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Rebeca Carolina da Silva Bandeira (RA: 137428)

Atividades Programadas de Pesquisa II – Linha Trabalho e Educação – 2º Sem/2018

LOUREIRO, Isabel. “Agronegócio, resistência e pragmatismo: as transformações do MST”.


In: As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? / organização André Singer, Isabel
Loureiro. - 1. ed. - São Paulo: Boitempo, 2016. 282 p. ISBN: 978-85-7559-511-4

O texto de Isabel Loureiro, aqui resenhado, é atinente ao livro ​As contradições do


lulismo: a que ponto chegamos? que, por sua vez, pertence à coleção Estado de Sítio,
coordenada por Paulo Arantes, da Editora Boitempo. O livro, publicado em 2016, conta com
oito textos de diferentes autores (André Singer, Ruy Braga, Leonardo Mello e Silva, Isabel
Loureiro, Carlos Alberto Bello, Cibele Rizek, Wolfgang Leo Maar e Maria Elisa Cevasco)
que apresentam elementos para se compreender a complexidade do governo petista no que diz
respeito às lutas sociais, organização societal, políticas de assistencialismo, crítica cultural,
desenvolvimento e etc. Os organizadores do livro são André Singer, professor associado do
Departamento de Ciência Política da USP, e Isabel Loureiro, professora aposentada do
Departamento de Filosofia da Unesp.
O texto de Isabel Loureiro, ​Agronegócio, resistência e pragmatismo: as
transformações do MST, possui como questão fundamental a investigação da questão agrária
brasileira de forma concomitante com a observação das ações implantadas pelos governos de
Lula e de Dilma. Num primeiro momento Isabel Loureiro trata de apresentar uma reflexão
sobre os processos que envolvem a legislação sobre as terras no Brasil, desde as sesmarias até
o Estatuto de Terras e Lei Agrária. Essa reconstrução histórica da legislação sobre a terra que
a autora realiza é uma ferramenta para se compreender o processo de consolidação dos
grandes latifúndios no Brasil que se justificou e se justifica, ainda hoje, como um caminho
para a ‘modernização’. Nesse sentido Loureiro pontua como os governos de Lula e Dilma
também foram pouco efetivos nos processos de combate à grilagem de terras públicas e na
fiscalização de propriedades classificadas como improdutivas que, segundo a legislação,
deveriam ser destinadas à reforma agrária.
Na argumentação autora isso ocorre porque a questão da terra no Brasil encontra-se
profundamente refém dos interesses do mercado que, por sua vez, engendra a lógica da
expansão da agricultura empresarial e do mercado de terra como uma fonte de lucro. Na
literatura em que Isabel se apoia há dados concretos que identifica um crescimento da
exportação de produtos primários, entre 1999 e 2012, em contrapartida de um recuo
proporcional da exportação de produtos manufaturados. Nesse sentido nota-se que o Brasil
tem, há alguns anos, privilegiado enquanto política governamental o agronegócio de tipo
exportador de ​commodities​. Agora, cabe perguntar o porquê isso ocorre? Para Loureiro isso
acontece porque há uma infiltração, em todos os poderes do Estado, de grandes proprietários
de terras e, além disso, um apoio midiático que produzem uma agenda governamental
pró-agronegócio, onde a aliança entre setor agrário e capital financeiro nacional e estrangeiro
são essenciais para a política de desenvolvimento/modernização escolhida, no caso a
exportação de ​commodities que, por sua vez, tem como prerrogativa para sua produção
grandes latifúndios de terra​.
Um dos resultados dessa política de implantação e apoio à concentração fundiária,
grilagem de terras públicas, desenvolvimento via agronegócio é, de acordo com Loureiro, a
violência contra os povos do campo, algo que é corroborado por pesquisas que “trazem dados
preocupantes sobre expulsões, ameaças de expulsões e assassinatos por parte do poder
privado, tendo sobretudo como alvo as populações tradicionais, mas também sem-terra,
assentados e pequenos proprietários”1.
Em meio a esses conflitos que envolvem a questão agrária brasileira a autora se
propõe a pensar sobre as possibilidades e limites da reforma agrária, para isso Loureiro elenca
alguns dos argumentos contrários à implantação da reforma agrária e alguns dos argumentos
favoráveis à reforma.
Já caminhando para o fechamento do texto, Isabel Loureiro dedica-se a expor a
história e a trajetória do MST, de modo a pontuar suas lutas, suas contribuições e também
sobre os novos desafios que o movimento tende a enfrentar. Além disso, a autora aborda as
contradições deste movimento social que tem feito, frequentemente, parcerias com empresas
tais como Pão de Açúcar e Petrobrás. Cabe questionar se esse processo seria uma perda da
radicalidade que nos anos 1980 foi essencial para que o MST se transformassem em um
movimento social de grande dimensão. Todavia, Isabel alerta que “não se trata de uma crítica

1
​LOUREIRO, Isabel. “Agronegócio, resistência e pragmatismo: as transformações do MST”.
In: As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? / organização André Singer, Isabel
Loureiro. - 1. ed. - São Paulo: Boitempo, 2016. p. 129.
moral, mas de entender essas transformações ligada às mudanças estruturais que ocorrem no
Brasil e no mundo.”2
A exemplo disso estaria a opção do MST por adotar práticas agroecológicas nos
assentamentos. Finalizando o texto e dedicando-se a essa questão Loureiro trás uma série de
apontamentos, tanto críticas negativas quanto positivas da opinião pública e da própria
militância, sobre a adesão do MST ao discurso agroecológico, de modo a demonstrar que este
é um campo em disputa. Para exemplificar esse processo a autora se atém ao fato de que
muitos estudiosos e militantes entende que adesão à agroecologia é um processo de
flexibilização da luta anticapitalista enquanto outros entendem como sendo esta uma única
saída, de momento, para se opor ao capital irrestrito e não-ecológico. Ou seja, de acordo com
a autora, ainda não há consenso sobre a atividade agroecológica e esta é só mais uma questão
que envolve a disputa ideológica e prática sobre as e nas questões das terras brasileiras.
Nesse sentido, nota-se que a reflexão apresentada por Isabel Loureiro tem como objeto
chave elencar temas fundamentais que circundam a questão da terra no Brasil. Desde a análise
da legislação da terra até os interesses de capital e os movimentos contra-hegemônico até a
questão ambiental a autora perpassa, em sua reflexão, por temas que servem de instrumentos
para pensar a complexidade da questão agrária desse país de dimensões continentais. Além
disso, Isabel Loureiro tece as suas argumentações de modo a evidenciar que a estratégia
governamental dos governos petista se não acirrou/contribuiu ao menos foi conivente com a
lógica de desenvolvimento predatório que vem a beneficiar, fundamentalmente, os interesses
do capital enquanto expurga do campo pequenos proprietários e as populações tradicionais.
Ademais, a forma com que a autora organiza a reflexão passando por muitos dos
pontos dessa temática é bastante interessante, uma vez que pode contribuir aos pesquisadores
que estão se inserindo nesse debate, de modo a servir como texto de apoio e de caráter
introdutório ao tema, soma-se a isso o fato de que ao longo do texto Isabel Loureiro menciona
e indica diversas pesquisas que podem auxiliar no aprofundamento da investigação sobre a
questão agrária nacional.
Por fim, a relevância do texto de Isabel Loureiro se dá, em minha opinião, na medida
em que possibilita formular questionamentos e, assim, estratégias de resistências para o futuro
próximo, uma vez que ao identificar as dimensões do problema agrário se pode construir
agendas de luta para os movimentos sociais pela terra e para as lutas anticapitalistas.

2
​Idem, ibidem, p.141.

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