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José Renato Junqueira Borges,1 Paulo Henrique Jorge da Cunha, 2 Augusto Ricardo Coelho
Moscardini,3 Rogério Tortelly, 4 Gumercindo Loriano Franco 5 e Luiz Antonio Franco da Silva 6
RESUMO
A compactação de abomaso é uma obstrução mecâ- ocorreu em um touro e em quatro fêmeas, sendo três em
nica ou funcional que impede o fluxo normal do conteúdo vacas multíparas e uma novilha. A maioria dos casos suge-
no trato digestório de bovinos. É causada pela ingestão de ria presença de indigestão vagal. A palpação retal revelou-
forragens secas, de baixa qualidade e ingestão inadequada se importante no auxílio ao diagnóstico, entretanto ela não
de água, sendo mais comum em vacas no terço final da foi definitiva, pois o abomaso não se mostrou palpável em
gestação. O trabalho descreve cinco casos de compacta- nenhum dos casos.
ção de abomaso em bovinos de diferentes raças. A doença
ABSTRACT
Abomasum impaction is a mechanical or functional of different breeds. The problem occurred in one bull and
obstruction that prevent the standard flow of the food in four cows, three of them were old animals and the other
the alimentary tract of cattle. It’s caused by the ingestion was a heifer. The majority of the cases suggested vagus
of dry and poor quality forage and low ingestion of water. indigestion and rectal examination was an important com-
Is commonly observed in late pregnant cows. This rese- plementary diagnostic aid, although abomasum was out of
arch reports five cases of abomasum impaction in cattle reach in all the cases.
o rúmen. O conteúdo omasal e abomasal apre- dante três metros de altura. A forragem colhida
sentava-se ressecado e no abomaso foram iden- era extremamente seca e triturada em partículas
tificadas lesões ulcerativas, apresentando áreas finas de 0,5 cm e fornecida aos animais.
de superfície rugosa, consistência endurecida, Aproximadamente duas horas após concluir
coloração enegrecida mesclando áreas amare- o procedimento cirúrgico, a novilha já apresenta-
ladas e bordas elevadas. Uma das áreas media va melhora do desconforto abdominal. Entretanto
aproximadamente 6 cm x 2,5 cm e outra apro- a melhora aparente ocorreu enquanto o efeito da
ximadamente 14 cm x 4 cm. O exame histo- tranqüilização e da anestesia perduraram. No
patológico dessas úlceras detectou extensa área dia seguinte, o animal começou a evacuar fezes
de destruição da mucosa apresentando áreas de levemente ressecadas. Mas o meteorismo ainda
necrose revestida por acentuada fibrose, inten- perdurou por três dias, sendo necessária uma nova
sa hemorragia, abundância de tecido conjuntivo intervenção, para colocação de cânula rumenal
atingindo áreas profundas, inclusive tecido adi- temporariamente. Como o animal apresentou
poso e presença de áreas com infiltrado inflama- sensível melhora, o dispositivo foi removido,
tório. Concluiu-se ser um caso de úlcera crônica reconstituindo-se a parede abdominal para eli-
de abomaso, compactação de omaso e abomaso minação da fístula. O animal apresentou melhora
com aderências de rúmen, retículo e abomaso. completa do quadro duas semanas após o aten-
dimento. Outros animais mestiços nas mesmas
Caso 2 condições de manejo não apresentaram nenhum
Três novilhas da raça Pardo Suíça apre- tipo de problema clínico.
sentaram anorexia e meteorismo gasoso rume-
nal grave. Duas sucumbiram mesmo tendo sido Caso 3
realizado o tratamento convencional, à base de Em agosto de 2000 foi atendida uma vaca
silicone. Na terceira foi colocada uma cânula mestiça com idade estimada de 12 anos, no oitavo
rumenal provisória para se evitar a compressão mês de gestação, de aproximadamente 470 kg.
do diafragma e morte por asfixia. Apresentava icterícia havia cerca de cinco dias,
Ao exame clínico, constataram-se ema- abaulamento abdominal e anorexia prolongada.
ciação, pêlos secos e arrepiados, timpanismo A alimentação fornecida era à base de cama-de-
rumenal grave, desconforto abdominal, ausência frango ad libitum, com palha de arroz e pastagem,
de fezes no reto e presença de pouco muco. As que se encontrava seca, em decorrência de se estar
alças intestinais estavam distendidas pela pre- na estação seca do ano.
sença de gases, mas não o suficiente para que se O exame clínico demonstrou a presença de
suspeitasse de obstrução intestinal. Realizou-se emaciação, pêlos secos e arrepiados, mucosas ama-
laparotomia exploratória, pelo flanco esquerdo, reladas, abaulamento abdominal predominante no
e à palpação do abomaso observou-se aumento flanco esquerdo e rúmen em atonia e com conteúdo
de tamanho do órgão com presença de conteúdo líquido. O exame clínico do tórax foi negativo para
endurecido, sendo diagnosticada compactação as provas de dor. As fezes se encontravam com
do abomaso. Procedeu-se à rumenotomia, para muco e ressecadas. A suspeita clínica foi indi-
remoção do conteúdo que se encontrava seco e gestão vagal com possível abscesso hepático. No
muito fibroso. Após a cirurgia, realizou-se a pas- dia seguinte, o animal sucumbiu, sendo realizada
sagem de sonda rumenal, administrando-se vinte necropsia, a qual revelou a presença de icterícia,
litros de água morna enriquecidos com 500 g de fígado com coloração clara e abomaso impactado,
semente de linhaça cozida. Durante a inspeção mas sem alteração de volume, com conteúdo res-
da propriedade, observaram-se as condições de secado decorrente da palha de arroz.
manejo e alimentação, quando foi identificada O diagnóstico definitivo foi de compactação
uma capineira de capim-elefante var. Napier de abomaso com esteatose hepática secundária,
(Pennisetum purpureum, Schum) de aproximan- confirmada pelo histopatológico.
valor nutritivo da gramínea durante seu desen- tação avançada com anorexia provoca uma li-
volvimento, em virtude da elevação dos teores pomobilização, liberando grande quantidade de
de matéria seca, parede celular, celulose, fibra triglicerídeos que vão se acumular no fígado e
em detergente ácido, lignina, enquanto caem os provocando esteatose hepática.
teores de proteína bruta e a digestibilidade in vitro Exceto o quinto caso, todos os outros su-
da matéria seca. geriam a presença de indigestão vagal, sendo
A deficiência de manejo no uso de capi- que, com exceção do caso 3, o abaulamento no
neiras provoca uma compactação rumenal leve. flanco direito era severo e a distensão abdominal
Os animais apresentam abdome abaulado, sem tão grave que não foi possível observar altera-
timpanismo, com movimentos ruminais normais ções na palpação da área de projeção do abo-
e por vezes até com freqüência e intensidade maso no abdômen inferior direito, como sugere
aumentadas, mau estado de nutrição, com ema- DIRKSEN (1978). No caso 3, o abaulamento era
ciação, pêlos secos e arrepiados e intervalo pro- restrito ao flanco esquerdo, sendo que na palpa-
longado entre os partos. ção externa do abomaso não foram evidenciadas
Os outros casos de compactação do aboma- alterações, talvez porque o abomaso não se en-
so ocorreram no Distrito Federal e Goiás, ambos contrava distendido pela compactação, como foi
utilizando cama-de-frango com palha de arroz, observado na necropsia.
método de alimentação freqüente na região. A Segundo o que reporta WHITLOCK
cama-de-frango é definida como o produto da (1999b), para o caso 1 há três possibilidades para
mistura dos excrementos das aves, mais detritos explicar os sinais de indigestão vagal: (a) falha
alimentares, penas, juntamente com material ab- ocorrida no transporte retículo omasal, por causa
sorvente usado para recobrir o piso nos galpões. da aderência do retículo e rúmen; (b) a compac-
Existe grande variação na sua composição quí- tação do omaso e (c) a obstrução pilórica ocor-
mica, em virtude, principalmente, do baixo teor rida pela compactação do abomaso. Nos outros
energético e da alta quantidade ou taxa de fibra casos a falha no esvaziamento do abomaso seria
da matéria-prima desse alimento, quando são a causa da indigestão vagal.
compostas de palha de arroz ou de maravalha. A palpação retal revelou-se importante
Contém, ainda, reduzido teor de nutrientes diges- no auxílio ao diagnóstico, entretanto ela não foi
tíveis totais, caracterizando-se como um alimento definitiva, pois o abomaso não se mostrou pal-
da baixa qualidade na alimentação de ruminantes pável em nenhum dos casos (o omaso pode ser
(GARCIA, 1997; ALVES, 1999). palpado, quando muito aumentado). No caso 2,
Em todos os casos analisados, a oferta de a palpação retal foi muito semelhante aos casos
água era abundante e parecia ser de boa qualidade, de obstrução intestinal, com ausência de fezes
não interferindo na etiologia da doença, como e presença de muco, além de distensão das al-
sugerem BLIKSLAGER et al. (1995). ças intestinais por gases, diferenciando-se por
Um dos animais (caso 1) apresentou úlcera ser menos severa que na obstrução intestinal.
de abomaso com peritonite localizada, o que pode Neste caso o abomaso não foi palpável. O caso
ter interferido na motilidade, por dificultar o es- 1 demonstrou fezes pastosas, porém escassas, e
vaziamento do abomaso e conseqüentemente do palpou-se uma estrutura arredondada e grande,
omaso. WHITLOCK (1999a) afirma que a úlcera sugerindo a compactação do omaso. No caso 3,
perfurada de abomaso provoca estase gastrintes- as fezes encontravam-se escassas, duras e com
tinal e apresenta sinais muito semelhantes aos da presença de muco, mas o abomaso também não
indigestão vagal, sendo constantemente confun- era palpável. No caso 5, a palpação retal não re-
dida com reticuloperitonite traumática. velou qualquer tipo de alteração. No caso 4, não
A vaca que apresentou esteatose hepática se realizou a palpação retal.
(caso 3) estava no 8o mês de gestação. A ges-
Na maioria dos casos relatados a com- GUARD, C. Compactação abomasal. In: SMITH,
pactação de abomaso estava associada a outras B. Tratado de medicina interna de grandes
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tação de omaso e esteatose hepática. O tipo de
alimentação em todos os casos colaborou para o HOFFSIS, G. F & McGUIRK, S. M. Abomasal
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(Ed.). Capim-elefante: produção e utilização. 2.
Protocolado em: 3 fev. 2006. Aceito em: 8 set. 2006.