este 'ellto S8 rolere aos hOmeM casados
que. nlo podando viver Conlugtl lmanle, se vêem obrigados ao celibato,
vlslo que o E.... ng.lho 010 autorlxa divórcio ou dlssoluçlo do malflmOnlo
com d lrello • segundas núpcl.s . ..,.alerla a pena lembrar esta no .... e Im-
partante Inlarprellçt.o olereclda por J . OUpofll.
De modo lIerel, por6m, a Iraduçlo 111 boa e ndedlgna. Nes Inttoduç&es
a equipa de ravlsio manteve pOSlçõe. equlllbrfldas: as cartas pastoraIs
&Ao 11.lbulda. a o pr6prlo S, Paulo, bem como E".los, A carta aos Hebreua
seria de um dlsclpulo dos ap6stolos (sentença corrente) , como tambl1lm
a 2 Pd.
Desej.rtamos 5ugerlr que as Introd uçôes lossem apresentadas em
Upo grllllco dl .... rto do tipo do I.xto blbllco, para que melhor se distin-
guisse o texto .agrado dos seul eoncomltan.tes .
Em .uma, saudemos com prezer a nova edJçlo do Novo T8$tamento,
que certamante mereca o s.eu lugar enlr. b d.mals, pois' lIuente, elara
e enriquecida por nlo poucll nOII' axpllt;aUvas ao P' de clldlll p'glna do
tlxto allgrado.
eomenl6,Io 80 Evanflelho de 810 luCI" por A. Lancellolll , 0,
Boccall - Traduçlo de Anlonlo Angonua e Eph,alm Ferrelr. Alves
Ed. Vozea, Petr6polll HtN, 135 x 210 mm, 23& pp.

- 438-
LIVROS EM ESTANTE

Tem ... aqui \Im eoment6rlo IÓlldo e, .o mesmo tempo, claro o com-
PI'98nsM', Oa eulores ao eslorçml por realçar as nolas tlplcls do lercelro
Eva.ngell\o, qUI prima pelo •• u Inl.,.... hlstorlogrince aulm como pelo
dealaqulI dado • mleerlç6rdla e • ..1'Iaçto trazida pelo Senhor Jesus,
Uma boa Introduçlo precade o texlo ..gredo, .mblentando o loltor na.
e.racter'-tlcas da Lucas e da aua obra,
ComentAM' do lexto blbllco fundlmenlados na euges. modorna 8
destinados ao pCibik:o aerlo aempro benvlndos no Brasil. Eis por q\le
regIstramos com praze r . edlç:lo do livro em pauta e aguardamos a pubH-
caçA0 doa qUI se t.rarem lOS outros evangelistas.
U,.... e flfla 8m Crltlo. Teologia MOnII pa,. oçerdol.. 11 Illgos.
por Bemhard Hae,lng. Vai. I : Teotogtl Moral Geral. Tradoçlo de Ir. Isabel
Fonles Leal FII, ...lr•. - Ed, Paullnas, Slo Paulo 1979, 160 "l 228 mm,
459 pp.
O autor' lamoso por seu prlmelro manual de Teologia Moral, tra-
duz1do para quatorze Idiomal, inclu.lvlI par. o português ( com o titulO
A Lal dI Crl.IO) . Vinil e cinco anos depoll da te rminar o lercalro voluma
da "A Lol da Crlato", o aulor r.fez a lua obra, benaflclando-a. d. num..
rosa, experiência. em CUl10S mlnl,trado, na Europa, 1\' América do Norte
e no Terceiro Mundo. T.mOl hoJa em portugué. a traduçlo do primeiro
volume da nova obra, que compr.ande mal. doll volumlt : . A verdada voa
t.r. livras e Lu.l par. o MloInclo,
O que o novo Manual traz de esplclflco, , urna conslderaçlo mais
alanta do aspecto subJ.tlvo • pslcol6glco dos atos morais, em opoalçlQ •
um .ntoque mullo obJ.tlvo e qUlnllteUvo do comportamanto moral. Nlo
h6 dúvida de que I estima do elemento aubJeUvo e penoal • Imponlnll
ml Morll: fodavle poda tlmb6m redundar em subJellvlsmo destruIdor de
lodo o odllfclo de Moralldede. B. Halllng procura escapar a esla plnpe~
UVI. como ae depreendl das luas ponderaç/)ls a respelt(l da lOUca da
sltuaclo (pp. 32&-333 : cl. p. 298) . mas, mesmo assIm, o seu livro apre--
senta vArias tópicos 8ul81101 fi dlacuulo,
Tenhamo. em vlsla partlcularmlntl o q ue o auto r prop6e e respeito
de opçlo fundamenlal 8 pecado. DIstingue entra pecado venial e pecado
mortal: "te í.rlllm<r a6 (lCorre quando é afelada • opç50 fundamenta' do
crlsllo ou Quando latI de.lste da procurer Deus I a emenda de Mua
vicias. Quando, porém. o crlsllo camata algl) de orava, mas logo se ar ...
pe:1da o continua a lular para nAo cair no pecado, nlo hA pecado mortal;
ha, sim, pecado venial grave, Por conseguinte, alguém pode comel.,
pecado vonla' greve e permanlcer Im eslado de graça ; cf. pp. 2Q()'204.
362-315.
Esta poslçlo do Haerlng • auJe"a a 16rles dí.rvldu. Tellha·sa em
conla. po r exemplo, a O.clallçlo da S. Congregaçlo par. a Doutrina da
F6 sobrl alguns pontol d. E:Uca Sexual (29 / 12115). Este doc\:manto nlo
disllnQue entre pecado grava o pecado mortal; elém do que, admite haveI
pecado mortal mesmo quando nio I . muda a opçio fundam.nl.I do suJeito:
" Slgundo • dOlltrlna da IgflJI, o pICado mortal que ee o,p6o a Oan,
nto canil.,. aplnas na " Ir.thcl. lormal I dlrata 80 preceito da carldadl:
ele "I!fIC.... Igualmlnt. naquera opallçao ao arr,or aullnUco que e.1i

- 439
... ..:PI!:RGUNT,I!; E RESPONDEREMOSlo 238/1979

'1M:1vlcJl em 10da tnMfr...Jo dl""f14" em m"kt. Uf'". cf. __ \J1NI


d. "h mo,..'•...
o homem, portanto. lMC' mortalmente nlo ,6 quando .. IUII .çe..
procedam do «h.prezo d' ..lo do MIO, de Deu• • do pr6llmo, .m.. limo
Wm quando el., COftec,enl. e Il'Il'It/'MInte, fu • escolha da um ob)eto
gravente"', desordenado, .eJ. qual f Df ó mOllvo d.~.. IUO HColha" (doe.
citado. "' 10).
Mal• . Pergunllrl<M'!os I Haerlng: se .I;u'm cal em IIIdull6r1o cons-
elent. , livremente, m.. gu.rda SUl '"tençao de fidelidade 8 Deus •
'emltla, conserva o .. tado d, graÇII ("lo peca mor1,'menle)? Por con-
*
.egulnte, pode lranqülllmanla recebar I S. Eucaristia, .am procur., pre-
vlament. o sacramanlo d. Rlllconcltlaçlo? - CremO!! qUI, .•• gul'ldo os
prll'tClplos de Ha8r1no. I T'II3posta 111 poalU.,. - o que redunda em abarr..
çlo moral.

~ "ula I em outros 1'01'1109 qUI o livro de H.aerlng I' torna dllcu-


tive!. Nlo deveria ser adotedo como manual nQ; Faculdad.. de Teologia
e nos Semln6rlo" nem pod. servir Incondicionalmente d. partm.lro para
pe,lore, e catequlsles, embora lenha beta. p'glna• ., uJa de .,tUo ,&cU
• nuenle. A sua doutrina 30bre opçl;o fundamental e p6Cado poda g."r
..ri .. confusa•• « .l)ernç"e•.

Moral d, Atltuel... Vol. 1: Moral Fundam.nlll, por Marciano Vldal.


Tradllç10 do P. , 1.... 0 Monl.nhesl C .S8. R. - Ed. Senluérlo. Caixa Post.1 oi.
12570 Apereclda eSp). 140 x 210 mm , 543 pp.

Marciano Vida' 6 sacerdote redenlomla, que s. vem impondo no


campo da Teologl. MonIl como professor no Inl lllulo de Moral cf, M.drld
I lutor de dtva,...s obras. das quais alguma, 16 Iraduzld.s para o PQftvguês.

o volume acima acha-se em 'UI tercelr. edlç10 ne IIngua orlgln.'


.spanhola (1978) . Como Jovem morall,ta, o lIulor lenclona rapanear os
dlver.os terna, da Moral Fundamant.1 (concenos de ~t1ca, alo humeno.
consciência moral. pecado. v]rludo .. . ): a mento com QUO oOOrda ....
larela, é exposta poto p,óprio IIuto, nl Ipre, entaçAo do .eu lI... ro :
'·Advlrto, duct. li. que 1'110 prltt.ndo romper com lodos OI ..quem..
_MrJaras pl,. comln.ll, l igo compa.lamenle ftCt\OO , orlglnll Pf'ocuro.
porm, of'Tecer uml olelll. çlo QUI a}llde • pHur d, II1'II modo c ..ui.11co
de enlender 111, elle§ort:l, morllt par. um. lorm. mah p.r.on'llsl&. E.lou
cOMelenl. de que • nec.s.sirlo canUnu., 'Caminhando para 1'10'1. famu..
'a~lt, Ir.balho .m qu., por oul,o lado, mo slnlo empenhedo".

o lulor fi IIIUS cologas mO/alistas lem raz!o quando .0 preocupam


cem o aspecto demasiado easul,lIco • oblellvlsla que I Teotoglll Moral
I1ssumlu nos .mlmo, séculos. É realmente n. cess6r1o quo SI procure le ...ar
mi l, .m canil o aspecto pessoal ou !õubjetIYo do agir humano. .
Um dos :oma~ Que mllls lêm sido cons lder.d~ nesta perspeCIIYI, é o
do pocad~. Marcla'lI) Vldal dedica ao as'S unlo o seu capitulo 8 (pp.. 331-"68):
.slude e r (I histó rico da quesito e as Slnlanças de dlve rsoe II/Ioras anti-
<101. modelnos e contomporâneos. Conclui o capltulc;J propondo Que "se
pontla enlre p~!ênll!!U a cl:.sslflcaçllo do pecado am morlallvenlll 8

- Hn _..
gravellev.", pois .slas categorias se acham demasiado presas .'orma da
celebraçlo do Ilcr.manlo da P.nltêncl., qu. exige a acusaçlo dos peca·
dos segundo a espécie e o numero, Para substituir a classlflcaçAo usual,
N , Vldal lI ug,r. uma dlversUlcaçlo da formas d' responsabllluçlo mo ral.
Haveria, pois :
- Pec.ado-opil!o; A opç'O consll1ul a aslrulura fundamenta' de vida
moral; dai ser o pacadQ..opçlo o p.cado : em sua dlmensio mal. profunda.
- Pleado-alllude : I! IOlma da pacado que se realiza de modo
global em alguns dos IOlor., da Ixl"60e18 c riaI., la um pecado que pode--
riamos chamar " ..Iorlar'.
- Pecaoo·alo; t O pecadO s lnoula rlladO. q ue nAo comporia lodo
o compromisso da peuoa, ma. que expressa a opçlo e as atlludel na
precariedade óO "aqui" e " agora" da vida. CI. PP . 46&-468.

Esta poslçlo de M. Vldal relele·u à o pçAo fun damental como a do


Pe. Hil.rlng. Todavia , menos avançada do Cl ua a desta outro autor ;
nenhuma objeçlo $8 Ir.e pode opor, pl.clsamenle porque nlo laIa de
"grave" ou "I....... ... SetA lIello. porém, perg untar se hâ vanlagem em
esq ue;er as noçOas de pecado lava/venial e grave / mot1al. Na praxe pas·
11)'81, set\ll eemp'. oporluno propor ClllérlO$ parI!! que alguém pOlIaa ovallar
se es" em el tado de graça ou nio. e 511, por consegunte, poda receber
a S. EUC811sl18 sam recorrer previamente aI) sacramento da Aeconclllaçlo.
Pil a que a T.ologia Moral se torno ml!!ls persona!!sla, não há necessidade
da se lhe IIrarem carloa r.lerenclals objel!vos. sem os Cluals os conceílos
!e tornam vagos I)U demais suJeltol a apreclaçOes subJativas e lIusMas.

Da 18s10. des.Jamos louvar o eslorço d. M, Vidal por renovar a


Teologia Mo ral. A sua obra' trica na aprlSenleçAo de sentenças e Infor·
maçOel, gUlrlfando ainda o sau cunha de texto da aulas unlv.rsllârlaa.
O leitor rlucr ará com o esludo do livro em paute, maa ainda nlo o podlll
,omll como expressA0 consumada da renovaçlo da Taologla Moral; •
slnles. entre o .ubJ.U'tO • o obJaUwo (dois alementóS impresclndlvela na
Mo,al) ser' sempre elÇio da dlllc:lI.

Pl.IObla : anlll... p.rspe-ctl.... , Inl."ogaçllll. por L, 8orl, Benl dOI


Sanlol. A. M. Roxo li ol.llros. CoI.çio "Teologia em diálogo". - Ed , Pau·
linas. 510 Paulo 1979. 160 J 230! mm, 154 pp.

e .l. l;vro conlta da doze .rUgOI. devidos a leólogos OI Slo Paulo,


" resp.ilo do documenlo IIn.1 de pu.bla • das lUas conaeqOJncla. pu·
lOlais, A lónlca dQa estudos aUlm apras.nl.ldos recai sobre. tusUça social,
nada havendo SObte as v.rdad.a que os ' bispos em Puebla quiseram r.cor-
dar a resp.lto de JISUS CrlltO. da Igreja e do homem. C.rtal páginas do
livro do elucldallvas a utals para O· aprofundam.nto do texto d. Pu.bla;
oulra!!. po rtm, poderiam ler retocadas no sefllido de certa mode raçlo.
Assim. por e~empto. 18 lilt ê p. 78 : "ou todOI s e convertem para a
açlo IIb.rtadora ou deium da ter erll 1105"; • p. 71: "Cartos movlmenlOS
de Igreja, (tnllg$dos de autênlica pasloral social, prodUllram crlslllos ...
moralmente bonl am I UIII opçllel, cujos conteúdos podem eslar sendo
moralm.nte Injustos", Tais afirn'laçr5u , call!lgórlcas como s ão, parecem
unilaterais ; "slmplllic:am" Indevldamenle os problemas. Gostarfamos de
que, na literatura rec6m·publleada sobre Puebla. se levassem em consi·
de raçllo a se com.nta.um as proposlç&s sobre Cristo, a Igr.Ja • o
homem que. após Joio Paulo 11. os bispos Quiseram lembrar aos Uéls da
Amoérlca Latina.
E .S .
AS VERDADES SOBRE CRISTO
.. ~ DEVER NOSSO ANUNCIAR CLARAMENTE, SEM DEI-
XAR DúVIDAS OU eQUíVOCOS , o MIST~RIO DA ENCARNA-
ç.a.O : TANTO A DIVINDAOE DE JESUS CRISTO . TAL COMO
A PROFESSA A F~ DA IGREJA, QUANTO A REALIDADE E
A FORÇA DE SUA DIMENSÃO HUMANA E HIST6RICA.

DEVEMOS APRESENTAR JESUS DE NAZAR~ COMPARo


TILHANDO A VIDA, AS ESPERANÇAS E AS ANGúSTIAS DO
SEU POVO E MOSTRAR OUE ELE ~ O CRISTO ACREDITADO,
PROCLAMADO E CELEBRADO PELA IGREJA.

JESUS DE NAZAR~ , CONSCIENTE DE SUA MISSÃO:


ANUNCIADOR E REALIZADOR DO REINO E FUNDADOR DE
SUA IGREJA, A QUAL TEM PEDRO COMO ALICERCE VIS,-
VEL; JESUS CRISTO VIVO, PRESENTE E ATUANTE NA
IGREJA E NA HISTóRIA.

NÃO PODEMOS DESFIGURAR, PARCIALlZAR OU IDEO-


LOGIZAR A PESSOA DE JESUS CRISTO. NEM FAZENDO
DELE UM POLiTICO, UM LiDER, UM REVOLUCIONAR 10 OU
UM SIMPLES PROFETA, NEM REDUZINDO AO CAMPO 00
MERAMENTE PRIVADO AQUELE QUE G: o SENHOR DA
HISTóRIA,

FAZENDO ECO AO DISCURSO DO SANTO PADRE AO


INAUGURAR NOSSA CONFER~NCIA, AFIRMAMOS: 'QUAL·
QUER SILENCIO, ESQUECIMENTO, MUTILAÇÃO OU INADE·
QUADA ACENTUAÇAO DA INTEGRIDADE DO MISTERIO DE
CRISTO QUE SE APARTE DA FE DA IGREJA, NAO PODE
SER CONTEúDO VÁLIDO DA EVANGELlZAÇAO '. UMA COISA
SÃO AS 'RELEITURAS DO EVANGELHO, RESULTADO DE
ESPECULAÇOES TE6RICAS' E 'AS HIPóTESES, TALVEZ
BRILHANTES, POREM FRÁGEIS E INCONSISTENTES QUE
DELAS DERIVAM ' E OUTRA A 'AFIRMAÇÃO DA FE' DA
IGREJA: JESUS CRISTO, VERBO E FILHO DE DEUS, SE
FAZ HOMEM PARA APROXIMAR.SE DO HOMEM E PRESEN·
TEÁ·LO, PELA FORÇA DE SEU MISTERIO, COM A SALVA·
ÇAO, GRANDE DOM DE DEUS' (JOÃO PAULO li, DISCURSO
INAUGURAL I, 4,1,5 - AAS, LXXI, p. 190, 191)".

(DOCUMENTO DE PUEBLA Nos, 175 • 179)

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