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Resumo Abstract
O texto apresenta uma análise das expulsões dos This article analyzes the evictions faced by the
sem-teto, durante a preparação do Rio de Janeiro homeless during the preparations of Rio de Janeiro
para sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olim- for the 2014 World Cup and the 2016 Olympic
píadas em 2016, emolduradas pelos conflitos so- Games, framed by social conflicts in favor of the
ciais, pelo direito à cidade, superpondo políticas right to the city, by juxtaposing urban security for
de segurança das elites e desrespeito aos direitos the elites and disrespect for the rights of subaltern
das classes subalternas. Os discursos midiáticos classes. The media’s and the official discourses
e oficiais classificam essa população como “mo- classify the homeless as those who “live on the
radores de rua”, naturalizando sua condição de streets”, naturalizing their “home-less” condition
“sem-teto”, instituindo o mito de que, apesar de and establishing the myth that, despite not having
não ter casa, essa população “mora”, o que es- a home, that population inhabit somewhere. This
vazia a natureza conflitante das relações sociais process tends to empty the conflicting nature of the
que operam nas cidades como razões da exclusão social relations that operate within the cities, such as
econômica e social e acentuando as oportunida- the real reasons for the economic and social exclusion,
des para milionários investimentos imobiliários thus accentuating opportunities for huge real estate
em processos acelerados de gentrificação. investments in accelerated gentrification processes.
Palavras-chave: sem-teto; naturalização; remo- Keywords: homeless; naturalization; eviction;
ção; gentrificação; discurso jornalístico. gentrification; media discourse.
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http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2014-3214
Sonia Maria Taddei Ferraz, Bruno Amadei Machado
No Terceiro Mundo áreas urbanas pobres moeda: altas taxas de concentração de renda
estão sempre com medo dos eventos
e de desigualdade, e os excluídos são consti-
internacionais de alto nível – conferências
e visitas de dignitários, competições tuídos principalmente pelos “mendigos, pedin-
desportivas, concursos de beleza e tes, vagabundos, marginais [que] povoaram
festivais internacionais – que pressionam
historicamente os espaços sociais, constituindo
as autoridades a lançar cruzadas para
limpar a cidade. Os moradores das favelas universos estigmatizados que atravessaram sé-
estão cientes de que são a “sujeira”, a culos” (ibid., p. 25) de discriminação. Segundo
“praga” que os seus governos preferem
Sposati,2 “no Brasil a discriminação é econômi-
esconder do mundo.
Mike Davis (2005) ca, cultural e política, além de étnica. Este pro-
cesso deve ser entendido como: exclusão”. No
caso dos sem-teto, a rua tem sido o universo de
exclusão que os discrimina e estigmatiza.
Como aponta Martins (1993, p. 37), o
Introdução
agravamento da crise das políticas de bem-es-
tar social tem resultado na sensível agudização
O nosso objetivo, antes de tudo, é oferecer uma
e visibilidade dos processos de exclusão e de
contribuição para o conjunto de análises re-
perda da habitação:
centes, nos mais diversos campos, das políticas
públicas de limpeza urbana/humana durante os Ao final da década de 1980, a utilização
preparativos da cidade do Rio de Janeiro para de espaços ocos e do vão de viadutos
sediar os megaeventos esportivos – Copa do como locais de moradias assinala muito
Mundo em 2014 e Jogos Olímpicos em 2016. bem o agravamento dos problemas ha-
bitacionais. À perversidade estética des-
A análise apresentada constitui um dos
tes elevados acrescenta-se a perversida-
desdobramentos da pesquisa Arquitetura da de social, com a ocupação dos espaços
violência1 e põe em relevo a população excluí vazios sob os viadutos por uma parcela
da sem-teto e instalada nas ruas da cidade do da população.
Rio de Janeiro, seja sob o aspecto das suas es-
De maneira generalizada, os processos
tratégias de sobrevivência, seja sob o aspecto
de limpeza urbana têm se dado, cada vez mais,
das intervenções das políticas públicas que, sis-
através da intensificação da expulsão desses
tematicamente, superpõem segurança urbana
excluídos sem-teto das ruas para áreas ou
e desrespeito aos direitos humanos.
abrigos distantes. Como afirma Davis (2005):
“no mundo inteiro [este] é o último estágio
alcançado pelo inveterado conflito entre ricos
Apresentação do tema e pobres pelo direito à cidade”. As expulsões
revelam, por desdobramento, os limites e fron-
O tema da exclusão não é novo no Brasil e no teiras urbanas a serem energicamente respei-
Rio de Janeiro. tados, que se realizam pela periferização das
Segundo Wanderley (2001, pp. 16-26), a camadas empobrecidas da população, liberan-
pobreza e a exclusão são faces de uma mesma do sem entraves áreas nobres da cidade para
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intervençõesde limpezaurbana e humana que tendo como foco prioritário o banimento das
têm acompanhado esse processo. “classes perigosas”.9
Segundo a “Pesquisa Nacional sobre O quadro de banimento territorial das
População em Situação de Rua”, realizada populações excluídas marcou as cidades desde
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e o advento da sociedade capitalista moderna,
Combate à Fome em 2007 e 2008, o Rio de caracterizado pela intensificação de desigual-
Janeiro apareceu como o município brasilei- dades e pela exploração da classe operária, via
ro com maior número de “moradores de rua” de regra, classificada como perigosa. Guareschi
3
(grifo nosso): 4.585 mil, para uma população (2001) mostra como, desde a Revolução Indus-
total de seis milhões de habitantes.4 Notícia trial, a sociedade capitalista se estrutura através
publicada em 1º de abril de 2014 indicou que de mecanismos que excluem grande parte da
o impacto da recente crise financeira mundial população não apenas do mercado de trabalho,
empurrou três milhões de latino-americanos mas dos seus direitos democráticos à cidade e
abaixo da linha da pobreza. Evidentemente, o da sua condição humana, distante de qualquer
fato reflete, nos diversos países, o aumento do possibilidade de reinserção na sociedade.
número de sem-teto nas calçadas das grandes A aproximação temporal dos megaeven-
cidades. Segundo estimativa do IBGE – Insti- tos se apresenta como uma ocasião excepcional
tuto Brasileiro de Geografia e Estatística,5 os para a legitimação necessária de um ritmo ace-
mais recentes números oficiais de “moradores lerado de “limpeza humana” de áreas urbanas
de rua” (grifo nosso) na cidade do Rio de Ja- da cidade. Assim, as atuais políticas públicas e
neiro são de 2012 e totalizam 6.300 pessoas, sociais no Rio de Janeiro para os “sem-teto”
o que significa um crescimento de 23,8% em podem ser analisadas também como viabiliza-
dois anos.6 doras da distribuição dos espaços a serviço do
Parte significativa dos 6.300 sem-teto mercado imobiliário, na medida em que, como
está instalada nas calçadas e praças na Zona afirma Machado (2004, p. 1), “o desenvolvimen-
Sul carioca,7 em pleno processo de preparação to histórico da política social a coloca, no século
para os jogos que teve início em 2009, e se- XXI, como uma política mercantil, totalmente
riam suficientes para explicitar quem de fato subsumida às determinações do capital. Em ou-
já está pagando pela atual supervalorização tros termos, é uma política intermediada pelo
imobiliária e pelo embelezamento da cidade Estado que visa lucro para o capital privado”,
como palco para os megaeventos. No quadro deixando de lado seu caráter original de “ga-
das políticas públicas de pretenso ordenamen- rantir espaços de consolidação de atendimentos
to da cidade, a Prefeitura do Rio de Janeiro a necessidades sociais não mercantilizáveis em
criou em 2008 a Operação Choque de Ordem, si mesmas”, que seriam, no caso específico, o
“com o objetivo de pôr um fim à desordem ur- direito pleno à cidade e à moradia digna.
bana, combater os pequenos delitos nos princi- Para ilustrar a afirmação de que as po-
pais corredores, contribuir decisivamente para líticas públicas de limpeza da cidade atendem
a melhoria da qualidade de vida”8 na cidade, privilegiadamente os interesses do mercado
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constitucionais12 à sobrevivência digna: direito impressosdo Rio de Janeiro e São Paulo, englo-
ao trabalho, à saúde, à educação, à alimenta- bando o período de 1994 a 2012, como listado
ção e à moradia. nas fontes bibliográficas.
A "rua", como território de instalação Esses jornais têm noticiado com clareza a
e permanência, passa a ser o lugar de enun- dimensão básica dessa condição, mostrando a
ciação dessa população, ao mesmo tempo, abissal diferença de renda entre ricos e pobres
como vítima e ameaça. Mais ameaça do que no Brasil, como se lê nos trechos abaixo:
vítima, já que sobrevive, como perturbadora
Brasil tem o 3º pior índice de desigualda-
e transgressora, na apropriação privada do
de do mundo. (O Globo, 23/7/2010)
espaço público.
Miseráveis somam 16,2 milhões no país:
O Ministério do Desenvolvimento Social
informou que o Brasil tem 16,2 milhões
Análise do discurso de miseráveis (8,5% da população). São
pessoas obrigadas a sobreviver com ren-
jornalístico da familiar per capita de até R$70 por
mês. (O Globo, 4/5/2011)
A análise do discurso jornalístico que tem co-
Rico brasileiro tem a soma da renda de
mo universo a cidade do Rio de Janeiro e como 40 pobres: Juntos, os brasileiros que se
sujeito a população sem-teto, instalada princi- encontram entre os 1% mais ricos do país
palmente nos bairros nobres da cidade, tem o possuem uma renda que, somada, supera
objetivo de desvendar a produção histórica do o que é pertencente aos 40% mais po-
bres. (Folha de S.Paulo, 17/11/2011)
mito “morador de rua”, que naturaliza o per-
verso cotidiano dessa população, esvaziando A partir dos dados apresentados acima, o
a natureza conflitante das relações sociais que que se pretende demonstrar é que a mídia tem
operam nas cidades, promovendo a espoliação enunciado, cada vez mais categoricamente, a
sumária do seu direito à cidade. Dessa forma, parcela “sem-teto” da população como “mora-
produzem estigmas que influenciam profun- dor de rua”, levando à produção do falseamen-
damente o imaginário social que relaciona to de sua real condição, criando o mito de que
pobreza, violência e insegurança, justificando essa população – espoliada do direito à mora-
violentos processos de limpeza urbana e hu- dia – mora. O mito passa a ser necessário não
mana nas cidades contemporâneas. As rajadas só para falsear a condição de ausência de teto,
discursivas “mitificadoras”, que contaminam como para consolidar o estigma da transgres-
o imaginário social, produzem consensos ne- são na apropriação privada do espaço público.
cessários à viabilização das atuais políticas de A análise parte da concepção de “mi-
valorização imobiliária no Rio de Janeiro, como to” suscitada por Barthes (1989, p. 11). Dada
apontam as reflexões de Smith já referencia- “a impaciência frente ao ‘natural’ com que a
das anteriormente. imprensa, a arte, o senso comum mascaram
O material aqui analisado é compos- continuamente uma realidade que, pelo fato
to de extrações exemplares de jornais diários de ser aquela em que vivemos, não deixa de
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ser por isso perfeitamente histórica”, Barthes linguagempara criar efeitos de verdade ou de
declara ter sofrido “por ver a todo momento realidade, com objetivo de convencer o interlo-
confundidas, nos relatos da nossa atualidade, cutor de sua perspectiva de realidade, de sua
Natureza e História”. E então denunciava o que ideologia. Logo, a linguagem é utilizada como
entendia por “abuso ideológico” e dissimulado. instrumento de poder pelos segmentos sociais
Segundo o mesmo autor (ibid., p. 132), o dominantes, o que leva à variação do uso de
“mito” seria uma fala, um sistema de comuni- determinadas terminologias, de acordo com in-
cação que, através da repetição, se naturaliza. teresses e circunstâncias.
O mito pode ser constituído “por escritas ou Como exemplo, a observação das man-
por representações: o discurso escrito, assim chetes jornalísticas publicadas em meados da
como a fotografia, o cinema, a reportagem, (...) década de 1990 revela claramente menor pre-
pode servir de suporte à fala midiática”. A par- cisão semântica, pois referenciam o mesmo
tir, portanto, de que o princípio do mito seria sujeito ora como morador de rua, ora como
transformar a história em natureza, a constata- população de rua, ora como mendigo ou como
ção se aplicaria de maneira clara à análise em sem-teto. Nas matérias mais recentes, há uma
questão: o mito “morador de rua”. substituição progressiva da designação “sem-
O trecho abaixo traça uma clara analogia -teto” pelo emprego quase exclusivo da de-
entre a beleza do cenário e o empecilho da pre- signação “morador de rua”. Embora seja pre-
sença do morador de rua. Ora, qual correspon- maturo afirmar que tal substituição tenha sido
dência existe de fato entre o “cenário digno de intencional, ela já aponta para a reinvenção (e
boas recordações” e a presença “não solicita- permanência) do mito “morador de rua”.
da” dos “moradores de rua” nesse cenário? Afinal, qual a diferença real entre “sem-
-teto” e “morador de rua”? Qual seria o senti-
Alerta vermelho nas áreas verdes: Ensea
da de Botafogo, Aterro do Flamengo e do essencial dessa substituição? A designação
Campo de Santana. Três áreas de lazer “sem-teto” expõe a realidade de exclusão da-
com muito verde que poderiam ser um queles que foram espoliados do teto, uma vez
cenário digno de boas recordações pa- que a etimologia da preposição “sem” exprime
ra visitantes que conhecerão a cidade
a ideia de falta, privação, exclusão, ausência
durante a Conferência das Nações Uni-
das sobre Desenvolvimento Sustentável (in: Grande Dicionário Houaiss, edição eletrôni-
(Rio+20), que acontecerá no mês que ca). Em contrapartida, a designação “morador
vem. Mas os belos cartões-postais têm ao de rua” expressa, pelo uso da preposição “de”
menos um triste ponto em comum: estão como relacionadora de palavras, procedência,
tomados por moradores de rua. (O Globo,
ponto de partida e origem (ibid.), criando e na-
11/5/2012)
turalizando o elo entre o sujeito e a rua como
O discurso midiático detém sempre um seu lugar de existência. Logo, a designação “de
certo poder na perpetuação da fala mítica. rua" expressa uma incongruência, na medida
O discurso, de acordo com Fiorin (1990), é em que “rua” constitui via pública urbana,
um campo de manipulação em que o falante onde transitam pessoas e veículos, e “mora-
se utiliza de estratégias argumentativas da dia” se materializa como um objeto – edifício
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Um morador de rua improvisa uma cabana em plena Avenida Presidente Vargas, na altura da prefeitura do Rio. Cada
vez mais, barracas têm sido erguidas com papelão, madeira e tecido nas principais vias da cidade. O secretário mu-
nicipal de Assistência Social, Marcelo Garcia, admite que o problema tem aumentado em bairros como Botafogo,
Flamengo, Catete e Glória. Levantamento de 2007 mostrava 1,9 mil pessoas vivendo nas ruas. (O Globo, 18/8/2008)
Obra vira abrigo para moradores de rua no Leme: “Grandes manilhas de concreto deixadas ao longo da Rua Aurelino
Leal, no Leme, viraram abrigo para moradores de rua e alvo de críticas de vizinhos da região”. (O Globo,16/10/2011) 13
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Moradores de rua se espalham pela Zo- a sujeira ou como o lixo das cidades contem-
na Sul: A Subprefeitura da Zona Sul vai porâneas. Acrescenta-se a esse tratamento a
insistir em ações semanais conjuntas
criminalizaçãodo sujeito, principalmente nas
com a Secretaria Municipal de Assistência
notícias que os associam a drogados15 e va-
Social (SMAS) para reduzir o número de
moradores de rua nos bairros da região. gabundos,16 fortalecendo o mito de que são
(O Globo, 9/4/2011) transgressores e, portanto, perigosos.
Essas políticas públicas rejeitam toda
Alerta vermelho nas áreas verdes: os
belos cartões-postais têm ao menos um ação filantrópica paralela, sob o risco de invali-
triste ponto em comum: estão tomados dar as razões do “acolhimento”, como declara
por moradores de rua. A prefeitura alega a Secretaria Municipal de Assistência Social:
que o problema é histórico, mas diz que
está intensificando as operações de aco- A Lapa dos contrastes: Em 2011, cerca de
lhimento. — No ano passado, batemos o 1.300 moradores de rua foram recolhidos
recorde de acolhimentos. Foram 21 mil, no bairro [da Lapa]. O número represen-
63% a mais do que em 2010. (...) — ar- ta 40% de todas as pessoas recolhidas
gumentou o secretário municipal de As- no Centro. A Secretaria Municipal de
sistência Social (...) (O Globo, 11/5/2012) Assistência Social diz que diariamente
faz operações na região. E que o fato de
Prefeitura rebate crítica de morador de voluntários darem comida e oferecerem
rua: A prefeitura também informou que serviços aos mendigos, como corte de ca-
este ano aumentou de R$15 milhões pa- belo, contribui para que eles permaneçam
ra R$28 milhões o investimento na área no bairro. (O Globo, 14/1/2012)
da proteção social especial, além de estar
capacitando funcionários e ter aumenta-
Mais além, a contaminação do imaginá-
do a quantidade de vagas nos abrigos. (O
Globo, 27/9/2011) rio coletivo se dá pela alteração social de sig-
nificado, engendrada pelas insistências semân-
Nem abrigo com piscina conquista men- ticas com a enunciação dos “sem-teto” quase
digos: Para acolher a população de rua, a
exclusivamente como “moradores de rua”.
prefeitura conta com 29 abrigos próprios
e 28 conveniados, num total de 2.980 va- Essa contaminação pode ser identificada na
gas. O secretário municipal de Assistência carta do leitor que busca no jornal um meio pa-
Social (...) admite que a evasão é muito ra expressar sua indignação, ao ver um espaço
alta — cerca de 90% de pessoas recolhi- público na cidade ocupado por “sujismundos,
das voltam para as calçadas, bancos de
drogados, baderneiros”. Dentre tantos exem-
praça, viadutos e areia da praia. (O Globo,
7/10/2011) plos, a carta abaixo explicita o desejo de uma
cidadã, que se considera “de bem”, de retirar
A utilização esporádica do termo “reco- os “moradores de rua” do seu bairro. O trecho
lhimento”, como na matéria acima publicada transcrito revela, ao mesmo tempo, a exposição
pelo jornal O Globo, em 7/10/2010, é exem- da miséria e o sincero desejo de apartar o “ou-
plo da referência feita a ações de limpeza ur- tro” do espaço público e vital, como sendo ele
bana, tratando a população sem-teto como “tudo de ruim”:
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Notas
(*) Este título é uma desconstrução da primeira frase da música de Dorival Caymi: “Eu não tenho
onde morar”.
(**) Trata-se aqui de uma versão ampliada e atualizada do texto “Eu não tenho onde morar é por isso
que eu moro na rua, ou como os sem-teto viraram moradores”, apresentado no IV Seminário
Internacional – Direitos Humanos, Violência e Pobreza: a situação de crianças e adolescentes na
América Latina, Universidade do Estado Rio de Janeiro, 21 a 23 de nov de 2012 – GT VII: Direito
à Cidade e Direitos Humanos e apresentado no Seminario Internacional – Ciudade de México,
Brasil y Argentina: Procesos y actores urbanos, Universidade Nacional Autónoma de México, 30
e 31 out 2012.O texto original contou com a coautoria de Sara Uchoa, estudante de Graduação
do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará, então pesquisadora
deste grupo.
(1) Pesquisa desenvolvida desde 2000 com apoio da Faperj – Fundação Carlos Chagas de Amparo
à Pesquisa do Rio de Janeiro, desenvolvida na Universidade Federal Fluminense. Home page:
http://www.uff.br/arqviol
(2) Mapa da Exclusão/inclusão na cidade de São Paulo, apud WANDERLEY, M., in SAWAIA, B. (org.),
2001, p. 20.
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(10) As Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) começaram a ser instaladas nas favelas cariocas após
a tentativa de murá-las para controlá-las e escondê-las, com a promessa de devolver segurança
à cidade. As primeiras estavam localizadas nas proximidades dos anéis olímpicos e dos bairros
nobres. A análise dos discursos sobre as UPPs foi objeto de outro trabalho deste grupo de
pesquisa, em 2010 – Arquitetura da Violência: cidade limpa e segura para turista ver – cujo
resumo pode ser acessado no site http://www.uff.br/arqviol.
(11) Em 8/1/2010, antes das devastadoras chuvas de abril de 2010, o jornal O Globo já publicava
matéria anunciando remoções de 119 favelas e as relacionando à política de implantação de
UPPs.
(15) Folha de S.Paulo, 6/1/2012: Em nova fase, ação anticrack dispersará moradores de rua.
(16) Folha de S.Paulo, 14/3/2012: PM de Santa Catarina prende moradores de rua por vadiagem.
(18) Embora sejam permanentes, essas práticas têm sido intensificadas na preparação da cidade para
os megaeventos esportivos.
Referências
BACHELARD, G. (1988). Bachelard. São Paulo, Nova Cultural. Coleção Os Pensadores.
FERRAZ, S. M. T.; PERES, N. e RODRIGUES, L. (2010). Arquitetura da Violência: cidade limpa e segura
para turista ver. In: III SEMINARIO INTERNACIONAL DE DERECHOS HUMANOS, VIOLENCIA Y
POBREZA. Anais. Montevidéu.
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Eu não tenho onde morar, é por isso que eu moro na rua
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(Trabalho original publicado em 1982).
MACHADO, E. M. (2004). Política social: a manutenção da desigualdade. In: VIII CONGRESSO LUSO-
-AFRICANO DE CIÊNCIAS SOCIAIS. Coimbra, set. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/lab2004/
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SMITH, N. (2000). “Contornos de uma política espacializada: veículos dos sem-teto e produção de
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______ (2006). “A gentrificação generalizada: de uma anomalia local à ‘regeneração’ urbana como
estratégia urbana global”. In: BIDOU-ZACHARIASEN, C. (org.). De volta à cidade: dos processos de
gentrificação às políticas de revitalização dos centros urbanos. São Paulo, AnnaBlume.
WANDERLEY, M. B. (2001). “Refletindo sobre a noção de exclusão”. In: SAWAIA, B. (org.). As artimanhas
da exclusão – análise psicossocial da desigualdade social. Petrópolis, Vozes.
Periódicos
Folha de S.Paulo – impresso e online, diversas edições de 1994, 2011 e 2012.
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