Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL
NATAL-RN
2017
Ceres Virginia da Costa Dantas
Natal-RN
2017
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede
___________________________________________________
Prof. Dr. Hélio Rodrigues dos Santos – Orientador
___________________________________________________
Prof. Dr. André Luis Calado Araújo – Coorientador
___________________________________________________
Profa. Dra. Juliana Delgado Tinôco – Examinador interno
___________________________________________________
Prof. Dr. Jean Leite Tavares – Examinador externo
Natal-RN
2017
RESUMO
A água foi, por muito tempo, considerada como um recurso inesgotável e, talvez por isso, mal
gerido. Por outro lado, cresce a consciência em torno da importância do uso racional, da
necessidade de controle de perdas e desperdícios e do reúso da água, incluindo a utilização de
esgotos sanitários tratados. As águas pluviais podem ser utilizadas como uma alternativa para
o abastecimento descentralizado, especialmente em localidades rurais (COHIM e
KIPERSTOK, 2008); proporciona a preservação dos mananciais tradicionais, especialmente
os poços, bem como pode reduzir custos. Aliado a isso, o reúso de águas cinzas geradas na
edificação também é uma alternativa promissora para fins pouco nobres, como a irrigação de
determinadas culturas. O estudo foi realizado no Centro de Estudos Budistas Bodhisatva
(CEBB) Darmata, que tem, dentre seus objetivos, a preservação dos recursos naturais e
convivência em harmonia com o meio ambiente. Tivemos como objetivo avaliar o potencial
de economia de água em uma edificação a partir do uso de águas pluviais para diversos fins,
inclusive potáveis, e o tratamento e reúso de águas cinzas na irrigação. Foi elaborado o
projeto legal com base nas normas brasileiras vigentes. O investimento para a implantação da
infraestrutura foi calculado utilizando o SINAPI como base de referência, totalizando um
valor de R$ 17919,41. Em termos financeiros, de uma maneira geral, o custo de implantação
dos sistemas pode ser considerado elevado, porém em termos de serviços ambientais, são 258
m³ de água do poço que deixam de ser utilizados por ano. Dessa forma, a implantação dos
sistemas de uso racional da água no CEBB Darmata se mostra favorável, apesar dos custos
relativamente altos, resulta em redução dos impactos ambientais gerados pelo
empreendimento e preservação das águas subterrâneas.
Palavras-chave: água de chuva, cisterna, custos, reúso, águas cinzas, meio ambiente.
ABSTRACT
Water has been regarded as an inexhaustible resource, and perhaps because of it, poorly
managed. On the other hand, the awareness of the importance of rational use is increasing, the
need to control losses and wastes, and the reuse of water, including the use of treated sewage.
Rainwater can be used as an alternative for decentralized supply, especially in rural locations
(COHIM and KIPERSTOK, 2008); it provides the preservation of traditional sources,
especially wells, as well as can reduce costs. Along with that, the reuse of gray water
generated in the building is also a promising alternative for less noble purposes, such as the
irrigation of crops. The study was carried out at the Bodhisatva Buddhist Studies Center
(CEBB) Darmata, which has, among its objectives, the preservation of natural resources and
coexistence in harmony with the environment. We aimed to evaluate the potential of water
saving in a building from the use of rainwater and the treatment and reuse of gray water in
irrigation. The legal project was elaborated based on Brazilian standards. The investment for
the implementation of the infrastructure was calculated through SINAPI, totaling a value of
R$ 17919,41. In financial terms, the cost of implementing the systems can be considered high,
but in terms of environmental services, they are 258 m³ of well water that are no longer used
per year.
1 INTRODUÇÃO1
A água é uma substância essencial à vida, que está presente em todas as atividades do
ser humano, desde sua alimentação até os usos industriais. Tendo isso em vista, a preservação
de tal bem se faz de suma importância, e a utilização de fontes alternativas de abastecimento é
uma alternativa para o melhor manejo da água, especialmente em tempos de crise hídrica
como a que o Brasil enfrenta de forma severa desde o ano de 2012, mais especificamente no
Nordeste do país. Segundo a ANA (2012), “a região semiárida do Nordeste, onde chove em
média 600 milímetros por ano de modo concentrado em poucos meses, sofre grande risco de
desertificação. Com a diminuição das chuvas, uma quantidade menor de água percola no solo,
reduzindo a recarga dos lençóis freáticos. Estima-se que possa ocorrer uma redução de até
70% na recarga dos aquíferos na Região Nordeste”.
Tal fato impacta no abastecimento que, muitas vezes, é feito através de poços. Nesse
contexto, as águas pluviais podem ser utilizadas como uma alternativa para o abastecimento
descentralizado, especialmente em localidades rurais. Nesses casos, o manejo deve buscar
aproveitar a água precipitada antes que ela entre em contato com substâncias contaminantes,
armazenando-a para uso doméstico, criando condições de infiltração do excedente,
restaurando os fluxos naturais, disponibilizando mais uma alternativa para abastecimento de
água local e descentralizado (COHIM e KIPERSTOK, 2008).
Sistemas de coleta e aproveitamento de águas pluviais e reúso de águas cinzas são
utilizados em países que incentivam a conservação de água potável, como a Alemanha,
Estados Unidos e o Japão. Uma das alternativas que tem demonstrado bastante eficácia na
conservação de água potável é o reúso de águas servidas (PHILIPPI, 2003 apud MAY, 2009)
Podem ser citados diversos aspectos positivos no uso de tais sistemas (MAY, 2004;
GONÇALVES, 2006; VIOLA, 2008): preservação do meio ambiente; utilização de estruturas
existentes na edificação (telhado, lajes e rampas); baixo impacto ambiental; água com
qualidade aceitável para vários fins, com pouco ou nenhum tratamento; aumento da segurança
hídrica para atender o crescimento populacional ou para atender áreas deficientes de
abastecimento; melhor distribuição da carga de água pluvial imposta ao sistema de drenagem;
redução dos riscos de enchentes, erosão dos leitos dos rios e assoreamento nas áreas planas no
início da temporada de chuvas torrenciais e em eventos isolados; possibilidade de uso para
recarga dos lençóis subterrâneos e manutenção dos níveis do lençol freático elevado, dentre
outros.
Tendo em vista tais aspectos, a utilização de águas de chuva e o reúso de águas cinzas
são iniciativas promissoras, especialmente em se tratando de locais com características
climáticas semi-áridas, como é o caso da maior parte do Nordeste brasileiro. O local em
estudo, uma edificação localizada na zona da mata do município de Timbaúba, interior de
Pernambuco, apresenta média anual de pluviosidade de 1073 mm, distribuídos de forma
desigual ao longo do ano. Apesar da média pluviométrica relativamente alta em comparação à
região semi-árida, ainda assim é notável a escassez hídrica no período mais crítico do ano.
Nesse sentido, o presente trabalho objetiva verificar o potencial de economia de água
potável, por meio do uso racional da água com a captação de água pluvial para diversos usos e
o reúso de águas cinzas para irrigação nas instalações do Centro de Estudos Budistas
Bodhisatva Darmata (CEBB Darmata).
2 REVISÃO DE LITERATURA
De posse dos resultados obtidos por Pinheiro e Araújo (2015), observa-se que de
forma geral a água apresenta-se com qualidade satisfatória a partir do segundo milímetro de
chuva quanto ao comparativo entre os parâmetros físico-químicos e os limites permissíveis
para fins de potabilidade. No que diz respeito aos parâmetros microbiológicos, segundo a
Portaria 2914/2011, os coliformes totais e E. coli devem estar ausentes. Entretanto, nas
amostras analisadas ambos os parâmetros apresentaram resultados positivos ao longo dos
cinco milímetros de chuva.
Assim, se faz de grande valia salientar a importância do descarte dos primeiros
milímetros de chuva. A primeira água, responsável pela lavagem da atmosfera e da superfície
de captação, deve ser desprezada e jogada fora, ou usada para fins pouco nobres, como
descargas sanitárias e lavagem de pisos, devido a suas características, menos aceitáveis
quando comparadas ao padrão de potabilidade existente no país. A partir do segundo
milímetro essa água poderá ser utilizada para fins não potáveis de usos não restritivos.
Andrade Neto (2004) apresenta uma proposta de desvio do primeiro milímetro de
chuva de forma simples, conforme Figura 1. Outro dispositivo pode ser citado, como o
apresentado por Lima et al. (2011), que utiliza os princípios físicos dos vasos comunicantes e
do fecho hídrico, em que os primeiros milímetros da chuva são acumulados em tubos
verticais, que são vedados por fecho hídrico após completamente cheios, quando a água segue
para a cisterna.
Em qualquer caso de funcionamento do dispositivo, é fundamental que depois de cada
evento chuvoso, o mesmo seja esvaziado, através de uma tubulação de descarga, a qual deve
ser novamente fechada permitindo o funcionamento do desvio automático das primeiras águas
do próximo evento (LAGE, 2010).
Águas cinzas são as águas residuárias provenientes dos usos do chuveiro, lavatório,
pia de cozinha, tanque para lavar roupa e máquinas de lavar louça e roupas. Em uma
edificação, a vazão de águas cinzas gerada está relacionada com o consumo de água como um
todo, considerando o per capita de água consumido e a quantidade de habitantes na
edificação. Para estimar as vazões em cada ponto de consumo, admite-se o quadro a seguir,
que apresenta o resultado obtido por pesquisas realizadas no Brasil.
9
A ABNT NBR 13969/1997 traz uma breve menção sobre parâmetros para reúso de
esgotos domésticos. Segundo a referida norma, são definidas classes de águas de reúso em
função de sua aplicação. Nessa classificação, o reúso de águas cinzas para irrigação de
pomares, cereais, forragens, pastagens para gados e outros cultivos compreende a classe 4,
cujas características, segundo a norma, não são restritivas, conforme mostrado na tabela a
seguir.
Destaca-se que, segundo a norma, a irrigação com esse tipo de efluente deve ser do
tipo pontual ou através de escoamento superficial. Outros autores (Pio et al, 2005) propõem
uma divisão diferente daqueles definidos pela ABNT NBR 13696/1997. Nessa classificação,
as águas destinadas à irrigação de áreas verdes e rega de jardins são classificadas como classe
3. Neste caso, a maior preocupação do emprego da água de reúso fica condicionada às
concentrações de contaminantes biológicos e químicos, incidindo sobre o meio ambiente e o
homem, particularmente o operário que exerce suas atividades nesse ambiente.
Alguns dos principais problemas relacionados com o gerenciamento da qualidade da
água são: salinidade, toxicidade de íons específicos, taxa de infiltração no solo, etc. O Grupo
Científico sobre Diretrizes para o Uso de Esgotos em Agricultura e Aqüicultura, reunido em
Genebra, Suiça, em 1989, estabeleceu os critérios básicos para a proteção dos grupos de risco,
associados a esquemas de reúso agrícola e recomendou, para efluentes líquidos, as diretrizes
resumidas no Quadro 2 (WHO, 1989).
Quadro 2: Diretrizes Microbiológicas Recomendadas para Uso de Esgotos na Agricultura (*)
3 MATERIAIS E MÉTODOS
questões ligadas à vida na zona rural e sobre como construir, produzir e consumir alimentos e
utilizar a água de forma lúcida e com menos impacto negativo, além de se situar em local que
apresenta escassez hídrica. Não possui abastecimento derivado da rede pública, utilizando
água proveniente de um poço profundo localizado a alguns metros das instalações.
A cobertura do prédio possui uma área de 174 m² e é composta por telhado metálico
que desagua em calhas de dimensões variadas. Também foi elaborado o projeto
hidrossanitário com separação das águas cinzas e negras, visando ao tratamento e reúso das
primeiras para irrigação.
O CEBB Darmata possui área total de 15 hectares, sendo que em suas instalações além
do templo existem chalés destinados a retiros longos. O restante da área é destinado à
agricultura e reflorestamento.
Figura 3: Projeção do prédio novo do CEBB Darmata Figura 4: Estágio da obra (mai. 2017).
Portanto considerou-se o valor de 9840 litros (ou 9,84 m³) de águas cinzas que seriam
reutilizadas para irrigação por mês no CEBB.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com base nas normas vigentes, foi feito o projeto das calhas para coleta e
direcionamento da água de chuva. Resultou na utilização de tubos de PVC de 100 mm de
13
150,0
(mm)
100,0
50,0
0,0
métodos (resultando em cerca de 8 m³ de volume de reservação). Tal fato pode ser justificado
devido à característica da precipitação pluviométrica naqueles países, que, diferente do Brasil,
geralmente ocorre uniformemente durante todos os meses do ano, dispensando, assim,
grandes reservatórios para suprir toda a demanda. Dessa forma, optou-se por desconsiderar os
métodos alemão, inglês e australiano para o projeto em análise.
O cálculo do reservatório através do método Rippl resultou conforme tabela a seguir.
A água coletada pelo telhado deve seguir para caixas de inspeção, interligadas entre si,
de onde seguirá para uma caixa de distribuição geral, a qual apresenta uma grade com o
objetivo de reter folhas e sólidos de maior granulometria. Por fim, a água deve ser direcionada
para o reservatório de descarte do primeiro milímetro de chuva, que, após o seu
preenchimento, alimenta o reservatório de armazenamento (cisterna), que será composto de
três reservatórios de polietileno de 10 m³.
Sugere-se que o reservatório de descarte do primeiro milímetro seja do modelo
proposto por Andrade Neto (2004): um pequeno tanque para onde são desviadas
automaticamente as primeiras águas de chuva, através de uma conexão em tê intercalada na
tubulação de entrada da cisterna, que deriva para este pequeno tanque as águas de lavagem da
superfície de captação. Como o tanque de desvio permanece totalmente fechado, quando o
telhado está lavado ele enche e só então é que a água de melhor qualidade vai para a cisterna.
16
O fecho hídrico dispensa boias ou outros artifícios. Depois da chuva, e antes que se acumule
sujeira na superfície de captação, o tanque de desvio deve ser esvaziado, através de uma
tubulação de descarga, que quando é novamente fechada, deixa o dispositivo pronto para o
desvio automático das primeiras águas da próxima chuva.
A água descartada do reservatório de desvio do primeiro milímetro pode ser utilizada
para fins menos nobres na edificação, como lavagem de pisos, descargas em bacia sanitária e
irrigação.
O tamanho do tanque de desvio foi estimado em cerca de 0,001 m³ por m² de área de
captação, resultando em um volume de 0,174 m³. Adotamos, portanto, um reservatório de 250
l, menor volume comercial existente para reservatórios de polietileno. Foi adotado ainda um
dispositivo de segurança, caracterizado por um extravasor localizado numa cota acima da
alimentação dos reservatórios, utilizado para impedir que, em casos extremos, quando a
precipitação for acima do esperado, a água extravase para um poço absorvente.
O sistema de abastecimento da edificação será composto por tais cisternas apoiadas
em lajes sobre o solo, que serão alimentadas pelo sistema anteriormente descrito. Tal cisterna
apresentará uma bomba submersa que recalcará a água para o reservatório localizado na
cobertura da edificação. Neste reservatório superior, será feita a cloração da água, onde
deverá ser utilizado flutuador abastecido com pastilha de cloro orgânico (comestível). Daí, a
água segue para o abastecimento.
O projeto de aproveitamento de água de chuva, anexado ao final do artigo, mostra
todo o percurso da água, desde a captação pelas calhas até a saída para o reservatório superior.
Dessa forma, o projeto visa a captar, reservar e utilizar a água proveniente das chuvas para
diversos usos no prédio, após cloração, proporcionando a manutenção da água do poço para
fins estritamente nobres e durante a época de seca, na propriedade.
Por outro lado, do ponto de vista de serviços ambientais, considera-se que são pelo
menos 140 m³ (devido ao uso de água de chuva) e 118 m³ (devido ao reúso de águas cinzas),
totalizando 258 m³ de água proveniente do poço que deixam de ser utilizados por ano. Essa
conduta está coerente com a visão do CEBB Darmata em preservar os recursos naturais e
conviver em harmonia com o meio ambiente, o que torna viável o investimento.
5 CONCLUSÃO
O estudo de caso apresentado neste artigo mostrou que no local em estudo existe um
grande potencial de economia de água potável através da captação da água pluvial para
19
diversos usos, e do uso das águas cinzas para irrigação, especialmente em se tratando de uma
região sujeita a períodos de seca e frente à crise hídrica que o Brasil enfrenta.
A redução de consumo anual devido ao uso de água de chuva, dentro da edificação,
utilizando-se um reservatório de 30,00 m³, é expressiva: da ordem de 140 m³, desde que os
dispositivos de proteção sanitária sejam adequadamente instalados, utilizados e tenham sua
manutenção efetivada.
Em relação às águas cinzas, em um ano ocorreria o reúso de 118 m³ de água na
irrigação, o que implica também na economia de água do poço que poderia ser usada para
esse fim.
O investimento para a implantação da infraestrutura seria de R$ 17919,41. Em termos
financeiros, de uma maneira geral, o custo de implantação dos sistemas pode ser considerado
elevado, em termos de serviços ambientais, são 258 m³ de água do poço que deixam de ser
utilizados por ano. Assim, a instalação de tal infraestrutura permite ao CEBB concretizar
ações de preservação do meio ambiente conforme suas diretrizes de convivência harmoniosa
com o meio ambiente, além da manutenção do recurso hídrico para momentos de escassez.
REFERÊNCIAS
______. NBR 5626: Instalação predial de água fria. Rio de Janeiro, 1998.
______. NBR 10844: Instalações prediais de águas pluviais. Rio de Janeiro, 1989.
ANDRADE NETO, C. O. de. Proteção Sanitária das Cisternas Rurais. In: SIMPÓSIO LUSO-
BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, 11., 2004, Natal, Brasil.
Anais... Natal: ABES/APESB/APRH, 2004.
PIO, A. A. B.; DOMINGUES, A. F.; SARROUF, L.; PINA, R. S.; GUSMAN JUNIOR, U
(COORD). Conservação e reúso da água em edificações. São Paulo:
ANA/FIESP/SINDUSCON, 2005.