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A lenda do pescador Ramiro e da Ria de Aveiro

Vivia, em tempos, junto à Ria de Aveiro, um jovem pescador de nome Ramiro. Órfão de mãe e pai,
trabalhava na faina, juntando dia a dia o pouco que lhe daria para sobreviver. Vivia então com sua
madrinha, solteirona de bom coração, mas de aspeto pouco agradável à vista.
Só, no barco onde pescava, ouviu um dia, uma linda voz que cantava.
Primeiro, inebriou-se. Depois, enamorou-se…
Aproximou-se do local, deparando-se-lhe uma linda jovem que se banhava nas águas. Estava nua, mas não
se assustou ao ver Ramiro e estendeu-lhe a mão sorrindo.
Era de uma beleza perfeita, em formas e em cores e o pescador logo lhe declarou que já a amava e queria
casar com ela. A rapariga sorriu, dizendo-lhe que muito gostaria de desposar jovem tão forte e belo, mas
que isso seria impossível, pois era uma sereia. E, estendendo-se na água, ali lhe mostrou o que ele antes
não pudera ver, uma cauda de sereia com lindas escamas que brilhavam cintilantes.
Revelou-se ela então ser filha do rei dos Mares, estando destinada para esposa de um tritão mau e
irrascível. E começou a chorar…
As lágrimas rodeavam-na como pérolas luminosas. Ramiro, perturbado, prometeu-lhe construir uma casa,
metade em terra, metade na ria, onde poderiam ser felizes.
Mas a bela sereia lamentava-se por medo ao tritão, dizendo que só se pudesse ser uma mulher de verdade
o desposaria. Lastimosa por isso ser impossível, mergulhou e desapareceu.
Ramiro bem lançou as suas redes e procurou, mas nada. E dia após dia, definhava de amor o pobre
enamorado, causando grande aflição a sua madrinha, a quem tinha contado o que se passara.
A boa senhora, vendo que o final do moço não estava longe, aconselhou-o visitar pela noitinha uma velha
que ali perto vivia. A sua sabedoria era conhecida de todos e os poderes que tinha faziam-na temida mas
respeitada pela vizinhança.
E Ramiro lá foi tremendo: de início de ansiedade e depois, ao ver o seu aspeto e o interior da sua casa, de
medo profundo.
A velha nem o deixou falar, alegando que sabia ao que vinha e que poderia ajudá-lo, mas que tudo teria de
ser feito como mandado, pois qualquer erro faria com que nunca mais pudesse ver a sua amada. E perante
Ramiro aturdido, enumerou e fê-lo repetir várias vezes os passos que teria que seguir para casar com a
linda sereia feita mulher.
Primeiro, havia que construir uma casa de madeira nas dunas situadas no local designado por Costa Nova.
De seguida, deveria pintá-la de riscas de cor viva, alternando com branco para afastar o mau olhado. E
então, seria altura do passo mais delicado do processo, que seria pescar a Lua Cheia.
Pescar a Lua Cheia? Nem nos mais fantasiosos sonhos sabia Ramiro ser isso possível.
Há que pescar a Lua Cheia, insistia a velha ou melhor, capturar o seu reflexo na água com a rede da faina e
levá-lo para dentro da casa feita, onde a sereia se tornaria mulher.
Mas, atenção! Tudo deveria ser feito sem qualquer ruído, de modo a que a Lua não se apercebesse. Mais
ainda, ninguém poderia saber do processo até o objetivo ser alcançado.
Saiu o jovem da casa da bruxa, cheio de esperança e Ramiro pescador, tornou-se Ramiro construtor.
Num trimestre, a casa ficou feita e pintada e para o esconder da grande Lua, a proa do seu barco foi
elevada em forma de pequeno crescente.
Tudo preparado, em bela e límpida noite de Lua Cheia, Ramiro lança a rede silenciosamente sobre o seu
reflexo e sem qualquer barulho, captura o globo brilhante. Navegou quietamente até à casa que construíra
e quando ia lançá-la para dentro, pisa uma ave que foge, clamando a sua indignação. Imediatamente, o
globo desaparece e tudo termina.
Ramiro, destroçado, chorou de dia e de noite e durante muito tempo pelo seu amor perdido. Tantas
lágrimas chorou que encheu umas covas que por ali existiam. O calor do sol evaporou a água, só ficando o
sal.
E assim, desde então que, por amor de Ramiro a uma sereia, a Ria de Aveiro se modificou.
Tem as suas famosas salinas, fruto das lágrimas choradas.
Tem as casas da Costa Nova, erigidas à semelhança da construída por Ramiro.
E tem os seus moliceiros, tão característicos da Ria que continuam de proa erguida, esconderijo fracassado
do pobre amante.

Lenda da Torre da Princesa


A tradição local refere que há muito, quando a povoação ainda era a aldeia da Benquerença, existiu uma bela
princesa órfã, que ali vivia com o seu tio, o senhor do castelo.
Esta princesa apaixonou-se por um nobre, valoroso e jovem cavaleiro, porém carente de recursos. Por esse
motivo, o jovem partiu da aldeia em longa jornada em busca de fortuna, prometendo retornar apenas quando se
achasse digno de pedir-lhe a mão.
Nesse ínterim, durante anos a fio, a jovem recusou todos os seus pretendentes, até que o seu tio, impaciente,
prometeu-a a um amigo, forçando-a ao compromisso.
Ao ser apresentada ao candidato do tio, a jovem confessou-lhe que o seu coração pertencia a outro homem, cujo
retorno aguardava há anos.
A revelação enfureceu o tio, que decidiu aumentar a coerção por meio um estratagema: nessa noite, disfarçou-se
como um fantasma e, penetrando por uma das duas portas dos aposentos da princesa, simulando ser o fantasma
do jovem ausente, afirmou-lhe com voz lúgubre, que ela estava condenada para sempre à danação, caso não
aceitasse casar-se com o novo pretendente. Prestes a obter um juramento por Cristo por parte da princesa,
milagrosamente abriu-se a outra porta e, apesar de ser noite, um raio de sol penetrou nos aposentos,
desmascarando o tio impostor.
Daí em diante, a princesa passou a viver recolhida na torre que hoje leva o seu nome, e as duas portas passaram
a ser conhecidas como Porta da Traição e Porta do Sol, respetivamente.

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