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INTRODUÇÃO

A Conferência da África Ocidental ou Conferência do Congo, realizou-se


em Berlim, de 15 de novembro de 1884 á 26 de fevereiro de 1885, marcando a
colaboração europeia na partição e divisão territorial da África. Gerson Brandão, Por
dentro da África No dia 26 de fevereiro de 1885, após três meses de debates, terminou a
Conferência de Berlim, um encontro entre países europeus (França, Alemanha, Grã-
Bretanha, Espanha, Portugal, Bélgica e Itália) com o propósito de definir fronteiras que
não existiam antes.

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O ENCONTRO QUE DECIDIU A ÁFRICA PARTILHANDO OS
CONTINENTE EM 50 PAÍSES

O ‘encontro’ decidiu o futuro da África partilhando o continente em mais de 50


países, em um processo que ignorou completamente os africanos, que não foram
convidados para a conferência. Um mapa com 50 países sobrepostos a mais de 1.000
povos, culturas e regiões do continente; algo como uma colcha de retalhos costurada
sem qualquer apreço e respeito pela geografia, línguas, dialetos, culturas ou outros
fatores unificadores que existiam no século XX, foi desenhado na capital da Alemanha.
Saiba mais: A África repartida na Conferência de Berlim Provavelmente para mascarar
a crueldade do colonialismo, para os alemães, o evento foi chamado de Conferência do
Congo (Kongokonferenz), um encontro para dirimir tensões entre países vizinhos,
nomeadamente a França e a Bélgica, mas também Portugal, que travavam uma guerra
de bastidores sobre o controle da região conhecida como bacia do Congo, área onde
atualmente se encontram o Gabão, a República Centro-Africana, a República do Congo
(ex-dono Francês), a província de Cabinda, em Angola, e, a joia da coroa, a República
Democrática do Congo (ex-dono Belga, ou ainda Zaire), já naquela época, um país
conhecido pela riqueza hídrica e abundância em recursos minerais. Saiba mais:
República Democrática do Congo:

O PAÍS QUE PASSOU POR UM DOS MAIS DANOSOS TIPOS DE


COLONIZAÇÃO

O chanceler alemão Otto von Bismarck (1815-1898), também interessado em


proteger os interesses comerciais da Alemanha na África, sentiu-se compelido a
organizar essa conferência, e pôr ordem nas inúmeras reivindicações de terras africanas
que vinham sendo feitas por diferentes países.

Ao final da conferência, ficou acordado que um indivíduo, o rei Leopoldo II da


Bélgica (1835-1909), se tornaria proprietário de 2,5 milhões de quilômetros quadrados
(90 vezes o tamanho da Bélgica), assim como todos os habitantes, e a força de trabalho
viraram um bem particular. Foi então que Berlim abençoou o início de um reino
descrito por historiadores e habitantes do antigo Congo Belga como explorador voraz de
pessoas e de recursos naturais. 135 anos depois, no dia 26 de fevereiro de 2020, o
governo congolês e a comunidade internacional lançaram o ‘plano de resposta
humanitária’, pedindo 1,7 bilhão de dólares americanos, para atender às pessoas que

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mais precisam de assistência no país. Uma coincidência de datas e também de valores,
se levarmos em contas as estimativas do diplomata Belga e historiador, Jules Marchal,
que estimou, em 1998, em mais de 1 bilhão de dólares americanos os ganhos do Rei
Leopoldo II, durante o reinado de 23 anos no Congo (entre 1885 e 1908).

Apesar dos conflitos em lugares como a Síria, Iêmen ou Iraque, a República


Democrática do Congo continua sendo uma das crises humanitárias mais complexas do
mundo. No final de 2019, a ONU reportou quase 1 milhão de congoleses vivendo nos
países vizinhos, fugindo da guerra no país deles. Os conflitos armados sobretudo na
parte leste do país, continuam a causar deslocamento interno das populações, perda de
vidas e destruição de aldeias e cidades. Além de ter quase 1 milhão de cidadãos
dependente de ajuda nos países vizinhos, dentro da República Democrática do Congo,
pelo menos, 13 milhões de pessoas precisam de ajuda humanitária para suprir as
necessidades mais básicas, incluindo mais de 1,3 milhão de crianças menores de 5 anos
que sofrem de desnutrição aguda grave e surtos de doenças variadas como o cólera ou
sarampo.

A divisão do continente africano foi feita, na Conferência de Berlim, sem os


maiores interessados, os africanos, e sem levar em conta as estruturas políticas, sociais e
econômicas existentes, o que causou danos irreparáveis na época como a separação de
famílias e morte de seres humanos, tratados como objetos, vítimas da exploração voraz
dos poderes coloniais. Entretanto, alguns países sofrem da falta de investimento e
avidez dos antigos colonos até hoje. É lamentável e surpreendente saber que um país
com os recursos naturais da República Democrática do Congo não possa prover o
mínimo à sua população, e que mais de 135 anos depois da ‘Kongokonferenz’, ainda
existem tantos africanos excluídos da riqueza do seu próprio continente. Uma casa
inacabada abriga o escritório do diretor da Faculdade de Direito de Likasi, a 3a cidade
da República democrática do Congo fundada pelo colonizador Belga. Arquivo Gerson
Brandão Gerson Brandão, mestre em Direitos Humanos pela Universidade de
Estrasburgo, atualmente pesquisa “sobre o papel das empresas privadas na proteção de
civis na

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O objetivo declarado era o de "regulamentar a liberdade do
comércio nas bacias do Congo e do Níger, assim como novas ocupações de territórios
sobre a costa ocidental da África". É de realçar a participação de estados que não
possuíam colónias ou territórios em África na conferência, como os países escandinavos
ou os Estados Unidos.

Esta Conferência foi uma das mais importantes realizadas na segunda metade do
século XIX, visando, entre outras questões, regular o Direito Internacional Colonial,
sendo que na conferência, entre outros temas, foram discutidos e estabelecidos
princípios relativos à navegação de rios internacionais, a liberdade de comércio ao
longo da bacia do Zaire, e também o estabelecimento de “regras uniformes nas relações
internacionais relativamente às ocupações que poderão realizar-se no futuro nas costas
do continente africano”. Adicionalmente, o tráfico de escravos, e a escravatura no geral
constituíram.

PONTOS IMPORTANTES NA AGENDA DA CONFERÊNCIA.

Uma conferência anterior (Conferência geográfica de Bruxelas, em 1876)


iniciou o debate sobre a partição da região do Congo, que foi dividido em três
partes: Congo-Léopoldville, que coube aos belgas; Congo-Brazzaville, atribuída aos
franceses; e Angola, que historicamente já pertencia a Portugal. Todas essas regiões
formavam o antigo Reino do Kongo. O principal resultado da conferência de Berlim foi
o estabelecimento de regras oficiais de colonização, mas, além disso, a conferência
gerou uma onda de assinaturas de tratados entre os vários países europeus.

A Alemanha, é o país vencedor da guerra franco-prussiana, não possuía colônias


na África, mas tinha esse desejo e viu-o satisfeito, passando a administrar o “Sudoeste
Africano” (atual Namíbia), Tanganica, Camarões e Togolândia; os Estados Unidos na
altura não tinham mais a colônia da Libéria, independente desde 1847, mas, como
potência em ascensão, foram convidados; o Império Otomano possuía províncias na
África, notadamente o Egito (incluindo o futuro Sudão Anglo-Egípcio) e Trípoli, mas
seus domínios foram vastamente desconsiderados no curso das negociações e foram
arrebatados de seu controle até 1914.

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Durante a conferência, Portugal apresentou um projeto, o famoso "mapa cor-de-
rosa", que consistia em ligar Angola a Moçambique, criando uma comunicação entre as
duas colônias, de modo a facilitar o comércio e o transporte de mercadorias. Sucedeu
que, apesar de todos concordarem com o projeto, mais tarde a Inglaterra, à margem
do Tratado de Windsor, surpreendentemente recusou o projeto, dando um ultimato a
Portugal, ameaçando declarar-lhe guerra se a proposta não fosse retirada. Portugal, com
receio de colocar em causa o tratado de amizade e cooperação militar mais antigo do
mundo, cedeu às pretensões inglesas, retirando o projeto do mapa cor-de-rosa.

Como resultado da conferência, a Grã-Bretanha passou a administrar toda


a África Austral (com exceção das colônias alemã da Namíbia, portuguesas de Angola e
Moçambique e da ilha francesa de Madagáscar) e o Sudoeste Africano, toda a África
Oriental (com exceção da Tanganica) e partilhou a costa ocidental e o norte da África
com a França, a Espanha e Portugal (Guiné-Bissau e Cabo Verde); o Congo – que
estava no centro da disputa, o próprio nome da Conferência em alemão é "Conferência
do Congo" – continuou como "propriedade" da Associação Internacional do Congo,
cujo principal acionista era o rei Leopoldo II da Bélgica; este país passou ainda a
administrar os pequenos reinos das montanhas a leste, o Ruanda e o Burundi.

PORTUGAL E A CONFERÊNCIA DE BERLIM

Os representantes portugueses a esta Conferência foram António Serpa


Pimentel, António José da Serra Gomes (Marquês de Penafiel), Luciano Cordeiro,
Carlos Roma du Bocage (adido militar), José P. Ferreira Felício (adido) e Manuel de
Sousa Coutinho (segundo-secretário).

Uma das mais importantes questões para Portugal, no contexto da conferência,


relacionou-se com o conteúdo do Capítulo VI do Ato Geral de Berlim, com a
“declaração relativa às condições essenciais a preencher para que as novas ocupações na
costa do continente africano sejam consideradas efetivas".

A Conferência de Berlim consagrou como regra de Direito Internacional o


princípio de “uti possidetis jure” do litoral africano, afastando definitivamente os
denominados “direitos históricos” (defendidos por Portugal). A referida norma, que
vinha a ser idealizada, e a ganhar apoiantes na década antecedente à conferência, veio
exigir de qualquer Estado a posse efetiva do território sobre o qual reclame a sua
soberania, com o objetivo de evitar que os Estados reclamassem direitos sobre

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territórios onde não tinham qualquer tipo de presença. Apesar de algumas potências,
nomeadamente o Reino Unido, defenderem que este princípio se deva aplicar a todo o
continente africano, na declaração final de Berlim o princípio de “uti possidetis jure”
restringe-se às áreas costeiras do continente. Surge assim o imperativo de alargamento
da ocupação efetiva ao interior do continente através da definição de “esferas de
influência” e que no caso português foi consubstanciado no projeto conhecido como
“Mapa Cor-de-Rosa”.

A divulgação do “Mapa cor-de-rosa” (documento cartográfico elaborado com


base nas explorações portuguesas do território entre Angola e Moçambique), provocou a
intervenção do Governo inglês que fez chegar a Lisboa um protesto, em resposta ao
qual o Governo Português procurou, através de termos conciliatórios e ao dar garantias
da integridade dos direitos ingleses, defender a sua posição, e simultaneamente evitar o
escalar da situação. No entanto, a pressão internacional exercida sobre o Reino Unido e
consequentemente sobre Portugal para definição de esferas de influência e ocupação de
territórios, aliada às dificuldades governativas de Portugal, que levaram a uma certa
negligência relativamente a questões de política externa, viriam a impedir a negociação
de contrapartidas ao projeto, levando a Grã-Bretanha a impor um ultimato.

Com efeito, o Governo de Lord Salisbury, apresentou, em 11 de janeiro de 1890,


através do seu Enviado em Lisboa, George Prette, um ultimato, exigindo a retirada
portuguesa das terras em disputa. Os termos em que estava redigido, bem como o curto
prazo concedido, não davam margem de manobra para quaisquer negociações, nem
apoios externos. Para evitar um conflito bélico, o Governo português cedeu às pressões
britânicos, protestando, no entanto, os seus direitos aos territórios em disputa e
pretendendo, no âmbito do artigo 12.º do Ato Geral da Conferência de Berlim, ver a
contenda resolvida através de mediação e arbitragem. O Governo de João Crisóstomo
continuou as negociações que conduziram à assinatura de um tratado definitivo em 11
de junho de 1891.

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Para Portugal acrescia ainda a questão da escravatura, que serviu frequentes
vezes de pretexto para ingerências das potências estrangeiras. A Inglaterra, após abolir o
tráfico em 1807, e com interesses coincidentes com a França nesta questão, pretendia
estender a abolição da escravatura aos restantes países europeus; sendo que a totalidade
do tráfico escravo só veio a ser abolida em todos os territórios portugueses em 1869,
apesar de datarem do século XVIII os primeiros decretos que viriam a abolir a
instituição da escravatura no território metropolitano português. A questão da
escravatura viria a marcar a política portuguesa durante o século XIX, sendo que o
primeiro decreto de abolição do tráfico nos domínios portugueses é da lavra do Marquês
de Sá da Bandeira, publicado em 10 de dezembro de 1836. Este decreto proibia o tráfico
de escravos em todos os territórios portugueses a sul do Equador. No entanto, muito
pressionado pelo governo inglês para não só abolir o tráfico, mas também para ajudar na
sua repressão, o Governo de Lisboa foi tentando escalonar no tempo e no espaço, as
ações a desenvolver de modo a não criar roturas e não prejudicar a economia.

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CONCLUSÃO

Concluímos como resultado da conferência, Portugal viria a consolidar o seu


controlo sobre os seus territórios em África, que viria a administrar até 1974, apesar dos
conflitos em lugares como a Síria, Iêmen ou Iraque, a República Democrática do Congo
continua sendo uma das crises humanitárias mais complexas do mundo.

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REFERÊNCIAS

1. ↑ "L'écriture du diable. Discours précolonial, posture ethnographique et


tensions dans l'administration coloniale allemande des Samoa", por George
Steinmetz. Politix, vol 17 nº 66, 2004, p.49-80, p. 5

2. ↑ Ir para:a b «Ata Geral da Conferência de Berlim» (PDF). Consultado em 16 de


agosto de 2017. Arquivado do original (PDF) em 29 de outubro de 2013

3. ↑ Ir para:a b c d e «Conferência de Berlim». Portal Diplomático. Consultado em 30


de abril de 2021

Bibliografia

 MAGNOLI, Demetrio. História da Paz. São Paulo: Editora Contexto, 2008. 448p. ISBN
85-7244-396-7-32

 Republica Democrática do Congo”.

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historia-135-anos-depois-uma-nova-conferencia-para-o-congo

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