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PROPRIEDADE
(Algumas considerações tópicas)
INTRODUÇÃO
Por outro lado, ainda pode-se constatar que a doutrina muitas das
vezes se perde quanto à classificação das ações possessórias, incluindo a ação de
usucapião e imissão de posse dentro dessas espécies de ações. Hoje esse equívoco
ocorre com menor intensidade, face a roupagem que foi dada pelo próprio
legislador, incluindo um capítulo no Código sobre as ações exclusivamente
possessórias.
Outro ponto que não vislumbramos uma razoável justificativa diante
da nova roupagem que tomou o direito possessório e o direito de propriedade nas
últimas décadas é o fato de se afirmar que a ação reivindicatória é aquela que o
proprietário ajuiza contra o possuidor e não proprietário. Essa idéia esboçada pela
1
In Ação Reivindicatória. Saraiva. 3ª edição. São Paulo. 1.985, pág. 15.
maioria da doutrina e muito estimulada na jurisprudência pátria parece merecer
algum reparo, como veremos adiante.
A permanência da ação de imissão de posse como instrumento hábil
e adequado para solucionar determinados conflitos no âmbito da posse e da
propriedade, deve ser estimulada e encontrar um maior apoio da jurisprudência
esvaziando, assim, a idéia inicial de seu desaparecimento, como chegou a ser
apregoado por alguns logo após o advento do Código de Processo Civil em 19742.
2 - Sentido da Posse
2
SILVA, Ovídio A Baptista da, em sua obra Ação de Imissão de Posse, é bem enfático ao afirmar: “... alguns
escritores e juízes, ao inaugurar-se a vigência do novo CPC, não vacilaram em afirmar que a ação de imissão de
posse havia desaparecido de nosso sistema. Muitos outros permaneceram indecisos e em dúvida sobre a
permanência da ação, tentando encontrar fundamentos para apoiá-la no campo do direito processual”, pág. 115.
3
In Código Civil Anotado. Saraiva. São Paulo. 1.995, pág. 373.
2
A posse pode ser vista em três sentidos: causal, como aquisição de
direitos reais e formal. No primeiro, tem-se a posse como conteúdo de certos
direitos, exemplificando-se com a propriedade, o usufruto e a servidão, onde esses
institutos guardam em seu conteúdo o aspecto possessório do bem. No segundo,
ela é palpável como requisito para adquirir o direito, como é o caso do usucapião.
Este, só pode ser reconhecido depois de embasado no pressuposto da posse após
certo lapso de tempo. Em terceiro lugar, a posse é identificável como entidade
jurídica de per se, autônoma, independente e dissociada de outro direito real.
Neste caso, é bastante se ver as hipóteses em que se adquire um bem imóvel, se
tem o título aquisitivo como um contrato, a escritura e as vezes um mero recibo,
porém sem qualquer registro ou matrícula como elemento caracterizador da
propriedade.
3 - Elementos da Posse
São elementos que constituem a posse: a) corpus, identificado com
o exercício de atos materiais sobre a coisa, caracterizando assim a “exterioridade
da propriedade”, no dizer de MARIA HELENA DINIZ4; b) animus, visto como
a intenção do possuidor de se comportar como titular do direito a que
correspondem os atos praticados. Segundo esse elemento, a posse só poderia ser
identificada quando existisse a vontade de ter o bem para si.
Esses dois elementos se sobressaíram nas lições de SAVIGNY,
como a concepção subjetivista da posse, embora dizendo que a posse exige os
dois elementos e IHERING, a quem se atribui a teoria objetivista, entendida como
estando presente na posse apenas o elemento material “corpus”, embora afirmasse
esse eminente jus filósofo que o tal requisito não poderia existir sem o “animus”.
Essas teorias, embora de suma importância ao se analisar o instituto
da posse, não sobrevivem com as concepções atuais das teorias sociológicas de
PEROZZI e da apropriação econômica de SALEILLES. A primeira entendida
como um fenômeno social de natureza consuetudinária, enquanto a segunda
configurando-se pela “consciência social”, onde o juiz deve verificar se há posse
pela apropriação econômica.
4
Idem pág. 373.
3
4 - Modalidades da Posse
A posse se apresenta em diversas modalidades: a) posse direta, onde
o possuir direto se encontra com o bem em razão de um direito ou de um contrato
como afirma MARIA HELENA DINIZ5; b) posse indireta, quando o possuidor
se encontra com o bem por força de cessão de uso, assim compreendido o
usufrutuário, o locatário, o arrendatário, etc.; c) posse justa é aquela que foi
adquirida sem violência, clandestinidade e não se configurar como precária; d)
posse injusta se identifica de forma contrária à justa; e) posse pacífica quando
adquirida por meios pacíficos; f) posse violenta é aquela que foi conseguida pela
força física ou por meios de coerção moral; g) posse pública é aquela que se
apresenta sem subterfúgios, à vista de todos e o possuidor não tem nenhuma razão
para escondê-la; h) posse clandestina é aquela estabelecida às ocultas de forma
subreptícia, sem que o possuidor tenha qualquer interesse em que a mesma seja
publicizada; i) posse precária no dizer de MARIA HELENA DINIZ é sempre
“originária do abuso de confiança por parte de quem recebe a coisa, a título
provisório, com o dever de restituí-la”6; j) posse titulada compreende aquela
que foi adquirida através de contrato ou que exista uma avença escrita que
identifique o possuidor como seu titular. Podemos exemplicar com a escritura sem
registro, o compromisso de compra e venda, o recibo, o contrato de locação, de
usufruto e de arrendamento; l) posse não titulada é aquela destituída de qualquer
documento, embora possa justa e de boa-fé; m) posse de boa-fé quando há
convicção do possuidor de que a coisa lhe pertence, ignorando que esteja
prejudicando o direito de outra pessoa, nem que haja qualquer vício sobre tal
direito; se configura ainda até quando o possuidor é portador de um título, mas
sabe ser ilegítimo o seu direito em razão de algum vício ou obstáculo impeditivo
do direito possessório.
5
Ob. Cit. Pág. 374.
6
Ob. Cit. Pág. 376.
4
Muito mais do que versar neste trabalho sobre os instrumentos de
defesa da posse, gostaria de melhor fixar o ponto sobre o qual se prestam as ações
possessórias. A preocupação é melhor esclarecer a grande divergência existente
entre o direito possessório e o petitório, mormente quando se trata de dar uma
interpretação razoável ao art. 923, do Código de Processo Civil, principalmente
quando aliado ao art. 505, do Código Civil e a Súmula 487, do Supremo Tribunal
Federal.
5
29.7.2975, na ap. 43.738, rel. juiz Renato Galbizo)8. Esse posicionamento
contradiz a lição do mestre OVÍDIO BAPTISTA e a própria sistemática imposta
em nosso ordenamento jurídico para a solução desse tipo de problema, pois aí
estaria se buscando na possessória o reconhecimento do direito à posse, o que não
é sua finalidade.
8
PAULA, Alexandre de. Código de Processo Civil Anotado. RT. 2ª edição. São Paulo. 1.980, pág. 121.
9
Ob. Cit. Pág. 192.
10
Ob. Cit. Pág. 193.
11
Ob. Cit. Pág. 193.
6
Termina OVÍDIO por concluir que “Ficam, pois, fora do campo das
possessórias mesmo as ações que tenham por fim a aquisição ou a recuperação
da posse de alguma coisa em que o demandante alegue - não uma ofensa à posse
- mas a existência de alguma relação jurídica que lhe dê direito à posse. É por
essa razão que a ação de imissão de posse não é uma ação possessória, assim
como não o será igualmente a ação de nunciação de obra nova que alguns
escritores e certos sistemas jurídicos incluem nessa categoria”12.
7
a da segunda parte do art. 505, do Código Civil, nos parece não haver dúvida da
revogação desta última.
Quanto à Súmula 487, do STF, mesmo que se queira emprestar
validade ao seu conteúdo, pois hoje a matéria parece se esgotar no Superior
Tribunal de Justiça, deve-se levar em consideração que a mesma não seria
incompatível com o sistema, desde que se procure dar uma interpretação razoável
e finalística, desprezando-se a sua literalidade.
8
É perfeitamente razoável também se entender que Súmula 487 está
revogada por força da revogação dos dispositivos legais antes referidos, não tendo
qualquer sentido prático o seu enunciado. Serve, no entanto, a análise aqui feita
para uma melhor compreensão do art. 923, do CPC, com a redação atual, que
veio realmente dar o real sentido desses instrumentos possessórios.
2 - Do Interdito Proibitório
O interdito proibitório como um dos meios de proteção da posse, tem
lugar quando está evidenciado o elemento ameaça através do justo preceito de
que a posse venha a ser molestada pela turbação ou esbulho, devendo o Juiz
expedir mandado proibitório, a fim de que o Demandado ou Demandados se
eximam de praticar qualquer ato que implique na violação da posse, cominando-
se pena pecuniária no caso de transgressão do preceito, como deixa patente o art.
932, da lei instrumental civil.
Essa espécie de ação possessória, embora tenha características com
o processo cautelar, com o mesmo não deve se confundir, pois ela não é apenas
preparatória de uma futura ação e não visa tão somente a garantia do direito que
vai ser definido em outra via legal. Ela encerra em si mesma a proteção a que se
presta.
9
Uma das características importantes dessas espécies de ações é a
natureza dúplice que elas representam. Com isso significa dizer que o réu, em sua
contestação, não está limitado a impugnar os fatos articulados na inaugural. Pode
também, “alegando que foi ofendido em sua posse, demandar proteção
possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do
esbulho”, como determina o art. 922, do Código de rito.
Está expresso no art. 920, do CPC, o princípio da fungibilidade dos
processos possessórios, devendo o Juiz, ao final, julgar a pretensão que vier a ser
reconhecida no curso da ação, tenha sido ela ajuizada pelo autor. Assim, se vier a
ser proposta uma reintegração, pode o Juiz entender se tratar de uma manutenção
ou vice-versa. Da mesma forma com relação ao interdito proibitório.
10
MARIA HELENA DINIZ conceitua a propriedade como sendo “o
direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar,
gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicar de
quem injustamente o detenha”13.
2 - Configuração da Propriedade
A idéia de propriedade no Brasil, especialmente quanto aos bens
imóveis que é o que aqui nos interessa, pressupõe a existência de registro ou
transcrição. Os artigos 531 e 532 do Código Civil são bem caracterizadores dessa
assertiva. O primeiro diz que “estão sujeitos à transcrição, no respectivo Registro,
os títulos translativos da propriedade imóvel, por ato entre vivos”. O segundo,
exige que sejam também transcritos os julgados das ações divisórias, a
adjudicação e a arrematação.
AÇÕES PETITÓRIAS
1 - Ação Reivindicatória
É comum se afirmar na doutrina e na jurisprudência que “a ação
reivindicatória deve ser dirigida contra aquele que está na posse ou detém a coisa
reivindicanda”14
Essa tradição vem do direito romano como diz SERPA LOPES15,
pois ali “a ação reivindicatória tinha dupla função: a de reconhecer o domínio e
a de sua restituição”, acrescentando que “A ação reivindicatória competia então
13
In Código Civil Anotado... pág. 400.
14
HAENDCHEN, Paulo Tadeu e LETTERIELLO, Rêmolo. Ação Reivindicatória... pág. 22. Na mesma obra os
autores citando CARVALHO SANTOS em expressão de WIELAND, está dito que a reivindicatória “é a ação
dada ao proprietário não possuidor contra o possuidor não proprietário” pág.20.
15
Apud HAENDCHEN, Paulo Tadeu e LETTERIELLO, Rêmolo. Ação Reivindicatória ... pág. 13.
11
ao proprietário, que não possuía, contra o terceiro possuidor, quer esse exercesse
uma posse com animus de dispor como dono, isto é, o verdadeiro possuidor, quer,
como se admitiu mais tarde, se tratasse de um simples detentor”.
16
Ob. Cit. Pág. 14 a 15.
12
2 - Ação de Imissão de Posse
Vigorava o sistema do processo civil estadual quando já se tratava
da ação de imissão de posse em alguns deles, como nos casos dos Códigos dos
Estados do Maranhão, Bahia, Distrito Federal, Pernambuco e Minas Gerais.
17
In Ação de Imissão de Posse, RT. 2ª edição. São Paulo. 1.997, pág. 95.
13
OVÍDIO BAPTISTA não deixa dúvida a esse respeito. “Pelo que
ficou dito, devemos, então, concluir que a ação de imissão de posse continua a
existir, no direito brasileiro, e, no sistema de nosso CPC, se há de processar, ou
pelo rito ordinário ou sumaríssimo, conforme com os princípios reguladores
dessas formas procedimentais. Em qualquer caso, contudo, a ação será sumária,
no sentido de ter limitada a espera de defesa que o demandado poderá opor à
demanda”18.
1 - Embargos de Terceiros
Essa espécie de remédio legal existente em nosso ordenamento
jurídico se aproxima muito das ações possessórias, tendo em vista que o ato que
enseja o seu ajuizamento é o de esbulho ou turbação da posse ou da propriedade.
18
In Ação de Imissão de Posse ... pág. 167.
19
Idem pág. 177.
20
Idem pág. 170.
14
A diferença nesse ponto reside no fato de ter partido essa violação do próprio
Judiciário e não do particular. Os atos de turbação ou esbulho são os mais
diversos, tendo o art. 1.046, do Código de Processo Civil, enumerado alguns que
servem de exemplo para o amplo expectro que o mundo fático pode ensejar.
Pode se valer dos embargos de terceiros aquele que, não sendo parte
no processo sofreu a violência do Judiciário em seus bens. Terceiro aí deve ser
entendido, num primeiro momento, aquela pessoa física ou jurídica que não tenha
nenhuma relação com o processo que se encontra em andamento.
2 - Ação de Usucapião
Esta ação tem por objetivo declarar o domínio do possuidor sobre o
bem por ter decorrido o lapso temporal exigido para cada espécie de usucapião.
NELSON LUIZ PINTO afirma que “O usucapiente, na ação de usucapião, não
visa a tornar-se proprietário da coisa com a sentença; na realidade ele já terá
adquirido a propriedade, desde que completou o lapso temporal exigido por lei,
pleiteando, na ação de usucapião, sentença declaratória desse domínio, para fins
de registro no Cartório de Registro de Imóveis competente”21.
21
In Ação de Usucapião. RT. Coleção Estudos de Direito de Processo “Enrico Tullio Liebman”.vo. 17. São
Paulo. 1.987, pág. 67.
15
O nosso Código de Processo Civil prevê a ação de usucapião nos
arts. 941 a 945 apenas de terras particulares concernentes a bens imóveis. As terras
públicas estão vedadas pela Constituição Federal, em seu art. 191, parágrafo único
de serem usucapidas.
5 - Ação Discriminatória
Essa espécie de ação disciplinada pela Lei nº 6.383/76, tem como
objetivo “demarcar a área pertencente ao Poder Público, fixar os limites,
22
Apud GIANESINI, Rita. Ação de Nunciação de Obra Nova. RT. Coleçao Estudos de Direito de Processo
“Enrico Tullio Liebman”. Vol. 28, São Paulo. 1.993, pág. 15.
16
identificar os posseiros para possíveis assentamentos e encontrar os
proprietários dentro da área para, ao final, registrar o imóvel pertencente ao
Poder Público, em Cartório”.
6 - Ação de Retrocessão
A retrocessão é uma espécie de ação embasada no direito que tem o
ex-proprietário de um bem desapropriado de reavê-lo, quando não tenha ocorrido
a utilização para os fins que o Estado o destinara, restituindo o proprietário o valor
recebido a título de indenização, na forma preconizada no art. 1.150, do Código
Civil.
CONCLUSÕES
17
As ações possessórias, diante de nosso ordenamento jurídico, se
limitam a três: manutenção, reintegração e interdito proibitório. As demais
ações são de natureza petitória ou proteger e reconhecer tanto o direito
possessório quanto petitório.
18
BIBLIOGRAFIA
01. ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. Forense, 7 ed., v.1, Rio de
Janeiro, 1991.
02. DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. Saraiva, São Paulo, 1995.
03. GIANESINI, Rita. Ação de Nunciação de Obra Nova. RT. Coleção Estudos
de Direito de Processo “Enrico Tullio Liebman”. V. 28, São Paulo, 1993.
04. GOMES, Orlando. Direitos Reais. Forense. 6 ed., Rio de Janeiro, 1978.
07. PINTO, Nelson Luiz. Ação de Usucapião. RT. Coleção Estudos de Direito de
Processo “Enrico Tullio Liebman”. V. 17, São Paulo, 1987
19
09. SILVA, Ovídio A Baptista da. Ação de Imissão de Posse. RT, 2 ed. São Paulo,
1997.
_____ Procedimentos Especiais - exegese do código de processo civil. AIDE. Rio
de Janeiro, 1989.
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