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Perle Noire: Meditations for Josephine (Pérola Negra: Meditações para Josephine)

Estética, Discussão e Recepção

Tyshawn Sorey

Apresentada como cumprimento parcial dos


requisitos para a obtenção do grau de
doutor em artes musicais na
Escola de Pós-Graduação em Artes Musicais

COLUMBIA UNIVERSITY
2017
Resumo

Esta dissertação, organizada em duas partes, é composta de um ensaio sobre o meu


ciclo de canções Perle Noire: Meditations for Josephine e suas partituras. Perle
Noire consiste em uma partitura musical flexível que eu compus para a soprano
Julia Bullock, membros selecionados da International Contemporary Ensemble e
eu, com duas edições de performance. A primeira edição, que decorre de parte de
uma produção concebida pelo diretor de teatro Peter Sellars, inclui poesia recitada
sobre Josephine Baker por Claudia Rankine e coreografia por Michael Schumacher.
A segunda edição é uma performance musical sem textos, nem coreografias. A
estreia mundial de Perle Noire ocorreu no 2016 Ojai Music Festival, na Califórnia,
com performances subsequentes no Lincoln Center, em Nova York; Da Camera,
em Houston; e no Stony Island Arts Center, em Chicago, Illinois. A performance
completa do ciclo de 90 minutos envolve as seguintes cinco recomposições e um
“head arrangement (arranjo da cabeça)” para um conjunto misto de improvisadores-
performers e soprano: Parte I - 1. Bye Bye Blackbird, 2. Sous le Ciel d'Afrique, 3.
C'est ca le Vrai Bonheur and Madiana (medley); Parte II - 4. Si J'etais Blanche, 5.
C'test Lui, 6. Terre Seche (Negro Espiritual).
O ensaio se centra nas composições da parte II de Perle Noire: “Si J’etais Blanche”
“C’est Lui” e “Terre Seche” (Negro Spiritual). Para começar, discuto brevemente
minhas exigências estéticas em relação às músicas criativas negras iniciadas na
última parte do século XX, bem como a inspiração que informa a criação desse
ciclo de canções. A seguir, discuto as músicas mencionadas para demonstrar como
minha estética participa neste trabalho. Por fim, detalho a controversa recepção
crítica da estreia mundial do ciclo e minha resposta a ela.
Introdução – Exigências Estéticas

A música, para mim, é simplesmente o maior e mais direto meio pelo qual eu
expresso minhas experiências de vida. Desde meus primeiros dias, ela me fascinou.
Crescendo no interior da cidade de Newark, não me limitei à onipresente música
popular negra da época; em vez disso, ouvi muitas músicas – independentemente
do gênero e independentemente do que eu “deveria” ouvir, ideias sugeridas por
meus colegas. De alguma forma, eu sabia que havia muito mais música por aí: eu
segui minha curiosidade e a procurei pelo rádio, coleções de gravações e gravações
de áudio e vídeo.

Desde que comecei a desenvolver minha voz composicional, minha música sempre
se deu em conversas com composição e improvisação. Aprendendo desde cedo a
não me preocupar com a pressão social, resolvi seguir o que considero um caminho
necessário: criatividade através da estruturação (design) e interação. Quando
cheguei à maioridade, percebi que fazer música com outros artistas (ou seja, colegas
músicos, dançarinos, poetas etc.) – seja experimentando como improvisador ou
interpretando uma partitura – é um aspecto da criatividade que eu desfruto
completamente. Além disso, é uma força motriz através da qual eu me transformo
como pessoa e como artista. Crescimento pessoal e comunitário através da
expansão da consciência e a participação no ato de fazer música é fundamental para
o meu trabalho. Por estas razões improvisação e estrutura são dois elementos
fundamentais presentes em muitas das minhas composições até o momento.
Minha Abordagem à Improvisação-Composição

Como um improvisador-compositor, minha música e prática de performance


operam como parte de várias linhagens tradicionais e experimentais que incluem
mas não se limitam aos trabalhos de Anthony Braxton, Alexander Scriabin, Roscoe
Mitchell, Edward Kennedy “Duke” Ellington, Hale Smith, George Lewis, Arnold
Schoenberg, Muhal Richard Abrams, John Coltrane, Wadada Leo Smith, Morton
Feldman, Lawrence “Butch” Morris, Toru Takemitsu, Jean Sibelius, Miles Davis,
John Zorn, Harold Budd e Steve Coleman. Apesar de suas diferenças
metodológicas, todos esses indivíduos têm produzido um trabalho seminal que não
apenas informa a maneira como eu componho e interpreto, mas também contribui
para o meu cultivo de uma estética que se extrai de uma infinidade de tradições
culturais e musicais. Braxton escreve sobre esse princípio:

Todas as várias músicas criativas [que] se interconectaram à


criatividade negra ajudaram a promover a formação de uma
criatividade mundial, pelo impulso de um dado fenômeno de
transferência de fonte que não afeta apenas um aspecto do
encontro – quando você é realmente tocado por alguém, essa
pessoa se torna parte de você e você [se torna parte] dele ou dela.
[… O futuro] promete ver ocorrências ainda maiores de
conversão de informações de transferência de fontes, e isso
também afetará profundamente o equilíbrio essencial das linhas
de informação do princípio da terra. Se isso for verdade, então
não haverá criatividade negra, branca ou asiática (exatamente
como é agora, apenas parece que não sabemos).¹
"Criatividade mundial", como mencionada por Braxton, celebra a ideia de
"transidiomaticismo"². Minha performance e, até certo ponto, minha prática de
composição também valorizam esse conceito. Dito de outra forma, eu gosto de
permanecer aberto para explorar diferentes tipos de música e ritual. Essa
abordagem decorre não apenas das minhas experiências de escuta formativa, mas
também meu trabalho com músicos como Braxton, Mitchell, Coleman, Lewis e
Smith, cujo trabalho envolve direta ou indiretamente várias tradições e mídias
performativas.

Minha metodologia composicional opera como um fluxo mutável, musicalmente


onívoro, do qual eu extraio influência, ao mesmo tempo em que problematizo o
modelo de composição musical pan-europeu. Para mim, como para Lewis, a
composição que vem da estética negra não apenas "apropria-se" e "desafia" esse
modelo, mas também é "[em diálogo com] tradições musicais africanas, asiáticas e
do Pacífico” e emprega “métodos composicioanais que não necessariamente
privilegiam partituras convencionais ou a figura do criador único, heróico, tão
amada pela historiografia do jazz.”³

O multi-instrumentista Joseph Jarman observou que para seguir um fazer musical


livre de categorizações de gênero, metodológicas e raciais é preciso assumir a
responsabilidade de “descobrir tudo o que puder sobre todas as formas de música
no universo"4. De acordo com a visão de Jarman, meu envolvimento em uma ampla
variedade de expressões musicais e experimentais informou tanto meu
desenvolvimento, quanto minha perspectiva como músico. Tendo sido influenciado
pelos interesses católicos de Braxton e Jarman, a natureza multifacetada de minhas
atividades como improvisador-compositor enfatiza minha preocupação com uma
estética inclusiva.

Como muitos improvisadores-compositores que trabalham principalmente no


campo da música experimental afro-americana (uma tradição com a qual me
identifico fortemente), a colaboração é igualmente essencial para o meu trabalho.
Tento criar um corpo de trabalho que ponha juntos músicos de qualquer segmento,
desde que estejam abertos a desafiar suas suposições e concepções de improvisação
e a concebê-la como um procedimento imaginativo. Ao considerar os
colaboradores, então, busco músicos que tragam independentemente suas próprias
ideias e perspectivas para cada iteração do meu trabalho e que também estejam
dispostos a levar o meu em conta. Assim sendo, os artistas que seleciono são
geralmente colaboradores de longa data ou afiliados com quem compartilho
afinidades musicais.

Improvisação na minha música não é uma oportunidade de "ter um tempo" ou


"fazer um solo". Em vez disso, é um sentimento de vitalidade que pede aos
performers que abordem os imprevistos da maneira mais explícita possível. Na
minha música, eu uso o improviso para explorar a memória; negociar material
notado e harmonia (quando aplicável); gerar autonomia-criativa, intuição e contra-
intuição, e ritual e cerimônia; e, finalmente, transpor espiritualidade e metafísica
para música.

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