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DOSSIER

MEDICINA DE VIAGEM

Prevenção da malária
MARIA JOÃO ROSAS*

Etiologia ou temperaturas inferiores a 20oC.


A malária é uma doença provocada por
um protozoário, o Plasmodium, que Epidemiologia
apresenta quatro espécies capazes de A malária é uma doença transmissível
provocar doença no homem: P. falcipa- endémica, emergente e reemergente.
rum, P. malariae, P. ovale, P. vivax. Des- Afecta anualmente 300 a 500 milhões
tes, o Plasmudium falciparum é o que de pessoas, causando cerca de 2,5 mi-
provoca as formas mais graves de doen- lhões de mortes, a grande maioria em
ça, sendo responsável por cerca de 95% crianças com menos de 5 anos. 90% dos
das mortes por malária. Infelizmente o casos ocorrem na África Subsaariana
Plasmodium tem vindo a desenvolver (Figura 2), mas afecta igualmente ou-
crescente resistência aos antimaláricos. tros países da Ásia e América Latina,
O vector que o Plasmodium utiliza é sendo que na Europa ocorrem anual-
o mosquito fêmea do género Anopheles mente mais de dez mil casos importa-
(Figura 1), o qual se alimenta de noite dos. Em Portugal a malária é uma
e tem grande capacidade de desenvolver Doença de Declaração Obrigatória.
resistência aos insecticidas. Não há ma- O aumento das migrações e das via-
lária em zonas desfavoráveis ao Anophe- gens tornam a malária um problema
les como por exemplo a grande altitude mundial e a grande facilidade de mo-
bilidade humana torna-a uma ameaça
como doença reemergente na Europa.
O período de incubação da malária
pode ir de 7 dias a vários meses, pelo
que os sintomas que surgem nos pri-
meiros seis dias após a chegada pela
primeira vez a uma zona endémica não
são malária. Mas se o viajante já esteve
anteriormente em alguma zona endémi-
ca, então estes sintomas poderão já ser
malária.
Os sinais e sintomas da malária in-
cluem:
Febre – o sintoma mais frequente,
com subida rápida da temperatura, que
atinge os 39o-41oC, seguida de descida
lenta, em 4 a 8 horas, e acompanhada
habitualmente de cefaleias.
Mal-estar geral; sudação profusa,
prostração, mialgias e artralgias, são
também sintomas frequentes, podendo
igualmente surgir sintomas grastroin-
testinais, icterícia e colúria.
A malária grave, que resulta do fac-
*Assistente Graduada Figura 1. Em cima, mosquito anopheles. Em baixo, to de o Plasmodium se sequestrar nos
de Saúde Pública - Coordenadora
da Sanidade Internacional
observação microscópica do Plamodium falciparum. capilares dos órgãos vitais, pode incluir
da Região de Lisboa e Vale do Tejo Fonte: OMS/TDR. malária cerebral, anemia grave, hipo-

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áreas onde a transmissão da malária ocorre


áreas com risco limitado
áreas sem malária

Figura 2. Adaptado de OMS, 2002.

glicémia, sindroma de dificuldade res- risco de adquirir malária durante a via-


piratória aguda, insuficiência renal, aci- gem, prevenção das picadas dos mos-
dose láctica, coagulação intravascular quitos, quimioprofilaxia correcta e re-
disseminada, e infecções secundárias. conhecimento dos sintomas.
A malária complicada tem uma mor- Sempre que um viajante se vai deslo-
talidade de 100% quando não tratada car para uma zona endémica de malá-
e de 10-20% quando tratada. ria, justifica-se que grande parte da con-
Existem também formas crónicas de sulta pré-viagem seja dedicada à sua
malária. prevenção.
O diagnóstico faz-se pela identifi- Assim, deverá em primeiro lugar ser
cação de formas assexuadas do Plasmo- explicado ao viajante que no país ou
dium no sangue periférico, devendo ser países, ou zona onde se irá deslocar,
efectuado o exame da gota espessa e do existe malária (não esquecer dizer que
esfregaço. No entanto, para que o dia- é a mesma coisa que «paludismo») e que
gnóstico seja possível, é necessário que a sua saúde poderá correr sérios riscos
o clínico suspeite da hipótese de malá- caso não tome as devidas precauções.
ria, pelo que é fundamental que o via- Deverá igualmente ser explicado que
jante seja avisado antes da partida que ainda não existe vacina contra a malária
deverá avisar ou lembrar o seu médico e que todas as medidas de prevenção
que esteve em determinado local, caso que lhe iremos propor são de grande im-
venha a adoecer depois de regressar – portância, uma vez que a medicação
«não há cá doenças tropicais (autócto- que irá tomar não tem a eficácia de uma
nes), ninguém se vai lembrar!» vacina; no entanto, esta medicação
A eficácia da prevenção da malária poderá ser bastante eficaz se correcta-
no viajante depende de vários factores, mente tomada, e poderá evitar que ve-
nomeadamente: consciencialização do nha a desenvolver uma forma grave da

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doença, a qual caso contrário poderá A quimioprofilaxia da malária deverá


mesmo ser fatal. A importância da ma- ser recomendada caso a caso, de acor-
nutenção do medicamento por um pe- do, em primeiro lugar, com o local da
ríodo depois do regresso é fundamen- viagem, e tendo em conta eventuais
tal que seja bem compreendida pelo via- contraindicações. O conhecimento do
jante de modo a que não se desmotive percurso da viagem é fundamental,
e suspenda a medicação. uma vez que terão de se ter em conta
No caso de se tratar de uma grávida, eventuais resistências a alguns antima-
deverá ser recomendado o adiamento láricos.
de qualquer viagem não imprescindível Terá de se ter sempre em considera-
para zona endémica de malária. No caso ção eventual medicação anterior, e de
de a grávida optar por fazer a viagem, e um modo geral a quimioprofilaxia não
no local de destino haver resistência do deverá exceder um períodos de 3 meses,
Plasmodium à cloroquina, deverá ser e será para efectuar, antes, durante e
dada ainda maior ênfase à importância após a estadia no local de risco.
das outras medidas de protecção. Existem neste momento vários
Deverá ser realçado o papel do repe- medicamentos no mercado, e a sua
lente de mosquitos, bem com da utili- prescrição dependerá dos factores atrás
zação de roupa adequada e a protecção citados:
do local de dormida, lembrando que o Cloroquina
ideal será «não ser picado pelo mosqui- (nome comercial: Resochina)
to». É o antimalárico que tem maior número
A utilização do repelente de mosqui- de locais no mundo com resistência.
tos deverá ser fomentada, lembrando a Esquema: 2 comprimidos/semana -
necessidade de reaplicação do produto sempre no mesmo dia da semana
várias vezes ao dia, bem como a reco- 1 semana antes
mendação de utilização de roupa que durante a estadia
proteja o mais possível, deixando um até 4 semanas após o regresso
mínimo de zonas de pele expostas. A re- Embalagens de 20 comprimidos –
gra de ouro para utilização do repelente venda em farmácia
de mosquitos deverá ser «usar e abusar,
e na dúvida… pôr». Proguanil (Paludrina)
Relativamente ao local de dormida, Prescrever sempre associado à cloro-
este deverá ser bem protegido, uma vez quina ou à atovaquona
que os mosquitos que transmitem a Esquema: 2 comprimidos/dia
malária se alimentam durante a noite; durante a estadia
recordar que se tiver ar condicionado, até 4 semanas após o regresso
tanto melhor, pois poderá ser mantido Contraindicações – medicação com
o ambiente mais fresco e não será sufunilureias ou anticoagulantes
necessário abrir as janelas; no entan- Embalagens de 100 comprimidos –
to, mesmo assim, se existir uma ventoí- venda em farmácia
nha sobre a cama, esta deverá ser liga-
da durante a noite, porque o movi- Cloroquina + Proguanil (Savarine)
mento do ar afasta os mosquitos. Caso Esquema: 1 comprimido/dia
não haja ar condicionado, deverão exis- 3 dias antes
tir redes mosquiteiras nas janelas, e durante a estadia
uma rede sobre a cama (que deverá até 4 semanas após o regresso
chegar até ao chão) a qual deverá ser Venda por comprimido, na farmácia
impregnada de repelente e mantida da Sub-Região de Lisboa - Av. 24 de
sempre bem fechada. Julho, 120

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Mefloquina (Mephaquin) Venda apenas na farmácia da Sub-


Esquema: 1 comprimido/semana – -Região de Lisboa (Av. 24 de Julho,120)
sempre no mesmo dia e no Instituto de Medicina Tropical (à
1 semana antes Junqueira) - atenção ao preço, que na
durante a estadia prática poderá representar uma con-
até 4 semanas após o regresso traindicação (3.7 €/comprimido).
Contraindicações: idade inferior a 2
anos ou peso inferior a 15 Kg; gravidez; Referências bibliograficas
depressão; imunodepressão; medicação 1. World Health Organization. International
com antiarrítmicos, b-bloqueantes, an- Travel and Health. Genéve, 2002.
tiepilépticos, ou alguma das seguintes 2. Waner S, Durrhiem D, Braack LE, Gam-
situações: pilotar aviões, praticar asa mon S. Malaria protection measures used by
delta, alpinismo, mergulho de garrafa, in-flight travelers to South Africa game parks.
Journal Travel Med 1999; 6: 254-257.
ou andar em andaimes.
3. Danis M, Gentilini M. Le paludisme, fléau
Embalagens de 8 comprimidos, ven-
mondial. La revue du practicien 1998; 254-
da em farmácia. 257.
4. Sousa S, Leitão C, Campos A. Paludismo
Atovaquona + Proguanil (Malarone) e gravidez. Lisboa: Arquivos da Maternidade
Esquema: 1 comprimido/dia Alfredo da Costa, 1999; XV: 43-50.
1 dia antes da partida 5. Harrison`s principals of internal me-
durante a estadia dicine. 14th ed. New York: McGraw-Hill Health
1 semana após o regresso Professions Division, 1998. p 1180--1189.
até um máximo de 28 dias de toma

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