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No 2.

071 - Ano 45 - 9 de setembro de 2019

UTOPIA ECOLÓGICA

Marcelo Lustosa | Criação Cedecom


Um resgate da história do Pensamento Econômico-Ecológico
(PEE), cuja origem data do século 19, é feito pelo pesquisador
Marco Paulo Vianna Franco em sua tese de doutorado
defendida na Face. Análoga ao princípio da sustentabilidade,
essa corrente se baseia nas ciências naturais, especialmente
na ecologia, para explicar o limite físico imposto à exploração
dos recursos naturais.
Página 6

Cientista político
português discute
fundamentos da
justiça de transição
Páginas 4 e 5
Opinião

O FUTURE-SE aponta para o FUTURO?


Ado Jorio*

A
construção de um ecossistema de ser apresentada em um momento de grave ção de grafeno com base no grafite, agregan-
inovação é lenta. O MARK I, primeiro contingenciamento, dando espaço ao ques- do valor a um minério que é exportado em
computador da IBM, foi feito em tionamento sobre o real direito de escolha forma bruta, retirado da região de Pedra Azul,
1937; os aparelhos de ressonância magné- da instituição. Segundo, porque os pontos que não fica em áreas de proteção ambiental.
tica que estão hoje nos hospitais são fruto verdadeiramente relevantes do Future-se, O Brasil criou a Empresa Brasileira de
do trabalho de Otto Stern, Nobel de Física, relacionados ao incentivo ao empreende- Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii),
em 1943. Esses dois exemplos me servem dorismo, à inovação, à internacionalização, e a UFMG abriga uma unidade da empresa
para dizer que, num tempo em que esses já são parte dos nossos esforços passados que desenvolve um equipamento, único no
aparelhos já estavam em funcionamento, o e presentes. mundo, para nanotecnologia. São diversos
campus da UFMG na Pampulha nem existia. O Marco Legal de CT&I de 2016, que os exemplos de parcerias para desenvol-
Constituía, em 1946, “um grupo de pessoas altera nove leis para fomentar a inovação vimento e transferência de tecnologias,
reunidas no meio do nada”, como descreve no Brasil, foi construído com o auxílio da empreendedorismo e inovação na UFMG.
nossa colega Heloísa Starling, em seu livro UFMG. Esta, por sua vez, exercendo sua A Universidade tem mais de mil pedidos de
Campus UFMG. autonomia, estabeleceu sua política de ino- patentes no Brasil e já celebrou mais de 100
Não ressalto essa diferença entre o Brasil vação para ampliar sua contribuição para contratos de licenciamento de tecnologias
e o mundo para dizer que precisamos de o avanço do sistema nacional de inovação, com empresas, gerando novos produtos,
tempo. É pelo motivo oposto. De 1993 a normatizando, por exemplo, a participação processos e serviços. Importante frisar que,
2014, o número de instituições de pesquisa de professores em spin offs acadêmicas, nos últimos 10 anos, realizou 10 vezes mais
no Brasil saltou de 99 para 492; o de grupos o compartilhamento de sua infraestrutura transferências de tecnologia do que em toda
de pesquisa, de quatro mil para 35 mil; e laboratorial com empresas e a formação sua história pregressa.
o de doutores, de 11 mil para 116 mil. O de alianças estratégicas para uso desses Tudo isso vem sendo construído e con-
Brasil, que, na década de 1950, tinha uma espaços. A Instituição também já iniciou cretizado com a maior celeridade possível
produção científica irrelevante, virou o século uma discussão sobre a criação de identidade à luz das novas leis – em alguns casos até
20 respondendo por 2,7% da produção jurídica própria ao órgão responsável pela se antecipando a elas – que possibilitam
científica mundial (dados de 2010). Esse gestão da inovação na UFMG. A criação de ao país transformar produção científica em
valor merece destaque por ser equivalente uma OS (Organização Social) para abrigar desenvolvimento tecnológico, de forma insti-
à nossa participação na população do pla- esse órgão tem sido estudada como alter- tucionalizada e intensa, graças à autonomia
neta e impressiona porque o número de nativa entre outras configurações jurídicas universitária.
pesquisadores per capita no Brasil chega a permitidas pelo marco legal. Além disso, a
Os cientistas das áreas tecnológicas se
ser 10 vezes menor do que na Europa e nos Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa
sentem hoje como agricultores que prepara-
Estados Unidos. (Fundep) criou um fundo de capital para
ram a terra, fizeram o plantio, cuidaram da
Mas a balança comercial brasileira ain- financiar startups universitárias.
plantação e, estando agora os campos verdes,
da é positiva em itens de baixa intensidade A UFMG sediou, nas últimas décadas, o novo senhor da terra diz que o investimento
tecnológica, como a extração de minério e diversos Institutos de Ciência e Tecnologia foi em vão e que não haverá colheita.
a agropecuária, e negativa em relação aos (INCTs). Alguns deles deram origem a em-
Nós, professores e cientistas brasileiros,
produtos de transformação de média e alta presas, e outros centros de tecnologia foram
que somos classificados em tempo real por
densidade tecnológica. Em razão disso, a instalados no Parque Tecnológico de Belo
organismos internacionais, cuja excelência
universidade está sendo cobrada hoje. Horizonte, localizado em um terreno da
pode ser verificada a qualquer momento na
Apesar de aceitarmos como nossa a UFMG. Também graças à presença da UFMG,
internet, gostaríamos de transmitir um pe-
corresponsabilidade de desenvolver o país, a Belo Horizonte e sua região metropolitana
dido à atual Administração do país: tenham
UFMG e outras instituições têm-se posiciona- são hoje um polo de biotecnologia, com um
mais confiança na nossa ciência, nas nossas
do contra a proposta do Future-se por duas parque tecnológico conhecido como Biotech
instituições e no povo brasileiro.
razões: primeiro, porque o programa aborda Town, instalado próximo à Fundação Dom
a gestão de forma lacunosa, ao permitir a Cabral, uma das maiores escolas de negócios
diluição da autonomia das universidades. do mundo.
Isso parece centralizador, autoritário e até A UFMG e o Centro de Desenvolvimento
contraditório ao discurso de um governo da Tecnologia Nuclear (CDTN) coordenam *Professor titular do Departamento de
dito liberal – não ajuda o fato de a proposta projeto de uma planta-piloto para a produ- Física do ICEx

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2 9.9.2019 Boletim UFMG


Em HONRA do PIONEIRO
Em sua quinta edição, Medalha Mendes Pimentel vai homenagear dez
personalidades que contribuíram para o desenvolvimento da UFMG

S
eis ex-reitores – Jaime Arturo Ramírez, Clélio Campolina Diniz, Tomaz Aroldo da Mota Santos (reitor da UFMG de 1994 a
Ronaldo Tadeu Pena, Ana Lúcia Gazzola, Francisco César de 1998)
Sá Barreto e Tomaz Aroldo da Mota Santos – receberão, nesta Graduado em Farmácia-Bioquímica e doutor em Bioquímica e
segunda-feira, dia 9, a medalha Mendes Pimentel, concedida a Imunologia pela UFMG, com pós-doutorado em Imunologia no
instituições, personalidades ou servidores que se destacaram pela Institut Pasteur, na França. Foi pró-reitor de Extensão (1984-1986),
relevância de sua contribuição à UFMG. A medalha também será diretor do ICB por dois mandatos e reitor pro-tempore da Univer-
entregue aos professores José Israel Vargas e Roberto Assis Ferreira. sidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
Os professores Henrique Cláudio de Lima Vaz (padre Vaz) e Jorge (Unilab) de 2015 a 2016.
Brovetto Cruz receberão homenagem póstuma.
José Israel Vargas
A medalha foi instituída pela Portaria 017, de 28 de março de
2007, alterada pela Portaria 082, de 7 de maio de 2014. Foi entregue Bacharel e licenciado em Química pela UFMG e doutor em Quí-
pela última vez em 2017, durante as comemorações dos 90 anos mica Nuclear pela Universidade de Cambridge, Inglaterra. Iniciou sua
da UFMG. A comenda tem o nome do professor Francisco Mendes carreira docente em 1948 como professor de Física da Faculdade de
Pimentel, primeiro reitor da Universidade. Filosofia da então UMG. Exerceu inúmeros cargos de administração
pública, com atuação essencial na implantação de políticas nas
A cerimônia será realizada no auditório da Reitoria, a partir das
áreas de ciência, energia, planejamento energético e modelagem
19h, em sessão pública dos conselhos Universitário e de Ensino,
da difusão de tecnologia. Foi ministro interino de Minas e Energia
Pesquisa e Extensão (Cepe). Leia a seguir um breve currículo de
e ministro de Ciência e Tecnologia.
cada homenageado.
Roberto Assis Ferreira
Jaime Arturo Ramírez (reitor da UFMG de 2014 a 2018)
Graduado em Medicina (1965) e doutor em Ciências da Saúde
Graduado e mestre em Engenharia Elétrica pela UFMG e doutor
(2000) pela UFMG. É um dos fundadores do Núcleo de Investigação
pelo Imperial College London, onde conquistou o prêmio de Outs-
em Anorexia e Bulimia do Hospital das Clínicas (Niab) e orientador
tanding Research do Electrical & Electronic Engineering Department.
pleno do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde – Saúde
Foi pró-reitor de Pós-graduação de 2003 a 2008 e coordenou pro-
da Criança e do Adolescente, da Faculdade de Medicina.
jetos de cooperação científica com Canadá, França e Japão.
Padre Vaz (homenagem póstuma)
Clélio Campolina (reitor da UFMG de 2010 a 2014)
Foi professor da UFMG de 1964 a 1986. Doutor em Filosofia
Graduado em Engenharia Mecânica e Engenharia de Opera-
pela Universidade Gregoriana, com a tese De dialectica et contem-
ção pela PUC Minas, mestre e doutor em Ciência Econômica pela
platione in Platonis dialogis, que versou sobre a dialética e a intuição
Unicamp, com pós-doutorado na University Of Rutgers, nos EUA.
nos diálogos platônicos da maturidade. Em seus últimos trabalhos,
Foi diretor do Cedeplar, da Face e do Parque Tecnológico de Belo
analisou a realidade sociocultural contemporânea e a crise da mo-
Horizonte (BH-Tec). De março a dezembro de 2014, foi ministro da
dernidade. Morreu em Belo Horizonte, em 2002.
Ciência e Tecnologia.
Jorge Brovetto Cruz (homenagem póstuma)
Ronaldo Tadeu Pena (reitor da UFMG de 2006 a 2010)
Reitor por dois mandatos da Universidad de la República do
Graduado em Engenharia Elétrica pela UFMG, mestre em Enge-
Uruguai, presidente da União das Universidades da América Latina
nharia Biomédica pela UFRJ e doutor em Engenharia Elétrica pela
(Udual) e fundador e secretário-executivo da Associação das Uni-
Universidade do Texas, em Austin. Foi pró-reitor de Planejamento
versidades do Grupo Montevidéu (AUGM). Fora da vida acadêmica,
e diretor da Escola de Engenharia e do Parque Tecnológico de Belo
presidiu a Frente Ampla, coalização de partidos de esquerda que tem
Horizonte (BH-Tec).
governado o Uruguai nos últimos anos, e foi ministro da Educação.
Ana Lúcia Gazzola (reitora da UFMG de 2002 a 2006) Morreu em junho deste ano.
Graduada em Letras pela UFMG, mestre em literaturas
Nilson Marostica | CC BY-SA 3.0
Wikimedia Commons | CC BY 3.0

luso-brasileira e hispano-americana pela University of Nor-


th Carolina at Chapel Hill (EUA) e doutora em literatura
comparada pela mesma instituição. Foi secretária de De-
senvolvimento Social (2010) e de Educação (2011-2014)
de Minas Gerais e diretora do Instituto Internacional de
Educação Superior para a América Latina e o Caribe (Ie-
salc), ligado à Unesco.
Francisco César de Sá Barreto (reitor da UFMG de
1998 a 2002)
Bacharel em Física pela UFMG e mestre e doutor em
Física pela Universidade de Pittsburgh (EUA). Foi pró-
reitor de Pesquisa (1991-1994) e secretário de Educação
Superior do MEC (2002). Atuou na Sociedade Brasileira
de Física (SBF), na Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência (SBPC) e em agências de fomento.
Jorge Brovetto Cruz e Padre Vaz: homenagem póstuma

Boletim UFMG 9.9.2019 3


Pasquale Paolo Cardo | CC BY 2.0
Entrevista / António Costa Pinto

‘TRANSIÇÕES
democráticas tendem a
manter os PRIVILÉGIOS
das elites’
Convidado do programa Cátedras Fundep/IEAT, professor
da Universidade de Lisboa fala sobre modelos de justiça de
transição e os legados dos regimes autoritários do século 20
Ewerton Martins Ribeiro

Nesta semana o senhor ministra potencial influência de legados au-


conferência na UFMG sobre Os legados toritários; quanto mais privilegiados
das transições democráticas . O que [são] os responsáveis autoritários no
significa justiça transicional e legados modo de transição do poder auto-
autoritários? A expressão “justiça de ritário, maior a potencial influência
transição” diz respeito a qualquer de legados autoritários.
transição entre regimes políticos ou se
refere especificamente à transição de E onde entra a justiça de
um regime autoritário para um regime transição nesse processo?
democrático? Costa Pinto - A justiça de tran-
Costa Pinto - A investigação sobre mu- sição envolve uma série de medidas Mural atribuído a Banksy, em Lisboa, alusivo à Revolução
danças de regime, e particularmente sobre tomadas durante o processo de dos Cravos de 1974
transições para a democracia, tem usado, democratização, as quais vão para
cada vez mais, o conceito de legados au- além da mera criminalização da
Contudo, como conjunto de atitudes e deci-
toritários. Embora seja muito difícil medir o elite autoritária e dos seus colaboradores e
sões relativas ao passado autoritário, a justiça
impacto de um legado, e poucos acadêmicos agentes repressivos e implicam igualmente
de transição é, ao mesmo tempo, uma con-
utilizem definições explícitas do que constitui uma grande diversidade de esforços extra-
sequência e uma parte de um processo de
um “legado”, alguns enfatizam as caracte- judiciais para erradicar o legado do poder
mudança de regime. Assim, a bem da clareza
rísticas institucionais e estruturais, enquanto repressivo anterior, tais como investigações
conceitual, deveríamos ligar justiça de
outros sublinham os padrões comportamen- históricas oficiais sobre a repressão dos regi-
transição com democratização; deveríamos
tais. O cientista político Grigore Pop-Eleches mes autoritários, saneamentos, reparações,
situá-la exclusivamente em processos de
definiu legados “como os pontos de partida dissolução de instituições, [instauração de]
transições democráticas, como sublinhou [a
estruturais, culturais e institucionais de uma comissões da verdade, entre outras medi-
jurista] Ruti G. Teitel. A justiça de transição é
ditadura ex-comunista (ou – pode-se acres- das. Nos últimos anos, tanto no mundo
componente de um processo de mudança
centar – qualquer ditadura) no princípio de das ciências sociais como nos think tanks
de regime, cujas diferentes facetas são parte
uma transição”. Um problema importante dos profissionais da reconciliação, o con-
desse processo incerto e excepcional que tem
aqui é como destrinçar legados específicos
lugar entre a dissolução do autoritarismo e a
dos regimes autoritários anteriores de lega- Espanha e Brasil constituíram institucionalização da democracia. Considero
dos históricos tout court, uma vez que o que
se encontra no armário quando as transições exemplos de casos em a justiça de transição como ponto de partida
de uma “política do passado” mais ampla,
abrem as portas das ditaduras é muito mais que seções da direita, que inerente às democracias liberais: um proces-
do que autoritarismo. Num esforço pioneiro
para compreender as ligações entre legados tinham estado associadas, so em desenvolvimento, no âmbito do qual
as elites e a sociedade reveem, negociam
autoritários de direita e a qualidade da de- respectivamente, ao e por vezes se desentendem relativamente
mocracia consolidada, [as cientistas políticas]
Paola Cesarini e Katherine Hite os definem franquismo e à ditadura ao significado do passado autoritário e das
injustiças passadas, em termos daquilo que
como “todos os padrões comportamentais, brasileira, controlaram em esperam alcançar na qualidade presente e
regras, relações, situações sociais e políticas,
normas, procedimentos e instituições quer grande parte o ritmo da futura das suas democracias.
introduzidos quer claramente reforçados transição política Que medidas um processo de justiça
pelo regime autoritário imediatamente ante- transicional precisaria contemplar para
rior” que sobrevivem à mudança de regime, ceito perdeu parte do seu rigor e adquiriu que pudesse ser considerado satisfató-
argumentando que as três variáveis-chave certa elasticidade, ao ponto de se associar rio, tendo em vista o interesse de um
são a estabilidade do regime autoritário an- a todas e a cada uma das decisões – sejam país em se estruturar em uma demo-
terior, a inovação institucional desse regime elas punitivas, de reconciliação ou ambas as cracia funcional?
e o modo de transição. Em outras palavras, coisas, respeitantes ao passado autoritário e/ Costa Pinto - O controle das elites so-
quanto mais estável e institucionalmente ou injustiças passadas – que uma democracia bre a determinação do tempo de transição
inovador [é] o regime autoritário, maior a ou instituição internacional procura impor. e a grande continuidade de elites políticas

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ao longo do processo de transição levam Costa Pinto - No caso português, que to que daria apoio social ideológico para a
transições “por transação”, ou transições foi um processo de democratização por democracia política sem, de certo modo,
“contínuas”, a evitar, em geral, a punição ou ruptura e crise do Estado, com características enfrentar os elementos mais penosos do seu
saneamento das elites autoritárias. Isso cons- pré-revolucionárias, algo muito raro na ter- próprio passado”.
titui, no entanto, apenas uma faceta, uma ceira onda de democratizações, o processo
O que representa, para uma nova
vez que, a par de transições simplesmente de justiça de transição afetou as instituições, democracia, herdar do regime autori-
“impostas” por elites governantes, as tran- a elite, os funcionários públicos e até o se- tário anterior uma parte significativa
sições “pactuadas”, desde 1974, ultrapas- tor privado. A democratização portuguesa da sua classe política?
saram em número as formas historicamente caracterizou-se por uma forte ruptura com
Costa Pinto - A continuação de parcelas
mais comuns de transição democrática. Mas o passado, facilitada pela crise de Estado e
significativas da elite política e da administra-
os tipos de “justiça de transição” foram pela radicalização política, enquanto a nova
ção pública autoritárias no novo regime pode
muito variados. Em trabalhos anteriores, elite política e a sociedade civil pressiona-
ter importantes repercussões numa nova
abordei os criminais, históricos, reparadores, vam para a punição e responsabilização. A
democracia, que fica provida de uma elite
administrativos, institucionais e até uma maior parte das medidas punitivas contra
cuja lealdade ao novo regime democrático
modalidade mais rara, a redistributiva, que os colaboradores mais visíveis e conhecidos
é duvidosa, o que leva, por sua vez, a uma
implica nacionalização e expropriações de foi tomada antes do estabelecimento das
falta de confiança nas novas instituições.
elites econômicas e sociais colaboracionistas instituições democráticas recém-legitimadas,
Isso também mina o apoio social ao novo
com as ditaduras. O que vale a pena destacar e o poder judicial teve um papel menor. Isso
regime, tendo como resultado um senti-
é um problema que tanto as transições pac- incluiu a criminalização do aparelho repres-
mento geral de desconfiança relativamente
tuadas quanto as impostas partilham: am- sivo, sobretudo a polícia política, uma forte
às elites políticas, às instituições e ao Estado
bas têm a tendência de manter inalterados denúncia pública da ditadura, depurações le-
como um todo, por serem identificados com
“privilégios existentes” em vários domínios. gais, a dissolução de instituições, depurações
o autoritarismo e a repressão anteriores.
“selvagens” e a demissão de administradores
Quais as principais diferenças dos Outra dimensão, muitas vezes subestimada
processos transicionais experimentados de empresas privadas, uma ação simbólica
na investigação, é a da construção, pelas
por Brasil e Portugal? e efetiva. Uma forte onda anticapitalista
novas democracias, de uma memória cole-
marcou a transição portuguesa.
Costa Pinto - Portugal e Brasil foram tiva dominante da ruptura com o passado.
dois casos do tipo oposto de democratiza- Como observa [a cientista política] Alexandra
ção, mas os processos de transição demo- Considero a justiça de Barahona de Brito, ao se estabelecer uma
crática nos proporcionam, desde 1945, uma ruptura moral e política com um passado
vasta panóplia de exemplos de punição de
transição como ponto não democrático e repressivo – cuja marca
elites autoritárias. A criminalização e disso- de partida de uma essencial é mudar os limites e padrões de
lução dos partidos e a suspensão temporária inclusão e exclusão social e política –, a voz
dos direitos políticos [dos representantes
“política do passado” das vítimas é legitimada, a repressão é con-
do antigo regime], como nas democracias mais ampla,inerente às denada, os democratas tornam-se os novos
que foram estabelecidas depois da Segunda vencedores, e os antigos opressores, párias.
Guerra Mundial, ou em Portugal em 1974,
democracias liberais: A legitimação democrática leva tempo, e
poderiam ser um dos polos no espectro de um processo em essa “legitimação invertida” pode ajudar a
punição. Espanha e Brasil ficaram no lado estabelecer uma quebra clara com o pas-
oposto, constituindo exemplos de casos em
desenvolvimento, no sado, como salientou o [cientista político]
que seções da direita, que tinham estado âmbito do qual as elites e a latinoamericanista Arturo Valenzuela.
associadas, respectivamente, ao franquis-
mo e à ditadura brasileira, controlaram em
sociedade reveem, negociam
grande parte o ritmo da transição política, e por vezes se desentendem
e a elite – que estava associada com o re-
relativamente ao significado
Arquivo Pessoal
gime anterior – manteve um nível elevado
de poder dentro do regime democrático do passado autoritário
subsequente, nomeadamente em novos
partidos de direita. No caso do Brasil, por
exemplo, quase metade da classe política É possível estabelecer uma relação
pós-transição tinha apoiado o regime militar diretamente proporcional entre a justi-
durante 20 anos. A situação era semelhante ça de transição que os países implemen-
taram e a qualidade das democracias
a algumas das transições democráticas que
que experimentam no presente?
ocorreram na Europa Central e do Leste,
onde setores muito significativos da elite, Costa Pinto - Uma das hipóteses – mui-
e até dos partidos comunistas no poder, tas vezes mais afirmada que demonstrada –
sobreviveram – em alguns casos, não ab- que inicialmente dominou a literatura sobre
dicando das suas convicções; em outros, democratização é a de que a sobrevivência
transformando-se em sociais-democratas e a reconversão de importantes segmen-
moderados. Isso surpreendeu muitos obser- tos das elites autoritárias e a impunidade
vadores contemporâneos, apesar de já existir daqueles que no regime anterior estavam
o exemplo da queda das ditaduras de direita mais ativamente envolvidos na repressão
nos anos 1970 e 1980 para demonstrar a tiveram um impacto pesado na qualidade
que ponto essas elites conseguem adaptar-se das democracias pós-autoritárias. [O cien-
com êxito a uma nova democracia. tista político] Philippe C. Schmitter afirmou
que “é difícil imaginar como uma sociedade António Costa Pinto: continuação das elites
Como se deu a transição portuguesa? pode regressar até um nível de funcionamen- autoritárias gera desconfiança nas instituições

Boletim UFMG 9.9.2019 5


O PLANETA tem LIMITES
Tese da Face revisita a história do Pensamento Econômico-Ecológico, cujo princípio
se baseia na finitude dos recursos naturais e na necessidade de melhor distribuí-los
Teresa Sanches

P
ensamento Econômico-Ecológico “Com base na consciência de que o pla- século 19: socialdarwinistas, tecnocratas e
(PEE) não é um termo comum na neta é finito em termos biofísicos, a análise utopistas ecológicos. Os primeiros aprego-
literatura científica, mas, desde sua de fluxos e estoques de energia e matéria avam que “aqueles que melhor se aproprias-
origem, no século 19, apresenta-se como subsidia a ideia de que os recursos deve- sem desse fluxo energético é que deveriam
argumento em favor de uma mudança riam ser mais bem distribuídos, tendo em sobreviver”; o segundo grupo se fiava no
sistêmica, que se faz necessária e urgente vista a satisfação de necessidades humanas progresso técnico como panaceia para os
no enfrentamento dos desafios sociais e básicas, além da preservação desses recursos problemas sociais; os últimos conjugavam os
ambientais da atualidade. O resgate histórico para suprir carências das gerações futuras”, limites impostos pela realidade biofísica com
e filosófico desse pensamento, regido pelo afirma Marco Franco. Entretanto, o próprio o princípio moral da distribuição equitativa
princípio do respeito aos limites biofísicos do fio da história revela o quanto essa ideia dos recursos naturais.
planeta, é tratado na tese do pesquisador está à margem da economia convencional Na década de 1920, por exemplo, ecó-
Marco Paulo Vianna Franco, defendida na e da própria literatura científica – ela foi logos soviéticos já tratavam de sistemas
Faculdade de Ciências Econômicas (Face). registrada de forma mais abrangente em complexos de organismos vivos e sua re-
Segundo Marco Franco, que elegeu uma única publicação, de 1987, já esgotada lação com os ecossistemas, propondo um
como foco de sua pesquisa o pensamento e sem reedição, do economista ecológico planejamento econômico que respeitasse os
russo e o conceito de utopismo ecológico, espanhol Joan Martinez-Alier. limites da natureza. “É certo que nada disso
os primeiros 50 anos do desenvolvimento foi implementado, pois logo foram silencia-
do PEE, entre 1880 e 1930, já revelavam seu
Suficiência dos pelo regime de Stálin. Mas, antes disso,
fundamento na energética social, combinan- Na década de 1880, surgiram os primei- por um breve período, conseguiram apoio
do diferentes valores, métodos e ideias em ros estudos relacionados ao PEE, que consi- político e criaram grandes reservas naturais,
uma crítica ecológica à economia conven- deravam os processos econômicos com base onde poderiam realizar suas pesquisas e es-
cional. Análogo ao princípio da sustentabi- nos preceitos da energética social. A análise tabelecer os limites para a oferta de recursos
lidade, o PEE se baseia nas ciências naturais, se referia, por exemplo, ao aproveitamento, naturais”, acrescenta.
especialmente na ecologia, para explicar o pelo produtor agrícola, da energia de bio-
O pesquisador também examinou o po-
limite imposto à exploração humana dos massa (energia solar absorvida pelas plantas)
pulismo russo ou “narodnismo”, composto
recursos naturais, associando-se também à e aos custos energéticos de seu próprio
de “revolucionários que queriam depor o
questão do aprovisionamento social, dadas trabalho, do trabalho animal ou de máqui-
czar e defender a comuna camponesa como
às suas implicações para a gestão e distribui- nas. “Era uma análise que buscava explicar
instituição tradicional, mas em total harmo-
ção desses recursos. o funcionamento econômico da agricultura
nia com a natureza”. Essa utopia ecológica,
com base no aproveitamento
tratada com base na obra do pensador Ni-
desses fluxos energéticos. Mas,
Foca Lisboa | UFMG

kolai Chernyshevskii, que ganhou destaque


nesse caso, devido ao caráter
na tese de Marco Franco, considera que o
finito dos processos, a ideia
progresso tecnológico deve ser complemen-
de eficiência foi combinada ao
tar à reforma social, à emancipação humana
conceito de suficiência, ou seja,
e a ideais sociais igualitários.
da satisfação de necessidades
humanas básicas. Em oposição Herdeiro dessas ideias no século 21, o
à concepção defendida pela “neonarodnismo ecológico” faz a junção
economia convencional, a entre a economia política e a ecologia polí-
atenção se volta, cada vez mais, tica, remetendo a movimentos de base em
para a escala, por entender-se favor de uma mudança sistêmica ancorada
que, por mais que sejamos na justiça ambiental. Esses movimentos hoje
eficientes, em algum momento encontram eco em organizações campone-
esbarraremos nos limites im- sas espalhadas pelo mundo.
postos pela natureza. Avanços
tecnológicos poderiam esten-
der esses limites, porém há um
alto grau de incerteza quanto
ao seu sucesso”, pondera Mar-
co Franco.
Essas ideias ganharam es- Tese: Ensaios sobre História e Filosofia do
paço principalmente em países Pensamento Econômico-Ecológico
de língua alemã e russa. Com Autor: Marco Paulo Vianna Franco
a consolidação e difusão das Defesa: abril de 2019
leis da termodinâmica para as
ciências sociais, grupos de três Orientador: Hugo Eduardo Araujo da
correntes teóricas dentro do Gama Cerqueira
Marco Franco: junção da economia com a ecologia PEE distinguiam-se no fim do Co-orientador: João Antonio de Paula

6 9.9.2019 Boletim UFMG


Acontece Resoluções

desastres e
RESOLUÇÃO No

Divulgação | CAU-RJ
desenvolvimento
A relação entre o modelo econô-
03/2019, DE 27 DE
mico brasileiro e grandes desastres, AGOSTO DE 2019
como os de Mariana e Brumadinho,
será debatida em palestra na quinta- Aprova a criação do Curso de Pós-
graduação em Promoção de Saúde,
feira, 12 de setembro, às 19h, no
em nível de Doutorado, de interesse
auditório 1 da Face, campus Pampu-
da Faculdade de Medicina.
lha. O encontro será conduzido pelo
sociólogo, economista e professor
O CONSELHO UNIVERSITÁRIO
da Universidade Federal do Rio de Ja- Carlos Vainer é professor da UFRJ
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS
neiro (UFRJ) Carlos Bernardo Vainer.
GERAIS, no uso de suas atribuições estatutárias
Vainer é referência em estudos que correlacionam a economia e a ocorrência de e regimentais, considerando a decisão de 11 de
grandes desastres. Ele integra o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Re- junho de 2019 do Conselho de Ensino, Pesquisa
gional (IPPUR) da UFRJ e lidera o Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza e Extensão e o Parecer nº 08/2019 da Comissão
(ETTERN), onde dirige a Rede de Observatório de Conflitos Urbanos. de Legislação, resolve:
O evento, aberto ao público externo, é uma iniciativa do programa Participa UFMG. Art. 1o Aprovar a criação do curso de pós-
As inscrições podem ser feitas até 11 de setembro, por formulário eletrônico (https:// graduação em Promoção de Saúde, em nível de
aplicativos.ufmg.br/conhecimento/atividades/userlogin/login). Doutorado, de interesse da Faculdade de Medici-
na, conforme o Processo n° 23072.019995/2018-71.
Art.  2o A presente Resolução entra em
sarampo
vigor nesta data.
Até a próxima sexta, 13 de setembro, a comunidade do campus Pampulha terá à
disposição postos de vacinação contra o sarampo. A cada dia, uma unidade recebe
equipe de vacinação, das 9h às 12h e das 13h às 17h. No posto do Departamento de Professora Sandra Regina Goulart Almeida
Atenção à Saúde do Trabalhador (Dast), a vacina é aplicada todos os dias, das 18h às Presidente do Conselho Universitário
21h (no dia 13, também nos horários diurnos).
O sarampo é evitável pela vacina tríplice viral. A campanha, promovida pela Secretaria de
Saúde de Belo Horizonte, UFMG e Casu, visa ampliar a cobertura vacinal entre pessoas de
15 a 49 anos. É necessário levar cartão de vacina, se houver, e documento de identidade. RESOLUÇÃO
9/9: Escola de Belas Artes e Dast |10/9: Fafich e Dast | 11/9: Faculdade de Educação COMPLEMENTAR No
e Dast 12/9: Escola de Veterinária e Dast | 13/9: Dast
03/2019, DE 27 DE
AGOSTO DE 2019
escala docente
Aprova a criação do Departamento de
Estão abertas as inscrições para a Chamada do Programa Escala Docente 2019-2020 Gestão em Saúde (GES), a partir do
da Associação de Universidades Grupo Montevidéu (AUGM). A iniciativa é destinada à mo- desmembramento do Departamento
bilidade de professores das instituições participantes do Grupo. de Enfermagem Aplicada (ENA), da
Podem se candidatar servidores docentes efetivos da UFMG com interesse em mo- Escola de Enfermagem da UFMG.
bilidade nos âmbitos do ensino, da pesquisa, da extensão ou da gestão universitária.
Há 10 vagas em instituições como as universidades de Buenos Aires, na Argentina, e O CONSELHO UNIVERSITÁRIO
La República, no Chile. A UFMG custeará as passagens dos professores selecionados se DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS
houver disponibilidade orçamentária. As universidades de destino são responsáveis pelo GERAIS, no uso de suas atribuições estatutárias
alojamento e despesas de manutenção. e regimentais, considerando a decisão de 9 de
As inscrições devem ser feitas até 2 de outubro. A chamada pode ser acessada no abril de 2019 do Conselho de Ensino, Pesquisa e
site da DRI (https://bit.ly/2lUxjJq). Extensão e o Parecer nº 10/2019 da Comissão de
Legislação, resolve:
Art.  1o Aprovar a criação do Departa-
questionário do enade
mento de Gestão em Saúde (GES), a partir do
Composto de questões sobre o perfil socioeconômico e acadêmico dos participantes desmembramento do Departamento de Enferma-
do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) de 2019, o Questionário do gem Aplicada (ENA), da Escola de Enfermagem,
Estudante já pode ser preenchido pelos inscritos. As questões referentes à organização conforme o Processo nº 23072.056504/2017-92.
didático-pedagógica, à infraestrutura e a oportunidades de ampliação da formação
Art.  2o  Revogam-se as disposições em
acadêmica e profissional do concluinte têm forte influência (15%) no Conceito Preliminar
contrário.
de Curso (CPC). 
Art.  3o A presente Resolução entrará
“É muito importante valorizar os aspectos positivos da formação.  O resultado al-
em vigor na data de sua publicação no Boletim
cançado no Enade atesta ao país e ao mercado de trabalho a qualidade do curso, da
Informativo da UFMG.
universidade e do diploma”, afirma a professora Viviane Birchal, diretora de Avaliação
Institucional, em comunicado aos inscritos.
Para preencher o questionário, o estudante deve acessar o endereço http://enade. Professora Sandra Regina Goulart Almeida
inep.gov.br/enade/#!/index. Todas as questões devem ser respondidas. Presidente do Conselho Universitário

Boletim UFMG 9.9.2019 7


SENTIDOS do PRESENTE
Verbetes reunidos em “indicionário” da Editora UFMG ajudam a pensar
questões contemporâneas nos campos da literatura e das artes
Ewerton Martins Ribeiro

C
onforme preconizam os dicionários de semiótica, um índice presente, um modo crítico de lidar com o nosso tempo” – é um
é um signo que se caracteriza por uma relação de “contigui- dos verbetes trazidos pelo volume: nele, faz-se uma reflexão sobre
dade natural”: fala-se de índices quando o que desperta a as “práticas e noções artísticas e críticas marcadas pela heteroge-
atenção dá a conhecer outra coisa com a qual mantém uma relação neidade, expansividade, inespecificidade” próprias do nosso tempo.
indicativa – o latido de um cão, por exemplo, indica a presença ou Em relação ao conceito de “comunidade”, os autores partem
a existência do animal. dos “problemas causados pelos nacionalismos do século XX” para
Recentemente, a Editora UFMG lançou um livro que reúne um estimular reflexão sobre as formas de sociabilidade próprias do con-
conjunto de ensaios – ou, nas palavras dos organizadores, um con- temporâneo que problematizam as “noções de sujeito e indivíduo,
junto de “verbetes indiciais” – sobre o contemporâneo: organizada nação e povo” e têm-se estabelecido “de modo coletivo, horizontal,
como um glossário robusto, a obra traz “conceitos que incidem de sem passar pelas instituições tradicionais (partidos, sindicatos etc.)”,
modo decisivo sobre o pensamento das artes e literatura atuais” e for- “sem planos programáticos”. Já a noção de “arquivo” é caracteri-
mam o imaginário público contemporâneo relativo aos seus campos. zada face ao diálogo que se estabelece entre a ideia de público e
Indicionário do contemporâneo é privado, num jogo que “se situa
resultado da empreitada de 14 pesqui- entre a ‘casa’ e o ‘museu’, entre o
sadores brasileiros e estrangeiros que nome íntimo e o nome público”,
se propuseram a escrever e editar um um jogo que “não se define tanto
livro inteiro em colaboração: todos os por aquilo que guarda, mas pela
seis verbetes reunidos na obra – “ar- relação que um sujeito mantém
quivo”, “comunidade”, “endereça- com esses objetos, imagens, pa-
mento”, “o contemporâneo”, “pós- lavras”.
autonomia” e “práticas inespecíficas” Ao tratarem do conceito de
Raphaella Dias | UFMG

– foram produzidos coletivamente, em “endereçamento”, os autores o


um processo que durou quatro anos. abordam relativamente aos cam-
“Este Indicionário supõe, antes que pos da poesia, da arte, da política
nada, insubordinação, insatisfação, e da filosofia, tomando-o como
inquietação, independência... Mas chave para pensar, entre outras
supõe, sobretudo, um infinito e infi- Exemplares da obra na Livraria UFMG, na Praça de Serviços coisas, a “questão do relacional e
nitivo desejo de ler, falar, ver, fazer e do comunitário” e os “modos de
viver junto, de parte de um in-certo grupo: um desejo de convívio e viver juntos” nos dias de hoje. Em “práticas inespecíficas”, abor-
de comunidade enquanto amizade, conversa e conflito em distintas dam a instabilidade crescente vivida pelas práticas estéticas latino-
paisagens americanas”, escrevem os organizadores. americanas contemporâneas, contexto em que as fronteiras entre
as diferentes disciplinas artísticas parecem se dissipar.
Verbetes indiciais Pós-autonomia é uma noção difusa e experimental que diz
Em razão de seu discurso direto e didático, os verbetes fun- respeito ao regime de leitura instaurado na contemporaneidade e
cionam como introduções fundamentadas e não extensivas aos a um conjunto de narrativas típicas do nosso tempo. Elas transitam
conceitos de que tratam, tendo por recorte a sua relação com entre diferentes gêneros e se posicionam tanto dentro quanto fora
os campos da literatura, das artes e da estética. A própria ideia do que tradicionalmente se considera literatura e ficção.
substantiva de “contemporâneo” – “uma dobra reflexiva sobre o
Indicionário do contemporâneo ainda traz um posfácio de Raúl
Antelo, professor de literatura da Universidade Federal de Santa
Livro: Indicionário do contemporâneo Catarina (UFSC), sobre o “espaçotempo”, conceito definido pelo
Organização: Celia Pedrosa, Diana Klinger, Jorge filósofo Robert DiSalle como “contínuo tetradimensional que com-
Wolff e Mario Cámara bina as três dimensões do espaço com o tempo para representar
Edição: Editora UFMG geometricamente o movimento”. Em seu texto, Antelo discute a
teoria da autonomia no campo da estética e retoma a definição de
263 páginas / R$ 47
DiSalle para pensar a arte e a literatura à luz desse conceito.

Reitora: Sandra Regina Goulart Almeida – Vice-reitor: Alessandro Fernandes Moreira – Diretora de Divulgação e Comunicação Social: Maria Céres Pimenta
EXPEDIENTE

Spínola Castro – Editor: Flávio de Almeida (Reg. Prof. 5.076/MG) – Projeto Gráfico: Marcelo Lustosa – Diagramação: Guilherme Martins – Revisão: Cecília de
Lima e Josiane Pádua – Impressão: Imprensa Universitária – Circulação semanal – Endereço: Diretoria de Divulgação e Comunicação Social, campus Pampulha,
Av. Antônio Carlos, 6.627, CEP 31270-901, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil – Telefone: (31) 3409-4184 – Internet: http://www.ufmg.br e boletim@cedecom.
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8 9.9.2019 Boletim UFMG

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