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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO À DISTANCIA

TURMA: F, 1º GRUPO

FELISMINO DOS SANTOS VALENTIM


Código: 708208411

Relação das Sociedades Africanas com as Sociedades Coloniais: Estudo de Caso das
Colónias Moçambicanas e Angolanas

(Licenciatura em Ensino de História)

Nampula, Julho

2021

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO À DISTANCIA

FELISMINO DOS SANTOS VALENTIM


Código: 708208411

Relação das Sociedades Africanas com as Sociedades Coloniais: Estudo de Caso das
Colónias Moçambicanas e Angolanas

(Licenciatura em Ensino de História)

Trabalho de carácter avaliativo da


Cadeira de História das Sociedades II, a
ser apresentado no Curso de Licenciatura
Em Ensino de História, 2º Ano.

Nampula, Julho

2021

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Índice

Introdução.............................................................................................................................. 3

1. Relação das Sociedades Africanas com as Sociedades Coloniais: estudo de Caso das ......... 4

1.1. Localização Geográfica de Moçambique e Angola .......................................................... 4

1.2. Panorama Colonial de Moçambique e Angola ................................................................. 4

1.2.1. Moçambique ................................................................................................................ 4

1.2.2. Angola ......................................................................................................................... 5

2. Caracterização das Sociedades Moçambicana e Angola ...................................................... 6

2.1. As Características das Sociedades Moçambicanas ........................................................... 6

2.2. As Características das Sociedades Angolanas .................................................................. 7

3. Instrumentos Utilizados no Domínio Colonial nas Duas Sociedades ................................... 9

3.1. Forma de Domínio Colonial em Moçambique ................................................................. 9

3.2. Forma de Domínio Colonial em Angola ........................................................................ 11

4. Impacto Social e Cultural de Contacto entre Africanos e Colonos .................................... 11

Conclusão ............................................................................................................................ 13

Bibliografia .......................................................................................................................... 14

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Introdução

O presente trabalho apresenta o seguinte tema: Relação das Sociedades Africanas com as
Sociedades Coloniais: Estudo de Caso das Colónias Moçambicanas e Angolanas. No decorrer
do trabalho faz-se o enquadramento físico geográfico de Moçambique e angola
respectivamente, panorama das duas sociedades coloniais, suas características, os
instrumentos empregues pelo colonialismo português no domínio colonial, e o impacto social
e cultural do contacto entre os africanos e colonos.

É de referir que nesse trabalho buscou-se de antemão contextualizar brevemente a sociedade


moçambicana e angolana no período colonial através de uma revisão de literatura sobre o
processo de colonização de Moçambique e Angola, da política portuguesa de assimilação das
populações indígenas africanas, bem como a produção empírica e teórica que tivemos acesso
sobre aspectos étnicos culturais e sociais.

Porém, este trabalho encontra-se estruturado em introdução, desenvolvimento, conclusão e a


respectiva bibliografia. Em fim, esta tarefa de carácter avaliativa e científica na se traduz num
dogmatismo, visto que está aberto para que se faça a apreciação, expondo correcções, críticas
e sugestões com vista a sua melhoria.

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1. Relação das Sociedades Africanas com as Sociedades Coloniais: estudo de Caso das
Colónias Moçambicanas e Angolanas

1.1. Localização Geográfica de Moçambique e Angola

A República de Moçambique fica situada no Hemisfério Meridional entre os paralelos 10º 27'
Sul e 26º 52' Sul. Ela pertence também ao Hemisfério Oriental entre os meridianos de 30º 12'
Este e 40º 51' Este. O seu território enquadra-se no fuso horário +2, possuindo assim duas
horas de avanço relativamente ao Tempo Médio Universal, tal como uma parte dos países da
Europa Setentrional e Oriental (Muchangos, 1999).

Moçambique faz fronteira com seis países vizinhos, a saber: a Norte a Tanzânia, a Noroeste o
Malawi e a Zâmbia, a Oeste o Zimbabwe e Suazilândia, a Sudoeste a África do sul e
Suazilândia e a sul novamente a África de Sul. A Este fica o oceano indico. Canal de
Moçambique. (Barca e Santos, s/d: 5).

Angola, oficialmente República de Angola, é um país da costa ocidental da África, cujo


território principal é limitado a norte e a nordeste pela República Democrática do Congo, a
leste pela Zâmbia, a sul pela Namíbia e a oeste pelo Oceano Atlântico. Inclui também o
enclave de Cabinda, através do qual faz fronteira com a República do Congo, a norte. Para
além dos vizinhos já mencionados, Angola é o país mais próximo da colónia britânica de
Santa Helena.

1.2. Panorama Colonial de Moçambique e Angola

1.2.1. Moçambique

O quadro colonial moçambicano remonta em 1498, aquando da passagem de Vasco da Gama


pelo território, a caminho das índias. Só depois da Conferência de Berlim, realizada em
1884/5, é que Portugal se lançou na ocupação efectiva de Moçambique e dos demais
territórios que reivindicava na África. Isso teve como consequência a deflagração de uma
guerra de ocupação contra reinos e impérios nativos que estavam aí instalados (Cruz e Silva,
1999).

Desta forma, só em 1930 é que, de facto, Portugal passou a ter o controlo efectivo de
Moçambique.

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A par da guerra de ocupação, uma significativa parcela do território moçambicano estava
concessionada a empresas de capital estrangeiro não-português. Tratou-se de empresas como
a Companhia do Niassa, que dispondo de funções económicas, administrativas, detinha
igualmente poderes militares sobre determinadas áreas de sua actuação, no norte do país. Na
região central do país, concretamente em Manica e Sofala, o governo colonial havia
concessionado a gestão do território à Companhia de Moçambique (Rocha et al,1999). Ou
seja, antes de 1930, o Estado colonial português detinha domínio limitado do território
moçambicano, dada a presença de domínios controlados por reinos ou impérios locais, assim
como por dividir sua soberania com grandes empresas de capital estrangeiro.

A concretização da ocupação efectiva de Moçambique, que em termos práticos significou a


monopolização da violência legítima, da economia e do sistema monetário do território pelo
Estado (Elias, 1993), coincidiu com a ascensão do regime salazarista em Portugal e a
implementação do Estado Novo. Um dos carros-chefe desse regime foi a implantação de um
nacionalismo português, tanto na sua economia, cultura e, especialmente na relação entre a
metrópole e os seus territórios ultramarinos.

1.2.2. Angola

Pelo ímpeto expansionista, Portugal, a partir do século XIV desenvolveu muitas acções para
ampliar seus domínios políticos e económicos, sendo o continente africano um dos espaços
catalisadores para a aquisição de riquezas materiais e humanas.

Havendo uma “herança” escravocrata portuguesa, desenvolvida ao longo de vários séculos,


com a centralização monárquica do século XIV (Toma, 2005, p.58), somada, ao processo das
grandes navegações, que se desenvolveu nos séculos seguintes, a dominação, e consequente
escravização dos povos africanos fez parte da lógica do processo desenvolvido por Portugal,
em diversas regiões africanas, como é o caso de Angola.

Ao longo do século XV, Portugal aportará no continente africano pelo litoral atlântico,
estabelecendo-se em diversas regiões, como é o caso da região angolana, localizado na Região
Sul do continente africano. O território angolano dominado pelos portugueses é banhado pelos
rios Zaire, Cuanza, Congo, entre outros, onde coexistiam muitos reinos organizados como o
reino do Congo, do Ndongo, de Matamba, entre outros. (Maestri, 1988, p, 73).

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2. Caracterização das Sociedades Moçambicana e Angola

A estrutura social é aqui entendida como um sistema de interdependências, distâncias e


hierarquias, existente no seio de uma sociedade (Ossowski 1986). O tema “estrutura social”
será aqui abordado segundo dois pontos de vista, designadamente: o da estratificação em
camadas sociais e o da estrutura de classes.

2.1. As Características das Sociedades Moçambicanas

No período colonial, a sociedade moçambicana era, e continua sendo, diversificada em termos


de segmentos sociais que nela habitam. Mesmo a dita população que estava na condição de
súbditos (os indígenas) se diversificava, entre outros, pela sua identidade étnica. De norte a
sul de Moçambique encontrava-se uma diversidade de grupos etno-linguísticos a ponto destes
não se verem como fazendo parte de uma mesma identidade colectiva (Cahen, 1993). É sobre
esse mosaico étnico das populações indígenas, que era igualmente caracterizado pela sua
diversidade na identidade linguística, que o Estado colonial se fundou em Moçambique, tendo
unificado artificialmente essas populações por mecanismos jurídicos, classificando-as de
“não-civilizados”.

Assim como a categoria dos indígenas não era homogénea, como ficou indicado pela
diversidade de grupos étnicos, o mesmo acontecia com a categoria dos cidadãos. Os colonos
portugueses e assimilados, ambos portadores da nacionalidade portuguesa, não gozavam do
mesmo grau de cidadania, na medida em que, os primeiros eram, nos termos de Adriano
Moreira (1956, p.324), “cidadãos originários” enquanto os últimos nada mais eram senão
indivíduos que procuravam se igualar àqueles.

Para o projecto colonial em Moçambique, três categorias sociais assumiam um lugar


importante. Tratou-se dos colonos portugueses (agentes da colonização), os indígenas
(objectos da colonização) e os assimilados (o “produto da colonização”). É com base na
relação entre estas categoriais sociais, que procuramos compreender, parcialmente, a estrutura
social de Moçambique.

Das três categorias sociais supracitadas, apesar de desfrutar do mesmo regime jurídico de
cidadania que a dos assimilados, tinha uma posição social especial na sociedade colonial. Sua
proveniência ou ascendência portuguesa, a sua língua, religião, raça, hábitos e costumes, eram
considerados como sendo marcadores de civilidade. É neste sentido que os colonos
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portugueses foram “eleitos”, pelo Estado colonial, como aqueles que garantiriam a sua
efectiva instalação em Moçambique, assim como seriam os agentes que levariam aos
indígenas moçambicanos, os hábitos e costumes que os caracterizavam enquanto originários
de Portugal. É em função desse ideal de supremacia dos colonos portugueses sobre os demais
integrantes da sociedade moçambicana, e especialmente sobre os indígenas, que se
caracterizou o Estado colonial desde as décadas de 1930 a 1974.

2.2. As Características das Sociedades Angolanas

Existem várias teorias a respeito da existência ou não de classes sociais em sociedades


africanas. Marek Szczepanski (1984) considera haver três grupos de teorias acerca da
estrutura de classes em sociedades africanas, designadamente: (a) teoria a respeito da
inexistência de classes sociais, (b) teorias que procuram justificar a existência de classes
sociais devidamente consolidadas, (c) teorias que tratam da existência de classes sociais, num
estágio inicial de criação e desenvolvimento

Ao realizar uma análise das comunidades étnicas que compõem o continente africano, anterior
ao período da dominação colonial europeia, deparamo-nos com uma dificuldade evidente: a
raridade de fontes escritas. Isso ocorre pelo facto de essas comunidades não terem
desenvolvido sistemas grafais, sendo necessária uma análise acerca de suas tradições orais e,
mais especificamente, dos relatos e textos escritos deixados pelos europeus, em sua maioria
religiosos, que registaram suas impressões sobre o que encontraram na África. (vansina, 1967)

Para objectivarmos a análise acerca de um dos objectos deste trabalho, cabe


delimitarmos o conceito de comunidades aldeãs bantus. A nos referirmos a elas,
estaremos nos reportando à população que vivia no actual território de Angola, na
região litorânea, composta por membros de uma família etno-linguística que pode ser
dividida em nove grandes grupos: ambós, bacongos, hereros, lunda-tchoukué,
nganguelas, nhanecas-humbes, ovimbundos, quimbundos e xindongas. (Menezes,
2000, p. 102).

Como principal característica social e económica dessas populações, citaremos o modo de


produção doméstica, proposto por Claude Meillassoux, na obra Mulheres, celeiros e capitais.
Segundo esse autor, as comunidades agrícolas angolanas pré-coloniais tinham, no contexto de
formas gerais de organização, especificidades em cada comunidade, que se distinguia pelas
leis, pelos costumes, pelas línguas e pelo modo de viver. Assim, não havia antagonismos de
classe; as distinções fundamentais estavam na diferença de idade e de sexo, detendo os mais

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velhos – ou, em alguns casos, os pretensamente mais velhos – o uso dos meios de produção
(terra) e o acesso às mulheres. (Pantoja, 2000, p. 23)

A organização familiar bantu se dava pelo sistema da matrilinearidade ou patrilinearidade,


podendo haver a coexistência dos dois regimes. No sistema matrilinear, a descendência
passava por meio das mulheres, aparecendo sempre um epónimo feminino, sendo que o tio
materno tinha autoridade sobre os filhos das suas irmãs. Já no sistema patrilinear, o filho
pertence à família do pai, reagrupando os descendentes por via masculina, de um antepassado
varão, conhecido ou mítico.

Destaca-se o papel fundamental desempenhado pelas mulheres nas comunidades aldeãs


bantus. Historicamente, devido à necessidade contínua de manter e aumentar o número de
integrantes das comunidades, as mulheres engravidavam em continuação, o que as
dificultavam de irem em busca de caça e colecta em regiões distantes, tarefa voltada aos
homens. Por motivo de segurança, as cobiçadas mulheres não se afastavam igualmente das
aldeias. Em função dos empecilhos, das mulheres saírem das aldeias, havia um contacto
íntimo entre elas e o meio ambiente, as plantas e as estações, o que acabou se revertendo no
processo de início das práticas agrícolas, tendo as mulheres como protagonistas. Segundo
Maestri,

O fundamental da actividade agrícola recaía portanto sobre os ombros da mulher


africana. Assim sendo, ser-nos-ia importante procurar definir se na época estudada a
totalidade do esforço agrário era desenvolvido pelo sexo feminino ou, se a parte mais
trabalhosa e que requer mais esforço físico, a limpeza do terreno e a colheita, era,
como o é contemporaneamente tarefa masculina ou executada com o auxílio do
homem.” (Maestri, 1978, p. 49).

Entre os principais produtos agrícolas produzidos, estavam os cereais e tubérculos, e os


nativos dividem o ano em seis estações: Massanza, Nsasu, Ecundi, Quitombo, Quibisso,
Quimbangala ou Massanza. Além do domínio agrícola, com o protagonismo feminino, os
bantus desenvolveram técnicas para fundição de metais, produzindo instrumentos de uso
cotidiano e artefatos cerimoniais. (Maestri, 1978)

Um factor referente às comunidades bantus que têm instigado as produções académicas de


muitos africanistas e colonialistas, refere-se às práticas escravistas nas dinâmicas sociais da
África pré-colonial. Essa discussão é controversa, pois foi criada uma visão contraditória a
seu respeito. De um lado, havia os defensores das colónias europeias, que justificavam o
sistema escravista colonial, a partir de pretensa preexistência de práticas escravistas africanas.

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De outro lado, os que negavam a existência de qualquer prática escravista no período anterior
ao domínio colonial, sendo esse sistema responsável por toda a dinâmica escravista em
território africano.

Entre as relações sociais existentes nas comunidades aldeãs bantus estavam práticas servis
não escravistas. Ou seja, incompletas. Categorizam-se como práticas porque não havia uma
uniformidade nessas instituições, diferentemente, por exemplo, do modo de produção
escravista colonial, com forte uniformidade e fins económicos.

As pessoas eram transformadas em cativos basicamente devido a algum crime, dívida, venda,
captura, etc. Após isso, podiam ser mortos cerimonialmente, como em alguns casos, ou
incorporados à comunidade doméstica ou de linhagem, em situação de subordinação ao
patriarca. Alguns autores identificam incorrectamente essas práticas como escravidão
colonial, ou como escravidão doméstica. O que é incorrecto, pois esta última não constituía
igualmente escravidão plena.

3. Instrumentos Utilizados no Domínio Colonial nas Duas Sociedades

3.1. Forma de Domínio Colonial em Moçambique

Os primeiros contactos dos portugueses com o território que futuramente seria a colónia de
Moçambique foi em 1498 com Vasco da Gama. Isso aconteceu devido à busca por rotas para
as Índias mais seguras que as terrestres pelo Oriente Próximo. Entrepostos de abastecimento e
a dominação de uma faixa litorânea estreita foi o que estes recém-chegados conseguiram às
custas de conflitos com os povos autóctones e árabes que já haviam estabelecido certo
domínio sobre rotas comerciais na África Oriental alguns séculos antes.

Com essa primeira informação histórica, Mandlane desmente o discurso oficial do governo
português que justificava a dominação colonial afirmando sua dominação naquele território a
mais de 450 anos. Este argumento fora utilizado primeiramente para reivindicar a posse
portuguesa frente a outras potências colonialistas e posteriormente para postergar a
subjugação dos povos colonizados aos interesses da metrópole. No entanto, Mondlane
demonstra que essa presença era ínfima até finais do século XIX.

Ao longo dos séculos, movidos por interesses económicos (escravização e exploração de


recursos naturais, especialmente o ouro nesse período), os portugueses avançaram
espalhando-se pelo interior, com a efetivação da dominação colonial apenas após a
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conferência de Berlim (1884-1885) onde as potências europeias definiram a partilha da
África. Diversos foram os ardis utilizados pelos portugueses. Mondlane lista alguns.

Sempre que possível, Portugal recorreu à infiltração de comerciantes portugueses, que


se disfarçavam de simples homens de negócios interessados na troca de mercadorias
entre parceiros iguais; mas em seguida, após terem espiado e feito mapas minuciosos
de toda a região, enviavam as forças militares para eliminar qualquer resistência por
parte dos chefes locais. Por vezes, os portugueses utilizavam colonos brancos, que
alegavam precisar de terra para cultivar, mas que depois de a terem recebido dos
chefes locais tradicionais, reclamavam a posse das terras comunitárias e começavam a
escravizar os seus anfitriões africanos. Por vezes, foram utilizados mesmo
missionários portugueses como “pacificadores” dos nativos, espalhando a fé cristã
como instrumento para adormecer os africanos, enquanto as forças militares
portuguesas ocupavam a terra e controlavam o povo. (Mondlane, 1995, p. 33).

Somente em 1985, com a morte do general Maguiguana e a prisão do imperador Gungunhana,


Portugal derrotou Gaza, o ultimo império tradicional de Moçambique. Isso possibilitou que a
implantação da administração colonial tivesse início a partir dos primeiros anos do século
XX, sendo que a resistência armada foi completamente vencida apenas na década de 20 do
mesmo.

Com isso, Mondlane demonstra também que a imposição colonial não se deu de forma
pacífica, muito pelo contrário, ela se deu por meio de guerras ditas de “pacificação” e “justas”
sofrendo muitas resistências dos povos africanos e também dos árabes que dominavam rotas
comerciais na região oriental da África.

Nesse período, ocupou as mentes dos administradores e militares portugueses


questões a cerca da “teoria política colonial”. Sua principal preocupação era como
tornar a colónia útil à Portugal. Mondlane destaca as reflexões do comissário régio de
Moçambique no período de 1894-95, António Enes, quanto aos objectivos da
implantação do sistema de administração/dominação. Diz ele: “Se não aprendermos a
fazer trabalhar o preto, e não soubermos tirar proveito desse trabalho, em pouco tempo
seremos obrigados a abandonar a África a favor de alguém que seja menos
sentimental e mais prático do que nós” (Enes apud Mondlane, 1985, p. 34).

Esse processo tornou todas as sociedades autóctones subordinadas aos interesses externos,
alterando profundamente as suas estruturas sociais. Mesmo onde chefes africanos foram
mantidos em posto de comando administrativos, o seu poder era limitado e hierarquicamente
inferior a algum administrador branco, dessa maneira, esses chefes foram transformados em
representantes do poder colonial em suas comunidades.

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3.2. Forma de Domínio Colonial em Angola

Unido aos interesses portugueses, e ao dos demais países, e inserida na dinâmica das grandes
navegações, constata-se como um dos instrumentos a participação directa da Igreja católica
nessa dinâmica de exploração. Isso porque, afligida pelo processo das Reformas protestantes,
necessitava buscar novos fiéis, substituindo as grandes perdas em países como Alemanha,
Suíça, Inglaterra e França. Nessa conjuntura, ocorreu relação de colaboração entre as
potências europeias e a Igreja Católica Apostólica Romana, a partir dos interesses de cada
parte.

Dentre os principais anseios destacam-se as viagens, a catequização dos povos nativos e a


organização de sistemas coloniais, balizados na exploração de africanos escravizados e o
posterior tráfico internacional de trabalhadores, apoiado pela Igreja católica. Isso pode ser
evidenciado nas bulas de que autorizavam os portugueses a reduzirem os africanos à condição
de cativos, com o pretenso intuito de cristianizá-los (Tinhorão, 1988, p. 56). Destaca-se o caso
de Angola que “exportará” milhões de “peças” para a colónia portuguesa na América,
havendo assim um processo de naturalização da escravatura (Oliveira, 2009, p. 359).

Inúmeros foram os instrumentos que colaboraram com o protagonismo português no processo


das grandes navegações e domínio colonial, entre eles, destaca-se a centralização política de
Portugal. Isso porque, já no século XIV o Estado português passou por um processo de
unificação política, por meio da Dinastia de Avis (1385-1582), que facilitou a organização de
sistema de arrecadação de impostos e estrutura administrativa centralizada.

Em segundo lugar, está uma burguesia mercantil, que, na ausência de investimentos efectivos
do Estado, que não vislumbrava inicialmente resultados positivos nessas acções, abriu espaço
para que a iniciativa privada o fizesse Salienta-se, também, como factor favorável, a posição
geográfica portuguesa, banhada pelo mar Mediterrâneo e pelo oceano Atlântico,
verdadeiramente debruçado sobre a África, o que a colocava numa situação de contacto
directo com as possibilidades de navegação pelas vias marítimas.

4. Impacto Social e Cultural de Contacto entre Africanos e Colonos

Continuo com Aimé Césaire (2011) para refletir sobre a dimensão cultural da estrutura do
colonialismo. Esse autor considera que a situação de colonizado é um denominador comum
entre os negros, sejam da África Negra, norte americanos, das Antilhas ou malgaxes. Nesse

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sentido, discutir a situação colonial é fundamentalmente necessário para compreender o que
condiciona o desenvolvimento das culturas negras, ou seja, a situação colonial é o
condicionamento concreto que determina o (sub)desenvolvimento dessas culturas (Césaire,
2011).

Césaire atribui esse poder de determinação do colonialismo sobre o desenvolvimento das


culturas negras porque defende a ideia de que a política tem influência sobre a cultura já que
“um regime político e social que suprime a autodeterminação de um povo, mata ao mesmo
tempo o seu poder criador.” (Césaire, 2011). O autor nos explica que a cultura necessita de
estruturas para surgir e se desenvolver. Estruturas essas que são degeneradas pelo regime
colonialista na medida em que: a “organização política que um povo se outorgou livremente”
(Césaire, 2011) é destruída (ressaltando que tal organização faz parte da cultura desse povo e
a condiciona) e a língua nativa é desclassificada. Por esses mecanismos há uma limitação,
supressão ou abastardamento de tudo o que estrutura a cultura colonizada.

Nesse sentido, Césaire, afirma que em todos os lugares onde a colonização europeia alcançou
foi imposta uma economia fundada no dinheiro que provocou a desestruturação social e
económica das comunidades atingidas.

Vale notarmos, que os princípios de colonização nos servem apenas de exemplos para mostrar
que a situação colonial que caracterizou a África em especial Moçambique e Angola não era
homogénea e que as experiências de contacto social entre colonos europeus e indígenas
variavam de acordo com o contexto e os agentes colonizadores envolvidos.

Como nota Mamdani (1996), contudo, a ideologia colonial, independentemente de sua


variação, na prática, caracterizou-se por ter um elemento em comum. Apesar de nem todos os
Estados coloniais terem assumido explicitamente o princípio da segregação, procuravam
dividir a sociedade entre, por um lado os cidadãos e por outro, os súbditos (indígenas);
abrindo espaço para a bifurcação do Estado na forma como definia os indivíduos que estavam
sub a sua alçada.

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Conclusão

Com esse trabalho buscamos apresentar como uma concepção racionalizada sobre as
sociedades moçambicanas e angolanas no período colonial evidenciando suas relações
culturais e de socialização.

Durante séculos, os povos que viviam na região actualmente conhecida como Angola e
Moçambique, denominados bantus, tiveram, como forma de organização familiar
predominante, o sistema patrilinear e matrilinear, inseridos numa organização de linhagens.
Como meio de subsistência, destacava-se a agricultura, com participação protagonista e
predominantemente feminina. Esses povos dominavam a metalurgia e tinham como práticas,
formas de escravidão semelhantes ao escravismo antigo.

Entretanto, o domínio colonial português alterou drasticamente essas relações. Pela


necessidade de os lusitanos ampliarem seus domínios em terras até então desconhecidas,
Vasco da Gama em 1884 atracou a Ilha de Moçambique e Diogo Cão, em 1483, aportou no
reino do Kongo e iniciou um processo de espoliação nas terras moçambicanas e angolanas
respectivamente. Suas práticas coloniais nesses territórios resultaram num processo que se
organizou pela coaptação das lideranças políticas locais, voltando seu poder interno para a
captura de nativos, que serão direccionados para o tráfico de escravos voltado à América.

Como resultado dessa dinâmica colonial, houve uma desorganização do sistema familiar
centrado na matrilinearidade e patrilinearidade, uma significativa diminuição populacional,
resultado do tráfico de escravos e a polarização de rivalidades políticas entre as diversas
etnias existentes naqueles territórios, que facilitassem o domínio português.

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