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Departamento de Educação
Faculdade de Aracruz – Uniaracruz
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RESUMO
Este artigo traz reflexões sobre a organização da clínica psicomotora como
uma prática diferenciada para ser trabalhada em algumas dificuldades de
aprendizagem. Nesse enfoque, aborda Transtorno de Déficit de
Atenção/Hiperatividade (TDAH), caracterizado como um distúrbio
psicomotor. O TDAH necessita de um olhar específico, sendo esse olhar o
ponto de destaque deste trabalho. Nossa intenção é fazer algumas
colocações mostrando a importância do olhar para a clínica psicomotora,
por meio da busca bibliográfica aqui expressa.
ABSTRACT
This article describes reflections about the organization of the psychomotor
clinic as a differentiated practical to be worked with some difficulties of
learning. In approach Attention/Hyperactivity Deficit Upheaval (AHDU),
characterized as a psychomotor riot. The AHDU needs a specific look,
being this look the point of prominence of this work. The objective is to
make some surveys about the importance of the look for the psychomotor
clinic, by means of the bibliographical search..
INTRODUÇÃO
Historicamente os estudos referentes a psicomotricidade aparecem no final do
séc.XIX , quando o "discurso médico" começa a nomear a zonas do córtex cerebral
situada nas regiões motoras. Porém, a história da psicomotricidade começa desde
que o homem é homem. Um homem que para este campo de conhecimento é corpo
- corpo este simbólico que é marcado enquanto se constrói ao longo de sua própria
história.
Dentro da clínica psicomotora, esse olhar se faz diferente do olhar instrumental; ele
se encontra voltado para o corpo, que indica, mostra, expressa e que deseja ser
olhado. Um corpo que se apresenta num sujeito, “[...] um corpo receptáculo,
erógeno, instrumental, investido, discursivo e simbólico” (LEVIN, 2003, p. 46), um
corpo imaginário que precisa do outro para torná-lo imagem repleto de significados.
Podemos, assim, afirmar que “o corpo fala” uma linguagem própria e que, em
alguma ocasião, é desvendado. Isso ocorre porque, “[...] não nascemos com um
corpo constituído, ele mesmo deve constituir-se” (LEVIN, 2003, p. 51).
Partindo desse ensaio, podemos citar Lacan (apud BRANCO, 1995, p. 74):
[...] em nossa relação com as coisas, tal como ela se constitui por
intermédio da visão e é ordenada nas figuras da representação,
alguma coisa desliza, passa, transmite-se, de degrau em degrau,
para estar sempre de alguma forma aí elidido - é isso que se chama
olhar.
Esse olhar aqui explicado por Lacan precisa ser trabalhado, apurado, aprimorado
para a práxis da clínica psicomotora. É diante dessa necessidade que se buscou
estudar a temática em questão.
Aqui o olhar ganha fundamento psicanalítico, tem algo mais que simples conotação
biológica e/ou cultural; ele está mais condicionado à experiência, ao desejo, a uma
falta, porque decorre da ação do inconsciente, o que irá possibilitar ao terapeuta
clínico a solução ou pelo menos a diminuição do problema observado/a ser tratado.
Nessa vertente, a clínica psicomotora institui uma diferença das outras práticas e fixa
seu olhar não para o método ou para a técnica a ser utilizada, mas para um “sujeito
desejante”, ou seja, um “[...] sujeito dividido, escondido, que possibilita diferenciar o
corpo real, do imaginário e do simbólico” (LEVIN, 2003, p. 31).
Diante do exposto, podemos dizer que a clínica psicomotora se ocupa do fazer e das
interrogantes que estão submersas no sujeito.
Essa breve citação nos remete a uma outra também do próprio Levin (2003, p. 50),
que complementa dizendo, “Quer dizer que o simbólico, a linguagem, pré-existente
Para reconhecer-se como corpo, é preciso que o outro também tenha um corpo. Por
isso, como nos mostra Levin (2003, p. 57),
É por esse motivo que Freud, segundo Levin (2003), insiste em dizer que o estádio
especular constitui-se a partir de um esquema corporal mental, isto é, na formação
do EU, que irá se projetar na elaboração de imagens que ele faz de si, criando
espaço entre o seu corpo e o do Outro. Nessa linha de reflexão, formam-se
conceitos corporalistas como o esquema corporal que se diferencia da imagem
corporal.
O corpo humano é feito da linguagem, que cria um sujeito e com ele o seu corpo e a
sua motricidade. Assim surgem as funções exercidas pelos psicomotricistas, que se
ocupam do ato psicomotor, do movimento e do fazer afetados e mediados pela
linguagem. Aqui um dos tipos de linguagem a que nos referimos é o olhar,
Por que o olhar é tão importante? Essa é uma questão que está sempre presente
em qualquer trabalho realizado. No trabalho psicomotor, vem ligado às experiências
vivenciadas com nossos clientes, ou seja, é uma manifestação típica de “sintomas”
que emerge na relação cliente – psicomotricista.
O olhar, portanto, não está em mim, no EU, ele “surpreende” o EU. Isso porque ele é
um ato inconsciente desencadeado pela luz do Outro, traçado nas dimensões
simbólicas e reais das pulsões, advém de um significado expresso por meio da
linguagem.
Um olhar que vê através de... além de... Neste trabalho, o olhar está focalizado no
TDA/H, popularmente conhecido e denominado hiperatividade. Mas que distúrbio é
esse?
As crianças nessa idade têm dificuldades para manter atenção em atividades muito
longas, repetitivas ou que não lhes sejam interessantes. Elas são facilmente
distraídas por estímulos do ambiente externo, mas também se distraem com
pensamentos “internos”, isto é, vivem “voando”. Como a atenção é imprescindível
para o bom funcionamento da memória, elas em geral são tidas como "esquecidas":
esquecem recados ou material escolar, aquilo que estudaram na véspera da prova,
etc. O fato de uma criança conseguir ficar concentrada em alguma atividade não
exclui o diagnóstico de TDA/H.
Elas também tendem a ser impulsivas (não esperam a vez, não lêem a pergunta até
o final e já respondem, interrompem os outros, agem antes de pensar).
Freqüentemente também apresentam dificuldades em organizar e planejar aquilo
que querem ou precisam fazer.
Levin (2003, p. 124) nos expõe sobre isso, afirmando: “[...] é ali na transferência [...],
onde coloca em jogo o desejo da criança, onde o brincar do corpo, o seu
posicionamento corporal é dado a ver ao olhar do psicomotricista.”
Nessa manobra, a criança supõe que o terapeuta possui o saber, deixando-se levar
pela interação transferencial, indicando, inconscientemente, tudo que é necessário
para essa intervenção. O terapeuta então “encarna” nesse jogo simbólico do Outro –
sujeito acolhendo as informações de que precisa para desenvolver um trabalho
psicomotor.
Como o sujeito diagnosticado hiperativo usa seu corpo constantemente, por meio
dos movimentos, reações tônicas, sons, articulações, cria-se uma clínica em
transferência; lugar onde a retórica corporal do sujeito é dada a ver ao olhar do
Outro (terapeuta). Graças a essa ação, podemos intervir na relação corporal do
sujeito hiperativo analisando-o, desdobrando-o, sem necessidade de utilização de
medicamentos, testes padronizados, de ordem reeducativa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa abordagem, ficou provada que o transtorno não é uma questão apenas de
motricidade, mas também psíquica. Aqui, o corpo é visto como um “receptáculo”, um
lugar de inscrição do Outro. Esse Outro se denomina geralmente aquele que serve
de fio condutor, que introduz esse corpo no universo simbólico. A criança portadora
do TDAH ou com instabilidade psicomotora não consegue metaforizar seu corpo,
representá-lo simbolicamente, ficando atrelada ao desejo e aos demandos do Outro.
É pelo jogo na relação com o Outro, no brincar, que a criança forma sua imagem
corporal. Quando isso não acontece, ela poderá apresentar sintomas do TDAH e
permanecer nesse estado instável por toda a sua vida, sendo, assim, rotulada,
excluída muitas vezes do meio ao qual pertence.
O que se propõe é que se faça um trabalho com o corpo, não para verificar a
motricidade, mas para observar a psicomotridade, o que deseja esse sujeito, quais
as suas queixas, ter consciência de que o corpo não é um amontoado de carne e
osso, mas algo que precisa atingir o simbólico.
REFERÊNCIAS