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CONFLITO DE CLASSES E RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES NA USINA

PAISA (2015-2016)

LUIZ FERNANDO.

RESUMO

O presente artigo se situa no campo da história social e aborda a


mobilização dos trabalhadores na usina PAISA por seus direitos, ocorrida
entre os anos de 2015-2016, e a falta de um sindicato combativo e
independente para conduzir essa luta à vitória. Visando possibilitar uma
visão macro sobre esse fato, organizamos nosso trabalho da seguinte
forma: discussão sobre história social, sobre o sistema de plantation e a
passagem dos engenhos às usinas, sobre o sindicalismo no Brasil e
finalmente a luta dos trabalhadores na usina PAISA, levantando uma
discussão sobre a necessidade de uma organização sindical classista e
combativa.

Palavras-chaves: PAISA, SINDICATO, RESISTÊNCIA.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................p. 3.
2. HISTÓRIA SOCIAL...............................................................p. 4.
3. METÓDO E OBJETIVO...........................................................p. 5.
4. CAPÍTULO 1 – O SISTEMA DE PLANTATION E A DOMINAÇÃO EM
ALAGOAS: DOS ENGENHOS ÀS USINAS..................................p. 6.
5. CAPÍTULO 2 – A LUTA DE CLASSES E O SINDICALISMO NO
BRASIL.............................................................................p. 14.
6. CAPÍTULO 3 – A LUTA DOS TRABALHADORES E A QUESTÃO
SINDICAL NA
PAISA...............................................................................p. 23.
7. CONCLUSÃO – A RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES E A
NECESSIDADE DE UMA ORGANIZAÇÃO SINDICAL CLASSISTA E
COMBATIVA......................................................................p. 34.
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................p. 37.
3

INTRODUÇÃO

As plantations definidas por W. Mintz (2003) como sendo "antes de


tudo, uma instituição política" representa o maior interesse dos
proprietários de terras e de capital para a manutenção de seu domínio e
de seus privilégios, frente à outra realidade completamente desigual, de
um povo sem posses e tutelado sob a hegemonia de uma determinada
classe dominante. Essas instituições utilizaram ao longo da história o
regime de escravidão e se fixaram em zonas tropicais, litorâneas,
"domesticando" tais áreas em seus projetos de colonização. O
enriquecimento da classe dominante se deu através da exploração da
terra e do trabalho realizado por um grande contingente de escravos em
suas instituições econômico-políticas. Essas instituições foram as "pontas
de lança da modernidade" no qual a sociedade contemporânea vive ainda
sob uma relação colonial de poder nas esferas da economia, da cultura e
da política.

As zonas açucareiras apresentam claramente estes aspectos. No


capitalismo as relações de poder perpassam no meio social mantendo
traços semelhantes ao regime escravagista. Nas Alagoas as oligarquias se
fixaram e estabeleceram seu poder através destas práticas, como aponta
Diégues Júnior (2012) "é através da economia açucareira que se expande
a colonização do território alagoano". A principal atividade econômica do
Estado de Alagoas, como veremos, continua sendo a da agroindústria
canavieira.

No município de Penedo (AL) os trabalhadores da usina Penedo


Agroindustrial S/A (PAISA) vivenciaram momentos de opressão e
injustiças cometidas pela burguesia empresarial, protagonizando lutas de
resistência. O Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Açúcar e Álcool
de Alagoas (STIAAL) se manteve omisso e por si só insuficiente para
defender e conquistar os direitos dos trabalhadores, colocando-se como
um modelo de sindicato colaboracionista/chapa-branca.
4

HISTÓRIA SOCIAL

Segundo José D’Assunção Barros (2005)1 “uma abordagem ou uma


prática historiográfica não pode ser rigorosamente enquadrada dentro de
um único campo”, ou seja, ainda que os/as pesquisadores/as e os/as
historiadores/as falem “em uma ‘História Econômica’, em uma ‘História
Política’, em uma ‘História Cultural’, e assim por diante, a verdade é que
não existem fatos que sejam exclusivamente econômicos, políticos ou
culturais”. Isso porque “todas as dimensões da realidade social interagem,
ou rigorosamente sequer existem como dimensões separadas”.

Sabe-se que “a cada novo período da historiografia, uma dimensão


pode como que se desprender da outra, ou então duas dimensões que
antes andavam separadas podem voltar a se juntar”. São os diferentes
contextos de uma sociedade estruturada de maneira vertical, com sujeitos
e protagonistas diversos ao longo da história nas relações sociais forjadas
em relação de poder de dominação por um sistema colonial-moderno e a
luta constante de se libertar dessa dominação.

Nesse sentido, situamos o artigo no campo da História Social,


fazendo uso de abordagens (fontes de notícias, imagens e vídeos, relatos)
e de domínios (agentes/sujeitos histórico, ambientes sociais) na nossa
pesquisa historiográfica. Este campo de pesquisa busca analisar “a historia
dos ‘modos de produção’ – isto é, das bases econômicas e sociais que
determinariam toda a vida social – e também a história das ‘lutas de
classes’, isto é, das relações entre os diversos grupos sociais presentes
em uma sociedade particularmente nas suas situações de conflito” bem
como seus processos de “industrialização, modernização, colonização, ou
quaisquer outros, inclusive as revoluções, que aparecem incluídas na
rubrica ‘movimentos sociais’”.

1
BARROS, José D’Assunção. A História Social: seus significados e seus caminhos. 2005.
5

METÓDO

O presente trabalho foi realizado com base em pesquisa


bibliográfica, levantamento de notícias em sites e entrevistas.

Com as referências teóricas, históricas, e a pesquisa realizada,


podemos chegar a algumas conclusões sobre a luta dos trabalhadores
contra as injustiças cometidas pelos capitalistas agroindustriais e os
limites do modelo sindical presente na usina Penedo Agroindustrial S/A
(PAISA) no período de intensa agitação e mobilização dos trabalhadores.

OBJETIVO

Geral: discutir o sindicalismo brasileiro, dando ênfase aos valores


classista, combativo e de resistência.

Especifico: analisar a mobilização de resistência dos trabalhadores


na usina PAISA e os limites da atuação do sindicato
colaboracionista/chapa-branca.
6

CAPÍTULO 1 – O SISTEMA DE PLANTATION E A DOMINAÇÃO


EM ALAGOAS: DOS ENGENHOS ÀS USINAS

Durante o período colonial predominou o sistema de plantation no


Brasil, com o uso do trabalho escravo nas grandes lavouras e engenhos de
cana-de-açúcar. Outra característica importante neste processo é que as
plantações se estabelecem para atender a demanda da econômica de
exportação para o consumo nos mercados europeus. (Mintz, 2003, p. 38)

Em sua obra O Poder Amargo do Açúcar, Sidney W. Mintz2 (2003)


caracteriza as plantações como sendo uma instituição política. Podemos
observar que nos territórios e regiões alagoanas o amplo domínio das
terras e da população local é exercido por parte de quem controla o poder
político através do controle das plantações. Além de ser uma instituição
política, as plantações desenvolvem um papel pioneiro para a
domesticação das regiões e exercem também uma grade influência na
cultura local.

Este poder dominante está enraizado por longos séculos através de


uma tradição e uma cultura colonial e escravagista. Em O Bangüê nas
Alagoas, Manuel Diégues Júnior3 (2012) nos apresenta o processo de
colonização e sua influência na economia e na cultura local. Os três
primeiros núcleos de povoamentos de Alagoas, com Porto Calvo ao Norte,
no centro a região de Marechal Deodoro e ao sul Penedo, são estratégicos
para o estabelecimento das plantações, pois “do ponto de vista geográfico
podem caracterizar estes núcleos pela influência do seu principal acidente
[...], principalmente hidrográfico, por isso seu elemento é a água: rios ou
lagoas” (Diégues, 2012, p. 44). Rico em rios e lagoas, aspecto
fundamental para o desenvolvimento da agricultura canavieira, a

2
MINTZ, Sidney Wilfred. O poder amargo do açúcar: produtores escravizados, consumidores
proletarizados. Tradução Christine Rufino Dabat. Recife: EDUFPE, 2003.
3
JÚNIOR, Manuel Diégues. O Bangüê nas Alagoas: traços da influência do sistema econômico do
engenho de açúcar na vida e na cultura regional. Maceió: EDUFAL, 2012.
7

mesorregião leste de Alagoas se torna primordial para o crescimento do


que vem a ser o Estado de Alagoas.

Inicialmente os três primeiros núcleos de povoamento de Alagoas


desenvolveram-se da seguinte maneira: “a agricultura da cana de açúcar
no norte e no centro litorâneo, os campos da pecuária, no sul (Penedo)”
sendo estes “sedes de freguesia” (Diégues, 2012, p. 43). O alicerce
“eclesiasticamente e politicamente têm sua organização assegurada”,
sendo possível que “se vai irradiando o povoamento à vizinhança” (ibdem,
p. 44).

Destaque-se que a família foi importante nessa estruturação, ou


seja, o patriarcalismo na formação de oligarquias para o controle das
terras e a dominação política. E na relação social no engenho “seja o
proveniente dos grupos indígenas, seja o originado das importações de
escravo negro; nele o português é a figura dominante” (idem, p. 85).
Portanto, trata-se exclusivamente de “constituir-se em aristocracia”,
formando a oligarquia política, de tal forma que:

“É em derredor dos engenhos e das famílias dos senhores de


engenho – os Lins, Wanderley, Aciolli, Barros, Pimentel, Botelho,
Soares, Bezerra, Calheiros, Gomes de Melo, Carvalho – que se

forma a sociedade alagoana” (idem, p.49).

Os engenhos sofreram mudanças em seus sistemas produtivos e


tiveram de se submeter ao poder das usinas modernas, diante da sua
capacidade de moer em larga escala e em menor tempo. Com o aumento
de sua capacidade de moagem, aumenta também a sua concentração de
terras para ampliar a plantação canavieira de tal modo que “hoje, há
usinas nas Alagoas que possuem canaviais através de terras de três ou
quatro Municípios: os velhos engenhos cederam à pressão da força maior”
(idem, p. 205).

A usina surge “absolutamente liberta do trabalho escravo” com uma


“tendência de expansão territorial. Do latifúndio, do devoramento de
8

terras para o plantio de cana. Aperfeiçoamento da monocultura”.


Consequentemente o crescimento da monocultura impulsionado pelas
usinas gerou “a irregularidade e a deficiência, do suprimento de outros
gêneros: carne, leite, ovos, legumes, grãos alimentícios, cereais” (idem,
p. 149).

O crescimento da usina já mostrava seus resultados como em 1913


quando “Alagoas liderou a exportação nacional do açúcar, concorrendo,
com 74,5%. Ao fim do período citado havia no Estado 8 usinas e 7 meios-
aparelhos, andando ainda na vizinhança dos 1.000 o número de banguês”.
Devido à crise capitalista que assolava o mundo no período conhecido
como “a grande depressão” iniciada em 1929, vai se tomar uma “série de
providências, visando a amparar tanto a lavoura como a indústria”,
resultando na formação da “Comissão de Defesa do Açúcar transformada
depois em Instituição do Açúcar e do Álcool (IAA)” (idem, p. 158).

Nesse contexto, Alagoas se integrava ao complexo nacional da


agroindústria canavieira no nordeste, com uma industrialização
influenciada nos estados de Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Ceará.
Conforme explica Araken Alves de Lima, em Alagoas e o complexo
agroindustrial canavieiro no processo de integração nacional4 (2006), “a
atuação do Estado teria influenciado o processo de reprodução do capital e
da força de trabalho na região” (Lima, 2006, p.9).

No quadro de exportação apresentado por Lima vemos que “a


importância do açúcar foi determinante para a formação de receitas de
exportação, chegando ao ponto de, no ano de 1953, as vendas externas
alagoanas terem sido quase exclusivamente de açúcar” (idem, p. 92).

No ano de 1950 o município de Penedo contava com uma área de


60.300 hectares (ha) e sua área de plantio era de apenas 6 hectares. Já
no ano de 1990, este conta com uma área de 69.070 hectares, sendo

4
Araken Alvez de Lima. O nordeste e a integração nacional, in: Alagoas e o complexo agroindustrial
canavieiro no processo de integração nacional. Campinas, SP: 2006
9

ocupada com plantio de cana em 13.710 hectares (idem, p. 107). Houve


um aumento no domínio de terras dos anos de 1940 até os finais de 1990,
tanto para a pecuária e principalmente para a agroindústria canavieira, no
qual:

“o que se percebe com toda clareza é o forte avanço da lavoura


temporária, que na verdade representa a expansão canavieira e a
profunda destruição da mata atlântica que, de 465 mil hectares
passou a ocupar algo em torno dos 174 mil hectares, uma redução
de área da ordem de 62%” (ibdem, p. 113).

Os usineiros alagoanos se constituíram como “um grupo hegemônico


que consolidou uma nova estrutura produtiva, dominou as estruturas
formais de poder no Estado, tornou-se a espinha dorsal da economia
estadual e estabeleceu um padrão de dominação nas relações sociais”
(idem, p. 122).

A disputa pelo controle do Estado mostra claramente os interesses


da burguesia agroindustrial em Alagoas. É comum que o Governo do
Estado de Alagoas atenda aos interesses dos usineiros, como por
exemplo, isentando o setor ou reduzindo a taxa de cobrança do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Nos anos 90 (ROCHA, 2017)5 Alagoas passou por um episódio de


crise econômica política muito intensa, que culminou em um levante
popular, envolvendo trabalhadores de diversas categorias do serviço
público contra o Governador Suruagy na Capital em Maceió. O “acordo dos
usineiros” foi um dos principais motivos da crise econômica que resultou
na revolta popular. Além de isentar, ou mesmo reduzir, o pagamento do
ICMS dos usineiros, o Estado determinou que fosse devolvido aos
usineiros dez anos de cobrança, de tal forma que “o setor sucro-
alcooleiro, que em 1983, participava da arrecadação de ICMS com
58,02%, teve sua participação reduzida para 1,48% em 1991”. Para se

5
ROCHA, Luiz Gomes da. O levante de 1997: policiais civis e militares na derrubada do governador
Suruagy. Maceió: Edições Nosso Mundo, 2017.
10

ter uma ideia do abuso dessa devolução, “na data em que foi realizado o
cálculo, 10/96, o estado já havia restituído ao setor R$358,05 milhões, ou
seja, R$291,81 milhões a mais do que o suposto direito”6.

Entre 2007 e 2011 houve uma queda na arrecadação do ICMS ao


setor, havendo assim uma exigência para que o secretário da Fazenda, o
usineiro Maurício Toledo, explicasse o motivo da falta de pagamento do
setor sobre o ICMS.

Em julho de 2018, o Governador do Estado de Alagoas isentou


novamente o setor sucroalcooleiro no pagamento do ICMS7. Essa decisão
foi tomada em um momento bastante difícil para centenas de
trabalhadores da PAISA em Penedo.

Dados divulgados pelo Governo do Estado de Alagoas8, através da


Secretaria de Estado do Planejamento, Gestão e Patrimônio (SEPLAG),
define a mesorregião do leste alagoano como “a mais desenvolvida
economicamente, especialmente graças as suas condições
edafoclimáticas, que compreende solos férteis e clima chuvoso,
possibilitando uma maior variedade de produção agrícola, especialmente,
a cana-de-açúcar, cultura exigente em terras de boa qualidade para
produção em larga escala”. Essa mesorregião leste “é composta por
cinquenta e dois municípios, incluindo a capital do estado, Maceió, e está
subdividida em 6 microrregiões: Serrana dos Quilombos; Mata Alagoana;
Litoral Norte Alagoano; Maceió; São Miguel dos Campos e Penedo”. O
documento aponta ainda que “a cana-de-açúcar continua sendo a principal
atividade agrícola do leste alagoano” (NEP-SEPLAG, 2017, p.3). É de
reconhecimento do Estado, através deste documento, que:
6
Araken Alves de Lima. A crise que vem do verde da cana: uma interpretação da crise financeiro do
Estado de Alagoas no período 1988-96. Maceió: EDUFAL, 1998. p.46.
7
Governador de Alagoas assina decreto que diminui ICMS para setor de cana-de-açúcar. Disponível
em https://www.cadaminuto.com.br/noticia/324276/2018/07/30/publicado-decreto-que-reduz-carga-
tributaria-para-setor-sucroalcooleiro-de-alagoas. Acessado em julho de 2021.
8
Núcleo de Estudos e Projetos. Secretaria de Estado do Planejamento, Gestão e Patrimônio.
Diversificação Produtiva como Alternativa para a área Canavieira de Alagoas. Secretaria de Estado
do Planejamento, Gestão e Patrimônio. – Maceió: SEPLAG, 2017. Disponível em
https://dados.al.gov.br/catalogo/dataset/fab1d5e2-e649-40fd-a965-
cd5b73235914/resource/cba8eba9-8254-4056-ad08-dc8c07268188/download/canavieira.pdf.
11

“Alagoas é um Estado com forte tradição na produção de cana-de-


açúcar, desde a sua formação e até mesmo após sua
independência de Pernambuco, constituindo, assim, na sua
formação econômica até os dias atuais. Mesmo após diversas
crises que afetaram o setor sucroalcooleiro no estado, a cana-de-
açúcar continua sendo o termômetro que baliza a economia
agrícola de Alagoas, em especial, a sua produção para
exportação.” (ibdem, p.6)

Outra caracterização apresentada no documento é que o uso do


“trabalho humano e a eficiência do trabalho escravo sob orientação do
senhor de engenho, tem-se as condições ideais para a cultura açucareira
prosperar em Alagoas, deixando de lado os demais tipos de produção”.
(idem p. 6). Trata-se então de entender as raízes coloniais e escravagistas
desenvolvidas através de uma monocultura que permite a expansão e a
dominação das oligarquias açucareiras no Estado de Alagoas.

Em relação “as demais atividades agrícolas, quando realizadas,


ainda são do tipo subsistência ou sua produção torna-se limitada, (...)
pelo fato da monocultura da cana ser extremamente exigente em terras
férteis e viável apenas no caso da produção em larga escala, daí resulta a
concentração da terra na mão de poucos, inviabilizando a produção de
outras culturas agrícolas”. (idem, p. 7).

Podemos observar que entre 2000 e 2015 houve um crescimento na


colheita da cana de açúcar em toda a mesorregião leste de Alagoas. Com
relação à microrregião de Penedo seu aumento foi “de 17.747 hectares
em 2000, para 35.644 hectares em 2014, ou seja, dobrando a área
colhida nesse mesmo período” e “praticamente manteve a sua produção
ao longo dos anos analisados, apresentando uma ligeira queda, saindo de
1.229.607 para 1.156.863 toneladas em 2015, ou seja, 6% de redução”
(idem, p. 8-9). É a partir de 2014 que ocorre diversos episódios trágicos
para a vida de trabalhadores e trabalhadoras na cidade de Penedo.
Momento em que a usina PAISA rompe com suas obrigações aos direitos
trabalhistas.
12

A usina PAISA, pertencente aos usineiros do Grupo Toledo, se insere


nessa tradição política e econômica de monocultura. Fundada nos anos de
1970, foi um dos principais polos econômicos na região. Como podemos
ver nos mapas abaixo, a usina PAISA pertence a uma rede de usinas
associadas na Cooperativa Regional dos Produtores de Açúcar e Álcool de
Alagoas – CRPAAA. Todas as usinas estão instaladas na mesorregião leste
de Alagoas, de norte a sul. Na figura 1 contabilizamos cerca de 10 usinas
na CRPAAA. Ver figura1.

Figura 1. Cooperativa Regional dos Produtores de Açúcar e Álcool de Alagoas – CRPAAA.


(fonte: Otimização do planejamento hierárquico da produção em usinas cooperadas do setor
9
sucroenergético ).

Já na figura 2, segundo dados do próprio Governo de Alagoas,


podemos ver um total de 17 usinas operantes no ano de 2018, incluindo a
PAISA, que terá seu processo industrial paralisado no final deste ano se
estendendo ao ano de 2021, sem previsão de reativação de sua produção
industrial. Ver figura2.

9
Disponível em https://www.scielo.br/j/prod/a/VmjZnYKDs9Gk6nWQsgdFNRh/?lang=pt. Acessado em
julho de 2021.
13

Figura 2 Usinas e destilarias de cana-de-açúcar do Estado de Alagoas 2018. (fonte:


10
dados.gov.br ).

Na figura 2 podemos ver a quantidade de cana-de-açúcar produzida


em 2018 por toneladas. O município que mais produziu foi o município de
Coruripe com as usinas Coruripe e Pindorama com um processamento de
2.000.001 a 2.900.000 toneladas. O município de Penedo e Igreja Nova,
com as usinas PAISA e Marituba, produziu uma média entre 200.001 a
600.00 toneladas no ano de 2018 cada.

10
Disponível em https://dados.gov.br/sr/dataset/usinas-e-destilarias-em-alagoas/. Acessado em julho
de 2021.
14

CAPÍTULO 2 – A LUTA DE CLASSES E O SINDICALISMO NO


BRASIL

A história do Brasil está marcada por inúmeros conflitos,


principalmente nas áreas rurais, tendo em vista a especificidade do país
para a agricultura com sua tardia industrialização. Os sujeitos
protagonistas de lutas por direitos foram em sua maioria camponeses,
trabalhadores rurais, povos indígenas e a população negra afro-brasileira.
Com a crescente modernização se formam as classes operárias que são
compostas por imigrantes e uma parcela de trabalhadores livres no Brasil
do fim da escravidão (XIX) e início da República (XX).

As condições insalubres, as jornadas de trabalhos extensas, a


imposição do trabalho infantil e a remuneração baixa e desigual entre
homens e mulheres, agravavam as condições de vida de milhares de
trabalhadores do mundo inteiro. Muitas das vezes as condições eram
análogas à escravidão.

A forma que a classe trabalhadora tinha para estabelecer sua força


na luta contra a classe dominante foi através “das sociedades de socorros
mútuos, que se transformaram progressivamente em sociedades de
resistência (sindicatos)”11. O radicalismo das sociedades de socorros
mútuos, tradição de uma primeira geração de socialistas, irá lançar as
bases para as Sociedades de Resistência, que são os sindicatos, na
segunda geração de socialistas. E assim, desde o surgimento desta prática
organizacional da classe trabalhadora, é que se define teoricamente o
Sindicalismo de Intenção Revolucionária.

Os sindicatos são então impulsionados por uma tradição socialista e


que mais tarde o anarquismo teria formulado suas teses e suas práticas
que foram amplamente difundidas no mundo a partir do final do século

11
Felipe Correa. O Anarquismo e o Sindicalismo de Intenção Revolucionária: da Associação
Internacional dos Trabalhadores à Emergência na América Latina. p. 1.
15

XIX. No Brasil, o sindicalismo de intenção revolucionária terá uma grande


influência até as três primeiras décadas do século XX. Portanto “o
sindicalismo de intenção revolucionária – especialmente em suas
duas mais relevantes modalidades, o sindicalismo revolucionário e
o anarcossindicalismo – constituem estratégias históricas do
anarquismo” (Idem, p. 44. Grifos meu). As origens da organização e da
luta sindical no Brasil, com suas diversas conquistas para a classe
operária, muitas das quais se tem até hoje, teve uma forte e quase que
exclusiva influência das ideias e práticas políticas do anarquismo.

E não somente de imigrantes europeu foi à influência e o


crescimento do anarquismo brasileiro e o sindicalismo de intenção
revolucionária, sendo “ao mesmo, também como em outros países, ele
seguramente envolveu trabalhadores locais, muitos dos quais haviam tido
experiências prévias de envolvimento em conflitos sociais” e a “a sua
principal estratégia de atuação durante a Primeira República foi o
sindicalismo revolucionário” (idem, p. 46. Grifos meu).

Algumas de suas relevantes contribuições organizacional da classe


operária foi à criação de sindicatos, bolsas trabalhistas, jornais operários,
teatros e inclusive de algumas escolas libertárias, conforme podemos ver
em Alexandre Samis12 e Christina Lopreato13.

Em 1906 a União Operária Alagoana havia participado do 1°


Congresso Operário Brasileiro organizado pela Confederação Operária
Brasileira (COB), organização sindical criada e impulsionada pela
militância anarquista (Samis, 2004, pp. 134-135). Em 1913 ela é
refundada, no 1° de maio, como Federação Operária Alagoana, e participa
do 2° Congresso Operário Brasileiro. O delegado pela Comissão Executiva
da FOAL, o gráfico Virgínio de Campos, “chegou a secretariar Edgard

12
Alexandre Samis. Pavilhão Negro Sobre Pátria Olivia: Sindicalismo e Anarquismo no Brasil. In:
História do Movimento Operário Revolucionário. Tradução Plínio Augusto Coêlho. São Paulo:
Imaginário; São Caetano do Sul: IMES, Observatório de Políticas Sociais, 2004.
13
Christina Lopreato. O espírito da revolta. Disponível em
http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/279980. Acessado em junho de 2021.
16

Leuenroth na condução dos debates” e apresentou um relatório


informando que ao todo a Federação contava com 422 membros e possuía
uma “pequena biblioteca”. Informava ainda as greves e seus resultados
positivos. Outra ação efervescente “foi o surgimento, em 1915, de vários
jornais operários, como O Debate, O Rebate e A Semana Social, este
último dirigido por Antônio Bernardo Canellas a partir de 1917”14.

De maneira geral podemos dizer que o “processo de burocratização


do sindicalismo brasileiro teve início ainda no século passado, durante a
Era Vargas (1930-1945). Foi intensificado pelo surgimento do ‘trabalhis-
mo’ nas décadas de 1940 e 1950, alcançando seu auge durante a
Ditadura Empresarial-Militar (1964-1985)”15 (Coordenação Anarquista
Brasileira [CAB]. Sindicalismo e Luta. 2017, p. 4).

Estes mecanismos e processos de burocratização dos movimentos


sociais foram muito bem esquematizados e explicados por Felipe Corrêa
(2011) em Ideologia e Estratégia16. O autor apresenta que em geral são
“seis mecanismos que dão origem aos dois processos de burocratização”.
Como podemos na figura a baixo:

14
A Federação Operária Alagoana e as primeiras greves. Disponível em:
https://www.historiadealagoas.com.br/federacao-operaria-alagoana-e-as-primeiras-greves.html.
Acesso em junho de 2021.
15
Sindicalismo e Luta. Coordenação Anarquista Brasileira (CAB). 2017.
16
Felipe Correa. Movimentos Sociais, Burocratização e Poder Popular: da teoria à prática. p. 179. In:
Ideologia e Estratégia: anarquismo, movimentos sociais e poder popular. São Paulo: FAÍSCA
PUBLICAÇÕES LIBERTÁRIAS, 2011.
17

Figura 3. Felipe Corrêa. Mecanismos e Processos de burocratização dos movimentos sociais.


2011, p. 184.

Discutindo Sindicalismo e Movimentos Sociais, Alexandre Samis


(2008)17 faz um importante resgate e caracterização sobre o contexto de
formação dos modelos e práticas sindicais vigentes que surge numa
tradição de combate frente ao arrocho salarial e aos diversos problemas
enfrentados pela classe trabalhadora na ditadura militar, principalmente
do momento da redemocratização iniciada em 1985 até os dias atuais.

Samis nos mostra que nesta conjuntura de lutas operárias


“evidenciava-se uma ruptura irreconciliável entre os setores mais
radicalizados e a antiga burocracia sindical”. Apresenta que “já na I
CONCLAT, a de 1981, o tema da greve geral, tradicional bandeira do
sindicalismo revolucionário, aparecia para clivar a distinção entre os
grupos presentes” (idem, p. 1).

Surgiu a Comissão Pró-Central Única dos Trabalhadores (CUT) na


qual “nascia com um estatuto provisório que destacava a sua
independência dos patrões, do governo, dos partidos políticos e dos

17
Alexandre Samis. Sindicalismo e movimentos sociais. Minas Gerais: 2008. Disponível em
https://quebrandomuros.files.wordpress.com/2015/04/sindicalismo-e-movimentos-sociais.pdf.
Acessado em junho de 2021.
18

credos religiosos”, bem como “definia-se pela autonomia e a liberdade


sindical, a organização por ramo de atividade produtiva e a organização
por local de trabalho, as então em voga ‘comissões de base’.”, opção que
“colocava-a na linha direta de sucessão da tradição sindicalista
revolucionária dos primeiros anos do século XX, não apenas no Brasil
como na França, EUA e outros países em igual período” (idem, p. 2).

No entanto em 1988, no III CONCUT, “a burocracia sindical ganhou,


por assim dizer, definitivamente a Central Única dos Trabalhadores” e a
partir de 2002 “passou a identificar sua política com as diretrizes
defendidas pelo novo governo” deixando claro por tanto “o acelerado grau
de burocratização da entidade de classe” (idem, p. 2).

Alexandre Samis definiu os sindicatos hoje a partir de três condutas


distintas.

Segundo a definição de Samis, há no Brasil atualmente os sindicatos


Colaboracionistas/Chapa-branca, sendo estes “os sindicatos que hoje
representam mais claramente os interesses do governo/patrões” (Samis,
2008, p. 2). Por tanto, “subordinam sua política a postulados puramente
economicistas, encarando o governo como um interlocutor legítimo, uma
instância imprescindível e fundamental na resolução dos problemas” e
ainda que “invocando no campo da retórica imagens tradicionalmente
esposadas pelo campo socialista, o que fazem, no mais das vezes, é re-
significar o conteúdo das lutas dos trabalhadores em favor da conciliação
de classe”. Os ganhos mais imediatos nesse tipo de sindicalismo “passam
a ser encaradas como um fim em si mesmo”.

Outra forma sindical existente atualmente é os sindicatos


Corporativos. Em sua definição são os “sindicatos que, em determinada
conjuntura, apresentam certo grau de combatividade (...) a partir de uma
pauta quase exclusivamente econômica, aproveitando as crises e as
agendas eleitorais para arrancar do governo as melhorias imediatas”.
Seus métodos “acabam por reforçar muito mais o campo do ativismo
19

sindical – importante de fato, entretanto insuficiente – ao investirem


exclusivamente na reação às medidas governamentais” e dessa forma
agem “estimulados pelas agendas eleitorais e políticas do Estado, ainda
que em oposição a elas”. As lutas sindicais neste campo estão por tanto
“ancorados no que é apenas visível, ou seja, as necessidades imediatas,
esquecem do que é desejável, a mudança radical em favor de todos e não
apenas da categoria”.

A terceira conduta sindical definida por Samis é o Sindicalismo de


Resistência, “identificada por sua ação em associação com seus
postulados teóricos” de tal forma que “articula a teoria revolucionária, que
podemos chamar de socialismo, com suas ações políticas e sociais,
instituindo a primeira em conformidade com a realidade específica da
segunda”. Esta forma de organização e atuação sindical “preocupa-se com
as necessidades imediatas” e “propõe-se a um enfrentamento mais claro e
efetivo do Estado burguês” (Samis, 2008, p. 3).

Uma vez tendo definido as três condutas sindicais vigentes, Samis


levanta discussões sobre “três etapas importantes para o desenvolvimento
de um programa estratégico de classe no sindicalismo”. A primeira etapa
se refere aos ganhos de curto prazo, sendo, por exemplo, as campanhas
salariais bastante utilizadas. Em relação às “questões de curto prazo, os
sindicalismos colaboracionista, corporativista e mesmo o de
resistência, as vezes se parecem muito” (idem, p. 4).

É nas questões de médio e longo prazo que essas condutas sindicais


se distanciam. Segundo Samis, “na realidade, tanto os colaboracionistas
quanto os corporativistas, não possuem as dimensões de médio e longo
prazo, (...) se guiam pelo pragmatismo, (e) dificilmente vão além do que
se apresenta de imediato”. Por tanto, sua conduta muitas das vezes “os
remete sempre ao mesmo ponto, percorrendo o mesmo trajeto, em idas e
vindas, em um jogo de soma zero que acaba por favorecer sempre aquele
que é, de fato, o causador do problema”.
20

Em relação aos sindicatos de resistência “buscam sempre em


seus programas estratégicos salientar as questões de médio e longo
prazo” por acreditar que são:

“nas projeções mais de fundo, aquelas que irão possibilitar o


contato com um universo mais amplo de explorados e, a partir daí,
consolidar a luta ideológica contra o capital, que se encontra a real
estratégia para o desmonte de toda a estrutura que garante a
manutenção do atual sistema” (idem, p. 4).

Ou seja, permanecer no campo de ganhos imediatos em


determinadas conjunturas por determinadas categorias, mantem intacta
as estruturas de exploração e dominação capitalista, e possibilita que todo
o acúmulo de força social resulte em um reformismo pragmático sem
perspectiva de mudanças estruturais profundas a médio-longo prazo.

Os conselhos de trabalhadores, preconizados pelo sindicato de


resistência, defende a autonomia e a ação direta como métodos de luta,
e “para a produção e a regulação da natureza do trabalho de cada
categoria, indica o regime da autogestão generalizada”, estimulando
também “atitudes que unifiquem todas as frentes de luta: a econômica, a
política e a ideológica, tendo-se como fim a edificação da nova sociedade”
(idem, p. 5).

Essa “estrutura organizativa é fundamental para impedir a


burocratização dos sindicatos, o distanciamento entre a base e a direção e
a dicotomia entre massa e vanguarda”, sendo “a burocracia, [um] triste
emblema ostentado pela maioria das entidades, [e] continua, a despeito
de louváveis esforços de uns poucos, a representar sérios limites ao
desenvolvimento das políticas de médio e longo prazo” (idem, p. 6). Felipe
Corrêa, em seu programa antiburocrático e o projeto de poder popular,
propõe “contra-mecanismos que levam a contra-processos” que “possam
desburocratizar os movimentos sociais e construir o que podemos chamar
de poder popular” (Corrêa, 2011, p. 199). Vejamos na figura a baixo.
21

Figura 4. Felipe Corrêa. Contra-mecanismos e contra-processos de desburocratização dos


movimentos sociais. 2011, p. 200.

Samis pontua que “no caminho inverso estão, entretanto, outros


setores organizados ou em vias de organização”, sendo atribuídos como
movimentos sociais, contendo procedência diversa, pluralidade,
especificidade e elementos comuns. Nesses movimentos sociais “os eixos,
como no passado, na Associação Internacional dos Trabalhadores, são
sempre de viés econômico”. Entre esses movimentos sociais estão
Movimento dos Trabalhadores Desempregados, Movimento Nacional dos
Catadores, Movimento dos Sem-Teto, Movimento dos Trabalhadores Sem-
Terra, Movimento Passe-Livre, Movimento de Organização de Base, além
de muitos outros.

Esses movimentos “em comum, e isso encontra correspondência nos


comunicados e panfletos, possuem a radicalidade. Aquela disposição para
o confronto, típica das pautas de médio e longo prazo”. E que “a despeito
da tentativa de apropriação dos movimentos por alguns partidos, e
mesmo a clara atuação de militantes destes nas bases ou direções, boa
parte da massa trabalhadora envolvida preserva um grau de
independência satisfatório”, sendo essas forças sociais “a expressão sem
22

retoques da luta de classes, a unidade pela ação e pelos propósitos,


movimentos que conseguem nas suas bandeiras, algumas muito simples,
sintetizar e aglutinar os esforços e esperanças de todo um setor de
excluídos” (idem, p. 7). Nesse sentido, segundo Samis, “o sindicalismo,
para tanto, deve aproximar-se dos movimentos sociais para novamente
reencontrar nesta simbiose política a vocação revolucionária” (idem, p. 8).

Agora que identificamos os tipos vigentes de sindicalismo e, ainda


que de maneira breve os desdobramentos de sua tradição histórica, nos
concentremos em analisar o conflito de classe ocorrido na usina Penedo
Agroindustrial S/A (PAISA), no município de Penedo, Estado de Alagoas-
BR, entre os anos de 2015 e 2016.

Em conformidade com as definições de Alexandre Samis e Felipe


Corrêa, iremos trabalhar por um lado com o conceito de movimento social
em relação à luta operária na indústria, e por outro lado, com o conceito
de sindicato colaboracionista/chapa-branca em relação ao Sindicato
dos Trabalhadores na Indústria de Açúcar e Álcool de Alagoas
(STIAAL-UGT) que em um momento de emergência o STIAAL pouco ou
nada fez para a defesa e a conquista dos direitos da classe trabalhadora.
23

CAPÍTULO 3 – A LUTA DOS TRABALHADORES E A QUESTÃO


SINDICAL NA PAISA

A classe trabalhadora na usina PAISA sofreu inúmeras situações de


violência e injustiça cometidas pelos empresariais capitalistas da
agroindústria canavieira entre os anos de 2014 e 2016 – realidade que
não se encerra por aí e perpassa até os dias atuais (2021) as situações de
injustiças.

Um por um, em sua maioria, os trabalhadores e trabalhadoras


começaram a parar as suas atividades nos diferentes setores de produção
da usina. Foi por uma necessidade econômica que os trabalhadores se
colocaram como protagonistas de paralisações e greves na indústria
através da ação direta pacífica, sem intermediações de negociantes ou de
dirigentes do sindicato da categoria. Essa situação se estende pelo menos
até o ano de 2019, quando definitivamente a usina PAISA encerra suas
atividades ao entrar em um processo de Recuperação Judicial (RJ),
demitindo assim basicamente todos os trabalhadores da indústria e do
campo.

Durante todo esse processo de luta operária, o sindicato da


categoria na indústria em Alagoas permaneceu em conciliação com os
industriais da usina PAISA, podendo assim ser caracterizado enquanto um
sindicato colaboracionista com os patrões e os governos. Nesse caso, a
prática burocrática e assistencialista do STIAAL não contribuiu na
mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras da PAISA, principalmente
nos momentos de maior intensidade na luta de classes travada entre os
interesses capitalista e os interesses da classe trabalhadora.

Nas greves e paralisações havia casos em que os trabalhadores


discutiam diretamente com os engenheiros da usina PAISA (os “doutores”,
como queriam que fossem chamados para manter o status de hierarquia e
superioridade frente aos trabalhadores). Esse embate acabava muitas das
24

vezes intimidando os trabalhadores e trabalhadoras por se encontrarem


desprotegidos/as e sem nenhum tipo de apoio, nem mesmo do próprio
STIAAL.

Podemos observa nesse momento que pela ausência de uma


formação sindical política, instrutiva, que pudesse fornecer orientação
para uma luta sindical organizada coletivamente, os trabalhadores se
encontravam desorientados, sem perspectiva e, ainda que estivessem
reunidos num mesmo espaço e tempo, a usina em seu horário de
trabalho, estavam desunidos e dispersos politicamente, movidos
exclusivamente por um interesse, ou melhor, por uma necessidade
comum a todos: a questão econômica.

Diante desse cenário, a classe trabalhadora enfrentava uma luta


política e uma luta econômica18. Por luta econômica, os trabalhadores
enfrentavam “a exploração que os patrões e os comerciantes exercem
sobre o trabalho, graças ao açambarcamento de todos os grandes meios
de produção e de troca” (Malatesta, 2008, p. 70). E por luta política os
trabalhadores enfrentam uma luta contra o Governo, sendo o governo “o
conjunto dos indivíduos que detêm o poder de fazer a lei e de impô-la aos
governados, isto é, ao público” (Idem, p. 74). Observamos isso quando o
Governo do Estado de Alagoas e suas instituições favorecem os usineiros
em uma relação de barganha, enquanto centenas de trabalhadores ficam
vulneráveis e sofrem com esta política nefasta.

O Governo do Estado de Alagoas costumeiramente atende aos


interesses dos usineiros, como por exemplo, isentando o setor ou
reduzindo a taxa de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e Serviços (ICMS). Por volta de 1997, o Estado de Alagoas isentou os
usineiros a pagarem o imposto do ICMS, e ainda, determinou que fosse
devolvido ao empresariado canavieiro o valor “indevido” que foi pago ao
ICMS. Para se ter uma ideia do abuso dessa devolução, “na data em que

18
Errico Malatesta. Escritos Revolucionários. Tradução Plínio Augusto Coelho. São Paulo: Hedra,
2008.
25

foi realizado o cálculo, 10/96, o estado já havia restituído ao setor


R$358,05 milhões, ou seja, R$291,81 milhões a mais do que o suposto
direito”19. Em julho de 2018, o Governador do Estado de Alagoas isentou
novamente o setor sucroalcooleiro no pagamento do ICMS 20. Essa decisão
foi tomada em um momento bastante difícil para a classe trabalhadora na
usina PAISA.

Um fato curioso no caso da usina PAISA é que os primeiros


episódios da luta de classes ocorrem com revoltas dos trabalhadores da
zona rural reivindicando o pagamento do FGTS que estavam sem receber
a dois anos, o seguro desemprego que também não recebiam, e
denunciavam ainda a alimentação servida para o almoço que “chega aos
cortadores de cana em condição imprópria para consumo humano”21. São
eles os primeiros a protagonizarem ações diretas para reivindicar a defesa
e a garantia dos direitos trabalhistas no início da década. Vejamos as
figuras 5 e 6 abaixo.

Figura 5 e 6. Dias 16-17 de fevereiro de 2011. Trabalhadores rurais bloqueiam estradas


reivindicando direitos trabalhistas. Fonte: Aqui Acontece.

Alguns anos mais tarde, a partir de 2014, os trabalhadores da


indústria, a maioria deles sendo da zona urbana de Penedo, foram os

19
Araken Alves de Lima. A crise que vem do verde da cana: uma interpretação da crise financeiro do
Estado de Alagoas no período 1988-96. Maceió: EDUFAL, 1998. p.46.
20
Governador de Alagoas assina decreto que diminui ICMS para setor de cana-de-açúcar. Disponível
em https://www.cadaminuto.com.br/noticia/324276/2018/07/30/publicado-decreto-que-reduz-carga-
tributaria-para-setor-sucroalcooleiro-de-alagoas. Acessado em julho de 2021.
21
Termina 1° dia de protestos de cortadores de cana em Penedo. Fonte:
http://www.aquiacontece.com.br/index.php/noticia/penedo/16/02/2011/termina-1-dia-de-protesto-de-
cortadores-de-cana-em-penedo/24724.
26

protagonistas de cenas de lutas devido ao desrespeito absoluto aos seus


direitos trabalhistas22. A classe trabalhadora na indústria já começava a
sentir as consequências da negligência que a usina PAISA fazia em relação
aos direitos trabalhistas.

As primeiras denúncias surgiram já em 2014, conforme demonstra


as notícias em sites locais, “o juiz do Trabalho André Antônio Galindo
Sobral, da Vara do Trabalho de Penedo, concedeu sentença liminar após o
Ministério Público do Trabalho em Alagoas ajuizar Ação Civil Pública contra
a usina Penedo Agroindustrial S.A. (PAISA) pelo não pagamento de verbas
rescisórias, férias e atraso no pagamento do salário de seus
empregados”23 e em alguns casos havia também “fraude nas datas de
homologação” dos pagamentos. Foi proposto na época um Termo de
Ajustamento de Conduta (TAC), termo este que a usina não firmou. Ficou
decidido que “em caso de descumprimento da decisão liminar, a usina
deverá pagar multa de R$ 5 mil por cada trabalhador que for encontrado
em desconformidade com a lei” e ainda que “a usina deverá continuar a
cumprir os pedidos liminares e pagar multa no valor de R$ 100 mil por
dano moral coletivo, a ser destinado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador
(FAT)”. Na época, um dos principais acionistas da empresa era o ex-
deputado federal, ex-prefeito de Penedo e ex-Secretário da Saúde do
Estado de Alagoas, Alexandre de Melo Toledo24, filiado ao Partido
Socialista Brasileiro (PSB).

A regularidade não se manteve por muito tempo e mesmo sabendo


das multas que poderia receber a usina PAISA não cumpriu com suas
obrigações. No ano seguinte, as consequências do desrespeito e da

22
Há no youtube um vídeo que aborda esse período. “Hoje, funcionários e ex funcionários vivem
indecisos com o futuro de melhores condições de trabalho e de vida”: Sindical. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=yf2-6TpuPnE. Acessado em julho de 2021.
23
Ministério Público do Trabalho obtém liminar na Justiça do Trabalho contra Usina Paisa. Disponível
em http://aquiacontece.com.br/noticia/penedo/12/08/2014/ministerio-publico-do-trabalho-obtem-
liminar-na-justica-do-trabalho-contra-usina-paisa/77631. Acessado em junho de 2021.
24
Falecido em gravidade da covid-19 no ano de 2021. Morre de Covid-19 Alexandre Toledo, ex-
deputado federal e ex-secretário da Saúde de Alagoas. Disponível em
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2021/03/30/morre-de-covid-19-alexandre-toledo-ex-deputado-
federal-e-ex-secretario-da-saude-de-alagoas.ghtml. Acessado em junho de 2021.
27

negligência começavam a pesar sob as vidas dos trabalhadores e suas


famílias.

Em 2015 operários da indústria paralisaram suas atividades diversas


vezes em protesto contra a falta de pagamento por meses. No dia 06 de
maio de 2015, mais um ataque opressivo vindo dos usineiros. Durante
uma manhã de paralisação do movimento operário, o Diretor da empresa
junto com Engenheiros resolveu retirar o transporte que levaria os
trabalhadores de volta para a cidade. Numa distância de
aproximadamente 9 km, os trabalhadores tiveram que voltar para suas
casas por volta de 13h da tarde a pé, fadigados, humilhados e indignados.
Demissões individuais foram feitas para “servir de exemplo” aos demais.

No dia 7 de maio é publicado a seguinte notícia: Funcionários da


PAISA protestam por salários atrasados e acabam sem transporte 25.
Segundo a matéria, os problemas que a PAISA passava era reflexo da
“crise que afeta o setor sucroalcooleiro em Alagoas” e que a produção de
2014/2015 ocorreu por apenas um período de 4 meses, devido a
“migração de antigos e grandes fornecedores, que passaram a entregar o
produto para outras duas usinas, localizadas em Igreja Nova e Coruripe”,
situação condicionada inclusive pela falta de pagamento da usina para os
próprios fornecedores.

Alguns trabalhadores lamentavam a situação, como mostra os


relatos: “começamos a protestar pelos nossos direitos, acabamos punidos,
cortaram o transporte que nos leva para Penedo”. E alertava para a
recorrência das injustiças: “o problema não é recente, tanto que no final
de 2014, o Ministério Público do Trabalho firmou um acordo com a usina
para o cumprindo de algumas medidas. Com a persistência do atraso nos
salários, resolvemos protestar, cruzar os braços. E o resultado, foi à
punição”.

25
Funcionários da PAISA protestam por salários atrasados e acabam sem transporte. Disponível em
http://aquiacontece.com.br/noticia/penedo/07/05/2015/funcionarios-da-paisa-protestam-por-salarios-
atrasados-a-acabam-sem-transporte/89668. Acesso em junho de 2021.
28

Internamente, as relações entre patrão e trabalhador iam se


desgastando profundamente de maneira geral, abrindo assim um leque de
discussões entre os trabalhadores sobre o que estava acontecendo e como
mudar essa situação para garantir seus direitos e seu trabalho
dignamente.

Havia um atraso em pagamentos salariais que se estendia desde


meados do ano de 2014. No mês de abril de 2015 a situação era grave,
com acumulo de várias quinzenas salariais não pagas, de férias não
remuneradas e de 13° salário fraccionado e retido. Na semana que se
encerra o mês de abril e inicia o mês de maio, os trabalhadores estavam
aflitos diante do declínio de sua condição econômica e do desrespeito às
leis trabalhistas. Na quinta feira do dia 30 de abril, com pouco mais de um
mês sem receber qualquer tipo de pagamento, os trabalhadores não
tinham nenhuma informação se iriam receber algum pagamento para este
feriado que iniciaria no dia em que se comemora o Dia Internacional do
Trabalhador, o 1° de maio, na sexta feira. Com um sentimento de
impotência, os trabalhadores voltaram para suas casas no ônibus
acompanhados de um silêncio angustiante durante o percurso.

Ao retornarem para a empresa na terça feira (5 de maio de 2015),


ainda sem receber nenhum pagamento, os trabalhadores registram a
entrada na empresa e permanecem nos seus setores em greve como
forma de protestos à falta de cumprimento aos seus direitos. Nesse dia,
os trabalhadores permaneceram os dois horários, durante o dia todo
paralisado.

Ao irem a indústria na quarta (6 de maio de 2015), com muita


indignação, entraram em greve novamente, dessa vez não queriam ficar o
dia todo na empresa, e fizeram “horário corrido” de 7h até as 13h para
poder voltar de uma vez só para casa. No entanto, como forma de
enfraquecer e dispersar os trabalhadores nessas paralisações, em uma
decisão inesperada e ainda mais cruel, por volta de 11h, a Direção da
29

empresa, junto a engenheiros e gerentes, decide por suspender o


transporte que levaria os trabalhadores para cidade, numa distância de
aproximadamente 9 km.

Na verdade, internamente na mobilização dos trabalhadores se


percebia um grande medo, resultado da ausência de uma estrutura
organizativa da classe trabalhadora, que acabou dividindo a categoria
entre os indecisos receosos e os indignados mais ativos.

A gerencia exigia que os trabalhadores fizessem o horário normal,


entrando de 7h e saindo para almoço de 11:30h, retornando de 13:30h e
largando de 17:30h. Os trabalhadores insatisfeitos e indignados, não
queriam ficar o dia todo na empresa, querendo ir para suas casas de 13h
e não retornar mais. A figura a baixo mostra os trabalhadores em
paralisação.

Figura 7. Dia 06 de maio de 2015. 11h53m. Funcionários em paralisação contra a falta de


pagamento. (Arquivo pessoal)

Desse modo a gerencia determina que o ônibus fosse circular em


horário de 11:30h e nega a saída de 13h com qualquer trabalhador. Os
indecisos receosos acabaram indo embora de 11:30h. Já os indignados
mais ativos permaneceram até 13h, no entanto, sofrendo com o castigo
cruel aplicado pelos “doutores”. Desacreditados, peregrinam saindo da
30

indústria em direção à cidade por volta de 13h. Com o sol fervendo,


famintos, com poucas energias, os trabalhadores ainda percorrem cerca
de 30min, até que algumas pessoas começaram aos poucos levar os
trabalhadores em seus carros pequenos e suas motos. Por sorte, houve
esse ato de solidariedade. Vejamos algumas imagens desse momento.

Figuras 8, 9, 10 e 11. 06 de maio de 2015. 13h11m. Após paralisação, engenheiros corta


transporte e obrigam trabalhadores irem a pé pra suas casa às 13h! (Arquivo pessoal)

No dia seguinte os trabalhadores voltaram para a indústria e,


inacreditavelmente, aos poucos foram retornando ao trabalho com um
silêncio desolado – o que reforça a hipótese de que a falta de formação
sindical que conscientizasse os trabalhadores sobre seus direitos
trabalhistas e sobre as formas de luta e organização sindical contribuiu
para a própria insuficiência dessa fase “imatura” de lutas dos
trabalhadores na indústria, algo que se explica pela própria falta de
31

organicidade (ausência de assembleias, reuniões, estabelecimento de


pautas/objetivos, deliberações coletiva da categoria, etc.) dos
trabalhadores durante todos os momentos de paralisações na indústria.

Essa situação estava em pauta por toda a cidade. Em alguns dias é


publicada uma notícia no qual em entrevista a uma rádio local o advogado
da PAISA, Rogério Galvão, alegava que “a Paisa luta para sobreviver”26,
quando na verdade se tratava de negligência e omissão, pois os usineiros
estavam totalmente cientes do processo que vinha acontecendo, e quem
estava lutando para sobreviver de fato era classe trabalhadora com suas
famílias. Diante de todo esse cenário, mesmo com a expectativa de
recuperar o “fôlego com moagem na safra 2016\17”27, as decisões
estavam sendo tomadas para um cenário desastroso que os trabalhadores
e trabalhadoras passariam.

No final do mês de março de 2017 houve uma demissão de cerca de


260 trabalhadores28. A Direção decidiu reduzir 20% no pagamento do
salário dos que permaneceram na Indústria. Os trabalhadores estavam
sem receber o pagamento de duas férias. A situação continuou precária
para os trabalhadores rurais e industriais. Os trabalhadores que estavam
(e ainda estão) com processo na justiça, esperam dolorosamente a
lentidão de resolução dos processos que exige o pagamento de direitos
trabalhistas garantidos por lei.

26
Áudio: Advogado diz que Usina Paisa em Penedo luta para sobreviver. Disponível em
http://www.aquiacontece.com.br/index.php/noticia/penedo/12/05/2015/audio-advogado-diz-que-usina-
paisa-em-penedo-luta-para-sobreviver/89873. Acesso em junho de 2021.

27
Usina Paisa busca fôlego com moagem na safra 2016\17. Disponível em
http://diariopenedense.com.br/2016/11/usina-paisa-busca-folego-com-moagem-na-safra-201516/.
Acessado em junho de 2021.
28
Usina Paisa promove demissão em massa com o desligamento de 260 trabalhadores. Disponível
em http://aquiacontece.com.br/noticia/negocios-economia/28/03/2017/usina-paisa-promove-
demissao-em-massa-com-o-desligamento-de-260-trabalhadores/119013. Acessado em junho de
2021.
32

No mês seguinte, em abril de 2017, a situação se agravava ainda


mais, com familiares denunciando que “Usina Paisa em Penedo não paga
salário e trabalhadores estão passando fome”29.

Tendo em vista a inserção política dentro das estruturas


institucionais do Estado, os usineiros conseguem que um Juiz fizesse a
leitura de 6 mil páginas em um só dia para acatar os pedidos de várias
usinas, incluindo a PAISA. E assim o pedido de Recuperação Judicial (RJ)
foi aceito pela Justiça, sendo determinado que:

“a PAISA especificamente fica autorizada a vender


parte dos seus bens, e com a participação de
administrador judicial, elencar os pagamentos
prioritários – débitos trabalhistas – bem como aos
demais credores em aberto. Isto significa que em prazo
estimado pela própria recuperação judicial a Paísa
quitará todos os seus débitos.”30

E com uma noticia ainda mais agravante, a usina PAISA informou


que não haveria safra em 2018/2019, deixando “cerca de 2 mil pessoas
sem empregos em Penedo”31.

Entre 2017 e 2018, havia iniciado uma articulação entre


trabalhadores e militantes da frente sindical da Resistência Popular
Alagoas, que adota o sindicalismo de resistência. Buscando fortalecer a
luta dos trabalhadores e seus direitos, diversos atos de solidariedade

29
Usina Paisa em Penedo não paga salário e trabalhadores estão passando fome. Disponível em
http://www.reportermaceio.com.br/usina-paisa-em-penedo-nao-paga-salario-e-trabalhadores-estao-
passando-fome/. Acessado em junho de 2021.
30
Justiça acata pedido e autoriza recuperação judicial das usinas em Alagoas. Disponível em
http://www.correiodopovo-al.com.br/index.php/noticia/2017/10/26/justica-acata-pedido-e-autoriza-
recuperacao-judicial-das-usinas-de-alagoas. Acessado em junho de 2021.
31
Não safra 2018/2019 da Usina Paisa deve deixar cerca de 2 mil pessoas sem empregos em
Penedo. Disponível em http://www.aquiacontece.com.br/noticia/negocios-economia/01/08/2018/nao-
safra-20182019-da-usina-paisa-deve-deixar-cerca-de-2-mil-pessoas-sem-empregos-em-
penedo/132485. Acessado em junho de 2021.
33

foram realizados nos bairros populares, nas feiras públicas, no centro


histórico da cidade, denunciando os abusos cometidos pelos capitalistas
da usina PAISA e aclamando a população a se solidarizar com os
trabalhadores. Em nota pública, a frente sindical da resistência já
denunciava a burocracia judicial e inclusive sindical:

“A recuperação judicial sobre a qual a empresa [PAISA] vem


passando não é certeza da manutenção dos postos de trabalho, ou
mesmo de tudo o que é devido aos trabalhadores. Sem
mobilização, a Justiça pode muito bem favorecer os patrões,
recuperando as perdas deles e implicando no desemprego em
massa”32.

O sindicato da categoria dos trabalhadores da PAISA, o STIAAL,


permaneceu totalmente omisso diante dessa conjuntura, não se
apresentou devidamente e não se esforçou para ajudar os trabalhadores a
enfrentarem esses conflitos.

O que se evidenciou, a partir de 2018, foram atos de solidariedade


aos trabalhadores realizados através de uma frente sindical, que possui
como modelo o que Samis caracteriza como sindicato de resistência.

Figura 12, 13 e 14. Ato do Comitê de solidariedade aos trabalhadores da Paisa na feira
pública em Penedo, janeiro de 2019. (Arquivo pessoal)

32
SUSPENSÃO DE MOAGEM AMEAÇA TRABALHADORES DA USINA PAISA DE
DESEMPREGO. Disponível em https://observatorioveiasabertas.com.br/operario-e-
campones/suspensao-de-moagem-ameaca-trabalhadores-da-usina-paisa-de-
desemprego/. Acessado em junho de 2021.
34

CONCLUSÃO – A RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES E A


NECESSIDADE DE UMA ORGANIZAÇÃO SINDICAL CLASSISTA E
COMBATIVA

Fazendo uma breve analise do sistema capitalista33, temos uma


definição bem precisa dessas relações entre capitalistas e a classe
trabalhadora. Segundo o teórico e socialista russo Mikhail Bakunin:

“O que atrai o capitalista para o mercado? É a vontade de


enriquecer, aumentar seu capital, satisfazer suas ambições e
vaidades sociais, poder entregar-se a todos os prazeres
concebíveis. E o que traz o trabalhador para o mercado? A fome,
a necessidade de comer hoje e amanhã. Assim, enquanto o
capitalista e o trabalhador são iguais pelo ponto de vista
jurídico, eles são qualquer coisa, menos iguais, pelo ponto de
vista da situação econômica, que é a situação real.” (idem, p.
13. Grifos meu).

É esta a realidade vivida pelos trabalhadores na usina PAISA – assim


como em outras usinas de Alagoas. Os trabalhadores estão em profunda
desvantagem, sem garantias de direitos, explorados ao máximo e
remunerados ao mínimo. Coagidos e ameaçados pela fome estão
constantemente se sujeitando a jornadas de trabalhas extensas para
garantir um sustento mínimo com sua família, enquanto o capitalista se
apropria ao máximo da riqueza produzida pela classe trabalhadora nas
fábricas e nos campos.

Até os anos de 2021 muitos trabalhadores e trabalhadoras ainda


não receberam os pagamentos em relação às indenizações trabalhistas. E
ainda que tenha sido determinado um “plano de recuperação judicial” não
há transparência de informar uma previsão para o pagamento dessas
dívidas.

33
Mikhael Bakunin. O sistema capitalista. São Paulo: Faísca, 2007. Tradução Thaís Ribeiro Bueno.
São Paulo: Faísca Publicações Libertária, 2007.
35

As lutas travadas pelos trabalhadores neste cenário são geralmente


lutas por ganhos de curto prazo, como a questão salarial. Está relacionado
ao imediato. E nesses objetivos, as três formas de atuação sindical
vigente algumas vezes podem até se assemelhar. Será, no entanto, no
avanço de uma perspectiva a médio-longo prazo que essas formas de
atuação dos sindicatos serão facilmente diferenciadas.

Quando se adota uma perspectiva de classe que passa a questionar


a estrutura capitalista e trava uma luta para a superação dessas formas
de exploração e desigualdade social gerada pelo capitalismo, se cria neste
caso as sociedades de resistência, os sindicatos em sua tradição de
luta socialista e revolucionária.

A mobilização dos trabalhadores na usina PAISA deixou importantes


lições. Por um lado, pode ser possível notar a capacidade de ação
imediata dos trabalhadores para lutar contra as injustiças. Por outro lado,
a lição que deve ser tirada deste episódio é que a ausência de
organização dos trabalhadores no âmbito sindical enfraqueceu e
contribuiu para a dispersão e o enfraquecimento dos trabalhadores.

Os espaços de diálogos que permite fortalecer a luta popular em


seus postos de trabalho e moradia são tão importantes quanto o
trabalho realizado diariamente por toda a sociedade. A organização
social, no caso aqui discutido, a organização sindical, é o meio pelo
qual a classe trabalhadora fortalece a defesa e a conquista de seus
direitos de forma coletiva.

Portanto, faz-se necessário resgatar, repensar e revalorizar as


formas e os significados dos movimentos sociais e do sindicalismo. Tendo
compreendido as formas sindicais vigentes e as limitações encontradas no
sindicalismo colaboracionista e corporativista, podemos aprofundar a
reflexão em relação aos “os princípios norteadores do sindicalismo
revolucionário” como a independência de classe, a solidariedade de
classe, a ação direta, e o federalismo político (Sindicalismo e Luta,
36

2017, p. 6-7), para refletirmos na luta sindical em busca de uma estrutura


classista e combativa, capaz de dar ganhos à classe trabalhadora.

O local do trabalho é também um local de formação da militância


sindical, pois nele surgem os primeiros laços de solidariedade e de
reivindicação por lutas imediatas, a exemplo da questão salarial. Nessa
construção de militância sindical “devemos estimular as instâncias de
base desde os locais de trabalho ou entre os próprios colegas de
setor”, isso porque quando não tem um apoio do sindicato oficial não
significa que devemos esperar pela sua “decisão” de ir ou não à luta, de
formar ou não uma assembleia, de decidir ou não pela greve, pois
organizados pela base “podemos acumular forças para os espaços
oficiais e com as propostas melhor discutidas e com respaldo daqueles
que ajudaram a construir” (idem, p. 14-15. Grifos meu).

Outro aspecto importante a se pensar sobre a luta sindical é de que


obterá mais força quando o movimento sindical se aliar a outras frentes
de lutas, pois “o que pode potencializar a luta contra a burocratização e
aproximar o movimento sindical de posições de resistência e para além do
corporativismo é aliar a luta dos trabalhadores e trabalhadoras em seus
locais de trabalho com a comunidade local e estudantes, por exemplo, de
maneira solidaria e recíproca” (idem, p. 15). Pois a classe trabalhadora é
considerada “como parte das classes oprimidas”, portanto, “os
trabalhadores precisam construir seu protagonismo nesse processo e uma
das saídas é aliando as pautas imediatas com as pautas mais gerais”
(idem, p. 22) como carestia de vida, passe livre, luta por vida digna, etc.

Notamos que a estrutura sindical oficial, seja a


colaboracionista ou a corporativista possui grandes limitações para o
conjunto das classes oprimidas, em especial a classe trabalhadora da
agroindústria canavieira. A tradição do sindicalismo de resistência foi
de grande relevância para as conquistas de direitos da classe
trabalhadora, sendo importante a sua atuação nos dias de hoje.
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