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Antecedentes
1
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Tomo II, Direito
Constitucional Português, 6ª Edição Revista e ampliada, Coimbra Editora, 1972, p. 490-491.
1
sedimentada2. Na imprensa da época, pode ler-se a satisfação com que foi recebida a
nova da elaboração de um projecto de Constituição, que foi mesmo apelidada de
“notícia sensacional”3.
Processo de elaboração
2
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p.
3
Cfr. Diário de Notícias, 9 de Janeiro de 1932.
4
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Tomo II, Direito
Constitucional Português, 6ª Edição Revista e ampliada, Coimbra Editora, 1972, p. 492.
5
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p.
2
registo da participação nos trabalhos preparatórios de juristas como Mário de
Figueiredo, Martinho Nobre de Melo, Manuel Rodrigues e José Alberto dos Reis6.
O projecto conheceu várias versões, que foram sendo alteradas em função das
opiniões de algumas personalidades auscultadas e dos debates tidos em Conselho de
Ministros. Salazar parece ter tido o cuidado de auscultar as diversas sensibilidades
políticas da época, em particular as representadas no Conselho Político Nacional, órgão
consultivo criado em 1931, que emitia parecer em assuntos de política e administração
de superior interesse público. Era constituído por titulares de vários cargos públicos
(entre os quais o Presidente da República, que presidia) e ainda por onze membros
nomeados pelo Chefe de Estado. Este órgão parece ter sido importante, não só porque a
sua composição consistia num compromisso entre Salazar e o então Presidente da
República Óscar Carmona, mas também, e sobretudo, porque nele se encontrava
representada uma facção militar republicana que, embora não defendendo o regresso à
ordem política anterior, era francamente liberal e democrática. Entre os seus membros
contavam-se José Vicente de Freitas, autor do chamado “contraprojecto constitucional”
(ver caixa), Abílio Passos e Sousa e Daniel de Sousa7.
6
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p.
7
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p. 24.
8
Cfr. “Projecto da Nova Constituição Política do Estado “, in Diário de Notícias, 28 de Maio de 1932.
3
génio português”. Desenhavam-se já, assim, as traves mestras da ideologia do Estado
Novo.
9
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Tomo II, Direito
Constitucional Português, 6ª Edição Revista e ampliada, Coimbra Editora, 1972, p. 494.
4
Queria-se uma Constituição ampla, que regulasse de maneira extensa e completa
todos os elementos fundamentais da vida do país, e não apenas “a enunciação das
garantias individuais e a definição dos poderes do Estado”. Pela primeira vez, aliás,
foram incluídas num texto constitucional matérias de carácter social e económico,
tendo-lhes sido dado bastante relevo, e tendo-se procedido à sua sistematização “com
método e clareza” e não acidentalmente como antes sucedera.
Processo de aprovação
Na véspera do acto eleitoral, o Governo apelou ao voto, afirmando que cada voto
favorável significava o repúdio da “cumplicidade com todos os agentes da desordem, da
10
Cfr. Diário de Notícias, 25 de Fevereiro de 1933.
11
Cfr. Diário de Notícias, 16 de Março de 1933
5
revolução e da ruína portuguesa”, no sentido da “reorganização, estabilidade e
progresso do País”12
A Constituição foi aprovada por cerca de 60% dos eleitores, tendo havido menos
de 5% de votos desfavoráveis. Foram anunciados resultados de 1.292.864 votos a
favor, e 6190 votos contra, num universo de cerca de 1.330.25815. Considerou-se, assim,
ter havido uma taxa de aprovação do texto constitucional superior a 95%, uma vez que a
abstenção foi contabilizada como “a favor do Governo”16, ou seja, como tendo dado
tacitamente voto concordante ao projecto.
12
Cfr. Diário de Notícias, 18 de Março de 1933
13
Cfr. António de Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p. 249.
14
O Notícias Ilustrado, 26 de Março de 1933.
15
O Diário de Notícias, 10 de Abril de 1933.
16
O Diário de Notícias, 20 de Março de 1933.
6
A Nação não se confunde com o povo. É, sim, uma entidade social histórica
distinta. Assim, a soberania nacional, “não se confunde com a soberania popular,
porque esta assenta na manifestação de vontade do povo interpretada pelos eleitores,
enquanto aquela existe mesmo quando interpretada, e até adivinhada, pelos homens de
escol, que sabem dar consciência a tendências latentes, mas ignoradas ou passivas no
seio da sociedade”17. Deste modo, e embora não se considerasse a soberania popular
como incompatível com a soberania da Nação, aquela não constituía, de forma alguma,
um elemento indispensável. Este é, aliás, um primeiro indício do carácter
antidemocrático do Estado Novo.
Quanto ao território nacional, era definido, nos termos do art. 1º, como “aquele
que actualmente [a Portugal] pertence”, compreendendo, além do continente e dos
arquipélagos dos Açores e da Madeira, os territórios ultramarinos de África (Cabo
Verde, Guiné, S. Tomé e Princípe, S. João Baptista de Ajudá, Cabinda, Angola e
Moçambique), Ásia (Estado da Índia e Macau) e Oceânia (Timor e suas dependências).
Afirmava-se ainda que “a Nação não renuncia aos direitos que tenha ou possa vir a ter
sobre qualquer outro território”.
b) O corporativismo
17
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 6ª Edição Revista e
Ampliada, Tomo II, Coimbra Editora, 1972.
7
“construir o Estado social e corporativo, em estreita correspondência com a constituição
natural da sociedade. As famílias, as freguesias, os municípios, as corporações em que
se encontram todos os cidadãos, com as suas liberdades jurídicas fundamentais, são os
organismos componentes da Nação e devem ter, como tais, intervenção directa na
constituição dos corpos supremos do Estado; eis uma expressão, mais fiel do que
qualquer outra, do sistema representativo”18.
18
Cfr. A. Oliveira Salazar, Discursos, vol I, 1º Edição, p. 87
19
Cfr. Marcello Caetano, A Constituição de 1933 – Estudo de Direito Político, Coimbra Editora, 1956
(Separata de “O Direito”, Fasc. 2, ano 87, 1955, p. 97, Fasc. 3, ano 87, 1955, p. 193 e Fasc. 1, ano 88,
1956, p. 3),
20
Cfr. J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª Edição, Almedina, p.
180.
21
Cfr. J. J. Gomes Canotilho, cit., p. 182.
8
A Constituição apresenta, pois, várias normas reguladoras das relações
económicas e laborais do capitalismo. Assume-se como direito e obrigação do estado
coordenar e regular a vida económica e social (os dois aspectos aparecem sempre
associados), a fim de defender a economia nacional, desenvolver o território e a
população e estabelecer um equilíbrio entre o capital e o trabalho. A organização
económica da Nação, afirma-se, deverá “realizar o máximo de produção e riqueza
socialmente útil, e estabelecer uma vida colectiva de que resultem poderio para o Estado
e justiça para os cidadãos”.
Os Direitos Fundamentais
22
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 6ª Edição Revista e
Ampliada, Tomo II, Coimbra Editora, 1972, p. 516.
9
sufrágio e a o direito a ser eleito para cargos públicos, não se encontravam, porém, no
seio das disposições sobre direitos e garantias individuais. Efectivamente, o direito de
voto não pertencia aos cidadãos individualmente considerados, mas sim ao chefe de
família, de acordo com o princípio do voto familiar, e aos representantes de algumas
associações de classe.
10
Estas restrições aos direitos individuais surgiam como naturais numa
Constituição que visava corrigir “os exageros do individualismo”23, verificados na
relação entre os cidadãos e o Estado, e devidos a uma “revolta permanente dos átomos
anónimos contra a própria estrutura social que lhes garante a existência”. A sua
utilização, de forma claramente abusiva, durante todo o período do Estado Novo, em
particular no combate aos seus opositores políticos, foi uma das características
marcantes do regime.
23
Cfr. “Projecto da Nova Constituição Política do Estado “, in Diário de Notícias, 28 de Maio de 1932
11
designadamente, relativas às relações internacionais, à Assembleia Nacional, à
legislação, ao Governo e à função judicial.
24
Cfr. Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 6ª Edição Revista e
Ampliada, Tomo II, Coimbra Editora, 1972.
12
existente, tendo desempenhado as funções típicas desse tipo de estrutura (suporte
político, mobilização, propaganda, mediação eleitoral25).
Revisões Constitucionais
Logo nos anos que se seguiram à sua aprovação (entre 1935 e 1938), sofreu
cinco emendas, todas respeitantes à chamada Constituição política e pouco relevantes.
25
Cfr. J. J. Gomes Canotilho, cit., p. 185.
13
Verificaram-se, ainda, ligeiras mudanças relativas à organização dos tribunais e
alterações mais significativas do Acto Colonial.
26
Cfr. Marcello Caetano, As minhas memórias de Salazar, 4ª Edição, Verbo, 2000, p. 513.
27
Cfr. Marcello Caetano, As minhas memórias de Salazar, 4ª Edição, Verbo, 2000, p. 518.
14
pouco tempo depois das eleições presidenciais directas de 1958, em que a candidatura
de Humberto Delgado uniu a oposição e causou grande sobressalto ao regime, mudou-
se o regime de eleição do Chefe de estado, passando este a ser indirectamente eleito, por
um colégio eleitoral restrito. Terminou, assim, um dos poucos elementos
“democráticos” do regime, iniciando-se uma “reprodução intra-sistémica do poder”28,
em que o Presidente da República passa a ser eleito por um conjunto de indivíduos que,
directa ou indirectamente, lhe devem os seus cargos. Além deste aspecto, a revisão
introduziu ainda uma autorização para a lei regulamentar “os direitos e os deveres quer
das empresas, quer dos profissionais do jornalismo” e alterou a divisão territorial do
país, passando o Continente a dividir-se em freguesias, concelhos e distritos (abandona-
se a designação “província”).
28
Cfr. P. Ferreira da Cunha, Da Constituição do Estado Novo Português (1933), in História
Constitucional, nº 7, 2006.
29
Cfr. Marcello Caetano, Revisão Constitucional – discurso proferido perante a Assembleia Nacional em
2 de dezembro de 1970, Secretaria de estado da Informação e Turismo, 1970.
15
trabalhos da comissão eventual constituída na Assembleia Nacional. Sá Carneiro
recusou-se mesmo a participar nos debates e viria a contestar a constitucionalidade da
própria lei de revisão30. Por outro lado, é visível que as alterações respeitantes ao
Ultramar visavam responder aos acontecimentos da época, em particular aos
movimentos independentistas. Todavia, a revisão veio tarde. O regime do Estado Novo
estava quase no fim.
30
Cfr. Jorge Miranda, Inconstitucionalidade de Revisão Constitucional – 1971 – Um projecto de
Francisco de Sá Carneiro, Assembleia da República, 1967.
16
CAIXA 1
Uma das principais vozes críticas em relação à Constituição de 1933 foi José
Vicente de Freitas. Militar de carreira, apoiante activo do golpe militar de 1926,
desempenhou vários cargos importantes durante o período da Ditadura Militar. Foi
presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Lisboa e desempenhou
ainda várias funções executivas entre 1927 e 1929.
31
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, Edições Tenacitas, 2007, p. 24.
17
Nacional e à sua transformação, na prática, em partido político único. Vicente de Freitas
defendia ainda a eleição de uma Assembleia Constituinte. Noutras matérias, as duas
propostas eram muito semelhantes.
32
Cfr. António Araújo, A Lei de Salazar, cit., p. 25.
18
CAIXA 2
A relação íntima entre a Igreja Católica e o Estado Português está ainda bem
patente na referência feita à “influência moral” adstrita à Nação pelo Padroado do
Oriente, fundamento da sua missão colonizadora e civilizadora das populações dos
domínios ultramarinos.
19
A Família e a condição da mulher
33
Cfr. Jorge Miranda, Direitos Fundamentais e Ordem Social (na Constituição de 1933)
20
assuntos da vida comum; obrigação de a mulher adoptar a residência do marido;
necessidade de autorização do marido para que a mulher pudesse exercer o comércio ou
celebrar contratos com terceiros relativos a actividades lucrativas).
21