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Acórdãos TCAS Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul

Processo: 02639/08
Secção: CT-2ºJUÍZO
Data do Acordão: 25-11-2008
Relator: JOSÉ CORREIA
Descritores: -IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
NATUREZA JURÍDICA DA TAXA DE PUBLICIDADE.
Sumário: I) -O tributo designado por taxa de publicidade tem a natureza jurídica de
imposto (por inexistência de nexo sinalagmático) quando a publicidade é afixada
em suportes instalados em propriedade privada.

II) -Aquele tributo apenas configura uma taxa quando a quantia paga à entidade
pública representa a contrapartida da remoção de um obstáculo à utilização de
um bem público ou semi -público.

III) -Em consequência, enfermam de inconstitucionalidade, por violação das


normas constantes dos arts. 106º n° 2 e 168°, n° l, al. i) CRP as normas
regulamentares editadas pelas autarquias locais que constituem o fundamento
jurídico da criação e cobrança daquele tributo (licença para publicidade afixada
em propriedade privada).
Aditamento:
1
Decisão Texto Acorda-se, em conferência, na Secção de
Integral:
Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal
Central Administrativo Sul:

1. -A CÂMARA MUNICIPAL DE O..........., interpõe


recurso jurisdicional, para este Tribunal, da sentença
de fls. 164 a 172 que julgou procedente a
impugnação deduzida por L........ - .............., S.A. e,
consequentemente, determinou a anulação das taxas
de publicidade impugnadas, relativas aos meses de
Outubro, Novembro e Dezembro de 2006, concluindo
assim as suas alegações :
I -Nos termos do artigo 4° n° 2 da Lei Geral
Tributária taxa define-a como a contrapartida pela
prestação de um serviço público ou pela remoção de
um obstáculo jurídico ao comportamento dos
particulares;
II -Nos termos do n° 2 do artigo 1° da Lei 97/88 de
17 de Agosto compete às Câmaras Municipais
licenciar a publicidade feita por particulares como
salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental;
III -Tal pedido é analisado pelos serviços
competentes do Município;
IV - O estudo e análise por parte da Câmara
Municipal se o anúncio pretendido pelo particular não
colide com o equilíbrio urbano e ambiental e a
emissão da respectiva licença de publicidade ou seja
a remoção de um obstáculo jurídico à afixação da
publicidade constitui a contraprestação ou sinalagma
por banda das Câmaras Municipais;
V - Por outro lado a taxa cobrada constitui uma
contraprestação da utilização de bens do domínio
público traduzida no facto de o anúncio transmitir
uma mensagem publicitária para a via pública;
VI - São os Municípios que estabelecem as regras de
licenciamento de publicidade, nos termos da Lei
97/88 de 17 de Agosto;
VII - Podendo criar taxas para esse efeito, Lei 53 -
E/2006 de 29 de Dezembro;
VIII - Pelo que o Tributo impugnado é uma
verdadeira taxa e não um imposto;
IX - Ao declarar o contrário violou o Tribunal a quo a
Lei Geral Tributária nomeadamente o seu artigo 4° n°
2 bem como a Lei 97/88 de 17 de Agosto;
X - Pelo que deveria o Tribunal a quo ter declarado a
existência do sinalagma vertido na remoção de um
obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares
tendo a final sido indeferida a impugnação
apresentada.
Termos em que deve a Sentença recorrida ser
revogada e substituída por outra que condene a
Recorrida no pagamento da taxa.
Houve contra alegações em que a recorrida sustenta
a manutenção do julgado.
O EPGA junto desta instância emitiu parecer no
sentido da improcedência do recurso.
Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir.
*
2. - Na sentença recorrida fixou-se e motivou-se o
seguinte probatório:
A) A L.............-.........., S.A foi notificada dos actos
de liquidações das taxas devidas pela afixação de um
anúncio de cariz publicitário, mediante avisos/recibos
emitidos pela CM de O......, com os n.°s 3980, 4135
e 4282, respeitantes aos meses de Outubro,
Novembro e Dezembro de 2006, no montante de €
2.096,25. (Doc.n.°s l, 2 e 3 junto à p.i.)
B) O anúncio publicitário referido na al. A) do
probatório, com a área de 559m2, foi afixado na
fachada no imóvel - Edifício P......... - sito na Rua
................, em M...... propriedade da impugnante.
(acordo)
C) Em 8.02.2007, por despacho proferido pelo
Presidente da CM de O......... foi indeferida a
Reclamação deduzida pela Impugnante contra as
liquidações referidas na al. A) do probatório. (Doc.
n.° 4 junto à p.i.)
D) A Impugnante foi notificada despacho referido na
al. C) em 15.02.2007. (Doc. n.° 4 junto à p.i.)
*
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração
dos factos provados na análise dos documentos
integrados nos presentes autos.

FACTOS NÃO PROVADOS


Inexistem outros factos sobre que o Tribunal deva
pronunciar-se já que as demais asserções da douta
petição integram antes conclusões de facto e/ou
direito.
*
3.- Perante esta factualidade e aquelas conclusões
delimitativas do objecto do recurso, cabe determinar
a sorte deste.
A sentença recorrida julgou-se a impugnação
improcedente com a seguinte fundamentação:
“ (…)
Antes de mais, importa consignar, que o processo
judicial tributário e designadamente a impugnação
judicial é uma garantia dos contribuintes pelo que o
seu direito não é sequer renunciável a não ser nos
casos previstos na lei (cfr. art. 96°, n° l da LGT).
O memo diploma legal apenas prevê como forma de
renúncia a expressa, já que a renúncia só é válida se
constar de declaração expressa ou outro instrumento
formal.
Não tendo assim a Impugnante renunciado
expressamente ao direito de impugnação, cai em
toda a linha a argumentação produzida pela Câmara
Municipal de O........ em torno da falta de
"legitimidade " da Impugnante quer para reclamar
quer para impugnar as liquidações ajuizadas.
O entendimento propugnado alinha com a
jurisprudência maioritária do Supremo Tribunal
Administrativo que deve ser mantida pela excelência
da sua fundamentação (entre outros: Acórdãos STA
de 22.11.2000 - Recurso n° 25.343, 13.03.2002 -
Recurso n° 26.283, de 04.12.2002 - Recurso n°
1.470/02, 07.05.2003 - Recurso n° 1.668/02 e de
21.01.2004 - Recurso n° 1.656/03).
Prosseguindo.
Está em causa nestes autos a questão de saber se o
tributo sindicado que foi liquidado à Impugnante
referente a anúncio publicitário afixado na fachada no
imóvel - Edifício P........ - sito na Rua .............., em
M...... propriedade da impugnante tem a natureza de
imposto cuja criação ofenda os arts. 103°, n.°2 e
165, n° l, al. i) da Constituição da República
Portuguesa ou, ao invés, se trata de uma taxa.
Assim a solução reclamada pela questão
controvertida tem de se ancorada no Regulamento de
Taxa e Outras Receitas da CM de O........, relevando
particularmente ao tema decidendo o art. 33° do
referido diploma.
Estatui o citado normativo que: "As taxas de licença
de publicidade são devidas sempre que os anúncios
se divisem da via pública."
Como se cré pacífico, a questão colocada nestes
autos é uma questão largamente tratada na
jurisprudência quer do Tribunal Constitucional quer
do Supremo Tribunal Administrativo nomeadamente
nos doutos Acórdãos citados pela Impugnante na
petição inicial quer no Douto Parecer do Digno
Magistrado do Ministério Público constantes dos
autos.
Com efeito, o Ac. do Pleno do STA de 18/05/05,
tirado no processo n.° 01176/04 e no qual sele:
(...) O Tribunal Constitucional tem destilado
Jurisprudência sustentando que:
-o tributo designado por taxa de publicidade tem a
natureza jurídica de imposto (por inexistência de
nexo sinalagmático) quando a publicidade é afixada
em suportes instalados em propriedade privada.
-aquele tributo apenas configura uma taxa quando a
quantia paga à entidade pública representa a
contrapartida da remoção de um obstáculo à
utilização de um bem público ou semi-público
(acórdãos 312/92; 558/98, 29.09.98 DR n°261, II
Série 12.11.98; 63/99 2.02.99 DR n.° 76 II Série
31.03.99; 32/2000, 12.01.2000DR n.° 57IISérie
8.03.2000).
-em consequência, enfermam de
inconstitucionalidade, por violação das normas
constantes dos arts.106.0 n.° 2 e 168.°, n.° l, ai i)
CRP RC/82 as normas regulamentares editadas pelas
autarquias locais que constituem o fundamento
jurídico da criação e cobrança daquele tributo (licença
para publicidade afixada em propriedade privada)."
Na verdade a distinção entre imposto e taxa assenta
na unilateralidade ou bilateral idade dos tributos pois
que enquanto o imposto tem estrutura unilateral, a
taxa caracteriza-se pelo seu carácter bilateral e
sinalagmático assumindo tal diferenciação quer a
doutrina quer a jurisprudência.
E, de tal distinção resulta, a afirmação do carácter
sinalagmático das taxas, o que implica reconhecer
que a sua estrutura supõe a existência de uma
correspectividade entre a prestação pecuniária a
pagar e a prestação de um serviço pelo Estado ou por
outra entidade pública, contrapartida essa que foi
expressamente acolhida no n.° 2 do art. 4° da Lei
Geral Tributária ao afirmar a "As taxas assentam na
prestação concreta de um serviço público, na
utilização de um bem do domínio público ou na
remoção de um obstáculo jurídico ao
comportamentos dos particulares".
Tal relação sinalagmática entre a contrapartida e o
montante a pagar não pode deixar de ter um carácter
substancial ou material, e não meramente formal o
que não implica, porém, que se exija uma
equivalência económica rigorosa entre ambos, não
sendo incompatível com a natureza sinalagmática da
taxa o facto de o seu montante ser "superior" (e,
porventura, até consideravelmente superior) ao custo
do serviço prestado, contudo o que não pode é
ocorrer uma "desproporção intolerável", ou seja,
"manifesta" e comprometedora, "de modo
inequívoco, da correspectividade pressuposta na
relação sinalagmática, devendo a respectiva aferição
tomar em conta, não apenas o valor da quantia a
pagar, mas também a utilidade do serviço prestado.
Ora, o anúncio a que se referem os presentes autos
não foi colocado em espaço público (al. B) do
probatório) e não se mostra prestada qualquer
contrapartida por parte da Câmara Municipal à
Impugnante pois que, como refere o TC, Ac. n.°
313/92 de 6 de Outubro, Proc. 435/91, e reafirmou
no Ac. n.° 453/03 de 14 de Outubro, Proc. 410/03,
"mesmo nas hipóteses em que a actividade dos
particulares sofre uma limitação, aqueloutra
actividade estadual, consistente na retirada do
obstáculo à mencionada limitação mediante o
pagamento de um tributo, é vista pela doutrina como
a imposição de uma «taxa» somente desde que tal
retirada se traduza na dação de possibilidade de
utilização de um bem público ou semi-público".
Daí que seja de concluir, que não havendo qualquer
oneração especial de um serviço público, nem
qualquer utilização de um bem público ou semi-
público, dado que o local pertence a particulares, terá
que considerar-se o tributo em causa como um
imposto.
Neste sentido se tem pronunciado o TC em casos
semelhantes aos dos presentes autos e
nomeadamente nos Ac. n.° 558/98 de 29 de
Setembro, Proc. 240/97, n.° 63/99 de 2 de Fevereiro,
Proc. 513/97, n.° 32/00 de 12 de Janeiro, Proc.
104/99, n.° 437/03 de 30 de Setembro, Proc.
540/02, n.° 453/03 de 14 de Outubro, Proc. 410/03,
n.° 34/04 de 14 de Janeiro, Proc. 33/03) e n.°
109/04 de 11 de Fevereiro, Proc. 409/03.
E na verdade, conforme se escreveu no referido Ac.
do TC n.° 32/00 de 12 de Janeiro, Proc. 104/99,
estando em causa a afixação de um reclamo e de um
friso luminosos nas fachadas de um prédio urbano tal
afixação não constitui qualquer «ocupação»
minimamente relevante do «espaço público».
Assim é de concluir que as taxas de publicidade,
questionadas nos presentes autos e cobradas pela
Câmara Municipal de O.........., relativamente à
afixação de um cartaz, com 559m2, em prédio
particular (da Impugnante) de, sejam de qualificar
como impostos estando a sua criação, através de
diploma não legislativo, ferida de
inconstitucionalidade por violar o preceituado nos art.
103.°, n.° 2, e 165.°, n.° l, alínea i), da Constituição
da República Portuguesa.
Por isso, a liquidação do tributo em causa enferma de
ilegalidade, pelo que se justifica a sua anulação
atento o disposto no art. 135° do CPA.”
Nenhuma censura nos merece o assim fundamentado
e decidido também com base no douto parecer do
EPGA do seguinte teor:
“O Município de O......... vem recorrer da douta
sentença de fls. 164 a 172 que julgou procedente a
impugnação deduzida por L..........-..........., S.A. e,
consequentemente, determinou a anulação das taxas
de publicidade impugnadas, relativas aos meses de
Outubro, Novembro e Dezembro de 2006.
Sustenta nas conclusões da sua Alegação que o
tributo impugnado é uma verdadeira taxa e não um
imposto, que ao declarar o contrário violou o Tribunal
"a quo" a LGT, nomeadamente, o seu art. 4°, n° 2,
bem como a lei 97/88, de 17 de Agosto; que o
Tribunal "a quo" deveria ter declarado a existência de
sinalagma vertido na remoção de um obstáculo
jurídico ao comportamento dos particulares...
A impugnante L.........-............, S.A. sustenta, por
seu turno, na Contra-Alegação que produziu, a
manutenção do julgado.
Creio que o presente recurso não merece provimento
já que, como vem referido na douta sentença
recorrida no antecedente parecer de fls. 161 e 162, a
questão a decidir é matéria já apreciada pela
jurisprudência quer do Tribunal Constitucional quer
do STA sendo presentemente pacifica a doutrina de
que o tributo cobrado pela afixação de publicidade
em propriedade privada tem a natureza de imposto e
não de taxa, sendo inconstitucionais as normas a
coberto das quais tais tributos são cobrados.
É o caso, nomeadamente, do recente Ac. do STA de
30.04.2008, in Proc. n° 0206/08, onde a propósito da
suscitada questão da existência de sinalagma
traduzido na remoção de um obstáculo jurídico ao
comportamento dos particulares se diz
designadamente o seguinte:
"...como se assinala no acórdão do STA de 15 de
Fevereiro de 2007 -recurso n.° 0739/06, "quando em
causa se encontra a terceira daquelas situações
(rememore-se, a que consiste no levantamento do
obstáculo jurídico ao exercício de determinada
actividade por parte do tributado), defende a
doutrina que o encargo pela remoção - in casu, a
concessão de licenciamento para a afixação ou
inscrição de publicidade - só pode configurar-se como
'taxa' se com essa remoção se vier a possibilitar a
utilização de um bem semi-público (vide autores por
último citados e Sousa Franco in Finanças Públicas e
Direito Financeiro, 4ª ed., vol. 1, 33, que, em vez de
bens semi-públicos, fala de bens colectivos, quer
públicos ou privados de uma perspectiva de provisão
pública, quer de bens colectivos impuros).
Neste contexto, e não olvidando que a norma sub
specie se reporta a painéis publicitários afixados ou
inscritos, não em quaisquer bens ou locais públicos
ou semi-públicos, mas sim em veículos de transporte
colectivo ou em veículos particulares (e são desta
última espécie os veículos da recorrida), não se
lobriga, por um lado, que forma de utilização de um
bem semi-público esteja em causa e, por outro, que
o ente tributador venha a ser constituído numa
situação obrigacional de assumpção de maiores
encargos pelo levantamento do obstáculo jurídico.
Por outro lado, como ali também se diz, "..., apesar
de, inicialmente, no momento em que é autorizada a
colocação dos anúncios haver uma contrapartida do
Município consubstanciada na actividade destinada a
verificar se eles respeitam o equilíbrio urbano,
ambiental e paisagístico e, designadamente, os
critérios de licenciamento definidos nos arts. 3° e 4°
da Lei n° 97/88, de 17 de Agosto -à semelhança do
que sucede com o controle da verificação das
condições de licenciamento de qualquer construção -,
essa actividade é desenvolvida apenas no momento
da instalação dos anúncios - também à semelhança
do que sucede com o licenciamento de qualquer
construção - e não da renovação da licença, que se
concretiza automaticamente. Por isso, não se pode
ver uma relação de correspectividade entre essa
actividade de natureza momentânea e um tributo que
é cobrado anualmente, sem qualquer novo
procedimento de licenciamento, a título de renovação
de licença.
Também não pode ver-se uma contrapartida nos
deveres gerais de polícia exercidos pelo Município,
pois essa actividade visa salvaguardar a tranquilidade
e segurança da generalidade dos cidadãos, não
constituindo um serviço individualizado prestado ao
proprietário do imóvel em que é afixada publicidade.
Essencialmente neste sentido, pode ver-se o acórdão
do Tribunal Constitucional n° 109/2004, de
11/02/2004, proferido no processo n° 409/2003."
Os tributos em causa têm, pois, de qualificar-se como
impostos que, nos termos dos artigos 103, n.° 2, e
165°, n° 1, alínea i), da Constituição, só podem ser
criados por acto de natureza legislativa, inserindo-se
a sua criação na reserva relativa da competência
legislativa da Assembleia da República, pelo que só
por esta podem ser criados (ou pelo Governo com
base em autorização legislativa)."
Termos em que, aderindo inteiramente à
fundamentação da sentença e aos reforços
doutrinários e jurisprudenciais citados no douto
parecer do MP junto desta instância, Pronuncio-me,
improcede o recurso devendo a sentença recorrida
manter-se na ordem jurídica.
*
4.- Termos em que se acorda negar provimento ao
recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.


*
Lisboa, 25/11/2008
(Gomes Correia)
(Eugénio Sequeira)
(Lucas Martins)

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