Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Neoliberalismo E Educação: Impactos Na Vida Profissional Do Jovem Trabalhador. Um Estudo de Caso Da Escola Técnica de Carapicuíba/Sp
Neoliberalismo E Educação: Impactos Na Vida Profissional Do Jovem Trabalhador. Um Estudo de Caso Da Escola Técnica de Carapicuíba/Sp
Resumo
Diante das profundas mudanças vivenciadas corriqueiramente em nosso cotidiano, novas
perguntas nos perturbam e inquietam. Vemos constantemente nos noticiários, jornais e
revistas questões referentes aos novos moldes da economia mundial (globalização), em geral,
e do mundo corporativo, em específico, bem como à introjeção de novas tecnologias que se
tornam obsoletas a velocidades inimagináveis há alguns anos. Em face a estas questões o
presente trabalho se propõe a desvelar em que níveis estas mudanças influenciam a vida
pessoal e profissional do jovem trabalhador formado sob as bases de uma educação que,
conforme veremos, também sofreu modificações. Para buscar as possíveis respostas a estas
perguntas analisaremos primeiramente as alterações realizadas na LDBEN/96, avaliando os
efeitos e proporções destas mudanças no que concerne ao ensino profissionalizante ou técnico
admitindo ou refutando estas considerações na realidade da Etec – Escola Técnica de São
Paulo, na cidade de Carapicuíba, Zona Oeste de São Paulo.
Abstract
Given the profound changes experienced routinely in everyday life, new questions disturb us
and unsettle. We see constantly in the news, newspapers and magazines issues relating to new
ways of the world economy (globalization), in general, and the corporate world, in particular,
as well as the take of new technologies will become obsolete at speeds unimaginable a few
years ago. In face of these questions this study intends to reveal at what levels these changes
influence the personal and professional lives of the young worker formed on the basis of an
education which, as we shall see, also underwent changes. To search for possible answers to
these questions first analyze the changes made in LDBEN/96, proportions and evaluate the
*
Trabalho de Conclusão de Curso da Faceq - Faculdade Eça de Queirós, apresentado em 2012, como exigência
parcial para obtenção do título de Licenciado em Pedagogia sob a orientação do Professor Ms. Washington
Nascimento.
1
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
effects of these changes in relation to vocational or technical admitting or rejecting the reality
of these considerations Etec - Technical School of Sao Paulo, in Carapicuíba city, the west of
Sao Paulo.
INTRODUÇÃO
1
Segundo Chauí (1984), trata-se de um conjunto de ideias produzidas pelas relações sociais em determinado
período histórico, visando legitimar interesses da classe dominante por meio da apresentação de uma realidade
pseudo verdadeira.
2
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Visto que a escola hoje está em crise por sua estrutura ultrapassada e, também, pelo
jogo de interesses e manipulações capitalistas sob a ótica neoliberal, o jovem trabalhador está
fadado a refletir seu desempenho escolar na vida social e mercado de trabalho.
O objetivo primeiro da presente pesquisa é proporcionar uma visão geral do
neoliberalismo à medida que seus efeitos forem tratados nas problemáticas escolares,
trabalhistas e de cidadania.
Para analisar esta problemática, nos reportaremos a renomados teóricos brasileiros ou
não, admitindo ou refutando suas ideias na realidade da Zona-Oeste de São Paulo. Para tanto,
visitaremos a escola técnica Centro Paula Souza (Etec) da cidade de Carapicuíba, cujo PIB é o
menor entre as cidades de São Paulo.
A instituição se mostrou aberta à pesquisa reconhecendo sua seriedade. A maior parte
dos dados colhidos se deu através de documentos próprios, entre eles o último senso
denominado Sistema de Avaliação Institucional, realizado via internet (Web SAI 2011). Neste
sistema alunos e ex-alunos respondem a perguntas concernentes à Etec e às atividades
realizadas por ela. Outros dados foram obtidos por meio do portal web da Etec Carapicuíba,
além de termos colhido dados sob a forma de observações e questionários aos gestores e
professores.
3
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
ideologia criada nos Estados Unidos e Inglaterra intitulada como teoria do Capital Humano,
com o objetivo de “vacinar” países subdesenvolvidos contra o vírus do comunismo. Em suma,
esta é mais uma teoria com bases no processo de produção e reprodução do capitalismo.
Com o objetivo de acelerar o crescimento próprio e dos países vizinhos os seguintes
acontecimentos marcaram a história mundial. Os Estados Unidos aplicaram, na década de 50,
preceitos desenvolvimentistas no movimento do New Deal 2. Ao passo que os países
subdesenvolvidos também foram alvo de modernização na década de 60 por meio de
instrumentos supranacionais como a ONU, FMI, BIRD e UNESCO.
Fundada em 1945, nos Estados Unidos, a Organização das Nações Unidas (ONU) tem
por objetivo principal manter a paz internacional para garantir os direitos humanos e fomentar
o desenvolvimento humano socioeconômico das nações. A partir da criação da ONU, outros
organismos internacionais especializados foram fundados. O FMI (Fundo Monetário
Internacional) órgão responsável por estabelecer a cooperação econômica em nível mundial.
O Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) ou mais conhecido como
Banco Mundial foi criado com o intuito de fornecer auxílio aos países que foram destruídos
na Segunda Guerra Mundial, além de fomentar o desenvolvimento econômico e social dos
Estados. Finalmente, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência
e Cultura) que tem por objetivos principais globalizar a educação promovendo a paz,
fomentar uma maior circulação de informações e liberdade de imprensa, proteger o
patrimônio natural e cultural das nações.
Theodore Schultz e sua equipe afirmaram em sua pesquisa que o Capital Humano é o
fator que determinará se o país será mais ou menos desenvolvido. Segundo este estudo, o
recurso humano é responsável por mais de 50% das diferenças entre países ricos e pobres.
Agências como a CEPAL e CINTERFOR 3 tornaram-se responsáveis por difundir as técnicas
de produção do fator H.
O resultado esperado era que nações subdesenvolvidas, que investissem
pesadamente em capital humano, entrariam em desenvolvimento e, em seguida, se
desenvolveriam. Os indivíduos, por sua vez, que investissem neles mesmos em
educação e treinamento, sairiam de um patamar e ascenderiam para outra na escala
social. (FRIGOTTO, 2004, p. 92-93)
2
Diz respeito à série de programas concernentes a reformulação das práticas capitalistas após o “crash” da Bolsa
de Valores de Nova Iorque, em 1929, onde o Estado passou a desenvolver/promover a economia e o social.
3
CEPAL (Comissão Econômica para América Latina e o Caribe) é o organismo econômico da ONU atuante na
América Latina e Caribe. CINTERFOR (Centro Interamericano de Desenvolvimento do Conhecimento na
Formação Profissional) é o organismo responsável pela promoção do conhecimento e cooperação de seus
membros, voltados aos recursos humanos.
4
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Toda essa configuração assentou-se sobre as bases do modelo fordista, isto é, pela
lógica de “[...] organização de grandes fábricas, tecnologia pesada e base fixa, decomposição
das tarefas, ênfase na gerência do trabalho, treinamento para o posto, ganho de produtividade
e estabilidade no emprego.” (FRIGOTTO, 2004, p. 96).
Esta lógica deu origem a uma concepção de Estado de Bem-Estar social4, onde os
cidadãos poderiam almejar melhores condições de vida em serviços como saúde, educação,
moradia, emprego e salário, cabendo ao Estado proporcioná-los enquanto direitos, não mais
como caridade.
Contudo, a transnacionalização do Capital, isto é, a queda do modelo de acumulação
fordista somado aos altos gastos com políticas públicas, enfraqueceram a lógica dos Welfare
States. A crise do capitalismo em 1973, proveniente do pós-guerra, pôs fim aos anos "de
ouro" do capitalismo avançado do Estado de Bem-Estar.
O "antídoto" proposto por essa ideologia passa por alguns aspectos mais ou menos
tenebrosos: romper paulatinamente com os gastos sociais por meio do desmantelamento da
máquina estatal; permitir que a “livre mão do mercado” controle a economia; criar um
4
Período também conhecido como Welfare States, onde a forma de organização política prevê o Estado como
defensor e protetor social.
5
Diz respeito à tese do economista inglês John Maynard Keynes, que consiste na concepção político-econômica
em que o Estado exerce função indispensável. Ler Teoria geral do emprego, do juro e da moeda.
5
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
exército reserva de mão de obra, restaurando os níveis "naturais" de desemprego restituindo
assim, os níveis de competitividade.
No tocante a programas sociais tais como saúde, segurança, previdência social,
moradia e educação o neoliberalismo prega a redução do financiamento por parte do Estado,
já que os mesmos se transformam em gastos públicos e não em investimentos. A ideologia
que se quer defender é a de que o público e o privado representam o mau e o bom,
respectivamente.
Nesta visão, as práticas dos setores públicos são precárias, ineficientes e ociosas, ao
passo que a própria competitividade “força” os indivíduos dos seguimentos privados a serem
eficientes e produtivos. A lei da oferta e da procura, em termos de força de trabalho, torna-se,
portanto, equilibrada favorecendo, mais uma vez, o capital burguês.
A questão da lógica do mercado também precisa ser analisada. Permitir que o mercado
regule as relações sociais, ao contrário do que se prega, produzirá mais desigualdades sociais,
pois “a livre concorrência, numa sociedade de classes, é uma falácia.” (FRIGOTTO, 2004, p.
83). É a partir desse argumento que procede a ideia central da teoria de Estado mínimo, isto é,
liquidar todas as conquistas sociais nos mais diversos campos como direito à saúde,
segurança, emprego e educação transferindo-os às férreas leis do mercado. “Na realidade, a
ideia de Estado mínimo significa o Estado suficiente e necessário unicamente para os
interesses da reprodução do capital”. (FRIGOTTO, 2004, p. 84, grifo do autor)
Gentili (1996) assevera que o extraordinário é que para além das estratégias políticas e
econômicas, reside a ambiciosa necessidade de inculcar na consciência popular um novo
senso comum. As verdades neoliberais precisam ser introjetadas por qualquer pessoa
minimamente responsável e sensata. Ideologicamente o neoliberalismo consegue, portanto,
legitimar suas ideias como a única forma de relações sociais possível. Mediante ao colapso
do socialismo com a Queda do Muro de Berlim, em 1989, o capitalismo sai, mais uma vez,
triunfante proporcionando maior respaldo à hegemonia neoliberal.
No tocante aos diferentes campos influenciados pelo neoliberalismo, Frigotto (2004),
denuncia que este sistema privatiza e monopoliza, brutal e violentamente, até a informação.
Desta forma, a consciência das massas consegue ser manipulada pela grande mídia.
Para Frigotto (2004), o mais desumano é o fato de os neoliberais tratarem
problemáticas contemporâneas com nenhum senso de sensibilidade. A citação a seguir é no
6
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
mínimo tenebrosa. Apesar de não ser objetivo desta pesquisa se ater às questões a seguir,
acreditamos serem elas importante para ilustrar seus efeitos ideológicos.
O dado mais perverso, neste plano, é o processo de naturalização da exclusão, das
diferentes formas de violência, inclusive o puro e simples extermínio de grupos e
populações. [...] [inclusive] as frias análises custo-benefício da poluição, feitas por
técnicos do Banco Mundial que, ao constatarem os custos da mesma serem até cinco
vezes maior nos países desenvolvidos, recomendam despoluí-los enviando o lixo
industrial para os países onde cada morte tem um custo menor [...] na mesma lógica,
encontramos as justificativas do apressamento da morte ou simples e puro não
atendimento de crianças pobres e subnutridas porque há falta de aparelhos,
remédios, etc., por isso, a atenção deve ser dada às crianças cujas chances de cura
são mais elevadas. (Idem, p. 84)
7
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
subordinação às determinações do livre mercado; ondas de privatizações, desemprego
estrutural e globalização do capital.
6
Preceito da Gestão da Qualidade Total (GQT). Ver Enguita (2001).
8
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Segundo Frigotto (2004) subordinar a educação às leis do mercado, significa adotar
um sistema utilitarista e imediatista, com vistas a suprir as necessidades do mercado de
trabalho. Esta filosofia prega um consenso fragmentário do conhecimento, concebendo a
educação como um dado, uma mercadoria como qualquer outra, não como um processo de
construção.
No Brasil, em 1996 foi aprovada, pelo governo Fernando Henrique Cardoso, a nova
LDBEN7, vinda de um processo de elaboração que durou mais de cinco anos. Travando a
disputa estão de um lado deputados conservadores, com traços ainda oligárquicos; do outro,
parlamentares progressistas, sindicatos e Universidades. Florestan Fernandes, um dos
parlamentares que participou da elaboração da LDB declara explicitamente quem saiu
vencedor nessa queda de braço
[...] Os interesses que se chocaram dentro do Parlamento são tão destrutivos que o
projeto que já havia passado por todas as comissões, e por elas aprovado acabou, por
manobras de partidos ultraconservadores – como PDS, PFL e outros - voltando à
deliberação das comissões. E aí surgiram negociações que tornaram o projeto, já
com muitas limitações, muito mais precário. Eu comparo o que aconteceu a um
conjunto de decapitações, pelas quais a melhor parte de alguns dispositivos ou foi
transformada ou foi eliminada. (FERNANDES, 1992:28, apud FRIGOTTO, 2001, p.
55).
7
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996)
9
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
estratégicas, a educação continua inteiramente centralizada por meio de atividades de
planejamento e poder decisório. (ROMAN, 1999)
A escola deve assumir cada vez mais a tarefa de educação de seus alunos e deve
para isso ter a autonomia necessária, concentrando seus esforços educacionais, e não
mais em órgãos auxiliares, distantes da sala de aula. [...] À medida que a autonomia
da escola cresce, deve crescer também a participação da comunidade em sua gestão.
(ROMAN, 1999, grifo nosso)
No entanto, é evidente que este tipo de descentralização não pode ser vista
ingenuamente. Na verdade o que se pretende é entregar a responsabilidade da educação à
comunidade.
Historicamente mantida à margem das decisões sobre os rumos educacionais da
sociedade, a comunidade, sem preparo algum, é agora objeto de articulações
políticas e manobras mercantis, não obstante sua ilusão de estar efetivamente
participando dos processos decisórios. (ROMAN, 1999)
É sob este viés que a privatização e/ou descentralização do ensino no Brasil. O jogo
que se faz aqui é lançar, sobre a própria comunidade, a culpa pelo fracasso escolar de seus
filhos.
Reformas Curriculares
É preciso entender que grande parte das reformulações educacionais foram feitas à luz
do pensamento capitalista. A necessidade de autonomia expressa pela nova LDB camufla as
verdadeiras intenções governamentais. O currículo sugerido pelos PCNs 8 é uma prova disso.
Estes sugerem que não mais é necessária a assimilação dos conteúdos em si, mas que se
desenvolva no aluno uma estrutura do “aprender a aprender” 9.
Para tanto, a postura do professor não mais deve ser a de detentor do conhecimento.
Esta prática deve dar lugar a tendências interacionistas, tais como o construtivismo, onde o
aluno passa a construir o seu próprio conhecimento, percebendo-se como ser histórico e não
como produto social. Para tanto, a prática pedagógica deve partir do interesse e da realidade
do aluno.
A crítica que se faz aqui por Silva (2001) é que os discentes não estão livres para
decidir o que querem ou precisam, pois “aquilo que querem já está determinado
8
Parâmetros Curriculares Nacionais.
9
Um dos quatro pilares da educação na concepção de Jacques Delors a respeito da educação para o século XXI.
O tema é discutido em seu livro: Educação: Um Tesouro a Descobrir.
10
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
antecipadamente quando todo o quadro mental e conceitual está previamente definido em
termos empresariais e industriais.” (Ibid., p. 21)
Encontramos neste aspecto outra contradição. Apesar de os PCN’s apresentarem
apenas “sugestões” de propostas pedagógicas, na prática isto não acontece. Na realidade,
existe um implícito e particular apelo à concepção construtivista, ferindo, portanto, o que o
artigo 206 da Constituição defende: “o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas”. Além
de o cumprimento ou não do currículo implica diretamente no repasse de verbas às escolas.
(ROMAN, 1999).
Avaliações externas
10
Ministério da Educação.
11
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
2.5. Atuação dos professores
Gentili (1996) observa que o professor hoje é formado sob a lógica da “pedagogia fast
food”, isto é, por meio do rápido treinamento planejado e definido de forma centralizada e
com aplicabilidade imediata em diferentes contextos sociais. “Formar um professor não
costuma ser considerada uma tarefa mais complexa do que a de treinar um preparador de
Hambúrguer.” (GENTILI, 1996)
Apesar de o discurso da gestão democrática implicar numa maior autonomia para a
atuação do professor, a realidade se mostra contraditória, pois como já foi discutido, as
diretrizes que vem de “cima” prescrevem explicitamente os conteúdos, disciplinas e
metodologias a serem aplicados pelo professor, com vistas ao alcance de metas e resultados.
O trabalho docente vem sofrendo interferências de caráter burocrático, isto é, está
sendo cada vez mais sobrecarregado com “[...] mais tarefas e responsabilidades extras, mais
relatórios e registros escolares, maior intensificação do trabalho, [implicando em] menor
tempo para preparação e estudo.” (HYPOLITO, 2010, p.1346-1347). Está evidente que o
projeto neoliberal prevê cada passo para que a educação sirva aos seus próprios interesses.
Gentili (1996) traça uma analogia das reforças educacionais à lógica dos fast foods.
Para ele, o sistema de alimentação rápida surgiu para atender uma nova demanda da
sociedade pós-moderna. Em meio à correria diária, as horas parecem ter diminuído, e as
pessoas passam a maior parte do dia fora de casa, tendo pouco tempo até para se alimentar.
As lanchonetes McDonald’s são referência no mercado da alimentação rápida. Mcdonaldizar
a escola é torná-la mera prestadora de serviços aos interesses mercadológicos atuais.
As pessoas comem hambúrgueres porque o mercado assim exige; da mesma forma as
pessoas precisam “consumir” educação porque o conhecimento é a chave para a entrada na
nova sociedade do saber. É preciso salientar que a ideia de uma escola voltada aos interesses
do mercado de trabalho implica somente no ajuste força de trabalho/mundo do emprego. Não
se trata de escolarizar para garantir um trabalho ao aluno. Não é este o papel da escola. A
educação vai apenas ofertar instrumentos para que se possa competir no mercado, ademais
disto o esforço individual, indicará onde cada um conseguirá chegar.
12
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Roman (1999) denuncia que o indivíduo, apesar de “formado” não se sente preparado
para enfrentar a férrea concorrência no mercado de trabalho. Contudo, talvez o que o
indivíduo não perceba é que não é dele a culpa pela sua falta de preparação. É ao próprio
mercado de trabalho que exclui diariamente uma grande massa de trabalhadores.
Ao invés de afirmarmos, então, junto com o discurso oficial, que a educação
possibilita a entrada no mundo do trabalho, devemos afirmar que o mercado de
trabalho cada vez mais exige uma educação que produza indivíduos preparados para
serem excluídos. (ROMAN, 1999)
Isto é preciso para que o exército de mão de obra reserva possibilite a maior exigência
por competitividade e que os índices naturais de desemprego continuem regulando a lei da
oferta e procura por um posto de trabalho.
Fomos buscar na maior rede de escolas técnicas do Estado de São Paulo respostas às
indagações feitas no início deste trabalho. O primeiro contato com a instituição foi realizada
através da secretaria acadêmica, não sendo possível, em um primeiro momento, conversar
com algum representante da instituição. A autorização da realização da pesquisa se deu por
contato telefônico pela coordenação pedagógica. Neste contato a instituição se mostrou aberta
à realização da pesquisa fornecendo-nos arquivos e sensos realizados no ano de 2011. De
modo geral, boa parte dos dados necessários à realização deste trabalho foram obtidos através
destes documentos.
Na busca por questões específicas investigamos a possibilidade da realização de
entrevistas com coordenadores e professores. Contudo, isto não foi possível devido à sua
rotina nitidamente agitada e pouco flexível. Portanto, as respostas a essas questões se deram
através de questionários. A aparente dificuldade em entender o foco e objetivos das questões
ficou evidente tanto pela carência por maiores esclarecimentos que este tipo de investigação
oferece, quanto pela pouca disponibilidade dos gestores e docentes.
Traçaremos um pequeno histórico do Centro Paula Souza, órgão responsável pela
administração da Etec, analisando posteriormente os dados que pretendem revelar traços do
objeto de estudo da presente pesquisa.
Histórico
13
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Na década de 1960, o Conselho Estadual de Educação começa a perceber a
necessidade de formação profissional para a indústria paulista. É preciso criar um polo
educacional voltado às necessidades do mercado. Contudo, só em 1969 o governador Roberto
Costa de Abreu Sodré assina o Decreto-Lei que outorgou a criação da autarquia Centro Paula
Souza. Iniciando suas atividades em seis de outubro de 1969. O Centro Paula Souza tem a
função de unir, executar e desenvolver, nos graus médio e superior a educação tecnológica.
O Centro Paula Souza11 é o órgão responsável pela administração das 55 Fatecs
(Faculdades de Tecnologia) e das 208 Etecs (Escolas Técnicas). Nestas últimas há a oferta de
121 cursos nos três setores da economia, Agropecuária, Indústria e Área de Serviços. Destes
três cursos atendem a modalidade semipresencial, 20 cursos são concomitantes ao Ensino
Médio e dois concomitantes à EJA (Educação de Jovens e Adultos). Atualmente cerca de 226
mil alunos em nível médio e técnico são atendidos pelas Etecs.
Missão:
Difundir a educação pública profissional com objetivo de atender as demandas sociais
e do mercado de trabalho, sempre atreladas aos padrões de excelência.
Visão:
Alicerçar-se como centro de excelência e fomento ao desenvolvimento humano e
tecnológico.
Estratégias:
a) Antecipar-se às necessidades do mundo do trabalho;
b) Alcançar a satisfação dos públicos internos e externos;
c) Promover o aperfeiçoamento contínuo dos processos de planejamento, gestão e
atividades diversas;
d) Obter e manter níveis de excelência nos processos de ensino-aprendizagem;
e) Estimular a constante inovação tecnológica através de parcerias internas e externas;
f) Reconhecer, adequar e desenvolver permanentemente o capital humano;
11
O patrono: professor, engenheiro e político Antônio Francisco de Paula Souza nasceu em 1843 na cidade de
ITU. Teve uma formação ampla, estudando na Alemanha e Suíça. Foi o fundador da Poli (Escola Politécnica de
São Paulo), hoje integrada à USP (Universidade de São Paulo). Proveniente de uma família militante política,
lutou pela Abolição da Escravatura e pela inserção da República. Em 1892 elege-se deputado estadual,
permanecendo pouco tempo no cargo por ser convidado a assumir o Ministério do Exterior. Pode-se dizer que o
seu maior desejo era introduzir no Brasil um ensino técnico a fim de formar profissionais para além das mesas
acadêmicas, isto é, um profissional para o trabalho.
14
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
g) Promover a transparência e o compartilhamento de conhecimento e informações aos
públicos internos e externos;
h) Incentivar a sustentabilidade financeira da instituição.
(Centro Paula Souza: Missão, Visão, Objetivos e Diretrizes)
A Etec Carapicuíba
15
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Dentre os alunos que procuram os cursos técnicos a grande maioria (46%) está na
faixa etária de 15 a 18 anos, ou seja, estudantes que realizam ensino médio
concomitantemente/ simultaneamente ao ensino técnico.
Gráfico 1.
Gráfico 2. Gráfico 3.
16
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
No gráfico “membros da família” é constatável que a procura por cursos da Etec se
fazem majoritariamente por famílias compostas por quatro e cinco pessoas, evidenciando que
os alunos pertencentes à classe trabalhadora tem maior presença no campi. A renda familiar
predominante no segundo gráfico é de até três salários mínimos, o que confirma a análise do
primeiro gráfico.
Devido à facilidade de acesso à Etec, alunos de diversas cidades (mais de 30% dos
alunos) procuram cursos no polo de Carapicuíba como mostra o gráfico a seguir.
Gráfico 4.
Além da pesquisa realizada por meio do ato de matrícula, a Etec utiliza um Sistema de
Avaliação anual – Web Sai12– que colhe dados não apenas do nosso universo de estudo (Etec
– Sede), mas das Extensões da escola em Carapicuíba EE Prof. “Oscar Graciano” e São
Lourenço da Serra. Verificou-se que os cursos deste campi são mais procurados por
estudantes que cursam/ cursaram o ensino médio em escolas públicas (81,6%). Seguidos por
12,4% que cursaram maior parte em escola pública. Apenas 2,8% estudaram integralmente
em escolas particulares e 3% cursaram maior parte neste tipo de escola.
A pesquisa procurou verificar qual (is) motivo (s) levaram os alunos a optar pela
escola Etec e por determinado curso. Nesta etapa do questionário o aluno poderia marcar mais
de uma opção. Os resultados encontrados estão a seguir
12
Sistema de Avaliação Institucional (SAI), criado em 1998, hoje realizado pela Web.
17
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Gráfico 5.
Os itens mais assinalados pelos alunos quanto aos motivos pela escolha da Etec são: é
gratuita; é uma boa escola. Confirma-se, mais uma vez, a evidência de que os alunos mais
pobres tem maior procura pelos cursos por serem gratuitos e de qualidade.
Gráfico 6.
18
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
como bons cursos, seguidos dos 90,4% que tem intenção de profissionalizarem-se. A
possibilidade de maiores oportunidades de emprego e o interesse em exercer a profissão em
nível técnico são também diferenciais que os alunos procuram.
Contextualização
19
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
A missão expressa pela Etec enquanto escola técnica é oferecer, prioritariamente aos
alunos da cidade, uma oportunidade de ascensão social através da formação técnica de
qualidade que oferece. Além disso, objetiva promover nos alunos ingressos dos cursos noções
de cidadania e ética, por meio de atividades que incentivem o voluntariado e ações sociais.
Além da sede localizada no centro da cidade, a Etec fomentou a ampliação de oferta
por cursos através das classes descentralizadas contempladas no Plano de Extensão I e II 13. A
Instituição acredita em sua importância para a cidade e região, realizando inclusive algumas
ações de cunho social como atividades do dia das crianças e projetos junto à CETEC 14.
Os projetos interdisciplinares desenvolvidos têm por finalidade o desenvolvimento de
competências e habilidades nos alunos através da vivência efetiva no mercado de trabalho. A
participação e o envolvimento dos alunos nos projetos realizados é uma marca priorizada pela
escola.
Com o objetivo de aperfeiçoar os serviços prestados, a Etec promove avaliações
contínuas a respeito das ações desde a Gestão até a estrutura básica da escola. Para promover
a hábito de acesso aos meios digitais a Etec mantém um site e blog próprios, além de ter
implantado softwares específicos, como a plataforma moodle. Abaixo segue uma tabela
comparativa entre algumas Etecs do entorno.
Tabela 1.
Possui site próprio? Possui blog?
Barueri Não Sim
Cajamar Sim Sim
Carapicuíba Sim Sim
Osasco I Não Não
São Roque Sim Sim
As autoras.
Do curso em estudo
13
Unidades E. E. Prof. Oscar Graciano e Cidade de São Lourenço da Serra
14
Coordenadoria de Ensino Médio e Técnico.
20
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
A escolha do curso de Comunicação Visual se deu pelo fato deste ser uma prioridade
por investimentos e inovação, previsto no Plano Plurianual 2010-2014. Todos os cursos da
unidade tem a duração de um ano e meio, sendo compostos por três módulos (semestres).
Para ingressar nos cursos oferecidos, o aluno precisa ter concluído no mínimo o primeiro ano
do ensino médio, sendo que o ingresso nos cursos faz-se mediante processo seletivo
(Vestibulinho), que consiste em uma avaliação de competências e habilidades da primeira
série do ensino médio, são elas
a) Linguagem, Códigos e suas Tecnologias;
b) Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias;
c) Ciências Humanas e suas Tecnologias.
(Plano de curso de Comunicação Visual)
O Curso de Comunicação Visual está inserido no Eixo Temático de Produção Cultural
e Design. O técnico em Comunicação Visual estará hábil a projetar e executar projetos de
Diferentes gêneros e formatos gráficos para peças publicitárias como livros, portais,
painéis, folders, jornais. Desenvolve e emprega elementos criativos e estéticos de
comunicação visual gráfica. Cria ilustrações: aplica tipografias. Controla, organiza e
armazena materiais físicos e digitais da produção gráfica. (Plano de curso de
Comunicação Visual)
Na pesquisa de avaliação Web SAI 2011 é expresso no item oito o cálculo do gasto
anual por aluno. O dado encontrado foi de que cada aluno custa R$3.550,86 para a Etec
Carapicuíba. Sendo o calculo realizado da seguinte forma:
21
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Calculo aluno/ ano: ( x12
Parcerias
15
Fundação de Apoio à Tecnologia, fundada em 18 de dezembro de 1987 por professores da FATEC-SP, sendo
uma fundação filantrópica de direitos privados.
22
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Comunicação Visual Camila Calabrez reafirma a importância de parceria com empresas da
área gráfica e de fotografia, pois possibilitam visitas técnicas a parques gráficos e exposições
da área. Para ela a empresa Comgás e a Divulgação e Cultura do Cinema Nacional são
empresas-alvo de novas parcerias. O coordenador de Comunicação Visual João Batista
declara que a Etec precisa ampliar parcerias com empresas na área de serviços em fotografia e
design, visto que, para ele, a área de parcerias requer melhorias.
Parcerias com empresas privadas constituem metas previstas no Plano- Plurianual
2010-2014 em relação como subsídios para o efetivo desenvolvimento de competências e
habilidades nos alunos, além da inovação dos laboratórios e outros ambientes de
aprendizagem. Contudo, a Coordenadora Calabrez declara que “a Etec Carapicuíba não
mantém parcerias que proporcionem subsídios para a escola. A maioria das parcerias é de
cunho cultural”. Ela afirma ainda que estas empresas-parceiras apenas requerem a divulgação
de seus nomes. O coordenador João declara que existem indicações destas empresas por
mudanças periódicas nos laboratórios e no currículo de cada curso. Já a coordenadora
Carolina afirma que as empresas-parceiras têm a mesma visão da Etec, portanto os conteúdos
discutidos em ambas as instituições são aplicados de forma prática. As respostas se mostram,
portanto, divergentes.
Perguntamos à coordenadora Marielli se existe alguma parceria, em termos
empregatícios, entre a Etec e a prefeitura de Carapicuíba, na forma programas de estágio ou
de concursos internos, isto é, processos seletivos abertos apenas aos jovens Carapicuibanos,
como existe em Itapevi16, por exemplo. A resposta foi negativa, pois segundo a coordenadora
a parceria existente é de cunho social, não de empregabilidade.
De forma indireta a Etec Carapicuíba promove o compartilhamento de suas práticas
educacionais por meio do blog mantido pela própria Unidade Escolar. As parcerias com
outras unidades de ensino são também valorizadas, visto que promovem encontros de
formação e troca de experiências entre alunos, professores e direção das escolas.
A atual reforma educacional objetiva nada mais que se adaptar às novas configurações
capitalistas: a de superar a crise do modelo taylorista/fordista, marcado por produções em
16
Programa Conexão Jovem.
23
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
larga escala e produtos estandardizados. Hoje existe uma demanda por produtos de maior
qualidade e exclusividade. O trabalhador que a escola em geral, e o ensino técnico, em
particular vão produzir precisa ter uma formação mais universal, ser mais versátil e flexível.
Mediante a este contexto é preciso desenvolver na consciência dos trabalhadores em
geral, e nos que buscam uma inserção no mercado, de maneira específica, que os índices de
escolaridade e capacitação profissional implicam diretamente na entrada ou não ao mercado
de trabalho.
Entretanto isto é uma falácia, visto que os trabalhadores são levados a acreditar que a
educação constitui-se na chave de entrada ao mercado de trabalho, quando na verdade, esta
“entrada” é definida dentro do próprio mercado. Esta lógica mascara o ideário neoliberal que
prega, implicitamente, a ideia de meritocracia, isto é, os méritos individuais dirão a quais
patamares se poderão alcançar.
Analisaremos ainda, sob a luz destas literaturas, a visão dos gestores e coordenadores
do curso de Comunicação Visual da Etec Carapicuíba a respeito destas questões.
Formação Técnica
17
Também conhecido como movimento pós-industrial ou financeiro, diz respeito à série de mudanças que se
desenvolveram da década de 50 até os nossos dias.
24
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
no concerto global, países como o Brasil abriram as portas para novos modelos neoliberais
entre eles o econômico.
Com as atuais mudanças é interessante observar que ao mesmo tempo em que se opera
uma mudança de paradigmas - Taylor/fordista para Toyotista18- existe implicitamente a noção
de controle e exclusão social. Controle sobre o cerne das mudanças, isto é, o fator RH e
exclusão daqueles antigos profissionais que não mais atentem as novas exigências do
mercado.
Trata-se do problema referente à participação econômica (como produtora e como
consumidora) da enorme parcela da população que vem sendo contínua, consistente
e crescentemente excluída da empresa nos setores modernos da economia, em
decorrência da adoção dos novos paradigmas produtivos; o mesmo ocorre com o
serviço público, devido ao enxugamento do aparelho estatal. (FERRETTI, 1997, p.
231)
18
Modelo japonês criado por Taiichi Ohno, e introduzido nas indústrias automobilísticas Toyota após o fim da
Segunda Guerra Mundial. Nos anos 70, este modelo disseminou-se mundialmente devido a crise capitalista
sofrida neste período. A flexibilização da produção, isto é, a redução de grandes estoques por pequenos lotes de
alta qualidade e a necessidade de profissionais qualificados e polivalentes são características deste modelo de
produção.
19
FUNDEF: Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.
25
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
conseguirem cursar a escola em ‘tempo regulamentar’ já excedem as necessidades das
empresas”. (ROMAN, 1999)
É preciso, ainda, salientar que a valorização da educação básica se justifica na medida
em que se acredita que esta é imprescindível na formação do “novo trabalhador”. Além disso,
faz-se necessário, por forças novamente internacionais, uma cisão entre educação básica e
ensino profissional, tratam-se de
[...] recomendações [que] insistem, num primeiro plano, em que se promova, pela
via do sistema público de ensino, menos flexível, a formação de caráter geral, mais
demorada, que constituirá o terreno básico sobre o qual se construirão as
capacitações profissionais. Num segundo plano, sugerem, enfaticamente, que tal
construção seja realizada de modo ágil e flexível pelas agências de formação
profissional, de modo a responder, da forma a mais imediata possível, às demandas
dos diferentes setores econômicos, mas, em especial, daqueles que vêm introduzindo
inovações tecnológicas. (ROMAN, 1999, p. 253)
26
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
“saber ser”, na qual se confundem/articulam/mobilizam saberes, comportamentos
[e] racionalidade. (FERRETTI, 1999, p. 258)
27
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Não há como negar que o fenômeno do subemprego é uma tendência crescente nos
moldes neoliberais. Este abre portas para a desregulamentação e informalidade, isto é, a
grande oferta de contratos temporários onde a perda de direitos trabalhistas é evidente.
Os sindicatos e cooperativas perdem gradativamente o seu posto à medida que se
supervaloriza méritos, objetivos e carreira individuais em detrimento dos interesses coletivos.
A forte incitação ideológica à individualização dilui as conquistas sociais (BURDIEU, 1998).
Nesta lógica do salve-se quem puder reside a explícita manipulação neoliberal, pois
A instituição prática de um mundo de todos contra todos, em todos os níveis da
hierarquia, com seus adeptos do estresse e do sofrimento, sem dúvida não poderia
obter um sucesso tão completo se não contasse com a cumplicidade dos dispositivos
de flexibilização, que produzem a insegurança e a existência, em todos os níveis
hierárquicos - até mesmo nos mais elevados -, de um exército de mão-de-obra
docilizada pela precarização, pela ameaça permanente de desemprego.
(BOURDIEU, 1998 apud SILVA&LIMA, 2010, p. 146, grifos nossos)
28
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
períodos de recessão quanto nos primeiros momentos de submersão econômica o jovem é
alvo de exclusão.
Mesmo tendo a qualificação exigida, muitos jovens se submetem a estágios, isto é,
contrato profissional sem registro em carteira, portanto sem direitos trabalhistas. Há também
os que conseguem um emprego formal, mas muitos deles apesar de superqualificados se
submetem a cargos não condizentes com sua formação e expectativas salariais. O sentimento
da juventude pós-moderna é marcado pela falta de motivação, expectativas e instabilidade.
É possível que essa instabilidade enfraqueça o dispositivo de mobilidade social.
Dados da Organização das Nações Unidas – ONU informam que a juventude
brasileira se encontra em segundo lugar no ranking de pessimismo no que tange a
trabalho. Sete em cada dez brasileiros não acredita que terá um futuro com
condições de viver e trabalhar melhor que seus pais. (POCHMANN, 2000 apud
SILVA&LIMA, 2010, p. 148)
29
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
pode ser realizada através de projetos baseados em situações problemas reais. A professora
Camila Calabrez declara são adotadas práticas que façam o aluno ultrapassar seus “limites”,
afirma ainda que a aplicação de métodos diferenciados, visando atender ao perfil dos alunos é
uma praxe adotada pelos professores. O professor João Batista afirma que professores e
alunos participam de todos os processos, desde o planejamento até os feedbacks, apresentando
ideias e propondo melhorias para os próximos projetos.
As questões referentes à formação humanística contemplada no currículo obtiveram
respostas dadas a partir de diferentes prismas. A professora Carolina Marielli assevera que
conteúdos humanísticos, isto é, de caráter crítico e de cidadania são trabalhados através dos
projetos desenvolvidos pela escola. O professor João Batista afirma que este eixo poderá ser
trabalhado pelo professor no planejamento de suas aulas, visto que o currículo estabelecido
pela Etec é flexível. A professora Camila Calabrez declara que quesitos como a ética,
proatividade e comprometimento dos alunos constituem-se em critérios de avaliação contínua.
Para nos atermos de forma ainda mais específica a essas questões, entrevistamos dois
professores do curso de Comunicação Visual. O professor A trabalha na instituição há cinco
anos, e o professor B há dois. Ao ser questionado sobre a presença de conteúdos de cunho
crítico-reflexivo em sala de aula, este afirma este assunto é trabalhado com frequência
mediana. O professor B declara que estes conteúdos são trabalhados com pouca frequência
“pois a minha disciplina é mais prática.” O mesmo professor declara que estas questões são
trabalhadas na forma de debates e diálogos.
A seguinte pergunta surpreendeu nitidamente os dois professores, portanto
acreditamos ser interessante apresentá-la na íntegra:
Um dos efeitos da mudança na mentalidade administrativa Taylor/fordista para
Toyotista foi a efetiva redução dos postos de trabalho. Como você acredita que a
Etec pode contribuir para que este fenômeno não seja um empecilho na carreira do
jovem trabalhador?
30
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
A seguinte questão legitima novamente a visão meritocrática dos dois professores.
Perguntamos: “Você acredita que hoje o jovem qualificado consegue ter boas expectativas
quanto à sua carreira profissional? Justifique”. O professor A assevera “Sim, se dedicando,
atualizando na área.” A resposta do professor B é também afirmativa “pois a qualificação dá
suporte e embasamento técnico-teórico para os jovens”.
Quando questionado sobre o acompanhamento dos alunos egressos do curso o
professor A declara que este contato até certo ponto existe, por meio de correio eletrônico. O
professor B responde afirmativamente, dizendo que este contato é feito através da internet.
Segundo o professor A “em torno de 40%” dos alunos saem da instituição atuando no
mercado de trabalho. O professor B declara “não tenho estes dados, talvez 40 a 50%”.
Os dois professores declaram que as empresas contratantes dos alunos Etec são
nacionais. Para o professor A empresas de pequeno, médio e grande porte contratam estes
alunos. Para o professor B, empresas de médio porte contratam majoritariamente os alunos
egressos da unidade.
A Área de Avaliação Institucional convida semestralmente, através de correio
eletrônico, os alunos egressos da Etec - depois de um ano de formados - a preencherem o
questionário SAIE 20, no sistema Web Sai. Trata-se de uma “amostra não probabilística,
intencional por cota, sobre os quais não se aplicam cálculos de precisão ou confiança” (Web
SAI 2011, apud Fauze Najib, 1993, pg. 282-302). O último Web Sai de 2011 computou o
número de 179 egressos em que apenas 45, isto é, 25,1% responderam à pesquisa. Destes,
60% são homens e 40% mulheres. Em relação à situação de estudo analisaremos dois gráficos
a seguir.
Gráfico 8.
20
Sistema de Acompanhamento Institucional de Egressos.
31
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Acreditamos que 64,4% dos alunos confiam que níveis maiores de qualificação
merecem investimentos por diversos fatores, entre eles pela ideia de que esta formação
proporcionará melhores resultados no quesito empregatício, ou que a sua formação técnica
não foi suficiente para o alcance de seus objetivos. Da mesma forma, o dado 35,6% dos que
não estudam pode representar o contrário, isto é, que a formação adquirida na Etec foi
satisfatória, não necessitando cursar outros níveis de ensino.
Em relação ao trabalho 80% da população pesquisada - 25% dos egressos- exerce
atividade remunerada, isto é, tecnicamente conseguiram um emprego, sendo que destes 35,6%
trabalha na área do curso; 44,4% trabalham em outras áreas e 20% não responderam. A seguir
analisaremos a remuneração dos egressos.
Gráfico 9.
Como observado, mais da metade dos alunos egressos dos cursos não conseguiu
ascender socialmente, permanecendo na posição da renda familiar predominante no gráfico 3.
O gráfico a seguir procurou analisar as relações de profundas mudanças que o trabalho
vem sofrendo nas últimas décadas. Também retirado do último Web Sai, este gráfico
apresenta o exame da formalidade ou não da situação trabalhista dos alunos egressos no
gráfico 10, bem como o tipo de empresas empregadoras no gráfico 11.
Gráfico 10.
32
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Fonte: Web Sai 2011.
Dos 80% de alunos que conseguiram um emprego, 75,6% apresentam vínculo formal
de trabalho, com direitos previstos na legislação trabalhista, contra 4,4% dos que exercem
atividade remunerada sem carteira assinada.
Gráfico 11.
33
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Fonte: Web Sai 2011.
Tabela 2.
Pontos Pontos
Cursos da Etec %
Máximos Obtidos
Sem dificuldades no desempenho profissional (n° 35 27 77,1
de trabalhadores)
Aplicação dos conhecimentos adquiridos no 45 34 75,6
curso, no dia-a-dia do seu trabalho (n° de
trabalhadores)
Contribuição do curso para melhorar a situação 45 36 80,0
pessoal / profissional (nº de respostas às opções)
O curso atendeu suas expectativas (nº de egressos) 45 43 95,6
Facilidade em arrumar ou manter o emprego 36 27 75,0
depois de formado (nº de trabalhadores)
34
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
Total 206 167
81,0
Total relativo à pontuação 60 48,6
Fonte: Web Sai 2011.
Como foi possível observar na tabela anterior, 77,1% dos egressos que responderam a
pesquisa não tiveram dificuldade no desempenho de sua profissão, contra 22,9% que
enfrentaram alguma dificuldade. Nota-se que a grande maioria dos egressos acredita que os
currículos e conteúdos dos cursos estão de acordo com as necessidades e tendências do
mercado de trabalho. Outro dado importante é que 95,6% dos egressos que acreditam que o
curso que realizaram atendeu suas expectativas, contra 4,4% que não ficaram satisfeitos com
o curso.
Tabela 3.
Descrição dos Itens Pesquisados M. Bom Bom Regular Deficiente
É visível que muitas das competências elencadas na tabela anterior são de cunho
majoritariamente técnicos. Também é possível observar que a grande concentração dos votos
35
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
foi depositada no conceito “bom”. Os conceitos “muito bom” e “regular” alcançaram,
basicamente, a mesma pontuação. Dois itens não receberam votos no campo “deficiente”, são
eles “capacidade para lidar com situações novas” e “planejamento do próprio trabalho”,
evidenciando que os cursos e currículos da Etec prezam e trabalham estas habilidades. Um
dado interessante, que só é assim após a analise do contexto, foi os 13,3% dos egressos que
veem como deficiente os “conhecimentos sobre gestão empresarial”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho pode-se constatar que as diferentes faces que o modelo econômico
vigente pode aderir. Desde o seu surgimento, o capitalismo se mostrou flexível e adaptável às
mudanças que no mundo em geral. No estado de Bem- Estar Social o capitalismo avançou à
mesma medida que os direitos das pessoas. Contudo, este modelo não duraria muito tempo
vistas aos novos modelos de administração e da globalização do capital e do conhecimento.
Os efeitos da ideologia neoliberal puderam ser vivenciados na realidade da educação,
em geral, e no ensino técnico, em específico, à medida que foram analisadas à luz das
pesquisas bibliográficas. Ficou nitidamente visível a coerência e o forte discurso que esta
ideologia prega. Os efeitos perversos desta corrente de pensamento são facilmente
naturalizados e incutidos na mentalidade social.
Diante do questionamento proposto neste trabalho encontramos o fato de que a grande
maioria dos alunos egressos dos cursos da Etec (80%) conseguiram uma colocação no
mercado de trabalho, entretanto parte considerável destes ex-alunos parecem permanecer na
condição socioeconômica à qual pertenciam. É de igual maneira importante considerar o fato
de que os egressos dos cursos que responderam a pesquisa são os que possuem
microcomputador em sua residência. Talvez este dado justifique o fato de que apenas 25,1%
responderam a pesquisa.
Outro fator de suma relevância foi a percepção do déficit de conhecimento que muitos
egressos da Etec obtiveram em sua formação referente à gestão empresarial, isto é, da visão
da empresa como um todo. O foco do curso está concentrado em conteúdos voltados para o
chão da fábrica e/ou setor de serviços.
A iniciativa do Centro Paula Souza é, para nós, louvável, pois apesar de seus
professores acreditarem na meritocracia, isto é, cada um chegará onde quiser chegar, existe a
36
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
oportunidade para que o jovem tenha o ensejo de conseguir uma formação técnica gratuita
bem como a consecução de uma oportunidade profissional. Acreditamos que conteúdos de
cunho crítico-reflexivo, bem como disciplinas e/ou seminários e palestras neste âmbito
precisam tornar-se parte integrante do currículo. Acreditamos ainda que medidas como
concursos internos para alunos e egressos moradores da cidade de Carapicuíba podem ser
ideias levantadas pela gestão Etec à cidade como medida de desenvolvimento interno.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHAUÍ, Marilena de Sousa. O que é ideologia. São Paulo: Abril Cultural/ Brasiliense, 1984.
FERRETTI, João Celso. Formação profissional e reforma do ensino técnico no Brasil: Anos
90. Educação & Sociedade, ano XVIII, nº 59, agosto/97.
GENTILI, PABLO. Neoliberalismo e educação: manual do usuário. In. SILVA, Tomaz Tadeu
da; GENTILI, Pablo (Orgs). Escola S.A: Quem ganha e quem perde no mercado educacional
do neoliberalismo. Brasília: CNTE, 1996.
HYPOLITO, Álvaro Moreira. Educação & Sociedade. Campinas, v. 31, n. 113, p. 1337-1354,
out.-dez. 2010.
37
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/
ROMAN, Marcelo Domingues. Neoliberalismo, política educacional e ideologia: as ilusões
da neutralidade da pedagogia como técnica. Psicol. USP [online]. 1999, vol.10, n.2, pp. 153-
187. ISSN 0103-6564. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-
65641999000200011&script=sci_arttext >. Acesso em: 10 ago. 2011.
SILVA, Maria Vieira; LIMA, Idalice Ribeiro Silva. Desemprego Juvenil e Políticas de
Educação Profissional no Contexto da Reestruturação Produtiva. In: LIMA, Antônio Bosto
de; PALAFOX, Gabriel Humberto Muñoz (Orgs.). Estado, e Políticas Públicas em tempos de
reformas. Campinas: Alínea, 2010
38
E-FACEQ: revista dos discentes da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2238-8605, Ano 2, número 2, agosto de
2013. http://e-faceq.blogspot.com.br/