Você está na página 1de 19

47425

Brazilian Journal of Development

A criminalização dos movimentos sociais do campo e o papel da mídia na


manutenção dos interesses capitais

The criminalization of social movements in the field and the role of the
media in maintaining capital interests

DOI:10.34117/bjdv6n7-396

Recebimento dos originais:10/06/2020


Aceitação para publicação:16/07/2020

Julio Cesar Braun


Mestrando em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE
Instituição: Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE
Endereço: Rua Joana D'arc, 207 – Vila Industrial – Toledo – Paraná
E-mail: juliocbraun@gmail.com

Francis Mary Guimarães Nogueira


Pós-Doutorado na Universidade Central da Venezuela – UCV
Instituição: Professora Titular da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE
Endereço: Rua Universitária, 1619 – Bairro Universitário, Cascavel – PR
E-mail: guimanog@terra.com.br

RESUMO
Este artigo pretende analisar a criminalização midiática dos Movimentos Sociais do Campo a partir
da investigação histórica em recortes de jornais disponibilizados no Arquivo Nacional de
Informações dos anos de 1950 a 1985 e compará-los as notícias de jornais atuais e sua abordagem
quanto a luta pela terra e reforma agrária, bandeira explicita do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra. Deste modo, o percurso da análise fundamenta-se na teoria do Materialismo
Histórico dialético, ferramenta pela qual buscou-se verificar quais elementos estão envolvidos na
desqualificação dos movimentos sociais do campo pela mídia jornalística e quais os interesses estão
mediados na produção da representação simbólica e ideológica que criminaliza a manifestação
destes movimentos no cenário brasileiro. Como resultados percebemos que a mídia tem grande
impacto na formação de opinião da sociedade e nas massas, porém neste território fica explícito que
a mídia normalmente utiliza seus mecanismos de persuasão para defender os interesses da classe
dominante e da hegemonia capitalista.

Palavras-chave: Movimentos Sociais do Campo, Mídia, Criminalização, Modo de Produção


Capitalista.

ABSTRACT
This article aims to analyze the media criminalization of Social Movements in the Countryside from
the historical investigation in newspaper clippings made available in the National Information
Archive from the years 1950 to 1985 and to compare them with the news from current newspapers
and their approach to the struggle for land and land reform, an explicit banner of the Landless Rural
Workers Movement. Thus, the path of analysis is based on the theory of Dialectical Historical
Materialism, a tool by which we sought to verify which elements are involved in the disqualification
of social movements in the countryside by journalistic media and which interests are mediated in
Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761
47426
Brazilian Journal of Development
the production of symbolic representation and ideological that criminalizes the manifestation of
these movements in the Brazilian scenario. As a result, we realize that the media has a great impact
on the formation of opinion in society and in the masses, but in this territory it is clear that the media
normally uses its persuasion mechanisms to defend the interests of the ruling class and capitalist
hegemony.

Keywords: Rural Social Movements, Media, Criminalization, Capitalist Mode of Production.

1 INTRODUÇÃO
Os Movimentos Sociais do Campo, são nas duas últimas décadas constituintes do legado
marcado pelo enfrentamento a exploração e expropriação no campo caminho que foi e continua
sendo trilhado por meio da luta e resistência dos camponeses. Para Fernandes (2011, p. 139) “a
história do campo brasileiro é a história da luta contra o cativeiro e contra o latifúndio”. História
manchada por sangue de trabalhadores do campo, exigindo dignidade e terra para a sobrevivência
empunharam sua bandeira e enfrentaram os grandes detentores do capital que apoiados pelo Estado
mantém seus interesses de Classe, dominando e massacrando de forma violenta estes brasileiros,
pois conforme Feitosa & Oliveira (2019, p. 24490) “a dinâmica do capital tem capacidade
sociometabólica de se reproduzir e fazer acreditar que é o único caminho possível”.
Neste processo de desconstrução do ideário produzido pela mídia pretende-se apresentar a
legitimação da crueldade do capital em relação à classe Trabalhadora do Campo e as influências da
mídia na distribuição de notícias tendenciosas visando propagar ideologias de criminalização destes
Movimentos sociais.
Como pressuposto metodológico utilizamos a abordagem materialista histórica que nos
possibilita uma análise criteriosa das contradições envolvidas neste movimento histórico de
criminalização dos movimentos sociais do campo e a manutenção da hegemonia capitalista. Por
meio de pesquisa bibliográfica e documental analisaremos jornais do período de 1950 a 1960
disponíveis no Arquivo Nacional de Informações, sites que contenham banco de dados de arquivos
e documentos da época, assim como jornais da atualidade. Objetivo é traçar um parâmetro histórico
da manutenção dos interesses capitais implícitos e explícitos pela mídia jornalística.
Para melhor esclarecer o tema aqui tratado é necessário primeiramente verificarmos o
contexto da emergência dos Movimentos Sociais do Campo no cenário brasileiro e a natureza dos
seus pressupostos nesta caminhada, como também é imprescindível apontar o papel fundamental da
mídia para efetivar o modelo capitalista de desenvolvimento agrário, as implicações desta ação na
destruição do espaço rural dos trabalhadores do campo. Este conflito, que acompanha a história
brasileira, demonstra uma luta desigual, onde de um lado contemplamos os Movimentos Sociais do
Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761
47427
Brazilian Journal of Development
Campo sujeitos de uma realidade expropriada e explorada que resiste e luta para se manter no
campo. De outro, grandes latifundiários que defendem um modelo de agricultura em grande escala
para exportação de commodities e expansão e concentração do capitalismo.
No espaço de luta dos Movimentos Sociais do Campo, constata-se pela literatura existente,
que essa luta é desigual, enquanto os trabalhadores rurais unificam-se na mobilização pelo direito a
1
reforma agrária e manutenção das propriedades de agricultura familiar, agroecológica e
permanência no campo, o modelo capital de agricultura, conhecido hoje como agronegócio 2, tem
expulsado os trabalhadores do campo de maneira desumana e violenta, seja por meios próprios de
intimidação destes trabalhadores ou mesmo com auxílio do Estado legitimando o uso da força
policial para afastá-los da terra.

O paradigma da questão agrária tem como ponto de partida as lutas de classes para explicar
as disputas territoriais e suas conflitualidades na defesa de modelos de desenvolvimento
que viabilizem a autonomia dos camponeses. Entende que os problemas agrários fazem
parte da estrutura do capitalismo, de modo que a luta contra o capitalismo é a perspectiva
de construção de outra sociedade (FERNANDES, 2011, p. 18).

Assim para uma ferramenta analítica se contextualizará a manifestação ideológica, na mídia


jornalística que vem demonstrando grande poder persuasivo na criminalização destes movimentos,
pois imprimi uma propaganda sistematicamente difamatória da realidade, tratando estes
movimentos que lutam por justiça social e reforma agrária como baderneiros, invasores e marginais
que instauram um clima de tensão contra a ordem social.

2 TRABALHADORES DO CAMPO: RESISTÊNCIA E LUTA ORGANIZADA


A organização dos movimentos sociais do campo no Brasil tem parte de sua origem nos
conflitos sociais da luta pela conquista da terra e para permanência nela. No Brasil a implementação
do desenvolvimento nacional desenvolvimentista a partir de 1950 promoveu uma grande corrente
migratória das áreas rurais para urbanas. Este episódio conta com as políticas de Vargas que

1 Agroecológica – Palavra que deriva de Agroecologia Constitui, em resumo, um conjunto de conhecimentos sistematizados,
baseados em técnicas e saberes tradicionais (dos povos originários e camponeses) “que incorporam princípios ecológicos e valores
culturais às práticas agrícolas que, com o tempo, foram desecologizadas e desculturalizadas pela capitalização e tecnificação da
agricultura” (Leff, 2002, p. 42).[…] A agroecologia se insere, dessa maneira, na busca por construir uma sociedade de produtores
livremente associados para a sustentação de toda a vida (Via Campesina e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, 2006),
sociedade na qual o objetivo final deixa de ser o lucro, passando a ser a emancipação humana (Dicionário de Educação do Campo –
CALDART, et al, 2012, p. 59 - 67).
2 Agronegócio - O termo agronegócio, de uso relativamente recente em nosso país, guarda correspondência com a noção de

agribusiness, cunhada pelos professores norte-americanos John Davis e Ray Goldberg nos anos 1950, no âmbito da área de
administração e marketing (Davis e Goldberg, 1957).O termo foi criado para expressar as relações econômicas (mercantis, financeiras
e tecnológicas) entre o setor agropecuário e aqueles situados na esfera industrial (tanto de produtos destinados à agricultura quanto
de processamento daqueles com origem no setor), comercial e de serviços (Dicionário de Educação do Campo – CALDART, et al,
2012, p. 79 – 67 - 87).

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47428
Brazilian Journal of Development
promoveu com a criação da Petrobrás e Eletrobrás alavancando a infraestrutura, base da economia
brasileira, necessária para o desenvolvimento, e expansão capitalista. Naquele momento era papel
fundamental do Estado, já que a burguesia nacional ainda não tinha acúmulo econômico para
impulsionar as bases da industrialização no Brasil.
A necessidade da reorganização mundial do pós-guerra foi um dos elementos fundamentais
para o avanço do capital.

o “ajuste” promovido pelas guerras que precederam esse período e a necessidade da


reconstrução dos países criou as condições para uma franca expansão do capitalismo
internacional, a “era dourada do capitalismo”, representado também por um “Estado de
bem-estar social” (MAGGI, 2013, p. 47).

Como país dependente e periférico aqui não se instalou o Estado de Bem-Estar Social, este
modo a projeção do capitalismo no Brasil, agregou junto a sua proposta desenvolvimentista e
progressista, privilégios e enriquecimento para as elites, desemprego e empobrecimento para as
classes menos favorecidas. Um plano para efetivar a hegemonia capitalista fortalecendo a elite e
extenuando os trabalhadores rurais, uma nova roupagem da herança maldita do período colonial.
De acordo com os estudos de Oliveira (2001, p. 190-191) o território capitalista no Brasil
tem sido produto de conquista e destruição, demonstrando que a violência tem sido a principal
característica da luta pela terra.

Tal percurso mantém-se atual no tocante ao desenvolvimento/expansão do modo de


produção capitalista no campo, a partir, principalmente da (re)produção de territórios da
agro-indústria, bem como a permanência da força de poderes locais aliados a interesses
externos (nacionais e internacionais), que têm ampliado crescentemente os processos de
expropriação do camponês e sua consequente expulsão da terra (COUTINHO, MUNIZ e
NASCIMENTO, 2012. p.58).

Neste território em disputa é que os movimentos sociais do campo iniciam sua caminhada
e organização, e em vários estados surgem movimentos descontentes com o modelo agrícola em
desenvolvimento, assim como diante da repressão e violência dos fazendeiros e jagunços foi de
certa forma o estopim para dar um basta e resistir a expropriação e expulsão da terra.
De acordo com Fernandes (2001, p.33) em meados de 1945 no Nordeste iniciou-se a
organização política dos campesinos com as chamadas LIGAS CAMPONESAS apoiadas pelo PCB
Partido Comunista Brasileiro. Esta mobilização se tornou o fio condutor para o surgimento de
outros movimentos, ULTAB União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas em Pernambuco, que
a partir de 1954 militou na organização e efetivação das leis trabalhistas pressionando o governo
de João Goulart (Jango) para implantação do Estatuto do Trabalhador Rural. Em 1963 como

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47429
Brazilian Journal of Development
surgimento da CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, a luta dos
camponeses ganha força, é aprovado o Estatuto do Trabalhador Rural e segue a luta pela sonhada
reforma agrária.
A emergência dos movimentos sociais do campo da mesma maneira que se multiplicava
neste período nas várias regiões e estados do Brasil, enfrentavam forte repressão, grupos de
fazendeiros, usineiros, patrões e políticos intensificaram a perseguição, emboscadas e assassinatos
a líderes e trabalhadores rurais que resistiam firmes na luta em defesa dos campesinos.
Cabe ressaltar que no período de 1963, o governo de Jango pressionado pelos movimentos
organizados do campo, criou o primeiro órgão de promoção da Reforma Agrária, o SUPRA
Superintendência da Política Agrária. A tarefa principal da SUPRA, foi auxiliar os trabalhadores
rurais e seus representantes a formarem novos sindicatos, ampliando sua representatividade. Esse
processo durou pouco tempo pois, com o golpe militar em 1964 os movimentos sociais do campo
foram interpelados por um clima de tensão total, houve perseguição e retalhação junto a grande
parte dos sindicatos formados na época.
Conforme Welch (2006, p. 62) 80% dos sindicatos foram extintos. No meio rural relata que
as lideranças de movimentos estavam sendo presas, jogadas a clandestinidade e assassinadas em
nome da desarticulação das lutas do campesinato brasileiro (Medeiros, 1989, p.195). Este cenário
qual marcou profundamente um retrocesso na história e na caminhada dos movimentos sociais no
Brasil.

O golpe acabou com a democracia e por conseguinte reprimiu violentamente a luta dos
trabalhadores. Os movimentos camponeses foram aniquilados, os trabalhadores, foram
perseguidos, humilhados, assassinados, exilados. Todo o processo de formação das
organizações dos trabalhadores foi destruído. Igualmente significou a impossibilidade dos
camponeses ocuparem seu espaço político, para promoverem por seus direitos, participando
das transformações fundamentais da organização do Estado brasileiro. O golpe significou
um retrocesso para o país (FERNANDES, 2000, p. 41).

Na década de 80 os movimentos sociais retomam sua reorganização, com o governo de


Figueiredo, houve o enfraquecimento da hegemonia militar por conta da recessão econômica que
culminou com baixos investimentos internacionais na economia interna obrigando o governo a
tomar medidas para reabertura política no país.

Ao longo dos anos de 1980, houve uma intensificação das lutas no campo, cujas raízes
devem ser buscadas em diversos fatores, tanto estruturais (a progressiva expropriação dos
trabalhadores, tanto posseiros como pequenos proprietários, parceiros e arrendatários, além
do aumento do preço da terra) quanto relacionadas ao trabalho molecular de difusão de
novas concepções de direitos entre os trabalhadores rurais, graças a ação tanto do
sindicalismo quanto das pastorais eclesiásticas e aparecimento de novas formas de

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47430
Brazilian Journal of Development
organização, das quais emergiram novas formas de luta. Além disso, pesaram também as
oportunidades políticas que se abriram num contexto de crise do regime militar e as
possibilidades de alargar a busca de suportes e alianças (MEDEIROS 1989, p 219-220).

Com o terreno fértil em meados de 1980 é que na continuidade histórica da emergência de


lutas e resistências dos trabalhadores rurais, começa a brotar a semente do MST Movimento dos
trabalhadores Rurais Sem-Terra.
Com organização de ocupações em vários estados brasileiros pelos trabalhadores rurais e a
participação da CPT – Comissão Pastoral da Terra, o MST foi concretizando-se junto a formação
histórica do campesinato brasileiro, da sua posição política e sua autonomia na luta por reforma
agrária. Em janeiro de 1984 na cidade de Cascavel, Estado do Paraná surge oficialmente o MST,
seu nascimento se deu no Primeiro Encontro Nacional dos Sem-Terra e sua bandeira de luta “A terra
para quem nela trabalha e vive”.

Na complexidade de suas ações o MST vai se fazendo um sujeito coletivo


articulador e educativo, em movimento através da conquista de territórios, das articulações
políticas e das diversas lutas e teorias que vão se constituindo em sua totalidade,
legitimando suas ações e mobilizações. O processo vivenciado pelos sujeitos sem-terra
aponta para a construção do MST como movimento eminentemente educativo, que
consegue articular a luta pela terra com ideais de vida e com a busca de um fazer
pedagógico; que valoriza as questões sociais e contribui para que as pessoas se percebam
enquanto sujeitos críticos, com condições de transformar a realidade (PEREIRA,
1990,p.135).

O MST ocupando espaço notório e importantíssimo na luta pela questão agrária e direitos
humanos não deixou de enfrentar a violência, criminalização e morte de suas lideranças. Em pleno
século XXI mesmo com a garantia de direitos da Constituição Brasileira, os grandes latifundiários
do agronegócio continuam se utilizando das ferramentas mais comuns, a ameaça, expulsão e
violência.
O Estado a serviço do capital, segue na legitimação desta violência por intermédio da
autorização judicial de reintegrações de posse que promovem um show de horrores na execução dos
despejos. Isso justifica-se nos estudos realizados por Coutinho, Muniz e Nascimento (2012, p.56)
quando afirmam que tal violência tem sido colocada atualmente nos termos da prática da
criminalização, e é sob esta prática, a qual manifesta a força de um projeto societário capitalista de
cunho latifundista empresarial.
Portanto a desconstrução destes movimentos sociais passa a ser construída simbolicamente
de maneira ideológica. Os instrumentos de informação midiática se tornam sujeitos primordiais
neste contexto, pois atingem as grandes massas na formação de opinião.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47431
Brazilian Journal of Development
3 O PODER E MÍDIA NA DIFUSÃO DA CRIMINALIZAÇÃO DA LUTA PELA TERRA
Quando falamos do poder da mídia estamos efetivamente mencionando seu papel
fundamental na formação de opinião de uma sociedade, opiniões estas que estão carregadas de
intencionalidades que objetivam produzir e/ou conduzir o pensamento das massas sociais.
A literatura mundial nos fornece vários elementos a respeito da articulação da mídia e sua
relação com o poder. No período nazista a propaganda contribuiu para a aprovação das massas
alemãs de um regime que marcou com sangue a história mundial. Para Chomsky (2014, p. 07) a
propaganda política patrocinada pelo Estado, quando apoiada pelas classes instruídas e quando não
existe espaço para contestá-la, pode ter consequências importantes. Foi uma lição aprendida por
Hitler e por muitos outros e que tem sido adotada até os dias de hoje.
Vejamos que Goebbels (1934, apud Capelato 1998, p. 73) ministro da propaganda na
Alemanha nazista apontava a propaganda como a arma mais eficaz de conquista do poder,
edificação e consolidação do Estado. Assim considerando os comentários de Guyot e Restellini
(1987, apud Capelato 1998, p.64) Goebbels acreditava que a propaganda deveria levar ao sucesso
objetivado, para isso ela não precisaria ser correta, prudente ou honorável, e nem precisa
impressionar o interlocutor, mas que ela possa atingir os resultados esperados, ou seja, a sua
intencionalidade, pois criou de fato os resultados esperados na grande massa do povo alemão.
O espaço midiático enquanto ferramenta ideológica pode produzir a propaganda tanto para
incentivar grupos e organizações na luta por transformações sociais e garantia de direitos, como
também tem o poder de desarticular e imprimir uma racionalidade contrária a estes.

(…) pela influência que tem sobre a ação política dos demais sujeitos, a mídia, que assume
significativa influência na visibilidade dos problemas sociais (…) se altera conforme os
interesses do sujeito que está apoiando, com tendências a uma racionalidade burocrática e
legalista, preocupada essencialmente com a eficiência da política (SILVA, 2009, p.12).

No cenário brasileiro Vieira (2015, p. 34) argumenta que a “Mídia Tradicional está
umbilicalmente ligada às classes dominantes do país”, assim produz uma luta desigual, em uma
extremidade a elite que controla os meios comunicação a favor de seus interesses, na outra os grupos
de pressão social e movimentos organizados que resistem a desconstrução de sua articulação por
direitos.
Contudo baseando-se nos escritos de Brittos e Gastaldo (2006, p. 124) é evidente que o
campo midiático é lugar de disputas entre diferentes participantes, em condições desiguais de poder
econômico e simbólico. Capelato (1998, p.38) entende que no terreno das representações do poder,

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47432
Brazilian Journal of Development
a propaganda desencadeia uma luta de forças simbólicas; aí se instaura uma violência de tipo
simbólica que visa ao reforço da dominação.

A produção de sentido/significado é também a produção de cultura, que permeia todas as


instâncias de produção, consumo e controle social em qualquer sociedade, simples ou
complexa, exprimindo também a produção/reprodução de uma relação de poder, na medida
em que atribuir significados implica em “definir a realidade”(...) Na nossa sociedade, o
poder de definição da realidade presente no ato de enunciação está em grande parte
localizado no discurso da mídia, de um modo mais sutil e simbólico no discurso publicitário
e de um modo mais explícito no chamado discurso jornalístico. O discurso jornalístico tem
características que fazem dele uma das maiores fontes de definição de realidade em nossa
sociedade (BRITTOS & GASTALDO, 2006, p. 126).

As representações simbólicas dominadas pela mídia almejam produzir no imaginário dos


indivíduos ou grupos sociais uma identidade que justifica sua razão de existir. De acordo com
Baczko (1985, p.311) os sistemas simbólicos em que assenta e através do qual opera o imaginário
social são construídos a partir da experiência dos agentes sociais, mas também a partir dos seus
desejos, aspirações e motivações.
O sistema simbólico e o imaginário social são elementos presentes no espaço midiático, pois
a propaganda está carregada de intencionalidades e para além disso precisa encontrar empatia no
seu discurso atingindo a coletividade instaurando seus objetivos.

É assim que, através dos seus imaginários sociais, uma colectividade designa a sua
identidade; elabora uma certa representação de si; estabelece a distribuição dos papéis e das
posições sociais; exprime e impõe crenças comuns; constrói uma espécie de código de
“bom comportamento”, designadamente através da instalação de modelos formadores tais
como o do “chefe”, o “bom súdito”, “guerreiro corajoso”, etc. Assim é produzida, em
especial, uma representação global e totalizante da sociedade como uma “ordem” em que
cada elemento encontra o seu “lugar”, a sua identidade e a sua razão de ser. Porém, designar
a identidade colectiva corresponde, do mesmo passo, a delimitar o seu “território” e as suas
relações com o meio ambiente e, designadamente, com os “outros”; e corresponde ainda a
formar as imagens dos inimigos e dos amigos, rivais e aliados, etc. O imaginário social
elaborado e consolidado por uma colectividade é uma das respostas que esta dá aos seus
conflitos, divisões e violências reais ou potenciais (BACZKO, 1985, p.311).

No entanto, refletir sobre a mídia na sociedade atual é compreender conforme Nogueira


(2013, p.183) que esta ocupa um lugar de extraordinária relevância nos processos de constituição
de hegemonia.
Haja vista, que na sociedade capitalista a mediação social está fundamentada no propósito
econômico, comprometido com a lucratividade. Assim a mídia é vislumbrada como um sujeito
determinante no apelo capitalista, seja fomentando o consumismo ou produzindo uma ideologia de
controle social.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47433
Brazilian Journal of Development
É no capitalismo, segundo Souza (2010, p. 52) que o controle adquire uma particularidade
em relação às demais sociedades, pois o capital assume a função determinante de controle social.
As condições de organização da produção capitalista estão submetidas as formas de controle das
relações sociais. Meszáros (2002, p. 96) utiliza o termo sociometabólico para expressar que o capital
assume a condição de controle nas relações sociais, pois não pode abstrair o trabalho vivo no
processo de expansão econômica.
Contribuindo com a implementação deste processo expansivo do capitalismo a mídia se
conecta como sujeito colaborativo destes interesses, segundo Volanin (2007, p. 09) a propaganda
ideológica apresenta uma versão da realidade a partir da qual se propõe a manter a sociedade nas
condições em que se encontra ou transformá-la em sua estrutura econômica, regime político ou
sistema cultural.

a mídia, como um meio ideológico e articulador. Não deixa de ser uma poderosa arma
manipulada por poderosos agentes do capital, do estado e do mercado. Todo e qualquer
“estorvo” que venha em percurso desordenar tal processo, a mídia tem a função
desarticuladora e ideológica frente a sociedade. Qualquer manifestação social, desde que
não represente uma ameaça que desencadeie a forma de sociedade modelada pela elite
social, a mídia faz por tornar-se fato de interesse social (VOLANIN, 2007, p. 10).

A discussão da criminalização dos movimentos sociais do campo pela mídia, se formaliza


num campo de disputa antagônica, em suas extremidades estão a luta pela promoção de direitos
sociais, notoriedade pública e legitimidade. Noutro o controle social necessário para a manutenção
do sistema capitalista e da hegemonia dominante.

Na nossa sociedade, o poder de definição da realidade presente no ato de enunciação está


em grande parte localizado no discurso da mídia, de um modo mais sutil e simbólico no
discurso publicitário e de um modo mais explícito no chamado discurso jornalístico. O
discurso jornalístico tem características que fazem dele uma das maiores fontes de definição
de realidade em nossa sociedade (BRITTOS & GASTALDO, 2006, p.126).

4 A MÍDIA CONTRA-HEGEMÔNICA
De acordo com Morais (2010, p. 72) para a contraposição ao poderio midiático, todos os
recursos táticos e canais contra-hegemônicos devem ser mobilizados e aproveitados. Essa
articulação da imprensa jornalística contra-hegemônica também esteve presente no período de 1950,
onde emergem conflitos e lutas por direitos sociais.
Os camponeses refletindo sobre essa conjuntura e influenciados pela imprensa comunista
iniciam um processo de construção da identidade da luta dos movimentos sociais do campo. Um
dos jornais mais relevantes no apoio a militância dos campesinos no período de 1950 a 1963 era o
Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761
47434
Brazilian Journal of Development
Terra Livre, o tabloide tratava dos aspectos da vida e do trabalho de operários e camponeses. O
jornal Terra Livre utilizava esse espaço midiático como via educativa para uma ação libertária e
revolucionária (Souza, 2005, p.116).

o jornal Terra Livre era vinculado à ULTAB – União dos Lavradores e Trabalhadores
Agrícolas do Brasil, com participação dos comunistas, circulando com dificuldades no
período da clandestinidade do PCB mas importante veículo de publicização dos
conflitos(PEDROZA, 2003, p. 29).

Terra Livre era financiado e editado pelo PCB que propunha assim um instrumento de
propaganda e agitação, mas também ganhou notoriedade na luta dos trabalhadores, propunha a
reflexão e ação como uma pedagogia revolucionária a partir da luta camponesa no país.

FONTE: http://armazemmemoria.com.br

Com a instauração do regime militar a repressão contra os tabloides e jornais que apoiavam
a resistência dos movimentos sociais do campo, trabalhadores e operários foi acirrada; em março de
1964 chegou o fim da circulação deste periódico.
Cabe ressaltar que como ferramenta de resistência dos movimentos campesinos e da classe
trabalhadora da época o jornal Terra Livre merece destaque.

Pelo grau de alargamento do espaço geográfico das lutas específicas e gerais, mais do que
isso, por suas colunas, almanaques, charges e cartas, além das notícias e artigos na
construção e forma de ver o mundo. Terra Livre colabora no sentido da construção da classe
camponesa, em oposição ao aos latifundiários, tatuíras e usineiros, e, nesse sentido, ajuda
a instituir o lugar político, na perspectiva da luta camponesa contra o latifúndio (SOUZA,
2005, p.157).

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47435
Brazilian Journal of Development
Podemos também destacar o jornal A Liga que a partir de 1962 iniciou sua participação na
divulgação das lutas do campo, o semanário liderado pelo editor-chefe Francisco Julião, que
também era advogado e deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro, tornou-se uma
liderança na articulação das Ligas Camponesas.
Para além do apoio ao movimento as Ligas Camponesas, Francisco Julião conclamou no
tabloide, a organização de uma rede de solidariedade entre os diferentes grupos de trabalhadores, a
Aliança Operário-Camponesa propunha a união entre o campo e cidade na luta pela defesa das
classes exploradas.
Como militante do PSB – Partido Socialista Brasileiro, Francisco Julião deixava claro no
semanário sua proposta de Revolução Brasileira, para isso era evidente na leitura as características
jornalísticas que explicitavam, intencionalidade, nacionalismo, socialismo e a formação política
doutrinária (Souza, 2005, p. 2-3).

FONTE: http://armazemmemoria.com.br

Porém da mesma forma que o jornal Terra Livre, o semanário a Liga foi impedida de
continuar suas publicações em 1964 com a instauração do regime militar. Neste período de vigência
entre os dois periódicos podemos ressaltar sua importância como instrumento midiático em favor
da luta dos movimentos sociais do campo.
A partir da emergência do MST em 1984, o campesinato do prosseguimento a luta pela terra
e reforma agrária, as ações de enfrentamento do MST contra as forças reacionarias e em favor dos
diretos sociais ganham destaque. Em apoio a estas ações, como aliado deste Movimento Social do
Campo a partir de 2003 entra em cena o jornal Brasil de Fato.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47436
Brazilian Journal of Development
O jornal Brasil de Fato foi fundado no Fórum Social Mundial em 2003, com apoio de líderes
políticos e sociais de esquerda, circulou como tabloide impresso até 2013 onde expandiu sua
abrangência, para as redes sociais e site de notícias e Radioagência Brasil de Fato.
Segundo Silva & Romão (2009, p. 113) o jornal Brasil de Fato se alinha com outros meios
de oposição ao capital na mídia, sob o slogan “Um jornal de esquerda”.

FONTE: https://www.brasildefatomg.com.br/

De acordo com Vieira (2015, p. 33) a mídia é um importante sujeito para os movimentos
sociais na consolidação da pauta reivindicatória e na visibilidade da pressão social. Contudo
historicamente sabemos das dificuldades no enfrentamento contra hegemônico mesmo porque ao
visualizarmos pesquisas acadêmicas verificamos que a classe dominante detém 70% da mídia
nacional que está concentrado sobre o controle de menos de 10 famílias abastadas ou de políticos
(Passos, 2013, p. s/n).

5 O PROTAGONISMO DA MÍDIA NA CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS


SOCIAIS DO CAMPO DOS ANOS 1950 E 1960
Analisamos um recorte da função midiática dos jornais nos anos de 1950 passando pelo
regime militar e chegando nos pós ditadura e verificamos como a propaganda jornalística se
comporta neste período histórico.
A mídia no processo de criminalização dos movimentos sociais não o faz
incondicionalmente, ela está articulada com os interesses de uma determinada classe, Nogueira
(2013, apud Vieira, 2015, p.32) menciona que os jornais são cidadãos coletivos: posicionam-se e
dão ênfases noticiosas conforme suas posições. Assim a focalização mais incisiva da mídia em

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47437
Brazilian Journal of Development
alguns assuntos será fundamental para inclusão ou retirada de pauta da sociedade (Canela, 2008,
apud Vieira, 2015, p32).
Considerando o domínio da mídia pela hegemonia capitalista, torna-se possível
compreender que este espaço social de disputa desenvolve a luta de classes, em que a comunicação
das massas sofre ataque da desinformação, resultando assim na manutenção do controle social.
Iasi (2011, p.26) comenta que a ideologia está intrinsecamente ligada a divisão da sociedade
de classes, esta deve ser a maneira em que a classe hegemônica produz e divulga sua visão de
mundo, projetando universalizar e tornar comum a todos os sujeitos sociais.

a ideologia disseminada principalmente pelo poder midiático que fortalece a criminalização


de tais movimentos sociais do campo, que oculta ou banaliza a violência que permeia e
aterroriza a vida dos trabalhadores e trabalhadoras do campo e dos povos tradicionais. Tudo
isso, a serviço dos interesses do grande capital que move associado às esferas públicas de
poder, predominantemente, as responsáveis pela elaboração de políticas econômicas e
sociais em nosso país, cujos planos são direcionados para atender aos interesses do capital
e contrários as necessidades camponesas (Coutinho, Munis e Nascimento, 2012, p. 56).

Para Grzybowski (1990, p. 13) os movimentos sociais precisam ser vistos a partir da luta de
classe, da relação de forças antagônicas, os campesinos são sujeitos coletivos que interpelam o
Estado na luta por seus direitos. Pois para o autor a expansão capitalista no campo é uma via de
dupla criminalização e violência, inicialmente pela exploração dos trabalhadores do campo e pela
expropriação.
Ao analisar os recortes de jornais mais comuns no período de 1950 a 1985 nos deparamos
com esta ideologia estampada nos tabloides, a mídia segundo Junior et al. (2012, p. 6) possui poder
para produzir formações discursivas em que os sujeitos sociais possam interiorizar e reproduzir os
mesmos. A reprodução destes discursos pelos sujeitos sociais mascara os interesses ideológicos que
estão sendo determinados pela classe dominante.

FONTE: http://armazemmemoria.com.br/

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47438
Brazilian Journal of Development
Se observarmos os noticiários jornalísticos na do jornal a Folha do Povo de 1950, o discurso
de violência e perseguição aos camponeses são explícitos, se analisarmos o discurso proposto pela
mídia, conseguimos enxergar a construção de um conteúdo simbólico de controle das massas. Nesta
lógica de acordo com Pechêux (2009, apud Junior et al. 2015, p.5) ao teorizar sobre o discurso as
ideologias não devem ser concebidas como ideais mais como forças materiais. O ideológico está
representado no imaginário que por sua vez está subordinado as forças materiais que movem os
sujeitos na sociedade.
As notícias estampadas nos jornais da década de 50 retratam um modelo de mídia
preocupada em defender os interesses das classes dominantes, muitos destes latifundiários.
Permanece evidente também que na atualidade a mídia mantém o mesmo escopo, mas com
ferramentas mais sofisticadas em relação aquele momento, quando se trata de movimentos sociais.
Em meados dos anos 1980 a retomada das pressões sociais pelos trabalhadores rurais e sua
reorganização, a emergência do MST no cenário das lutas por Reforma agrária e direito a terra
demostra que o enfrentamento contra o latifundiário e o sistema econômico atual que prega uma
agricultura baseada no mercantilismo é retomada.
Deste modo os ataques ao movimento pela mídia são contínuos, pois ocupa espaço de
destaque ao estampar a luta e a mobilização por reforma agrária, de forma aviltante.

FONTE: https://br.pinterest.com/manchetes/mst/

Ao analisar as manchetes públicas nos diversos jornais, os movimentos sociais do campo


ocupam um espaço de marginalização, o aspecto fundamental é evidenciar e criar um ambiente de
contravenção que possa criminalizar o movimento, produzir uma mensagem simbólica que possa
condenar a atitude mobilizadora e desqualificar a verdadeiro projeto de luta do movimento.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47439
Brazilian Journal of Development
Como descreve Ayoub (2006, p. 38) o MST virou objeto de crítica, alvo e muito mais, um
verdadeiro inimigo a ser combatido pela mídia. Os organismos midiáticos objetivam promover uma
verdadeira satanização do MST.
A ilustração de um estereótipo por parte da mídia incentiva e reforça junto aos receptores do
texto a aceitação de tal notícia. A utilização de palavras de conotação pejorativa induz os sujeitos
sociais a aceitar os argumentos estampados na propaganda jornalística, produzindo no imaginário
social a demonização destes movimentos.

FONTE: https://br.pinterest.com/manchetes/mst/

A mídia torna-se também cada vez mais importante influência no processo de


criminalização dos movimentos sociais, enquanto instância de controle informal. Este meio
ideológico, em geral, busca desqualificar, ou ainda, “satanizar” as ações dos movimentos,
colocando-os como algozes, responsabilizando-os pela intransigência, intolerância e
violência. Acontece um descredenciamento dos movimentos sociais, apresentando-os
como grupos subversivo-revolucionários, arruaceiros, desordeiros e criminosos, muitas
vezes com teor terrorista (VOLANIN, 2007, p. 14).

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos considerar que os movimentos sociais do campo no processo histórico brasileiro
sempre estiveram engajados na luta por seus direitos e na promoção da conscientização de classe,
assim, como também se manteve na resistência contra os ataques da mídia hegemônica.
Porém é possível observar que existe um território em disputa, pois ao tempo que a mídia
hegemônica provoca a descaracterização dos movimentos sociais, do outro lado encontramos uma
mídia contra hegemônica que promove a defesa e conscientização da realidade dos fatos, seguindo
na articulação de uma luta de classe que expressa a capacidade de mobilização dos sujeitos
comprometidos com a mudança do sistema implementado pelo capital.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47440
Brazilian Journal of Development
Na análise percorrida pelo artigo percebemos que a mídia jornalística dos anos de 1950 a
1985 manteve-se em uma disputa de grupos antagônicos, que tal qual procuram polarizar seus
interesses. Os jornais Terra Livre, A liga e Brasil de Fato seguem no viés de defesa dos movimentos
sociais, vinculando em suas reportagens aspectos relevantes a luta por direitos negados pelo Estado.
Na contramão outros jornais de cunho ideológico procuram defender os interesses
pormenorizados e divulgar notícias em tom intimidador ou de carácter persuasivo contra os
movimentos sociais.
Demonstra-se evidente o protagonismo da mídia hegemônica na ação de desqualificação dos
movimentos sociais atuais, no comparativo entre os jornais esta mídia é responsável pela produção
de uma cultura ideológica, revelando seu caráter subserviência ao poderio das classes dominantes.
As intenções desta mídia hegemônica ficam mais claras conforme a própria citação de Ramonet:

a mídia não se dirige a nós para transmitir-nos informações objetivas, mas para conquistar
o nosso espírito. Como já dizia Goebbels: ‘Nós não falamos para dizer alguma coisa, mas
para obter um certo efeito’.Os colonizados e seus opressores sabem que a relação de
domínio não está fundada apenas na supremacia da força. Passado o tempo da conquista,
soa a hora do controle dos espíritos. E é tanto mais fácil dominar, quando o dominado
permanece inconsciente. Daí a importância da persuasão clandestina e da propaganda
secreta, pois, a longo prazo, para todo império que deseja durar, a grande aposta consiste
em domesticar as almas, torná-las dóceis e depois subjugá-las (RAMONET, 2005: p. 20-
21).

Na atualidade com o advento das mídias sociais, e portais eletrônicos de informação o


impacto dos meios de comunicação fica ainda mais evidente, segundo Gohn (2000, p. 09) “resulta
que a mídia ampliou seu poder na sociedade e passou a ser, também, um mecanismo de controle
social” pois, esse volume de informação consegue atingir as massas com rapidez não dando chance
muitas vezes de uma análise mais aprofundada da notícia.
A respeito do MST, movimento social que se destaca no cenário brasileiro, isso pois segue
na resistência, encampando grandes mobilizações por direitos sociais, acaba por se tornar o foco da
criminalização por parte da mídia, pois suas ações atrapalham o desenvolvimento do plano capital
de expansão do agronegócio e do latifúndio, resultando na expropriação do pequeno agricultor dos
espaços agrários. Conforme Junior Et al (2012, p. 11) “os meios de comunicação […] utilizam
mecanismos sutis par inculcar uma visão negativa da luta de movimentos sociais como MST no
imaginário da sociedade”.
Portanto o discurso da mídia muitas vezes esta atrelado a manutenção das forças
hegemônicas da sociedade capitalista, e nesse sentido os movimentos sociais por meio da luta

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47441
Brazilian Journal of Development
organizada promovem ações de mobilização para conscientização e enfrentamento das forças
opressoras da sociedade brasileira.

REFERÊNCIAS

AYOUB, A. H. Mídia e movimentos sociais: a satanização do MST na Folha de S Paulo.


Estudos em Jornalismo e Mídia, v. 4, n. 1. 2006.

ALMEIDA, Rosemeire Aparecida; PAULINO, Eliane Tomiasi. Fundamentos teóricos para o


entendimento da questão agrária: breves considerações. Geografia, Londrina, v. 9, n. 2, p. 113-
127, jul./dez. 2000.

AQUINO, Maria Aparecida de. Censura, Imprensa, Estado Autoritário. (1968-1978). Bauru:
EDUSC, 1999.

AZEVÊDO, Francisco Antônio. As ligas Camponesas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.

BACZKO, Bronislaw. “A imaginação social” In: Leach, Edmund et Alii. Anthropos Homem.
Lisboa, Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1985. 7) CAPELATO, Maria Helena R. Multidões em
cena: propaganda política no varguismo e no peronismo. Campinas, SP: Papirus, 1998.

BRITTOS, Valério; GASTALDO, Èdison. Mídia, poder e controle social. In: Revista ALCEU.
Rio de Janeiro, v.7, n.13, p. 121 a 133, jul./dez. 2006. Disponível em: http://revistaalceu.com.puc-
rio.br/media/alceu_n13_Brittos%20e%20Gastaldo.pdf Acesso em 20 dez 2019.

CANELA, Guilherme. A Cobertura Jornalística das Políticas Públicas Sociais: elementos para
debate. In: CANELA, Guilherme (Org.). Políticas Públicas Sociais e os Desafios para o
Jornalismo. 1. ed. São Paulo: Cortez Editora, 2008.
CAPELATO, Maria Helena Rolim. Multidões em cena. Propaganda política no varguismo e no
peronismo / Maria Helena Rolim Capelato. - Campinas. SP: Papirus, 1998.

COUTINHO, Adelaide Ferreira; MUNIZ, Raquel Susana Lobato; NASCIMENTO, Rita de Cássia
Gomes. Luta pela terra, criminalização dos movimentos sociais (do campo) e educação.
Revista Aurora. Marília, v. 5 (2012): Edição Especial.

CHAUÍ, Marilena de Souza. Cultura e democracia. 4. ed. rev. e ampla. São Paulo: Cortez, 1989.
CHOMSKY, Noam. Mídia: propaganda política e manipulação; tradução Fernando Santos. São
Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013.

FEITOSA, Osmiriz Lima; OLIVEIRA, Selma Suely Baçal de. Política pública e educação:
reflexões sobre as políticas educacionais para Educação do Campo. Braz. J. of Develop.,
Curitiba, v. 5, n. 11, p.24486-24501 nov. 2019.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47442
Brazilian Journal of Development
FERNANDES, Bernardo Mançano; WELCH, Clifford. GONÇALVES, Elienai Constantino.
Questão agrária e disputas territoriais no Brasil. Presidente Prudente, 2011. Inédito.
FERNANDES, Bernardo Mançano. A formação do MST no Brasil. Editora Vozes, Petrópolis:
2000.

GRZYBOWSKI, Cândido. Caminhos e descaminhos dos Movimentos Sociais no Campo.


Editora Vozes, Petrópolis: 1990.

GOHN, M. G. Mídia, terceiro setor e MST: impacto sobre o futuro das cidades e do campo.
Petrópolis: Vozes, 2000.

GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal e cultura política: impactos sobre o


associativismo do terceiro setor. Ed. São Paulo: Cortez, 2001.MAGGI, Leonardo Bauer. Fatores
estruturais do desenvolvimento do Brasil e América Latina Ensaios sobre a questão agrária. Ana
Terra Reis; Andréa Francine Batista (org.).1. ed. São Paulo: Outras Expressões, 2013.

IASI, Mauro Luiz. Ensaios sobre consciência e emancipação. São Paulo: Expressão Popular,
2007.

JÚNIOR Carlos Pedretti, et al. MOVIMENTOS SOCIAIS E MÍDIA NO BRASIL: análise do


discurso da mídia brasileira sobre o mst. Anais do XXI Encontro Nacional de Geografia Agrária.
UFU. MG, 2012.

MEDEIROS, Leonilde Sérvolo de. “Trabalhadores do campo, luta pela terra e o regime civil
militar”. In: PINHEIRO, Milton (org.). Ditadura: o que resta da transição. São Paulo: Boitempo,
2014.

MESZÁROS, István. Educação para além do capital – rumo a uma teoria da transição. São
Paulo: Boitempo, 2002. NARVÁEZ MONTOYA, Ancízar. Cultura política y cultura mediática:
esfera pública, interesses y Códigos. Revista de Economía Política de las Tecnologías de la
Información y Comunicación, v. 6, n. 1, Ene-Abr. 2004.

MORAES, Dênis de. Comunicação, hegemonia e contra-hegemonia: a contribuição teórica de


gramsci. REVISTA DEBATES, Porto Alegre, v.4, n.1, p. 54-77, jan.-jun. 2010.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. As Ruas e a Democracia: ensaios sobre o Brasil contemporâneo. Rio
de Janeiro: Contraponto, 2013.
ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. 3 ed.
São Paulo: Brasiliense, 1991.

OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A longa marcha do campesinato brasileiro: movimentos


sociais, conflitos e Reforma Agrária. Estud. av. vol.15 no.43 São Paulo Sept./Dec. 2001.
PASSOS, Najla. Lei da Mídia Democrática é lançada em Brasília e quer ser nova Ficha Limpa.
Carta Maior, São Paulo, 23 agosto 2013. Disponível em:
http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Midia/Lei-da-Midia-Democratica-e-lancada-em-Brasilia-e-
quer-ser-nova-Ficha-Limpa/12/28428. Acesso em: 30 mar. 2015.

PEDROZA, Manoela da Silva. Terra de Resistência. Táticas e estratégias camponesas nos


sertões cariocas (1950-1968). Dissertação de Mestrado. Porto Alegre, UFRGS, 2003, p. 27.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761


47443
Brazilian Journal of Development
SILVA, Maria Ozanira da Silva e. Editorial. Revista Katálysis. Florianópolis, v. 12 n. 1 p. 11-12,
jan./jun. 2009.

PEREIRA, Carlos Olavo da Cunha. Nas terras do rio sem dono. Rio de Janeiro: Record, 1990.

RAMONET, Ignacio. Propagandas silenciosas: massas, televisão, cinema. Petrópolis: Vozes, p.


15-32. 2005.

VIEIRA, Andressa Brito. Movimentos sociais e mídia: uma complexa relação no processo de
formulação da agenda. Revista Tempo da Ciência. Vol.22, n° 43, 2015.

SOUZA, Enilce Lima Cavalcante. Palavra impressa e Ação militante de Camponeses e


Intelectuais Comunistas na Cultura Política do Brasil de 1945 a 1964. Projeto de doutorado.
Fortaleza: UFC, 2010, p.11.

SOUZA, Enilce Lima Cavalcante de. Campo e Palavras. Dimensões da Questão Agrária no
Ceará, 1954-1964. Dissertação (Mestrado) em História Social. Universidade Federal do Ceará.
Fortaleza, 2005.

VOLANIN, Leopoldo. Poder e mídia: a criminalização dos movimentos sociais no Brasil


nas últimas trinta décadas. 2007.Disponível em:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/760-4.pdf Acesso em: 15 abr. 2019.

WELCH, Clifford Andrew. Movimentos sociais no campo até o golpe militar de 1964: a
literatura sobre as lutas e resistências dos trabalhadores rurais do século XX. Lutas &
Resistências, Londrina, v.1, p. 60-75, set., 2006.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.47425 -47443 jul. 2020. ISSN 2525-8761

Você também pode gostar