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Guilherme de Almeida
Qual é a caca:
No 'Painel' da GloboNews do dia 21 de julho de 2002, Gilberto Dupas
(economista da USP), Carlos Eduardo Lins da Silva (diretor de redação do
jornal Valor Econômico) e Bóris Fausto (historiador da USP) debatiam
sobre a situação política nos Estados Unidos. No decorrer do debate,
surgiu uma deixa para Gilberto Dupas afirmar que "o capitalismo trabalha
nessa zona cinzenta do moralismo", oferecendo como exemplo a questão
da elisão e da sonegação fiscal.
Além de se equivocar ao tratar o capitalismo como ideologia (o
capitalismo surgiu como realidade econômica séculos antes de qualquer
tentativa de legitimá-lo ideologicamente), Gilberto Dupas utilizou o velho e
falso discurso da associação da direita à imoralidade, reservando à
esquerda, conseqüentemente, o manto exclusivo da moralidade.
Gilberto Dupas escolheu o tema 'elisão fiscal' porque sabe muito bem que
a imensa maioria das pessoas, não conhecendo nada sobre o assunto, tem
como opinião aquilo que lê em jornais e revistas de grande circulação (os
quais transmitem conceitos difusos, que quase se confundem, de elisão e
sonegação fiscal). Assim, ciente da confusão conceitual na cabeça de
seus ouvintes, Dupas não vacilou em associar o capitalismo à
malandragem, à elasticidade moral de espertalhões.
A elisão fiscal, no entanto, não se confunde com sonegação fiscal. Muito
pelo contrário, aliás: elisão e sonegação estão em campos diametralmente
opostos.
A atuação da elisão fiscal - apenas um nome difícil para o resultado do
velho e bom planejamento tributário - reside exclusivamente no terreno do
lícito, do fiscalmente correto, do constitucional. O planejamento tributário,
saudável instrumento à disposição do contribuinte, revela apenas o limite
intransponível para a ânsia fiscal do Estado, o qual parece precisar de
focinheira para não avançar no patrimônio das pessoas e das empresas.
Não nos esqueçamos de que há no Brasil 61 tributos cobrados na forma de
impostos, taxas e contribuições; nem de que estão em vigor 3.000 normas
que regem o sistema tributário; e nem de que há, ainda, mais 93
obrigações acessórias que uma empresa deve cumprir, entre as quais o
preenchimento de declarações, formulários, livros e guias (Gazeta do Povo,
14/07/2002).
A sonegação fiscal, bem diferente da elisão, surge quando não se respeita
uma norma instituidora de tributo; comete ilícito fiscal o contribuinte que
não recolher tributo legalmente previsto.
Como já afirmei, a maior parte das pessoas desconhece tal diferença, e
isso ocorre por ela se revelar claramente apenas no plano jurídico. É por
isso que o homem médio tende a aproximar a elisão da sonegação fiscal.
Mas como economista da USP, Gilberto Dupas conhece muito bem os
limites legais do planejamento tributário. Dupas escolheu o exemplo da
elisão fiscal para impor ao telespectador leigo no mínimo a indução à
dúvida sobre a 'moralidade do capitalismo'. Em seguida, para ter certeza da
eficácia de seu intento, o economista afastou-se do tecnicismo
jurídico-fiscal para arrematar: "se julgarmos o capitalismo sob a ótica de
estrita moralidade, não ficará pedra sobre pedra".
No bloco seguinte do 'Painel' na GloboNews, examinando o presidente da
maior potência capitalista, Carlos Eduardo Lins da Silva asseverou: "Bush
não tem simpatia pelo que ocorre fora dos Estados Unidos".