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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
R613d
2. ed.
Rodrigues Jr., Otavio Luiz
Direito civil contemporâneo : estatuto epistemológico, constituição e direitos fundamentais / Otavio Luiz
Rodrigues Jr. - 2. ed., rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro : Forense Universitária, 2019.
; 23 cm.
Inclui bibliografia e índice
ISBN 978-85-309-8737-4
1. Direito Civil - Brasil. 2. Direito Constitucional – Brasil. 3. Direitos fundamentais – Brasil. I. Título.
19-57429
CDU: 347(81)

Vanessa Mafra Xavier Salgado - Bibliotecária - CRB-7/6644


NOTA À SEGUNDA EDIÇÃO

Impressa no final de outubro de 2018, a primeira edição esgotou-se em


pouco menos de 3 meses, o que foi motivo de alegria e de surpresa para o autor e
a Editora. A alegria dispensa razões, mas a surpresa se explica por se tratar de
obra resultante de uma tese de livre-docência, lançada no auge da crise do
mercado editorial. Talvez justifiquem esse êxito a generosidade do público, a
quem se expressa sincero agradecimento, e um provável acerto nos propósitos
anunciados no Prólogo: a obra foi escrita para o leitor contemporâneo, destinada
a resolver problemas de nosso tempo, mas sem perder o rigor metodológico.
Outra hipótese para a acolhida do livro pode ser levantada: talvez se haja
iniciado uma inflexão no modo como a universidade e os tribunais lidam com o
neoconstitucionalismo, que se expandiu na literatura e na jurisprudência dos
últimos 20 anos de uma maneira quase irrefreável.
Independentemente dessas questões, para a segunda edição, a obra foi
aperfeiçoada em alguns pontos e atualizada em outros, a saber: (a) incorporação
ao texto das Leis n. 13.709, de 14 de agosto de 2018 (proteção de dados), e n.
13.777, de 20 de dezembro de 2018 (multipropriedade); (b) análise de novos
julgados como o caso Stadionverbot, julgado em 2018 pelo Tribunal
Constitucional Federal alemão, e o RE 878.694, do Supremo Tribunal Federal,
relativo à interpretação do art. 1.790, do Código Civil; (c) incorporação de mais
de 30 novas referências bibliográficas, cuja edição foi posterior à publicação da
tese ou cuja citação se incluiu após novos estudos. São exemplos disso a
pesquisa empírica sobre o impacto doutrinário e jurisprudencial das doutrinas da
eficácia dos direitos fundamentais em Portugal, publicada na Revista de Direito
Civil Contemporâneo, ou o artigo com a descrição do estado-da-arte desse tema
na Espanha. Sem que se esqueça de novos textos de caráter histórico, que
aprofundam hipóteses relativas à técnica da ponderação e ao passado nacional-
socialista de certas concepções teóricas hoje em evidência.
Esforçou-se ainda para se aprimorar o enfoque sobre determinados temas e
questões, tornando-os mais claros ou refutando objeções que não pareceram tão
bem escrutinadas na primeira edição. Finalmente, algumas (inevitáveis) gralhas
foram corrigidas.
Este livro, como resultado de uma tese de livre-docência, não pode
descaracterizá-la com alterações excessivas. O sabor e o colorido originais
devem ser conservados, afinal eles capturam o momento no qual a tese foi
escrita e as circunstâncias a ela inerentes. Entre a conservação, que pode
conduzir à fossilização, e a atualização, que pode tornar irreconhecível o plano
original, é mais seguro um meio-termo. Acredita-se que ele foi alcançado nesta
segunda edição.
À alegria e à surpresa, une-se a gratidão do autor pela generosidade dos
leitores, a quem se dá franca abertura para o debate e a crítica desta obra, por
meio de um rico intercâmbio de ideias e de questionamentos.
São Paulo, 6-II-2019.
Otavio Luiz Rodrigues Jr.
otavioluiz.usp@gmail.com
PRÓLOGO

Esta tese de livre-docência é, para o autor, o encerramento de um ciclo que


se iniciou no ano de 1999, quando despertou seu interesse epistemológico sobre
certos problemas experimentados pelo Direito Civil, alguns dos quais
identificados pela doutrina nacional ainda nos anos 1970.1 Esse interesse não se
circunscrevia apenas ao objeto e aos espaços da metódica do Direito Civil, mas
também a suas relações com os direitos fundamentais. O interregno
compreendido entre 1990-2000 foi marcado por questionamentos sobre a
conservação do papel de centralidade do Direito Civil no sistema de Direito
Privado, de modo particular em uma época tão rica em mudanças e notável por
suas contradições.2
Alguns dos problemas analisados neste trabalho, que se apresentou como
tese à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e à
ilustre Banca Examinadora, foram objeto de pesquisas no exterior, em momentos
e setores do conhecimento jurídico distintos. Para tal fim, o candidato cumpriu
dois estágios pósdoutorais. O primeiro na Universidade de Lisboa (2010-2011),
sob a direção de Jorge Miranda, professor catedrático de Direito Constitucional,
e o segundo no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales
Privatrecht (2011-2012), de Hamburgo, instituto dirigido por Reinhard
Zimmermann, catedrático de Direito Civil, Direito Romano e História do Direito
da Universidade de Ratisbona. O autor registra aqui seus agradecimentos à
Sociedade Max-Planck pela bolsa concedida durante o estágio pós-doutoral na
Alemanha. É igualmente necessário agradecer aos catedráticos Jorge Miranda e
Reinhard Zimmermann, gentis anfitriões em Lisboa e Hamburgo,
respectivamente, e modelos de juristas e de docentes. Na Alemanha, deixa-se o
reconhecimento ao Dr. Jan Peter Schmidt e ao Dr. Tilman Quarch, dois alemães
apaixonados pelo Brasil e pela cultura jurídica lusófona, que tanto auxiliaram
este autor antes, durante e depois do estágio pós-doutoral no Instituto Max-
Planck.
Esses períodos de “refúgio do viajante cansado”3 permitiram ao autor
pesquisar em duas excelentes bibliotecas. As investigações dirigiram-se tanto a
aspectos do Direito Privado relacionados ao Direito Constitucional quanto a
temas mais propriamente vinculados à metodologia e à metódica do Direito
Civil. De certo modo, procedeu-se a um exame dessas matérias naquilo que são
secantes e tangentes entre si. Como exigências parciais dos mencionados
estágios de pós-doutorado, elaboraram-se artigos e capítulos de livros que, de
modo lateral ou não, enfrentaram parte das já referidas indagações teóricas sobre
a epistemologia do Direito Civil contemporâneo.4 Nesta tese, far-se-ão presentes
algumas das ideias ali desenvolvidas, mas aqui escritas com a nota da
originalidade.
Para além de encerrar um ciclo de pesquisas, esta tese nasce sob o signo de
uma preocupação com seus destinatários. A quem interessa uma tese de caráter
metodológico nos dias atuais? Se é certo que o público orientado a obras de
maior fôlego vem desaparecendo, seja pela necessidade de respostas imediatas
em um mundo digital cada vez mais frenético, seja pelo consumo de
informações cujo perecimento é quase instantâneo, torna-se também necessário
pensar e escrever para uma nova geração, que, em muito breve, ocupará os
espaços na academia e nos meios profissionais. O desafio de dialogar com esses
dois polos permeou a elaboração deste trabalho, do qual resultaram duas opções
metodológicas, cujo acerto ou erro foi apreciado, com primazia, pela Banca
Examinadora, e agora submetido ao público. A primeira opção consistiu em
escrever um texto mais sucinto e objetivo. A segunda foi a de combinar o texto
jurídico com uma linguagem metafórica e um estilo mais dúctil, embora sem
comprometimento da técnica e da forma. O lugar da fala do autor é a academia.
Ele, no entanto, desejou que a ágora também conseguisse ouvi-lo. Como já
salientado por Alcides Tomasetti Jr., “as regras de direito não estão encerradas
nos códigos como numa vitrina; operam na vida”. Nas faculdades,
diferentemente de outras áreas do conhecimento, “não há contratos vivos para
mostrar”.5
O autor, em 2016, completou 20 anos de carreira docente, transcorrida na
Universidade Federal do Ceará, instituição na qual se graduou em 1996 e iniciou
a docência como professor de Direito Civil no mesmo ano, na Universidade
Federal Fluminense e na Universidade de São Paulo, onde espera concluir seus
dias como professor, sem esquecer de instituições privadas de excelência, como
a Universidade de Fortaleza, o Instituto Brasiliense de Direito Público e o Centro
Universitário 7 de Setembro, mantendo-se vinculado a este último por laços de
amizade e admiração com a Professora Doutora D. Maria Vital da Rocha (UFC).
Passados 22 anos, ainda há muito o que fazer e aprender. Os discentes de todas
as universidades mencionadas e, agora com particular referência, os alunos da
Faculdade de Direito do Largo de São Francisco têm sido admiráveis
companheiros na travessia pelos mares do conhecimento e da vida acadêmica.
Este trabalho guarda as marcas dos anos de experiência no ensino, na pesquisa e
na extensão. Mas não somente. A vida prático-profissional também se revelará
nas próximas páginas. A atuação como membro da Advocacia-Geral da União e
o exercício de alguns cargos na Administração Pública e no Poder Judiciário
contribuíram para uma visão aberta à realidade do Direito Público, suas nuances,
suas praxes e sua maneira de trabalhar os fatos e as situações jurídicas. Até
mesmo por essa experiência com o Direito Público, reforçaram-se as convicções
do autor sobre a necessidade de se reservar um estatuto epistemológico próprio
ao Direito Civil.
Esta tese, defendida entre 11 a 14 de dezembro de 2017, é também uma
homenagem a essa tradição e aos civilistas brasileiros, representados pela
distinta banca examinadora, que se compôs da professora titular Silmara
Chinellato (USP), presidente, e dos professores titulares Nestor Duarte (USP),
Gustavo Tepedino (UERJ), Heloisa Helena Barboza (UERJ) e José Antonio
Peres Gediel (UFPR). O rigor teórico, a diversidade de visões sobre o Direito
Civil e o pluralismo de ideias tornaram particularmente ricas as arguições feitas
pelos examinadores, a quem se deixa o agradecimento público. Algumas das
observações feitas durante a arguição da tese foram objetos de reflexões e
contribuíram para o aprimoramento do texto.
Registra-se também o profundo agradecimento ao número expressivo de
colegas docentes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e de várias
universidades brasileiras, muitos deles integrantes da Rede de Direito Civil
Contemporâneo, que honraram o autor com suas presenças nas diversas fases do
concurso. Não menciono nominalmente a todos para não cometer injustiças, mas
simbolizo na pessoa dos professores titulares Ignacio Poveda Velasco e Heleno
Taveira Torres, esse reconhecimento. A participação e o apoio dessas pessoas,
algumas delas cuja amizade vem de duas décadas, tornaram a defesa ainda mais
especial para o autor. É também de justiça mencionar o apoio de alunos,
orientandos de graduação e de pós-graduação, membros dos grupos de extensão
e de pesquisa em Direito Civil Contemporâneo, que tanto participaram da defesa
quanto do auxílio nas fases de preparação para as provas do concurso de livre-
docência. Os professores Rodrigo Xavier Leonardo (UFPR) e Rafael Peteffi da
Silva (UFSC) dedicaram parte de seu tempo à leitura crítica de capítulos da tese,
pelo que se lhes é muito agradecido. Bruno de Ávila Borgarelli, um brilhante
civilista da nova geração, foi um incansável auxiliar nas atividades de pesquisa e
nas fases do concurso. A Guilherme Benages Alcântara, fica a gratidão por seu
dedicado empenho às atividades profissionais do autor antes e durante o
concurso. A Gabriel Nogueira Dias, um intelectual refinado e amigo dileto,
agradeço pelo apoio silencioso e pelas indicações bibliográficas tão relevantes.
O ministro Dias Toffoli e o professor catedrático António Menezes
Cordeiro emprestaram a este livro o concurso de suas palavras de apresentação e
de prefácio. A generosidade de ambos não encontra gratidão suficiente deste
autor.
Aos ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Gilmar
Mendes, Humberto Martins, Antonio Carlos Ferreira, Mauro Campbell, Luís
Felipe Salomão, Marco Aurélio Bellizze e Roberto Rosas igualmente se registra
o agradecimento do autor.
No ano de 2017, celebraram-se os 190 anos de criação dos cursos jurídicos
no Brasil. Como é de todos sabido, a Faculdade de Direito do Largo de São
Francisco e a Faculdade de Direito de Olinda e Recife conservam o título de
instituições primazes na História da educação jurídica nacional. A primeira
cátedra de Direito Civil do país, prevista na Lei de 11 de agosto de 1827, em seu
art. 1o, denominava-se “Direito Pátrio Civil ”, sendo ministrada no terceiro ano
do quinquênio conformador da matriz curricular dos “Cursos de Ciências
Jurídicas e Sociais”, criados por D. Pedro I, com regulamentação provisória
pelos Estatutos do Visconde da Cachoeira. Os Estatutos previam expressamente
que “o segundo Professor explicará o direito patrio particular, e convindo que
os estudantes juristas tenham como um systema de toda a legislação patria, de
modo que senhores de todo elle, possam governar-se no estudo do vasto corpo
da jurisprudencia patria, (...)”.6 O Departamento de Direito Civil, unidade da
estrutura universitária à qual este autor está vinculado, é sucessor imediato e sem
interrupções dessa primeira cátedra de Direito Civil brasileira. Uma tese sobre a
autonomia epistemológica do Direito Civil não pode ignorar essa herança
histórica e omitir-se em homenagear o Departamento e seus integrantes atuais e
do passado, especialmente ao professor titular Antonio Junqueira de Azevedo
(1939-2009), orientador, amigo e grande responsável por este livro existir. Este
livro é uma homenagem póstuma do eterno aluno. Suas ideias estão aqui.
São Paulo, 5-VI-2018.
Otavio Luiz Rodrigues Jr. Professor Associado de Direito Civil da Faculdade de
Direito do Largo de São Francisco (USP) e Coordenador da Área de Direito da
CAPES

1 Cf. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O Direito Civil tende a desaparecer? Revista da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, v. 70, p. 197-210, 1975, reeditado em: JUNQUEIRA DE AZEVEDO,
Antonio. O Direito Civil tende a desaparecer? Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 1, no 1, p. 355-
364, 2014.
2 Cf. BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht.
Archiv für die civilistische Praxis – AcP, v. 194, fascículo 1, p. 319-351, 1994; MENEZES CORDEIRO,
António. Tratado de Direito Civil português: Introdução, doutrina geral e negócio jurídico. 2. reimp. 3.
ed. Coimbra: Almedina, 2009. v. 1, t. 1. especialmente §§ 1º, 2º, 3º, 8º, 9º, 14º, 17º, 18º e 19º, seções 71
e 72 (a primeira edição desse tomo é de 2000); JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Caracterização
jurídica da dignidade da pessoa humana. In. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Estudos e pareceres
de Direito Privado. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 5-6; FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do Direito Civil. Rio
de Janeiro: Renovar, 2000; DEL NERO, João Alberto Schützer. Do “estado liberal” ao “estado social”: O
caso do Direito Privado? Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 41, p. 97-115, out.-dez.
2002.
3 Paráfrase dos versos de Heinrich Heine (1797-1856), utilizados por Hans Kelsen para encerrar seus
escritos autobiográficos (KELSEN, Hans. Autobiografia de Hans Kelsen. Tradução de Gabriel Nogueira
Dias e José Ignácio Coelho Mendes Neto. Introdução de Matthias Jestaedt. Estudo introdutório de
Otavio Luiz Rodrigues Jr. e José Antonio Dias Toffoli. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 109).
4 Dos estágios pós-doutorais em Portugal e na Alemanha, resultaram os seguintes textos: RODRIGUES
JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo na tradição de civil law em
face do neoconstitucionalismo e dos princípios. O Direito (Lisboa), v. 143, p. 43-66, 2011; RODRIGUES
JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um caso de “constitucionalização” do
Direito Civil. In: VERA-CRUZ PINTO, Eduardo; SOUSA, Marcelo Rebelo de; QUADROS, Fausto de;
OTERO, Paulo. (Orgs.) Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda: Volume 3 - Direito
Constitucional e Justiça Constitucional. Coimbra: Coimbra Editora, 2012, v. 3, p. 61-90; MIRANDA,
Jorge; RODRIGUES JR., Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato. Principais problemas dos direitos da
personalidade e estado-da-arte da matéria no Direito Comparado. In. MIRANDA, Jorge; RODRIGUES
JR., Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato. (Orgs). Direitos da Personalidade. São Paulo: Atlas, 2012, v. 1,
p. 1-24; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB e da doutrina alemã no Direito Civil
brasileiro do século XX. O Direito (Lisboa), v. 147, p. 45-110, 2015.
5 TOMASETTI JR., Alcides. Execução do contrato preliminar. São Paulo: Tese de Doutorado: Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, 1982. p. 2.
6
Capítulo V, art. 6o, cf. CARVALHO E MELO, Luiz José de (Visconde da Cachoeira). Estatutos dos cursos
jurídicos. Conselheiro de Estado Visconde da Cachoeira. Introdução de Alberto Venancio Filho. Rio de
Janeiro: Instituto dos Advogados Brasileiros, 1977.
APRESENTAÇÃO

Conheci o Professor Otavio Luiz Rodrigues Jr. quando, à frente da


Advocacia-Geral da União, pesquisava alguém integrante da carreira para ocupar
a importante função de Advogado-Geral Adjunto. Na oportunidade, chegou-me
às mãos seu currículo que, de imediato, impressionou-me. Advogado da União
concursado, mestre em Direito pela Universidade do Ceará, seu estado natal, já
possuía expressivas publicações na área jurídica, em especial, em Direito
Privado, além de experiência em diferentes setores dos Poderes Executivo e
Judiciário.
Mas, em particular, chamou minha atenção seu grau de doutor, obtido em
2006 na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), menos por
ter sido sob as mesmas arcadas onde vivi e convivi nos felizes tempos de minha
graduação, mais por ter sido orientando da figura ímpar e insubstituível do
Professor Titular de Direito Civil, Antonio Junqueira de Azevedo, o
“Junqueirinha”, que fora o Paraninfo de minha turma. Para mim, eram
qualificações mais que suficientes, pois aprendi com o Professor Junqueira que
aquele que domina o Direito Civil, a “área mais nobre do Direito”, tudo domina.
Porém, a mente inquieta do Professor Otavio conduziu-o para além-mar,
para dois pós-doutorados. O primeiro, em Direito Constitucional, na
Universidade de Lisboa, em Portugal, sob a orientação do Professor Jorge
Miranda; e o segundo, no prestigiadíssimo Max-Planck-Institut für
ausländisches und internationales Privatrecht em Hamburgo, na Alemanha,
dirigido pelo Professor Reinhard Zimmermann, lente de Direito Civil, Direito
Romano e História do Direito, radicado pela Universidade de Ratisbona.
Hoje ocupa uma cadeira de Professor Doutor do Departamento de Direito
Civil da mesma “velha e sempre nova Academia”, desde 2013, onde, segundo
suas próprias palavras, “espera concluir seus dias como professor”. Mas, antes,
abrilhantou o corpo docente de muitas tantas universidades públicas e privadas,
citando-se algumas, como a Universidade Federal do Ceará (UFC), a
Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade de Fortaleza (Unifor),
o Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), também em Fortaleza (CE), e o
Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
É o idealizador e o editor-chefe da Revista de Direito Civil Contemporâneo
(RDCC), que está em seu quinto ano e já se tornou referência em excelência na
área do Direito Civil. Coordena a Rede de Pesquisa de Direito Civil
Contemporâneo, que reúne membros de diversas universidades, nacionais e
estrangeiras, como a USP, a UFC, a UFF, a Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a
Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS), a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade
Federal do Amazonas (UFAM), a Universidade Humboldt de Berlim
(Alemanha), as Universidades do Porto, de Coimbra e de Lisboa, em Portugal, a
Universidade de Roma Tor Vergata e a Universidade de Salerno, na Itália, além
da Universidade de Girona, em Espanha.
Não bastassem todos esses predicados, há um que impressiona a todos que
o conhecem: seu caráter “multimídia”, para se usar um vocabulário
contemporâneo e familiar ao cargo de Conselheiro da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel), que atualmente ocupa. Não há assunto que não
domine: história, literatura, artes e cinema. Sua cultura é vastíssima, qualidade
que sempre foi marcante e não passou desapercebida dos Professores Sílvio de
Salvo Venosa e Antonio Junqueira de Azevedo quando fizeram,
respectivamente, a apresentação e o prefácio de seu livro Da revisão judicial dos
contratos: autonomia da vontade e teoria da imprevisão, lançado em 2002.
Tanto, que sempre tive no Professor Otavio um arguto interlocutor e debatedor
de ideias e pensamentos nos quase dois anos em que tive a honra de contar com
sua colaboração em meu gabinete no Supremo Tribunal Federal, como assessor e
chefe de Gabinete.
Penso que a tese de livre-docência que se apresenta em livro traduz o
homem e o jurista que hoje é Otavio Luiz Rodrigues Jr., no ápice de seu
amadurecimento pessoal, intelectual e doutrinário. Ela vem disposta em três
Partes e, como é uma das características do autor, iluminada e enriquecida por
trechos da História e da História do Direito.
Na Primeira Parte, tem-se a demonstração de que ainda persiste a
dicotomia entre o Direito Público e o Direito Privado. A Segunda Parte, por sua
vez, é dedicada ao confinamento e à definição conceitual da constitucionalização
do Direito Civil, que “não pode assumir as proporções e o apetite de um
Moloch”. Essa Segunda Parte inicia-se com a “metáfora das Ilhas do Canal”,
sobre um episódio apócrifo que se passa nas Ilhas de Jersey, único território
inglês ocupado pelos alemães na Segunda Guerra Mundial, na intenção de
ilustrar a confusão que a ausência de acordos semânticos causa na doutrina. Por
fim, a Terceira Parte se depara com a questão da eficácia dos direitos
fundamentais em relação aos particulares e que estes podem, tal como “cavalos
de troia”, penetrar o Direito Civil. Defende, dentre os modelos de eficácia dos
direitos fundamentais, o modelo fraco da eficácia indireta. A narrativa conduz,
no final, para o fortalecimento da autonomia epistemológica do Direito Civil, ao
sustentar a dicotomia entre Direito Privado e Direito Público, identificar o que é
e o que não é a constitucionalização do Direito Civil e defender a eficácia
indireta fraca dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
A tese é um verdadeiro manifesto pela sobrevivência dos fundamentos do
Direito Civil, escrito por um genuíno civilista, guiado pelo espírito de Friedrich
Carl von Savigny. Uma obra que fornece argumentos técnicos suficientes a
outros civilistas que queiram se juntar nessa mesma cruzada, já que a autonomia
do Direito Civil, infelizmente, encontra-se ameaçada.
Brasília, 17 de setembro de 2018.
Min. Dias Toffoli
Presidente do Supremo Tribunal Federal
PREFÁCIO

Ao Direito Civil pede-se um papel multifacetado. Cultura jurídica básica


dos espaços de Direito continental, o Direito Civil deve, ainda, disponibilizar
uma dogmática avançada, assegurar a tutela das pessoas e oferecer a todos os
demais ramos do Direito um arrimo supletivo. Vale a pena aprofundar.
Nas terras de Civil law – pois na Common law, a combinação histórico-
cultural é diversa – o Direito Civil dá a coloração geral aos ordenamentos
correspondentes. Fruto das sucessivas resseções do Direito romano,
complementadas pela adaptação territorial aos inúmeros povos a que se aplica, o
Direito Civil modela o modo de pensar dos juristas. O raciocínio encadeia
posições autônomas, relações, direitos e deveres, de tal modo que pensar-Direito
é “pensar-Civil”. Ainda no plano cultural alargado, o Direito Civil disponibiliza
uma linguagem básica que será, depois, usada em todo o espaço jurídico-
científico. De um “pensar-Civil” passa-se a um “falar-Civil”. Ou melhor: o
“pensar-Civil” já envolve o “falar-Civil”, uma vez que o pensamento e a
linguagem não são mais do que as duas vertentes da humanidade.
Cultura jurídica por excelência, o Direito Civil construiu, ao longo de uma
evolução bimilenária, uma dogmática cuidada, isto é, um modo científico de
resolver casos concretos. Todos os meandros da Ciência do Direito, mesmo
aqueles que mais se distanciam do tronco comum, vivem da dogmática civil.
Não é pensável, a propósito de cada concreta disciplina jurídica, reelaborar os
conceitos básicos: pessoa, direito, dever, obrigação, contrato, imputação e
transmissão, como exemplos, são letras civis de um alfabeto jurídico universal.
Mas vamos bem mais longe: os avanços dogmáticos civis, como a tutela das
pessoas, a personalidade jurídica alargada, a diversidade cultural, a apropriação
privada e os seus limites, a cooperação societária ou a centralidade da família:
tudo isso advêm de uma elaboração civil e surge imprescindível para qualquer
subsistema jurídico. Os avanços mais recentes da Ciência do Direito, como a
dogmatização do próprio sistema, através da boa-fé, a correção judicial dos
contratos injustos ou a revisão da doutrina da impossibilidade têm, no civilismo,
o seu ponto de partida e uma guarida segura.
O Direito é uma vivência. Malgrado, desde o século XII, ele é sempre
estudado e ensinado nas universidades, o Direito existe porque corresponde ao
modo justo de agir, dentro de uma comunidade. O Direito manifesta-se na
regularidade das condutas dos seus agentes e, fundamentalmente, dos cidadãos
comuns. Os contratos são espontaneamente executados e os direitos, respeitados.
Cada um tem consciência própria do “justo” e do “injusto”. Apenas por exceção
se requer a intervenção do Estado e dos seus tribunais para aplicar o Direito. Não
dispensamos – já chegaremos lá – o Direito Constitucional. Insistimos, todavia,
em que a maior e mais eficaz proteção das pessoas reside no dia a dia civil. As
esferas de liberdade, pessoal e patrimonial jogam-se em cada momento e são de
construção e de tutela civil. A consistência da sociedade, por meio dos contratos
e das mais diversas agremiações, é civil. Na família, como nas sucessões, a
coesão da qual tudo depende é essencialmente espontânea e civil. Deem-nos um
Direito Civil adaptado e robusto e teremos uma sociedade pacífica e próspera.
O Direito Civil não é uma mera disciplina entre outras. Nas famílias de
Civil law, o Direito Civil constitui o fundo jurídico comum no qual se inscrevem
as diversas disciplinas. Não estabelecemos, com isso, hierarquias entre áreas do
conhecimento jurídico: todas as disciplinas têm, na Universidade, igual relevo e
dignidade. Apenas apontamos um dado insofismável: além de dar os seus
conceitos, a sua linguagem e a sua dogmática básica, o Direito Civil constitui
uma referência a partir da qual, por adoção ou por diferenciação, se tornam
possíveis as mais diversas evoluções. Não vale repetir o já dito ou elaborar o já
elaborado: a construir de novo, parte-se do existente, desde que compatível.
Nesta ambiência, ramos inteiros do Direito desenvolvem-se em moldes
fragmentários, no sentido de assumirem, com legítima tranquilidade, os
instrumentos civis disponíveis. A mais especializada área bancária ou mobiliária
irá usar as ideias comuns de contrato, de exercício e de boa-fé, sem necessidade
de tudo elaborar. E, na falta de específicas soluções, regressamos ao Direito
Civil, a título direto ou em modo supletivo.
A Ciência jurídica civil é aberta, interna e externamente. Ela reconhece
problemas novos, integrando no seu seio as lacunas que surjam. Questões
inicialmente não problemáticas assumem exigências dogmáticas novas, à medida
que o progresso social e jurídico o requeira. Pense-se na sindicância dos
exercícios individuais por meio da axiologia do sistema, com recurso ao
princípio da boa-fé. No plano externo, o Direito Civil está atento a todas as
novidades apuradas nas demais disciplinas. Acolhe a proteção da parte débil, por
meio dos aperfeiçoamentos conseguidos no Direito do Consumo e no Direito do
Trabalho. Aprofunda a tutela da confiança, protagonizada no Direito Comercial.
Controla o exercício de direitos potestativos, com sensibilidade aos direitos dos
administrados, no Direito Público. Assegura o equilíbrio das armas, aprofundada
no Direito Processual. E, naturalmente, modela e concretiza os direitos de
personalidade e a defesa das pessoas, usando as lições do moderno Direito
Constitucional. A abertura do Direito Civil fez dele um importante ponto de
encontro de todas as novidades jurídico-científicas. O Direito Civil dos nossos
dias as conhece, estuda, valida e repercute em todas as áreas jurídicas, sem
prejuízo, naturalmente, de estas as ponderarem e adaptarem aos valores
respetivos.
O Direito Constitucional constitui uma faceta decisiva do próprio
civilismo. Tomado como acervo dos valores fundantes de uma determinada
comunidade, inscreve, com solenidade, a axiologia civil básica, dando-lhe a
primazia na modelação das diversas disciplinas. O desafio é de monta: nos
manuais de Direito Civil encontramos, com aprofundamento, regras
constitucionais básicas, com especial relevo para os direitos fundamentais.
Constitucionalização do Direito Civil ou civilização do Direito Constitucional?
Mais do que semântica, a questão requer respostas dogmáticas.
A hora do constitucionalismo moderno foi conquistada, nos diversos
países, sobre os escombros da sempre incompreensível Segunda Guerra
Mundial. Inesperadamente, o Direito Civil demonstrou fraquezas: no III Reich,
juristas de renome puseram em causa o mais elementar e – dir-se-ia –
indiscutível civilismo. Afinal, o ser humano tem abismos contra os quais há que
se manter defesas. Em outros países, conquanto que, em menor medida, o
civilismo, para além de aprofundado, devia ser defendido. A montagem de uma
mecânica constitucional, com a separação de poderes, a auscultação da opinião
pública por meio de eleições livres e a abertura à primazia da Lei foi decisiva:
não conhecemos melhor. E, além disso, os níveis substanciais, com relevo para a
consagração e a efetivação dos direitos fundamentais, revelam-se instrumentos
poderosos na tutela da sociedade civil.
O encontro e o diálogo entre os Direitos Civil e Constitucional exigem
níveis de aprofundamento semântico, sistemático e dogmático. Temos, aqui, um
forte desafio que requer uma cultura envolvente, um domínio de literaturas
diversificadas, com relevo para a alemã, uma capacidade analítica elevada e a
faculdade de reconstruir um discurso que prossiga a ambiciosa bissetriz entre o
civil e o constitucional. O Professor Otavio Luiz Rodrigues Jr. aceitou o desafio
e deu-lhe excelentes respostas. Não está em jogo o Direito Civil e a sua
autonomia histórica, cultural e dogmática. Tampouco po-de-se apostar no
enfraquecimento, pelo desinteresse momentâneo, do Direito comum. Antes
valem pontes alargadas, em que o Direito Civil, com a sua tranquila autonomia,
acolhe e enriquece o constitucionalismo, mormente na área sensível dos direitos
fundamentais.
A presente obra, sugestivamente intitulada Direito Civil Contemporâneo –
Estatuto Epistemológico, Constituição e Direitos Fundamentais, representa mais
do que um ensaio no delicado ponto de encontro entre as constelações civil e
constitucional. Traduz uma defesa viva do civilismo moderno, confrontado com
as questões dos nossos dias e envolvido num diálogo profícuo com o
constitucionalismo. O tempo passa: as obras ficam.
Ao Professor Otavio Luiz Rodrigues Jr. vaticinamos êxitos acrescidos na
defesa da nossa Ciência civil. Tenha a obra que lhe devemos a divulgação que
merece, nos meios acadêmicos das duas margens do Atlântico e junto ao público
em geral. Aguardamos, com interesse expectante, os passos seguintes.
António Menezes Cordeiro
Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (UL), Portugal.
Decano do Grupo de Ciências Jurídicas. Efetivo da Academia das Ciências de
Lisboa.
SUMÁRIO

NOTA À SEGUNDA EDIÇÃO

PRÓLOGO

APRESENTAÇÃO

PREFÁCIO

ABREVIATURAS

INTRODUÇÃO

§1. O nascimento e a evolução da moderna metódica do Direito Civil


1.1. Savigny, o “jurista global” e a metódica das metódicas
1.2. Metódica em transformação: Larenz, Wieacker e Esser
1.3. Crise de hegemonia: sistema, constitucionalização e redes

§2. Estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo: autonomia,


constitucionalização e o espaço dos direitos fundamentais

§3. Plano do trabalho, delimitação do objeto e tese


3.1. Plano do trabalho
3.2. Delimitação do objeto
3.3. Tese
METODOLOGIA DA PESQUISA

§4. Plano do capítulo

§5. Aspectos materiais e objetivos da pesquisa


5.1. Método
5.2. Delimitações terminológicas: Direito Civil e Direito Privado
5.3. Delimitações terminológicas: “Distinção sistemática” e “grande
dicotomia”
5.4. Delimitações terminológicas: eficácia dos direitos fundamentais
em relação aos particulares, eficácia em face de terceiros e
Drittwirkung

§6. Aspectos formais da pesquisa


6.1. Uso de idiomas estrangeiros e regras ortográficas intertemporais
6.2. Transcrições, notações e referências bibliográficas
6.3. Acesso às fontes: bibliotecas e portais
6.4. Citação de fontes jurisprudenciais
6.5. Fontes legislativas

PRIMEIRA PARTE

CAPÍTULO PRIMEIRO
PUBLICIZAÇÃO, SOCIALIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO

§7. A “distinção sistemática” e o positivismo jurídico

§8. Da publicização à privatização do Direito?


8.1. Acordo semântico: o sentido de privatização
8.2. A locomotiva do Direito Público nos territórios do Direito Privado
8.3. Publicização e socialização do Direito Privado
8.4. A tese anglo-americana da “crise do contrato” e sua recepção no
Brasil: Gilm Horwitz e Atiyah
8.5. Privatização do Direito: a virada dos anos 1980-1990
8.5.1. Liberalismo, neoliberalismo e Quarta Revolução Industrial
8.5.2. O caso especial do Direito Administrativo: desestatização,
privatização e deslegalização

CAPÍTULO SEGUNDO
AS NOVAS FRONTEIRAS DO DIREITO PRIVADO CONTEMPORÂNEO
(OU SOBRE COMO AVIVENTAR RUMOS APAGADOS E RENOVAR
MARCOS ARRUINADOS OU DESTRUÍDOS)

§9. Introdução: Refeudalização e novas fronteiras

§10. Pluralismo jurídico: Expertenrecht, soft law e Internet


10.1. O direito dos especialistas e o soft law
10.2. Regulação público-privada da Internet?

§11. Paradigmas em crise e o “bando dos quatro”

§12. Novas fronteiras para o direito privado


12.1. Introdução
12.2. Direito de Família: O avanço da autodeterminação sobre a tutela
estatal
12.3. Direito das Sucessões: simplificação e flexibilização
12.4. Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD): mais autonomia,
menos proteção?
12.5. Direito Civil e antidiscriminação: Experiências norte-americana e
alemã
12.6. “Privatização” do Direito Processual?
12.7. Direito Ambiental e a “tragédia dos comuns”
12.8. Antitruste e private enforcement: tutela privada da concorrência

§13. Conclusões parciais

CAPÍTULO TERCEIRO
A VISÃO DA DOUTRINA NACIONAL, O DIREITO ROMANO E AS
TEORIAS SOBRE A “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”

§14. Considerações iniciais

§15. A “grande dicotomia” na doutrina brasileira


15.1. Doutrina nacional do século XIX até 1988
15.2. A “grande dicotomia” no cenário pós-1988

§16. Extinção ou mitigação da “distinção sistemática”: catálogo de


fundamentos da civilística brasileira

§17. Origens romanas e medievais: Ius Publicum e Ius Privatum

§18. Repasse das principais teorias sobre a “distinção sistemática”

CAPÍTULO QUARTO
A “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”: PERMANÊNCIA, UTILIDADE E
FUNDAMENTOS

§19. Autonomia e diferenciação do Direito Privado: entre a permanência e


a utilidade nas relações jurídicas contemporâneas
19.1. A organização da jurisdição e a diferenciação específica
19.2. A “distinção sistemática” e a formação jurídica
19.3. A “distinção sistemática” no universo das relações privadas

§20. A recodificação do Direito Civil e os espaços normativos do Direito


Privado

§21. Fatores culturais, teóricos, práticos e significativo-ideológicos

§22. Objeções e fundamentos contemporâneos para a manutenção da


“distinção sistemática”

§23. Conclusões parciais da Primeira Parte

SEGUNDA PARTE
CAPÍTULO QUINTO
O DIREITO CIVIL ENTRE A AUTONOMIA E A
CONSTITUCIONALIZAÇÃO: EM BUSCA DE UM ACORDO SEMÂNTICO
(OU SOBRE COMO SERVIR VINHO VELHO EM TAÇAS NOVAS)

§24. A “metáfora das ilhas do Canal” e os acordos semânticos


24.1. Introdução: vinho velho em taças novas
24.2. As Ilhas do Canal: tropas de ocupação ou imigrantes ilegais?

§25. O impacto da constitucionalização do Direito Civil na literatura


jurídica brasileira

§26. A crise de formalismo jurídico e as novas escolas jurídicas: o avanço


do n positivismo no final do século XX

§27. A “roupa nova do imperador”: neoconstitucionalismo, pós-


positivismo constitucionalização

CAPÍTULO SEXTO
O QUE NÃO É CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL

§28. Colocação do problema

§29. Constitucionalização como “sobreinterpretação” ou reinterpretação


das normas ordinárias a partir da Constituição

§30. Constitucionalização como elevação da dignidade da pessoa humana a


elemento funcionalizante do Direito Civil

§31. Constitucionalização como a colocação da Constituição no centro do


ordenamento jurídico

§32. Constitucionalização como controle de constitucionalidade e de


interpretação constitucional das normas

§33. Constitucionalização como uso de cláusulas gerais e como


“perturbação das prestações”, sem relação direta com a Constituição

§34. Constitucionalização como interpretação progressista ou como


socialização do Direito Civil

§35. Conclusões parciais

CAPÍTULO SÉTIMO
O QUE É CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL

§36. Colocação do problema

§37. Constitucionalização por elevação de normas ordinárias ao texto


constitucional

§38. Constitucionalização por reforma legislativa

§39. Constitucionalização por juridicização das normas constitucionais

§40. Constitucionalização por transformação das instituições e dos direitos


ou por irradiação do Direito Constitucional

§41. Excursus: Constitucionalização em sentido jurídico-político


(constitucionalização e reconstitucionalização) e jurídico-sociológico
(constitucionalização simbólica)

§42. Conclusões parciais

TERCEIRA PARTE

CAPÍTULO OITAVO
DIREITO CIVIL E DIREITOS FUNDAMENTAIS: O NASCIMENTO DE UM
NOVO OBJETO EPISTEMOLÓGICO

§43. Introdução
§44. O renascimento de uma nação: do “patriotismo imperial” ao
“patriotism constitucional”
44.1. A reconstrução nacional pós-1945 e a reconstitucionalização da
Alemanha com os “avós fundadores”
44.2. Em busca de um “guardião da Constituição”
44.3. O alvorecer do Tribunal Constitucional e o Direito Civil: o caso
Lüth

§45. O Lüth-Urteil (ou como se resolver um caso de Direito Civil na


jurisdição constitucional com respeito aos métodos civilísticos)
45.1. Introdução
45.2. Contexto histórico do caso Lüth: cinema, política e justiça
45.3. Elementos descritivos do caso Lüth e a decisão do TCF
45.4. Os fundamentos jurídicos do caso Lüth: interpretação
constitucional e Direito Civil
45.4.1. Estudo analítico interno-externo dos fundamentos do caso
Lüth
45.4.2. Ponto de partida: a doutrina de Jellinek
45.4.3. Respeito à “grande dicotomia”
45.4.4. Interpretação gramatical
45.4.5. Interpretação lógico-sistemática
45.4.6. Interpretação histórica

§46. A introdução do conceito de “ordem objetiva de valores” e o uso da


ponderação em um caso de Direito Civil
46.1. A “ordem objetiva de valores”
46.2. A ponderação e o Direito Civil

§47. Os legados do caso Lüth ao discurso metodológico do Direito Civil


47.1. O despertar para uma nova realidade metodológica
47.2. Respeito aos métodos, aos padrões decisórios e à gramática do
Direito Civil
47.3. A complexidade interpretativa e a ponderação
47.4. Eficácia indireta dos direitos fundamentais

CAPÍTULO NONO
EFICÁCIA DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA ALEMANHA E
NO BRASIL: A CONSTITUIÇÃO COMO NOVA “PARTE GERAL” DO
ORDENAMENTO JURÍDICO

§48. Hans Carl Nipperdey: o civilista criador da doutrina da eficácia


direta do direitos fundamentais

§49. A teoria de Nipperdey e a jurisprudência do BAG sobre a eficácia dos


direitos fundamentais
49.1. Principais postulados da teoria de Nipperdey
49.2. A doutrina da eficácia direta na jurisprudência do BAG: ascensão e
queda de um marco teórico

§50. Principais postulados da eficácia direta no Direito Alemão

§51. Situação atual da doutrina da eficácia direta na Alemanha


51.1. Panorama na doutrina alemã
51.2. Panorama na jurisprudência do TCF

§52. A exportação da doutrina da eficácia direta dos direitos fundamentais


em relação aos particulares

§53. Panorama da recepção da doutrina da eficácia direta dos direitos


fundamentais nas relações privadas no Direito brasileiro

§54. Principais postulados da teoria da eficácia direta dos direitos


fundamentais no Brasil
54.1. Dualidade de modelos de eficácia direta
54.2. Modelo fraco de eficácia direta
54.3. Modelo forte de eficácia direta
54.4. Modelo sincrético (ou um não modelo)
CAPÍTULO DÉCIMO
EFICÁCIA INDIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: ORDEM
OBJETIVA DE VALORES E AUTONOMIA DO DIREITO CIVIL

§55. Introdução

§56. O soldado do constitucionalismo da “ordem objetiva de valores”

§57. Principais postulados da teoria de Günter Dürig sobre a eficácia dos


direitos fundamentais em relação aos particulares

§58. Situação da teoria da eficácia indireta na Alemanha

§59. Estado atual da teoria da eficácia indireta no Brasil

§60. Excursus: Não eficácia dos direitos fundamentais (Diederichsen),


modelo da convergência estatista (Schwabe), modelo dos três níveis
(Alexy) e modelo da state action
60.1. Introdução
60.2. Modelo da não eficácia dos direitos fundamentais
60.3. Modelo da convergência estatista
60.4. Modelo de três níveis (Robert Alexy)
60.5. Modelo da state action

§61. Excursus: a “força normativa da constituição” de Konrad Hesse e a


eficácia dos direitos fundamentais
61.1. Introdução
61.2. Konrad Hesse, o jurista de Königsberg
61.3. A força normativa da Constituição: o livro e seu impacto na
literatura internacional
61.4. O que é afinal a “força normativa da Constituição”?
61.5. A recepção da obra no Brasil

CAPÍTULO DÉCIMO PRIMEIRO


EFICÁCIA INDIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES
PRIVADAS: PRINCIPAIS PROBLEMAS E PROPOSTA DE UM MODELO

§62. O “jogo dos absurdos não aparentes” e duas posições realistas sobre a
eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares

§63. A interpretação do art. 5º, § 1º, CF/1988, e a questão da eficácia dos


direitos fundamentais em relação aos particulares

§64. Natureza tendencialmente abstrata das normas de direitos


fundamentais

§65. A indispensabilidade da filtragem dos direitos fundamentais pelo


Direito Civil

§66. As cláusulas gerais: função, suficiência e combinação com normas


objetivas

§67. O barateamento dos princípios constitucionais e a banalização dos


direitos fundamentais

§68. Direito Civil: soluções intrassistemáticas e influência no sistema de


Direito Público

§69. Unidade da ordem jurídica e fundamentação do Direito Civil: a


autonomia privada

§70. Preservação do espaço normativo da lei

§71. A questão dos poderes sociais ou poderes privados

§72. O fator de correção interno e o modelo fraco de eficácia indireta dos


direitos fundamentais

CONCLUSÃO
§73. A vertigem das listas e “uma certa enciclopédia chinesa”

§74. “Distinção sistemática”, constitucionalização e modelo fraco de


eficácia indireta

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES LEGISLATIVAS (REPOSITÓRIOS ELETRÔNICOS)

ÍNDICE DE JURISPRUDÊNCIA CITADA


ABREVIATURAS

AA. VV. – autores vários


österreichisches Allgemeines Bürgerliches Gesetzbuch (Código
ABGB –
Civil da Áustria)
a.C. – antes de Cristo
ac. – acórdão
AC – apelação cível
ACOr – ação cível originária
ACP – ação civil pública
Archiv für die civilistische Praxis (periódico) – Mohr Siebeck
AcP –
(Alemanha)
Adcoas – Série – Jurisprudência Adcoas
ADC – ação direta declaratória de constitucionalidade
ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
ADI ou ADIn – ação direta de inconstitucionalidade
ADPF – ação de descumprimento de preceito fundamental
ADR – alternative dispute resolutions
ADV – Advocacia Dinâmica
Ag – agravo de instrumento
AgA – agravo regimental em agravo de instrumento
Gesetz zur Regelung des Rechts der allgeimeinen
AGBG – Geschäftsbedingungen (Lei alemã sobre as Cláusulas Contratuais
Gerais, de 9-12-1976)
AGG – Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz (Lei Geral de Igualdade de
Tratamento, de 14-8-2006)
AgPt – agravo de petição
AgRg – agravo regimental
AgRt – agravo retido
AGU – Advogado-Geral da União; Advocacia-Geral da União
AI – ato institucional
AJ – Arquivo Judiciário (periódico)
Ajuris – Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (periódico)
Allgemeines Landrecht für die preußischen Staaten (código
ALR –
territorial para os estados prussianos, 1794)
Amagis – Revista da Associação dos Magistrados Mineiros (periódico)
AMJ – Arquivos do Ministério da Justiça (periódico)
AMS – apelação em mandado de segurança
ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil
ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações
ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários
ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres
ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar
AöR – Archiv des öffentlichen Rechts (periódico) – Alemanha
Ap – apelação
AR – ação rescisória
art. – artigo
Bacen – Banco Central do Brasil
BAG – Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho) – Alemanha
Entscheidungen des Bundesarbeitsgerichts (Decisões do Tribunal
BAGE –
Federal do Trabalho)
BDA – Boletim de Direito Administrativo (periódico)
BGB – Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão)
BGH – Bundesgerichtshof (Tribunal Federal da Alemanha)
Entscheidungen des Bundesgerichtshofs in Zivilsachen (Decisões do
BGHZ –
Tribunal Federal em matéria cível)
BGHSt – Entscheidungen des Bundesgerichtshofs in Strafsachen (Decisões do
Tribunal Federal em matéria criminal)
BolAASP – Boletim da Associação dos Advogados de São Paulo (periódico)
Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal) –
BVerfG –
Alemanha
Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, amtliche Sammlung
BVerfGE –
(Decisões do Tribunal Constitucional Federal, Repositório Oficial)
Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal) –
BVerwG –
Alemanha
Entscheidungen des Bundesverwaltungsgerichts, amtliche
BverwGE – Sammlung (Decisões do Tribunal Administrativo Federal,
Repositório Oficial)
Cade – Conselho Administrativo de Defesa Econômica
Câm. – Câmara
cass. – cassação
c/c – combinado com
CC – conflito de competência
CC/2002 – Código Civil brasileiro (Lei no 10.406, de 10-1-2002)
CC/1916 – Código Civil brasileiro de 1916 (Lei no 3.071, de 1o-1-1916)
CCom/1850 – Código Comercial brasileiro
CDC – Código de Defesa do Consumidor
Christlich Demokratische Union (União Democrata-Cristã) –
CDU –
Alemanha
C.E. – Conseil d’État (Conselho de Estado da França)
CE – Comissão Europeia
CF – Constituição Federal (seguida do ano respectivo)
cf. – conforme, confira
CGI.br – Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br
CI/1824 – Constituição Política do Império do Brasil, de 25-3-1824
Convenção de Viena para compra e venda internacional de
CISG –
mercadorias
cit. – citado, citatum
Civ. – Aresto de uma câmara cível da Corte de Cassação (França)
civ. – cível
CJF – Conselho da Justiça Federal
CMN – Conselho Monetário Nacional
CNE/CES – Conselho Nacional de Educação/Câmara de Ensino Superior
Coord(s) – Coordenador(es) de obra coletiva, coletânea, tratado ou coleção
CNJ – Conselho Nacional de Justiça
Código de Processo Civil de 1973, revogado (Lei no 5.869, de 11 de
CPC/1973 –
janeiro de 1973)
Código de Processo Civil de 2015 (Lei no 13.105, de 16 de março de
CPC/2015 –
2015)
CVM – Comissão de Valores Mobiliários
D. – Recueil Dalloz (periódico) – França
Dig. – Digesto, parte do Corpus Iuris Ciuilis, do imperador Justiniano
Dec. – decreto
d.C. – depois de Cristo
DCFR – Draft Common Frame of Reference
Dep. – Deputado
Des. – Desembargador
DJU – Diário de Justiça da União
DL – Decreto-lei
Dleg – Decreto Legislativo
DOU – Diário Oficial da União
Recueil périodique et critique mensuel Dalloz (anos anteriores a
DP –
1941) (periódico) – França
EAC – embargos em apelação cível
EC – emenda constitucional, seguida do número respectivo
ed. – edição
EDcl. – embargos de declaração
EDiv – embargos de divergência
EDP – Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei no 13.146, de 6 de julho de
2015)
e.g. – exempli gratia
EMERJ – Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro (Rio de
Janeiro)
ERE – Embargos de Divergência em Recurso Extraordinário
Freie Demokratische Partei (Partido Democrático Livre) -
FDP –
Alemanha
FS – Festschrift (livro em homenagem, liber amicorum)
Grundgesetz (Lei Fundamental da República da Alemanha),
GG –
equivalente a LF/1949
HansOLR – Hanseatisches Oberlandesgericht
HC – Habeas corpus
HGB – Handelsgesetzbuch (Código Comercial alemão)
IDP – Instituto Brasiliense de Direito Público (Brasília, Distrito Federal)
IOB – Informações Objetivas (informativo de jurisprudência)
IoT – Internet of things
International Organization for Standardization (Organização
ISSO –
Internacional para a Padronização)
IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
J. – Jurisprudence
j. – julgado em
JBl. – Juristische Blätter (periódico) - Alemanha
JSTF – Lex-Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
Lex-Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais
JSTJ –
Regionais Federais
JTJ – Jurisprudência do Tribunal de Justiça (Lex) (periódico)
Jus – Juristische Schulung (periódico) - Alemanha
JW – Juristische Wochenschrift (periódico) - Alemanha
JZ – Juristenzeitung (periódico) - Alemanha
King’s Bench (Reino Unido) – divisão da High Court of Justice of
K.B. –
England and Wales, competente para julgar recursos cíveis
Kritische Vierteljahresschrift für Gesetzgebung und
KritV –
Rechtswissenschaft (periódico) - Alemanha
LF/1949 – Lei Fundamental da República Federal da Alemanha de 1949
LG – Landgericht (tribunal de primeiro grau)

Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro (Decreto-lei no 4.657,


LICC –
de 4 de setembro de 1942), até 30-12-2016
Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro (Decreto-lei no
LINDB – 4.657, de 4 de setembro de 1942), nomenclatura alterada pela Lei no
12.376, de 30 de dezembro de 2010
LTr – Revista Legislação Trabalhista (periódico)
MCI – Marco Civil da Internet (Lei no 12.965, de 23 de abril de 2014)
Min. – Ministro
MP – Ministério Público
MS – Mandado de Segurança
no – número
NJW – Neue Juristische Wochenschrift (periódico) - Alemanha
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
ob. – obra
Oberster Gerichtshof für die Britische Zone (Superior Tribunal de
OGHBrZ – Justiça para a Zona de Ocupação Britânica)- Território ocupado da
Alemanha Ocidental
op. – opus, obra
op. cit. – opus citatum, obra citada
Ordenações do Reino de Portugal (a depender do documento citado,
Ord. –
Manuelinas, Afonsinas ou Filipinas)
Org(s). – organizador(es) de obra coletiva, coletânea, tratado ou coleção
organização da sociedade civil de interesse público (Lei no 9.790, de
OSCIP –
23 de março de 1999)
OTT – over-the-top-contents
p. – página
par. ou § – parágrafo
PLC – Projeto de Lei da Câmara dos Deputados (Brasil)
PLS – Projeto de Lei do Senado Federal (Brasil)
Rabels Zeitschrift für ausländisches und internationales Privatrecht
RabelsZ –
(periódico) - Alemanha
RBDC – Revista Brasileiro de Direito Comparado (periódico)
RDA – Revista de Direito Administrativo (periódico)
RDC – Revista de Direito do Consumidor (periódico) – RT
RDCC – Revista de Direito Civil Contemporâneo (periódico) – RT
Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial
RDCiv –
(periódico) – RT
RDE – Revista de Direito do Estado (periódico)
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro
RDM –
(periódico)
RD – Revista de Direito Público (periódico)
Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da
RDB –
Arbitragem (periódico)
RDP – Revue de Droit Public et de la Science Politique (periódico) – LGDJ
RDPriv – Revista de Direito Privado (periódico) – RT
Riv.Dir.Civ. – Rivista di Diritto Civile (periódico) – Itália
RE – recurso extraordinário
rel. – relator
REsp – recurso especial
RF – Revista Forense (periódico) – Forense
Revista Fórum de Direito Civil (periódico) – Fórum (Belo
RFDC –
Horizonte)
Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
RFDUSP –
(periódico)
RG – Reichsgericht (Tribunal do Reich – Império Alemão)
Entscheidungen des Reichsgerichts in Zivilsachen (Decisões do
RGZ –
Tribunal do Reich em matéria cível) – Reich Alemão (1879-1945)
RIL – Revista de Informação Legislativa (periódico)
RJ – Revista Jurídica (periódico) – Porto Alegre
Revista da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção do Ceará
ROAB-CE –
(periódico)
ROMS – Recurso Ordinário em Mandado de Segurança
RP – Revista de Processo (periódico) – RT
RR – Recurso de Revista
RSTJ – Revista do Superior Tribunal de Justiça (periódico)
RT – Revista dos Tribunais (periódico) – RT

Revista Trimestral de Direito Civil (periódico) – Padma (Rio de


RTDC –
Janeiro)
RTDP – Revista Trimestral de Direito Público (periódico) – Malheiros
RTJ – Revista Trimestral de Jurisprudência do STF (periódico)
RTJE – Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados (periódico)
RVBI – Rede Virtual de Bibliotecas Institucionais
s/d – sem data
s/e – sem edição
SBDC – Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência
S.E. – Sentença Estrangeira
SEC – Sentença Estrangeira Contestada
Sen. – Senador
SIRD – Società Italiana per la Ricerca nel Diritto Comparato (Itália)
s/n – sem número
s/p – sem página
(Sozialdemokratische Partei Deutschlands) – Partido Social-
SPD –
Democrata da Alemanha
Sr. – Senhor
ss. – seguintes
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
SUMOC – Superintendência da Moeda e do Crédito
T. – turma
t. – tomo
TCF – Tribunal Constitucional Federal (Alemanha)
TFR – Tribunal Federal de Recursos
Tribunal de Justiça (seguido da sigla da unidade federativa
TJ –
respectiva)
trad. – tradução, tradutor, traduzido
TRF – Tribunal Regional Federal (seguido do número da região respectiva)
UF – Universidade Federal, seguida da sigla da unidade da federação
respectiva
TST – Tribunal Superior do Trabalho
un. – unânime
EU – União Europeia
United Kingdom of Great-Britain and Nothern Ireland (Reino Unido
UK –
da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte)
Institut international pour l’unification du droit privé (Instituto
Unidroit –
Internacional para a Unificação do Direito Privado)
USP – Universidade de São Paulo
v. – volume, veja, ver
Verfolgten des Naziregimes (Associação de Vítimas do Regime
VVN –
Nazista)
v.g. – verbi gratia
v.u. – votação unânime
Weimarer Reichsverfassung (Constituição do Reich [geralmente
WRV –
traduzido literariamente por República] de Weimar)
ZPO – Zivilprozessordnung (Ordenança de Processo Civil) – Alemanha
ZeuP – Zeitschrift für Europäisches Privatrecht (periódico) – Alemanha
Zeitschrift der Savigny-Stiftung für Rechtsgeschichte-Romanistische
ZSS-RA –
Abteilung (periódico) – Alemanha
INTRODUÇÃO

SUMÁRIO. § 1. O nascimento e a evolução da moderna metó dica do


Direito Civil. 1.1. Savigny, o “jurista global” e a metódica das metódicas.
1.2. Metódica em transformação: Larenz, Wiea cker e Esser. 1.3. Crise de
hegemonia: sistema, constitucionali zação e redes. § 2. Estatuto
epistemológico do Direito Civil con temporâneo: autonomia,
constitucionalização e o espaço dos direitos fundamentais. § 3. Plano do
trabalho, delimitação do objeto e tese. 3.1. Plano do trabalho. 3.2.
Delimitação do ob jeto. 3.3. Tese.
§1. O NASCIMENTO E A EVOLUÇÃO DA MODERNA METÓDICA DO
DIREITO CIVIL

1.1. Savigny, o “jurista global” e a metódica das metódicas


O Direito Civil desenvolveu, desde o século XIX, sua própria metódica, a
qual, em larga medida, foi assimilada, absorvida, incorporada ou serviu de
modelo para outras disciplinas.7 A palavra “metódica” é plurívoca. Ela pode
significar (i) um tipo específico de procedimento, (ii) a ciência que estuda os
procedimentos científicos ou (iii) a teoria do método, que compreende a
investigação, a formação e a transmissão do conhecimento de uma determinada
área.8
Reconhece-se que coube ao Direito Civil, na Alemanha do século XIX, um
papel pioneiro nesse campo, tendo a Escola Histórica grandes méritos por isso.9
O Direito Civil era não somente o direito dos particulares, mas aquele que
assegurava um conjunto de liberdades civis no âmbito da propriedade, da
autonomia privada e da família. Ele assumiu “parcialmente o papel dos direitos
fundamentais”.10 Já se disse, a respeito do século XIX, que houve uma
transferência de métodos e modelos jurídicos do Pandectismo para o Direito
Público e tal processo, como lembra Konrad Hesse, não é tão perceptível nas
constituições e nas leis, e sim no pensamento dos juristas.11 As mudanças
ocorreriam, é certo, após a Constituição de Weimar, embora com reservas de
ordem prática consideráveis, as quais só viriam a ser verdadeiramente retiradas
no julgamento do caso Lüth,12 o divisor de águas no processo de deslocamento
de forças do Direito Privado para o Direito Público.13
Essa “estrada para Damasco”, vista sob a óptica do Direito Público, só
reforça a tese de que a metódica do Direito Civil serviu de molde e de inspiração
para as demais áreas do Direito no século XIX e em grande parte do século XX.
Ao estilo de Konrad Hesse, é inegável que os trabalhos de Friedrich Carl
Freiherr von Savigny inauguraram a era moderna da metódica no Direito Civil,
mas também em todo o Direito.14 Seu Sistema de Direito Romano Atual
provavelmente seja a obra mais influente de toda a literatura jurídica do século
XIX.15
Savigny é um filho cronológico, mas acima de tudo espiritual, do século
XVIII. Ele nasceu em Francoforte sobre o Meno, no ano de 1779, em uma
família aristocrática de huguenotes, originária da Lorena, que abandonara a
França em 1630 por conta da perseguição religiosa. O apelido de família Savigny
não esconde o acento francês e refe-re-se ao castelo de idêntico nome, situado no
Vale do Mosela. Seus antepassados prestaram juramento de vassalagem a
suseranos alemães e permaneceram desde então do outro lado do Reno. Como
noticia Franz Wieacker, muito jovem ele se tornou órfão. Precocemente,
formou-se em Direito na Universidade de Magdeburg, onde estudou de 1795 a
1799. A independência econômica permitiu-lhe dedicar-se inteiramente à vida
universitária, não sem antes uma peregrinatio academica pelos Estados alemães
do Sacro Império, onde forjou contatos, reuniu livros e manuscritos e adquiriu
experiências culturais. Em 1802, aos 24 anos, assumiu o cargo de professor em
Magdeburg.16 Foi cofundador da Universidade de Berlim e assumiu a reitoria da
instituição em 1812.17 A partir de então, ligou seu destino à Prússia e prosseguiu
em sua carreira acadêmica e depois como alto servidor desse Reino, onde foi
grão-chanceler. Como jurista e humanista, Savigny é um “clássico da Ciência do
Direito” e um “mestre da língua alemã”.18 Mais que isso, ele foi um aristocrata
huguenote, nascido no moribundo e milenar Sacro Império Romano-Germânico,
testemunha da destruição do Antigo Regime pelas legiões napoleônicas,
convertido em jurista de Estado na Prússia durante a Restauração e caput
scholae de um dos mais importantes movimentos do século XIX, a Escola
Histórica.19 E, apesar de todas essas circunstâncias, até hoje, Savigny é uma
incógnita quanto a suas posições políticas e sua orientação ante os rumos que a
velha Europa foi obrigada a tomar no turbulento alvorecer do Oitocentos.20
Uma das certezas que se pode ter em relação a ele, ao menos em termos de
metódica jurídica, é que, antes de Savigny, quase nada havia. Com Savigny,
quase tudo se formou.
É necessário advertir para o fato de que, embora o Sistema, seu opus
magnum, não tenha em seu título as palavras “metodologia” ou “metódica”, tão
francas em sua utilização nos dias de hoje, era um tratado que também delas se
ocupava. A servir de contraste, observe-se que há versões em espanhol21 e em
português22 de uma obra de Savigny que ganhou o título de “Metodologia
Jurídica”, mas que não é propriamente um estudo geral de caráter metodológico
e sim a compilação de suas aulas-magnas nos anos letivos de 1802 e 1803, em
Magdeburg, quando ele ainda era um jovem professor.
Da mesma maneira, a presença do Direito Romano em seu título, de rigor,
há de ser mitigada pelo adjetivo Atual.23 Savigny venerava o Direito Romano.
No Sistema, contudo, o Direito Romano emprestava autoridade às teses de
Savigny, especialmente em um século conflagrado pelo combate entre
romanistas e germanistas.24 O adjetivo não visava delimitar os volumes do
Sistema como exclusivamente um compêndio romanístico ou como uma obra
dedicada à História do Direito Romano, objetivo anteriormente alcançado com
seu clássico História do Direito Romano na Idade Média, cuja edição se iniciou
em 1815. O Atual é que deve ser observado com maior atenção. Ele não apenas
qualifica o título, mas a própria obra: Savigny escreveu para seu tempo.25 E, com
acerto, já se afirmou que é “possível dizer sem exagero que a modernidade
jurídica nasce com a obra de Savigny, fundador de um paradigma científico
destinado a um excepcional sucesso dentro e fora da Europa ao longo de todo o
séc. XIX”. A tanto, Karl Larenz, autor de “um dos livros de metodologia mais
influentes atualmente, sentiu a necessidade de legitimar-se historicamente
precisamente a partir da metodologia savignyana”.26
Embora o Direito das Pandectas, de Bernhard Windscheid,27
especialmente seu primeiro volume, possa ser considerado um livro de caráter
parcialmente metodológico, parcialmente dogmático, ele não alcançou o grau de
universalidade e de abrangência metódica da obra de Savigny.28 Deve-se, porém,
considerá-lo um exemplo dos efeitos do pensamento de Savigny, ainda no século
XIX, sobre o modo de organização metodológica do Direito Privado, que se
irradiou para outros países.29

1.2. Metódica em transformação: Larenz, Wieacker e Esser


No século XX, a Constituição de Weimar e o caso Lüth enfraqueceram a
antiga posição do Direito Privado, mas isso não impediu que estudos
metodológicos continuassem a ser desenvolvidos em seu âmbito e que seus
institutos e suas figuras jurídicas permanecessem a interagir e a influenciar o
Direito Público. Como lembra Gilberto Bercovici, muitos publicistas renomados
como Carl Friedrich von Gerber, Paul Laband e Vittorio Emmanuele Orlando
inspiraram-se na metodologia desenvolvida pelos pandectistas e não se
envergonhavam de estimular sua utilização para que o Direito Público
alcançasse um nível mais elevado de cientificidade.30 Os administrativistas não
se cansaram de reconhecer tal circunstância.31
O “breve século XX”, na famosa definição de Eric Hobsbawm,32 assistiu a
uma violenta troca de guarda nas cátedras universitárias alemãs e, como reflexo
disso, no pensamento jurídico-metodológico no Direito Civil. Se não todos,
muitos dos herdeiros espirituais de Savigny e Windscheid foram apeados de suas
posições acadêmicas ou perderam prestígio político-universitário com a chegada
do nacional-socialismo ao poder nos anos 1930. Como já assinalado alhures,
dois dos expoentes dessa viragem são Karl Larenz e Franz Wieacker.33
Na Methodenlehre der Rechtswissenschaft de Karl Larenz, traduzida para o
português por José Lamego,34 estão as bases para uma compreensão sistemática
do Direito no século XX. Esse livro incorpora elementos desenvolvidos a partir
dos anos 1920-1930, como as cláusulas gerais, os princípios e as relações
intersistêmicas. Larenz é um dos principais responsáveis pela divulgação e pela
disseminação das cláusulas gerais na literatura jurídica do segundo pós-guerra.
Sua influência, no Brasil, por exemplo, foi determinante para a “entrada” das
cláusulas gerais no Direito Civil e sua posterior vulgarização junto à grande
doutrina e à jurisprudência.35
A Metodologia da Ciência do Direito soma-se a obras gerais de Direito
Civil, como a Parte Geral do Código Civil, que da primeira à décima edição
atingiu o impressionante número (para a Alemanha) de 10 mil exemplares, e ao
Direito das Obrigações, em dois volumes.36 Nesses livros, é visível a
preocupação com a socialidade, o personalismo ético kantiano37 e o controle da
autonomia privada. Pode-se considerar tais interesses como uma reação ao
discurso crítico ao Direito Civil do século XIX, como também aos resquícios da
ideologia dominante nos meios jurídicos alemães nos anos 1930-1940, que será
referida nesta tese, ou ainda aos reflexos do embate intergeracional entre os
herdeiros espirituais de Savigny e os sucessores do germanismo do começo do
Oitocentos. Talvez não seja equivocado dizer que a conjugação desses três
fatores, associados ao momento histórico tão propício ao aumento dos espaços
estatais no Direito Privado, expliquem adequadamente essa orientação
encontrada nos textos de Larenz e que tanto hão influenciado os juristas
brasileiros.38
O historiador do Direito Privado Franz Wieacker não deixou uma
contribuição metodológica em sentido estrito. Mas, ao menos na chave do que se
começou a chamar de metodologia jurídica no século XIX, o Direito Romano e a
História do Direito não podem ser considerados intrusos nessa conceituação.
Wieacker, ligado a Larenz por circunstâncias acadêmicas,39 é responsável por
um dos maiores câmbios quanto à forma como o Direito Privado é visto externa
e internamente. Como um elemento importante na construção da
metadogmática,40 a História do Direito Privado (1952, primeira edição; 1967,
segunda edição)41 de Franz Wieacker contribuiu para enfraquecer a influência de
Savigny-Windscheid e abrir uma justificativa para a legitimação do novo
discurso metódico desenvolvido por Larenz, embora não apenas por ele. Note-se
que “uma das mais populares caracterizações do BGB, muito usada por Franz
Wieacker, é a de ser esse código um ‘filho tardio do liberalismo’”.42
Sua produção não foi apenas em História do Direito, mas também em
Direito Civil. Os títulos de seus trabalhos refletem não somente a identificação
com Larenz, mas também com o momento em que ambos viveram,
particularmente no pós-guerra, quando temas como a nova sociedade industrial,
a boa-fé objetiva e modelos sociais estavam em evidência.43 A magnitude do
ofício de Franz Wieacker para o Direito Privado não pode ser ignorada. Ele é
considerado o criador de um objeto epistemológico próprio para a História do
Direito.44
As bases dessa metodologia jurídica do século XX, liderada por privatistas,
encontram na obra de Josef Esser (1910-1999) a ponte para a questão dos
princípios, a qual viria a se tornar o núcleo da teoria da decisão do Direito
Constitucional contemporâneo. Uma vez mais, está no Direito Privado, não
apenas no Direito Civil, a chave para se entender problemas como sopesamento,
ponderação e colisão de princípios, os quais viriam a assegurar as glórias
acadêmicas, no final do século passado, a Robert Alexy e a Ronald Dworkin.
Esser inaugura seu livro Princípio e norma na criação jurisprudencial do
Direito Privado45 com a afirmação de que o termo “princípios jurídicos”
corresponde a uma terminologia empregada continuamente na teoria e na
jurisprudência sem que haja sido submetida a um exame sistemático de seu
sentido e de seu alcance. Como se cuidasse de alguns conceitos tratados nesta
tese, Josef Esser afirma, em relação aos princípios, que dessa despreocupação
com acordos semânticos resulta que eles são utilizados para as tarefas mais
diversas, o que faz com que deles se abuse como panaceia para todos os males a
fim de resolver toda estirpe de problemas. Esser afirma expressamente que os
princípios são empregados das formas mais contraditórias, além de não se
submeterem aos padrões da silogística clássica.46 Ao longo do livro, ele ataca o
solipsismo teoréticojurídico47 e desfaz as ilusões dos positivistas quanto a uma
derrocada do jusnaturalismo, ainda muito presente, em sua visão, no segundo
pós-guerra.

1.3. Crise de hegemonia: sistema, constitucionalização e redes


Poder-se-iam descrever outros importantes privatistas que ajudaram a
edificar a metodologia e a metódica do Direito no pós-guerra. Larenz, Wieacker
(como formador das bases para uma metadogmática de cunho histórico do
Direito Privado) e Esser (com o incendiário problema dos princípios) servem
para o fim exclusivo e limitado a esta tese de comprovar o sentido de
continuidade das contribuições privatísticas ao Direito e também da força e da
persuasão de seus modelos sobre as outras províncias jurídicas. Para não se
recuar tanto, recuperem-se dois grandes nomes do crepúsculo do século XX,
embora ambos possam ser citados como representativos de caminhos diferentes
para o Direito Civil.
Concedida a liberdade para tratá-los como dois oponentes na luta pela
prevalência de um modelo metodológico para o Direito Civil, o que talvez seja
um abuso de linguagem, exponha-se primeiramente o perdedor, fazendo-o a
partir das palavras do vencedor.
Claus-Wilhelm Canaris, o vencedor, escreveu um artigo em homenagem
aos 70 anos de Franz Bydlinski, o perdedor. Canaris informa que Bydlinski
nasceu na Alta Silésia, em 1931, atualmente território polonês, tendo crescido na
Áustria, onde terminou sua carreira como catedrático de Direito Civil da
Universidade de Viena. Anteriormente, ele foi catedrático em Bonn.48 Em 1982,
Bydlinski publicou seu opus magnum, Metodologia do Direito e conceito
jurídico49 e, no ano de 1996, ele editou Sistema e princípios de Direito Privado,
que veio a ser considerado por Dieter Medicus como “uma das grandes obras da
Ciência do Direito em língua alemã”.50 Infelizmente, não há traduções para a
língua portuguesa dessas obras fundamentais da metodologia privatística
contemporânea, o que limita seu alcance e sua influência no Direito brasileiro.
Claus-Wilhelm Canaris, ao completar 70 anos, em 2007, recebeu diversas
homenagens. Um grupo expressivo de privatistas alemães escreveu um artigo em
honra dessa efeméride, no qual eles põem ênfase às preocupações de Canaris,
desde a década de 1960, com o princípio da igualdade e sua conexão com a
atividade interpretativa e a identificação das lacunas na lei.51
A tese de livre-docência (ou a palestra de Habilitation) de Canaris,
apresentada em 1969, intitulou-se Pensamento sistemático e conceito de sistema
na Ciência do Direito,52 na qual Theodor Viehweg (1907-1988) é o alvo de suas
principais restrições. Percebe-se no livro uma inegável tentativa de se combater
uma “nova” proposta metodológica para o Direito contida na noção de tópica
oferecida por Viehweg.53 Segundo António Menezes Cordeiro, na Introdução à
edição portuguesa da tese de Canaris, a tópica viehwegiana “teve um vivo
sucesso, depois de ter passado despercebida nos anos subsequentes ao estudo” de
seu criador. A ideia tem seus méritos, “mas sobretudo, as-sistiu-se a um
vulgarizar do termo ‘tópicos’ – muitas vezes expresso no grego alatinado, mais
impressivo, ‘topoi’ – que veio, assim, a conhecer um emprego alargado, mesmo
em áreas onde, com total propriedade, se deveria antes dizer ‘princípios’,
‘vectores’ ou, até, ‘normas’”. Dessa maneira, “a pretexto de adesões tópicas,
redobrou-se na crítica ao pensamento sistemático, sem atentar no facto de os
argumentos de Viehweg – conhecidos, aliás, há muito – atingirem, tão-só, um
certo tipo de sistema: o axiomático-dedutivo”.54
O discípulo de Larenz contava 22 anos quando o Tribunal Constitucional
Federal julgou o caso Lüth, no qual se reconheceu pela primeira vez na História
da Alemanha (e de muitos países) a eficácia dos direitos fundamentais nas
relações privadas. Claus-Wilhelm Canaris, portanto, atravessou a segunda
metade do século XX como um acadêmico em plena atividade e assistiu ao
impacto da transformação das relações entre o Direito Privado e o Direito
Constitucional. O desenvolvimento da matéria na Alemanha, como será exposto
na Terceira Parte da tese, conduziu a uma solução que preservou, em certa
medida, os espaços metodológicos do Direito Privado e, evidentemente, do
Direito Civil.
A Alemanha vive, por conseguinte, uma situação paradoxal: é a pátria da
teoria da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares e
também o berço e o refúgio espiritual do estatuto epistemológico do Direito
Civil contemporâneo. A importância de Claus-Wilhelm Canaris como um
“sucessor apostólico” da tradição iniciada com Savigny, embora vinculado ao
pensamento de Larenz, está em haver enfrentado o desafio de analisar o
problema a partir do Direito Civil e deste para o Direito Constitucional.
O esforço de Claus-Wilhelm Canaris refletiu-se em duas publicações,
sendo que a última é um desenvolvimento da primeira e foi vertida para o
português, com efeitos muito positivos para o estado-da-arte da matéria no
Brasil. Trata-se do livro Direitos fundamentais e Direito Privado, no qual
Canaris revisita o problema da eficácia dos direitos fundamentais nas relações
privadas e formula uma nova teoria, denominada “doutrina dos deveres de
proteção”, uma variante da eficácia indireta.55
Esse tipo de aproximação já havia ocorrido na obra do privatista Hans Carl
Nipperdey56 e a ela Larenz dedicou algumas passagens de sua Parte Geral do
Código Civil.57
Uwe Diederichsen é outro civilista que dedicou atenção ao problema da
Drittwirkung, sendo uma das referências mais importantes daqueles que
defendem não haver eficácia dos direitos fundamentais em relação aos
particulares, dada a impossibilidade de vasocomunicação entre os sistemas
privado e público.58
Na Alemanha do segundo pós-guerra, os publicistas ou teóricos do Direito
tiveram um papel central na construção da doutrina da eficácia dos direitos
fundamentais em relação aos particulares, um capítulo importante da teoria dos
direitos fundamentais. Para se ficar apenas nos mais conhecidos e relevantes,
podem-se mencionar Günter Dürig,59 Konrad Hesse,60 Robert Alexy,61 Jürgen
Schwabe,62 Bernhard Schlink,63 Christian Starck64 e Karl-Heinz Ladeur.65
Os publicistas, nos últimos 20 anos, partiram para outro tipo de
problematização, que interessa hoje prioritariamente à Alemanha e à Europa: a
eficácia do direito europeu em face dos ordenamentos internos e como
operacionalizá-la ante a autonomia dos direitos internos (é o chamado effet
utile).66 Na prática, esse tema desdobra-se em dois aspectos: (i) a jurisdição
europeia como intérprete dos direitos fundamentais, o que cria, de imediato, uma
colisão de interpretações entre os tribunais europeus e os tribunais
constitucionais (ou os tribunais superiores ordinários); (ii) o efeito direto ou
efeito útil das normas europeias, particularmente as de direitos humanos, sobre a
legislação interna (se vinculam e em que medida vinculam os direitos nacionais
europeus). O caso Bosman v. UEFA é sempre mencionado como o paradigma da
aplicação do effet utile: as regras da União Europeia de Futebol - UEFA
estabeleciam limitações à livre circulação de jogadores no território da União
Europeia. O jogador belga Jean-Marc Bosman, que atuava pelo RFC Liège, foi
colocado em uma lista de atletas “transferíveis” para outras ligas de futebol.
Pelas normas da UEFA, nesses casos, ter-se-ia de cumprir uma cláusula de
indenização (equivalente a 4 milhões e oitocentos mil euros). Após negociações,
o time USL Dunkerque aceitou receber Bosman, mas sem pagar o valor previsto
na cláusula de indenização. A transferência foi inviabilizada e Bosman
processou o Liège, a Federação Belga de Futebol e a UEFA, argumentando que
a cláusula foi prejudicial a sua livre circulação. O Tribunal de Justiça da União
Europeia, em 1995, julgou favoravelmente o recurso a Bosman e declarou que
tais cláusulas, bem assim quaisquer restrições à transferência de jogadores no
espaço comunitário, deveriam ser abolidas. Essa decisão é mencionada como o
precedente inaugural do effet utile, o que implicaria a eficácia direta de normas
do Tratado de Roma, de direito público, às entidades privadas. Há, no entanto,
quem considere que não ter sido um caso de eficácia horizontal, mas de
reconhecimento de normas de competência: as regras da UEFA, na espécie,
teriam natureza pública e, como tais, foram assim tratadas pelo Tribunal
Europeu.67
No Direito Civil, o exemplo mais emblemático dessa nova “dimensão” de
problemas está nos sucessivos casos de violação de direitos da personalidade (e
também fundamentais) da princesa Caroline von Hannover (née de Mônaco).68
Uma exceção talvez seja o civilista e sociólogo do Direito Gunther Teubner, que
escreveu em 2014 sobre a eficácia dos direitos fundamentais transnacionais.69
É possível ainda mencionar Gunther Teubner como um dos civilistas que
continuaram com pretensões metódicas para além das fronteiras do Direito
Privado. Seu Direito como sistema autopoiético70 é uma prova desse intuito.
Nesse livro, Teubner fala uma nova linguagem, ao combinar elementos jurídicos
com metajurídicos, como a neurofisiologia de Humberto Maturana e Francisco
Varela; a biologia molecular, de Zeleny e Uribe; a lógica das estruturas, com
Gödel; a cibernética de primeiro e segundo graus, de Ashby e von Förster. Sem
esquecer da linguística, dos sistemas autorreferentes de comunicação (Luhmann)
e da noção de consciência dos primatas antropoides.71 Não é sem causa o
particular interesse de Antonio Junqueira de Azevedo pelas ideias de Teubner,
que lhe serviram de inspiração para construir pontes entre o Direito e a Biologia,
a Epistemologia e a Primatologia.72
Mais recentemente, Teubner tem desenvolvido estudos sobre a crise do
constitucionalismo, baseado em ordenações jurídicas internas e hierarquizadas,
com referência a uma ordem objetiva de valores. A nova ordem jurídica é
transconstitucional e fundada na comunicação e pela construção do poder de
forma coletiva.73
Há estudos metodológicos no Direito Civil para além das fronteiras alemãs,
ao exemplo de obras publicadas em Portugal, Espanha, França, Itália e Brasil
desde o século XIX.74 A preferência pela “genealogia das ideias” alemãs deu-se
por razões de duas ordens. A primeira foi a de traçar a evolução desses estudos a
partir de Savigny. Nada mais compreensível que a Alemanha fosse privilegiada
nesse aspecto. A segunda, talvez a mais relevante, é que, por motivos históricos
e talvez econômicos, a Alemanha é hoje o principal bastião de resistência ao
avanço de conceitos, categorias e institutos metajurídicos e de common law no
Direito Civil de tradição romano-germânica.75 So-me-se a isso que a
metodologia do Direito Civil contemporâneo na Alemanha prossegue sua
jornada com impressionantes frescor e diversidade.
§2. ESTATUTO EPISTEMOLÓGICO DO DIREITO CIVIL CONTEMPORÂNEO:
AUTONOMIA, CONSTITUCIONALIZAÇÃO E O ESPAÇO DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
Na República de Weimar, surgiu um movimento fortemente contrário ao
positivismo jurídico. As causas históricas para esse ataque ao positivismo foram
assinaladas por Michael Stolleis: a atividade legislativa, durante a Primeira
Guerra Mundial, foi dirigida pela necessidade de superar crises econômicas e
sociais. A lei transformou-se em um produto (industrial), que era rapidamente
fabricado, frequentemente falho e expeditamente revogado. A legislação deixou
de ser confiável. A lei poderia ser e era frequentemente injusta ou inadequada.
Como resultante disso, renasceu o interesse pelo jusnaturalismo e o catálogo de
direitos fundamentais da Constituição de Weimar passou a ser considerado como
um sistema de valores que se punha acima do direito positivo.76 Esses foram os
tempos que poderiam ter convertido a Alemanha em uma “República feliz”,
debaixo de uma “Constituição feliz”, naqueles loucos anos 1920. Ao menos até
que sobreviesse o crack da Bolsa de Valores em 1929 e a Grande Depressão,
com o desemprego e a crise econômica em níveis que superaram qualquer outra
experiência histórica anterior. Nos anos 1930, o Legislativo perdeu o resto de
sua autoridade e, no imaginário popular, só um líder forte haveria de salvar o
país de todos os males.77
É importante, no entanto, compreender que as bases do que surgiria depois
de 1945, no segundo pós-guerra, estavam ali em Weimar: (i) um positivismo
desacreditado; (ii) a atividade legislativa considerada como um parque industrial
normativo “a serviço” da solução de crises econômicas emergenciais e que
constantemente expelia produtos “com defeito” de sua linha de produção; (iii)
um catálogo generoso de direitos fundamentais e (iv) uma sociedade ainda
traumatizada pelo regime de força. Eis os ingredientes para a fórmula que
posteriormente vingaria na Alemanha, mas com uma sofisticação intelectual
maior e sob o prestígio do TCF: direitos fundamentais como fator de correção ao
direito ordinário.
O problema dessa estrutura, que combina elementos da doutrina do
escalonamento das normas de Kelsen-Merkl com fatores de correção internos ao
sistema jurídico, está na contradição essencial de direitos fundamentais e
princípios que também são o cume axiológico do próprio sistema. Se eles são
fatores de correção internos, portanto, aclimatáveis à linguagem, à estrutura e à
pressuposição de que uma norma inferior encontra seu fundamento de validade
na norma superior, qual é a contradição? Ela surge quando se indaga qual o
conteúdo desses direitos fundamentais e dos princípios constitucionais, que
guardam entre si uma relação de implicação-polaridade. Não se vai entrar na
discussão sobre a diferença forte ou fraca entre regras e princípios,78 muito
menos desenvolver o longo e polêmico estudo sobre o que são realmente
princípios.79 Esse é um tormento que os constitucionalistas há décadas tentam
afastar das margens do continente do Direito Público e ele foge ao objeto desta
tese, embora o Direito Civil não deva ficar indiferente e omitir-se em participar
dessa discussão.
Apresentada essa restrição objetiva ao tema e à sua verticalização neste
trabalho, volte-se ao ponto de partida: se os princípios constitucionais e, em
certas circunstâncias, os direitos fundamentais precisam ter seus conteúdos
normativos preenchidos, quem está autorizado a fazê-lo? Alguns deles são
suficientemente precisos ou já dispõem de décadas de atividade doutrinária e
jurisprudencial, tornando-os aptos a fornecer um acordo semântico sobre o que
significam e a definição de seus conteúdos mínimos.
Há pouca dúvida, v.g., sobre o conteúdo do inciso XXXI80 do art. 5o,
CF/1988, relativo à incidência da norma mais favorável ao cônjuge ou aos filhos
brasileiros do de cuius, no que se refere à sucessão de bens de estrangeiros
situados no país. Diferentemente será resolver um caso no qual estejam em jogo
a vida privada e a intimidade de uma pessoa natural81 diante do exercício das
liberdades comunicativas por outro particular.82 Esse último exemplo é até óbvio
quanto a sua complexidade e essa assertiva é confirmável pela consulta ao
repositório eletrônico do STF: duas das mais importantes decisões do tribunal,
nos últimos 10 anos, examinaram esse tipo de conflito (ADI 4815, caso das
biografias, e ADPF 130, caso da Lei de Imprensa).83
Pode-se objetar com o que já se assinalou: em relação à privacidade e à
intimidade, de um lado, e às liberdades comunicativas, do outro, já se constituiu
um amplo conjunto de entendimentos doutrinários e jurisprudenciais. O grau de
incerteza normativa decorrente da operacionalização dos conceitos relacionados
aos princípios constitucionais e aos direitos fundamentais envolvidos no
exemplo do inciso X do art. 5o em face do art. 220, CF/1988, é bem menor.
Quanto a isso não haveria grandes contestações.
Ponham-se em evidência, todavia, alguns fatores – que poderiam ser
compartilhados com outras áreas do Direito – tais como: a) a perda de autonomia
epistemológica do Direito Privado, que se exterioriza por meio das contestações
(articuladas como discurso de combate) à diferenciação sistêmica (Direito
Público-Direito Privado); b) o neoconstitucionalismo como elemento
aglutinador de discursos que se unificam pela plurivocidade conceitual e por
uma agenda supostamente progressista; c) o idêntico desacordo semântico e
teórico sobre o que seja a constitucionalização do Direito Civil, que só é
superado, de igual modo, pela unidade de agenda de seus adeptos; d) o consenso
sobre a importação do modelo da eficácia imediata dos direitos fundamentais em
relação aos particulares; e) o parcial insucesso de se tentar conferir racionalidade
ao uso generalizado da ponderação nas decisões judiciais e nos trabalhos
acadêmicos; f) a contaminação da doutrina e da jurisprudência com o “mal de
Hedemann” no manuseio das cláusulas gerais; g) a narrativa retórica encontrável
em doutrina e jurisprudência, ao se identificar nesses “lugares da fala” a
recuperação dos legados malditos da Jurisprudência dos Interesses, da Escola do
Direito Livre e da Escola de Kiel; h) a transformação da “conspícua dignidade
humana” em um tropo retórico, esvaziando-a de sentido, utilidade prática e
credibilidade conceitual; i) um alastramento sistêmico das hipóteses de mutação
constitucional, que não encontra limites nem no texto expresso da Constituição.84
Antes de prosseguir, uma explicação e uma justificativa.
A explicação: o “mal de Hedemann” é uma alusão a Justus Wilhelm
Hedemann e a seu opúsculo A fuga para as cláusulas gerais: Um perigo para o
Direito e o Estado”.85 Nesse livro, encontram-se passagens que parecem ter sido
escritas nos dias de hoje. A boa-fé, a cláusula geral mais importante e famosa,
era definida como um ornamento das decisões judiciais e usá-la se convertera em
um “esporte da geração atual de juristas”.86 No Brasil, esse mesmo mal ou
patologia avança a ritmo tresloucado e não deixou de ser percebido por
observadores externos, como Jan-Peter Schmidt, para quem cláusulas gerais
como a boa-fé objetiva, a função social e o interesse público aparecem com
nítido papel retórico.87
A justificativa: em uma narrativa dos sucessos metodológicos do Direito
Civil nos últimos 200 anos não se poderia ignorar os nomes que construíram,
dentre outras, a Jurisprudência dos Interesses e a Escola do Direito Livre, como
Rudolf von Jhering, Phillip Heck e Hans Carl Nipperdey, além dos “catedráticos
socialistas”, particularmente Anton Menger von Wolfensgrün, para se limitar a
estes. Não foram ignorados, mas deixados de parte porque a crítica ao núcleo de
suas ideias conduziria a uma tese inteiramente nova. O enfraquecimento da
autonomia epistemológica do Direito Civil, em larga medida, teve suas origens
em alguns trabalhos desses autores, a despeito da grande e rica contribuição que
deram à civilística. Não será aqui o locus para se enfrentar esse tema, que é
central para a metodologia do Direito Civil.88
Diante de todos esses fatores, por mais objetiva, certa, coerente, íntegra e
tradicional que seja a interpretação de princípios constitucionais ou de direitos
fundamentais, relativamente ao Direito Civil, é muito provável que essa conexão
forme uma “tempestade hermenêutica perfeita”, com efeitos potencialmente
lesivos ao Direito Civil e a seu estatuto epistemológico.
Parafraseando o título de uma conhecida obra revolucionária do início do
século XX, diante de tudo isso, que fazer?89 A resposta “retomar os estudos
metodológicos do Direito Civil” é mais do que necessária na
contemporaneidade. Deve-se voltar a fazer perguntas como (i) o que é, (ii) para
que serve, (iii) quais os limites objetivos e materiais e (iv) como se organiza o
Direito Civil?90
Considera-se, entretanto, que a crise da autonomia epistemológica do
Direito Civil contemporâneo no Brasil, antes de serem (re)formuladas essas
questões nucleares da disciplina, carece de três definições fundamentais para ser
mitigada ou superada: (i) se permanece válida e operacional a dicotomia Direito
Público-Direito Privado; (ii) qual o conceito e o sentido da constitucionalização
do Direito Civil; (iii) como e em que medida as relações privadas se vinculam
aos direitos fundamentais.
§3. PLANO DO TRABALHO, DELIMITAÇÃO DO OBJETO E TESE

3.1. Plano do trabalho


A tese estrutura-se em três grandes partes, antecedidas de um capítulo
introdutório e de um capítulo de metodologia da pesquisa, seguidas das
Conclusões.
O método, a divisão das fontes, os aspectos formais e materiais da
metodologia da pesquisa e as opções feitas pelo autor quanto às notações
bibliográficas preenchem o contéudo do capítulo sobre Metodologia da Pesquisa.
Algumas precisões semânticas sobre o sentido de Direito Civil e Direito Privado
também se apresentam neste capítulo, ao lado da explicação terminológica sobre
a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
A Primeira Parte ocupa-se da “grande dicotomia”, expressão que se tornou
mundialmente famosa após o texto homônimo de Norberto Bobbio,91 e que se
ocupa da distinção sistêmica entre Direito Público e Direito Privado. Como
adequadamente anota Norberto Bobbio, a divisão interna das disciplinas e das
áreas do conhecimento é uma providência ordinária no “processo de ordenação e
organização do próprio campo de pesquisa”. Ele denomina esse processo de
grande dicotomia, no qual o adjetivo “grande” tem o sentido de “total”, “uma
vez que todos os entes, sem excluir nenhum, aos quais atual e potencialmente a
disciplina se refere devem poder nela se inserir”.92 E, na Teoria Geral do Direito,
“a distinção que se apresenta, mais marcadamente do que qualquer outra, com o
caráter de ‘grande dicotomia’ é a distinção entre direito privado e direito
público”.93
Nessa Primeira Parte figurarão parágrafos dedicados à evolução histórica
da “grande dicotomia”, ao sentido histórico-jurídico de expressões como
publicização e socialização do Direito Civil, aos avanços do Direito Civil sobre
novas áreas normativas e sua utilização para resolver problemas da sociedade da
era digital. Aproximações tradicionais sobre a “grande dicotomia”, como os
fundamentos romanísticos, as teorias explicativas da separação Direito Público-
Direito Privado e a posição da doutrina brasileira dos séculos XIX a XXI sobre a
autonomia do Direito Privado serão feitas em paralelo ao exame da privatização
ou civilização de áreas tradicionais e mais recentes do Direito, à evolução
legislativa nos diversos ramos do Direito Civil e ao modo como algumas
disciplinas publicísticas se colocam em face da “grande dicotomia”. O fecho
dessa parte dar-se-á com as objeções e os fundamentos para a manutenção da
separação do Direito Público e do Direito Privado.
A Segunda Parte ocupa-se do abrangente tema da constitucionalização do
Direito Civil. O impacto desse objeto (a constitucionalização do Direito Civil) na
doutrina nacional é apresentado em termos estatísticos, de modo a revelar a
desproporção entre sua importância e as atenções a ele dedicadas pela literatura
jurídica. A constitucionalização é também examinada no quadro dos
movimentos e escolas jurídicas contemporâneas, com especial tônica ao
neoconstitucionalismo, ao pós-positivismo e à crise do formalismo jurídico. O
coração da Segunda Parte é a delimitação conceitual do que é e do que não é
constitucionalização do Direito Civil. A raiz de vários dos problemas
relacionados à crise da autonomia epistemológica do Direito Civil
contemporâneo está na falta de acordo semântico a respeito da
constitucionalização dessa área nuclear do Direito Privado.
A Terceira Parte obedece à lógica da narrativa da tese: comprovada a
conservação e a utilidade da “grande dicotomia” e postos em termos adequados
o conceito de constitucionalização do Direito Civil, deve-se apreciar como e em
que medida os direitos fundamentais vinculam os particulares. Os dois grandes
modelos – eficácia direta e eficácia indireta – são examinados, com uma
introdução ao caso Lüth. Em todo o texto, serão oferecidas amplas referências
contextuais e histórico-jurídicas desse que é o julgado mais importante da
história do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha.
O capítulo das conclusões é sintético e tentará formular as principais
consequências da tese, sem repetição mecânica de todo o trabalho ou de partes
dele.
3.2. Delimitação do objeto
A tese estrutura-se, em todas as suas Partes, para identificar os limites do
sistema interno do Direito Privado, com referência específica ao Direito Civil. É,
porém, impossível construí-la sem considerar, de modo recorrente, uma série de
conceitos, categorias e figuras jurídicas transfronteiriços ou próprios de outras
áreas do Direito, particularmente aqueles submetidos ao Direito Público. A
delimitação objetiva da tese será referida em todas as suas Partes, de modo a se
evitar os custos argumentativos ou os riscos de se confundir restrições materiais
com omissões no exame de alguns tópicos.

3.3. Tese
A autonomia do Direito Civil, como disciplina com estatuto
epistemológico próprio, precisa resolver três problemas específicos, cada um
deles compreensivo da tese ora defendida:
(1) O problema da diferenciação sistêmica é clássico na Teoria Geral do
Direito, no Direito Romano e na Teoria Geral do Direito Privado, além de ser
objeto de especulações no Direito Público, de modo especial no Direito
Administrativo. Por ser um tema multissecular, há farta literatura sobre seus
desenvolvimentos históricos e dogmáticos. A tese aqui formulada (i) defende a
manutenção da autonomia e da diferenciação sistêmica do Direito Privado; (ii)
observa os fundamentos históricos, romanísticos, teóricos e normativos para
subsidiar essa diferenciação; (iii) sustenta a reformulação dos argumentos de
defesa da dicotomia com suporte no surgimento de novas situações existenciais,
novos Direitos e na ampliação dos espaços jusprivatísticos, superando-se os
argumentos preponderantes na doutrina do século XX (publicização,
socialização e constitucionalização) como hipóteses de compressão do Direito
Civil. O marco teórico utilizado para defesa desta tese é, de modo
preponderante, a obra de Franz Bydlinski.
(2) A constitucionalização do Direito Civil não é um tema clássico.
Remonta à segunda metade do século XX e foi incorporada como objeto
epistemológico do Direito Constitucional. No Brasil, ela assumiu uma feição
particular, dado que se tornou um objeto predominantemente civilístico. A tese
aqui defendida consiste em oferecer uma delimitação semântica sobre a
constitucionalização do Direito Civil, por meio de critérios de exclusão e de
delimitação. Pelos critérios de exclusão, eliminam-se acepções que
correspondem a fenômenos, procedimentos e modos de interpretação do Direito
Civil em conformidade ao texto constitucional, por serem óbvios, triviais ou
elementares, insusceptíveis de conformarem um novo conceito ou um conceito
autônomo de constitucionalização. Pelos critérios de delimitação, utilizando-se
premissas desenvolvidas por Louis Favoreu, Robert Alexy, Gunnar Folke
Schuppert e Christian Bumke, e Virgílio Afonso da Silva, apresentam-se
acepções que se podem reputar de adequadas para o conceito de
constitucionalização do Direito Civil. A despeito do recurso a esses autores, a
formulação da tese guarda contornos de originalidade em alguns pontos.
(3) Admitida a supervivência da autonomia sistêmica e epistêmica do
Direito Privado e, por efeito, do Direito Civil, passou-se à delimitação conceitual
da constitucionalização dessa área. Identificou-se, porém, na eficácia dos direitos
fundamentais em relação aos particulares o principal obstáculo ao
preenchimento do conteúdo de uma das acepções da constitucionalização e
também sua metafórica posição como “cavalo de troia” para a distinção
sistemática. A tese, após analisar os dois mais importantes modelos de eficácia
dos direitos fundamentais, toma posição pelo modelo fraco da eficácia indireta,
uma variante do modelo forte, desenvolvido originalmente por Günter Dürig.
Considera-se que esse modelo é o melhor dotado de ferramentas para preservar a
autonomia do Direito Civil.

7 HAGER, Günter. Von der Konstitutionalisierung des Zivilrechts zur Zivilisierung der Konstitu-
tionalisierung. JuS: Juristische Schulung, no 9, p. 769775, 2006. Item I.
8 MOTULSKY, Henri. Direito Privado: Hermenêutica e realização metódica: A teoria dos elementos
geradores dos direitos subjetivos. Reedição apresentada por MarieAnne FrisonRoche. Tradução de
Márcia Atálla Pietroluongo. Revisão técnica de Francisco Bilac Moreira Pinto Filho. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2014. p. 30 ss; WARDE JÚNIOR, Walfrido Jorge. Tratado de Direito Empresarial.
Coordenação de Modesto Carvalhosa. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 29; TORRES,
Heleno Taveira. Direito Constitucional Tributário e segurança jurídica: Metódica da segurança jurídica
do sistema constitucional tributário. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
p. 6166; ADEODATO, João Mauricio Leitão. Retórica como metódica para estudo do Direito.
Sequência: Revista do Curso de Pósgraduação em Direito da UFSC, v. 27, no 56, p. 5582, jun. 2008.
9 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht. Heidelberg: Müller, 1988. p. 1012.
10 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 11.
11 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 12.
12 O caso Lüth, considerado o mais importante da história do Tribunal Constitucional Federal ale mão,
referese a uma reclamação constitucional formulada por Erich Lüth em face de decisão da justiça
ordinária que lhe impôs preceito cominatório para se abster de incitar boicote a um filme dirigido
pelo cineasta Veit Harlan, que havia sido uma das estrelas do cinema nazista. A relevância desse
julgamento para o Direito Civil está no reconhecimento da eficácia dos direitos fundamen tais em
relação aos particulares e não somente na relação entre os cidadãos e o Estado.
13 HAGER, Günter. Von der Konstitutionalisierung des Zivilrechts zur Zivilisierung der Konstitutio-
nalisierung...Item I.
14 São necessários dois esclarecimentos quanto ao nome de Friedrich Carl Freiherr von Savigny. Nas
edições do século XIX, a grafia de seu segundo prenome é Carl, com a letra “c”. É comum, todavia,
encontrarse a grafia com “k”, Karl. No portal da Universidade Humboldt de Berlim, sucessora da
instituição que ele ajudou a fundar, seu nome aparece grafado desse modo, que é mais moderno do
que Carl. Nesta tese, optouse pelo uso do prenome Carl, seguindose a grafia do século XIX. O
segundo esclarecimento diz respeito a Freiherr, traduzível para a língua portuguesa como “barão”.
Esse nome não é um apelido de família, mas o designativo de um título de nobreza. Com a abolição
da monarquia na Alemanha, os títulos nobiliárquicos incorporaramse ao nome de seus portado res,
ao contrário do que ocorreu com a Áustria, após o fim da monarquia dual, que proibiu o uso de
designativos de nobreza. Mantevese o Freiherr em atenção às normas vigentes na Alemanha.
15 Destacando a relevância de Savigny para a formação da moderna dogmática do Direito Privado:
SOLON, Ari Marcelo. Dever jurídico e teoria realista do direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
2000. p. 44. Para Ari Marcelo Solon (Dever jurídico e teoria realista do direito...p. 44), apesar de portavoz
da Escola Histórica, cujo programa apresentava “uma reação contra o direito natural, no sistema de
Savigny encontramse espelhados os ideais filosóficos do seu tempo de conteúdo jusnaturalístico”.
16 Como Privatdozent, a princípio.
17 WIEACKER, Franz. Privatrechtsgeschichte der Neuzeit: Unter besonderer Berücksichtigung der
deutschen Entwicklung. 2. ed. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1967. p. 232.
18 WIEACKER, Franz. Privatrechtsgeschichte der Neuzeit...p. 233.
19 Friedrich Carl Freiherr von Savigny (17791861) é um dos juristas com a vida e a obra mais do-
cumentadas e divulgadas no mundo até hoje. Além de líder da Escola Histórica, grãochanceler e
secretário de Negócios Estrangeiros do Reino da Prússia, professor e reitor da Universidade de Berlim,
ele foi o mentor de uma geração de brilhantes professores de Direito, como Bernhard Windscheid e
Georg Friedrich Puchta (17981846).
20 Franz Wieacker foi um dos grandes responsáveis por transformar Savigny em um ícone do reacio-
narismo jurídico e político, a figura representativa do aristocrata do Antigo Regime. Os estudos
contemporâneos de História do Direito Privado desmentem essa visão: “É, sem dúvida, importan te
ressaltar que seria errôneo querer imputar ao autor atributos políticos correntes nos dias atuais como
‘socialista‘, ‘conservador‘ ou ‘liberal‘. Ressaltase corretamente que tais categorias surgi ram apenas na
primeira metade do século XIX. Ademais, sabese também que Savigny manteve contato com
defensores da Revolução Francesa. Entendêlo exclusivamente como ‘reacionário’ seria, de fato,
incorreto” (HERZOG, Benjamin. A recepção da metodologia de Savigny no Brasil e em Portugal.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. Tradução de João Carlos Mettlach. Revisão e notas de Otavio
Luiz Rodrigues Jr. v. 7, ano 3, p. 277292, abr.jun. 2016. p. 280).
21 SAVIGNY, Friedrich Karl von. Metodologia jurídica. Tradução de J. J. SantaPinter. Buenos Aires:
Depalma, 1979.
22 SAVIGNY, Friedrich Karl von. Metodologia jurídica. Tradução de Hebe A. M. Caletti Marenco. Campinas:
Edicamp, 2001.
23 Sobre esse curioso dualismo entre o Direito Romano e a atualidade do Sistema de Savigny: SORDI,
Bernardo. Verso la grande dicotomia: Il percorso italiano. In. BENACCHIO, Gian Antonio; GRAZIADEI,
Michele (Orgs.). Il declino della distinzione tra Diritto Pubblico e Diritto Privato: Atti del IV Congresso
Nazionale SIRD, Trento, 2426 settembre 2015. Trento: Università degli Studi di Trento, 2016. p. 17.
24 Essa divisão entre os Germanisten e os Romanisten era tão profunda que eles se reuniam em con-
gressos diferentes e publicavam em periódicos separados ou em seções diversas de uma mesma
revista Os germanistas “estudavam o germânico Volksrechte e os costumes medievais alemães”, ao
passo em que os romanistas se dedicavam ao Corpus Iuris e às escolas que se especializaram no
exame dessas fontes na Europa medieval e moderna. No entanto, mais do que um debate
acadêmico, esses dois grupos representavam visões diferentes sobre o passado e o futuro po lítico da
Alemanha. Exemplo disso estava na associação entre o romanismo e uma visão antis social do
Direito, enquanto o germanismo expressaria um sentimento de união e comunidade, anti-
individualista, socialmente comprometido e mais afeito às tradições genuínas da Alemanha. Gierke,
nessa chave, era “o portavoz por excelência do campo germanista” (CAENEGEM, R. C. van. European
law in the past and the future: Unity and diversity over two millennia. Cambridge: Cambridge
University Press, 2003. p. 9293 e 95, os trechos entre aspas foram retirados dessas páginas). A gênese
do pensamento germanista está nas lições do professor de Otto von Gierke na Universidade de
Berlim, Georg Beseler, que escreveu o livro Volksrecht und Juristenrecht, de 1843, época na qual se
iniciava a reação ao pensamento de Savigny nos meios universitários alemães. Muitas das teses do
grupo dos germanistas, assim como várias outras deste período, voltariam a ser brandidas no período
hitlerista, a ponto de os nazistas defenderem oficialmente a extinção das cátedras de Direito Romano
das universidades alemãs.
25 “Primeiramente, traçar e estabelecer, no corpo de todo o nosso Direito, o que possui origem romana,
de modo a não sermos inconscientemente dominados por ele. Mas, então, nossa abor dagem visa a
eliminar, dentre todos os elementos romanos de nossa formação intelectual, aquilo que evanesceu
(...)” (SAVIGNY, Friedrich Carl von. System des heutigen Römischen Rechts. Berlin: Veit und Comp., 1840,
v. I. p. 15). Na abertura de seu System, ele esclarece que seriam excluídos de sua obra: em primeiro
lugar, a história em si dos institutos; em segundo lugar, as disposições do Direito anterior ao dos
tempos do imperador Justiniano; e em terceiro lugar, os institutos que, pertencendo embora ao
direito justinianeu, tenham desparecido no atual (SAVIGNY, Friedrich Carl von. System des heutigen
Römischen Rechts...p. 12).
26 REIS, Thiago. Direito e método na teoria possessória de Savigny. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
2013. p. 14.
27 WINDSCHEID, Bernhard. Lehrbuch des Pandektenrechts. 5. ed. Stuttgart: Ebner & Seubert, 1879. t. 1.
28 No primeiro tomo do Direito das Pandectas, há um capítulo específico sobre a interpretação e o tra-
tamento científico do Direito (Auslegung und wissenschaftliche Behandlung des Rechts). Após forne cer
o conceito de interpretação (§ 20), e analisar os métodos gramatical e lógico (§ 21), Windscheid
estuda as lacunas e as contradições no texto jurídico (§ 23). Na sequência, apresenta sua visão sobre
o tratamento científico do Direito (§ 24), que se serve dos elementos básicos fornecidos pela in-
terpretação para desenvolver, então, os conceitos presentes nas normas (p. 6364). Afirma que a
Ciência do Direito (a Pandectística) decompôs os conceitos, sendo este seu grande mérito, porque
dessa análise exaustiva depende a plena compreensão do Direito, bem como a segurança de sua
aplicação (WINDSCHEID, Bernhard. Lehrbuch des Pandektenrechts...t. 1, p. 64).
29 Reinhard Zimmermann demonstra a importância de Windscheid e sua ligação com Savigny: “E
mesmo Bernhard Windscheid, a encarnação da doutrina pandectista na segunda metade do século
XIX (‘Doutrina jurídica significa pandectismo, e pandectismo significa Windscheid’) não apenas
encarava a si mesmo como um servo, mas também como um mestre dos conceitos” (ZIMMERMANN,
Reinhard. The New German Law of Obligations: Historical and Comparative Perspectives. Oxford: Oxford
University Press, 2006. p. 8).
30 BERCOVICI, Gilberto. Die dirigierende Verfassung und die Krise der Verfassungslehre am Beispiel
Brasiliens. Verfassung und Recht in Übersee-VRÜ, v. 37, p. 286330, 2004. p. 290. Em sentido aproximado
sobre a “tradução” de institutos de Direito Privado para o Direito Público: “Assim, é preciso entender
quais são as origens da Teoria Geral do Direito Público: é uma disciplina que sur ge na passagem do
constitucionalismo clássico liberal para o constitucionalismo social” (CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo
Andrade. Contribuições para uma teoria crítica da Constituição. Belo Horizonte: Arraes, 2017. p. 80).
31 SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da contribuição do Código Civil para o Direito Administrativo. Revista de
Direito Administrativo, v. 78, p. 125, 1964. p. 1, 6 e 24; CIRNE LIMA, Ruy. O Código Civil e o Direito
Administrativo. Revista Jurídica, v. 8, no 44, p. 515, mar./abr. 1960. p. 9.
32 HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: O breve século XX (19141991). Tradução de Marcos Santarrita.
Revisão técnica de Maria Célia Paoli. 2. ed. 9. reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. p.
7 (prefácio, onde o autor situa a extensão do século entre 1914 e o fim da era soviética).
33 “De entre esses autores, Franz Wieacker e Karl Larenz são particularmente relevantes, dada sua
enorme influência no pensamento jurídico brasileiro da segunda metade do século XX e até aos dias
de hoje. Suas obraschave foram escritas nos anos de 19501970 e, como afirma Joachim Rückert,
conseguiram retratar o BGB de uma maneira bastante negativa. Ocorre, porém, que mui tas das
críticas ao BGB, identificáveis nas obras desses dois autores, refletem concepções dos anos 1940 ou
mesmo anteriores, o que implicaria a recepção de ideias ultrapassadas, mesmo em 1950, e de
conteúdo nacionalsocialista. Sobre esse último ponto, nem seria de se estranhar, dado o
comprometimento de amplos setores da universidade e da magistratura alemãs com o nazismo,
como os membros da Escola de Kiel (Kieler Rechtsschule), um dos mais radicais centros da ‘renovação
jurídica’ promovida pelo regime hitlerista. Karl Larenz ocupou a cátedra de Gerhart Husserl, que foi
destituído da Universidade de Kiel por ser judeu. Essas ligações implicaram seu temporário
afastamento da cátedra universitária no pósguerra” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB
e da doutrina alemã no Direito Civil brasileiro do século XX...p. 102).
34 LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. Tradução de José Lamego. 4. ed. Lisboa: Calouste
Gulbenkian, 2005 (traduzida a partir da sexta edição reformulada de Methodenlehre der
Rechtswissenschaft, de 1991).
35 A “entrada” das cláusulas gerais como conceito operacional na doutrina brasileira tem como marco a
obra de Clóvis Verissimo do Couto e Silva (A obrigação como processo. São Paulo: J. Bushatsky, 1976,
embora a edição original seja de 1964), com o concurso de seu discípu lo Ruy Rosado de Aguiar
Junior, em sua atuação tanto no TJRS (Jurisprudência TJRS, 1997, v. 2, t11, p. 1116, RJTJRS, 133/401;
Jurisprudência TJRS, 1994, v1, t23, p. 2435, RJTJRS 154/378; Jurisprudência TJRS, 1989, v1, t17, p. 231-
237, RJTJRS 145/320) quanto no STJ (STJ. EREsp 125.859/RJ, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Segunda
Seção, j. 26/06/2002, DJ 24/03/2003, p. 136; STJ. REsp 95.539/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar,
Quarta Turma, j. 03/09/1996, DJ 14/10/1996, p. 39015). Embora por via autônoma, com influências de
Emilio Betti, Menezes Cordeiro e da dog mática francesa, Antonio Junqueira de Azevedo foi outro
grande responsável pela introdução do tema no país (cf. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. A boafé
na formação dos contratos. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 87, p. 7990,
jan./dez. 1992). António Menezes Cordeiro (Da boa fé no Direito Civil. 2. reimp. Coimbra: Almedina,
2001), ainda que seja um autor português, merece créditos especiais tanto pela “entrada” quanto
pela divulgação da boafé no Brasil. A circunstância de sua obra ter sido escrita em vernáculo foi
decisiva para tal efei to, o que também se deve a seu conteúdo excepcional, que a põe entre os mais
importantes livros sobre boafé no mundo ocidental. Isso se comprova pelo número de citações a
Menezes Cordeiro na doutrina alemã, reconhecidamente pouco aberta ao uso de fontes estrangeiras.
36 DIEDERICHSEN, Uwe. Karl Larenz. NJW, p. 902903, 1993. p. 903.
37 LARENZ, Karl. Allgemeiner Teil des bürgerlichen Rechts. 9. ed. revisada e ampliada por Manfred Wolf.
München: C. H. Beck, 2004. p. 2122.
38 Sobre a recepção da doutrina de Karl Larenz no Brasil, com um importante viés crítico, acen tuando
inclusive que parte das ideias desse autor (ou o modo como foram aqui compreendidas) poderiam
ser atribuídas já à Pandectística: HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal
und Brasilien Eine rechtsvergleichende Untersuchung aus genetischer, funk tionaler und
postmoderner Perspektive Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering. Tübingen:
Mohr Siebeck, 2014. p. 673675.
39 Tanto Larenz quanto Wieacker foram expoentes da famigerada Escola de Kiel, “um dos mais radicais
centros da ‘renovação jurídica’ promovida pelo regime hitlerista” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A
influência do BGB e da doutrina alemã no Direito Civil brasileiro do século XX... p. 102103).
40 É um conceito que começa a ser desenvolvido no Brasil, de modo original, por Walfrido Jorge Warde
Júnior (Tratado de Direito Empresarial...p. 29) em um esforço de renovação epistemológi ca, assim
definível: “A metadogmática transcende a dogmática na sua objetividade, referindose, contudo, a
categorias e conceitos dogmáticos. O termo é empregado, no contexto de uma metó dica (teoria do
método), para designar um produto da interpretação (possivelmente para fins de atualização do
direito), que expresse uma visão externa do fenômeno jurídico, às vezes voltada à aplicação da
norma, mas sempre dedicada a uma reflexão que confronta fatores exógenos aos dogmáticos.
Qualquer rearranjo programático (do âmbito, das funções ou das técnicas) de uma disciplina jurídica,
que produza um resultado dogmático, pressupõe um diálogo entre Política do Direito e dogmática,
que é próprio da metadogmática”.
41 A primeira edição tem a seguinte referência: WIEACKER, Franz. Privatrechtsgeschichte der Neuzeit:
unter besonderer Berücksichtigung der deutschen Entwicklung. Göttingen: Vandenhoeck &
Ruprecht, 1952. A segunda edição (WIEACKER, Franz. Privatrechtsgeschichte der Neuzeit: Unter
besonderer Berücksichtigung der deutschen Entwicklung. 2a ed. Göttingen: Vandenhoeck &
Ruprecht, 1967) foi vertida para o português por António Manuel Botelho Hespanha: WIEACKER,
Franz. História do direito privado moderno. Tradução de A. M. Botelho Hespanha. Lisboa: Calouste
Gulbenkian, 1980.
42 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB e da doutrina alemã no Direito Civil brasilei ro do
século XX...p. 105. Em sentido idêntico: RÜCKERT, Joachim. Das Bürgerliche Gesetzbuch – ein
Gesetzbuch ohne Chance? JuristenzeitungJZ, ano 58, fasc. 15 16, p. 749 760, ago. 2003. p. 750.
43 As obras são: Esclarecimentos jurídico-teóricos sobre o § 242 do BGB, publicado em “Kleine juristische
Schriften” (1988); “Teoria do Direito e da produção do Direito” (1983); Das Sozialmodell der klassischen
Privatrechtsgesetzbücher und die Entwicklung der modernen Gesellschaft (1953), e Industriegesellschaft
und Privatrechtsordnung (1975), conforme anotado em: BEHRENDS, Okko. Franz Wieacker. NJW, p.
17131714, 1994. p. 1714.
44 ZIMMERMANN, Reinhard. Juristische Bücher des Jahres – Eine Leseempfehlung. NJW, p. 3332 3338,
2007. p. 33343335.
45 ESSER, Josef. Grundsatz und Norm in der richterlichen Rechtsfortbildung des Privatrechts. Tübingen:
Mohr, 1956.
46 ESSER, Josef. Grundsatz und Norm in der richterlichen Rechtsfortbildung des Privatrechts...p. 1 e p. 50 ss.
47 ESSER, Josef. Grundsatz und Norm in der richterlichen Rechtsfortbildung des Privatrechts...p. 337.
48 CANARIS, ClausWilhelm. Franz Bydlinski zum 70. Geburtstag. NJW, p. 3530, 2001. p. 3530.
49 BYDLINSKI, Franz. Juristische Methodenlehre und Rechtsbegriff. Vienna, New York: Springer, 1982.
50 CANARIS, ClausWilhelm. Franz Bydlinski zum 70. Geburtstag. NJW... cit. p. 3530. A referência da obra é
a seguinte: BYDLINSKI, Franz. System und Prinzipien des Privatrechts. Vienna, New York: Springer, 1996.
51 GRIGOLEIT, Hans Christoph; HAGER, Johannes; HELDRICH, Andreas; HEY, Felix Christopher; KOLLER,
Ingo; LANGENBUCHER, Katja; NEUNER, Jörg; PETERSEN, Jens; PRÖLSS, Jürgen; SINGER, Reinhard.
ClausWilhelm Canaris zum 70. Geburtstag. NJW, p. 20252026, 2007. p. 2025.
52 A tradução para a língua portuguesa é de António Menezes Cordeiro: CANARIS, ClausWilhelm.
Pensamento sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito. Introdução e tradução de A.
Menezes Cordeiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. A versão original alemã é esta:
CANARIS, ClausWilhelm. Systemdenken und Systembegriff in der Jurisprudenz: entwickelt am Beispiel des
deutschen Privatrechts. Berlin: Duncker & Humblot, 1983.
53 Sobre a tópica viehwegiana: HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und
Brasilien Eine rechtsvergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmo derner
Perspektive Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering... § 21, item 4.
54 MENEZES CORDEIRO, António. Introdução à edição portuguesa. In. CANARIS, ClausWilhelm.
Pensamento sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito...p. XLVIIXLVIII.
Originalmente, foi publicado como um artigo (CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und Priva trecht.
55
Archiv für die civilistische Praxis-AcP. v. 184, fascículo 3, p. 202246, 1984). Posteriormente, com
alterações, saiu como uma pequena monografia (CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und
Privatrecht: eine Zwischenbilanz. Berlin: New York: Walter de Gruyter, 1999), cuja tradução para a
língua portuguesa foi publicada em 2003 (CANARIS, ClausWilhelm. Direitos fundamentais e direito
privado. Tradução de Ingo Wolfgang Sarlet e Paulo Mota Pinto. 2. reimpr. da edição de julho de 2003.
Coimbra: Almedina, 2009).
56 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl (Ed.). Festschrift für Erich
Molitor zum 75. Geburtstag. München, Berlin: C. H. Beck, 1962. p. 1733. Com análise da po sição de
Nipperdey – pioneiro na defesa da aplicação direta dos direitos fundamentais às relações
particulares: SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: Os direitos fundamentais nas
relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 8791.
57 LARENZ, Karl. Allgemeiner Teil des bürgerlichen Rechts...p. 8890.
58 DIEDERICHSEN, Uwe. Das Bundesverfassungsgericht als oberstes Zivilgericht: ein Lehrstück der
juristi schen Methodenlehre. Archiv für die civilistische Praxis-AcP. v. 192, fascículos 12, p. 171260, 1992.
59 DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner
Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung: Festschrift zum 75. Geburtstag von Hans Nawiasky.
München: Isar, 1956. p. 157190.
60 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...cit.
61 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte. 5. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1996.
62 SCHWABE, Jürgen. Die sogenannte Drittwirkung der Grundrechte: zur Einwirkung der Grundrechte auf
den Privatrechtsverkehr. München: W. Goldmann, 1971.
63 SCHLINK, Bernhard. Freiheit durch Eingriffsabwehr. Rekonstruktion der klassischen Grundre-
chtsfunktion. Europäische Grundrechte-Zeitschrift – EuGRZ, no 17, p. 457468, 1984.
64 STARCK, Christian. Derechos fundamentales y Derecho Privado. Tradução de María J. Roca. Revista
Española de Derecho Constitucional, ano 22, no 66, p. 6590, 2002.
65 LADEUR, KarlHeinz. Kritik der Abwägung in der Grundrechtsdogmatik: Plädoyer für eine Erneuerung der
liberalen Grundrechtstheorie. Tübingen: Mohr, 2004. p. 5870.
66 MOITINHO DE ALMEIDA, José Carlos de Carvalho. L’interprétation par la Cour de justice de l’Union du
droit européen de procédure civile. In. BRADLEY, Kieran; TRAVERS, Noel; WHELAN, Anthony (Eds.). Of
Courts and Constitutions: Liber Amicorum in honour of Nial Fennelly. Oxford e Portland: Hart
Publishing, 2014. p. 1331. cit. p. 2426.
67 Neste sentido: ODUDU, Okeoghene. The public/private distinction in EU internal market law. Revue
Trimestrielle de Droit Europeeen, v. 46, no 4, p. 826841, dec. 2010. Item 3.
68 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Do príncipe Bismarck à princesa Caroline de Mônaco: vida pri vada de
pessoas célebres e as liberdades comunicativas no Direito Civil. In. CASSETTARI, Christiano (Coord.).
10 anos de vigência do Código Civil brasileiro de 2002: Estudos em ho menagem ao professor Carlos
Alberto Dabus Maluf. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 111125. cit. p. 117118. Cf. também STARCK,
Christian. Das CarolineUrteil des Europäischen Gerichtshofs für Menschenrechte und seine
rechtlichen Konsequenzen. Juristen Zeitung (JZ), v. 2, p. 7681, 2006 (com uma análise das decisões do
caso e sobre sua repercussão no âmbito internacional e constitucional).
69 TEUBNER, Gunther. A eficácia horizontal dos direitos fundamentais transnacionais. Tradução de
Raphael de Carvalho Vasconcelos. In. ASENSI, Felipe Dutra; PAULA, Daniel Giotti de (Coords.). Tratado
de direito constitucional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014, v. 2, p. 466490.
70 TEUBNER, Gunther. Recht als autopoietisches System. Frankfurt: Suhrkamp, 1989. Há tradução para a
língua portuguesa: TEUBNER, Gunther. O Direito como sistema autopoiético. Tradução e prefácio de
José Engracia Antunes. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1993.
71 NUNES, José Engrácia. Prefácio. In. TEUBNER, Gunther. O Direito como sistema autopoiético... p. III.
72 Cf. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. A arbitragem e o Direito do Consumidor...p. 268; JUNQUEIRA
DE AZEVEDO, Antonio. O Direito, ontem e hoje: crítica ao neopositivismo constitu cional e
insuficiência dos direitos humanos. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v.
102, p. 579590, jan./dez. 2007, cit. p. 587586; JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Crítica ao
personalismo ético da Constituição da República e do Código Civil. Em favor de uma ética
biocêntrica. Revista Trimestral de Direito Civil – RTDC, v. 35, p. 2941, jul./set. 2008. passim, mas esp. p.
3133.
73 TEUBNER, Gunther. Fragmentos constitucionais: Constitucionalismo social na globalização.
Coordenação de Marcelo Beves e Rodrigo Mendes. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 240 ss.
74 Citamse algumas: MOSCO, Luigi. Scienza giuridica e metodologia giuridica. Napoli: Jovene, 1954;
VICENTI, Umberto. Lezioni di metodologia della scienza giuridica. Padova: CEDAM, 1997; HERNANDEZ
GIL, Antonio. Metodologia de la Ciencia del Derecho. Madrid: EspasaCalpe, 1988; MOZOS, Jose Luis de
los. Metodologia y Ciencia en el Derecho Privado moderno. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1977;
BERGEL, JeanLouis. Méthodologie juridique. Paris: Presses Universitaires de France, 2001; PONTES DE
MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do Direito. 2. ed. Rio de Janeiro, Borsoi,
1972 (edição em 4 tomos); PERLINGIERI, Pietro. Tendenze e metodi dela civilistica italiana. Napoli:
Edizioni Scientifiche Italiane, 1989.
75 A preocupação é tanta, especialmente em França, que os Archives de Philosophie du Droit, de 2001,
dedicaram um tomo especial (no 45) para a americanização do Direito. Nesse tomo, há capítulos
dedicados a diversos aspectos da americanização, como: a) perspectivas antro pológicas da
americanização do Direito Europeu (p. 4359); b) a americanização do Direito Constitucional (p. 7787);
c) a influência americana na Justiça e nas instituições judiciárias fran cesas (p. 88115 e p. 117135); d) a
“MacDonaldização do discurso judiciário francês” (p. 137 148); e) a americanização do Direito Penal,
do Direito Financeiro e da Responsabilidade Civil (p. 149157); f) a americanização do Direito francês
pelo viés econômico, dentre outros (TERRÉ, François. L’américanisation du Droit. Paris: DallozSirey,
2001). Na doutrina brasileira, esse tema não é ignorado. Há quem reconheça haver contestações a
esses avanços do Direito de ma triz norteamericana, como Luís Roberto Barroso (A americanização do
Direito Constitucional e seus paradoxos: teoria e jurisprudência constitucional no mundo
conteporâneo. Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais, no 9, p. 258301, 2008. p. 260 e
301): “Os ataques vêm da direita, com sua agenda conservadora, que defende – mas nem sempre
pratica a auto contenção judicial; e da esquerda, com sua crítica à supremacia judicial e sua defesa do
constitu cionalismo popular” (p. 260). O autor adota uma posição moderada em relação a esse
fenômeno, defendendo que o modelo americano precisa ser aplicado a países de democratização
tardia, onde “o processo político majoritário não consegue satisfazer plenamente as demandas por
legitimi dade democrática, em razão de distorções históricas na distribuição de poder e de riquezas”
(p. 301). Termina por defender uma “atuação equilibrada e independente dos tribunais constitucio-
nais”, contra o que chama de “vocação autoritária do Executivo” e “baixa representatividade do
Legislativo” (p. 301). A despeito da seriedade desse autor, acreditase que a dificuldade na manu-
tenção desse modelo americanizado esteja justamente em atingir um ponto de equilíbrio, ponto este
cuja existência (no Brasil, pelo menos) é gravemente contestada pela demonstração empírica.
76 STOLLEIS, Michael. Judicial review, administrative review, and constitutional review in the Weimar
Republic. Ratio Juris. v. 16, no 2, p. 266280, jun. 2003. p. 278.
77 STOLLEIS, Michael. Judicial review, administrative review, and constitutional review in the Weimar
Republic…p. 278279.
78 Sobre essa distinção, consultese: ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplica ção dos
princípios jurídicos. 15. ed. rev., atual. e. ampl. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 102116. Para uma
importante opinião a respeito da segmentação teórica entre princípios e regras (in clusive com
apontamentos críticos sobre a recepção das ideias de Ronald Dworkin): LOPES, José Reinaldo de
Lima. Juízo jurídico e a falsa solução dos princípios e das regras. Revista de Informação Legislativa, v.
40, no 160, p. 4964, out./dez. 2003.
79 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito...p. 2937.
80 “A sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do
cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do ‘de cujus’”
(art. 5o, inciso XXXI, CF/1988).
81 “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (art. 5º, inciso X, CF/1988).
82 “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma,
processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” (art.
220, caput, CF/1988).
83
STF. ADI 4815, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, j. 1062015, DJe018 1o22016 caso das biografias;
STF. ADPF 130, rel. Min. Carlos Britto, Tribunal Pleno, j. 3042009, DJe208 6112009, RTJ 2131/20 – caso
da Lei de Imprensa.
84 Tropo retórico é expressão de João Baptista Villela (Variações impopulares sobre a dignidade da
pessoa humana. In. AA.VV. Superior Tribunal de Justiça: Doutrina. Edição comemorativa, 20 anos,
Distrito Federal, 2009. p. 559581).
85 HEDEMANN, Justus Wilhelm. Die Flucht in die Generalklauseln: Eine Gefahr für Staat und Recht,
Tübingen: J. C. B. Mohr, 1933.
86 No original: “zum Sport der heutigen Juristengeneration geworden” (HEDEMANN, Justus Wilhelm. Die
Flucht in die Generalklauseln…p. 64).
87 SCHMIDT, Jan Peter. Zivilrechtskodifikation in Brasilien. Strukturfragen und Regelungsprobleme in
historischvergleichender Perspektive. (Schriften zum ausländischen und internationalen Privatrecht,
v. 226), Tübingen, Mohr Siebeck, 2009. p. 451.
88 Essa crítica começa a ser formulada em trabalhos como: HERZOG, Benjamin. Anwendung und
Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien Eine rechtsvergleichende Untersuchung aus ge-
netischer, funktionaler und postmoderner Perspektive Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und
weniger Jhering...cit; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB e da doutrina alemã no Direito
Civil brasileiro do século XX...cit; STRECK, Lenio Luiz. As várias faces da discricionariedade no Direito
Civil brasileiro: O “reaparecimento” do movimento do Direito Livre em terrae brasilis. Revista de Direito
Civil Contemporâneo, v. 8, p. 3748, jul./set. 2016.
89 LENIN, Vladimir. Que fazer?: Problemas candentes do nosso movimento. Tradução de Marcelo Braz.
São Paulo: Expressão Popular, 2010.
90 Em certa medida, essas perguntas são formuladas e respondidas por António Menezes Cordeiro no
primeiro volume de seu Tratado de Direito Civil (MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil
português...v. 1, t. 1), a última (ou a mais recente?) grande obra em língua portuguesa (e,
provavelmente, não apenas em língua portuguesa) de natureza omnicompreensiva do Direito Civil e
que o considera como unidade epistêmica dotada de estatuto próprio. Embora voltada para um
escopo menos abrangente, identificase essa preocupação com questões de fundo epistemo lógico
também nesta obra: NERY, Rosa Maria de Andrade. Introdução ao pensamento jurídico e à Teoria Geral
do Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
91 BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade: para uma Teoria Geral da Política. Tradução de Marco
Aurélio Nogueira. 1. ed., 18. reimpr. São Paulo: Paz e Terra, 2012. p. 139158.
92 BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade...p. 139.
93 BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade...p. 143.
METODOLOGIA DA PESQUISA

SUMÁRIO. § 4. Plano do capítulo. § 5. Aspectos materiais e objetivos da


pesquisa. 5.1. Método. 5.2. Delimitações termi nológicas: Direito Civil e
Direito Privado. 5.3. Delimitações ter minológicas: “Distinção sistemática”
e “grande dicotomia”. 5.4. Delimitações terminológicas: eficácia dos
direitos fundamen tais em relação aos particulares, eficácia em face de
terceiros e Drittwirkung. § 6. Aspectos formais da pesquisa. 6.1. Uso de
idiomas estrangeiros e regras ortográficas intertemporais. 6.2.
Transcrições, notações e referências bibliográficas. 6.3. Acesso às fontes:
bibliotecas e portais. 6.4. Citação de fontes jurisprudenciais. 6.5. Fontes
legislativas.
§4. PLANO DO CAPÍTULO
Neste capítulo, pretende-se apresentar alguns tópicos sobre a metodologia
da pesquisa. Em geral, nas dissertações e teses desenvolvidas em Ciências
Humanas e Ciências Sociais Aplicadas, este conteúdo está limitado a uma
pequena seção ou disperso na Introdução. À semelhança de trabalhos das
Ciências Econômicas e Exatas, optou-se por expor a metodologia
autonomamente. A escolha justifica-se pelas dimensões que terminou por
assumir e pela independência temática em relação ao capítulo introdutório.
O capítulo divide-se em duas partes: (i) aspectos materiais e objetivos da
pesquisa; (ii) aspectos formais.
A leitura deste capítulo é autônoma em relação às demais partes da tese,
embora seja recomendável sua consulta na sequência regular do texto para que
se esclareçam algumas dúvidas sobre as escolhas metodológicas do autor.
§5. ASPECTOS MATERIAIS E OBJETIVOS DA PESQUISA

5.1. Método
Na maior parte da tese, seguiu-se o método dedutivo. A pesquisa foi
preponderantemente baseada em revisão de literatura, que compreendeu
publicações nas línguas portuguesa, espanhola, francesa, italiana, inglesa, alemã
e em latim. Quando disponíveis, foram cotejados os originais com traduções da
obra em outros idiomas. Os fragmentos em latim, referidos na tese, extraíram-se
de livros de Direito Romano. Salvo termos de conhecimento vulgar, o autor, que
não domina o latim, valeu-se de paráfrases ou de traduções para línguas
modernas oferecidas nas próprias fontes bibliográficas citadas, conferindo-se o
crédito ao responsável.94
Este trabalho não é histórico nem possui pretensões historiográficas. Não
se fez uso de quaisquer dos métodos próprios da História, como aqueles
desenvolvidos pelas escolas metódico-positivista, marxiana e dos Annales.
Apesar disso, recorreu-se frequentemente a informações e dados históricos, a sua
grande maioria extraídos de fontes secundárias. Evitou-se, contudo, a citação de
obras de vulgarização histórica, dando-se preferência a trabalhos de historiadores
(gerais e do Direito).
Justifica-se o uso de elementos históricos por duas razões. A primeira é
didática. Há expressões e fatos que, embora sejam de conhecimento ordinário
nos meios acadêmicos, podem não ser acessíveis para leitores de perfis variados.
A presença de informações históricas e biográficas permite uma maior fluidez na
leitura, dispensan-do-se a consulta a outras fontes. Evidentemente que tal
finalidade não se aplica à Banca Examinadora. A segunda integra-se aos
objetivos da tese. Como anunciado na Introdução, o elemento histórico tem sido
frequentemente utilizado para reforçar conceitos ultrapassados ou equívocos
sobre o Direito Civil. Alguns deles se baseiam na interpretação problemática de
obras e dos autores que os desenvolveram por efeito da má contextualização
histórica. Outros se ligam ao indevido isolamento entre o autor citado como
fonte e suas convicções político-ideológicas. É muito comum que certas ideias,
concepções e teorias tenham surgido em meio a movimentos ou regimes
autoritários e, por um expediente ordinário nos meios acadêmicos, ressurjam ou
se reinventem como concepções de caráter democrático. É indispensável dar ao
leitor meios de apreciar esses vínculos e decidir sobre a idoneidade dos autores e
a atualidade de suas teses.
O sincretismo metodológico e o bartolismo foram dois vícios que o autor
tentou, a todo custo, evitar. Em trabalhos anteriores, já se havia tornado pública
sua posição em ordem a evitar confusões conceituais, terminológicas e
metodológicas, particularmente quanto à procedência estrangeira das ideias e sua
vinculação a escolas jurídicas, filosóficas ou econômicas díspares e, muita vez,
conflitantes entre si.95 No que concerne ao bartolismo, trata-se de expressão
utilizada por Clóvis Verissimo do Couto e Silva96 para representar o modo como
a doutrina brasileira se vale de fontes estrangeiras, “com o objetivo de
estabelecer uma melhor definição do próprio objeto de análise”.97 No centro do
bartolismo estão as fontes oriundas da Europa continental de tradição latina e
alemã. Esse “estilo de investigação” converte-se em algo censurável quando se
transforma em um enumerar de citações de autores estrangeiros, sem coerência
de pensamento e sem que suas ideias possam ser reconduzidas a um sistema
jurídico que não lhes reconhece utilidade, aplicabilidade ou assimilação. É óbvio
que a tese não está imune a esse problema, que se entranhou na cultura jurídica
nacional e o autor, como membro dessa comunidade acadêmica, não está imune
a referido vício. Tanto quanto possível, tentou-se evitar esses desvios.
Atento ao problema e até por uma questão de coerência com o que já
escreveu a respeito, o autor evidencia que seu trabalho se constitui em uma tese
assimilável ao Direito brasileiro. Essa preocupação não é irrelevante, embora o
autor reconheça que, mesmo sem ela, não haveria como se exibir tal ambição,
seja pela ausência de méritos da tese para tal fim, seja por ser ela escrita em
língua portuguesa, o que restringe - e muito – seu impacto. Tal preocupação
revelou-se útil para Claus-Wilhelm Canaris, quando ele inseriu como subtítulo
em seu livro Systemdenken und Systembegriff in der Jurisprudenz (traduzido por
António Menezes Cordeiro como “Pensamento sistemático e conceito de sistema
na Ciência do Direito”)98 o seguinte complemento: “Entwickelt am Beispiel des
deutschen Privatrechts” (“Desenvolvido tendo em consideração o Direito
Privado alemão”).99
Por ser uma tese de Direito brasileiro, a literatura citada será primariamente
nacional em diversas partes do trabalho. É claro que permeará à tese um
conjunto de temáticas desenvolvidas no estrangeiro ou que dizem respeito a
teorias gerais igualmente formuladas em outros países. Nesses casos, a
prevalência será dos autores não brasileiros. Outra possibilidade de citação de
obras estrangeiras é a que se relaciona a um confronto, uma crítica ou uma
comparação com respostas dadas por autores nacionais a questões formuladas no
trabalho. Tanto quanto as limitações ou a vigilância do autor permitirem, haverá
uma fuga do “bartolismo”, na particular acepção dada ao termo por alguns
autores.100
Finalmente, é preciso informar o leitor sobre a parte da tese que excepciona
o método dedutivo. Na Segunda Parte, Capítulo Quinto, há uma seção dedicada
ao estudo da recorrência do termo “constitucionalização” na literatura jurídica
brasileira desde março de 1950 até março de 2017. Esta é a única seção do
trabalho que se afasta do método dedutivo. Há uma hipótese, a saber, a
desproporção entre a importância do tema e o espaço que lhe é dedicado no
Brasil, a qual é submetida a um processo indutivo de pesquisa. Não é pretensão
do autor qualificar essa parte do trabalho como uma “pesquisa empírica”,
conquanto se tenha utilizado de procedimentos típicos desse tipo de
investigação, os quais foram indicados § 25 do Capítulo Quinto, ao qual se
remete o leitor.

5.2. Delimitações terminológicas: Direito Civil e Direito Privado


Esta é uma tese “de” e “sobre” o Direito Civil, embora em diversas
passagens se faça referência ao Direito Privado. Essa dilatação do objeto será
sempre excepcional e justificar-se-á em três hipóteses: (i) a terminologia
estrangeira; (ii) a dicotomia Direito Público-Direito Privado; (iii) a fórmula
tradicional da “eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares” e
da conexão entre “direitos fundamentais e Direito Privado”.
Quando este autor mencionar “Direito Privado” e não “Direito Civil”, o
propósito poderá ser o de dialogar com textos ou concepções estrangeiros, que
usam a expressão Direito Privado com maior liberdade (como é o caso dos
italianos e dos alemães). Outra possibilidade dar-se-á quando a obra citada for
escrita em inglês (original ou traduzida), o que implica o uso de Private law e
não de Civil law. É um equívoco comum no Brasil traduzir-se Direito Civil por
civil law, quando esta última expressão significa o conjunto de direitos de
tradição romano-germânica em contraponto ao direito de common law.
Nos países de common law, como Inglaterra e País de Gales, assim como
na maior parte dos Estados Unidos da América, não há um Direito Civil
estruturado como uma disciplina dotada de unidade sistemática e de coerência
histórico-meto-dológica, à exceção, v.g., de Escócia, no Reino Unido, e do
Estado da Louisiana, nos Estados Unidos. É uma realidade bem diversa da
encontrada no Brasil e nos países de civil law. Daí a utilização de Private law
para representar tanto o que seria traduzível por Direito Privado quanto por
Direito Civil. As traduções feitas pelo autor ou mesmo as retiradas de obras já
vertidas para o português utilizar-se-ão da terminologia de Direito Privado a fim
de se referir a essa realidade de simetria complexa em relação ao conceito
nacional de Direito Civil. Essa primeira razão ficará bem nítida quando o leitor
cotejar a passagem citada com o fundamento bibliográfico utilizado ou quando o
texto se referir aos países de common law.
A segunda hipótese de dilatação excepcional está na referência ao Direito
Privado como setor autônomo em relação ao Direito Público. Na Primeira Parte
isso ficará bem nítido. A ênfase recairá sobre a “grande dicotomia” entre essas
áreas e não faria sentido visualizá-la com a chave Direito Civil-Direito Público.
Nas demais Partes, quando ressurgirem os debates sobre essa diferenciação
sistemática, o Direito Privado terá preferência sobre o Direito Civil.
Evidentemente que se a intenção for aludir a uma área específica do Direito
Privado, na qual se contemplem as partes do Direito Civil, será este último
mencionado e não o primeiro.
A terceira hipótese recai sobre uma fórmula tradicional nos estudos sobre a
eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas: não se fala em eficácia
sobre o Direito Civil e sim sobre o Direito Privado. Eventualmente, até para se
restringir o alcance da fórmula, usar-se-á Direito Civil e Direito Privado de
modo indistinto. Não porque se entenda que são conceitos intercambiáveis, mas
por mera tradição do que se faz na literatura alemã, na qual esse tema surgiu e se
desenvolveu. Finalmente, a temática é apresentada em muitos trabalhos
acadêmicos pela expressão “Direito Privado e direitos fundamentais”. É óbvio
que nesse conjunto entram o Direito Comercial e o Direito do Trabalho. A
manutenção da fórmula deve-se, uma vez mais, ao respeito a um uso
consolidado na literatura jurídica, especialmente alemã, mas também brasileira.
Sempre que for necessário, tentar-se-á mencionar o Direito Civil e não o Direito
Privado.

5.3. Delimitações terminológicas: “Distinção sistemática” e “grande


dicotomia”
Para se referir ao problema de diferenciação e de autonomia do Direito
Privado em face do Direito Público, e vice-versa, o autor empregará
indistintamente as expressões “distinção sistemática” (ou distinção,
diferenciação sistêmica) e “grande dicotomia”. A primeira expressão foi criada
por Franz Bydlinski,101 enquanto a segunda é uma concepção de Norberto
Bobbio.

5.4. Delimitações terminológicas: eficácia dos direitos fundamentais em


relação aos particulares, eficácia em face de terceiros e Drittwirkung
A Terceira Parte da tese será dedicada, como se anunciou na Introdução,
ao problema da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
Há enorme diversidade terminológica nesse tema. É ordinário encontrar as
seguintes expressões para defini-lo: (i) eficácia dos direitos fundamentais em
relação aos particulares (ou nas relações privadas);102 (ii) eficácia em face de
terceiros;103 (iii) vinculação dos particulares aos direitos fundamentais;104 (iv)
eficácia horizontal dos direitos fundamentais (em inglês, horizontal effect of
fundamental rights);105 (v) eficácia privada ou externa;106 e (vi) a forma alemã
Drittwirkung der Grundrechte.107 Em alguns dos escritos sobre o tema há uma
seção dedicada a justificar a escolha terminológica e criticar suas variações,
quando se formula objeção a seu emprego em dado sentido.108
A tese não se dedicará a esse problema, que é mais importante para a teoria
dos direitos fundamentais, um tópico da teoria constitucional. Utilizar-se-á
preponderantemente a expressão eficácia dos direitos fundamentais em relação
aos particulares, aos privados ou nas relações privadas (ou nas relações
particulares). Quando se falar em eficácia horizontal será apenas para se
distinguir da terminologia clássica do Direito Constitucional, que é eficácia
vertical. Não se estenderá na justificativa para essa opção, pois isso implicaria o
desenvolvimento de um capítulo autônomo sobre a estrutura e a função dos
direitos fundamentais,109 o que não guarda aderência com a tese e seu objeto
específico. Registre-se que, na prática, muitos autores têm ignorado ou não dado
muito valor a esse problema,110 conquanto haja questões como a distinção entre
validade e eficácia e o sentido da eficácia das normas constitucionais.111
Entende-se que a expressão eficácia dos direitos fundamentais nas relações
privadas (e seus equivalentes) é suficiente para se chegar a um acordo
semântico.
§6. ASPECTOS FORMAIS DA PESQUISA

6.1. Uso de idiomas estrangeiros e regras ortográficas intertemporais


A tese, até por isso se constituir um requisito obrigatório para a livre-
docência, apresenta variedade de fontes nacionais e estrangeiras. Quanto às
últimas, quando possível, fez-se uso das versões originais. Nem sempre,
contudo, o objetivo foi alcançado. A tese utilizou-se de algumas obras em
alemão, italiano e inglês em suas versões para o português ou para outros
idiomas.
Sempre que possível, nas citações de textos em idiomas estrangeiros, fez-se
a tradução ou a paráfrase no corpo do texto, conservando-se nas notas o trecho
no original, se realmente necessário. As citações de livros e capítulos indicam as
páginas, os itens ou os parágrafos efetivamente empregados na tese.
Para os textos escritos em língua portuguesa, respeitou-se a grafia histórica
daquelas referências cuja publicação se deu anteriormente às Reformas
Ortográficas de 1911, 1943, 1971 e 1990, esta última em vigor desde 1o de
janeiro de 2016.112 As fontes portuguesas, mesmo aquelas publicadas após 2016,
também foram conservadas em sua grafia original. Idêntico proceder adotou-se
em relação a outros idiomas que também passaram por reformas ortográficas.

6.2. Transcrições, notações e referências bibliográficas


Na maior parte da tese, evitaram-se longas transcrições dos textos citados,
pre-ferindo-se utilizar as notas de rodapé como instrumento de identificação das
obras citadas na pesquisa ou como forma de se reproduzir excertos cuja
importância não justificaria sua exclusão, mas que também não demandaria sua
colocação no corpo do texto. Quando a citação não estiver acompanhada desse
elemento identificador é porque ela aparece como indicativa da vinculação do
autor a uma escola jurídica, uma corrente de pensamento ou a uma posição
teórica antagônica ou simétrica à qual se faz alusão no corpo do texto. Se a
citação do livro veio seguida da expressão passim, significa que a obra como um
todo contém passagens intercaladas ou sequenciais em um dado sentido ou ideia,
cuja referência de todas as páginas seria excessivamente cansativa e pouco útil.
As referências bibliográficas estão arroladas ao final da tese. Só foram
incluídas nas referências as obras efetivamente citadas, embora outras possam
ter sido consultadas. Tais fontes compreendem livros, capítulos, artigos, ensaios,
resenhas, comentários jurisprudenciais e entrevistas. Adotou-se tal critério,
embora seja respeitável a inclusão de obras meramente consultadas e não
citadas, por se entender que facilitaria ao leitor identificar o material citado e
cotejá-lo com os originais.
O autor decidiu apresentar as obras em uma lista alfabética de referências.
Assim o fez por entender que a ordenação ao estilo francês poderia, a despeito
de suas vantagens, dificultar a rápida identificação da presença (ou da ausência)
de determinada fonte, o que é essencial para membros de bancas examinadoras
avaliarem rapidamente a qualidade das referências bibliográficas.
Dentre as técnicas de citação mais recorrentes, ao estilo das soluções
ítalofrancesa, anglo-saxã, alemã e brasileira, optou-se pela observância desta
última. Há respeitáveis orientações para se seguir o modelo franco-italiano, por
seu caráter mais internacional.113 A escolha do modelo brasileiro deveu-se a sua
ampla utilização no país e sua maior aceitação no mercado editorial.114 A
despeito da eleição da ABNT como critério, tomou-se a cautela para se manter a
uniformidade nas citações.115

6.3. Acesso às fontes: bibliotecas e portais


Para a elaboração desta tese, o autor realizou pesquisas in loco, em
diferentes períodos, nas Bibliotecas da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, do Senado Federal, do Supremo Tribunal Federal e do Superior
Tribunal de Justiça (as quais permitem o acesso simultâneo à Rede Virtual de
Bibliotecas Institucionais – RVBI), da Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, do Max-Planck-
Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo,
Alemanha) e da Rechtswissenschaftliche Fakultät (Universidade de Viena,
Áustria), o Juridicum.
Registra-se aqui a imensa gratidão a todos os bibliotecários dessas
instituições, cujo auxílio e profissionalismo tornaram possível frequentar esses
espaços e ter acesso a obras fundamentais para a investigação que se converteu
nesta tese.
O acesso a obras históricas não brasileiras, anteriores ao século XX,
quando não pertencentes ao acervo do autor ou de bibliotecas por ele utilizadas
na pesquisa, deu-se por intermédio dos seguintes portais eletrônicos: Deutsches
Textarchiv (http://www.deutschestextarchiv.de/), Gallica BnF
(http://gallica.bnf.fr/) e Digitale Bibliothek – Max-Planck-Institut für
europäische Rechtsgeschichte, de Francoforte-sobre-o-Meno, Alemanha
(https://www.rg.mpg.de/bibliothek/digitale_bibliothek).
Para alguns livros e artigos publicados a partir do século XX, o acesso se
deu pelos seguintes portais: Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br/),
Google Livros (https://books.google.com.br/), JSTOR (http://www.jstor.org/),
HeinOnLine (http://heinonline.org/) e Beck (http://beck-online.beck.de). Nessas
citações não se distinguiram as obras consultadas fisicamente daquelas cujo
acesso se deu por meio de bibliotecas digitais, como o uso de notações
específicas para textos eletrônicos. Assim se optou porque se considera que a
consulta se deu à obra original, embora com um suporte físico diferente da
celulose. Na essência, tratava-se das mesmas obras. Se o texto citado, porém, foi
produzido exclusivamente para meio digital, seguiu-se a regra de se indicar o
enlace para a página eletrônica no qual ele está disponível, com a respectiva data
de acesso.
Com a proliferação de periódicos científicos em meio digital, seguindo o
padrão dos Open Journal Systems, considerou-se igualmente desnecessário
transcreveremse para a notação bibliográfica as informações sobre o enlace e a
data de acesso. Aqui se aplicou idêntico padrão: embora lançada em meio
eletrônico, a revista conservava-se como uma fonte bibliográfica identificável
por seus elementos essenciais (ano e mês de edição; intervalo de páginas; nome
do periódico; título do artigo e nome do autor). Ter sido publicada em suporte
eletrônico e físico ou apenas eletrônico não altera a suficiência dos elementos
identificadores, inclusive possibilitando a citação da página. Situação particular
é a dos periódicos da ThomsonReuters, que assumiu o controle e o acervo da
centenária Editora Revista dos Tribunais. As citações das revistas desse grupo
editorial apresentar-se-ão de modo idêntico, quanto aos elementos pretextuais,
sejam eles disponíveis em meio eletrônico ou em meio físico. Dá-se, contudo,
uma diferença quando o texto foi encontrado apenas em sua versão eletrônica,
embora ainda exista a versão física. Nesses casos, o autor buscou ter acesso à
versão física, o que nem sempre foi possível dado a um fenômeno que se há
generalizado nos últimos anos: as bibliotecas públicas têm optado por manter
acervos digitais e, no caso da ThomsonReuters, não há divisão de páginas como
nos demais periódicos digitais dos Open Journal Systems. O autor contornou
esse problema, sempre que possível, indicando o parágrafo ou o item do qual a
citação se utilizou. Quando um artigo citado não indicar a página, o item ou o
parágrafo, tal se deveu por duas hipóteses: a citação foi genérica,
compreendendo todo o artigo, como expressivo de uma ideia-força ou de uma
posição teórica específica, ou não havia divisões internas no texto, de modo a
permitir a citação localizada no trecho que poderia interessar ao leitor para
futuro cotejo.

6.4. Citação de fontes jurisprudenciais


As citações de jurisprudência organizaram-se de dois modos. Quando o
acór-dão foi extraído de repositório, a citação referiu-se à abreviatura do
periódico e os números identificadores do volume e da página, conforme o
padrão do respectivo acervo. A lista de abreviaturas permite que o leitor
rapidamente saiba a qual periódico a citação corresponde. Eventualmente, além
disso, transcreveram-se os elementos identificadores do julgado (tribunal, órgão
plenário ou fracionário, número do recurso, relator(a), data de julgamento e
diário oficial, com data de publicação). O segundo modo, mais comum em razão
da ampla digitalização dos acervos dos tribunais, deu-se pela transcrição de
todos os elementos identificadores fornecidos pelo repositório eletrônico,
segundo a ordem de cada tribunal. As citações extraídas de portais de órgãos
judiciários não vieram acompanhadas do enlace e da data do acesso por se
considerar que tal providência é desnecessária e que aumentaria inutilmente o
tamanho da tese.
Uma praxe ainda comum em algumas obras monográficas foi deixada de
lado: a inclusão nas referências, como um metadado autônomo, de cada acórdão
citado, antecedido, em caixa-alta, do nome do país de origem. É uma
providência dispensável nos dias atuais, tamanha a facilidade de consulta a tais
fontes na Internet. Nas referências bibliográficas, incluíram-se os endereços
eletrônicos dos portais utilizados.
O autor, embora tenha feito uso desse expediente em outras publicações e
reconheça a importância dessa praxe, evitou ao máximo transcrever longas
ementas de acórdãos citados ou referidos. Essa regra só se excepcionou em
relação a arestos estrangeiros ou nacionais (muito antigos), cujo acesso não seja
possível nos motores de busca na Internet. Tanto aqui como em outros casos,
considerou-se que a ampla digitalização dessas fontes recomenda que se
economize espaço no texto para oferecer ao leitor apenas informações ou
conceitos que ele não teria como encontrar, isoladamente ou de modo
sistematizado, em outros lugares. Preocupações ecológicas (com o gasto de
papel) e com a objetividade na escrita dos textos jurídicos, cada vez mais
disponíveis na Internet, também presidiram essa opção do autor.

6.5. Fontes legislativas


A legislação é citada conforme o padrão estabelecido pela Lei
Complementar no 95, de 26 de fevereiro de 1998. Constituições, códigos,
estatutos e leis gerais referi-ram-se como tais e não por sua identificação
numérica, ressalvadas situações exigidas pelas circunstâncias. O uso de siglas e
abreviaturas foi privilegiado nas citações de textos normativos, observando-se o
critério fornecido pela Lista de Abreviaturas. A reprodução de textos legais mais
extensa foi evitada, especialmente de normas brasileiras, cujo acesso é irrestrito
por meio de portais governamentais, particularmente o mantido pela Presidência
da República (www.planalto.gov.br/). Idêntico procedimento adotou-se em
relação a portais estrangeiros, os quais estão referidos no final da tese. As
normas estrangeiras, quando reproduzidas literalmente, foram traduzidas ou
parafraseadas. Quanto à Lei Fundamental de Bonn de 1949, utilizou-se a versão
oficial do Ministério Federal da Justiça (https://www.gesetze-im-
internet.de/gg/BJNR000010949.html), cotejada com a tradução oficial para o
português patrocinada pelo Bundestag, elaborada por Assis Mendonça e revista
por Urbano Carvelli
(http://www.brasil.diplo.de/contentblob/3160404/Daten/1330556/Gundgesetz_pt.pdf
Não se incluíram as citações de textos legais nas referências bibliográficas.
O autor, embora possa ser censurado por esta opção, entende que os tempos são
outros e a quantidade de informação legislativa disponível na Internet é tão
ampla que essas referências servem hoje para dilatar desnecessariamente o
tamanho das monografias.

94 As principais fontes de consulta utilizadas para termos em latim foram estas: CORPUS JURIS CIVILIS.
Digesto de Justiniano, Liber Primus: Introdução ao Direito Romano. Traduzido por Hélcio Maciel França
Madeira. Prólogo de Pierangelo Catalano. 7. ed. revista. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013;
MADEIRA, Hélcio Maciel França; RODRIGUES, Dárcio Roberto Martins. Introdução ao latim jurídico:
Lucerna Iuris. São Paulo: Quartier Latin, 2005; FERREIRA, António Gomes. Dicionário de latim
português. Porto: Porto Editora, 1995; TORRINHA, Francisco. Dicionário latino português. Porto:
Gráficos Reunidos, 1942.
95 “Não é este o momento apropriado para se criticar o sincretismo da doutrina e de algumas de cisões
jurisprudenciais quanto ao emprego desses diversos movimentos como fundamentação contrária ao
positivismo e favorável à intervenção judicial ativa, com base no texto constitucional. Registrese,
apenas, o desconforto de se encontrar citações de Ronald Dworkin e Robert Alexy, especificamente
sobre ponderação, conflito, regras e princípios, como se houvesse franca uni formidade de
pensamento entre esses autores” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Dogmática e crí tica da jurisprudência
(ou da vocação da doutrina em nosso tempo). Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 99, no 891, p. 65106,
jan. 2010. p. 83). Em sentido mais amplo, referindose também ao problema “da importação e da
apropriação inadequadas de conceitos e de categorias”, es pecialmente estrangeiros: RODRIGUES JR.,
Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo...p. 45.
96 COUTO E SILVA, Clóvis do. Principes fondamentaux de la responsabilité civile en Droit brésilien et
Comparé: cours fait à la Faculté de Droit et Sciences Politiques de St. Maur (Paris XII). Paris: s/e., 1988,
p. 5 e ss.
97 MEDINA, Francisco Sabadin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien –Eine
rechtsvergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive –
Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering, de Benjamin Herzog. Revista de Direito
Civil Contemporâneo. v. 7, ano 3, p. 393412, abr./jun. 2016. p. 407.
98 CANARIS, ClausWilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito. Tradução
de António Menezes Cordeiro. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996.
99 Sobre essa delimitação e sua importância na recepção de doutrina estrangeira, confirase: HERZOG,
Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien – Eine rechts vergleichende
Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive – Zugleich ein Plädoyer
für mehr Savigny und weniger Jhering...cit. p. 741.
100 Particularmente, quanto à tradição da jurisprudência brasileira de invocar argumentos de autori dade

no Direito estrangeiro: SCHMIDT, Jan Peter. Zivilrechtskodifikation in Brasilien. Strukturfragen und


Regelungsprobleme in historischvergleichender Perspektive. (Schriften zum ausländischen und
internationalen Privatrecht, v. 226), Tübingen, Mohr Siebeck, 2009. p. 12. Em sentido mais am plo,
fazendo referência à obra de Clóvis do Couto e Silva: MEDINA, Francisco Sabadin. Anwendung und
Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien...p. 407.
101 No original, systematischen Unterscheidung.
102 MENDES, Gilmar Ferreira. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas: exclusão de
sócio da União Brasileira de Compositores. Revista da Ajuris: doutrina e jurisprudência, v. 32, no 100, p.
139151, dez. 2005; VALE, André Rufino do. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2004; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamen tais e Direito
Privado: algumas considerações em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais.
Revista de Direito do Consumidor, no 36, p. 54104, out./dez. 2000. § 2 (admitindo também “vinculação
dos particulares ou entidades privadas aos direitos fundamentais”, mas com fortes restrições à
terminologia “eficácia horizontal”).
103 Essa terminologia corresponde a uma tradução literal de Drittwirkung e encontrase em: MOTA PINTO,

Carlos Alberto da. Teoria Geral do Direito Civil. Atualizado por António Pinto Monteiro e Paulo Mota
Pinto. 4. ed., 2. reimp. Coimbra: Coimbra Editora, 2012. p. 74 (o autor também em prega “eficácia
reflexa”).
104 Expressão bastante utilizada em Portugal: MACCRORIE, Benedita Ferreira da Silva. A vinculação dos

particulares aos direitos fundamentais. Coimbra: Almedina, 2005. p. 1319; ABRANTES, José João Nunes.
A vinculação das entidades privadas aos direitos fundamentais. Lisboa: Associação Acadêmica da
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1990. p. 87108 (embora ao lon go da obra prefira
usar “eficácia dos direitos fundamentais”); ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais
na Constituição portuguesa de 1976. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2009. p. 247352. O conceito de
“vinculação” também é usado no Brasil: STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos
fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 58 (conquanto admi ta também como corretas as
expressões “eficácia horizontal” e “eficácia de direitos fundamentais nas relações (jurídicas) entre
particulares”).
105 TUSHNET, Mark V. The issue of state action/horizontal effect in Comparative Constitutional law.
International Journal of Constitutional Law, v. 1, no 1, p. 7998, jan., 2003. p. 8898, especial mente;
RÖDL, Florian. Fundamental rights, Private law, and societal constitution: On the logic of the socalled
horizontal effect. Indiana Journal of Global Legal Studies, v. 20, no 2, p. 10151034, 2013, p. 10161019
(voltado para a teoria da eficácia dos direitos fundamentais de Teubner); ANZURES GURRÍA, José
Juan. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales. Cuestiones Constitucionales: Revista
Mexicana de Derecho Constitucional, no 22, p. 351, 2010.
106 ROTHENBURG, Walter Claudius. Direitos fundamentais e suas características. Revista de Direito

Constitucional e Internacional, v. 8, no 30, p. 146158, jan./mar. 2000. § 15.


107 Exemplificativamente: MÜNCH, Ingo von. Die Drittwirkung von Grundrechten in Deutschland. In.

MÜNCH, Ingo von; SALVADOR CODERCH, Pablo; FERRER I RIBA, Josep (Orgs.). Zur Drittwirkung der
Grundrechte. Frankfurt am Main: Peter Lang, 1998. p. 713; CLASSEN, Claus Dieter. Die Drittwirkung der
Grundrechte in der Rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts. Archiv des öffentlichen Rechts -
AöR, v. 122, p. 65107, 1997. p. 6670; BUCHER, Eugen. Drittwirkung der Grundrechte? Schweizerische
Juristen Zeitung, v. 83, no 41, p. 3747, 1987. Em espanhol, citase: GARCÍA TORRES, Jesús; JIMÉNEZ-
BLANCO, Antonio. Derechos fundamentales y relaciones entre particulares: La Drittwirkung en la
jurisprudência del Tribunal Constitucional. Madrid: Civitas, 1986. p. 1118 (que usam o termo no
sentido de eficácia em relação aos particulares).
108 É o caso de: SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito:...cit. p. 5460 (analisa as
expressões “relações privadas”, “relações entre particulares”, “relações intersubjetivas”, eficácia,
aplicabilidade, efeitos); SOMBRA, Thiago Luís Santos. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações
privadas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 5658; SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações
privadas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. XXXXXXI; STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos
particulares a direitos fundamentais...p. 5358; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fun damentais e Direito
Privado: algumas considerações em torno da vinculação dos particulares aos direitos
fundamentais...cit, § 2.
109 Para uma análise rigorosa do suporte fático dos direitos fundamentais sugerese consultar: SILVA,

Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2. ed. 4. tira gem.
São Paulo: Malheiros, 2017. p. 65125.
110 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. XXXIXXXII.
111 Virgílio Afonso da Silva (Direitos fundamentais...p. 208251) explicita o conceito de eficácia das normas

constitucionais, após uma análise das principais formulações teóricas feitas a esse pro pósito no
Brasil, destacandose, naturalmente, a de José Afonso da Silva (distinção tríplice das normas
constitucionais segundo sua aplicabilidade). A tese defendida por Virgílio Afonso da Silva (Direitos
fundamentais...p. 209) é, em suas palavras, incompatível com essa última teoria, “pelo menos no
âmbito dos direitos fundamentais”.
112 As regras já estavam em uso no Brasil, posto que não obrigatoriamente, desde 1º de janeiro de 2009,

após a ratificação do acordo em 2008 pelo Governo brasileiro.


113 MARCHI, Eduardo C. Silveira. Guia de Metodologia Jurídica: Teses, monografias e artigos. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2009. p. 160161 e 164.
114 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação: refe-
rências: elaboração. Rio de Janeiro, 2002.
115 “Emqualquer caso, porém, é sempre inadmissível e, portanto, inteiramente desaconselhável: a) criar
um novo método (...) b) não manter uma uniformidade na maneira de citar, mudando a téc nica
página a página, pois, como já referido, o mínimo que se exige é a homogeneidade” (MARCHI,
Eduardo C. Silveira. Guia de Metodologia Jurídica...p. 164).
PRIMEIRA PARTE

A narrativa da tese inaugura-se com o exame da “grande dicotomia”. O


principal objetivo desta parte é comprovar a permanência e a utilidade da
autonomia do Direito Privado. Três grandes matrizes serão convocadas para
servir de fundamento a esse propósito: a) a histórica; b) a técnico-jurídica, que se
dividirá em legislativa e doutrinária; c) a ideológica.
A Primeira Parte divide-se nos seguintes capítulos: (1o) a publicização, a
socialização e a privatização do Direito; (2o) as novas fronteiras do Direito
Privado contemporâneo, com as relações jurídicas e os conteúdos normativos
que surgiram nas últimas décadas e que terminaram por dilatar mencionadas
fronteiras; (3o) a visão da doutrina nacional, o Direito Romano e as teorias sobre
a “distinção sistemática”; (4o) a “distinção sistemática” e sua permanência e sua
utilidade, com a exposição de objeções a sua continuidade, que, uma vez
refutadas, oferecem fundamentos para explicar a autonomia do sistema de
Direito Privado.
CAPÍTULO PRIMEIRO

PUBLICIZAÇÃO, SOCIALIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO

SUMÁRIO. § 7. A “distinção sistemática” e o positivismo jurídi co. § 8. Da


publicização à privatização do Direito? 8.1. Acordo semântico: o sentido
de privatização. 8.2. A locomotiva do Di reito Público nos territórios do
Direito Privado. 8.3. Publiciza ção e socialização do Direito Privado. 8.4. A
tese angloameri cana da “crise do contrato” e sua recepção no Brasil:
Gilmore, Horwitz e Atiyah. 8.5. Privatização do Direito: a virada dos anos
19801990. 8.5.1. Liberalismo, neoliberalismo e Quarta Revo lução
Industrial. 8.5.2. O caso especial do Direito Administrati vo:
desestatização, privatização e deslegalização.
§7. A “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA” E O POSITIVISMO JURÍDICO
Nenhum autor moderno contribuiu tanto para o fim da distinção entre
Direito Público e Direito Privado quanto Hans Kelsen.116-117
Em sua tese de livre-docência, apresentada à Universidade de Viena em
1911, intitulada Principais problemas da Teoria do Direito Público, Kelsen
deixa evidente seu programa de desconstruir essa diferenciação específica, ao
declarar no prefácio à primeira edição dessa obra que: a) rejeita o entendimento
prevalecente – à época – sobre haver uma divisão essencial entre o Direito
Público e o Direito Privado, seja pelo critério dos sujeitos envolvidos na relação,
seja pelo critério da subordinação e da coordenação; b) entende ser todo Direito
de natureza pública; c) haveria uma única Teoria Geral do Direito e os conceitos,
princípios e categorias jurídicas são comuns a todas as áreas do Direito, o que
implica reconhecer também a unidade metodológica do Direito, sem que se
possa aceitar uma metodologia específica para o Direito Público e outra para o
Direito Privado.118
Embora haja autores jusnaturalistas a defender o fim dessa divisão,
baseados em uma ideia de que essa “dicotomia tradicional” seria “historicamente
esvaziada”,119 o certo é que a concepção de Kelsen ganhou enorme prestígio no
século XX entre os civilistas, de modo particular, a partir dos anos 1930-1940,
com a ascensão dos governos totalitários na Europa.
É evidente que se não pode colocar no mesmo nível um democrata de
tendências socialistas como Hans Kelsen e autores que, em maior ou menor grau
de comprometimento defenderam os regimes totalitários ou sua ideologia na
metade do século XX. Oportunamente neste trabalho serão explorados os
meandros ideológicos que os levaram a defender tais concepções sobre a
dicotomia Direito Público-Direito Privado.120 Quanto a Kelsen, sua tese é apenas
um desdobramento coerente de sua concepção de que todo Direito é um Direito
estatal, por ele produzido ou por ele autorizado.121 O problema está em justificar
o abandono dessa diferenciação específica por aqueles que elegeram Kelsen e o
Positivismo Jurídico como alvo da falácia do espantalho.
Há aqui um problema de quitação de custos argumentativos: afirmar que
não existem mais limites divisórios entre o Direito Público e o Direito Privado é
defender sobretudo uma tese positivista.122 Não apenas isso, é apoiar um dos
postulados centrais da teoria que é uma das mais criticadas na doutrina civilista
contemporânea. Manifestase, contudo, algo mais do que uma preocupação com a
coerência, o que já seria o suficiente para inspirar preocupações. Interessa ao
objeto desta tese o fato de que a rendição da fortaleza na qual se aloja a célebre
dicotomia, como Kelsen expressamente declarou, implicará aceitar o postulado
de que haveria uma “única Teoria Geral do Direito” e “conceitos jurídicos
básicos uniformes, que são comuns a todas as áreas do Direito e para todas elas
construídas, debaixo dos mesmos princípios metodológicos”.123
Para a tese aqui defendida, há espaços distintos reservados ao Direito
Privado e ao Direito Público, com princípios, metodologia e conceitos jurídicos
próprios, os quais, embora possam eventualmente se comunicar, interpenetrar e
confundir, guardam sua autonomia e sua filiação a um sistema autônomo, o que
implica o reconhecimento de um estatuto epistemológico para o Direito
Privado.124
§8. DA PUBLICIZAÇÃO À PRIVATIZAÇÃO DO DIREITO?

8.1. Acordo semântico: o sentido de privatização


Antes de se iniciar, é importante ressaltar que existe certa plurivocidade no
conceito de privatização do Direito. Uma das possibilidades conceituais está no
reconhecimento de um Direito fora do Estado, supranacional ou não nacional,
produzido autonomamente e que não depende da legitimação estatal. Esse
Direito é privado, mas não deriva de uma fonte normativa estatal. Em paralelo,
haveria o Direito Privado clássico, produzido pelo Estado e dentro do Estado. O
código civil, v.g., é o instrumento normativo por excelência para veicular esse
Direito Privado estatal. A primeira hipótese corresponde a uma das acepções da
privatização do Direito, especialmente na doutrina europeia contemporânea.125
Outro sentido de privatização do Direito, que é mais ordinário e comum no
Brasil, recai na transformação de institutos de Direito Público em homólogos de
Direito Privado ou a transferência de matérias fortemente reguladas pelo Estado
para âmbito da autonomia privada, como é o caso do Direito de Família.
Ambos os sentidos serão analisados neste capítulo, com maior ênfase ao
segundo, por ser mais próximo à realidade brasileira.

8.2. A locomotiva do Direito Público nos territórios do Direito Privado


Aceitar o postulado de que persiste a “distinção sistemática” não implica
negar, ao longo do século XX, a existência de um processo de avanço contínuo
do Direito Público sobre o Direito Privado. As duas Grandes Guerras Mundiais
destruíram a organização econômica de matriz europeia, fortemente baseada em
investimentos de grupos capitalistas, nos setores de transporte, indústria de base,
financeiro, minerário e agrícola. No modelo oriundo da segunda metade do
Oitocentos, esses grupos operavam de braços dados com os Estados nacionais,
pesando sobremaneira na formação desses laços as relações familiares e de
classe.
Na raiz das mudanças no Novecentos estão o fim das grandes dinastias
europeias, o desaparecimento físico de milhares de elementos da classe
dominante nos conflitos bélicos ou em políticas genocidas, e as desapropriações
forçadas após a queda dos regimes políticos ou a mudança de titularidade de
territórios nacionais por efeito dos tratados do primeiro e do segundo pós-guerra.
Em certa medida, foi relativamente fácil para os Estados assumirem os meios de
produção, o que normalmente só ocorreria após atos de força ou processos
judiciais demorados, quando as famílias proprietárias não mais existiam ou seus
vínculos com as Forças Armadas se dissolveram com a derrota militar.
Para além disso, o crescimento populacional, as novas tecnologias e a
formação de uma sociedade de consumo, a partir dos anos 1950-1960, exigiram
recursos e investimentos em escala nunca vista na História e só um agente
dispunha desses meios: o Estado. Com as ressalvas óbvias dos Estados Unidos
da América, embora até lá se falasse em um “complexo industrial-militar”,
amplos setores de exploração capitalista privada foram assumidos por
sociedades de economia mista e empresas públicas, quando não diretamente por
órgãos estatais.126
No Brasil, para se limitar tal análise, podem-se citar como exemplos dessa
transformação a chegada ao poder de Getúlio Vargas, em 1930, com a
subsequente instauração do Estado Novo (1937-1945), e a Ditadura Militar
(1964-1985), com o intervalo do período de industrialização de perfil mais
liberal no governo do presidente Juscelino Kubistchek de Oliveira (1956-1961).
Durante boa parte do século XX, o transporte ferroviário, as
telecomunicações, a radiodifusão, os hidrocarbonetos, a energia elétrica, a
siderurgia e a indústria química, para se limitar a alguns campos sensíveis da
Economia, tornaram-se monopólio estatal ou submeteram-se a níveis elevados
de intervenção econômica do Estado. Criaram-se pesados mecanismos de
securitização previdenciária, dos acidentes de trabalho e de transporte, além de,
em alguns Estados, redes de assistência social subvencionadas com recursos
públicos contínuos. Buscou-se universalizar a educação e, em um número
invulgar de países, ela se tornou pública e gratuita. Leis protetivas aos
trabalhadores, aos consumidores, aos locatários prediais urbanos, aos idosos, às
crianças e aos adolescentes foram aprovadas.
No Brasil, esse processo teve início antes mesmo da Revolução de 1930,
com edição do Decreto no 4.403, de 22 de dezembro de 1921, que inaugurou
uma série de leis do inquilinato, todas com maior ou menor grau de proteção aos
locatários. A CLT foi uma das grandes marcas do Estado Novo.127 Em ambos os
casos, as novas leis tornaram residuais as disposições dos contratos de locação
de coisas e de serviços, respectivamente previstos nos arts.1.188-1.210 e 1.216-
1.236, CC/1916. Em relação a ambos os diplomas, a preocupação em resolver
conflitos e interesses sociais estava na raiz das iniciativas legislativas.128
No Direito de Família, as transformações foram igualmente intensas: a)
admissão de casamento de colaterais do terceiro grau, desde que, após exame
médico, se comprovasse não haver óbices sanitários e eugênicos; b)
reconhecimento de filhos ilegítimos; c) flexibilização da adoção; d) legitimação
adotiva; e) edição do Estatuto da Mulher Casada (Lei no 4.121, de 27 de agosto
de 1962), que eliminou a incapacidade relativa da mulher casada e mitigou
assimetrias conjugais no matrimônio e quanto ao poder familiar; f) aprovação da
Lei do Divórcio (Lei no 6.515, de 26 de dezembro de 1977).129

8.3. Publicização e socialização do Direito Privado


É natural que tais movimentos concêntricos em torno de espaços
historicamente reservados ao Direito Privado e a seus institutos gerassem uma
sensação de asfixia ao espaço privado, do que resultou o desenvolvimento de
teorias, movimentos ou mesmo slogans como a publicização, a moralização, a
democratização e a socialização do Direito,130 além da publicização do contrato
e o dirigismo contratual.131 Algumas dessas ideias eram tributárias de autores
alemães e italianos do final do século XIX, como Otto von Gierke, Anton
Menger von Wolfensgrün (representante dos “catedráticos socialistas
austríacos”) e Enrico Cimbali. No século XX, prevaleceram autores franceses,
muitos deles ligados intelectualmente ao colaboracionismo de Vichy.132
A socialização do Direito é um conceito problemático por efeito de sua
plurivocidade, que se revela tanto pela generalização quanto pela paradoxal
simplificação do conceito, que ora se apresenta como o prestígio de ideais
humanizadores, de caráter social ou democrático.133 Note-se que a socialização
esteve muito em voga no Brasil na primeira metade do século XX, tal foi a
quantidade de textos publicados sobre o tema nesse período. E não apenas no
Direito Civil.134
Muito bem, nos dias de hoje, quem poderia ser contra a socialização do
Direito?
Um artigo expressa bem o risco da leitura feita por rótulos, mormente
quando se inicia um procedimento argumentativo de desqualificação por
contraste, como é comum em relação ao Direito Civil, como um ramo
individualista ou conservador. A “socialização do Direito Penal”, de que resulta
um “Direito Penal Socialista”, é o processo que gera consequências como (i) a
prevalência dos interesses sociais sobre os individuais; (ii) a culpabilidade seria
um elemento ultrapassado no Direito Penal, devendo-se buscar uma maior
objetivação na responsabilização do infrator; (iii) o desprezo aos limites da
tradição do liberalismo-jurídico-penal; (iv) o repúdio ao Direito Penal que pune
o fato, porquanto “muitas vezes a periculosidade se manifesta antes do delicto, e
desde então deve a sociedade defender-se”; (v) a mitigação do princípio da
legalidade penal (nulla poena sine lege), dado que o princípio da defesa social
deve prevalecer em nome da eficácia da sanção penal.135 Tais ideias, escritas no
final dos anos 1920, poderiam ser transpostas para o Direito Civil nos dias de
hoje. Se, no Direito Penal, elas chocam um leitor contemporâneo (objetivação da
culpabilidade, defesa social, flexibilização da legalidade penal), talvez
convencessem no campo do Direito Civil. O que é impressionante (ou não) é que
um mesmo qualificativo, por falta de acordo semântico, possa se prestar a tão
incompatíveis funções.
Michele Giorgianni deu outro sentido à socialização do Direito (Civil),
entendida como uma forma de ampliar as preocupações da disciplina com os
interesses sociais.136 Persiste, contudo, o sincretismo terminológico. Esse apelo
ao elemento “social” esteve presente na justificativa para a substituição (bem-
sucedida) dos códigos civis italiano (o Código Civil de 1865) e português (o
Código do Visconde de Seabra de 1867) pelos códigos de 1942 e 1967,
respectivamente, ambos aprovados durante regimes de exceção.137 Ao seu tempo
e, provavelmente, até o final do século XX, tais ideias poderiam ser aceitas com
pouca contestação. Se hoje elas suportam alguma crítica não se deve a sua
debilidade ou erronia, mas à circunstância de que serviram para explicar
determinado período histórico. Na atualidade, talvez, elas não mais se prestem a
esse propósito com tanta ductilidade.
Exemplos muito interessantes dessa retroalimentação da experiência
histórica e da construção teorética no Direito brasileiro são encontrados em
textos como os de Orlando Gomes, influenciado pela visão estado-novista dos
anos 1930,138 período no qual ele “iniciou sua atividade advocatícia e sua
carreira docente”.139 Como bem acentuado por Thiago Reis,140 em Raízes
históricas e sociológicas do Código Civil brasileiro, de Orlando Gomes, é nítida
a presença de autores-chave da década de 1930 e da era getulista, como Gilberto
Amado, Oliveira Viana e Nestor Duarte, embora de perfis ideológicos
distintos.141

8.4. A tese anglo-americana da “crise do contrato” e sua recepção no


Brasil: Gilmore, Horwitz e Atiyah
Volte-se, agora, para a realidade jurídica de common law. Não deixa de ser
curioso que, guardadas as devidas proporções, os dois expoentes do mundo
anglófono, países capitalistas centrais, tenham deixado florescer concepções
muito aproximadas às que se formaram na Europa continental e, por recepção,
tradição ou legal transplants, que também se manifestaram no Brasil.
Nos Estados Unidos da América da década de 1970, Grant Gilmore (1910-
1982) e Morton J. Horwitz (1938-), respectivamente da Universidade de Ohio e
da Universidade de Harvard, ocuparam-se do nascimento e da morte da teoria
contratual clássica. Do outro lado do Atlântico, Patrick S. Atiyah (1931-)
estudou o mesmo objeto sob a óptica e as particularidades do Direito inglês. Em
comum, entre esses estudos, que começaram nos anos 1960, estão alguns
elementos: os autores vivenciaram a ascensão do intervencionismo estatal e do
complexo industrial-militar em seus países, o prestígio do keynesianismo, a
Guerra Fria e o desencanto, tanto na América quanto na antiga sede do velho
Império Britânico, com a sociedade burocratizada de comitês de servidores
públicos, agências capturadas e movimentos paredistas e sindicais fortalecidos.
Para além disso, deixaram esses três autores alguns slogans que povoam até hoje
os textos de abertura de obras sobre Direito Contratual no Brasil, como a
transformação do Direito, a morte, a ascensão e queda ou o declínio do
contrato.142
Não se deve, nem se pretende, resenhar as ideias desses três autores, mas
convém explorar sucintamente o impacto de suas obras sobre o enfraquecimento
da autonomia de um instituto central do Direito Privado, que é o contrato. Não se
alude à debilitação do Direito Privado e sim de um de seus institutos em razão
dos Direitos norte-americano e inglês não conhecerem uma unidade sistemática
semelhante à existente na tradição romano-germânica. Em common law, tem-se
Contracts, Obligations, Torts, Family Law, mas não um “Direito Civil” no
sentido próprio que se emprega no Direito europeu continental e seus enxertos
ao redor do mundo.143
Partindo-se do pressuposto de que, ao menos até agora, não há uma perfeita
equivalência entre o Direito Civil (romano-germânico) e as disciplinas isoladas
que se agrupam, mais por um acordo semântico do que por simetria, sob a
rubrica do Private law, é de se observar que, nos três textos citados (Gilmore,
Horwitz e Atiyah) há argumentos que, se forem transpostos, como efetivamente
o foram, para o Direito brasileiro, contribuem ao discurso de crise e decadência
do Direito Civil e de seu estatuto epistemológico.
Em Gilmore, encontra-se um padrão de estratégia intelectual muito
parecido com o que se observou no Brasil para a crítica à autonomia do Direito
Civil e à dicotomia público-privado, a qual se apresenta em três níveis: i)
escolhem-se os autores-vilões (no caso de Gilmore, são Langdell, Holmes e
Williston, com ênfase no primeiro) e os autores-heróis (Corbin e Cardozo); ii)
identifica-se o alvo teorético – a Teoria Geral do Contrato, que é considerada
como um conceito a serviço (do que, se verá no terceiro nível); iii) vinculam-se
os autores-vilões e o alvo a uma ideologia ou um conjunto de valores que não
goza (ou deixou de gozar) do favor das simpatias públicas, a saber, o
individualismo e o formalismo, em contraponto ao welfare state e seus efeitos na
Economia e no Direito. Prova disso foi que áreas como a Responsabilidade Civil
(Tort law) acabaram por invadir o Direito dos Contratos por efeito de padrões
sociais que se tornaram incompatíveis com esse último, ao contrário da primeira,
que soube se adaptar à realidade social e, por essa razão, passou a “reabsorver”
espaços da responsabilidade contratual.144
Morton J. Horwitz escreveu uma obra de História do Direito, mas
igualmente conectada com a História Econômica do período analisado. O Direito
norte-ameri-cano pré-1790 era estático, baseado no jusnaturalismo e em ideias
de justiça. Entre 1790-1860, os tribunais converteram-se em órgãos
jurisdicionais a serviço do desenvolvimento econômico capitalista, amoldando o
Direito de common law às necessidades de grupos mercantis emergentes (e
poderosos) em desfavor de elementos socialmente mais débeis. Valores como
previsibilidade, essenciais para o planejamento econômico dos investidores,
eram mais importantes para o judiciário do Oitocentos, do que conceitos
estáticos de justiça.145 A separação entre a responsabilidade pessoal do sócio e da
sociedade foi também decisiva nesse processo de favorecimento do capital,
ainda que isso haja custado para os setores menos poderosos.146 A autonomia
privada e princípios como o caveat emptor (acautele-se comprador) suplantaram
critérios de equidade na interpretação do contrato.147
Na década de 1980, começaram a surgir as primeiras críticas acadêmicas
ao trabalho de Horwitz, basicamente estruturadas em duas ordens: i) o
reducionismo e a simplificação excessivos, ao, por exemplo, contrapor interesses
de fazendeiros versus empresários emergentes, quando essa clivagem não seria
compreensiva da realidade do território americano em suas plúrimas facetas; ii) a
falta de rigor dos dados econômicos.
No período objeto da pesquisa de Horwitz, os Estados Unidos
enriqueceram imensamente, o que teria gerado efeitos positivos para a sociedade
em geral. A teoria de Horwitz, como se percebe, é menos contratual e mais
histórica (sobre a evolução dos contratos e da propriedade). Dois aspectos de seu
livro guardam conexão estreita com o tema deste capítulo: o primeiro está na
utilização da História como veículo para a crítica ao individualismo do século
XIX, o que converge com autores brasileiros, e a contradição com Gilmore
quanto à dicotomia formalismo-ductilidade jurídica. Em Gilmore, o formalismo
era uma marca do Direito Privado, ao passo que Horwitz explica que o
desequilíbrio socioeconômico do Oitocentos foi contestado pelo Poder Judiciário
a partir da flexibilização de categorias jurídicas formais, herdadas do Direito
Natural do século XVIII, em nome da promoção do desenvolvimento
econômico.
Das 13 colônias, volte-se à metrópole, a capital do Velho Império, com
Patrick S. Atiyah e o popular e sugestivo título de seu livro “ascensão e queda da
liberdade contratual”. O título, porém, sugere algo mais do que ele realmente
oferece: o autor cuida da ascensão e queda de uma teoria contratual, a inglesa e
dos séculos XVIII-XIX, que se fundava no voluntarismo. No entanto, muitos
projetaram-na para a realidade brasileira como se fosse um trabalho descritivo da
crise do contrato na sociedade do pós-guerra, o que não é verdadeiro. Ademais,
Atiyah associa a liberdade contratual e o direito de propriedade como se fossem
elementos comuns ao século XIX, quando seriam valores mais antigos na
sociedade britânica.148 Em comum com os norte-ame-ricanos está o uso da
História como legitimadora das teses defendidas publicamente. Não por falta de
qualidade acadêmica ou por insinceridade intelectual, até porque eles
representaram uma ruptura na forma como a História do Direito era trabalhada
em seus países.
O problema mais grave talvez esteja no fato de que tanto as ideias de
Atiyah, quanto as de Gilmore e Horwitz hajam sido recepcionadas no Brasil
como argumentos de autoridade para o combate à autonomia do Direito Privado.
Não é sem causa que os três professores são hoje considerados representantes de
uma mesma abordagem metodológica, dita histórico-evolutiva, que procura
entender a teoria dos contratos em conexão com as transformações sociais e
econômicas, a qual, todavia, perdeu enorme espaço para o Law and
Economics.149
A evolução histórica, nomeadamente do século XX, e todas essas
concepções, doutrinas e teorias, que tanto contestam a autonomia do Direito
Privado quanto a própria essência das fronteiras entre aquele e o Direito Público,
conduziriam ao incontornável fim da “distinção sistemática”, como a denomina
Franz Bydlinski?150 É o que se pretende responder nas próximas seções.

8.5. Privatização do Direito: a virada dos anos 1980-1990

8.5.1. Liberalismo, neoliberalismo e Quarta Revolução Industrial

Não se pode fundamentar a tese do fim da dicotomia entre Direito Público


e Direito Privado nos referidos acontecimentos históricos ou em várias das
correntes teóricas que surgiram nos anos 1930-1940 e 1950-1970. Tal se afirma
por duas ordens de ideias. A primeira recai no caráter transitório desses
acontecimentos e seus reflexos sobre as fundações metajurídicas que inspiraram
e deram suporte a tais teorias. A segunda está na necessidade de se observar a
História em perspectiva, com o distanciamento que só o passar das décadas
permite.
O avanço do Estado sobre o mundo privado pode tê-lo transformado em
um Moloch.151
Desde os anos 1980, especialmente graças às administrações do presidente
Ronald Reagan e da baronesa Thatcher, respectivamente nos Estados Unidos da
América e no Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, o movimento de
publicização inverteu-se e o que parecia ser algo inexorável terminou por se
comprovar passageiro. O Estado saiu rapidamente de quase todas as áreas nas
quais o emprego massivo de capital público foi necessário na segunda metade do
século XX.152 As desestatizações e privatizações atingiram as atividades de
infraestrutura nas economias ocidentais.153 Mais do que câmbios ideológicos, há
quem entenda estar na raiz dessas transformações uma causa de origem mais
vulgar: “cofres públicos vazios”, porquanto “muito do que o Estado, em
quaisquer de suas formas, ao longo do tempo tomou para si, mostrou-se
impossível de ser financiado”.154 O fato é que, com a queda do Muro de Berlim e
o derretimento das economias planificadas da antiga União Soviética e dos
países da Europa do Leste, esse fenômeno atingiu fronteiras nunca imaginadas
pelos mais severos adversários da experiência socialista real iniciada em 1917,
na Rússia.155
Ideias defendidas nos anos 1940-1950, de modo pioneiro, por economistas
como Ronald Harry Coase,156 e, posteriormente, pelos representantes da Escola
de Chicago, tornaram-se majoritárias e inspiraram reformas liberalizantes cujos
efeitos até hoje se fazem sentir. Contestaram-se os fundamentos do Welfare
State157 ao mesmo tempo em que se assistiu a uma onda de desindustrialização
nos países capitalistas mais antigos, que transferiram suas plantas industriais
para a China, a Índia e o Sudoeste Asiático. A última fronteira desse processo de
desconstrução do modelo econômico do pós-guerra está agora na preservação
dos direitos sociais (trabalhistas e previdenciários) nas economias capitalistas
centrais, ameaçados pela inversão da curva demográfica e pela chamada 4ª
Revolução Industrial, advinda com a Internet e a digitalização da sociedade.
Embora o Direito tenha sido moldado pelas transformações econômicas do
século XX, o movimento inverso, de interpretação dos efeitos da era neoliberal e
da era digital, não ocorreu de modo uniforme, figurando o Direito Privado como
uma das mais notáveis exceções. Longe de significar uma adesão aos valores
econômicos que se tornaram predominantes a partir do final dos anos 1980 e que
agora são reinterpretados pela economia digital dos últimos 15 anos, a recepção
dessa nova realidade é indispensável para compreendê-la, criticá-la ou mesmo,
aos que acreditam ser isso necessário, para se conceber mecanismos de proteção
a amplos setores populacionais que assistem a uma escalada de supressão de
direitos sociais.158
As reações proto-ludistas159 a esses novos tempos já se fazem sentir com o
avanço de movimentos extremistas e a crise do solidarismo europeu, cujo
principal símbolo provavelmente está na saída do Reino Unido da Grã-Bretanha
e Irlanda do Norte da União Europeia, após o plebiscito de 2016.160
Independentemente de se concordar com tal estado de coisas, é necessário
atualizar o discurso jurídico, concebido para descrever e ajustar as estruturas
sociais ao brave new world do “novo estado industrial”161 dos anos 1950-1970,
mas que hoje pouco ou nada significa para um mundo em aguda transformação.
Se a chamada publicização revelou-se passageira e se a História, observada
como um continuum no qual um século é apenas um fragmento de uma longa
narrativa, que deve ser interpretada em sua transitoriedade, desabam os alicerces
que serviram ao discurso hegemônico no Direito Privado brasileiro de sua
publicização. Alguns textos captaram essa mudança, tanto no Direito Público
quanto no Direito Privado, embora com muito maior ênfase no primeiro. A
despeito do juízo que se possa fazer sobre suas conclusões, há de se levar em
conta o mérito de terem abertamente discutido esse novo tempo e seus efeitos,
para o bem e para o mal, sobre as pessoas e os institutos jurídicos. É disso que se
cuidará na próxima subseção.

8.5.2. O caso especial do Direito Administrativo: desestatização,


privatização e deslegalização

Antes mesmo das transformações sentidas pelo Direito Administrativo no


final dos anos 1970 e consolidadas no cair da década de 1980, as quais geraram
literatura adiante estudada, não deixa de ser notável que, nos anos 1960, Miguel
Seabra Fagundes tenha-se dedicado a estudar a contribuição do Código Civil
para o Direito Administrativo. Segundo ele, o Direito Administrativo, até por
consequência do modo como se organizou o Estado, encontrou na “legislação
civil a origem de algumas das suas principais instituições, dela recebendo-as por
cissiparidade”.
São exemplos desse legado do Direito Civil, segundo ele, a teoria das
nulidades dos atos administrativos, a responsabilidade patrimonial do Estado por
atos ilícitos, a teoria dos funcionários de fato (“que encontra raízes na gestão de
negócios do Direito Privado”) e a “noção de personalidade jurídica dos entes
públicos, precedida, no tempo, da personalidade moral reconhecida a entidades
civis”.162
No entanto, Seabra Fagundes deixa transparecer que essa recepção de
institutos do Direito Privado haveria de ser temporária e se justificaria por
elementos de caráter histórico, dado que “as normas que precedem ao Código
Civil, sob o título de Lei de Introdução, e as que o abrem, com a denominação de
Parte Geral, só assim se intitulam e nêle se ajustam, porque encerrando critérios
aplicáveis, de início, apenas às relações civis, uma vez que somente delas
cogitando, em forma sistemática, o direito positivo”.
Sob essa ordem de ideias, “tais normas, pelo cunho de generalidade, que as
faz de interêsse comum a vários setores do direito escrito, e não apenas ao
Direito Civil, antes deveriam constituir a lei dos princípios gerais, abrangedora
das relações jurídicas disciplinadas por quaisquer ramos da legislação”.163 Ele,
contudo, diverge dos que consideravam indevida a inserção de matérias
administrativistas (como a retrocessão) no Código Civil de 1916: “A
contribuição do Código para o Direito Administrativo a nós nos parece de alto
mérito”.164 Esse pensamento de Seabra Fagundes, ainda que contemporizando os
pontos de fricção entre o Direito Público e o Direito Civil (particularizado em
seu texto), foi representativo de concepções então vigentes a seu tempo.165
Os sinais de mudança começaram se notar, como dito, após a chegada ao
poder nos Estados Unidos da América e no Reino Unido da Grã-Bretanha e
Irlanda do Norte de governantes alinhados com políticas de intervenção mínima
do Estado.
A se comprovar esse câmbio, veja-se que, no final da década de 1980,
Maria João Estorninho trouxe para o Direito Administrativo lusófono alguns
aspectos da discussão alemã sobre o Direito Privado Administrativo,166 com
ênfase no emprego de institutos privatísticos em um espaço anteriormente
cerrado ao reconhecimento de sua prevalência sobre os homólogos institutos
publicísticos.167 Seu trabalho apresentava os primeiros sinais de desconforto do
Direito Administrativo com uma nova realidade de transformação conceitual e
funcional de institutos tradicionais, com as novas políticas desestatizantes.
A supremacia do interesse público sobre o interesse privado, um dogma do
Direito Administrativo de matriz francesa, começou a ser posta em causa na
literatura jurídica nacional há quase 20 anos, o que é perceptível a partir dos
artigos escritos sobre o tema, ora negando-a, ora mitigando-a ou admitindo-a
abertamente.168
Embora iniciada na administração Fernando Collor de Mello (1990-1992),
interrompida por um processo de impeachment, a desestatização e a privatização
tor-naram-se uma política de Estado nos dois governos de Fernando Henrique
Cardoso (1995-2003), o que se estruturou em torno do Plano Diretor de Reforma
do Aparelho do Estado – PDRAE, concebido pelo ministro Luiz Carlos Bresser-
Pereira. O núcleo do PDRAE “consistia em uma reorientação conceitual das
várias frações organizacionais que compõem o aparelho do Estado brasileiro”. O
perfil do Estado brasileiro, tal como desenhado na CF/1988, era visto “como
equivocado e fruto de um anseio estatista dos constituintes”. A ambição do
PDRAE era tamanha que alcançava três níveis: (i) alterar o regime estatutário
dos servidores públicos, criando uma elite com regras distintas da massa de
agentes públicos, que seria transferida para um modelo mais próximo do
celetista; (ii) a transferência para a iniciativa privada ou para regimes de
cogestão de diversas competências estatais, como cultura, educação, saúde e
produção científica e tecnológica; (iii) privatização e regulação por autarquias
especiais.169
Essa estratégia, embora não tenha alcançado todos os seus objetivos de
modo pleno, foi vitoriosa no terceiro objetivo. Mesmo com a chegada ao poder
em 2003 de um arco de forças políticas liderado por um partido de esquerda,
historicamente contrário às privatizações, esse perfil do Estado brasileiro não se
alterou de modo significativo. Como resultado, prosseguiram os câmbios
normativos para se dar fundamento a novos arranjos negociais com a
Administração, como as parcerias público-privadas, as concessões e as
permissões de serviços públicos.170
O Direito Administrativo no Brasil não se limitou a essas mudanças em
direção ao Direito Privado. As contratações privadas na Administração Pública
aumentaram em número e em diversificação. A venda de próprios nacionais,
ainda no governo Fernando Collor, e o crescimento da máquina pública, após
2003, levaram à celebração de contratos de locação predial e de contratos built to
suit (para acomodar unidades governamentais), de prestação de serviços, de
empreitada e tecnologia. Cada vez mais o Estado precisava lidar com o elemento
privatístico para realizar suas finalidades constitucionais. Embora a doutrina
administrativista tenha defendido posições clássicas sobre a persistência das
“cláusulas exorbitantes”, havia o reconhecimento da incidência de regras
civilísticas nesses arranjos negociais.171
Até mesmo serviços públicos típicos, em uma linguagem bem peculiar ao
constitucionalismo do Estado Social de Direito, como saúde, educação e
segurança pública, foram permitidos, delegados ou autorizados à iniciativa
privada, para além da utilização das organizações sociais nesse novo modelo.172
No Direito Privado, contudo, foram poucos os escritos que reconheceram
essas transformações no Direito Público, ao se permitirem falar em sua
privatização173 ou civilização,174 em contraste a uma publicização do Direito
Privado.175 Rubens Limongi França, no início dos anos 1980, é um desses raros
autores que não se deixou seduzir pelo discurso da publicização, por ele
reconhecida quanto aos “aspectos tributários e fiscais da atividade privada”.
Para ele, “o direito público se vai privatizando, por isso que, para atender a tal
imperiosidade, teve de recorrer (porque nunca as possuiu) às técnicas do direito
privado, milenarmente amadurecidas, como a das sociedades, das fundações, do
contrato de serviço”.176
Orlando Gomes, em escrito de 1983, denunciava a reprivatização do
Direito do Trabalho.177
Ainda que se não denomine de civilização do Direito Público o
aproveitamento de institutos civilísticos pelo Direito Público, ao estilo da
elegante formulação de Miguel Seabra Fagundes,178 é interessante notar que, sob
esse ângulo, não se poderia coerentemente denominar de publicização a entrada
de institutos de Direito Civil para o plano normativo público.179 Um exemplo
contemporâneo de tal aproveitamento está na aceitação de que a boa-fé objetiva
é também aplicável no âmbito do Direito Administrativo, embora com variáveis
fundamentos, alguns dos quais até mesmo contraditórios com a tese do avanço
de institutos de Direito Privado sobre a esfera pública.180
Registre-se a posição de quem afasta ambas as imagens, por entender que
“o fenômeno em questão (...) não é nem de publicização de um, nem de
privatização de outro, mas de constitucionalização de ambos”.181

116 Hans Kelsen (18811973), jurista austrohúngaro, lecionou em Viena, Colônia, Berna, Praga e Berkeley,
onde terminou seus dias, após sucessivas mudanças de nacionalidade, religião e uni versidades, por
efeito da Primeira e da Segunda Guerra Mundiais, além da ascensão do nacio nalsocialismo na
Alemanha. Judeu, socialdemocrata, progressista e coerente, Kelsen foi um dos maiores teóricos do
Direito de todos os tempos. Embora o Prêmio Nobel não seja “conce dido a juristas”, ele, no entanto,
“poderia ser incluído no pequeno círculo ilustre de uma Légion d’honneur jurídica, dado que sua
posição de ‘clássico’ em escala global é inconteste” (JESTAEDT, Matthias. Introdução. In. KELSEN,
Hans. Autobiografia de Hans Kelsen...cit. p. 12). Ele é fruto da riqueza cultural nunca depois igualada da
Viena do final do século XIX, que gerou também nomes como Robert von Musil, Theodor Herzl,
Joseph Roth, Sigmund Freud, Friedrich von Hayek, sir Karl Popper, Ludwig Wittgenstein, Gustav Klimt,
Alois Schumpeter, Hugo von Hofmannsthal, Gustav Mahler e Karl Kraus. Essa mesma Viena foi
chamada de “a monstruosa residência de um rei já morto e de um deus ainda por nascer” ou de o
“laboratório do Apocalipse”, respectivamente, por von Hofmannsthal e Kraus (ROUDINESCO,
Elisabeth; PLON, Michel. Dicionário de Psicanálise. Tradução de Vera Ribeiro e Lucy Magalhães.
Supervisão da edição brasileira por Marco Antonio Coutinho Jorge. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. p.
775).
117 Sobre o papel de Kelsen na crítica aos fundamentos da diferenciação específica entre Direito Público

e Direito Privado: BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und
öffentlichem Recht. Archiv für die civilistische Praxis – AcP, v. 194, fascículo 1, p. 319351, 1994. p. 323.
118 KELSEN, Hans. Hauptprobleme der Staatsrechtslehre entwickelt aus der Lehre vom Rechtssatze.
Tübingen: Mohr (Paul Siebeck), 1911, p. X.
119 VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria da norma jurídica. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 308.
120 Reconhecidamente, os regimes totalitários e autoritários foram os grandes defensores, seja por seus
atos, normas e documentos oficiais, seja por seus juristas, do fim da dicotomia entre o Direito Público
e o Direito Privado: “Merece maior atenção a recorrente hostilidade, neste século, de in fluentes
ideologias políticas às grandes bifurcações sistemáticas, em particular aos componentes do sistema
e, mais especialmente, ao Direito Privado. Sua autonomia foi contestada sob o prestí gio do Nazismo,
que só poderia ser, em alguma medida, subtraída à ideologia da Gemeinschaft e ao Führerprinzip”
(BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.
322).
121 DIAS, Gabriel Nogueira. Positivismo jurídico e a teoria geral do direito: na obra de Hans Kelsen. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 177.


122 O “selo positivista” é identificável também na obra de positivistas como Herbert Lionel Adolphus Hart
(The concept of Law. 2. ed. Oxford: Oxford University Press, 1994. p. 100 ss).
123 “Jedenfalls halte ich an dem Postulate einer einzigen allgemeinen Rechtslehre und einheitlicher
juristischer Grundbegriffe fest, die allen Rechtsgebieten gemeinsam sind und für alle Gebiete nach
denselben methodologischen Prinzipien zu konstruieren sind”. (KELSEN, Hans. Hauptprobleme der
Staatsrechtslehre, p. X.)
124 Como já se defendeu em: “O Direito privado tem sua História, sua metodologia, seus princípios e suas

funções no que se poderia chamar de ‘divisão do trabalho’ entre as diversas províncias jurídicas. Não
é adequado fazer o transplante desses elementos do Direito Público para o Direito Privado. O
estatuto epistemológico do Direito Privado não se coaduna com essa transposição, por que
desnecessária e imprópria” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil
contemporâneo na tradição de civil law em face do neoconstitucionalismo e dos princípios. O Direito
(Lisboa), v. 143, p. 4366, 2011. p. 64).
125 MICHAELS, Ralf; JANSEN, Nils. Private law beyond the State? Europeanization, globalization, priva-
tization. American Journal of Comparative Law, v. 54, p. 843890, 2006. p. 889890.
126 No Brasil, mesmo nos anos 1970, falavase em uma “desprivatização” ou “publicização” de “largos

setores do Direito Privado”, que ocorreria “em toda a parte, em regimes monárquicos ou repu-
blicanos, parlamentares ou não parlamentares, federativos ou não federativos, de capitalismo
privado ou de capitalismo privado com capitalismo de Estado, ou de capitalismo de Estado em
monopólio. O que difere é o grau da interveniência, mas em substância o fenômeno ostenta sua
homogeneidade essencial” (VILANOVA, Lourival. Fundamentos do estado de direito. Revista do
Instituto dos Advogados Brasileiros, v. 12, no 54, p. 6580, jan./jun. 1978).
127
Decretolei no 5.452, de 1º de maio de 1943.
128 Especificamente quanto às leis do inquilinato e seu papel social: MOREIRA ALVES, José Carlos.

Panorama do Direito Civil brasileiro: das origens aos dias atuais. Revista da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, v. 88, p. 185238, jan./dez. 1993. p. 222.
129 MOREIRA ALVES, José Carlos. Panorama do Direito Civil brasileiro: das origens aos dias atuais... p. 224-

225.
130 SAVATIER, René. Du Droit Civil au Droit Public. Paris: LGDJ, 1950, p. 13 e ss. Sobre a democratiza ção do

Direito: RIPERT, Georges. O regimen democrático e o Direito Civil moderno. Tradução de J. Cortezão. São
Paulo: Saraiva, 1937. p. 1970 (a tradução brasileira baseouse na edição francesa de 1936: RIPERT,
Georges. Le regime democratique et le Droit Civil moderne. Paris: LGDJ, 1936); SCAFF, Fernando
Campos. As novas figuras contratuais e a autonomia da vontade. Revista da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, v. 91, p. 141159, 1996. p. 144 (referindose à doutrina francesa da
moralização do contrato).
131 Citamse algumas obras do período que analisam a questão do dirigismo contratual: RIPERT, Georges.

La règle morale dans les obligations civiles. 4. ed. Paris: LGDJ, 1949. p. 130 e ss.; JOSSERAND, Louis. Les
dernières étapes du dirigisme contractuel: Le contrat forcé et le con trat legal. Dalloz: Recueil
Hebdomadaire, no 2, Chronique II, p. 58, 1940 (aqui Josserand critica os excessos do dirigismo,
embora tenha atacado o individualismo jurídico em outras oportu nidades).
132 A República Francesa foi invadida por forças militares do Reich alemão em 1940. O armistício foi

celebrado em 22 de junho de 1940, tendose definido que parte do território francês seria mantido
sob administração independente do Governo Militar alemão para as áreas ocupadas. O presidente
Albert Lebrun nomeou para o cargo de primeiroministro o marechal Philippe Pétain, que, em julho
de 1940, se tornou chefe de Estado do que passou à História como o Regime de Vichy, dado que a
sede do governo foi transferida para uma estância hidrotermal com esse nome. O governo de Pétain
ficou conhecido como “colaboracionista”, pois, enquanto durou, ser viu aos interesses alemães,
perseguindo judeus e compatriotas que não se renderam e prosse guiram a luta contra o invasor sob
a liderança do general de brigada Charles de Gaulle, futuro liberador da França em 1944. Grande
parte da elite política, militar, econômica e jurídica fran cesa tornouse “colaboracionista” e cooperou
ativamente com o governo de Pétain e o invasor alemão. A esse respeito, Robert Aron (Histoire de
Vichy. 19401944. Paris: Fayard, 1954. p. 97) assinala que Vichy surge em julho de 1940 como palco de
um dos mais impressionantes momen tos políticos da História da França: o lugar onde a República
comete suicídio legalmente e onde um golpe de estado é aprovado por suas próprias vítimas.
Poucos juristas, como René Cassin, Joë Nordmann e Pierre Cot, uniramse à França Livre e saíram do
conforto de suas posições para dar combate ao regime protofascista de Vichy (CASSIN, René. Vichy or
Free France? Foreign Affairs, v. 20, no 1, p. 103104, out. 1941). Os “juristas de Vichy” escreveram uma
página pouco lembrada da historiografia do Direito: “Um dos exemplos mais vergonhosos é o de um
jurista muito citado e admirado no Brasil, Adolphe Marie Louis Georges Ripert (18801958). La règle
morale dans les obligations civiles (A regra moral das obrigações civis) é provavelmente seu livro de
maior influência no Brasil. (...) Ripert foi um dos pioneiros na defesa de uma certa decadência do
Direito Civil e de sua publicização, que começou a se divulgar nos anos 1960 no país e ganhou ares
quase hegemônicos nos últimos 20 anos. O solidarismo ripertiano ainda é bem forte, a despeito dos
quase 70 anos de seu surgimento. Ripert foi ministro de Estado da Educação e Juventude no governo
de Vichy e, nessa condição, abandonou suas posições filossemíticas dos anos 1930, ao tempo em que
autorizou a elaboração de listas de judeus que ocupavam postos no serviço edu cacional. Cassin foi
uma das vítimas de Ripert, tendo perdido sua cátedra universitária por efeito da nova legislação
antissemita. O ministro Georges Ripert assinou o ato de demissão de Cassin” (RODRIGUES JR., Otavio
Luiz. Direito Comparado: Como se produz um jurista? O modelo fran cês [Parte 12]. Consultor Jurídico,
6 de maio de 2005. Disponível em: http://www.conjur.com. br/2015mai06/direitocomparadoproduz-
juristamodelofrancesparte12. Acesso em 174 2017). Com a vitória da Resistência em 1944, Georges
Ripert chegou a ser preso, mas foi liberado posteriormente e terminou seus dias na cátedra
universitária sem ser molestado (Cf. HALPÉRIN, JeanLouis. Georges Ripert. In. ARABEYRE, Patrick;
HALPÉRIN, JeanLouis; KRYNEN, Jacques. Dictionaire historique des juristes français: XIIXX siècle. Paris:
PUF, 2007. p. 669).
133 FARIA, Anacleto de Oliveira. Reflexões sobre o socialismo jurídico. Revista da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, v. 69, no 1, p. 3166, 1974. p. 4244.
134
AZEVEDO, Noé. A socialização do Direito Penal. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 16, no 63, p. 449-
463, out. 1927; MORAES, Justo de. A socialização do Direito contemporâneo. Archivo Judiciario, v. 42,
p. 4952, abr./jun. 1937; REZENDE FILHO, Gabriel José Rodrigues de. Socialização do Direito. São Paulo:
Universidade de São Paulo, 1941; AMADO, Gilberto. Direito Público e Direito Privado: socialização dos
meios de produção. Revista Forense, v. 43, no 105, p. 170172, jan./mar. 1946; FONSECA, Arnoldo
Medeiros da. Socialização e humanização do Direito. Revista Forense, v. 49, no 141, p. 714, maio/jun.
1952.
135 AZEVEDO, Noé. A socialização do Direito Penal... loc. cit. Essa abordagem do texto foi originalmen te
feita por: GRECO, Luís. Comentário ao estudo “A socialização do Direito Penal”, de Noé Azevedo.
Revista dos Tribunais, v. 921, p. 4655, jul. 2012.
136 GIORGIANNI, Michele. O Direito Privado e as suas atuais fronteiras. Tradução de Maria Cristina de

Cicco. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 87, no 747, p. 3555, jan. 1998.
137 Sobre o contraponto entre o “individualismo” do Código Civil português de 1867 e o caráter “social”
do futuro Código de 1967: “Numa palavra, já não é de hoje a insistência por um direito de carácter
social, a cujos ideais não poderia corresponder o nosso velho Código de marcada feição liberal e
individualista” (COSTA, Mario Julio de Almeida. Enquadramento histórico do Código Civil português.
Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no 37, p. 138160, 1961. p. 158159).
138 REIS, Thiago. Dogmática e incerteza normativa: crítica ao substancialismo jurídico do direito civil-

constitucional. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 11, ano 4, p. 213238, abr. jun. 2017. § 3.
139 RAMOS, Luiz Felipe Rosa; SILVA FILHO, Osny da. Para entender Orlando Gomes. Rio de Janeiro: Elsevier,

2015. p. XV.
140 REIS,
Thiago. Dogmática e incerteza normativa: crítica ao substancialismo jurídico do direito civil-
constitucional...cit. § 3.
141 GOMES, Orlando. Raízes históricas e sociológicas do Código Civil brasileiro.
Salvador: Livraria Progresso,
1959. § 2.
142 GILMORE, Grant. The death of contract. Ohio: Ohio State University, 1974; HORWITZ, Morton J. The

transformation of American law, 1780-1860. London: Harvard University Press, 1977; ATIYAH, Patrick. S.
The rise and fall of freedom of contract. Oxford: Clarendon, 1979.
143 Na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, há sinais de mudança quanto a essa visão atomís-
tica do Direito Privado, que deita suas raízes no final do século XIX, quando se fez a opção por um
caminho propedêutico autônomo em relação aos modelos da Europa continental. É um movimento
que se denominou “The New Private Law” e cuja apresentação pública ocorreu em 2001, em um
simpósio na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. The New Private Law expressa um
certo cansaço com a predominância do Law and Economics e dos Critical Legal Studies no discurso
acadêmicojurídico norteamericano, e defende a retomada da autonomia epistemológica do Direito
Privado, a partir de seus conceitos tradicionais (cf. HOSEMANN, Eike Götz. „The New Private Law“: Die
neue amerikanische Privatrechtswissenschaft in historischer und vergleichender Perspektive. Rabels
Zeitschrift für ausländisches und internationales Privatrecht, v. 78, p. 3770, 2014).
144 GILMORE, Grant. The death of contract…p. 87, 9596 e 101.
145 HORWITZ, Morton J. The transformation of American law, 17801860…p. 81.
146 HORWITZ, Morton J. The transformation of American law, 17801860…p. 99100.
147 HORWITZ, Morton J. The transformation of American law, 17801860…p. 192.
148 ATIYAH, Patrick S. The rise and fall of freedom of contract…cit. p. 86, 104 e 116.
149 FARNSWORTH, Alan. Contracts. 4. ed. New York: Aspen, 2004, p. 29 e ss.
150 Nooriginal, systematische Unterscheidung (BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unter scheidung
von Privatrecht und öffentlichem Recht...p. 323).
151 Divindade dos povos amorreus que devorava crianças (Levítico XX:25). A metáfora foi retirada de um

texto de Robert Alexy, no qual ele compara o tribunal constitucional alemão a um estra nho Moloch,
que devora a vítima e a si mesmo, quando deseja controlar os demais poderes. A afirmação é mais
provocativa do que expressiva do pensamento de Alexy (ALEXY, Robert. Direito constitucional e
direito ordinário: jurisdição constitucional e jurisdição especializada. Tradução de Luís Afonso Heck.
Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 91, no 799, p. 3351, mai. 2002).
152 Não é coerente esquecer uma exceção a esse processo de liberalização e privatização nos anos 1980:

a França, após a vitória do candidato socialista François Mitterrand (19161996), que go vernou o país
de 1981 a 1995. Na primeira fase de seu mandato, houve uma onda de estatizações de diversos
setores da economia francesa, até mesmo no sistema bancário. Em 1986, esse pro cesso foi
interrompido e começouse sua reversão, com a privatização de companhias públicas e a liberação do
mercado de bens e serviços. A administração Mitterrand, em sua fase estatizante, no entanto, marcou
o nascimento de um Direito Público dos Negócios (HALPÉRIN, JeanLouis. The French model: The
construction of Public law through the development of state liability for wrongs. In. BENACCHIO,
Gian Antonio; GRAZIADEI, Michele (Orgs.) Il declino della distinzione tra Diritto Pubblico e Diritto Privato:
Atti del IV Congresso Nazionale SIRD, Trento, 2426 settembre 2015. Trento: Università degli Studi di
Trento, 2016. p. 39).
153 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. A arbitragem e o Direito do Consumidor. Revista da Faculdade de

Direito da Universidade de São Paulo, v. 91, p. 265275, 1996, p. 266.


154 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.
328. Giulio Napolitano (Pubblico e privato nel diritto amministrativo. Milano: Giuffrè, 2003. p. 81 ss.)
tem uma visão mais positiva sobre as causas da privatização e da desestatização ocorridas no
período: elas resultariam da modernização do aparato administrativo, do aumento do espaço dado à
iniciativa privada, do interesse em abrir espaços de diálogo e de colaboração entre a Administração e
os cidadãos, mas, é claro, também do propósito de restaurar as finanças públicas. Quanto a este
último objetivo, Napolitano e Bydlinski estão de acordo.
155 No sentido de que o fim da experiência socialista no Leste Europeu deuse fundamentalmen te pela

incapacidade econômica: BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht
und öffentlichem Recht...p. 327328.
156 COASE, Ronald H. A firma, o mercado e o direito. Traduzido por Heloisa Gonçalves Barbosa. Revisão da
tradução por Francisco Niclós Negrão. Estudo introdutório de Antonio Carlos Ferreira e Patrícia
Cândido Alves Ferreira. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2016. p. 95 ss (o Capítulo 5, O problema
do custo social, elaborouse sob influência do artigo: COASE, Ronald. The Federal Communications
Commission. The Journal of Law and Economics, v. 2, p. 140, Oct. 1959).
157 Em português, estado do bemestar social.
158 Parauma crítica a esse processo, com ênfase na realidade europeia, confirase: SUPIOT, Alain. The
publicprivate relation in the context of today’s refeudalization. International Journal of Constitutional
Law, v. 11, no 1, p. 129145, Jan. 2013. p. 140 e ss.
159 A referência é uma variante do movimento britânico surgido durante a Revolução Industrial, carac-

terizado pela atuação dos ludistas, um grupo dedicado à destruição das máquinas e à sublevação
contra o elemento tecnológico que avançava, com o uso do tear mecânico e da máquina a vapor.
Seu nome devese à figura mítica de Ned Ludd, cuja existência é controversa. Em 1779, Ludd te ria
destruído máquinas na tecelagem de uma vila de Leicestershire (HENDRICKSON JR., Kenneth.
Luddites and Ned Lud. In. HENDRICKSON III, Kenneth (Ed.). The encyclopedia of the Industrial
Revolution in world history. Lanham: Rowman & Littlefield, 2015, v. 3, p. 572). O crescimento da
tecnologia da informação nas últimas décadas, especialmente com o advento da Internet, criou uma
espécie de reação de amplos setores das classes trabalhadoras dos países capitalistas cen trais
(Estados Unidos, os red necks; Reino Unido, operários da “velha” indústria britânica, que
paulatinamente se transfere para a Ásia; França, habitantes das antigas regiões industriais do Reno),
por meio de votações em partidos de extremadireita ou de extremaesquerda, sem com promissos
com a União Europeia e com agendas xenófobas. A reação física dos taxistas contra os motoristas de
aplicativos como o Uber, em várias metrópoles ocidentais, também pode ser mencionada. O termo
proto-ludista significa essa antessala de uma possível reação mais violenta contra as novas
tecnologias (GRAHAM, Gordon. The internet: a philosophical inquiry. New York: Routledge, 1999. p. 6-
7). Uma conhecida síntese histórica dos movimentos contra a tecnologia pode ser vista em: JONES,
Steven E. Against technology: from Luddites to NeoLuddism. New York: Routledge, 2006.
160 A proposta de saída do Reino Unido da GrãBretanha e Irlanda do Norte da União Europeia ficou
conhecida como Brexit, em uma flexão das palavras Britain e exit (saída). Essa sigla povoou os
noticiários mundiais nos últimos tempos, acompanhada pelo debate político circundante, fer-
mentado pelo fortalecimento de partidos de viés nacionalista (contrários à permanência na União
Europeia). Em 2016, houve um plebiscito não vinculante para decidir a questão, e a vontade da
maioria foi pela efetiva saída. A questão envolve sensíveis problemas políticos, como a aparente falta
de uma verdadeira identificação políticocultural entre o Reino Unido e a União Europeia e a
valorização do elemento nacional.
161 Expressão que serve de título ao livro O novo Estado industrial (1967), do economista John Kenneth

Galbraith (19082006), nascido no Canadá e naturalizado norteamericano. O foco dessa obra está na
“profunda interpenetração entre as estruturas tecnoburocráticas do setor privado e do setor
público”. Ele “cunhou uma expressão para caracterizar esse fenômeno: ‘simbiose burocráti ca’”,
representativo da ideia de que “a tecnoestrutura das grandes empresas procura influenciar
sistematicamente as políticas públicas, provendo os técnicos e nomeando políticos que tomarão as
decisões relevantes para o desenvolvimento das suas atividades privadas” (SUPLICY, Eduardo
Matarazzo. Revista de Economia Política, v. 26, no 4 (104), p. 619626, out. dez. 2006. p. 621). Estado
industrial e economia industrial converteramse em expressões muito comuns em títulos de livros
jurídicos, especialmente nos anos 19601980, como se nota de duas obras alemãs de referência até os
dias atuais: FORSTHOFF, Ernst. Der Staat der Industriegesellschaft: Dargestellt am Beispiel der
Bundesrepublik Deutschland. 2. ed. inalterada. München: Beck, 1971, e em WIEACKER, Franz.
Industriegesellschaft und Privatrechtsordnung. Frankfurt am Main: Fischer, 1974.
162 SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da contribuição do Código Civil para o Direito Administrativo...cit. p. 1.
163 SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da contribuição do Código Civil para o Direito Administrativo...p. 6.
164 SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da contribuição do Código Civil para o Direito Administrativo...p. 24.
165 Em um sentido aproximado, na literatura administrativista contemporânea: “Com o direito civil, ramo

do direito privado, o direito administrativo mantém muitos pontos de conexão. Devese lembrar que,
nos primórdios de sua formação, os institutos do direito civil forneceram os alicer ces para a
construção do novo ramo. Assim, por exemplo, a teoria dos atos jurídicos foi a base da teoria dos atos
administrativos” (MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 18. ed. rev. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014. p. 52). Igualmente: “Constatase, historicamente, que a teoria do Direito
civil possui suas raízes nas civilizações antigas. E é natural, do ponto de vista da ciência do Direito,
que as novas formulações teóricas – como se passa com o Direito adminis trativo – aproveitem
raciocínios e construções já edificados, ao longo dos séculos, por pensadores dedicados a certo ramo
da ciência do Direito, ramo esse que, por circunstâncias históricas, tenha anteriormente se
evidenciado como objeto de estudo” (MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato administrativo.
São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 16).
166 Em alemão, Verwaltungsprivatrecht.
167 ESTORNINHO, Maria João. Requiem pelo contrato administrativo. Coimbra: Almedina, 1990. Em obra
mais recente, a autora esclarece que a “fuga para o Direito Privado” no âmbito do Direito
Administrativo teria por causa remota o “processo de alargamento das tarefas da Administração
Pública, no Estado Social”, cujos efeito é esta “passar a utilizar o meio de actuação mais típico do
Direito Privado, o contrato” (ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o direito privado: Contributo para o
estudo da actividade de direito privado da Administração Pública. 2. reimpressão. Coimbra:
Almedina, 2009. p. 42).
168 OSÓRIO, Fábio Medina. Existe uma supremacia do interesse público sobre o privado no Direito
Administrativo brasileiro? Revista dos Tribunais, v. 88, no 770, p. 5392, dez. 1999; SARMENTO, Daniel. A
trajetória da dicotomia públicoprivado. Revista Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 6, no 22, p. 239257,
abr./jun. 2005; ABBOUD, Georges. O mito da supremacia do interesse público sobre o privado: a
dimensão constitucional dos direitos fundamentais e os requisitos necessários para se autorizar
restrição a direitos fundamentais. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 100, no 907, p. 61119, maio 2011;
SILVA, Frederico Rodrigues. A relatividade da supremacia do interesse pú blico: um estudo
comparado. Direito público: Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), v. 8, no 43, p. 195230, jan./fev.
2012; MADUREIRA, Claudio Penedo. Supremacia do interesse público sobre o privado: uma
necessária desconstrução da crítica. Fórum administrativo, v. 14, no 161, p. 924, jul. 2014.
169 VERONESE, Alexandre Kehrig. A judicialização das políticas públicas de telecomunicações e as

demandas dos consumidores: o impacto da ação judicial. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro:
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2011. p. 3132.
170 Para uma ampla visão desses novos arranjos: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na
administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria públicoprivada e outras
formas. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
171 “Como já dito, os contratos administrativos são disciplinados pelas regras e princípios do direito pú-

blico, conforme dispõe a Lei 8.666/93. Nada impede, porém, que regras e princípios do direito
privado no caso acima foram aplicadas regras do Código Civil sejam aplicados no âmbito dos
contratos administrativos. Isto ocorrerá sempre que não existirem regras ou princípios do direito
público que possam ser utilizados para a solução de questões verificadas em contratos celebra dos
pela Administração Pública, e desde que essas regras ou princípios do direito privado sejam
compatíveis com o direito público” (FURTADO, Lucas Rocha. Contratos administrativos e contratos de
direito privado celebrados pela administração pública. Revista do Tribunal de Contas da União, v. 31,
no 86, p. 4159, out./dez. 2000. p. 4243).
172 “Emboraentenda eu não se tratar propriamente de uma privatização (pois que não se alienam os
bens ou a atividade, transferidos que são eles mediante contrato passível de extinção ou desqua-
lificação da OS), tal trespasse de atividade pública implica uma redução do campo de atuação es tatal
mediante introdução da gestão privada sobre o serviço público antes direta e integralmente a cargo
do Estado” (MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Público e privado no setor de saúde. Revista de
direito público da economia, v. 3, no 9, p. 105154, jan./mar. 2005).
173 Essa expressão é também encontrável em obras estrangeiras: KÖNDGEN, Johannes. Privatisierung

des Rechts: Private Governance zwischen Deregulierung und Rekonstitutionalisierung. Archiv für die
civilistische Praxis – AcP. v. 206, p. 477525, 2006. p. 478 e ss.; GALGANO, Francesco. Pubblico e privato
nell’organizzazione giuridica. Contratto e impresa, v. 2, p. 35775, 1985.
174 Com ironia, em relação às duas faces da moeda: “Com efeito, uns falam com arrogância de ‘civili-

zação do direito constitucional’ e outros respondem com igual sobranceira com a ‘constituciona-
lização do direito civil’” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Dogmática de direitos fundamentais e
direito privado. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e Direito Privado.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 339). Citando exemplo em relação a um dado instituto
jurídico: “Não fosse por isso, a doação modal avulta em importância no direito administrativo, pois é
um dos mecanismos de que dispõe o poder público para fomentar a cons trução de instalações
industriais e comerciais. Ao civilista é caro constatar, aqui, um exemplo da ‘civilização do direito
público’, vale dizer, a incidência de um contrato civil no âmbito da adminis tração pública”
(MARQUESI, Roberto Wagner. A doação modal no Código Reale. Revista de Direito Privado, v. 11, no
42, p. 91105, abr./jun. 2010. item 1).
175
MARQUESI, Roberto Wagner. Fronteiras entre o direito público e o direito privado. Arte jurídica, no 1,
p. 257276. 2005. p. 266267, especialmente; MATIAS, João Luis Nogueira; PINHEIRO, Afonso de Paula.
Atuação estatal na ordem pública e privada. Nomos: Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC,
no 25, p. 97111, jan./dez. 2006. Em texto fundamental, Norberto Bobbio (Estado, governo, sociedade:
para uma Teoria Geral da Política. Tradução: Marco Aurélio Nogueira. 17. reimpr. São Paulo: Paz e
Terra, 2011. p. 26) anota que: “De fato, o processo de publicização do privado é apenas uma das faces
do processo de transformação das sociedades industriais mais avançadas. Ele é acompanhado e
complicado por um processo inverso que pode chamar de pri vatização do público. Ao contrário do
que havia proposto Hegel, segundo o qual o Estado como totalidade ética terminaria por se impor à
fragmentação da sociedade civil, interpretada como ‘sistema da atomística’, as relações de tipo
contratual, características do mundo das relações pri vadas, não foram realmente relegadas à esfera
anterior das relações entre indivíduos e grupos menores, mas reemergiram à fase superior das
relações politicamente relevantes”.
176
FRANÇA, R. Limongi. Direito Privado. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 4, no
11, p. 3341, jan./mar. 1980. Itens 4 e 5.
177 GOMES, Orlando. Perspectivas atuais da CLT. In. GOMES, Orlando. Novos temas de Direito Civil. Rio de
Janeiro: Forense, 1983. p. 326.
178 SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da contribuição do Código Civil para o Direito Administrativo...p. 1, 6 e

24.
179 Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado: Parte Geral. Introdução: pessoas
físicas e jurídicas. Atualizado por Judith MartinsCosta, Gustavo Luís da Cruz Haical e Jorge Cesa
Ferreira da Silva. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 139) criti ca a ideia de que
isso se trate de uma privatização do Direito Público: “Quando, no direito pú blico, se invoca regra de
lei, ou princípio de direito privado, não é para se privatizar o direito público: é para que êsse se revele,
em sua plenitude; recorrese ao direito privado, porque é de entenderse que o direito público e o
direito privado, pertencendo ao mesmo sistema ju rídico, são inspirados pelos mesmos temas e fins;
portanto, que o igual é tratado igualmen te. É o que se passa com todos os compartimentos em que
há vazio: o que é de um dêles se comunica”.
180 Sobre a aplicabilidade da boafé objetiva no Direito Administrativo: NOBRE JUNIOR, Edilson Pereira. O

princípio da boa-fé e sua aplicação no Direito Administrativo brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris, 2002. passim. Na jurisprudência, encontrase um acórdão do STJ que reco nhece, de modo
expresso, a transposição da boafé objetiva, citandose o BGB, para as relações de Direito
Administrativo: “Prestigiase o primado da confiança, assente no § 242, Código Civil alemão, e
constante do ordenamento jurídico brasileiro como cláusula geral que ultrapassa os limites do
Código Civil (arts. 113, 187 c/c art. 422) e que influencia na interpretação do Direito Público, a ele
chegando como subprincípio derivado da moralidade administrativa. Ao caso aplicase o que a
doutrina alemã consagrou como ‘pretensão à proteção’ (Schutzanspruch) que serve de fundamento à
man tença do acórdão recorrido” (STJ. REsp 944.325/RS, rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma,
j. 04/11/2008, DJe 21/11/2008).
181 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do

Direito Constitucional no Brasil). Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 58, p. 129 173, jan.
mar. 2007. Item 4.2.
CAPÍTULO SEGUNDO

AS NOVAS FRONTEIRAS DO DIREITO PRIVADO


CONTEMPORÂNEO (OU SOBRE COMO AVIVENTAR
RUMOS APAGADOS E RENOVAR MARCOS ARRUINADOS
OU DESTRUÍDOS)

SUMÁRIO. § 9. Introdução: Refeudalização e novas fronteiras. § 10.


Pluralismo jurídico: Expertenrecht, soft law e Internet. 10.1. O direito dos
especialistas e o soft law. 10.2. Regula ção públicoprivada da Internet? §
11. Paradigmas em crise e o “bando dos quatro”. § 12. Novas fronteiras
para o direito privado. 12.1. Introdução. 12.2. Direito de Família: O avanço
da autodeterminação sobre a tutela estatal. 12.3. Direito das Sucessões:
simplificação e flexibilização. 12.4. Estatuto da Pes soa com Deficiência
(EPD): mais autonomia, menos proteção? 12.5. Direito Civil e
antidiscriminação: Experiências norte americana e alemã. 12.6.
“Privatização” do Direito Processual? 12.7. Direito Ambiental e a “tragédia
dos comuns”. 12.8. Anti truste e private enforcement: tutela privada da
concorrência. § 13. Conclusões parciais.
§9. INTRODUÇÃO: REFEUDALIZAÇÃO E NOVAS FRONTEIRAS
O debate sobre a privatização do Direito Administrativo e seus institutos é
relativamente antigo. Em geral, a privatização se apresenta como um
contraponto à publicização do Direito Privado. Independentemente dessa função
de prova por contraste (publiciza-se mas também privatiza-se o Direito), esse
discurso, na maioria das vezes, vem acompanhado de críticas ou de reservas
quanto à “grande dicotomia”.182 Ressalvam-se alguns textos que se ocupam
apenas do Direito Administrativo e registram ou criticam sua privatização, sem
que precisem contrastar a publicização com a privatização.183 Não é admissível
examinar e defender a permanência da “grande dicotomia” com base nessa
discussão, cuja importância não se nega, mas que é muito restrita ao Direito
Administrativo e não consegue capturar as enormes transformações histórico-
jurídicas dos últimos anos.
Se foi dito, e não poucas vezes, que as “fronteiras atuais” do Direito
Privado em relação ao Direito Público estavam borradas, talvez seja o caso de
“aviventar rumos apagados e renovar marcos destruídos ou arruinados”, com
base na observação empírica dos câmbios sociais e históricos das últimas
décadas e de seus fundamentos teóricos. Dito de outro modo, é possível defender
a diferenciação entre o Direito Público e o Direito Privado, não por amor ao
passado, mas por mera observação de exemplos práticos contemporâneos.
Nesse sentido, em textos mais recentes, chega-se até ao conceito de
“refeudalização do Direito”, que se iniciara com o triunfo neoliberal, no
crepúsculo dos anos 1980, no Ocidente.184
Para Alain Supiot, essa refeudalização é algo diverso do retorno à Idade
Média, mas corresponderia a uma “reemergência da estrutura jurídica” que se
considerava obsoleta desde o surgimento dos estados nacionais na Europa
moderna.185 Baseado na tese de que as categorias históricas podem assumir
formas diversas ao longo do tempo e que a História não se desenvolve em um
continuum, o professor do Collège de France defende que, nos dias de hoje,
revivem-se estruturas feudais sob novas vestes. Na União Europeia, os Estados
relacionam-se como suseranos e vassalos, exercendo aquela o poder indireto
sobre as populações, que recorrem a seus governantes nacionais em renovado
nível de suserania e vassalagem. Os direitos de propriedade convertem-se em
direitos feudais sobre as coisas. Como no Medievo, não haveria mais uma
relação direta de propriedade sobre a terra, que se organizava sob camadas de
domínio útil e de domínio eminente.186 As novas tecnologias, as transformações
dos direitos autorais e de propriedade industrial não permitem mais se afirmar
que haja uma relação definitiva de aquisição da propriedade desses bens ou da
proteção aos titulares de direitos autorais. É o exemplo dos aplicativos de
serviços over the top ou da “aquisição” de livros eletrônicos ou músicas por
mecanismos de streaming.
§10. PLURALISMO JURÍDICO: EXPERTENRECHT, SOFT LAW E INTERNET

10.1. O direito dos especialistas e o soft law


A confirmar a utilidade e a atualidade das discussões que são o objeto deste
capítulo, Johannes Köndgen, proferiu conferência no encontro anual da
Associação de Professores de Direito Civil da Alemanha,187 de setembro de
2005, dedicada à “Privatização do Direito”. Na abertura de sua exposição, ele
ironizou o fato de que, com a escolha do tema a Associação teria ingressado na
pós-modernidade. No entanto, ele não seria tão avant-garde como parece à
primeira vista, pois o tópico é muito mais velho do que a própria Associação. A
dogmática civil alemã, segundo ele, já estudava o fenômeno das cláusulas gerais
e seu avanço no Direito desde a década de 1920, elas mesmas um exemplo desse
processo de transferência do poder de criação jurídica para os particulares. Essa
passagem do texto não pode deixar de surpreender a um leitor brasileiro.188
Manifestações mais recentes dessa privatização estariam no chamado
Expertenrecht, o conjunto de normas produzidas por especialistas ou
organizações privadas de expertos, de caráter não estatal, mas que, na prática,
vincula os agentes interessados em exercer uma atividade econômica ou
profissional, em utilizar determinada tecnologia ou obter o licenciamento de
novos produtos.
São exemplos desse direito não estatal: a) os International Financial
Reporting Standards, que reúnem um conjunto de padrões internacionais de
contabilidade, que permitem a comparação, a harmonização e o controle
uniforme dos balanços das empresas de modo transnacional. Obedecer a essas
normas é conseguir um selo de qualidade nos critérios de governança
corporativa; b) as regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT
ou, no caso do texto, do Deutsches Institut für Normung, o Instituto Alemão de
Normalização, uma entidade privada, mantida por corporações, mas que
celebrou convênio com o Governo da República Federal da Alemanha para
elaborar normas técnicas nos mais diversos setores da economia (construção,
engenharia elétrica, ergonomia, equipamentos ópticos, aeroespaciais,
radiológicos, dentre outros);189 c) a International Organization for
Standardization – ISO (Organização Internacional para a Padronização), com
sede em Genebra, Suíça, que é reapresentada no Brasil pela ABNT, e se tornou
conhecida pelas certificações ISO 9000 e ISO 9001, que consistem na adoção de
práticas destinadas a padronizar os processos industriais ou terciários de
produção ou de prestação de serviços. O elemento democrático está na estrutura
e nos métodos de trabalho da ISO;190 d) os International Comercial Terms –
INCOTERMS (Termos Internacionais de Comércio), com as cláusulas CIF, FOB,
criados em 1936 pela Câmara de Comércio Internacional (CCI), em Paris, com a
finalidade de informar ex ante e de modo universalmente compreensível o
momento a partir do qual os riscos e custos passam a ser responsabilidade do
comprador de uma mercadoria.191
Esse direito dos especialistas, embora não fundado na autoridade estatal,
eventualmente gera efeitos muito mais relevantes do que aqueles produzidos por
normas do Estado. Restrições de importação a produtos que não observam
normas técnicas podem ser muito mais danosas do que barreiras alfandegárias de
caráter tributário. A privação ao acesso a bolsas de valores ou o óbice à obtenção
de financiamentos de bancos estatais podem ter por causa a desconformidade da
empresa com padrões internacionais de contabilidade ou de gestão corporativa.
A inadequação a padrões fitossanitários não estatais pode dar ensejo a severos
prejuízos a exportadores de produtos agropecuários. São diversos os exemplos
de regras produzidas por agentes privados, acreditadas ou não por órgãos
públicos, que se enquadram em um conceito há muito tempo conhecido no
Direito Internacional, que é o de soft law. Aqui, no entanto, tem-se um conjunto
de normas de criação privada e cujos destinatários diretos são particulares, posto
que indiretamente por elas sejam atingidos órgãos ou entes públicos, quando não
a própria coletividade.
Conhece-se há muito tempo o universo das normas de conduta profissional,
de boas práticas e os códigos privados de natureza deontológica, ao passo em
que esses se têm ampliado em número e importância nos últimos anos.
No Brasil, as corporações profissionais (médicos, advogados, contabilistas,
economistas, engenheiros, dentre outros) possuem seus códigos de ética, todos
de natureza privada, embora se possa, em último caso, admitir que seus
fundamentos derivam indiretamente das leis que criaram os conselhos
profissionais. 192 Nem se há de falar da Ordem dos Advogados do Brasil, regida
por um Conselho Federal, que possui assento constitucional e participação
obrigatória em diversos atos administrativos complexos voltados à composição
de tribunais estatais. Abstraída essa particularidade do Direito brasileiro quanto
aos conselhos profissionais,193 podem-se voltar as atenções para os códigos de
boas práticas, concebidos nos anos 1990 no Reino Unido da Grã-Bretanha e
Irlanda do Norte (não por acaso a década que consolidou a privatização dos
serviços públicos nas ilhas britânicas), cujo alvo primordial foi a autorregulação
bancária e a governança corporativa.194

10.2. Regulação público-privada da Internet?


Em relação à Internet, existe previsão normativa que atribui à União a
prerrogativa de editar regras sobre o uso da rede mundial de computadores, que
vem a ser a Lei no 12.965, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet). Essa
lei, em seu art. 24, prevê qual seria a atuação do poder público “no
desenvolvimento da internet” no país. Não se menciona, de modo expresso, o
controle ou a regulação da Internet. No inciso I do art. 24 do MCI, prevê-se
como diretriz para esse “desenvolvimento” o “estabelecimento de mecanismos
de governança multiparticipativa, transparente, colaborativa e democrática, com
a participação do governo, do setor empresarial, da sociedade civil e da
comunidade acadêmica”.
Antes mesmo do MCI, essa “governança multiparticipativa” era prevista no
Decreto Federal no 4.829, de 03 de setembro de 2003, que emprestou novo
fundamento de validade à Portaria Interministerial no 147, de 31 de maio de
1995, que criou o Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br, composto de
representantes do Governo federal, dos Governos estaduais, do setor
empresarial, do terceiro setor, da comunidade científica e tecnológica e um
representante de “notório saber em assuntos de internet”.
O CGI.br “tem formulado portarias acerca do assunto, destacando-se a
Resolução CGI.br/RES/2009/003/P, que apresenta os princípios para a
governança e uso da internet do Brasil”.195
§11. PARADIGMAS EM CRISE E O “BANDO DOS QUATRO”
Permanece a insistência em se apreciar os desenvolvimentos da relação
entre o Direito Público e o Direito Privado, neste último aspecto, quanto à
legitimidade nomogenética, com os olhos postos em uma realidade dos anos
1950-1970. Como resultante dessa visão, na literatura nacional, são igualmente
raros os textos que perceberam a insuficiência ou a inadequação dos conceitos
orientados a uma perda de identidade e de autonomia do Direito Civil, aqui mais
particularmente referido.
Antonio Junqueira de Azevedo, no ano de 2000, identificou essa virada
histórica ao criar uma metáfora que já se tornou célebre no Direito Civil
contemporâneo: a equiparação da função social, da boa-fé, da ordem pública e
do interesse público ao “que chamo de ‘bando dos quatro’196 - à moda daquela
revolução cultural comunista”.197 Longe de ser uma mera crítica ao uso das
cláusulas gerais e dos conceitos jurídicos indeterminados, que viria a se tornar
generalizado e assistemático, esse texto discute a crise do “paradigma do juiz”,
que substituiu o “paradigma da lei” Oitocentista.
Contrariando o tom quase existencialista que Antonio Junqueira de
Azevedo conferiu a seu texto de 1975, sobre a tendência do Direito Civil a
desaparecer,198 ele mesmo passou a considerar que “é o próprio Direito Civil que
voltou a ser disciplina jurídica de ponta”. Segundo ele, “os publicistas ainda
insistem no Direito que passou (paradigma moderno), mas hoje, glosando Lenin,
pode se dizer que ‘não há mais direito público, é tudo direito privado’”.199
Abstraindo certo tom panfletário dessa frase, não deixa de ser interessante
comparar o artigo de 1975 com os de 1999-2000 e observar a mudança de
inclinações do autor sobre o papel do Direito Civil no século XXI e, por
consequência, a recuperação do discurso de sua autonomia epistemológica,
conquanto, ao estilo do mesmo autor, não seria este o Direito Civil de outrora.
Na Alemanha, desenvolveu-se uma tese muito similar a esta linha de
pensamento: haveria uma “fuga para o Direito Privado”, à semelhança da “fuga
para as cláusulas gerais” anunciada na década de 1930 por Justus Wilhelm
Hedemann.200
A crítica à superação do “paradigma do juiz” é também identificável na
dogmática e na jurisprudência germanófonas mais recentes, posto que de modo
não uniforme.201 Mesmo no Brasil, começam a surgir escritos censurando a má
utilização ou a desnecessidade do emprego das cláusulas gerais para solução de
casos.202
Neste capítulo não se apreciará esse problema mais detidamente, mas é
necessário pôr ênfase em dois aspectos que interessam a esta parte da tese. O
primeiro está na dissociação – ao menos na literatura alemã – de qualquer
vínculo entre as cláusulas gerais e a publicização do Direito Privado. O segundo
é que não se pode mais considerar que a introdução dessas cláusulas no sistema
sirva de fundamento para se considerar borradas as linhas divisórias entre o
Direito Público e o Direito Privado.
A exploração dessas contradições entre a realidade e a doutrina
contemporânea não fica apenas no campo das relações entre o Direito e a
organização econômica da sociedade. O neoliberalismo dos anos 1980-1990,
embora sempre retorne com nomes ou argumentos novos, não pode ser o moto
para essa argumentação. O Direito Privado dele não precisa para afirmar sua
autonomia, que é anterior a essa concepção econômica e continuará a sê-lo com
ou sem seu concurso.203
§12. NOVAS FRONTEIRAS PARA O DIREITO PRIVADO

12.1. Introdução
O Direito de Família, o Direito das Sucessões, a teoria das incapacidades, o
Direito Processual (Civil e Penal), o Direito Ambiental, o Direito Constitucional
e o Direito da Concorrência, que se serão examinados a seguir, trazem diversos
exemplos práticos da porosidade do Direito Público a institutos do Direito
Privado, ou mesmo de um “renascimento” deste último como esfera de
desenvolvimento das relações jurídicas. Muitos outros haveriam de ser
enumerados, fez-se tão somente um recorte aleatório de situações fáticas e suas
respectivas normas, até para se seguir algo que é muito próprio ao sistema de
Direito Privado: seu caráter entrópico e, muita vez, destituído de
racionalidade.204

12.2. Direito de Família: O avanço da autodeterminação sobre a tutela


estatal
O Direito de Família tem sido recorrentemente associado à ideia de
publicização. Suas regras mal se acomodariam no Código Civil, que dirá no
próprio Direito Civil.205 O Direito de Família caminharia para se vincular ao
Direito Público.206 Defende-se atualmente que essa área ganhe status
epistemológico próprio. Embora a ideia de se conferir autonomia normativa ao
Direito de Família esteja em franco declínio no mundo, como ironizou Reinhard
Zimmermann: “se quisesse ser cômico, poderia dizer que um dos ordenamentos
jurídicos da Europa que removeu o Direito de Família do Código Civil foi a
República Democrática Alemã”.207
Talvez a tese da publicização tenha sido verdadeira até três décadas atrás,
mas as sucessivas reformas legislativas ocorridas a partir dos anos 1970 no
Brasil, ao contrário do que se imagina, reduziram paulatinamente a intervenção
estatal sobre um dos mais importantes institutos do Direito de Família, o
casamento.208
Primeiramente, a Emenda Constitucional no 9, de 28 de junho de 1977, que
alterou a Constituição de 1967-1969, instituiu o divórcio no país, o que foi
regulamentado em sede infraconstitucional pela Lei no 6.515, de 26 de dezembro
de 1977.209 A CF/1988, como anota Silvio Rodrigues, revelou “sua menor
consideração pelo casamento dentro do quadro da família”, ao não mais repetir o
que afirmavam as Constituições pretéritas de que a família era constituída pelo
casamento e agora “apenas afirma que a família está sob a especial proteção da
lei”.210 É uma ruptura histórica com o princípio da legitimidade que, por séculos,
delimitou o conceito de família no Direito Civil em muitos países da tradição
romano-germânica.211
Câmbio igualmente fundamental está no art. 226, § 6o, CF/1988, que
simplificou as formas de extinção do casamento e da sociedade conjugal,
reduzindo o prazo de conversão da separação judicial em divórcio de 5 para 3
anos, além de admitir o divórcio direto a qualquer tempo. Seria este mais um
exemplo do “menosprezo” da CF/1988 “pelo casamento”, que teria posto “nossa
legislação divorcista entre as mais audazes” do mundo.212
Outra mudança importante deu-se com a Lei no 11.441, de 4 de janeiro de
2007, que criou o divórcio e a separação consensuais pela via cartorária,
dispensando a participação do juiz para as hipóteses nas quais não haja litígio e
inexistam filhos menores ou incapazes.213
A Emenda Constitucional no 66/2010, deu nova redação ao § 6o do art. 226
da Constituição de 1988, cuja redação passou a ser singelamente: “O casamento
civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Esse texto abriu polêmica na doutrina
sobre se a separação judicial havia sido extinta em face da supressão da
exigência de “prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos
em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”, a fim de que o
divórcio ocorresse;214 ou se teria ocorrido mera desconstitucionalização da
separação judicial, que permaneceria vigente, agora, apenas no âmbito da
legislação ordinária.215 Os defensores dessa tese baseiam-se, em certa medida, na
conservação da separação judicial no atual Código de Processo Civil, aprovado
pela Lei no 13.105, de 16 de março de 2015.
Todos esses sucessos quanto ao casamento desvelam o processo de sua
privatização, que se apresenta cada vez mais como um contrato e menos como
uma instituição.216 O Estado reduziu drasticamente sua participação no
casamento, a ponto de retirar a primazia do regime de comunhão universal de
bens (que pressupunha a indissolubilidade da união entre os cônjuges), subtrair a
participação do juiz e permitir a alteração do regime de bens.
Em pouco tempo, é provável supor que será permitido o divórcio por mera
comunicação postal, com aviso de recebimento, como já existe em alguns países
europeus e Estados norte-americanos. É ainda possível que se comece a se
aceitar um âmbito maior para o desenvolvimento da autonomia privada e da
autodeterminação dos cônjuges nos pactos antenupciais, com a previsão de
cláusulas não econômicas. Na doutrina mais atual, a defesa de uma maior
liberdade na formatação das relações familiares direciona-se inclusive contra a
“excessiva judicialização dos conflitos existentes nessa seara”.217 Discute-se
também a liceidade ou não de os cônjuges autorregulamentarem os efeitos do
casamento, derrogando, por exemplo, os deveres conjugais de fidelidade.218 Em
resposta a essa possibilidade, tem-se usado a Constituição e o interesse público
para se afastar tais derrogações, dado o caráter da família como “elemento
fundamental da sociedade”, assim como está definida constitucionalmente.219
Debate-se agora sobre a inserção de cláusulas de responsabilidade entre os
cônjuges por violação de dever matrimonial, as quais seriam deflagradas contra
o culpado pela separação, assim considerado em sentença. Os recursos para o
custeio dessa sanção convencional adviriam de “um fundo destinado a esta
finalidade, formado pelo patrimônio particular de cada um dos nubentes” ou por
bens pessoais, na hipótese do regime de comunhão universal.220
A noção de culpa na separação judicial, para os que a admitem, tornou-se
muito pouco relevante quanto a seus efeitos.221 O cônjuge declarado culpado na
separação “perde o direito a usar o sobrenome do outro, desde que
expressamente requerido pelo cônjuge inocente” (art. 1.578, CC/2002). Essa
hipótese, no entanto, é excepcionada por situações que impliquem para o
culpado: evidente prejuízo para a sua identificação; manifesta distinção entre o
seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida; dano grave
reconhecido na decisão judicial (incisos do art. 1.578, CC/2002). Na prática,
dificilmente o culpado perderia tal direito se insistisse em con-servá-lo. Mesmo
o direito aos alimentos permanece devido ao cônjuge responsável pela
separação, embora o parágrafo único do art. 1.704, CC/2002, crie uma hipótese
mais restrita para fruição desse direito: “Se o cônjuge declarado culpado vier a
necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem
aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o
juiz o valor indispensável à sobrevivência”.222
Mesmo na doutrina do século XX, prevaleceu a tese de que o casamento
seria um negócio jurídico bilateral,223 um negócio jurídico complexo,224 ou um
contrato,225 embora houvesse focos de resistência a considerá-lo uma
instituição226 – destacando-se, no Brasil, Rubens Limongi França,227 apontado
por Silmara Chinellato como o “mais ardoroso defensor” da concepção
institucionalista228 – doutrina ainda defendida por certos autores.229 Há ainda os
que reconhecem o casamento como uma figura jurídica híbrida, de natureza
contratual e institucional.230
Nos dias correntes, quando declinam elementos metajurídicos como a
moral e a religião no plano da família e do casamento, este último é cada vez
mais admitido como um negócio jurídico privado, com baixo interesse estatal
pelo modo como os cônjuges o conduzem, conservam ou extinguem.231 Erik
Jayme defende que o Direito de Família desenvolveu-se, a partir do início da
década de 2000, com fortes traços do pós-modernis-mo, com aparente ameaça à
segurança jurídica, efeito que traria a “vantagem de bem corresponder à
complexidade da vida de hoje”, refletindo “os desejos da sociedade atual”.232

12.3. Direito das Sucessões: simplificação e flexibilização


No campo sucessório, deu-se a simplificação dos procedimentos, como a
possibilidade de o inventário seguir o rito dos arrolamentos, independentemente
de seu valor e mesmo com a existência de interessado incapaz, “desde que
concordem todas as partes e o Ministério Público” (art. 665, CPC/2015). Por
outro lado, ainda que se tomasse o Estado sob a consideração de um sujeito
especial no regime sucessório, ao menos na maior parte dos Direitos
contemporâneos, “é sob a égide do Direito Privado e não do Direito Público que
o Estado intervém na sucessão”.233
Para além das meras alterações legislativas, como se verá na subseção 19.3,
o envelhecimento populacional, o prolongamento da expectativa de vida, a
queda nas taxas de natalidade, os novos arranjos familiares, a perda crescente de
referenciais religiosos e o desejo de blindar as empresas contra disputas entre
herdeiros têm-se revelado como fatores determinantes para uma repaginação do
Direito Sucessório, cada vez mais aberto à autonomia privada. O interesse pela
disciplina, seja por estudantes e pesquisadores ou por advogados, oficiais de
notas e registradores, além de juízes, é crescente por razões econômicas e
profissionais, o que termina por influenciar a doutrina, provocada a encontrar
soluções para as novas demandas e a casuística delas advinda no Direito das
Sucessões. O tempo dos institutos empoeirados e rigidamente controlados por
uma suposta preservação de “valores sociais” começa a passar, assim como a
ideia de um nível de intervenção estatal crescente nesse setor do Direito Privado.
São exemplos desses câmbios, que representam as novas conexões entre
autonomia privada e Sucessões: a) a dilatação do objeto do testamento para
compreender a chamada “herança digital”, o conteúdo intangível do de cuius,
que possa ser armazenado no ambiente virtual, como senhas, perfis em redes
sociais, contas de e-mail, o qual seria transferido aos herdeiros, com poderes
para manter, administrar ou apagar dados e registros; b) a rediscussão do
tratamento igualitário entre descendentes e cônjuge ou companheiro supérstites
do falecido. Essa rigidez isonômica seria incompatível com uma realidade de
vínculos conjugais ou equiparáveis sucessivos e de duração menor ao longo da
vida das pessoas, o que implica enfraquecer os laços de solidariedade sucessória
que presidiram a elaboração das normas legais em vigor; c) a constituição das
holding familiares, que estimulam a profissionalização da gestão e conferem aos
membros da família a titularidade de quotas na holding. Esse arranjo volta-se a
preservar a empresa de disputas peculiares ao processo de inventário e partilha;
d) o reexame do direito real de habitação na sucessão, de modo a flexibilizar o
regime atual, que não consegue distinguir uma série de situações advindas da
transitoriedade das relações conjugais ou de companheirismo.234
O Direito das Sucessões busca a flexibilização também por efeito de sua
própria fragmentação normativa. As regras do CC/2002 encontram-se
notoriamente desatualizadas, seja por problemas de origem (porque assim já
nasceram), seja por questões de vínculo com outra disciplina, o Direito de
Família, cujas regras têm sido reescritas pela jurisprudência dos últimos 10 anos
em temas nucleares. Exemplo disso é o problema da concorrência sucessória do
art. 1.790, CC/2002, no julgamento pelo STF do RE 878.694.235 O descompasso
talvez se resolva por uma reforma do Código Civil. Ainda assim, é incerto que
ela seja exitosa porque a complexidade das relações é cada vez maior no
universo familiar e, por consequência, no plano sucessório. Não será exagero
dizer que o Direito Civil se voltará para a antiga tradição romana de sucessão
testamentária como regra e, dentro desse modelo, a autonomia privada possa
ocupar espaços hoje bloqueados por normas cogentes da legislação civil. Não
deixa de ser irônico que é por apelo à Roma e à autonomia privada que se almeja
superar as deficiências do marco normativo nas Sucessões. Este é mais um
exemplo prático mobilizado para se confrontar o discurso da publicização do
Direito Privado.

12.4. Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD): mais autonomia, menos


proteção?
O recente Estatuto da Pessoa com Deficiência –EPD, instituído pela Lei no
13.146, de 6 de julho de 2015, introduziu mudanças significativas na teoria das
incapacidades, ao exemplo da revogação de hipóteses legais de incapacidade
absoluta, previstas nos incisos I a III do art. 3o, CC/2002 (exceto a incapacidade
absoluta dos menores impúberes, única hipótese mantida, e levada ao caput do
art. 3o) e a diminuição das hipóteses de incapacidade relativa, com a supressão
dos incisos II e III do art. 4o, bem como a pequena alteração de seu parágrafo
único, CC/2002. A opção legislativa, que é objeto de acalorado debate
doutrinário, deu maior peso à autonomia dos sujeitos e reduziu o âmbito de
proteção estatal para os incapazes em sua formulação clássica.236 Nesse sentido,
há autores que defendem que a interdição deixou de existir no Direito
brasileiro,237 além de que se deve privilegiar a “autonomia do apoiado”, quando
se instituir a tomada de decisão apoiada, o que não implica limitação a sua
capacidade civil: “Note-se que a necessidade da presença do juiz para decidir a
controvérsia se dá somente diante de casos em que a realização do negócio possa
trazer risco ou prejuízo relevante”.238

12.5. Direito Civil e antidiscriminação: Experiências norte-americana e


alemã
Um tema típico do Direito Constitucional norte-americano, em razão do
histórico de luta pelos direitos civis (no sentido de civil rights, parcialmente
equiparável ao de direitos fundamentais na nomenclatura romano-germânica) e
das decisões da Suprema Corte, é o da antidiscriminação, que envolve etnia e
raça, gênero, religião, nacionalidade, aspecto físico e condição social.
A literatura jurídica dos Estados Unidos da América tem sido pródiga no
estudo da antidiscriminação, tanto direta quanto indireta. Os norte-americanos
preocupam-se cada vez mais com o chamado implicit bias (viés implícito ou
discriminação implícita). Um caso é referência para essa modalidade de
discriminação: o processo seletivo de músicos para as orquestras sinfônicas e
filarmônicas dos Estados Unidos. Em geral, a escolha dava-se por audições
públicas, com o profissional demonstrando sua habilidade perante um comitê em
auditórios musicais. As estatísticas revelavam a prevalência na seleção de
homens. Uma mudança no processo ampliou a participação feminina nas
orquestras: o recurso a audições às cegas. O candidato ou a candidata tocavam
seu instrumento e o examinador só identificava o som produzido e não quem o
produzia. O impacto das audições às cegas é aferível em números: a) em 1970,
havia menos de 5% de mulheres nas cinco principais orquestras norte-
americanas;239 b) em 1980, esse número passou para 12%; c) no ano de 1996,
havia 25% de mulheres.240
O universo da pesquisa – as orquestras – é imune a desvios-padrão ou
críticas metodológicas. O número de integrantes é estável (em geral 100
músicos) e não há variações significativas de uma para outra quanto a esse
número.241 Além disso, não há aumento na quantidade individual de
especialidades musicais. Por essa razão, é possível estabelecer uma relação
causal entre as audições às cegas, um fator impeditivo do implicit bias, e o
câmbio nos padrões de contratação.242
Esse exemplo insere-se no âmbito das relações de trabalho e no
recrutamento de prestadores de serviço e foi nessa óptica que a
antidiscriminação mais se desenvolveu nos Estados Unidos da América desde a
década de 1970, com apelo a teorias comportamentais, inclusive na
jurisprudência.243 Mais recentemente, outros aspectos como aparência física
entraram em cena. O certo é que se passou a tratar mais explicitamente de um
“direito da antidiscriminação”.
A Alemanha possui, desde 14 de agosto de 2006, uma Lei Geral de
Igualdade de Tratamento,244 que compreende o Direito Privado, especialmente
nas áreas do Direito Civil (§§ 19-21) e do Direito do Trabalho. As práticas
discriminatórias ligam-se a elementos como raça ou origem étnica, sexo, religião
e crença, idade e identidade sexual (na linguagem utilizada pela lei).
A AGG prevê hipóteses de discriminação direta (§ 3, apartado 1, AGG) e
discriminação indireta (§ 3, apartado 2, AGG).
A discriminação direta ocorre quando um indivíduo, “em razão de portar
um ou vários sinais discriminatórios, recebe tratamento menos favorável daquele
que é, tenha sido ou possa vir a ser dispensado a outra pessoa em situação
comparável”. A indireta manifesta-se quando “uma disposição, critério ou
prática aparentemente neutra, coloque portadores de sinais de discriminação em
situação de desvantagem comparativamente a outras, salvo se essa disposição,
critério ou prática seja objetivamente justificada por um critério legítimo, vale
dizer, lícito em geral e não discriminatório em si”.245
No Brasil, há estudos sobre o tema desde os anos 1980, em sua maior parte
com enfoque no Direito Constitucional, nas relações de trabalho e nas ações
afirmativas.246 O Direito Civil, porém, esteve na vanguarda da antidiscriminação,
ao se apreciar seus efeitos no âmbito do Direito dos Contratos.247 Em Portugal, a
antidiscriminação nas relações privadas também há sido objeto de interesse por
parte dos civilistas.248 Tanto em Portugal quanto no Brasil, a matéria integra o
Direito Constitucional e o Direito Civil, sem que se perca de vista a necessária
autonomia epistemológica das duas disciplinas.
O Direito Civil, no que se refere ao direito da antidiscriminação, ocupa
cada vez mais uma posição de relevo.
Paulo Mota Pinto exemplifica como se operacionalizam esses conceitos,
que demandam o cotejo entre o exercício de direitos fundamentais na esfera da
autonomia privada e da autodeterminação pessoal: (i) um locador poderia rejeitar
uma proposta de locação por um locatário pelo fato de este professar
determinado credo religioso?; (ii) um empregador poderia rejeitar um
empregado para a função de baby sitter, que deveria trabalhar apenas nos
sábados, quando o candidato professa uma religião que lhe exige a guarda do
sábado? Segundo ele, no exemplo (ii), o direito à recusa à contratação
descansaria em uma “razão substancial”: “seria impossível que o candidato à
vaga (trabalhador de fim de semana) pudesse executar suas funções”. No
exemplo (i), ter-se-ia “uma limitação ditada pelos limites da esfera privada da
pessoa”. A discriminação lícita separar-se-ia da ilícita pela presença dos
“elementos suspeitos”: “compreensivos de origem étnica, língua, aparência, raça,
orientação sexual, religião, independentemente de sua utilização em sua
expressão pública ou como fundamento para a recusa a contratar”.249
O Direito Civil tem meios de identificar soluções antidiscriminatórias,
assim como o Direito Romano encontrou no passado, quando não se conheciam
os direitos fundamentais, ao menos em sua conformação contemporânea. O
paralelismo dos direitos fundamentais é relevante, mas não é condição
necessária para que problemas ligados à discriminação sejam resolvidos com o
apelo ao Direito Constitucional.250 Mais do que isso, o direito da
antidiscriminação é um exemplo da utilidade da conservação da autonomia
epistemológica do Direito Civil.
12.6. “Privatização” do Direito Processual?
No Direito Processual, sentem-se também sinais de mudança. Savigny foi
um dos primeiros a reconhecer a vinculação do Direito Processual Civil ao
Direito Público.251 Autores alemães como Oskar Büllow252 e Wach,253 por sua
vez, contribuíram para a tese da autonomia da ação254 e, no século XX, tanto a
jurisdição255 quanto o processo256 reconheceram-se como categorias inerentes ao
Direito Público.
Nas codificações processuais dos anos 1930-1940, existia um debate que é
pouco divulgado sobre: a) o caráter autoritário dos princípios nelas contidos, de
reforço ao poder do juiz e do Estado no processo; b) a influência do pensamento
de Anton Menger sobre um processo com viés de classe. O fato é que Franco
Cipriani, ao considerar esses dois pontos, passou a defender um movimento de
valorização do papel das partes no processo em nome de uma maior eficiência.
Mal ou bem colocado o nome, a isso se chamou de “privatização” da justiça
civil.257 Embora não vinculado a esse debate europeu, o CPC/2015 adotou
institutos e figuras jurídicas que poderiam ser definidos como elementos de
“privatização do processo”, ao exemplo do negócio jurídico processual (jamais
admitido por parte da doutrina ao tempo do CPC/1973),258 das mudanças
procedimentais por acordo entre as partes (art. 190, CPC/2015), que podem
inclusive “fixar calendário para a prática dos atos processuais” (art. 191,
CPC/2015).259
A privatização do processo é um conceito ainda polêmico e, antes de tudo,
polissêmico na doutrina processual brasileira. Sua existência como problema
epistemológico, porém, não pode ser negada e se comprova pelo número de
publicações dedicadas a essa temática.260 No Direito Processual Penal, idêntica
ordem de ideias pode ser apresentada, especialmente com a notícia da introdução
da plea bargain no Brasil, o que terminou por se confirmar no PLC no 4.850, de
2016, sob a forma de um mal denominado “acordo penal”.261
No campo das alternative dispute resolutions (ADR), a Lei da Arbitragem
(Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996), criou uma espécie de jurisdição não
estatal sobre conflitos privados. Mesmo antes da nova lei, sua defesa como
instrumento de jurisdição “extrajudicial” já encontrava seus adeptos de entre os
privatistas do século XX.262 Embora ocupe um espaço híbrido entre o Direito
Privado e o Direito Processual, a arbitragem é mais um exemplo da renúncia
estatal ao monopólio da função jurisdicional em nome da liberdade dos sujeitos
quanto ao modo como dissolverão suas controvérsias.263

12.7. Direito Ambiental e a “tragédia dos comuns”


No Direito Ambiental, deu-se o reconhecimento expresso pelo STJ da
validade das convenções privadas contendo restrições ao direito de construir,
inclusive em detrimento de normas de Direito Público menos protetivas.264
Desde os anos 1990, conhece-se o movimento do ambientalismo de livre-
mer-cado (freemarket environmentalism), que defende a privatização de áreas
ambientais com a imediata sujeição dessas áreas a rígidas normas de proteção
contra intervenções prejudiciais à fauna e à flora. Para esses autores, a
manutenção do meio ambiente sob um regime de bens públicos de uso comum
do povo é prejudicial a sua conservação, o que se comprovaria por conceitos
econômicos.
Um deles é a “tragédia dos comuns”, uma teoria econômica criada por
William Forster Lloyd, na primeira metade do século XX, e adaptada para o
ambientalismo por Garrett Hardin, em um artigo publicado na revista Science,
em 1968.265 De acordo com a “tragédia dos comuns”, quando uma propriedade é
deixada como bem de uso comum do povo e dado que os recursos são finitos,
essa combinação gera o incentivo a que alguns se antecipem aos demais no uso
das riquezas ali depositadas. Em geral, essas pessoas são os empreendedores e as
limitações ambientais genéricas são pouco inibitórias a suas ações,
especialmente quando sopesam os ganhos e as sanções inerentes a suas condutas.
Se tais áreas fossem privatizadas e submetidas a restrições conhecidas ex ante,
seus titulares impediriam que agentes mais ousados destruíssem o meio-
ambiente, fa-zendo-o com maior eficiência do que o próprio Estado.266

12.8. Antitruste e private enforcement: tutela privada da concorrência


Uma área que é normalmente compreendida como espécie do gênero
Direito Público é o Direito da Concorrência, ainda que na Alemanha e na Áustria
essa província jurídica tenha nascido e se desenvolvido no âmbito do Direito
Privado.267 Uma das primeiras formas de proteção à concorrência nasceu de uma
figura privatística, que é a vedação do contrato em prejuízo a terceiro. Esse tipo
de contrato, em princípio vinculante apenas às partes que o convencionam,
produz efeitos externos em relação a pessoas determinadas ou não,
independentemente da vontade de quem os gerou. É vulgar que esses efeitos
sejam prejudiciais, ao estilo da formação de cartéis com objetivo de controle de
preços (para obstar sua redução ou evitar seu aumento), de impedir a livre
concorrência, de restringir direitos dos consumidores ou para exercer o poder de
mercado significativo.268
O processo envolvendo a Companhia Nacional de Tecidos de Juta versus o
conde Álvares Penteado e a Companhia Paulista de Aniagens é considerado
como um marco para as bases da proteção contra a concorrência desleal no
Brasil. A discussão era sobre os efeitos de uma cláusula de não restabelecimento,
após a transferência do controle de uma fábrica de tecidos do conde Álvares
Penteado para Jorge Street e outros. Ela veio a ser descumprida, quando o conde
construiu uma nova fábrica no mesmo bairro e com a finalidade de produzir juta.
O conflito chegou ao STF, com atuação de Rui Barbosa e parecer de Carvalho
de Mendonça, com a vitória do conde quando do julgamento do recurso em
1914.269 Apesar do êxito da tese do conde, a lei terminou por prestigiar a posição
do empresário Jorge Street, como se observa, v.g., do art. 1.147, CCB/2002, que
proíbe o alienante, após trespasse do estabelecimento, de fazer concorrência com
o alienatário, nos cinco anos posteriores à transferência, salvo autorização
expressa em sentido contrário.270
Pode-se também comentar sobre as cláusulas de raio, instituídas em
dezenas de shopping centers brasileiros, que proíbem as lojas neles instaladas
abrirem filiais ou sucursais em área delimitada por certo raio em quilômetros.
Essas cláusulas pretendem impedir a concorrência da loja, que funciona em um
dado centro comercial, com outra, do mesmo titular ou da mesma cadeia, em
áreas contíguas.271 No final de 2016, o STJ julgou um caso-líder sobre a matéria,
com fundamentação preponderantemente privatística, reconhecendo a validade
dessas disposições e negando que houvesse dano aos consumidores ou à
concorrência em sua estipulação.272
Não se pretende aqui demonstrar a supervivência da tese de que o Direito
Concorrencial é parte do Direito Privado. Mas, se deseja comprovar os avanços
normativos contemporâneos de institutos privados sobre esse direito especial.
Veja-se que, no âmbito público, a defesa da concorrência é atribuída ao
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia federal que
se situa no centro do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), que
é regido pela Lei no 12.529, de 30 de novembro de 2011. Esse caráter
publicístico não impediu que o art. 47 da Lei no 12.529/2011 conferisse uma
pretensão em favor de particulares, de modo direto ou por intermédio do
Ministério Público, dos órgãos públicos dos entes federados, de associações
legalmente constituídas (nos termos do art. 82, CDC), para a “defesa de seus
interesses individuais ou individuais homogêneos”. Essa pretensão deduzida em
juízo pode satisfazer os interesses dos prejudicados por atos infracionais à ordem
econômica sob duas vertentes: a) a cessação de práticas econômicas ilícitas; b) a
reparação por danos sofridos em decorrência dessas condutas infracionais. Tudo
isso “independentemente do inquérito ou processo administrativo, que não será
suspenso em virtude do ajuizamento de ação”.
Tal pretensão baseia-se no conceito de private enforcement e na correta
noção de que o Direito Concorrencial tem reflexos imediatos no Direito Privado,
especialmente no Direito do Consumidor e no Direito Civil. A defesa da
concorrência é também uma forma de proteção do direito dos particulares (em
sentido amplo) e dos consumidores (em sentido restrito),273 ainda que se discuta
sobre ser direta ou indireta sua influência no Direito do Consumidor.274
O private enforcement, que é positivado nos Estados Unidos da América,
no Canadá e na União Europeia,275 reconhece a pretensão ressarcitória dos
particulares em face de ato violador das normas concorrenciais por danos
resultantes dessa infração. Cria-se, sob outro ângulo, o dever de reparar,
imputável às pessoas naturais ou jurídicas que cometam tais delitos, com
independência relativa de instância aos atos do órgão regulador. Um dos
parâmetros para essa indenização é, por meio da teoria da diferença, baseado na
diferença entre o preço efetivamente pago pelo bem e o preço competitivo
hipotético (que deveria ter sido praticado naquela negociação). Tem-se admitido
também o ressarcimento por meio de créditos em favor da pessoa lesada.276
§13. CONCLUSÕES PARCIAIS
Ao se concluir este capítulo, é necessário fazer algumas advertências, até
para se imunizar o texto em face de incompreensões, o que seria natural dado o
caráter polêmico de algumas das situações ou ideias descritas, ou mesmo
deslealdades intelectuais, o que é mais raro, porém impossível de negar que
eventualmente se manifestem. A primeira é que narrar todos esses exemplos de
ampliação dos espaços normativos privados ou de migração de áreas
anteriormente sujeitas ao Direito Público para arranjos, negócios e institutos
jurídicos de Direito Privado, não significa aderir a um pensamento econômico
liberal, neoliberal ou pró-liberalização da Economia e do Direito. Como dito,
boa parte deste capítulo é descritiva e, por consequência, não exige do leitor a
concordância com os fundamentos ideológicos subjacentes a tais
transformações. A segunda, como consequência da primeira advertência, está em
que o reconhecimento dessa realidade se torna necessário até mesmo para os que
defendem uma maior presença do Estado no Direito e na Economia.
Independentemente de se situar a questão em bases econômicas ou
ideológicas, não se pode misturar o debate jurídico com análises de
infraestrutura. O objetivo desta tese é exclusivamente voltado para o exame
desses fatos e fenômenos sob a óptica da superestrutura, espaço ao qual o Direito
está confinado, para se valer da terminologia marxiana.277
Não é preciso desacreditar das funções metajurídicas da família e do
casamento para se reconhecer que o Estado, ao menos nos últimos 30 anos, por
vontade do povo nas alterações legislativas ou por decisões não democráticas
dos juízes, deixou amplos espaços para a liberdade, a autodeterminação e
autonomia privada. Da mesma maneira não se exige a filiação à Nova Escola
Econômica Institucional para que se reconheça a diminuição voluntária da
intervenção estatal em setores como telecomunicações e educação.
Por fim, ressalvados aqueles que se filiam ao positivismo jurídico, de modo
particular ao positivismo da Escola de Viena, coerentemente organizados
debaixo do lema “alles Recht ist Staatsrecht” (“todo Direito é Direito
Público”),278 é hoje insustentável defender o fim da dicotomia Direito Público-
Direito Privado com argumentos ao estilo da publicização do Direito Privado ou
seus derivados, como o declínio da autonomia privada, do individualismo e da
iniciativa privada.

182 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. A administração pública entre o Direito Público e o Direito Privado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 3, p. 3153, abr./jun. 2015; MUNIZ, Veyzon Campos.
Superando Antígona. A distinção entre Direito Público e Direito Privado: limites, en fraquecimento e
consequências operacionais a partir de uma análise hermenêutica. Revista do Instituto de
Hermenêutica Jurídica, v. 11, no 14, p. 169183, jul./dez. 2013. p. 175177.
183 São exemplos de obras que criticam a privatização do Direito Administrativo, com referências a uma

“colonização” do Direito Administrativo por valores privados: BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito
Administrativo e políticas públicas. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 172; NOHARA, Irene Patrícia.
Transformações latentes das fronteiras entre público e privado: mutação ou retro cesso no Direito
Administrativo brasileiro. In. LINHARES, Emanuel Andrade; MACHADO SEGUNDO, Hugo (Orgs.)
Democracia e direitos fundamentais: uma homenagem aos 90 anos do professor Paulo Bonavides. São
Paulo: Atlas, 2016. p. 94102.
184 Ricardo Luis Lorenzetti (Fundamentos do Direito Privado. Tradução de Véra Maria Jacob de Fradera.
São Paulo: RT, 1998. p. 55) desenvolveu o conceito de “feudalização” do Direito ao comparar a
situação das classes altas, residindo em condomínios fechados de alto luxo e com segurança pri vada,
aos senhores feudais do Medievo: “Esse indivíduo não necessita do Estado; incomodao, pretende que
seja suprimido, porque ele está satisfeito, não tem necessidade da ação pública. O Estado incomoda-
o, cobralhe impostos, a lei impõelhe ônus, responsabilidades; é preciso redu zilo ao mínimo”.
185 SUPIOT, Alain. The publicprivate relation in the context of today’s refeudalization... cit. p. 138.
186 SUPIOT, Alain. The publicprivate relation in the context of today’s refeudalization…p. 140143.
187 Em alemão, Zivilrechtslehrervereinigung.
188 KÖNDGEN, Johannes. Privatisierung des Rechts: Private Governance zwischen Deregulierung und
Rekonstitutionalisierung…p. 478479.
189 KÖNDGEN, Johannes. Privatisierung des Rechts: Private Governance zwischen Deregulierung und

Rekonstitutionalisierung…p. 483484.
190 KÖNDGEN, Johannes. Privatisierung des Rechts: Private Governance zwischen Deregulierung und
Rekonstitutionalisierung…p. 484485.
191 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Código Civil comentado: (arts. 481 a 537), compra e venda, troca, contrato

estimatório. Coordenação de Álvaro Villaça Azevedo. São Paulo: Atlas, 2008. v. 6, t. 1, p. 152.
192 Parcialmente nesse sentido, cuidando do conceito de “polícia das profissões”: “As leis que regu-
lamentam profissões e criam ordens ou conselhos transferemlhes competência para exercer a
fiscalização do respectivo exercício profissional e o poder disciplinar. A chamada polícia das
profissões, que originalmente caberia ao poder público, é, assim, delegada às ordens profissionais”
(MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno...p. 112).
193 Sobre o problema do enquadramento jurídico das ordens e conselhos profissionais (que parte da
doutrina insere no âmbito das autarquias): MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno... p. 113.
194 KÖNDGEN, Johannes. Privatisierung des Rechts: Private Governance zwischen Deregulierung und

Rekonstitutionalisierung…p. 495496.
195 SILVA, Joseane Suzart Lopes da. A responsabilidade civil dos provedores em face dos consumido res
de produtos e serviços contratados no ambiente virtual: a relevância do Marco Civil da Internet
regulamentado pelo Decreto Federal 8.771/2016. Revista de Direito Civil Contemporâneo. v. 10, ano 4,
p. 151190, jan. mar. 2017. p. 184.
196 A metáfora referese ao grupo formado por Jiang Qing, Zhang Chunqiao, Wang Hongwen e Yao

Wenyuan, que passou à História como o “Bando dos Quatro” ou a “Camarilha dos Quatro”. Nos anos
finais de Mao TséTung, líder da República Popular da China de 1949 a 1976, esse bando – que era
formado pela última esposa de Mao, Jiang Qing – influenciou suas ações governamentais, a ponto de
estimulálo a iniciar a Revolução Cultural (19661969), um período de radicalização ideológica do
regime e de expurgo de milhares de quadros do Partido Comunista chinês, sob suspeita de
moderação política. Após a morte de Mao TséTung, a camarilha foi acusada de usur pação do poder e
a eles se imputou a responsabilidade pelos expurgos da Revolução Cultural.
197 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Insuficiências, deficiências e desatualização do projeto de Código

Civil na questão da boafé objetiva nos contratos. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 89, no 775, p. 11-
17, mai. 2000. p. 16.
198 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O Direito Civil tende a desaparecer?...passim.
199 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O direito pósmoderno e a codificação. Revista da Faculdade de
Direito da Universidade São Paulo, v. 94, p. 312, jan./dez. 1999. p. 9.
200 MOHNHAUPT, Heinz. Historische Konkurrenzen und Beeinflussungen zwischen Privatrecht und

öffentlichem Recht. Rechtsgeschichte, no 19, p. 239246, 2011. p. 241.


201 Com citação de interessantes acórdãos austríacos: KOZIOL, Helmut. Glanz und Elend der deut schen
Zivilrechtsdogmatik. Das deutsche Zivilrecht als Vorbild für Europa? Archiv für die civilistische Praxis –
AcP, v. 212, p. 162, 2012. p. 5659.
202 Particularmente sobre o venire contra factum proprium: “Vêse então que a proclamação: venire contra

factum proprium nulli conceditur! é apenas uma maneira rebuscada para dizer que os sujei tos de
direito devem respeitar os vínculos jurídicos por eles criados. (...) A desvantagem da fórmula do
venire... é que ela facilmente induz ao equívoco, muito corriqueiro especialmente na jurispru dência,
de que tudo o que se precisa demonstrar é um comportamento incoerente” (SCHMIDT, Jan Peter.
Alegação de invalidade como comportamento contraditório proibido? – Comentários ao Acórdão do
REsp 1.461.301/MT. Revista de Direito Civil Contemporâneo. v. 7, ano 3, p. 419 437, abr./jun. 2016. p.
433); “No Brasil, é bem provável que se esteja a iniciar um processo de discussão sobre princípios e
cláusulas gerais muito próximo do incendiário debate ocorrido na Alemanha na primeira parte do
século XX, envolvendo as escolas do Positivismo, do Direito Livre e da Jurisprudência dos Interesses,
sobre a boafé objetiva” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Um ‘mo delo de revisão contratual por etapas’ e
a jurisprudência contemporânea do Superior Tribunal de Justiça. In. ANCONA LOPEZ, Teresa; LEMOS,
Patrícia Faga Iglecias; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Sociedade de risco e Direito Privado: desafios
normativos, consumeristas e ambientais. São Paulo: Atlas, 2013, p. 513); “Os redatores do Código Civil
alemão consideraram que uma cláusula geral de responsabilidade civil não oferece critérios
minimante precisos para os juízes decidirem os lití gios, o que os sobrecarregaria, além de contrariar
a concepção de judicatura então prevalecente na Alemanha” (REINIG, Guilherme Henrique Lima;
CARNAÚBA, Daniel Amaral. Abuso de direito e responsabilidade por ato ilícito: críticas ao Enunciado
37 da 1ª Jornada de Direito Civil. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 7, p. 6394, abr./jun. 2016. p.
77); DAMASCENO, Jaks Douglas Uchôa; CACAU, Marfisa Oliveira. Cláusulas gerais, Direito Privado e
Constituição: A importância das cláusulas gerais sob os influxos do Direito Constitucional. In. MATIAS,
João Luís Nogueira (Coord.). Relações privadas, direitos humanos e desenvolvimento nos 30 anos da
Constituição de 1988. Fortaleza: Mucuripe, 2018. p. 1338. Sobre a cláusula geral da boafé e os abusos
em sua utilização: DIAS Toffoli, José Antonio; RANGEL, Roberta Maria. Revisão contratual e boafé:
confronto inevitá vel? In. LIMA, Tiago Asfor Rocha; ARAÚJO FILHO, Raul Araújo Filho; SOUZA, Cid
Marconi Gurgel de (Coords.). Temas atuais e polêmicos na Justiça Federal. Salvador: JusPODIVM, 2018,
p. 190194.
203 Parcialmente nesse sentido: “(...) há equívoco em se falar de publicização do direito privado em
virtude da intensidade da intervenção estatal nas relações privadas” (LÔBO, Paulo. Direito Civil:
Famílias. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 41).
204 “A entropia é uma palavra de diferentes acepções, mas que significa nas Ciências Biológicas a medida

da desordem de um sistema. O Direito Privado é entrópico nesse sentido. A criatividade, a destruição,


a transformação e a liberdade pautam a realidade que o Direito Privado tenta regu lar. O mundo das
famílias, das empresas, dos negócios e da propriedade é assim e somente um conjunto de regras
adaptadas a esse modo entrópico de organização das relações sociais é hábil (ou útil) para responder
às necessidades de seus atores” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil
contemporâneo na tradição de civil law em face do neoconstitu cionalismo e dos princípios...cit. p.
64).
205 No Direito francês: SAVATIER, René. Du Droit Civil au Droit Public a travers les personnes, les biens et la
responsabilité civile. Paris: LGDJ, 1945, p. 15. No Direito brasileiro: VIANA, Rui Geraldo Camargo. A
família e a filiação. Tese (Professor Titular). São Paulo: Departamento de Direito Civil da Faculdade de
Direito, Universidade de São Paulo, 2006. p. 49 (especificamente, sobre a inter venção estatal em
campos novos com a filiação); RIOS, Arthur. O novo bem de família no Direito brasileiro. Revista de
Direito Imobiliário, no 28, p. 6581, jul./dez. 1991. § 5.
206 Em sentido contrário, a favor da conservação da natureza privatística do Direito de Família, embo ra

com fundamentos diferentes dos que se defende nesta tese: “(...) o direito de família é genuina mente
privado, pois os sujeitos de suas relações são entes privados, apesar da predominância das normas
cogentes ou de ordem pública. Não há qualquer relação de direito público entre marido e mulher,
entre companheiros, entre pais e filhos, dos filhos entre si e dos parentes entre si. Não lhe retira essa
natureza o fato de ser o ramo do direito civil em que é menor a autonomia privada e em que é
marcante a intervenção legislativa” (LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
p. 41).
207 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sérgio. Interview with Reinhard Zimmermann and Jan Peter
Schmidt. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 4, ano 2, p. 379413, jul./set. 2015. p. 408.
208 Cf. MULTEDO, Renata Vilela; BODIN DE MORAES, Maria Celina. A privatização do casamento.
Civilistica.com, a. 5, no 2, p. 121, 2016. p. 5, referindose à maior liberdade em relação ao casa mento
como um “fenômeno do século XXI”.
209 Uma análise pormenorizada dessa lei, precedida por um breve estudo comparatístico sobre o
divórcio, pode ser consultada em: RODRIGUES, Silvio. O divórcio e a lei que o regulamenta. São Paulo:
Saraiva, 1978. p. 59 ss.
210 RODRIGUES, Silvio. Breve histórico sobre o Direito de Família nos últimos 100 anos. Revista da

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 88, p. 239254, jan./dez. 1993. p. 244. No mesmo
sentido: “Diferentemente do que acontecia com a Constituição anterior, a atual abdicou da idéia de
proteção absoluta ao casamento e de que este era a via única para a formação de uma família com
proteção legal” (ALMEIDA, José Luiz Gavião de. O Direito de Família e a Constituição de 1988. In.
MORAES, Alexandre de. Os 20 anos da Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Atlas,
2009. p. 381394, citada p. 382).
211 A ponto de não ser mais possível qualificar a família “de legítima ou ilegítima, sendo esta consti tuída

de várias formas: pelo casamento, pela união estável ou pela monoparentalidade” (MALUF, Adriana
Caldas do Rêgo Freitas Dabus. Novas modalidades de família na pós-modernidade. São Paulo: Atlas,
2010. p. 13.
212 RODRIGUES, Silvio. Breve histórico sobre o Direito de Família nos últimos 100 anos...p. 245.
213 “Anova lei restringe a intervenção do Estado na vida privada das pessoas, na medida em que
possibilita que os inventários, as separações e os divórcios consensuais, sem filhos menores, não
necessitem mais se submeter à tutela prévia do Poder Judiciário, já combalido e assoberbado com
tantas demandas judiciais” (COLTRO, Antonio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz. Nota dos
coordenadores. In. COLTRO, Antonio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz (Coords.) Separação,
divórcio, partilhas e inventários extrajudiciais: questionamentos sobre a Lei no 11.441/2007. São Paulo:
Método, 2007. p. 57. cit. p. 5).
214 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. O novo divórcio. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 55. Pouco

antes da aprovação da EC 66/2010, Paulo Lôbo já afirmava que seu efeito seria a supressão da
separação judicial, “seja como alternativa ao divórcio, seja como requisito ao divórcio por con-
versão”, e que se reputariam “revogados todos os dispositivos do Código Civil que tratarem da se-
paração judicial, exceto os que digam respeito à guarda dos filhos, aos alimentos devidos ao cônjuge
e aos filhos, à manutenção ou não do nome de casado (sem o requisito de culpa) e à partilha dos
bens” (LÔBO, Paulo Luiz Netto. Dissolução da sociedade conjugal: separação judicial e suas modali-
dades. In. CHINELLATO, Silmara; SIMÃO, José Fernando; FUJITA, Jorge Shiguemitsu; ZUCCHI, Maria
Cristina. Direito de família no novo milênio. São Paulo: Atlas, 2010. p. 285297, cit. p. 287288).
215 CASTRO JUNIOR, Torquato. O divórcio após a Emenda Constitucional 66/2020 e a questão da culpa
pelo rompimento de vínculo no Brasil. In. COSTA FILHO, Venceslau Tavares; CASTRO JUNIOR,
Torquato da Silva (Coords.). A modernização do Direito Civil. Recife: Nossa Livraria, 2012. V. 2. p. 235-
248.
216 Em sentido aproximado: “Tais alterações refletiram a tendência que vem ocorrendo em nosso país: a

da desregulamentação das relações conjugais, havendo a possibilidade cada vez maior de expressão
das liberdades de escolhas, atentando o Direito por garantir a estrutura familiar mais conveniente
para cada indivíduo” (MULTEDO, Renata Vilela; BODIN DE MORAES, Maria Celina. A privatização do
casamento. Civilistica.com, a. 5, no 2, p. 121, 2016. p. 5).
217 MULTEDO, Renata Vilela; BODIN DE MORAES, Maria Celina. A privatização do casamento...p. 7. As
autoras destacam, contudo, que “não se busca defender a completa ausência do Estado; bus camse,
sim, as intervenções que sejam garantidoras dos espaços de autodeterminação, de modo a que a
autonomia existencial se realize plenamente. Para tanto, parece, fundamental aceitar que as relações
conjugais e convivenciais não estejam sob o jugo de normas cogentes, salvaguardandose sempre as
especiais situações de vulnerabilidade e desigualdade material que, diante dos prin cípios da
solidariedade e da dignidade da pessoa humana, requeiram a ação positiva do Estado” (MULTEDO,
Renata Vilela; BODIN DE MORAES, Maria Celina. A privatização do casamento...p. 8).
218 Jorge Alberto Caras Altas Duarte Pinheiro (O núcleo intangível da comunhão conjugal: Os deveres

conjugais sexuais. Coimbra: Almedina, 2004. p. 509) reconhece a existência do problema, mas nega
essa possibilidade, pois, “embora não exista nenhuma norma que impeça especificamente a
realização, na constância do matrimônio, de acordos que derroguem os deveres conjugais, há pre-
ceitos que negam a licitude de acordos do género, quando efectuados no momento da celebração
do casamento ou em momento anterior”.
219 PINHEIRO, Jorge Alberto Caras Altas Duarte. O núcleo intangível da comunhão conjugal: Os deve res
conjugais sexuais...p. 514.
220 NERY, Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade. Segurança patrimonial da família: Institutos jurídi cos

a serviço da liberdade dos nubentes na confecção do pacto antenupcial. In. TAVARES DA SILVA,
Regina Beatriz; BASSET, Ursula Cristina (Coords.). Família e pessoa: Uma questão de princípios. São
Paulo: YK, 2018. p. 639655 (esp. p. 648649).
221 Emfavor da continuidade da culpa, de modo coerente com a defesa de que a separação judicial
permanece no ordenamento brasileiro: CASTRO JUNIOR, Torquato. O divórcio após a Emenda
Constitucional 66/2020 e a questão da culpa pelo rompimento de vínculo no Brasil...p. 247; TAVARES
DA SILVA, Regina Beatriz. Divórcio e separação: após a EC no 66/2010. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
p. 37 ss.
222 Há disputa na doutrina especializada sobre haver realmente alguma diferença entre essas espé cies

de alimentos devidos entre os cônjuges: a) pela diferença: CARVALHO FILHO, Milton Paulo de.
Comentário ao art. 1.704. In. PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil comentado: doutrina e
jurisprudência. 8. ed. revista e atualizada. Barueri: Manole, 2014. p. 18341835; b) pela igualdade das
espécies de alimentos: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed. revista, atualizada e
ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 549: “Com o fim da separação (EC 66/10), restou
definitivamente esvaziada a busca de motivos para a dissolução do casamento, que só pode ser
obtida via divórcio. Dessa forma, as previsões legais (CC 1.702 e 1.704), impondo redução do
pensionamento do cônjuge culpado, restaram derrogadas”. Criticando a “situação constrangedora e
até humilhante” a que é submetido o excônjuge nessa hipótese do art. 1.704, parágrafo único:
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 9. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 711-
712.
223 RAVÀ, Adolfo. Lezioni di Diritto Civile sul matrimonio. 3. ed. revista e atualizada. Padova: CEDAM, 1935.
p. 397398 (destacando não se tratar de negócio de natureza patrimonial, pertencendo, na verdade, “à
categoria dos negócios familiares ou negócios de Direito de Família”. (No original: “(...) appartiene alla
categoria dei negozi familiari o negozi di diritto familiare”).
224 RUGGIERO, Roberto de. Istituzioni di Diritto Civile. 7. ed. Milano: Casa Editrice Giuseppe Principato,
1934. v. II. p. 64.
225 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Contrato de casamento, sua extinção e renúncia à alimentos na separa ção
consensual. In. AA.VV. Estudos em homenagem ao professor Washington de Barros Monteiro. São Paulo:
Saraiva, 1982. p. 4748 (invocando o caráter utilitário de assim considerar o casamento, mas
advertindo que este se rege por normas de ordem pública, embora permaneça como um instituto de
Direito Privado); CARVALHO SANTOS, João Manuel de. Código Civil brasileiro interpretado
(principalmente do pontodevista prático). 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1961. v. IV. p. 1011
(para quem o casamento é contrato especial, diferentemente dos demais contratos, por quanto “o
casamento se prende a elevados interêsses morais e pessoais e de tal forma que, uma vez ultimado o
contrato, produz êle desde logo efeitos que não mais podem desaparecer, subsis tindo sempre e
sempre como que para mais lhe realçar o valor”); ESPÍNOLA, Eduardo. A família no Direito Civil
brasileiro. Rio de Janeiro: Conquista, 1957. p. 4850; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti.
Tratado de direito de família. 3. ed. inteiramente refundida e aumentada. São Paulo: Max Limonad,
1947. v. I. p. 9394; BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da família. 6. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1938. p.
3637; “O que se deve entender, ao assegurar a natureza do matrimônio, é que se trata de um
contrato especial dotado de consequências peculiares, mais profundas e ex tensas do que as
convenções de efeitos puramente econômicos, ou contrato de Direito de Família, em razão das
relações específicas por ele criadas” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 2. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1975. v. V. p. 46).
226 A corrente doutrinária que negava a natureza contratual do casamento era representativa no século

XIX: “O casamento, attenta a sua natureza intima, não é um contracto, antes differe delle
profundamente, em sua constituição, no seu modo de ser, na duração e alcance de seus effeitos. O
casamento abrange a personalidade humana inteira; crêa a familia; funda a legitimidade dos filhos;
dá nascimento a relações que só se extinguem com a morte: os direitos e obrigações que delle
resultão trazem o cunho da necessidade e, no que dizem respeito ás pessoas, não podem ser
alterados, modificados ou limitados pelo arbitrio dos cônjuges” (PEREIRA, Lafayette Rodrigues.
Direitos de Familia. Annotações e adaptações ao Código Civil por José Bonifácio de Andrada e Silva. 2.
tiragem. Rio de Janeiro: Typ. da Tribuna Liberal, 1889. p. 30).
227 O casamento é “uma instituição, com caracteres próprios, que nasce de um ato jurídico de feição
complexa” (FRANÇA, Rubens L. Instituições de direito civil. 2. ed. atualizada. São Paulo: Saraiva, 1991. p.
225).
228 CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu. A mutabilidade do regime de bens entre cônjuges no Código

Civil de 2002. Revista Jurídica do Uniaraxá, no 9, p. 345367, 2006. p. 347. A autora é adepta da teoria
contratualista do casamento, destacando, contudo, seu caráter especial, como “contrato de direito
de família” (CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu. A mutabilidade do regime de bens entre cônjuges
no Código Civil de 2002...p. 350).
229 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

v. 5. p. 56: “Por ser o matrimônio a mais importante das transações humanas, uma das bases de toda
constituição da sociedade civilizada, filiamonos à teoria institucionalista, que o considera uma
instituição social”; RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família...cit. p. 23 (reconhecen do, contudo, haver
obrigações “que impregnam de contratualidade o casamento, como aquelas de mútua colaboração
no sustento e nas responsabilidades econômicas”).
230 “Em suma: o casamento assume a feição de um ato complexo, de natureza institucional, que
depende da manifestação livre da vontade dos nubentes, o que, porém, se completa pela celebra-
ção, que é ato privativo de representante do Estado. Não há inconveniente, dada a peculiaridade do
fenômeno, de chamar ao casamento contrato de direito de família” (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil:
Direito de Família. 28. ed. rev. e atual. por Francisco José Cahali. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 6. p. 2022,
citada p. 22).
231 “Nas relações conjugais impera uma certa instabilidade, muito embora a Constituição Federal

continue proclamando (Art. 226) que ‘a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado’.
É uma proteção muito relativa e de certo modo precária” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Evolução do
Direito de Família: Transformação dos valores éticosociais em relação ao casamento, aos filhos e à
sexualidade. In. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Direito civil: Alguns aspectos da sua evolução. Rio de
Janeiro: Forense, 2001. p. 204).
232 JAYME, Erik. Pósmodernismo e Direito da Família. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de
Coimbra, no 78, p. 209221, 2002.
233 FERNANDES, Luís A. Carvalho. Lições de Direito das Sucessões. Lisboa: Quid Juris, 1999. p. 23.
234 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sergio. Entrevista com Reinhard Zimmermann e Jan Peter
Schmidt. Tradução do inglês por Mark Walker. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 5, ano 2, p.
329 362, out./dez. 2015. p. 345 346 (sobre os novos arranjos jurídicos no Direito das Sucessões e a
renovação do interesse acadêmico sobre a matéria); GARBI, Carlos Alberto. Proposições para um
novo Direito Sucessório no Brasil. In. TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz; BASSET, Ursula Cristina
(Coords.). Família e pessoa: Uma questão de princípios. São Paulo: YK, 2018. p. 257266 (esp. p. 261264,
quando defende a flexibilização do regime atual de igualdade entre cônjuge e compa nheiros
sobreviventes e a descendência do sucedido); MACEIRA, Irma Pereira. Herança digital. In. TAVARES
DA SILVA, Regina Beatriz; BASSET, Ursula Cristina (Coords.). Família e pessoa: Uma questão de
princípios. São Paulo: YK, 2018. p. 387412; MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Holding
familiar e suas vantagens: planejamento jurídico e econômico do patrimônio e da sucessão familiar. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 5; FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. O direito real de habitação e a sua
possível relativização no direito sucessório brasileiro: Primeiras reflexões. Revista de Direito Civil
Contemporâneo, v. 8, p. 225271, jul./set. 2016.
235 STF, RE 878694, rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. 10/05/2017, DJe021 06/02/2018. Para um

exame crítico desse acórdão: RANGEL, Roberta Maria. A declaração incidental de inconstitucio-
nalidade do art. 1.790 do Código Civil pelo Supremo Tribunal Federal: Comentários ao RE 646.721/ RS
e RE 878.694/MG. Revista de Direito Civil Contemporâneo. v. 15, ano 5, p. 353438, jul.set. 2018.
236 LAGO JÚNIOR, Antonio; BARBOSA, Amanda Souza. Primeiras análises sobre o sistema de (in)capa-
cidades, interdição e curatela pós Estatuto da Pessoa com Deficiência e Código de Processo Civil de
2015. Revista de Direito Civil Contemporâneo, São Paulo, v. 8, no 3, p. 4989, jul./set. 2016. p. 61. Esses
autores destacam, contudo, a existência de aspectos dignos de reflexão no EDP: “Ocorre que, da
forma como o EPD transformou a teoria das incapacidades, em determinadas situações sua aplicação
redundará em desproteção, como nos casos de pessoas com deficiência que sejam, de fato,
absolutamente incapazes. Entendese que, nesses casos extremos, não existe razão para não se
declarála como tal, mediante a ação de interdição” (LAGO JÚNIOR, Antonio; BARBOSA, Amanda
Souza. Primeiras análises sobre o sistema de (in)capacidades, interdição e curatela pós Estatuto da
Pessoa com Deficiência e Código de Processo Civil de 2015...p. 84).
237 Com maior ênfase, defendendo que o CPC restringiu “de maneira brutal os direitos fundamentais da

pessoa restrita em sua capacidade, excluindoo da sociedade civil, colocandoo a margem das relações
extrapatrimoniais, contrariando de forma cediça o objetivo da Convenção da Organização das
Nações Unidas e do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que possui como paradigma social a
inclusão” (NISHIYAMA, Adolfo Mamoru; TOLEDO, Roberta Cristina Paganini. O estatuto da pessoa
com deficiência: reflexões sobre a capacidade civil. Revista dos Tribunais, v. 974, p. 3562, dez. 2016. p.
47). Em sentido contrário, defendendo a continuidade da interdição no ordenamento brasileiro:
TOSTES, Camila Strafacci Maia; AQUINO, Leonardo Gomes de. A repercussão do es tatuto da pessoa
com deficiência no regime da capacidade civil. Revista de Direito Privado, v. 75, p. 6377, mar. 2017, p.
71. Adotando posição intermediária, no sentido de que a lei fixou “a obrigatoriedade da aplicação de
tailored measures, que levem em conta as circunstâncias de cada caso concreto, afastando a tão
comum saída, utilizada até então de forma quase total, de simples decretação da incapacidade
absoluta com a limitação integral da capacidade do sujeito” (REQUIÃO, Maurício. As mudanças na
capacidade e a inclusão da tomada de decisão apoiada a partir do Estatuto da Pessoa com
Deficiência. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 6, no 3, p. 3754, jan./mar. 2016. p. 48).
238 REQUIÃO, Maurício. As mudanças na capacidade e a inclusão da tomada de decisão apoiada a partir

do Estatuto da Pessoa com Deficiência...p. 51.


239 Ascinco grandes (“Big Five”) são a Orquestra Sinfônica de Boston, a Orquestra Sinfônica de Chicago,
a Orquestra Sinfônica de Cleveland, a Filarmônica de Nova York e a Orquestra de Filadélfia. Nenhuma
delas possuía mais de 12% de mulheres até 1980 (GOLDIN, Claudia; ROUSE, Cecilia. Orchestrating
impartiality: The impact of “blind” auditions on female musicians. American Economic Review, v. 90, no
4, p. 715741, Sep. 2000. p. 717).
240 GOLDIN, Claudia; ROUSE, Cecilia. Orchestrating impartiality…p. 738.
241 GOLDIN, Claudia; ROUSE, Cecilia. Orchestrating impartiality…p. 717 e 738, nota 56.
242 GOLDIN, Claudia; ROUSE, Cecilia. Orchestrating impartiality…p. 737740.
243 A temática dos estudos demonstra esse viés: KRIEGER, Linda Hamilton; FISKE, Susan T. Behavioral
realism in employment discrimination law: Implicit bias and disparate treatment. California Law
Review, v. 94, fascículo 4, p. 9971062, 2006.
244 No original, Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz – AGG.
245 SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A proteção contra discriminação no Direito Contratual brasileiro.
Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 1, ano 1, p. 4165, 2014. p. 5253. Em sentido apro ximado:
THÜSING, Gregor. AGG § 3. In. THÜSHING, Gregor (Ed.) Münchener Kommentar zum Bürgerlichen
Gesetzbuch: BGB. 7. ed. München: C. H. Beck, 2009. § 3, nota marginal 9.
246 GUEDES, Jefferson Carús. Igualdade e desigualdade: Introdução conceitual, normativa e histó rica dos

princípios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014 (esp. p. 116118); MALLET, Estevão. Igualdade e
discriminação em Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2013; RIOS, Roger Raupp. Direito da
antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2008; GOMES, Joaquim Benedito Barbosa. Ação afirmativa e princípio constitucional da
igualdade: o direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de
Janeiro: Renovar, 2001; MAGANO, Octavio Bueno. A igualdade e a não discriminação nas relações de
trabalho. Revista LTr: legislação do trabalho e previdência social, v. 48, no 10, p. 11731180, out. 1984;
GENRO, Tarso. O princípio da “nãodiscriminação” no Direito do trabalho. Revista LTr: legislação do
trabalho e previdência social, v. 45, no 9, p. 10441046, set. 1981.
247 Jorge Cesa Ferreira da Silva tem escrito sobre o tema desde 2007, com interesse principalmente nas
discriminações indiretas: SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A proteção contra discriminação no direito
contratual brasileiro. In. PINTO MONTEIRO, Antonio; NEUNER, Jörg; SARLET, Ingo Wolfgang (Orgs.).
Direitos fundamentais e Direito Privado: uma perspectiva de Direito Comparado. Coimbra: Almedina,
2007; SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A proteção contra discriminação no Direito Contratual brasileiro.
Revista de Direito Civil Contemporâneo...cit. Mais recentemente: PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. A
proibição de discriminação nos contratos no Direito brasileiro em face da expe riência europeia.
Direitos Fundamentais e Justiça, v. 8, no 28, p. 5281, jul./set. 2014.
248 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sérgio. Entrevista com Paulo Mota Pinto. Revista de Direito Civil

Contemporâneo, v. 8, ano 3, p. 367380, jul./set. 2016. p. 377380.


249 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sérgio. Entrevista com Paulo Mota Pinto. p. 378379. Em sen tido
parcialmente aproximado, quando se refere às discriminações inaceitáveis: ROTHENBURG, Walter
Claudius. Igualdade. In. LEITE, George Salomão; SARLET, Ingo Wolfgang (Coords.). Direitos
fundamentais e estado constitucional: Estudos em homenagem a J. J. Gomes Canotilho. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009, p. 346371 (esp. p. 353354). Mais especificamente sobre a preser vação
dos espaços de escolha com base em convicções ou formas de vida: MOTA PINTO, Paulo. Autonomia
privada e discriminação: algumas notas. In. SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos
fundamentais e Direito Privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 331.
250 SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A proteção contra discriminação no Direito Contratual brasileiro.

Revista de Direito Civil Contemporâneo...cit. p. 64. Em sentido aproximado, particularmente quan to ao


Direito Romano: “É possível que uma sociedade sem Direitos Fundamentais no sentido atual possa
manterse unida somente por meio do Direito Privado? Ou, formulado sob uma ou tra perspectiva: o
Direito Privado romano, que conseguiu garantir essa coesão, era diferente do Direito Privado
moderno? A resposta às duas perguntas é afirmativa. Decorre da moderna idéia de Estado a
necessidade de Direitos Fundamentais; em uma outra compreensão de Estado po dem, pelo menos
algumas das funções protetivas dos Direitos Fundamentais, ser exercidas pelo Direito Privado, cujo
papel, desse modo, é concebido diferentemente do que o é nas sociedades modernas (CHIUSI,
Tiziana. A dimensão abrangente do Direito Privado Romano: observações sis temáticoteoréticas
sobre uma ordem jurídica que não conhecia “direitos fundamentais”. Revista Trimestral de Direito Civil:
RTDC, v. 9, no 34, p. 211236, abr./jun. 2008).
251 SAVIGNY, Friedrich Carl von. System des heutigen Römischen Rechts...cit. v. 1. p. 26 (reconhece expli-
citamente essa vinculação com base no Direito Romano). Reconhecendo esse papel fundante para a
publicização do Direito Processual na obra de Savigny: MORAES, Bernardo B. Queiroz de. Parte Geral:
Código Civil. Gênese, difusão e conveniência de uma ideia. São Paulo: YK, 2018. p. 100.
252 O nome do processualista alemão Oskar Büllow é curiosamente objeto de desacordo no Brasil. Ele é

mais conhecido como Oskar von Büllow, mas quem consultar suas obras até 1877 encontrará apenas
Oskar Büllow. Rigorosamente, as duas formas são corretas. Assim como Otto von Gierke, que
escreveu a maioria de suas obras como Otto Gierke e passou a usar a partícula von só no século XX,
Büllow era um plebeu que foi nobilitado em 1877, quando Karl, rei de Württemberg, concedeulhe a
Cruz de Cavaleiro de 1ª Classe da Ordem da Coroa Vurtemberguesa. Só a partir de então ele adquiriu
o direito de incorporar a seu nome a partícula von, que caracteriza os membros da nobreza nos
Estados alemães.
253 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Candido Rangel. Teoria
Geral do Processo. 31. ed. revista e ampliada. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 286287.
254 Sobre o caráter publicístico da ação: TUCCI, Rogério Lauria. Jurisdição, ação e processo civil (subsídios

para a Teoria Geral do Processo Civil). Revista de Processo, v. 13, no 52, p. 740, out./dez. 1988. § 5.
255 Sobre o caráter público da jurisdição: TUCCI, Rogério Lauria. Jurisdição, ação e processo civil (sub-
sídios para a Teoria Geral do Processo Civil)...§ 2; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Breves no tas
sobre jurisdição e ação. In. ZUFELATO, Camilo; YARSHELL, Flávio Luiz (Org.). 40 anos da Teoria Geral do
Processo no Brasil: passado, presente e futuro. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 537555, cit. p. 538539
(inclusive afirmando o caráter de “administração pública de interesses privados” para o caso da
jurisdição voluntária: op. cit. p. 545). Heitor Vitor Mendonça Sica destaca que a construção do
instituto da jurisdição é muito anterior à autonomização científica do Direito Processual, tendo sido
esse conceito aprimorado pelos juristas entre o fim do século XIX e meados do século XX, “a reboque
do desenvolvimento do conceito de processo, considerado este último como instrumento de que se
serve o Estado para exercer o poder jurisdicional” (SICA, Heitor Vitor Mendonça. Velhos e novos
institutos fundamentais do direito processual civil. In. ZUFELATO, Camilo; YARSHELL, Flávio Luiz
(Orgs.). 40 anos da Teoria Geral do Processo no Brasil: passado, presente e futuro. São Paulo: Malheiros,
2013. p. 430466. cit. p. 433434).
256 “Na verdade, foi somente com Planck e, mais tarde, com Windscheid, é que a actio e outros institutos

a ela jungidos passam a ser examinados sob um prisma processual, culminando com a obra de Bülow
reconhecidamente o mais importante processualista do século passado na qual, após sobrelevar as
fronteiras que separam o direito material do direito processual, vem concebido o processo como
relação jurídica, de natureza pública, autônoma e triangular” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Espírito do
Processo Civil moderno na obra de Rudolf von Ihering. Revista da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, v. 87, p. 2336, jan./dez. 1992. p. 29). A gran de contribuição de Büllow, realmente, “foi
demonstrar que a relação (pública) entre juiz, autor e réu não se confunde com a relação jurídica de
direito material controvertida entre autor e réu e trazida à apreciação judicial, pois cada qual se
sujeita a pressupostos próprios” (SICA, Heitor Vitor Mendonça. Velhos e novos institutos
fundamentais do direito processual civil...p. 439). “Se é certo que o Direito Processual Civil disciplina a
resolução processual das lides civis (id est, não penais), seus princípios e normas incidem, por outro
lado, sobre uma atividade estatal. Isto significa que o Direito Processual é ramo do Direito Público”
(MARQUES, José Frederico. Instituições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1958. v. I. p.
42).
257 CORREIA DE MENDONÇA, Luís. O pensamento de Franco Cipriani sobre a Justiça civil. Revista de
Processo, v. 172, p. 55120, jun. 2009.
258 DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

v. 2. p. 484485.
259 Essa contratualização do Processo Civil não tem sido ignorada pelo Direito francês: CADIET, Löic. La
tendance a la contractualisation de la justice et du procès. Revista de Processo, v. 41, no 261, p. 117-
137, nov. 2016; CADIET, Löic; JEULAND, Emmanuel. Droit Judiciaire Privé. 9. ed. Paris: LexisNexis, 2016.
260 “Pois bem, à orientação contrária não cairá mal, nessa perspectiva, a denominação de privatismo.

Sejamos, porém, mais exatos: já que semelhante orientação nos remete à mentalidade dominan te
em tempos idos e infelizmente, ao que tudo indica, reerguida da sepultura em que parecia jazer ,
numa época em que o processo civil era tido e havido como ‘coisa das partes’ (Sache der Parteien,
segundo a conhecida expressão alemã), tomamos a liberdade de chamarlhe neopriva tismo, na
esperança de que isso não desagrade aos seus ardorosos propagandistas” (BARBOSA MOREIRA, José
Carlos. O neoprivatismo no Processo Civil. Revista de Processo, v. 122, p. 921, abr. 2005. § 10); GRECO,
Leonardo. Publicismo e privatismo no Processo Civil. Revista de Processo, v. 33, no 164, p. 2956, out.
2008; BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Privatização do processo? Revista da EMERJ, v. 1, no 3, p. 1325,
1998.
261 O PLC 4.850, de 2016, estabelece medidas contra a corrupção e demais crimes contra o patrimô nio

público e combate o enriquecimento ilícito de agentes públicos. Em um de seus títulos, que


pretende introduzir no Brasil o chamado “acordo penal”, que é uma espécie de plea bargain à
brasileira: um acordo entre o réu e o Ministério Público pelo qual o primeiro aceita todas ou parte das
acusações em troca da mitigação ou supressão de penas. Há um acordo entre as partes, com nítida
natureza negocial, que, em última análise, impede o avanço da instrução, cujos resultados poderiam
ser incertos, em câmbio de penas menores. É mais um exemplo de legal transplant de institutos de
common law para o Direito brasileiro.
262 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Uso da arbitragem para desafogo do Judiciário. In. PEREIRA, Caio Mário
da Silva. Reformulação da ordem jurídica e outros temas. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 118124.
263 CARMONA, Carlos Alberto. Mediação, conciliação e arbitragem no novo CPC. In. MENDES, Aluisio

Gonçalves de Castro (Org.). O novo Código de Processo Civil: programa de estudos avançados em
homenagem ao Ministro Arnaldo Esteves Lima. Rio de Janeiro: EMARF, 2016. p. 161172; MESQUITA,
José Ignácio Botelho de. Vista da arbitragem a partir do processo. In. FRANÇA, Erasmo Valladão
Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von (Coords.). Temas de direito empresarial e outros
estudos: em homenagem ao professor Luiz Gastão Paes de Barros Leães. São Paulo: Malheiros, 2014,
p. 192200; MENDES, Rodrigo Octávio Broglia. Arbitragem, lex mercatoria e direito estatal: uma análise
dos conflitos ortogonais no direito transnacional. São Paulo: Quartier Latin, 2010 (com enfoque no
problema da jurisdição em face da transnacionalidade).
264 Embora com fundamentos diversos dos aqui apresentados: “As restrições urbanísticoambientais
convencionais, historicamente de pouco uso ou respeito no caos das cidades brasileiras, estão em
ascensão, entre nós e no Direito Comparado, como veículo de estímulo a um novo consen sualismo
solidarista, coletivo e intergeracional, tendo por objetivo primário garantir às gerações presentes e
futuras espaços de convivência urbana marcados pela qualidade de vida, valor esté tico, áreas verdes
e proteção contra desastres naturais” (STJ. REsp 302.906/SP, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda
Turma, j. 26/08/2010, DJe 01/12/2010).
265 HARDIN, Garrett. The Tragedy of the Commons. Science, v. 162, fascículo 3859, p. 12431248, Dec.

1968.
266 COLE, Daniel. Pollution and property: Comparing ownership institutions for environmental protec-
tion. Cambridge: Cambridge, 2002. p. 86 e ss.
267 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.
325.
268 ROPPO, Vincenzo. Il contratto. Milano: Giuffrè, 2001. p. 565; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A dou trina

do terceiro cúmplice: autonomia da vontade, o princípio res inter alios acta, função social do contrato
e a interferência alheia na execução dos negócios jurídicos. Revista dos Tribunais, v. 93, no 821, p. 80-
98, mar. 2004. § 4.
269
SILVEIRA, Newton. Propriedade imaterial e concorrência. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 75, no
604, p. 264271, fev. 1986.
270
Existe ainda a proteção ao locatário, em um regime de locações subordinado à Lei no 8.245, de 18 de
outubro de 1991, em seu art. 51, que prevê o direito de renovação do contrato desde que haja
exploração comercial no imóvel, na mesma atividade, por, no mínimo, de três anos ininterruptos.
271 LEAL, Larissa Maria de Moraes; COSTA FILHO, Venceslau Tavares. Notas sobre o empreendimento do
shopping center: a questão do tenant mix e da cláusula de raio e seus efeitos no campo das relações
empresariais e das relações de consumo. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 2, p. 137154,
jan./mar. 2015.
272 “O controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos de cunho empresarial é res trito,

face a concretude do princípio da autonomia privada e, ainda, em decorrência de preva lência da


livre iniciativa, do pacta sunt servanda, da função social da empresa e da livre concor rência de
mercado. (STJ. REsp 1535727/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 10/05/2016, DJe 20/06/2016).
Sobre este caso, confirase este comentário jurisprudencial: ANCONA LOPEZ, Teresa. Cláusula de raio
em contrato de shopping center. Revista de Direito Civil Contemporâneo. v. 10, ano 4, p. 373412,
jan./mar. 2017.
273 O Direito Concorrencial como meio de proteção indireta dos direitos dos consumidores enquadra se
na leitura de Calixto Salomão Filho (Direito concorrencial: as condutas. São Paulo: Malheiros Editores,
2003. p. 81). Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer (Tutela coletiva da livre concorrência. Revista de
Direito do Consumidor, v. 49, p. 1139, jan./mar. 2004) tem posição favorável a uma relação de
proteção imediata.
274 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direto comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. 2. ed.

São Paulo: RT, 2012. p. 159.


275 A Diretiva 2014/104/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, regulou

o exercício das pretensões de indenização por infração às regras de concorrência. Ela é conhecida
como Diretiva do private enforcement.
276 ZÖTTL, Johannes; SCHLEPPER, Lisa. Die private Durchsetzung von kartellrechtlichen Schaden-

sersatzansprüchen – Status Quo in Deutschland. Europäische Zeitschrift für Wirtschaftsrecht EuZW, v.


23, p. 573576, 2012. p. 575. Sobre o desenvolvimento da matéria no Direito europeu: SCHMOLKE,
Klaus Ulrich. Private enforcement und institutionelle Balance. Neue Zeitschrift für Gesellschaftsrecht –
NZG, v. 19, p. 721728, 2016.
277 MEIRELES, Henrique da Silva Seixas. Marx e o Direito Civil (para a crítica histórica do “paradigma
civilístico”). Coimbra: Coimbra, 1990. p. 5660.
278 KELSEN, Hans. Hauptprobleme der Staatsrechtslehre...p. X; DIAS, Gabriel Nogueira. O positivismo
jurídico e a Teoria Geral do Direito...p. 133, nota de rodapé 8. Ivan Pupolizio (Per un modello teorico
della “grande dicotomia” tra Diritto Pubblico e Diritto Privato. Materiali per una Storia della Cultura
Giuridica, v. XLIII, no 2, dic. 2013. p. 349, nota de rodapé 24) também dá o crédito a Kelsen, não só pela
frase, mas pela forma resoluta com que se ocupou a destruir qualquer possível fundamento teórico à
“grande dicotomia”. En passant, sugere uma “antecipação medieval dessa tese” na obra de Baldo de
Ubaldis (13271406), sob a fórmula equivalente em latim, “omne ius est publicum”.
CAPÍTULO TERCEIRO

A VISÃO DA DOUTRINA NACIONAL, O DIREITO


ROMANO E AS TEORIAS SOBRE A “DISTINÇÃO
SISTEMÁTICA”

SUMÁRIO. § 14. Considerações iniciais. § 15. A “grande dicoto mia” na


doutrina brasileira. 15.1. Doutrina nacional do século XIX até 1988. 15.2. A
“grande dicotomia” no cenário pós1988. § 16. Extinção ou mitigação da
“distinção sistemática”: catá logo de fundamentos da civilística brasileira.
§ 17. Origens ro manas e medievais: Ius Publicum e Ius Privatum. § 18.
Repasse das principais teorias sobre a “distinção sistemática”.
§14. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Era praticamente uniforme na doutrina civilista brasileira do século XIX e
até o final do século XX a adesão à tese da dicotomia entre o Direito Privado e o
Direito Público. Diferentemente do debate europeu ou latino-americano,279 no
Brasil esse tema ficou confinado aos manuais, tratados e cursos de Direito Civil,
com relativamente poucas publicações em revistas científicas, monografias ou
capítulos de livros.
É especialmente interessante observar que, nas últimas duas décadas, os
administrativistas assenhoraram-se do tema, o que provavelmente se deu pelo
desconforto de alguns (ou pelo entusiasmo de outros) com o avanço dos
institutos privados sobre o território publicístico. Ressalte-se, ainda, que parte
dos textos não trata como objeto central da discussão a dicotomia em si, seus
fundamentos e sua possibilidade histórica ou científica. A maior parte deles tem
como finalidade analisar os efeitos dessa diferenciação ou como se dá a
retroalimentação de conceitos, institutos e figuras jurídicas entre o Direito
Público e o Direito Privado.280
§15. A “GRANDE DICOTOMIA” NA DOUTRINA BRASILEIRA

15.1. Doutrina nacional do século XIX até 1988


Exemplos representativos da literatura jurídica do Oitocentos, como
Augusto Teixeira de Freitas,281 Antonio Joaquim Ribas282e Lourenço Trigo de
Loureiro, comprovam o reconhecimento da “distinção sistemática” como tema
central na Teoria Geral do Direito Privado de então.283
No início do século XX, a questão foi objeto do relatório dos trabalhos
sobre a elaboração do Código Civil. Embora se tenha reconhecido a dificuldade
de se “delimitar o campo das differentes disciplinas jurídicas” e de se elogiar a
redação do art. 23 do Projeto Nabuco de Araújo (“O Direito Civil é o regulado
pelo Código Civil”), chegouse à seguinte conclusão: “si o Direito Privado encara
mais particularmente o individuo e a sociedade, emquanto distincta do Estado,
ao passo que o Direito Publico visa o cidadão e a sociedade politicamente
organizada”.284
Em uma das primeiras obras didáticas sobre o então novo Código Civil,
Spencer Vampré divide as leis quanto ao seu objeto dentre as de direito público,
“as que dispõem directa e imediatamente sobre a organização do Estado ou o
interesse publico”, que se departem em constituições e leis administrativas, e as
de direito privado, “as que dispõem directa e imediatamente sobre os interesses
dos particulares”, subdivididas em leis civis e leis comerciais.285
Em seu livro sobre Teoria Geral do Direito Civil, Clóvis Beviláqua
concede poucas linhas à divisão do direito objetivo. Limita-se o autor do
anteprojeto do CC/1916 a mencionar a existência de leis de ordem pública,
inderrogáveis pelos acordos privados, e as leis supletivas, aqueles que funcionam
apenas “quando a vontade individual deixa de manifestar-se”, pois “seu campo
de ação é o reservado à autonomia da vontade dos particulares”.286
Nos comentários ao CC/1916, Beviláqua enaltece a distinção entre o
Direito Público e o Direito Privado como o resultado da argúcia dos romanos,
sendo ela “de importância capital, na teoria do direito, para systematização das
idéias, porque as duas ordens de preceitos obedecem a principios diversos”, além
de o ser “na pratica legislativa e forense”. Como ele reconhece, essa divisão é
por todos conhecida e proclamada, o problema desponta quando “surgem as
dificuldades, e as sombras se projectam sobre o pensamento”.287 Após rejeitar a
teoria do interesse, ele recorre à diferenciação baseada nos sujeitos: a presença
do Estado tornaria pública a relação jurídica e tudo o que a ela diga respeito. A
pessoa, como cidadã, sujeitar-se-ia ao Direito Público.288
Dos autores da primeira metade do século XX, Eduardo Espínola foi um
dos que se dedicou com maior profundidade ao tema.289 Ele afirma que é
pequeno o número de estudiosos que “repelem a divisão consagrada desde os
romanos”, posto que não seja desprezível o número de dificuldades em se
proceder a essa departição, tanto maiores quanto mais próximas dos “limites
entre os dois territórios”.290
A seu ver, “o Direito Civil compreende as relações entre os indivíduos, as
relações entre estes e as associações particulares, as destas entre si, e as entre os
indivíduos ou as associações particulares e as associações públicas, quando são
sujeitos de direitos ou de obrigações, do mesmo modo por que o pode ser o
indivíduo”. Por fim, ele toma partido pela qualificação do Direito Civil como um
direito comum, equiparável ao conceito de direito privado geral, em oposição ao
Direito Comercial, que se revelaria como “um direito especial de certa classe de
indivíduos”.291
Convém agora proceder à revisão de obras escritas no período posterior ao
Governo Provisório de 1930, que já alcançaram a fase de intervencionismo
estatal inaugurada por Getúlio Vargas, a qual se constituiu em uma ideologia do
regime, de modo particular após o Estado Novo. Na Europa, particularmente na
Alemanha e na Itália, as ideologias totalitárias deixavam suas marcas na
universidade e nos livros jurídicos.
Tem-se o registro das aulas de Francisco Clementino de San Tiago Dantas,
o catedrático de Direito Civil da Faculdade Nacional de Direito da Universidade
do Brasil, nos anos de 1942 a 1945, graças à edição das notas taquigráficas de
seus alunos.
O caráter de uma obra de tradição oral do Programa de Direito Civil de
San Tiago Dantas colhe-o apresentando aos alunos quais são os melhores livros
e periódicos de Direito Civil, disponíveis nas bibliotecas jurídicas do Rio de
Janeiro. Ao chegar às revistas alemãs, ele lamenta que “hoje em dia não se
recebe nada”, o que é esperável por se estar, em 1942, no auge da Segunda
Guerra Mundial.
Ele prossegue: “Havia duas boas, uma a Deutsch Recht, mas o direito
alemão, com o advento do nacional socialismo, entra para nós numa fase inútil,
os juristas todos se empenham em abandonar as tradições do direito alemão e
improvisar uma nova doutrina de acordo com o novo regime político”.292 Quem
dera todos tivessem essa lucidez na época e, mais importante, nas décadas
subsequentes.
Especificamente quanto ao tema da dicotomia, ele é tratado acidentalmente
na obra. San Tiago Dantas primeiro esclarece que as “relações entre os homens”
correspondem ao objeto do Direito Civil, as quais assim se distinguiriam: a)
aquelas nas quais “um particular coloca-se na dependência de outro”, ao
exemplo do filho sujeito à autoridade parental; b) as relações de pessoa a pessoa,
“mas tendo em vista um interesse patrimonial”, como se dá no uso dos bens ou
quando se dá “a um indivíduo a faculdade de exigir do outro uma certa prestação
patrimonial”; c) as relações derivadas do Direito de Família e do Direito das
Sucessões.293 De modo lateral, ele retorna ao problema quando expõe sobre o
art. 6o da então LICC (atual LINDB), e afirma que “nas normas de direito
público predomina o argumento de que o Estado deve tutelar imediatamente o
bem comum”.294
Nos anos 1950, na obra de Vicente Ráo, já se notam os efeitos das teorias
da publicização e da socialização do Direito Privado, por ele muito criticadas,
seja pela falta de acordo semântico, seja porque as aceitar implicaria admitir que
o Direito “somente agora se revelasse uma ciência social”.295 Fiel à
essencialidade da “distinção sistemática”, Vicente Ráo propõe como critério
diferenciador a natureza de norma de organização do Estado, seus órgãos e
funções, atribuível ao Direito Público; ao passo em que, ao Direito Privado,
recairia a disciplina das relações “desprovidas de natureza política ou
jurisdicional, que os indivíduos mantêm entre si, ou com o Estado, ou com as
entidades por ele criadas para a realização de seus fins próprios”.296
Ainda como representativo dos anos 1950, cita-se Miguel Maria de Serpa
Lopes, que chama a atenção para o “fracasso de todas as tentativas modernas
para excluir a distinção, a despeito da forte oposição de Kelsen”. O critério
escolhido por Serpa Lopes para conservar a dicotomia é o da natureza da justiça
que envolve as relações respectivas: as que se submetem à distributiva, são de
Direito Público, enquanto as que se timbram pela justiça comutativa, são de
Direito Privado.297
Nas páginas seguintes, Serpa Lopes traça as linhas de um cenário bem
característico de sua época: (i) o Direito Privado, louvado em autores franceses
como Savatier e Ripert, publicizou-se, socializou-se e proletarizou-se, o que se
denota pelo desaparecimento dos valores e dos modos da vida burguesa, com o
declínio das instituições nelas concebidas, para se dar lugar a um novo Direito,
“imbuído da maneira de viver e das concepções proletárias”; 298 (ii) o Direito de
Família, ao menos na óptica de autores do período, caminharia para uma
“estreita afinidade” com o Direito Público.299
O manual de Orlando Gomes começou a ser editado em fins dos anos
1950,300 embora sua visão sobre a diferenciação do Direito já pudesse ser
captada bem antes em escritos como Raízes históricas e sociológicas do Direito
Civil.301 Em sua obra didática, Orlando Gomes faz uma resenha das principais
teorias explicativas da divisão, com as respectivas objeções. Informa o leitor
sobre o surgimento de uma reação à dicotomia, inspirada no “movimento de
renovação do Direito, impregnado de essência antiindividualista”.302 Ele admite
que muitas das críticas à separação mostram-se procedentes, mas conservá-la é
algo “aceitável sob os aspectos técnico e didático”. 303
Obras inicialmente publicadas nos anos 1960, mas reeditadas até os dias de
hoje, como os cursos de Caio Mario da Silva Pereira,304 Silvio Rodrigues305 e
Washington de Barros Monteiro306 também se posicionam no sentido de ser útil,
atual e fundamentada a dicotomia.
Caio Mário da Silva Pereira, defende existir uma unidade conceitual (no
plano filosófico), orgânica (no plano científico) e teleológica (no plano social)
do Direito, o que não impede que os “princípios jurídicos” se agrupem “em duas
categorias, constituindo a primeira o direito público e a segunda o direito
privado”.307 Não haveria para ele uma separação “total e absoluta das normas
públicas e das normas privadas”, as quais se comunicariam “com frequência”. O
problema residiria em como distinguilos.308 Após passar em revista as principais
teorias, opta pela combinação de critérios objetivos e subjetivos, ao estilo de
Roberto de Ruggiero, para defender que o Direito Público é o que tem “por
finalidade regular as relações do Estado com outro Estado, ou as do Estado com
seus súditos”, esforçado “em razão do poder soberano” e atuando “na tutela do
bem coletivo”. Enquanto o Direito Privado disciplinaria as relações entre pessoas
singulares, “nas quais predomina imediatamente o interesse de ordem
particular”.309
Washington de Barros Monteiro, provavelmente influenciado pelo período
histórico em que escreveu as primeiras edições de sua obra, realçou, contudo, o
avanço da publicização do Direito Privado, do que seria exemplo o fato de que
“todo o direito de família caminha para o direito público”.310

15.2. A “grande dicotomia” no cenário pós-1988


No ano da promulgação da CF/1988, Rubens Limongi França lançou suas
Instituições de Direito Civil e, mesmo em edição atualizada com o novo texto
constitucional, conservou-se fiel à dicotomia.311
Com gradações, a maioria dos cursos de Direito Civil editados ou
reeditados no Brasil, no século XXI, continuam a validar a dicotomia Direito
Público-Direito Privado,312 com variável uniformidade nos argumentos
utilizados.313
Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade Nery e Nelson Nery Júnior, ao
analisar o tema, também afirmam a conveniência de se manter a dicotomia,
embora não considerem ser possível tomá-la de modo extremado.314 Em
conclusão, defendem que a “dicotomia estanque” está superada na atualidade,
sendo mais correto falar em uma “ressignificação” tanto do Direito Privado
quanto do Direito Público, porque ambos, “ao mesmo tempo em que mantêm a
sua autonomia disciplinar, exigem a colaboração um do outro” para se proceder
a sua diferenciação no caso concreto e observadas as mudanças histórico-
temporais.315
Francisco Amaral examina os critérios distintivos das normas de Direito
Público e Direito Privado, ao passo que demonstra suas fragilidades. Ele assinala
que “a doutrina dominante inclina-se pela teoria do ius imperium”, segundo a
qual o Direito Público regularia “as relações em que o Estado intervém com
poder de autoridade” e ao Direito Privado cumpriria regular “as relações dos
particulares entre si ou com o Estado, com base na igualdade jurídica e no seu
poder de autodeterminação”.316 A apreciação das críticas à “grande dicotomia”,
especialmente formuladas por autores positivistas, não impede que Francisco
Amaral conclua que o Direito Privado continua a ser o “direito comum das
pessoas e da economia, disciplinando as relações jurídicas comuns de ordem
pessoal e patrimonial, enquanto o direito público disciplina relações jurídicas
especiais e autoritárias, criadas em função de uma atividade dirigida a fins de
interesse geral”.317
Carlos Alberto Dabus Maluf e Adriana Caldas do Rêgo Freitas Dabus
Maluf entendem que há uma continuidade no marco divisório entre o Direito
Público e o Direito Privado, mas que deixou de haver uma “linha separativa
precisa”.318
Há, porém, exceções, como aqueles que deixam de se referir à dicotomia319
ou declaram que ela cede espaço ante a constitucionalização do Direito Civil.320
En-contram-se também textos para os quais “o Direito Privado é Direito
Constitucional aplicado, pois nele se detecta o projeto de vida em comum que a
Constituição tenta impor; Direito Privado representa os valores sociais de
vigência efetiva”.321
§16. EXTINÇÃO OU MITIGAÇÃO DA “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”:
CATÁLOGO DE FUNDAMENTOS DA CIVILÍSTICA BRASILEIRA
As causas metajurídicas, preponderantemente históricas e econômicas,
expõem a fragilidade das teses que permanecem a defender acriticamente o
esmaecimento das fronteiras entre o Direito Púbico e o Direito Privado ou a
ampla publicização do Direito Privado, especialmente do Direito Civil. As
referências legislativas servem de fundamento jurídico a essa refutação, embora
se tenha optado por uma enumeração puramente descritiva de câmbios
normativos recentes.
Ainda que não exaustivamente, expuseram-se algumas correntes que
defendem o enfraquecimento ou mesmo o fim da dicotomia Direito Público-
Direito Privado. Convém, no entanto, organizar os principais argumentos
contemporâneos dos que defendem essas teses. A finalidade desse inventário é
permitir que se tente refutar essas teses nos parágrafos subsequentes. Por efeito
dessa delimitação, somente autores brasileiros serão arrolados, dada a finalidade
desta tese que é examinar o problema à luz do Direito nacional.
É preciso evitar um recorrente problema: confundir-se socialização,
publicização e constitucionalização do Direito Privado, embora esses fenômenos
possam aparecer como círculos secantes ou tangentes.322 Nesta seção, objetiva-se
exclusivamente expor os fundamentos desenvolvidos pelos que defendem o
publicização do Direito Privado, o fim da dicotomia público-privado ou o caráter
artificial dessa divisão.
Os argumentos podem ser assim organizados para explicar o fim da
dicotomia Direito Público-Direito Privado, quanto a suas causas: a)
interpenetração das regras de Direito Público e de Direito Privado; b) eficácia
dos direitos fundamentais em relação aos particulares; c) a constitucionalização
do Direito Privado; d) superação do patrimonialismo; e) proteção à dignidade da
pessoa humana; f) solidariedade social; g) função social dos institutos jurídicos;
h) humanização do Direito Civil; i) sujeição da vontade das partes contratantes
ao interesse público; j) publicização do Direito Privado; k) socialização do
Direito Privado; l) o caráter puramente ideológico da dicotomia.323
Muita vez, a “distinção sistemática” aparece como um elemento retórico do
discurso principal contido no texto. É uma espécie de “espantalho
argumentativo”, que precisa ser atacado para se assegurar o “lugar da fala”.
Quando se compara semelhante debate, ao menos em estudos contemporâneos,
há alguma identificação quanto às causas que conduziram ao (suposto) declínio
da “grande dicotomia”, ao exemplo da publicização do Direito Privado (e a
correspondente privatização do Direito Público).324
Não é ignorado, por exemplo, o papel das ideologias totalitárias e
autoritárias em seu enfraquecimento. A publicização e a socialização do Direito
Privado dariam o substrato necessário a um Konvergenzrecht, que combinaria
elementos publicísticos e privatísticos e ainda funcionaria como uma forma de
interrupção do pluralismo jurídico e dos riscos dele derivados quanto à unidade
do Estado. O Nacional-Socialismo reforçou essa última tese com a vinculação da
“diferenciação sistemática” a uma ruptura com a unidade instituída pelo Führer
e pela ideologia da grande “comunidade alemã”.325
É claro que os autores nacionais não cogitavam desses vínculos histórico-
teóri-cos do discurso contrário à “grande dicotomia”. E, mesmo com tais
ligações, é possível colocar-se contra a divisão ou sustentar seja ela mitigada,
sem que isso implique tais concessões. O problema está em não admitir certas
exigências de rigor metodológico e de coerência argumentativa. Uma delas é que
a diferenciação específica não é compatível com o monismo jurídico, algo que
raramente é admitido pelos civilistas contemporâneos, ciosos das fontes não
estatais.
§17. ORIGENS ROMANAS E MEDIEVAIS: IUS PUBLICUM E IUS PRIVATUM
Expostas as principais linhas argumentativas, no Direito brasileiro, contra a
“distinção sistemática”, refaz-se nesta seção o percurso inicial de qualquer
debate sobre o tema: a tradição romanística, pois é comum iniciar-se tal procura
a partir do Direito Romano e seus desdobramentos. Essa providência não vem
isolada de problemas, sejam eles históricos (de qual período do Direito Romano
se está a cuidar?), sejam eles de interpretação das fontes, consubstanciadas nos
textos retirados dos fragmentos das tábulas e dos pergaminhos antigos. A
despeito dessas dificuldades, convém proceder a um inventário, com base nos
livros dos romanistas, sobre as definições de Direito Privado e Direito Público
ali desenvolvidas. Não sem antes advertir, com Darcio Roberto Martins
Rodrigues, que “todo estudo histórico-jurídico só faz sentido e tem razão de ser
se estiver inserido numa visão prevalentemente jurídico-dogmática (e não
meramente histórica, o que transformaria o Direito Romano em simples peça de
museu ou antiquário).”326
É muito citado o fragmento de Ulpiano (Dig. I, 1, 1, 2), segundo o qual ius
publicum est quod ad statum rei Romanae spectat, priuatum quod ad singulorum
utilitatem. Na tradução de Hélcio Maciel França Madeira: Direito Público é o
que se volta ao estado da res Romana, privado o que se volta à utilidade de cada
um dos indivíduos, enquanto tais.327 Tem-se aqui um critério distintivo baseado
na utilitas, equiparável ao conceito moderno de interesse, proveito,
necessidade.328 Como se poderia formular uma “objeção irrespondível” a esse
critério, pois o “que interessa ao Estado também é do interesse de seus
cidadãos”, admite-se como a verdadeira intenção de Ulpiano “estabelecer a
divisão com base na função imediata das normas jurídicas: as que interessam
imediatamente ao Estado e apenas mediatamente aos cidadãos se enquadram no
ius publicum; caso contrário, no ius priuatum”.329
A autoridade do fragmento de Ulpiano e sua utilização como marco
fundante da dicotomia Direito Público-Direito Privado notabilizaram-se na
doutrina civilista moderna e contemporânea, tanto no Brasil330 quanto em
Itália,331 Alemanha e Áustria332 e Portugal.333 Mais que isso: desde a Revolução
Francesa, o fragamento há se constituído em um dos pilares fundamentais para a
classificação e o estudo do Direito.334
Persiste, ainda, uma distinção, encontrada no Direito Romano clássico,
quanto à matéria objeto dos editos: aqueles que diziam respeito ao ius publicum
eram baixados pelos censores e os relativos ao ius privatum eram publicados
pelos pretores.335
Outra interpretação possível é a que identifica no ius publicum o conceito
atualmente referido como direito cogente ou direito (norma) de ordem pública.
Essa outra hipótese não é desconhecida de Moreira Alves, quando ele menciona
a Lei Falcidia e o caráter ius publicum (“hoje diríamos: de ordem pública”) de
seus preceitos, os quais não poderiam “deixar de ser aplicados pela vontade do
testador”.336 Em sentido aproximado, desta vez com base em outro fragmento
(Dig. 2.14.38, ius publicum priuatorum pactis mutari non potest), o ius publicum
corresponderia ao ius cogens (direito cogente), “cuja aplicação não pode
depender da vontade das partes interessadas”, que não o poderiam excluir ou
derrogar. O ius dispositium (direito dispositivo) suportaria os efeitos da força
modificativa da vontade das partes.337 Essa leitura encontra contestações.
Segundo Antonio dos Santos Justo, “este critério não justifica que todas as
normas do ius privatum possam, a contrario, ser afastadas pela vontade dos
particulares: há, no ius privatum romano, disposições que restringem a
autonomia individual, proibindo acordos ou pactos que se lhes oponham”.338
Max Kaser oferece outra visão do problema. Depois de assinalar que os
termos ius publicum e ius privatum não correspondem em Roma a “nenhuma
divisão sistemática e estrita do direito em duas áreas principais”, verificando-se
essa distinção em obras didáticas dos juristas do período clássico tardio (caso do
fragmento das Instituições de Ulpiano),339 ele explica que essas expressões
“designam duas massas segundo os pontoschave do respectivo objecto: por um
lado ‘direito do Estado’ (publicus de populus), por outro ‘direito do indivíduo’ e
da sua família (privatus de privus ‘singular’, privatus ‘particular’)”.340 A
segmentação estaria enraizada na provecta oposição entre a civitas (“associação
estadual”) e a família (“associação familiar da casa”).341
Esse critério é verificável na literatura romanista. Theodor Mommsen anota
que o conceito de populus sofrerá variações históricas, ora se aproximando da
ideia de Estado (em contraposição a César); da ideia de partícula formadora da
vontade geral; ou da comunidade de patrícios e plebeus. Todas essas acepções
correspondem a diferentes períodos da civilização romana.342
Há dúvidas quanto à estabilidade histórica dessa divisão, considerando-se a
possibilidade de interpolações343 e de intervenções dos glosadores no
preenchimento do conteúdo desses conceitos, como a consideração de que
seriam públicas as matérias relativas aos magistrados, aos sacerdotes e às igrejas;
ou ainda as que se referem ao tesouro do Estado e ao Direito Penal.344
Ao tempo de Acúrsio, chegou-se mesmo a usar de critérios mais dúcteis,
com a introdução do discrímen “principaliter”: o Direito Público respeitaria
principalmente (principaliter) à situação do Estado, mas não de modo exclusivo,
dado que a proteção dos interesses estatais também é conveniente aos
particulares. O Direito Privado referir-se-ia principaliter à utilidade dos
particulares, mas também não de modo exclusivo, visto que os indivíduos
deveriam bem usar suas propriedades e esse uso óptimo ao Estado interessa, seja
porque este é responsável por baixar normas indicando como se devem empregar
adequadamente os bens, seja porque não se deve usá-los de modo indevido.345
Nos territórios hoje correspondentes à Alemanha, na Idade Média,
conhece-ram-se diversas variantes da definição do que seria “público” e
“privado”, especialmente nos séculos XIII a XVI. A riqueza do idioma alemão
está na raiz desses câmbios linguísticos, que conheceram desde associações entre
o público (Volk) como algo de uso do povo (populus); ao privado como algo
contraposto ao que é de conhecimento de todos, o secreto; ou o público como
expressão de algo que pertence ou se vincula à soberania do Estado
(Staatlichkeit).346
Do Medievo e da Idade Moderna, chega-se à Idade Contemporânea, mas
terá sido apenas no século XIX, com Gustav Hugo, que se estabilizou a divisão
entre öffentliches Recht e Privatrecht, o que se tornou comumente aceito após a
edição do primeiro volume do Sistema de Direito Romano atual de Friedrich
Carl Freiherr von Savigny.347 O Direito Público compreenderia o Direito do
Estado, o Direito Penal e o Direito Processual.348
A Escola Histórica ocupou-se preponderantemente do Direito Privado. Ao
estilo de seus integrantes, para além de interesses nacionais no elemento privado,
as fontes de direito público (assim entendidas) eram por demais esparsas para
servirem de base a uma verdadeira “ciência jurídica publicística”.349 Além disso,
ante a relação estreita entre o Direito Público e a experiência política, sua
instabilidade era grande demais para caber no projeto de sistematização
empreendido por aqueles juristas.350 A efetiva apropriação da “temática
publicística” pela historiografia jurídica somente se daria pelas mãos de Theodor
Mommsen.351
É ordinário que a diferenciação sistêmica seja pródiga em implicações
filosóficas. Giuseppe Lumia, ao propor uma aproximação com o pensamento de
Immanuel Kant, afirma inicialmente que se dedicam a essa distinção, com igual
interesse, juristas e filósofos.352 Pois bem. Retomando o fragmento de Ulpiano,
Giuseppe Lumia afirma que a utilitas, como um elemento meramente empírico,
não poderia satisfazer ao filósofo de Königsberg, cujo método consistia em
discernir “no material oferecido pela experiência quanto houvesse de universal e
necessário, e por isso mesmo inderivável da experiência mesma”.353 Kant
abandona a visão tradicional que relacionava a dicotomia ao conteúdo da norma
e adota a posição atintente à forma do comando, à sua fonte. Ele identifica o
Direito Privado ao Direito Natural e o Direito Público com o Direito Positivo, e
explica a diferença entre esses a partir das diversas fontes de ambos: os
princípios a priori da razão, no caso do Direito Natural (Direito Privado), e a
vontade do legislador, quando se alude ao Direito Positivo (Direito Público).354
§18. REPASSE DAS PRINCIPAIS TEORIAS SOBRE A “DISTINÇÃO
SISTEMÁTICA”
António Menezes Cordeiro organizou as teorias que fundamentam a
contraposição entre o Direito Público e o Direito Privado de uma maneira muito
interessante e que será adotada nesta seção.355 Ele apresenta, em duas classes, as
teorias materiais e as do sujeito.
São materiais as teorias do interesse; da importância; da subordinação; e da
tradição, as quais se examinam a seguir:356
a) Teoria do interesse (Interessentheorie). Por esta teoria, toma-se o
fragmento de Ulpiano (D. I, 1, 1, 2), recorrendo-se à utilitas, traduzida por
“interesse”, sendo que, ao Direito Privado, recomendam-se os interesses dos
particulares, enquanto ao Direito Público, o interesse público. Essa teoria serve
para justificar a prevalência do “interesse público” sobre o “interesse privado”,
ao mesmo tempo em que explica o porquê de certos Direitos situarem-se no
campo publicístico, dada sua destinação à coletividade e a seus fins, como é o
caso do Direito Tributário, do Direito Administrativo, do Direito Urbanístico ou
do Direito Penal.357
Uma moderna objeção a essa teoria encontra-se no já anunciado câmbio da
aparente publicização do Direito Privado para uma privatização do Direito
Público, com a transferência de amplos setores de atuação estatal, em particular
na prestação de serviços públicos, para agentes privados. No século XXI, é
difícil sustentar a divisão com base em interesses que se mostram realizáveis por
meio de particulares e com instrumentos negociais formados no Direito
Privado.358 Outra crítica deriva do fato de que é difícil, na prática, identificar
qual o interesse predominante.359
b) Teoria da importância. Uma forma particular da Interessentheorie, essa
teoria radicaliza a tese da prevalência do interesse público sobre o privado, na
medida em que o “Direito público corresponde a um sector mais importante do
que o privado”, sobre ele prevalecendo em caso de concorrência.360 Ela também
esconde um problema que consiste na aparente preeminência axiológica do
Direito Público sobre o Direito Privado. Para além disso, existem situações
contemporâneas, particularmente no Direito brasileiro, que afastam o
fundamento da importância do Direito Público como um dado a priori.
A primeira diz respeito aos conflitos entre a função social e a função
ambiental da propriedade. O parágrafo primeiro do art. 1.228, CC/2002,
determina que o direito de propriedade “deve ser exercido em consonância com
as suas finalidades econômicas e sociais”, mas “de modo que sejam preservados,
de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como
evitada a poluição do ar e das águas”. Haveria espaço para se afirmar a
coexistência das referidas funções (social e ambiental), para além de outras,
como a histórica e a cultural. Isso está bem. Mas pode haver um conflito entre
esses limites externos ao direito de propriedade, quando se pretende construir
uma hidrelétrica, que gerará energia para milhares de pessoas, atendendo-se à
função social, em uma área ecologicamente protegida, o que poderia dar margem
a uma violação da função ambiental. Qual dessas funções teria mais
importância?
A segunda, que é mais próxima da dicotomia público-privado, está em uma
situação assim exemplificável: a construção de um shopping center, com a
geração de empregos, em área protegida por cláusulas de uma escritura pública
de loteamento muito antigo, dispostas quando não havia legislação ambiental
municipal e que proíbem obras dessa natureza. Para se complicar ainda mais o
problema, adicione-se o fato de que posteriormente aprovaram-se normas
urbanísticas (de Direito Público, portanto), que oferecem um minus de proteção
às áreas edificandas, se comparada àquela promovida pelo negócio jurídico inter
partes. Qual deveria ser mais importante?
Quanto à segunda hipótese, ao menos na jurisprudência contemporânea do
STJ, já se tem uma resposta. O caso decidido no tribunal possui os seguintes
elementos descritivos: no início do século XX, a City of São Paulo
Improvements and Freehold Land Company Limited, fundada em 1912, adquiriu
diversas projeções em áreas periféricas do então centro expandido da capital de
São Paulo. Com base em inovadores projetos urbanísticos de Barry Parker e
Raymond Unwin, no ano de 1913, a empresa – que ficou conhecida como
Companhia City – lançou seu primeiro loteamento, o Jardim América.
Transportava-se para o Brasil o conceito de cidade-jardim, que havia sido
desenvolvido por Ebenezer Howard, cuja pretensão era criar ambientes nos quais
se conjugasse a qualidade de vida, a flora e a harmonia comunitária.
O Jardim América, hoje um bairro de São Paulo, constituiu-se por
edificações de único piso, com amplas áreas arborizadas, recuos e linhas
divisórias superiores ao padrão da época. Mesmo após um século de sua criação,
o empreendimento ainda conserva parte de suas características originais.
Outras áreas foram adquiridas pela Companhia City e resultaram em novos
loteamentos (Anhangabaú, City Butantã, Alto da Lapa, Bela Aliança, Alto de
Pinheiros e Pacaembu). Nos anos 1910-1930, era muito comum encontrarem-se
anúncios de página inteira nos jornais de São Paulo com esses empreendimentos,
nos quais se salientava o caráter inovador da concepção arquitetônica, baseada
nos elementos imaginados por Ebenezer Howard. Atualmente, esses loteamentos
serviram de base para novos bairros da capital paulista, todos extremamente
valorizados. Alguns foram tombados pelo Patrimônio Histórico a partir dos anos
1990.
A especulação imobiliária, a explosão demográfica e a mudança das leis de
zoneamento e de posturas municipais tiveram por consequência a
descaracterização parcial desses bairros. As associações de moradores
terminaram por recorrer ao Poder Judiciário e aos órgãos de proteção urbanística
e histórica, a fim de impedir essas alterações na concepção original das áreas.
Sob a óptica ambiental, as restrições construtivas baseavam-se em convenções e
não em normas legais ou infralegais. Com o passar das décadas, aprovaram-se
leis municipais que apresentavam níveis de proteção inferiores às restrições
convencionais fixadas quando da constituição dos bairros-jardim. Os adquirentes
dos imóveis entendiam que tais óbices poderiam ser superados por se fundarem
na autonomia privada e não encontrarem reflexo na legislação vigente.
Esse conflito entre convenções continentes de regras protetivas (ambientais
e paisagísticas) óptimas, decorrentes da autonomia privada, e leis urbanísticas
(com reflexos ambientais e paisagísticos) menos protetivas, deu ensejo a que se
testassem as hipóteses 1 e 2. E foi precisamente o que se deu no âmbito do REsp
302.906/SP,361 quando se julgou um conflito entre restrições convencionais-
ambientais e se lhes concedeu prevalência sobre normas legais de natureza
administrativa, preservando a concepção do loteamento em sua feição original
do início do século XX.
O relator valeu-se de uma argumentação fundada no interesse público e na
natureza verdadeiramente pública das convenções privadas instituidoras de
“restrições urbanístico-ambientais”. Na verdade, essa assimilação teve caráter
mais retórico do que efetivo e revela um traço comum em certas argumentações
que pretendem conferir maior importância aos dispositivos de Direito Privado
em relação aos de Direito Público, que é a de transmudar a natureza dos
primeiros. Não é adequado dizer-se que um instituto privatístico, ao exercer
funções de proteção ambiental, assume natureza ou funções de Direito Público.
O caráter inovador do acórdão poderia ter sido ainda mais perceptível se seus
fundamentos reconhecessem o caráter (eventualmente) óptimo de cláusulas
negociais proibitivas de condutas antiambientais.
O simples reconhecimento de que, em certos casos, pode haver
superioridade axiológica de convenções privadas não seria menos válido e ainda
teria a vantagem de não exigir custos argumentativos tão elevados.
Independentemente de tais fundamentos, contudo, o caso é revelador da
fragilidade de distinções entre o Direito Público e o Direito Privado louvadas
preponderantemente em um vago critério de importância.
c) Teoria da subordinação. A teoria da subordinação, também conhecida
por teoria da imputação, encontra fundamento para a dicotomia na diferenciação
das de Direito Privado e de Direito Público a partir do binômio coordenação-
subordina-ção.362 As relações entre os privados dar-se-iam no plano da
igualdade, regendo-as normas de coordenação. Ao passo que as relações
jurídico-publicísticas seriam timbradas por normas de subordinação, dada a
preeminência de um dos sujeitos (o Estado) sobre o outro (o administrado).363 É
uma teoria que deita raízes no século XIX e que se baseia na noção de que a
Administração Pública se limitava pelos deveres de intervenção.364
A teoria da subordinação é contestável quando se percebem traços de
igualdade em algumas relações jurídicas entre o Estado e o particular; enquanto
também é notável certa assimetria por subordinação nos vínculos entre dois
particulares.365
d) Teoria da tradição. Sua formulação é “muito funcional e realista”: serão
matérias de Direito Público ou de Direito Privado aquelas que assim o foram
consideradas ao longo da experiência jurídico-histórica e da evolução dos
institutos. Ressalvase sempre a possibilidade de uma “requalificação das
normas”, a depender de fatores supervenientes dignos de relevância,366 que
justifiquem uma alteração em seu locus no Direito Público ou no Direito
Privado.367
Na sequência do catálogo organizado por António Menezes Cordeiro,
quanto ao sujeito assim elas se agrupam:
a) Teorias do sujeito. O Direito Público corresponde ao Direito das
pessoas jurídicas de direito público e daquelas que sejam equivalentes, desde que
atuem como expressões da soberania estatal.368 Por consequência, a norma de
Direito Público não seria vinculante em relação a todos os sujeitos, porque, em
vários casos, se “dirige exclusivamente aos titulares de um poder de autoridade”.
As normas de Direito Privado, por sua vez, dirigem-se indistintamente a todos,
desde que pressuposta a igualdade entre os agentes.369
b) Teoria da ordenação. Entra aqui o elemento da especialidade das regras
de Direito Público e sua função legitimadora dos sujeitos que se regulam
exclusivamente por esse setor do ordenamento.370 Há quem divida a teoria da
ordenação em supra-or-denação e infra-ordenação: “essa, ao dizer que o direito
público disciplina relações de desigualdade (de supra-ordenação ou de infra-
ordenação) e que o direito privado disciplina relações de igualdade”.371
c) Teoria da competência. A diferenciação aqui se dá pela competência
para agir no sistema jurídico. O Direito Privado contém regras que permitem a
atuação jurídica por qualquer pessoa, dentro de sua capacidade. No Direito
Público, são competentes apenas “as pessoas indicadas por uma norma de
legitimação”.372 Uma aproximação que esclarece melhor o alcance dessa teoria é
o princípio da legalidade. No Direito Público, ele significa que só é permitido
aquilo que a lei assim o considera. No Direito Civil, será legal tudo o que não
contrariar as normas jurídicas dessa natureza. Um agente administrativo só pode
praticar atos quando houver uma norma de competência que lhe confira tal
prerrogativa, ainda que possua forte caráter de generalidade. Um particular só
encontrará limites a sua atuação quando ultrapassar as fronteiras da licitude.
d) Teoria da gestão pública. O Direito Público consistiria em uma “soma
das normas relativas a relações nas quais um dos sujeitos, na base de uma
situação legitimadora actuaria como gestor (Sachwalter) do bem comum”.373
e) Teoria do direito especial. Segundo Menezes Cordeiro, não haveria uma
teoria do Direito especial, mas um conjunto delas. Elas seriam “hoje
dominantes” e se pautam pelo caráter geral da incidência do Direito Privado
(“aplicável a todos os sujeitos”), em contraponto à natureza especial do Direito
Público. Essa especificidade revelar-se-ia de dois modos: (i) pela incidência em
relação a entidades com legitimidade derivada da lei para se utilizar das
“inerentes prerrogativas”; (ii) o Direito Público só atuaria “perante determinadas
ocorrências”.374 Essa teoria foi originalmente desenvolvida por Hans Julius
Wolff que concebia o Direito Público como o “direito especial do Estado”.375
A leitura desse catálogo de teorias é reveladora da importância de que
ainda se reveste o problema da dicotomia Direito Público-Direito Privado.
Independentemente disso, desde muito cedo tem-se anotado problemas ou
limitações nessas teorias. Afir-ma-se serem sincréticas, insuficientes,
tautológicas ou, ainda, que os autores terminam por proceder a combinações que
as tornam irreconhecíveis.376

279 Evidentemente que qualquer pesquisa sobre o tema, no Direito estrangeiro, é lacunosa, dada a
imensidão de fontes e a pluralidade de repositórios a serem pesquisados. A seguir, enumeramse
artigos, capítulos de livros e obras monográficas especialmente dedicadas ao problema da dis tinção
Direito PúblicoPrivado: ALPA, Guido. Diritto Privato e Diritto Pubblico. Un questione aperta. Rivista
Trimestrale di Diritto dell’Economia, v. 2, p. 104174, 2016; PUPOLIZIO, Ivan. Per un modello teorico
della “grande dicotomia” tra Diritto Pubblico e Diritto Privato. Materiali per una Storia della Cultura
Giuridica...cit.; PUPOLIZIO, Ivan. Materiali per uno studio socio logico della distinzione tra Diritto
Pubblico e Diritto Privato. Sociologia del Diritto. v. XXXIX, no 2, p. 735, 2012; MOHNHAUPT, Heinz.
Historische Konkurrenzen und Beeinflussungen zwischen Privatrecht und öffentlichem Recht...cit.;
ODUDU, Okeoghene. The public/priva te distinction in EU internal market law. Revue Trimestrielle de
Droit Europeeen, v. 46, no 4, p. 826841, dec. 2010; RÖDL, Florian. Private law beyond the democratic
order? On the legitima tory problem of Private law “beyond the state”. The American Journal of
Comparative Law, v. 56, no 3, p. 743767, 2008; JANSEN, Niels; MICHAELS, Ralf. Private Law and the
State: Comparative perceptions and historical observations. Rabels Zeitschrift für ausländisches und
internationales Privatrecht, v. 71, no 2, p. 354397, 2007; LEISNER, Walter. Unterscheidung zwischen
priva tem und öffentlichem Recht. Juristen Zeitung, v. 61, no 18, p. 869875, Sep. 2006; MICHAELS, Ralf;
JANSEN, Nils. Private law beyond the State? Europeanization, globalization, privatization... cit.;
NAPOLITANO, Giulio. Pubblico e privato nel diritto amministrativo. Milano: Giuffrè, 2003; STOLLEIS,
Michael. Öffentliches Recht und Privatrecht im Prozeß der Entstehung des modernen Staates. In.
HOFFMANNRIEM, Wolfgang; SCHMIDTAßMANN, Eberhard (Orgs.). Öffentliches Recht und Privatrecht
als wechselseitige Auffangordnungen. BadenBaden: Nomos, 1996, p. 41 61; CAPPELLINI, Paolo.
Pubblico e privato (diritto intermedio). In. AA.VV. Enciclopedia del diritto. Milão: Giuffrè, 1986. v. XXXV,
p. 660687; FERRARI, Vincenzo. Privato e pubblico (sociologia del dirit to). AA.VV. Enciclopedia del
diritto. Milão: Giuffrè, 1986. v. XXXV, p. 687704; GALGANO, Francesco. Pubblico e privato
nell’organizzazione giuridica. Contratto e Impresa, v. 2 loc. cit.; RAISER, Ludwig. O futuro do Direito
Privado. Revista da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul, v. 9, nº 25, p. 1130, 1979 (texto
de grande influência no Brasil nos anos 1980); BULLINGER, Martin. Öffentliches Recht und Privatrecht:
Studien über Sinn und Funktionen der Unterscheidung. Stuttgart: W. Kohlhammer, 1968;
MERRYMAN, John Henry. The Public lawPrivate law distinc tion in European and American law.
Journal of Public Law, v. 17, no 1, p. 319, 1968; BAUR, Fritz. Neue Verbindungslinien zwischen
Privatrecht und öffentlichem Recht. Juristen Zeitung, v. 18, no 2, p. 4147, Jan. 1963; CERRONI,
Umberto. Sulla storicità della distinzione tra Diritto Privato e Diritto Pubblico. Rivista Internazionale di
Filosofia del Diritto, v. 37, p. 335367, 1960; EISENMANN, Charles. Droit Public, Droit Privé. Revue du
Droit Public, v. LXVIII, p. 903979, 1952; WOLFF, Hans Julius. Der Unterschied zwischen öffentlichem
und privatem Recht. Archiv des öffentlichen Rechts-AöR, v. 76, p. 205217, 1950; MOLITOR, Erich. Über
Öffentliches Recht und Privatrecht. Eine rechts systematische Studie. Karlsruhe: C.F. Müller, 1949;
SAVATIER, René. Du droit civil au droit public.... loc. cit.; ALIMENA, Francesco. Osservazioni sulla
distinzione del Diritto in pubblico e privato. Roma: Società Editrice del Foro Italiano, 1931; DONATI,
Benvenuto. L’unità del diritto e l’unità della scien za del diritto a proposito della distinzione del diritto
in pubblico e privato. Internationale Zeitschrift für Theorie des Rechts, v. 1, p. 120139, 19261927;
BONFANTE, Pietro. La progressiva diversifica zione del Diritto Pubblico e Privato. In. BONFANTE,
Pietro. Scritti Giuridici Vari. Roma: Sampaolesi, 1925. v. 4, p. 2845; KELSEN, Hans. Diritto Pubblico e
Privato. Rivista Internazionale di Filosofia del Diritto, v. 4, p. 340357, 1924; MAGGIORE, Giuseppe.
L’aspetto pubblico e privato del Diritto e la crisi dello Stato moderno. Rivista Internazionale di Filosofia
del Diritto, v. II, 23, p. 111142, 1922; RAGGI, Luigi. Ancora sulla distinzione tra Diritto Pubblico e Diritto
Privato. Rivista Italiana per le Scienze Giuridiche, v. LV, p. 111172, 1915; RANELLETTI, Oreste. Il concetto
di ‘pubblico’ nel diritto. Rivista Italiana per le Scienze Giuridiche, v. XXXIX, p. 337354, 1905. Parte dessas
fontes baseouse na enumeração feita por: PUPOLIZIO, Ivan. Per un modello teorico della “grande
dicotomia” tra Diritto Pubblico e Diritto Privato...loc. cit.
280 São exemplos desse debate pouco intensivo na literatura especializada no Brasil, em ordem cronoló-

gica decrescente, que reúne 23 trabalhos sobre a dicotomia Direito PúblicoDireito Privado: NOHARA,
Irene Patrícia. Transformações latentes das fronteiras entre público e privado: mutação ou retrocesso
no Direito Administrativo brasileiro. In. MACHADO SEGUNDO, Hugo; LINHARES, Emanuel Andrade
(Orgs.). Democracia e direitos fundamentais: uma homenagem aos 90 anos do professor Paulo
Bonavides. São Paulo: Atlas, 2016, p. 85108; PINTO, Emerson de Lima; COSTA, Bernardo Leandro
Carvalho. A distinção entre público e privado e sua caracterização no âmbito do Estado brasileiro.
Revista Digital de Direito Administrativo, v. 2, no 1, p. 311323, 2015; BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. A
administração pública entre o direito público e o direito privado...; MORAES, Luiz Gustavo Vasques
de. A validade da distinção clássica entre Direito Público e Direito Privado no âmbito dos direitos
reais mediante o princípio da função social da propriedade. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 104, no
958, p. 7397, ago. 2015; MUNIZ, Veyzon Campos. Superando Antígona. A distinção entre Direito
público e Direito Privado: li mites, enfraquecimento e consequências operacionais a partir de uma
análise hermenêutica. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica, v. 11, no 14, p. 169183, jul./dez.
2013; PINTO, Renata Jamús da Costa. Direito Público e Direito Privado: uma dicotomia do Direito
Desportivo. Revista Brasileira de Direito Desportivo, no 18, p. 180187, jul./dez. 2010; CASTRO, Honildo
Amaral de Mello. Falsa dicoto mia entre Direito Público e Direito Privado. Revista de doutrina e
jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Amapá, no 36, p. 3344, jan./abr. 2005; FLORES, Paulo
Roberto Thompson. A dicotomia entre Direito Público e Direito Privado. Universitas Jus, no 12, p. 145-
149, jan./jun. 2005; MARQUESI, Roberto Wagner. Fronteiras entre o Direito Público e o Direito
Privado...; SGARBI, Adrian. “Reduction ad unum”: Kelsen e o problema da dicotomia: Direito Público e
Direito Privado. Revista Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 4, no 14, p. 317, abr./jun. 2003; REIS,
Sebastião. Uma visão do Direito: Direito Público e Direito Privado. Revista de Informação Legislativa, v.
35, no 137, p. 6367, jan./mar. 1998; VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Direito Público, Direito Privado:
sob o prisma das relações jurídicas. 2. ed., rev. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 1996; POLETTI,
Ronaldo. A vertente romanista na dicoto mia Direito PúblicoPrivado. Revista Brasileira de Direito
Comparado, v. 7, no 12, p. 148151, jan./jun. 1992; BORJA, Sergio. Direito Público e Direito Privado:
desenvolvimento histórico da distinção. Estudos Jurídicos, São Leopoldo, v. 24, no 60, p. 525, jan./abr.
1991; MADEIRA, Carlos. Direito Civil e Direito Público. Revista do Tribunal de Justiça do Estado do
Maranhão, v. 1, no 1, p. 1125, out./dez. 1983; SURGIK, Aloísio. Anotações históricocríticas em torno do
binômio Direito PúblicoDireito Privado. In. AA.VV. Estudos em homenagem ao professor Washington de
Barros Monteiro. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 2742; SALDANHA, Nelson. Direito Público e Direito
Privado: notas sobre o aspecto histórico do problema e sobre a possibilidade de uma revisão. Arquivo
Forense, v. 46, p. 5562, jul./dez. 1962; QUEIROZ, João José de. A distinção entre o Direito Público e o
Direito Privado. Revista de Direito da Procuradoria Geral da Prefeitura do Distrito Federal, no 2, p. 1628,
1955; CIRNE LIMA, Ruy. Direito Pú blico e Direito Privado. Revista Jurídica, v. 1, no 1, p. 712, jan./fev.
1953; AMADO, Gilberto. Direito Público e Direito Privado: socialização dos meios de produção. Revista
Forense, v. 105, no 511/513, p. 170172, jan./mar. 1946; KLINGHOFFER, Hans. Direito Público e Direito
Privado: resumo da teoria de Hans Kelsen. Revista Forense, v. 39, no 89, p. 395399, jan./mar. 1942.
281 “(...) nada vamos com essas idéas francezas, que proclamão a impossibilidade de separarse com rigor

o Direito Publico do Direito Privado, o Direito Civil do Direito Criminal, e o Direito Civil the orico do
Direito Civil pratico, apresentando mil pontos de contacto e de differenças, e reduzindo desta
maneira a Sciencia Juridica e a Legislação a uma pasta de confusos elementos” (TEIXEIRA DE FREITAS,
Augusto. Nova apostila à censura do senhor Alberto de Moraes Carvalho sobre o projetcto do Codigo Civil
portuguez. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1859. p. 72). Em sentido aproximado:
TEIXEIRA DE FREITAS, Augusto. Consolidação das leis civis. Rio de Janeiro: Garnier, 1876. p. XXXVIII-
XXXIX.
282 RIBAS, Antonio Joaquim. Curso de Direito Civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: B.L. Garnier, 1880. v. 1. p.

39.
283 “O direito publico é o complexo das leis, que respeitao á organisação do corpo politico, aos inte-
resses geraes da sociedade, á segurança e garantias dos direitos individuaes. dos seus membros, e
que regulão ao mesmo tempo as relações do poder soberano com os seus subditos. O direito
privado, porém, é o complexo das leis, que regulão as relações dos subditos entre si como parti-
culares” (LOUREIRO, Lourenço Trigo de. Instituições de Direito Civil brasileiro. 4. ed. Rio de Janeiro: B. L.
Garnier, 1872. t. 1. p. 19).
284 BRASIL. Código Civil brasileiro: Trabalhos relativos á sua elaboração. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,

1917. v. 1. p. 26.
285 VAMPRÉ, Spencer. Manual de Direito Civil brasileiro: Theoria Geral do Direito e Direito de Familia. Rio
de Janeiro: F. Briguiet, 1920. v. 1. p. 4.
286 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria geral do Direito Civil. Ed. hist. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1977. p. 19.
287 BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil: Commentado. 5. ed. São Paulo: F. Alves,
1936. v. 1. p. 65.
288 BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil...v. 1. cit. p. 6768.
289 ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema do Direito Civil brasileiro. Rio de Janeiro: Editor Rio, 1977. p. 4152.
290 ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema do Direito Civil brasileiro...p. 42.
291 ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema do Direito Civil brasileiro...p. 5051.
292 SAN TIAGO DANTAS, Francisco Clementino de. Programa de Direito Civil: Teoria Geral. 3. ed. revis ta e
atualizada por Gustavo Tepedino, Antonio Carlos de Sá, Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho e
Renan Miguel Saad. Notas taquigráficas de Victor Bourhis Jürgens. Rio de Janeiro: Forense, 2001. v. 1.
p. 27.
293 SAN TIAGO DANTAS, Francisco Clementino de. Programa de Direito Civil: Teoria Geral...v. 1. p. 35.
294 SAN TIAGO DANTAS, Francisco Clementino de. Programa de Direito Civil: Teoria Geral...v. 1. p. 83.
295 RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos: Noções gerais. Direito positivo. Direito objetivo.
Atualização de Ovídio Rocha Barros Sandoval. 3. ed. anot. e atual. São Paulo: RT, 1991. v. 1. p. 188 (a
primeira edição é de 1952).
296 RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos...v. 1. p. 190191.
297 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil: Introdução, Parte Geral e Teoria dos Negócios
Jurídicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1957. v. 1. p. 27.
298 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil...v. 1. p. 30.
299 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil...v. 1. p. 31.
300 Utilizouse nesta tese, para as citações do pensamento de Orlando Gomes, a décimanona edição:
GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19. ed. revista, atualizada e aumentada, de acor do com o
Código Civil de 2002 por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
A primeira edição desse livro é, no entanto, de 1957: GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Rio
de Janeiro: Forense, 1957.
301 GOMES, Orlando. Raízes históricas e sociológicas do Código Civil brasileiro...cit. Essa obra é en contrável

na atualidade, em segunda edição: GOMES, Orlando. Raízes históricas e sociológicas do Código Civil
brasileiro. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
302 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil...p. 910.
303 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil...p. 1011.
304 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Introdução ao Direito Civil. Teoria Geral de
Direito Civil. 28. ed., rev. e atual. Atualizado por Maria Celina Bodin de Moraes. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. v. 1 p. 1215, embora a visão da atualizadora seja crítica à grande dicotomia (a primeira
edição é de 1961).
305 Ele comenta, com base em literatura francesa dos anos 1950 (SAVATIER, René. Du Droit Civil au Droit

Public...cit.) que ʺa tendência de absorção do direito privado pelo direito público é conside rável e
sensívelʺ. Tal vocação revela-se ʺnitidamente no aumento das regras de ordem pública, que se
multiplicam no campo do direito privado, principalmente no do Direito de Famíliaʺ (RODRIGUES,
Silvio. Direito Civil: Parte Geral. 34. ed. atual., 3. tir. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 1. p. 79).
306 BARROS MONTEIRO, Washington de; FRANÇA PINTO, Ana Cristina de Barros Monteiro. Curso de Direito

Civil: Parte Geral. 45. ed. São Paulo: 2016. v. 1. p. 1720.


307 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil...v. 1. p. 11.
308 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil...v. 1. p. 12.
309 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil...v. 1. p. 14.
310 BARROS MONTEIRO, Washington de; FRANÇA PINTO, Ana Cristina de Barros Monteiro. Curso de Direito

Civil: Parte Geral...v. 1. p. 1920.


311 FRANÇA, R. Limongi. Instituições de Direito Civil: todo o direito civil num só volume. São Paulo: Saraiva,

1988. Nesta tese, utilizouse edição mais moderna: FRANÇA, R. Limongi. Instituições de Direito Civil:
todo o direito civil num só volume. 3. ed., atual. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 8.
312 GOMES, José Jairo. Teoria Geral do Direito Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 23 (reconhecen do a
perda de prestígio da “grande dicotomia”, mas assinalando seu “inegável interesse prático”, por se
tratar de uma “classificação didática, operacional, que facilita a compreensão do fenômeno jurídico
em seus diversos matizes”); NADER, Paulo. Curso de Direito Civil. 7. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2010. v. 1. p. 1416; VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. 13. ed., rev. e atual. São
Paulo: Atlas, 2013. v. 1. p. 6062 (conquanto reconheça haver mais interesse didático do que uma
separação ontológica entre esses Direitos); FIUZA, César. Direito Civil: Curso completo.17. ed., rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 5255; DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito
Civil brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1. p. 1319; GAGLIANO,
Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. 8. ed. revis. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1. p. 2829 (embora afirmem que “a realidade atual aponte para a
impossibilidade de se traçar nítida diagnose diferencial en tre o direito público e o direito privado, a
doutrina cuida de estabelecer critérios diferenciado res”); FERRIANI, Carlos Alberto. Noções gerais de
Direito e de Direito Privado. In. LOTUFO, Renan; NANNI, Giovanni Ettore (Coords.). Teoria geral do
Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2008. p. 1112.
313 Exemplo dessa variação está em Paulo Lôbo (Direito Civil: Parte Geral. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

p. 6), que, de forma coerente com sua visão do Direito Civil, assim se manifesta: “No estágio atual
permanece a dicotomia cumprindo função operacional, com largo uso linguístico. Todavia, novos
direitos têm sido compostos de partes de direito privado e partes de direito público, em interlocução
contínua, ainda que partindo da mesma situação jurídica básica, como o direito da criança e do
adolescente, o direito do consumidor, o direito do idoso, o direito ambiental, que conjugam direito
civil, direito processual, direito penal, direito administrativo, formando um todo incindível”.
314 NERY, Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade; NERY JUNIOR, Nelson. Instituições de Direito Civil:

Teoria Geral do Direito Privado. 2. tiragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. v. 1, t. 1. p. 418.
315 NERY, Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade; NERY JUNIOR, Nelson. Instituições de Direito Civil:
Teoria Geral do Direito Privado. v. 1, t. 1. p. 420.
316 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 8. ed. rev., mod. aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2014. p.

116117.
317 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução...p. 120.
318 MALUF, Carlos Alberto Dabus; MALUF, Adriana Caldas do Rêgo Freitas Dabus. Introdução ao Direito
Civil. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 37.
319 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2006. p. 19.
320 FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 74.
321 RIZZARDO, Arnaldo. Parte geral do Código Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 19.
322 Sobre o tratamento promíscuo dos conceitos de “socialização” e “publicização” do Direito Privado,
ver a crítica de Michele Giorgianni (O Direito Privado e as suas atuais fronteiras...cit. § 1o). De modo
correto: “É importante observar que o fenômeno da constitucionalização dos direitos não se
confunde com o que no Brasil se denominou de publicização” (LÔBO, Paulo. A constitucionali zação
do Direito Civil brasileiro. In. TEPEDINO, Gustavo (Org.). Direito Civil contemporâneo: novos problemas
à luz da legalidade constitucional. Anais do Congresso Internacional de Direito Civil Constitucional da
Cidade do Rio de Janeiro. São Paulo: Atlas, 2008. p. 19).
323 CAMBI, Eduardo; FOGAÇA, Marcos Vargas. Direito civil constitucional. Revista de Direito Privado, v. 61,
p. 1335, jan./mar. 2015. item 2.4 (argumentos a a g); ARONNE, Ricardo. Por uma nova Hermenêutica
dos direitos reais limitados: (das raízes aos fundamentos contemporâneos). Rio de Janeiro: Renovar,
2001. p. 10 (argumentos c e h); PEIXOTO, Ester Lopes. O princípio da boafé no Direito Civil brasileiro.
Revista de Direito do Consumidor, no 45, p. 140171, jan./mar. 2003. Item 3.1. (argumento i); DELGADO,
José Augusto. O direito adquirido nas relações de Direito Privado e nas relações de Direito Público.
Revista de julgados do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, v. 10, no 20, p. 1336, jul./set. 1984.
§ 1o (argumento j e k); BOYADJIAN, Gustavo Henrique Velasco; BIZELLI, Rafael Ferreira. A cláusula
geral da função social dos contratos: enfo que específico na sua eficácia externa, sob a perspectiva
civilconstitucional. Revista de Direito Privado, v. 15, no 58, p. 111137, abr./jun. 2014. § 2o (argumento
c); BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Direito Administrativo e o novo Código Civil. Belo Horizonte: Fórum,
2007. p. 2327 (argu mentos a e c); SURGIK, Aloísio. Anotações históricocríticas em torno do binômio
Direito Público Direito Privado...p. 42 (argumento l, afirmando que “não podemos afirmar que a
divisão do direito em direito público e privado, tal como se coloca hoje, tenha origem romana”, além
do que não seria essa uma matéria “tanto lógica; talvez, mais ideológica”); ALMEIDA, Gregório
Assagra de. Direito material coletivo: superação da summa divisio Direito Público e Direito Privado Por
uma nova summa divisio constitucionalizada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 407419 (argumento c);
RETAMOSO, Mariana Borges. O abuso de direito à luz da Teoria Geral do Direito. Revista de Direito
Privado, v. 9, no 34, p. 221285, abr./jun. 2008 (argumentos e e f); AIRES, Mariella Carvalho de Farias. A
eficácia horizontal dos direitos fundamentais no contrato de trabalho a partir da Constituição Federal
de 1988. Revista de Direito do Trabalho, v. 33, no 128, p. 125154, out./dez. 2007. Item 1.3; (argumentos
d e b).
324 SORDI, Bernardo. Verso la grande dicotomia: Il percorso italiano. In. BENACCHIO, Gian Antonio;

GRAZIADEI, Michele (Orgs.) Il declino della distinzione tra Diritto Pubblico e Diritto Privato...p. 1819.
325 DELLEDONNE, Giacomo. La distinzione tra Privatrecht e öffentliches Recht nel dibattito tedesco. In.

BENACCHIO, Gian Antonio; GRAZIADEI, Michele (Orgs.) Il declino della distinzione tra Diritto Pubblico e
Diritto Privato...p. 6364.
326 RODRIGUES, Darcio Roberto Martins. Aspectos de interesse atual do matrimônio romano. Revista da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 93, p. 81107, jan./dez. 1998. p. 82.
327 CORPUS JURIS CIVILIS. Digesto de Justiniano, Liber Primus: Introdução ao Direito Romano. Traduzido

por Hélcio Maciel França Madeira. Prólogo de Pierangelo Catalano. 7. ed. revista. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2013. p. 1920.
328 AMARAL, Francisco. Individualismo e universalismo no Direito Civil brasileiro permanência ou su-
peração. Revista Brasileira de Direito Comparado, v. 7, no 13, p. 6495, jul./dez. 1992. Item 3.
329 MOREIRA ALVES, José Carlos. Direito Romano. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 84.
330 Agrande maioria dos manuais brasileiros faz menção ao fragmento de Ulpiano. Apenas a título de
exemplo, citemse algumas referências extraídas de periódicos: CASTRO, Honildo Amaral de Mello.
Falsa dicotomia entre Direito Público e Direito Privado. Revista de Doutrina e Jurisprudência - Tribunal
de Justiça do Estado do Amapá, no 36, p. 3344, jan./abr. 2005. p. 3941; REIS, Sebastião. Uma visão do
Direito: Direito Público e Direito Privado. cit...p. 64; SALDANHA, Nelson. Direito Público e Direito
Privado: Notas sobre o aspecto histórico do problema e sobre a possibilidade de uma revisão. Arquivo
Forense...p. 55; QUEIROZ, João José de. A distinção entre o Direito Público e o Direito Privado. Revista
de Direito da Procuradoria Geral da Prefeitura do Distrito Federal, no 2, p. 1628. 1955. p. 24; FRANÇA, R.
Limongi. Direito Privado...item 1.
331 ALPA, Guido. Manuale di Diritto Privato. 4. ed. Milano: CEDAM, 2005. p. 2122; ALPA, Guido. Diritto

Privato e Diritto Pubblico. Un questione aperta...p. 107; SORDI, Bernardo. Verso la grande dicotomia: Il
percorso italiano. In. BENACCHIO, Gian Antonio; GRAZIADEI, Michele (Orgs.) Il declino della distinzione
tra Diritto Pubblico e Diritto Privato...p. 18.
332 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.
321322 (embora reconheça haver dúvidas sobre a correta interpretação do fragmento e sua utilidade
para a “distinção sistemática”, especialmente MayerMaly, Kaser e Wieacker).
333 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português: Introdução, doutrina geral e negócio

jurídico. 2. reimp. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2009. v. 1, t. 1. p. 31; MOTA PINTO, Carlos Alberto da.
Teoria Geral do Direito Civil...p. 36.
334 BONFANTE, Pietro. La progressiva diversificazione del Diritto Pubblico e Privato. In. BONFANTE,

Pietro. Scritti Giuridici Vari. Roma: Sampaolesi, 1925. v. 4, p. 29.


335 LOBO, Abelardo Saraiva da Cunha. Curso de Direito Romano: História; sujeito e objecto do direito;
instituições jurídicas. Prefácio do Francisco de Paula Lacerda de Almeida. Rio de Janeiro: A. Pinto,
1931. p. 169.
336 MOREIRA ALVES, José Carlos. Direito Romano...p. 810.
337 MARKY, Thomas. Curso elementar de Direito Romano. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 16.
338 SANTOS JUSTO, António. Direito privado romano I: Parte Geral (Introdução. Relação jurídica. Defesa
dos direitos). 5. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p. 33.
339 KASER, Max. Direito privado romano. Traduzido por Samuel Rodrigues e Ferdinand Hämmerle. 2. ed.
Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2011. p. 47.
340 KASER, Max. Direito privado romano...cit., p. 47; TALAMANCA, Mario. Istituzioni di Diritto Romano.

Milano: Giuffrè, 1990. p. 62.


341 KASER, Max. Direito privado romano...cit., p. 47.
342 MOMMSEN, Theodor. Disegno del Diritto pubblico romano. Traduzido para o italiano por Pietro
Bonfante. Milano: Casa Editrice Francesco Vallardi, 1904. p. 1112, 24, 92 e 245.
343 BORJA, Sérgio. Direito Público e Direito Privado desenvolvimento histórico da distinção. Estudos
Jurídicos, v. 24, no 60, p. 525, jan./abr. 1991. p. 9. Em conexão com esse entendimento, Mario
Talamanca (Istituzioni di Diritto Romano...p. 64) afirma que “os diversos significados de ius publicum e
ius privatum capturáveis nas fontes romanas não podem ser reduzidos a um único sistema, não
obstante as tentações que o intérprete moderno possa ter nesse sentido”.
344 ANKUM, Hans. La noción de ius publicum en Derecho romano. Anuario de Historia del Derecho Español.

no 53, p. 523536, 1983. p. 524.


345 ANKUM, Hans. La noción de ius publicum en Derecho romano...p. 525.
346 MEYER, Christoph H. F. Das Publicum als Instrument spätmittelalterlicher Justiz. In. KINTZINGER,
Martin; SCHNEIDMÜLLER, Bernd (Eds.) Politische Öffentlichkeit im Spätmittelalter. Ostfildern:
Thorbecke, 2011. p. 87145. cit. p. 9192.
347 Há quem defenda ter havido um mélange do Direito Público e do Direito Privado até a forma ção dos

Estados nacionais. A partir daí eles voltaram a se separar. Nesse sentido: STOLLEIS, Michael.
Öffentliches Recht und Privatrecht im Prozeß der Entstehung des modernen Staates. In. HOFFMANN-
RIEM, Wolfgang; SCHMIDTAßMANN, Eberhard (Orgs.)...cit. p. 60.
348 ANKUM, Hans. La noción de ius publicum en Derecho romano...p. 529.
349 GIUFFRÈ, Vincenzo. Il “Diritto Pubblico” nell’esperienza romana. 2. ed. Napoli: Jovene, 1989. p. 25.
350 GIUFFRÈ, Vincenzo. Il “Diritto Pubblico” nell’esperienza romana...p. 25.
351 GIUFFRÈ, Vincenzo. Il “Diritto Pubblico” nell’esperienza romana...p. 26.
352 LUMIA, Giuseppe. Diritto Pubblico e Diritto Privato nel pensiero di Kant. In. ORECCHIA, Rinaldo (Org.).
La norma giuridica: Diritto Pubblico e Diritto Privato: Atti del IV Congresso Nazionale di Filosofia del
Diritto (Pavia, 1013 Ottobre 1959). Milano: Giuffrè, 1960. p. 385391. cit. p. 385.
353 LUMIA, Giuseppe. Diritto Pubblico e Diritto Privato nel pensiero di Kant...p. 385.
354 LUMIA, Giuseppe. Diritto Pubblico e Diritto Privato nel pensiero di Kant...p. 385.
355 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português...v. 1, t. 1. p. 36 e ss.
356 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português...v. 1, t. 1. p. 37.
357 Parcialmente nesse sentido: MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1.

p. 37.
358 Argumento extraído de: LEISNER, Walter. Unterscheidung zwischen privatem und öffentlichem
Recht...p. 872.
359 “(...) o critério não é aceitável, pelas duas seguintes razões: α) Não pode saber-se, em muitos casos, qual

o interesse predominante. O interesse principalmente tutelado por certas normas será o interesse da
coletividade ou um interesse particular? Muitas vezes não nos restaria, perante a pergunta, senão a
incerteza e a dúvida insuperáveis ou, pelo menos, conducentes a respostas carecidas de certeza. β)
Há normas que, dado o lugar da sua inserção no sistema jurídico e dada a tradição e o
desenvolvimento histórico do direito, são pacificamente classificadas como de direito privado e,
todavia, visam predominantemente interesses públicos. É o que acontece com a maio ria das normas
imperativas (jus cogens)” (MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria geral do Direito Civil...cit. p. 38).
360 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 38.
361 STJ. REsp 302.906/SP, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 26/08/2010, DJe 01/12/2010.
362 WOLFF, Hans J.; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Verwaltungsrecht. 11. ed. atual. München: C.H. Beck,
1999. v. 1. § 22, item 3.
363 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 3839.
364 MAURER, Hartmut. Allgemeines Verwaltungsrecht. 18. ed. atual. München: Beck, 2011. § 3, nota
marginal 19.
365 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 39.
366 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 39.
367 MAURER, Hartmut. Allgemeines Verwaltungsrecht...cit. § 3, nota marginal 16.
368 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 40.
369 OLIVEIRA, Nuno Manuel Pinto. Princípios de Direito dos Contratos. Coimbra: Coimbra Editora, 2011. p.
11.
370 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 40.
371 OLIVEIRA, Nuno Manuel Pinto. Princípios de Direito dos Contratos...p. 8.
372 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 41.
373 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 41.
374 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 41.
375 Ateoria foi lançada nesta publicação: WOLFF, Hans Julius. Der Unterschied zwischen öffentli chem
und privatem Recht...cit. p. 205217. Em sentido idêntico: MAURER, Hartmut. Allgemeines
Verwaltungsrecht...cit. § 3, notas marginais 1718. Para a crítica dessa teoria: LEISNER, Walter.
Unterscheidung zwischen privatem und öffentlichem Recht. Juristen Zeitung, v. 61, no 18, p. 869 875,
Sep. 2006. p. 871.
376 Hans Kelsen (Diritto Pubblico e Privato. Rivista Internazionale di Filosofia del Diritto, v. 4, p. 340357,
1924; p. 340) vai se referir a “um caos de opiniões doutrinárias contraditórias”. Nesse sentido, com
variada fundamentação: LEISNER, Walter. Unterscheidung zwischen privatem und öffentlichem
Recht...p. 869870.
CAPÍTULO QUARTO

A “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”: PERMANÊNCIA,


UTILIDADE E FUNDAMENTOS

SUMÁRIO. § 19. Autonomia e diferenciação do Direito Priva do: entre a


permanência e a utilidade nas relações jurídicas contemporâneas. 19.1. A
organização da jurisdição e a dife renciação específica. 19.2. A “distinção
sistemática” e a forma ção jurídica. 19.3. A “distinção sistemática” no
universo das relações privadas. § 20. A recodificação do Direito Civil e os
espaços normativos do Direito Privado. § 21. Fatores culturais, teóricos,
práticos e significativoideológicos. § 22. Objeções e fundamentos
contemporâneos para a manutenção da “distin ção sistemática”. § 23.
Conclusões parciais da Primeira Parte.
§19. AUTONOMIA E DIFERENCIAÇÃO DO DIREITO PRIVADO: ENTRE A
PERMANÊNCIA E A UTILIDADE NAS RELAÇÕES JURÍDICAS
CONTEMPORÂNEAS

19.1. A organização da jurisdição e a diferenciação específica


Em 2016, o STJ julgou 8.932 processos na Primeira Seção, responsável
pelas matérias de Direito Público, excluídas as de caráter criminal. A Segunda
Seção, competente para as matérias de Direito Privado, decidiu e julgou 17.510
processos. O número de julgamentos em Direito Penal, matéria da Terceira
Seção, foi de 458, entre colegiados e monocráticos.377 Esses dados refletem os
resultados das estatísticas sobre a Alemanha, apresentadas por Franz Bydlinski e
que demonstravam a desproporção entre o número de questões judiciais de
Direito Privado (muito maiores) e de Direito Público.378 A estatística brasileira
tem um diferencial: a responsabilidade do Estado como um dos grandes
litigantes da justiça do país, segundo dados do CNJ de 2011.379 Ainda assim, os
conflitos privados sobrexcedem seus equivalentes públicos.
As Leis de Organização Judiciária, de modo usual, dividem suas unidades
em varas cíveis, de família e sucessões, da infância e adolescência, falimentares,
de execuções fiscais, de fazenda pública, criminais e de execuções penais. Em
alguns Estados, há uma maior especialização interna, como varas empresariais,
de conflitos fundiários, ambientais, de acidentes de trânsito, previdenciárias, de
crime organizado ou até mesmo em questões de saúde.
Sempre há novas demandas por especialização, em nome de uma maior
celeridade ou de um julgamento qualitativamente melhor, dado que o magistrado
manteria o foco em assuntos muito específicos, favorecendo o conhecimento
verticalizado dos temas afeitos a sua vara. É verdade que também se podem
identificar efeitos colaterais, como a criação de quistos ideológicos em relação a
determinadas matérias que foram objeto de especialização.
A própria matriz externa da justiça brasileira é influenciada por essas
divisões. A Justiça Federal é predominantemente voltada para questões de
Direito Público. A Justiça Estadual é mais abrangente em termos de competência
material, contudo, há nítida preponderância de questões de Direito Privado. As
Justiças do Trabalho, Militar da União (e dos Estados, quando neles existente) e
Eleitoral são voltadas, em caráter quase universal, a conflitos disciplinados pelo
Direito Privado ou pelo Direito Público.
As diferenciações específicas firmadas na Constituição, nas leis
processuais e de organização judiciária tiveram impacto na especialização
profissional no âmbito do Direito. As atividades desenvolvidas por advogados,
juízes, membros do Ministério Público, registradores, notários e advogados
públicos terminaram por se preordenar a partir de tais escolhas legislativas, que
levaram em conta a “grande dicotomia”. Evidentemente que essa hipótese – a
correlação entre a divisão jurisdicional e as diferenciações de habilidades e
competências profissionais – não se baseia em explicações sociológicas ou
antropológicas, dado não ser este o objeto de uma tese de Direito. Observados os
limites de uma interpretação jurídica, a hipótese não é susceptível de escrutínio.
As atribuições profissionais, marcadas por divisões de competência
material, exigiram pessoas com conhecimentos especializados em Direito
Público e Direito Privado, ainda que, em muitos dos casos, houvesse inúmeros
pontos de contato entre essas áreas. Esses indivíduos, seja para se habilitarem às
provas de seleção profissional, seja para bem desempenharem essas atribuições,
ainda adquiriram ou conservaram conhecimentos compartimentalizados, posto
que muitos possuam habilidades interdisciplinares.
A educação dos juristas, portanto, é um campo a ser explorado
autonomamente.

19.2. A “distinção sistemática” e a formação jurídica


As referidas especializações criaram nichos profissionais no âmbito
privado, a se observar pelas demandas dos clientes. As matrizes curriculares das
faculdades de Direito e suas próprias estruturas administrativas mantiveram essa
“distinção sistemática”, com disciplinas ou departamentos de Direito Público e
de Direito Privado, em suas subdivisões clássicas.
Essa é uma tradição que remonta às origens das faculdades de Direito no
Brasil, quando o imperador D. Pedro I, por lei de 11 de agosto de 1827, criou os
cursos de “Ciências Jurídicas e Sociais” nas cidades de São Paulo e Olinda, com
5 anos de duração e divididos em 9 cadeiras.
O Direito Público ocupava o primeiro e o segundo anos. O Direito Privado
dividia o terceiro ano com o Direito Penal e o Direito Processual Penal. No
quarto ano, figurava novamente Direito Civil, acompanhado do Direito
Comercial Terrestre e Marítimo. No quinto e último ano, havia cadeiras de
Economia Política e Direito Processual Civil.380
Essa matriz, inspirada nos Estatutos do Visconde da Cachoeira, manteve-se
na estrutura provisória de 1827 e depois no Estatuto de Regulamentação dos
Cursos Jurídicos de 1831.381 Na Resolução CNE/CES 5/2018, documento que
regula atualmente as diretrizes curriculares nacionais dos cursos jurídicos,
encontram-se as disciplinas obrigatórias em seu art. 5o, inciso II, reservando-se
espaços para as vinculadas ao Direito Privado e ao Direito Público.382 Mesmo
Direitos mais recentes são agrupados nessas áreas, salvo quando postos em
grupos híbridos, metajurídicos ou metadogmáticos.

19.3. A “distinção sistemática” no universo das relações privadas


Abstraindo-se o “direito nos tribunais”, o “direito dos professores” e o
“direito dos profissionais jurídicos” e ocupando-se da realidade não
judicializada, que é muito mais rica e próxima do que efetivamente ocorre na
vida das pessoas, encontrar-se-ão idênticos padrões de diferenciação do Direito.
Em uma sociedade capitalista, tanto a produção da vida imediata, a
produção dos meios de existência, que compreende alimentos, habitação e
instrumentos para tal fim, quanto a reprodução da vida imediata, a produção
humana em si, a continuação da espécie, para se valer de categorias marxianas,
dependem de vários atos que se podem enquadrar perfeitamente no conceito de
“atos da vida civil”.
O nascimento e a morte, fatos jurídicos em si considerados, produzem ou
extinguem relações jurídico-privadas. Esses efeitos estão há tempos previstos na
legislação civil brasileira, assim como na maior parte do mundo. De entre outras
consequências, o nascimento: a) com vida, dá início à personalidade (art. 2o,
CC/2002);383 b) com ou sem vida, demanda o registro público no ofício das
pessoas naturais (art. 9o, inciso I, CC/2002, c/c arts. 50 e 53, Lei no 6.015/1973);
c) cria o direito ao nome e o dever de sua atribuição (art. 54, Lei no
6.015/1973);384 d) com vida do herdeiro esperado, implicará ser-lhe “deferida a
sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do
testador” (art. 1.800, § 3o, CC/2002).
A morte, por sua vez, além de outras hipóteses, implica: a) o fim da
existência da pessoa natural (art. 6o, CC/2002), ressalvados alguns efeitos em
relação aos direitos da personalidade (art. 12, parágrafo único, CC/2002);385 b) a
extinção do contrato de prestação de serviços, se esta recair sobre qualquer das
partes (art. 607);386 c) a supressão da ação paralisante sobre o direito ao benefício
estipulado em contrato de seguro de vida; d) a liquidação da quota do sócio
falecido, com as ressalvas dos incisos do art. 1028, CC/2002;387 e) a
transferência do direito de superfície, em razão do falecimento do superficiário,
a seus herdeiros (art. 1.372, caput, CC/2002); f) se do usufrutuário, a extinção do
usufruto (art. 1.410); g) a extinção da sociedade conjugal (art. 1.571) e do
casamento válido (art. 1.571, § 1o, CC/2002); h) dos pais ou do filho, a extinção
do poder familiar (art. 1.635, CC/2002); i) a abertura da sucessão (art. 1.784,
CC/2002).388 Todas essas situações desenvolvem-se no âmbito de um sistema
normativo que se convencionou denominar, a depender do marco histórico
escolhido (Roma, Alta Idade Média, Renascimento ou século XIX), de “sistema
de Direito Privado”.
Franz Bydlinski demonstra a razão pela qual o Direito Privado é tão ou
mais significativo nos dias atuais do que no passado. Em seu entendimento, na
verdade, por efeito de uma relativa melhoria do bem-estar econômico das gentes,
pode-se até dizer que sua importância nunca foi tanta para milhões de pessoas.389
Antes de se passar à descrição de Bydlinski sobre o alcance inimaginável
do Direito Privado na vida quotidiana atual, é preciso pôr ênfase em uma crítica
que em geral é feita, mais particularmente, ao Direito Civil do século XIX e às
respectivas codificações: era um Direito para classes produtoras e não para as
classes proletárias, a se fazer recordação do livro do “catedrático socialista”
Anton Menger von Wolfensgrün (1841-1906).390 Ou, nas palavras de Reinhard
Zimmermann, “um mundo no qual a regulação de enxames de abelhas era vista
como mais importante do que uma sobre as condições gerais dos contratos (ou
cláusulas contratuais gerais)”, sendo que “o cidadão típico para o BGB não era o
trabalhador fabril, mas antes o empresário endinheirado, o proprietário de terras
ou o servidor público”.391
Sobre isso, parece que já é o suficiente. Não é necessário mais para se
alimentar a imagem do século XIX como um ambiente de “excessos liberais”,
embora todas essas descrições possam ser paradoxalmente localizadas em países
agrários e atrasados economicamente, como foram o Brasil, a Áustria e a
Alemanha, esta última só até a unificação em 1871 e o doloroso processo de
industrialização maciça levado a efeito por Otto von Bismarck e, posteriormente,
para fazer frente à corrida armamentista do final dos anos 1890.392 Se era esse o
“século do Direito Privado”,393 os homens e as mulheres do Oitocentos tinham
pouco o que fazer além de trabalhar (em linguagem marxista, produzir sua
existência material) ou ter filhos (idem, reproduzir a existência humana).
Os tempos de hoje cambiaram de tal modo essas questões, a ponto de os
autores marxistas ou neomarxistas procurarem um lugar para o lazer e tentarem
explicar a ocupação do tempo livre da classe trabalhadora, na medida em que
este só seria possível com os excedentes de produção. Tais excedentes, ao menos
na visão marxiana dos séculos XIX e XX, seriam apropriáveis exclusivamente
pelas classes burguesas.
Os seres humanos – e volte-se a Franz Bydlinski e sua elegante narrativa –
iniciam sua vida profissional com a celebração de um contrato de trabalho
(ressalvandose, é claro, a minoria que a começa sob o regime estatutário) ou com
a constituição ou o gerenciamento de uma empresa, o que implica, no geral,
celebrar-se um contrato de sociedade. A empresa é um centro de imputação de
negócios da mais variada ordem e com múltiplas pessoas naturais ou jurídicas
envolvidas. As pessoas “casam-se e têm filhos; alugam e compram um
apartamento ou uma casa, móveis, carros ou máquinas”, tendo de conservá-los
ou consertá-los. E para tudo isso, que é parte corriqueira de uma vida humana,
seja em uma grande cidade ou em uma vila interiorana, às vezes, cele-bram-se
contratos de mútuo para fazer frente à aquisição de bens e serviços aos quais não
se teria acesso sem o recurso a tais expedientes creditícios.394
Não se esqueça das associações,395 que tanto podem servir para congregar
os veteranos em países com tradições bélicas quanto os torcedores de um time de
futebol, para os que não as possuem. No Brasil, até à vigência da Lei no 10.825,
de 22 de dezembro de 2003, que alterou o art. 44, CC/2002, com a introdução de
seu inciso IV e seu § 1o,396 igrejas e ordens religiosas haviam de se organizar
como associações ou fundações. Desde então, pelos excessos intervencionistas
no regime legal das associações, até por pressão das Igrejas, elas passaram a
assumir a forma de “organizações religiosas”, permanecendo, a despeito disso,
no sistema de Direito Privado.397
A vida moderna tem sido definida como a expressão de uma “sociedade de
consumo”. No século XIX e início do século XX, o camponês da Alta Silésia ou
das fazendas de café do interior de São Paulo teria muita sorte se conseguisse
comprar e manter um par de sapatos para cada um de seus filhos assistirem às
missas dominicais. Nos dias de hoje, porém, o trabalhador urbano ou rural, o
profissional liberal ou o capitalista não mais se identificam por signos exteriores
de classe, como as roupas, a linguagem ou o sotaque, o acesso a determinados
“prazeres burgueses” como o esporte, os concertos musicais ou as viagens.398 Na
verdade, explica Ulrich Beck, a antiga diferenciação de “classe” é substituída
por distintos “padrões de consumo”.399
No século XXI, um professor de fonética como a personagem Henry
Higgins teria muita dificuldade em encontrar uma Eliza Doolittle, uma simples
vendedora de flores, com sotaque característico da periferia de Londres, e
transformá-la em uma dama da alta-roda, como Sir George Bernard Shaw
fantasia em Pigmalião, sua peça de 1913, da qual resultou o filme My fair lady
(1964). Dificilmente o professor encontraria uma mulher londrina envergonhada
de seu sotaque e não faria muita diferença qual seu acento, caso ela tivesse (ou
aparentasse ter) dinheiro. Não que as desigualdades sociais tenham diminuído
sensivelmente, mas as relações de classe mudaram no sistema capitalista a ponto
de mascarar as assimetrias profundas na distribuição de renda por meio de um
acesso fácil ao crédito e ao consumo.
A quantidade de contratos que um ser humano celebra diariamente é
incomparável com qualquer outro período histórico. O agricultor, o pequeno
comerciário, o fazendeiro, o militar e o sacerdote dos fins da Belle Époque nem
sonhavam que seus descendentes precisariam contratar com tal intensidade um
século depois da chegada dos cavaleiros do Apocalipse em 1914.400
Na atualidade, inúmeros são os contratos que se substituíram os
tradicionais instrumentos particulares por tickets, correspondências eletrônicas,
imagens na Internet ou por atos puramente mecânicos, reservando-se os
instrumentos públicos para atos mais solenes e aparentemente representativos de
objetos mais valiosos. Aparentemente porque milhões são negociados em bolsas
de valores por meros atos mímicos (os gestos dos operadores bursáteis) ou
toques em um computador. Quanto às formas mais simplificadas, nem por isso
deixaram de imprimir nas pessoas o respeito aos contratos.
Direitos da personalidade e seus reflexos patrimoniais também se
sujeitaram ao ambiente negocial. Imagem, voz, criações literárias ou puramente
artísticas cons-tituem-se na base de uma indústria de proporções mundiais, capaz
de movimentar bilhões de divisas.401 O velho contrato de prestação de serviços,
praticamente restrito a vínculos entre pessoas jurídicas ou a um círculo
privilegiado de pessoas naturais, recobrou importância nas últimas décadas, seja
pelo dramático processo de flexibilização das relações de trabalho, seja pelo
surgimento de novos arranjos colaborativos (muitos deles meros biombos para
uma exploração capitalista “tecnológica”) inerentes à 4a Revolução Industrial.
No século XIX, as ferrovias transformaram os meios de transporte
terrestre, que se mantiveram quase inalterados desde antes de Cristo. Na
atualidade, as opções multiplicaram-se.402 Do carro, adquirido por um contrato
de compra e venda com alienação fiduciária, aos ônibus, metrôs, aviões e navios.
Desses transportes, decorrem uma série de danos, os quais se reproduziram em
escala exponencial, a ponto de gerar câmbios profundos no Direito. As primícias
ocorreram na jurisprudência, depois as mudanças vieram pela via legislativa,
como o Decreto no 2.681, de 7 de dezembro de 1912, que regula a
responsabilidade civil nas estradas de ferro. Por fim, deu-se a evolução na teoria
do Direito Civil, com a sistematização da responsabilidade objetiva fundada no
risco, posteriormente generalizada no art. 927, parágrafo único, CC/2002.
A propriedade, mesmo extremamente limitada por restrições
administrativas,403 ambientais ou tributárias, ainda é uma categoria central no
sistema de Direito Privado. Os direitos vicinais apresentam novas externalidades
ligadas à proteção ambiental. Em paralelo, ocorrem rápidas transformações no
campo da organização horizontal das moradias, das novas formas condominiais
e do compartilhamento do uso das coisas. A multipropriedade é um exemplo da
força criativa da autonomia privada, que punha em causa, segundo parte da
doutrina, a própria tipicidade dos direitos reais,404 até que a Lei no 13.777, de 20
de dezembro de 2018, instituísse o condomínio em multipropriedade, o que, na
prática, significou sua positivação legislativa. A História do Direito Privado é
plena de exemplos de negócios jurídicos concebidos no âmbito dos usos e das
práticas do povo que foram tipificados legalmente após longo tempo de bem-
sucedida experiência social. A junção dessas mudanças no perfil dos institutos
com a chegada das novas tecnologias determinou o surgimento de um contrato
de locação de espaços em propriedades urbanas, por meio eletrônico, conhecido
internacionalmente pelo nome da empresa pioneira no setor (Airbnb). Alguém
interessado em visitar uma cidade, por meio de seleção de ofertas em aplicativo
da Internet, contrata por prazo determinado o compartilhamento de espaços na
habitação de outrem, com ou sem direito a refeições e outras comodidades. Esse
negócio eletrônico tem posto em causa a violação ou não de normas e posturas
municipais, regras tributárias e até mesmo concorrenciais, dada a identidade
parcial de objeto com os hotéis e a assimetria regulatória em favor do Airbnb.
Em França, há uma tentativa de se reelaborar teoricamente os direitos de
garantia, que se tornariam uma província autônoma dentro do Direito Civil, a ser
aprovada a regulação proposta por Michel Grimaldi.405
Famílias são constituídas de formas inteiramente novas. O casamento
fundado na legitimidade passou a coexistir com a união estável. Os pactos
antenupciais, que eram exclusivamente dotados de conteúdo econômico,
avançaram sobre questões morais.406 Preocupações anteriormente restritas a
pessoas de alta renda são hoje comuns a nubentes de classe média, que se
preocupam com a administração do patrimônio, o que tem levado ao crescimento
na adoção do regime de separação convencional de bens. O Direito de Família
passou a se interessar por temas como a reparação de danos por abandono
afetivo407 e a violação de deveres conjugais.408 As holdings familiares surgem
como forma alternativa de resolver problemas patrimoniais anteriormente
limitados ao Direito de Família.409
A morte cada vez mais se dessacraliza e converte-se em algo a ser evitado
a todo custo. Os cuidados com a saúde tornaram o esporte e a ginástica uma
obsessão coletiva no final do século XX, algo que não conhece diferenças de
classe. A privatização dos seguros-saúde substituiu a centralidade dos serviços
públicos, mesmo para setores da classe trabalhadora. Embora não se tenha
experimentado uma mudança sensível nos hábitos do povo brasileiro quanto ao
testamento, o Direito das Sucessões voltou a ganhar vitalidade, especialmente na
Europa, onde ele tem criado espaços comuns com o Direito Societário.410 A
compra e venda de imóveis passou a se utilizar da morte para se calcular a
depreciação de um bem e transformar o direito de propriedade em direito de
usufruto.
Em todas essas subdivisões do Direito Civil, surge a necessidade de
proteção dos direitos no âmbito judicial. A posse turbada e a propriedade
invadida demandam o recurso a meios processuais cabíveis. Atravessa-se
rapidamente a ponte e chega-se ao Direito Público, mas é o Direito Civil quem
fornece os elementos conceituais sobre esbulho, turbação e reivindicação.
Os credores exercem suas pretensões em face dos devedores a partir de
conceitos como mora e inadimplemento. As vítimas de delitos civis postulam em
juízo a fim de obter reparações, pensionamentos ou cominações de caráter
inibitório e preventivo. O fator tempo é determinante para o exercício dessas
prerrogativas jurídicas.
A prescrição e a decadência, dois institutos tipicamente civis, regulam essa
matéria.411 A diferenciação de prazos prescricionais relativos ao Direito Público
é objeto de centenas de decisões judiciais,412 que demarcam a incidência ou não
do art. 1o do Decreto no 20.910, de 6 de janeiro de 1932, com o prazo quinquenal
idêntico ao previsto no CC/1916, com a interrupção da prescrição limitada a uma
única vez e sua nova fluência “passaria a ser da metade apenas daquele prazo”.413
A prescrição no Direito Tributário, embora conserve os elementos essenciais da
prescrição no Direito Civil, apresenta notórias diferenças quanto a esta, em razão
do regime jurídico publicístico ao qual está subordinada.414
§20. A RECODIFICAÇÃO DO DIREITO CIVIL E OS ESPAÇOS NORMATIVOS
DO DIREITO PRIVADO
Todos os exemplos aqui oferecidos dizem respeito a espaços típicos do
Direito Privado e do Direito Civil, consideradas as fronteiras desenhadas pelos
códigos oitocentistas e pelas codificações tardias. Em geral, salvo situações
muito particulares como o Direito do Consumidor, não houve ampliação dos
espaços normativos e sim dilatação ou transformação das hipóteses fáticas
anteriormente coloridas por aquelas regras. O Direito Civil, com sua tradição
histórico-romanística e sua condição de um produto da cultura e do humanismo,
teve capacidade para se adaptar e oferecer soluções a novos problemas com base
em institutos não tão modernos.415
Sob o aspecto estritamente normativo, uma distinção quanto ao modo de se
organizarem as regras e os princípios de Direito Privado e de Direito Público
também se mostra perceptível com alguma facilidade. O sistema de Direito
Privado encontrou nas codificações dos séculos XIX, XX e XXI sua natural
forma de expressão. Os vaticínios sobre o fim da “era das codificações”,
originalmente encontrados na obra de Natalino Irti, mostraram-se falhos.416
Mesmo sob críticas severas, de catedráticos dos mais respeitados, que
assinalavam a desnecessidade ou o caráter anacrônico do projeto que se
converteria no CC/2002, o novo código terminou por se concretizar e hoje boa
parte das restrições a ele foram substituídas por um discurso, às vezes, até
efusivo.417
No Direito Comparado, nos últimos 40 anos,418 a codificação
(especialmente nos países da Europa do Leste) e a recodificação419 mostraram
sinais de fecundidade. A mera observação empírica serve para expor essa
tendência, ao estilo dos seguintes novos códigos civis: a) Nepal (2017, em vigor
desde 2018); b) Argentina (2015, que passou a tratar de matéria comercial); c)
República Checa (em vigor desde 2014, aprovado em 2012, revogou quase uma
centena de leis e recodificou o Direito Internacional Privado); d) Romênia (em
vigor desde 2011, embora aprovado em 2009, que substituiu o Código Civil de
1865, o Código Comercial de 1887 e o Código de Família de 1954); e) Timor-
Leste (2011); f) Rússia (2008, quando entrou em vigor a Parte IV, sobre
propriedade intelectual, embora sua Parte I seja datada de 1994, em vigor em
1995); g) Brasil (2002); h) Lituânia (2000); i) Macau (1999); j) Quebec (1994,
substituiu o Código Civil do Baixo Canadá, de 1865). Registrem-se ainda a
anunciada elaboração de um código civil para a República Popular da China e os
debates sobre a necessidade de um código civil para a Índia. As reformas dos
códigos da Holanda (1992), da Alemanha (2002) e da França (2016) são
exemplos da vitalidade do modelo de organização e sistematização das normas
de Direito Civil na contemporaneidade.420
§21. FATORES CULTURAIS, TEÓRICOS, PRÁTICOS E significativo-
ideológicos
Os elementos descritivos e normativos apresentados neste § 21
correspondem, com maior ou menor simetria, aos fatores culturais, teóricos,
práticos e significativoideológicos, desenvolvidos por António Menezes
Cordeiro para comprovar o caráter sistemático da divisão entre Direito Público e
Direito Privado.421
Os fatores culturais levam à recondução da normatividade privada ao
modelo dos códigos, diferentemente do que se deu no âmbito do Direito Público,
que, embora disponha de um texto constitucional como seu vértice e de códigos
setoriais (tributário, penal, processual penal), não encontrou um modelo
equivalente no plano ordinário para o Direito Administrativo. Os fatores teóricos
relacionam-se ao que se expôs em relação às diversas construções teoréticas que
procuraram explicar os fundamentos da “distinção sistemática”. Os fatores
práticos radicam-se no “perfil acadêmico, literário, jurisprudencial ou
profissional”, que levou à “repartição das disciplinas jurídicas, as literaturas
especializadas, as jurisdições e as próprias profissões dos juristas”.422 Os fatores
significativo-ideológicos resultam no espaço de proteção dos particulares,
“evitando intromissões arbitrárias e dando corpo a estruturas que facultem um
mínimo de previsibilidade dentro do espaço jurídico-social”.423 Sobre este último
grupo de fatores, é de se reforçar o que se disse sobre a oposição histórica dos
regimes autoritários ou totalitários à summa divisio e à autonomia do Direito
Privado. As codificações civis aprovadas durante esses regimes ressentiram-se
dessa invasão de fronteiras e da baixa proteção aos indivíduos, o que levou a
reformas ou a um processo de decadência do Direito Privado como agente
autárquico de proteção das liberdades individuais e pela atribuição desse papel
às constituições, como terminou por ocorrer, por exemplo, na Itália.
§22. OBJEÇÕES E FUNDAMENTOS CONTEMPORÂNEOS PARA A
MANUTENÇÃO DA “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”
Não seria suficiente a exposição desse conjunto de fatores para justificar a
persistência contemporânea da “grande dicotomia”. Importa examinar algumas
das objeções que se lhe fazem e é disso que se ocupará este § 22. Cada objeção
refutada produz um fundamento à preservação da “grande dicotomia”.
a) Publicização do Direito Privado. Foi amplamente comprovada a
ampliação dos espaços de incidência normativa do Direito Civil em face de uma
pluralidade de novos suportes fáticos e eventos da vida social. Os mesmos
artigos codificados em 1916 e reproduzidos (ou parcialmente alterados) em 2002
passaram a reger um número impressionante de novas situações ou a atingir
milhares de novos destinatários, cujos antepassados jamais sonharam com a
possibilidade de nelas tomar parte.
Como já assinalado, há uma ampla variedade de leis, regimes jurídicos e
matérias de Direito Público que passaram (i) a incorporar ou usar institutos,
categorias ou conceitos de Direito Privado; (ii) a ceder espaço à incidência ou à
regulação do Direito Privado; (iii) por um processo de reversão de influência
sobre o Direito Privado, que se reduziu em vez de se dilatar, como indicavam os
prognósticos tão firmes dos anos 1930-1950.
Na era da Quarta Revolução Industrial, nota-se a tendência cada vez maior
de avanço do Direito Privado sobre as relações jurídicas que têm surgido sob o
influxo da pós-digitalização. A proteção de dados pessoais, por exemplo, não
pode ser nem mais referida como uma “nova fronteira” do Direito Privado,
considerando-se a edição da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei de
Proteção de Dados).424 Em muito breve, com a popularização da internet das
coisas (IoT),425 será necessária a regulação da proteção de “dados das coisas”:
uma máquina de lavar ou uma televisão, submetidas aos processos tecnológicos
do ambiente da IoT, funcionarão autonomamente no horário mais propício ao
menor consumo de energia elétrica, calcularão a quantidade adequada de água e
sabão para o tipo de roupa (sem comando humano), selecionarão programas de
interesse do usuário de modo muito mais preciso que os algoritmos atuais. Tudo
isso gerará um número fabuloso de informações sobre as coisas, que, porém,
indiretamente, revelarão os hábitos, os desejos e a localização das pessoas. Na
era dos dados,426 esses elementos informacionais valerão fortunas. Dito de outro
modo, a Economia da Quarta Revolução Industrial centrar-se-á no valor
atribuível aos dados, o qual será exponencialmente maior a cada ano.427
Dados monetizáveis, eis um elemento novo em uma discussão antiga sobre
o conceito e as funções de privacy, que não corresponde tão somente à “esfera
mais nuclear da vida privada” (acepção franco-alemã) nem ao espaço das
“relações íntimas entre as pessoas” ou do right to be left alone (o direito de ser
deixado em paz), as duas apresentadas como acepções norte-americanas. A nova
privacy insere-se no acesso e no fluxo de dados pessoais,428 que se desdobra em:
a) controle de acesso e uso dos dados que “constituem sua identidade pessoal e
permitem o livre desenvolvimento de sua personalidade”; b) o conteúdo desses
dados açambarca elementos como “opinião política, convicções religiosas, vida
sexual, dados de saúde e dados genéticos”.429 O consentimento do acesso a dados
pessoais, que é tratado de modo displicente pelos usuários da Internet, será
colocado em outro patamar quando a IoT se difundir como padrão na indústria
automobilística, de eletrônicos e eletrodomésticos.
A regulação da proteção de dados era outro exemplo típico de uma
atribuição primária do Direito Civil, embora houvesse sérias dúvidas sobre sua
base legislativa imediata,430 o que implicava, por exemplo, discutir se era
suficiente o recurso a normas já vigentes, como o CDC.431
Não se pode negar que o CC/2002, no que se refere aos direitos da
personalidade, possuía a primazia no tratamento dessa questão.432 Com a edição
da Lei nº 13.709/2018, o Brasil passou a contar com uma legislação especial de
proteção de dados pessoais, ainda em vacatio legis. A Lei de Proteção de Dados
também possui normas que veiculam conteúdos típicos de direitos da
personalidade, o que remete ao Código Civil o papel de fonte complementar
nesse âmbito.
Não se pretende obviamente reforçar o discurso, que já apresenta sinais de
fadiga, da publicização do Direito Privado (ou do Direito Civil) e da privatização
(ou civilização) do Direito Público. Ele está hoje mais próximo de um slogan,
muito eficaz e sonante, reconheça-se, do que de um conceito operacional.
A descrição histórica, fática e da evolução normativa serviu a um
propósito: negar atualidade e serventia ao discurso da publicização. Ele é
historicamente datado, atendeu a propósitos ideológicos, de variada matriz, e a
diferentes senhores, inclusive regimes políticos, não sendo mais comprovável
empiricamente. Ele também é pouco útil como argumento axiomático sobre as
“transformações do Direito Civil”.
Franz Bydlinski, a esse respeito, merece nova menção. Em seu texto de
1994, ele era um observador privilegiado do fim da experiência do socialismo
real na Europa do Leste. Era um momento de euforia para muitos dos europeus,
mas que, rapidamente, conheceram a face oculta do sistema capitalista, após
setenta anos de proteção sob o regime comunista. Bydlinski, que não se deixa
empolgar por aquele momento histórico, toca em um ponto central para este
capítulo da tese: o caráter irracional, imprevisível e incontrolável dos processos
históricos. Como ele afirmou, “as coisas ocorrem de forma contraditória e
fortuita”.433 A Europa pós-comunista submeteu-se a um processo radical de
liberalização, desestatização e de quebra do aparato social dos Estados nacionais.
A Europa Ocidental, fundada nas bases da Comunidade Europeia e, depois do
Tratado de Maastricht, na União Europeia, tornou-se “uma espécie de Super-
Estado”,434 com a burocracia de Bruxelas a se contagiar por uma doença
legisferante – a nomomania -, com diretivas sobre tudo e os mais diversos
campos da vida pública e privada dos europeus, o que conduziu a uma sucessiva
contestação quanto ao déficit democrático dessa forma de governança. Não é
sem motivo que haja reações tão fortes hoje no Reino Unido da Grã-Bretanha e
Irlanda do Norte (já consubstanciada no Brexit), em França, Alemanha e
Holanda, para se limitar aos países mais ricos do bloco.
Não é mais sustentável defender a publicização com base em argumentos
de meados do século XX. Muito menos é correto falar em uma privatização do
Direito Público como efeito de um avanço da ideologia neoliberal. Haverá
contingências históricas em um ou em outro sentido. O importante é que, mesmo
com essas ondas a se esbater nos rochedos, o fundamento histórico não é
suficiente para se eliminar a divisão sistemática. Menos ainda é útil ou coerente
partir para soluções sincréticas, que não tragam respostas para alguns dos
conflitos que se verificam nas fímbrias entre as duas grandes áreas do Direito.
b) Problemas de delimitação e retroalimentação de conceitos, institutos e
categorias jurídicas. Há um bloco de matérias, relações jurídicas e normas de
Direito Privado, cujas características autárquicas se mantiveram e cujos espaços
até se dilataram nas últimas décadas.
A maior parte dos críticos da diferenciação específica entre Direito Privado
e Direito Público louvam-se nos problemas de delimitação nas zonas de
fronteira. Como também já foi ressaltado, não se pode destruir a “grande
dicotomia” com base nos conflitos ocorridos em uma “terra de ninguém”
existente nos limites de qualquer disciplina jurídica. Tais contingências sempre
existiram e sempre ocorrerão. Nem por isso elas são suficientes para apagar
todos os rumos e borrar os marcos entre essas áreas. Eliminar a summa divisio
por causa dessas “sobreposições e aproximações” é substituir um critério
multissecular pelo arbítrio da escolha ad hoc e retirar validade aos fundamentos
nos quais descansam tanto o Direito Público quanto o Direito Privado. É
preferível manter-se a divisão, com pequenas escaramuças de fronteira, a vê-la
ser levantada por questões ligadas a interesses ideológicos ou pelas vantagens do
casuísmo generalizado na aplicação das regras jurídicas, cujos efeitos já se
fazem sentir por toda a ordem jurídica em vários sentidos e em diversos
campos.435
O Direito sempre trabalhou com tais conflitos vicinais ou com a
retroalimentação conceitual, categorial ou institucional entre o Direito Público e
o Direito Privado. Um dos exemplos mais conhecidos, embora não associado aos
conflitos vicinais envolvendo essas áreas, é a independência relativa de
instância (art. 935, CC/2002; art. 315, CPC/2015; arts. 63-68, CPP). Um mesmo
ato ilícito pode ser colorido por normas de Direito Civil, Direito Penal e Direito
Administrativo (no caso de prática por servidores estatutários e que possam vir a
responder processo administrativo-disciplinar pelo mesmo ato),436 o que
demanda a solução de problemas de qualificação jurídica e a necessidade de se
controlar a ação paralisante sobre o exercício de pretensões punitivas pelo
Estado (no juízo criminal e pela Administração) ou de pretensões privadas (de
caráter ressarcitório). Em momento algum se questiona haver ruptura das
divisões sistemáticas, muito menos uma privatização ou publicização das
respectivas áreas.
Outro exemplo, agora de retroalimentação, está no controle de
constitucionalidade das leis, que é uma variante dos juízos privatísticos de
nulidade dos atos, e da interpretação conforme sem redução do texto normativo,
que corresponde a uma forma publicística da conversão substancial do negócio
jurídico, desenvolvida no Medievo pelos antigos notários e registradores.437
c) Problemas de qualificação.438 Se a “grande dicotomia” não foi abalada,
como explicar a situação dos contratos de seguro, seguro-saúde e de planos de
assistência médica, de previdência complementar, de transporte aeronáutico,
marítimo ou terrestre, de serviços de telecomunicações ou os contratos
bancários, que se submetem a um incomparável nível de intervenção
regulatória?
Desde os anos 1990, o Brasil criou agências reguladoras para esses setores
(Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL, Agência Nacional de
Aviação Civil - ANAC, Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT,
Agência Nacional de Transportes Aquaviários - ANTAQ, Agência Nacional de
Saúde Suplementar – ANS, Superintendência de Seguros Privados - SUSEP),
sem que se esqueça da antiga função regulatória do Banco Central do Brasil e do
CMN, órgãos que sucederam o Banco do Brasil e a Superintendência da Moeda
e do Crédito- SUMOC nesses misteres.439 Essas agências, com maior ou menor
poder regulatório, atuam em espaços de deslegalização total ou parcial,
permitindo que exerçam funções tipicamente normativas, decisórias e
executivas. Diante desse cenário, qual o espaço para o Direito Civil e, por
consequência, o Direito Privado?
Todos esses contratos não deixaram de ser civis ou comerciais. Em todos
eles permanecem os elementos, os requisitos e os fatores eficaciais previstos na
legislação ordinária geral ou especial, em cujo âmbito foram criados (a se valer
da imagem da criação dos negócios jurídicos pela sociedade antes de sua
“entrada” para o mundo dos tipos440) e, posteriormente, normatizados, tipificados
e generalizados. Um contrato de transporte ou um contrato de seguro
encontrarão tais elementos, requisitos e fatores no Código Civil.
Durante boa parte do século XX, não apenas no Brasil, parcela desses
contratos foi afetada pelo Direito Público por causa da introdução de um sujeito
de direito público (órgãos, autarquias ou fundações) ou de direito privado de
caráter paraestatal (sociedades de economia mista ou empresas públicas) na
relação jurídica. Nos anos 1950, em muitos países, eram estatais as companhias
ferroviárias, as companhias telefônicas, as empresas de transporte coletivo, as
companhias de navegação aérea e marítima, e até mesmo bancos (lembrar-se do
modelo socialista francês pós-1981) operavam em regime de monopólio ou de
concessões, permissões e autorizações.
Segundo as teorias subjetivas, seria até mesmo possível discutir se os
negócios jurídicos celebrados com esses entes ou órgãos seriam contratos
administrativos ou contratos privados com sujeitos públicos. Em uma ou outra
hipótese, seria inevitável a utilização de institutos ou princípios próprios do
Direito Público. No atual cenário, de ampla privatização desses serviços na
maior parte do mundo, a definição, a partir do sujeito, sobre qual a natureza da
relação jurídico-contratual tornou-se menos relevante.
A substituição do Estado por agentes privados na oferta ou na prestação
direta ou indireta desses bens e serviços deu lugar ao modelo de regulação, que
prepondera nas Américas e na Europa desde os anos 1980-1990. Com isso, a
análise desses negócios jurídicos exige do contratante ou do intérprete (judicial
ou administrativo) a necessidade de resolver problemas de qualificação jurídica.
Esse tipo de expediente não é algo novo. O Direito Privado com ele já convive
há tempos, com maior ou menor sucesso. Se duas partes celebrassem, em 1995,
um contrato de compra e venda de uma escultura, uma caneta-tinteiro ou um ar-
condicionado e o comprador identificasse um vício redibitório em quaisquer
desses objetos, qual o prazo para se pretender a devolução da coisa ou o
abatimento do preço? Seria de 10 dias, se a relação fosse qualificada como
comercial.441 Poderia ser de 15 dias, no entanto, se qualificada como de Direito
Civil,442 ou de 30 dias, se de Direito do Consumidor.443
Com a revogação da Parte Primeira do CCom/1850 pelo art. 2.045 do
CC/2002, essa questão ficou limitada aos prazos do Código Civil e do CDC.
Somente em 10 de novembro de 2004, após mais de uma década de dissídio
jurisprudencial, o STJ definiu um critério para essas qualificações, adotando a
tese minimalista ou subjetiva moderada para as relações de consumo, no
julgamento do REsp 541.867/BA.444 Embora, até hoje, “com certa frequência, os
rigores da aplicação da teoria finalista têm sido atenuados em julgados nos quais
se admite a incidência do Código de Defesa do Consumidor em relações
jurídicas envolvendo consumidores profissionais, quando comprovada sua
vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica”.445
Se é válido resolver problemas dessa natureza por meio da qualificação
jurídica, sê-lo-á com maior interesse e eficácia em relação aos conflitos sobre
qual (ou quais) regime(s) jurídico(s) deve ser aplicável a um determinado
contrato (ou a partes dele) submetido(s) à regulação. A jurisprudência do STJ,
nos anos 2000, demonstrou essa possibilidade e serve para se comprovar
praticamente a utilidade desse mecanismo.
É emblemático o exemplo do grupo de casos sobre a cobrança de
assinatura básica dos usuários do Serviço Telefônico Fixo Comutado, que, à
época, era preponderante no sistema de telecomunicações do Brasil. Na prática,
o usuário teria de pagar um valor fixo mensal à companhia de telecomunicações,
utilizando ou não aquele serviço. Na raiz da questão, estava o seguinte conflito:
qual o regime jurídico que deveria prevalecer? O regulatório-administrativo ou o
privatístico, particularmente o do CDC? As empresas cobravam essa assinatura
básica por efeito do contrato de concessão do STFC e por resolução da
ANATEL. Por essa razão, não lhes interessava que o contrato, nessa parte, fosse
considerado um negócio jurídico de Direito Privado. Ao passo que as
associações de defesa dos consumidores defendiam a incidência do CDC e de
princípios peculiares ao Direito Civil, como o da equivalência material das
prestações (sinalagma) e a onerosidade excessiva. Por que se pagar pela
assinatura básica quando não havia correlação entre o valor e o benefício?
No STJ, prevaleceu a tese da subordinação dessa cláusula do contrato às
regras do Direito Administrativo Regulador. O caso-líder foi o REsp no 911.802-
RS, que posteriormente resultou na edição da Súmula STJ 356,446 julgado na
Primeira Seção do STJ.447
Não é relevante para esta tese a descrição pormenorizada do caso e quais os
fundamentos utilizados pelo tribunal. É suficiente saber que o STJ procedeu à
qualificação jurídica do contrato e não entendeu que deveriam prevalecer sobre
as leis e resoluções de Direito Administrativo Regulador, na espécie, as regras
do CDC e do CC/2002 sobre cláusulas abusivas, equilíbrio material das
prestações e vedação ao enriquecimento sem causa.
O problema era de qualificação e, naquele feixe de relações jurídicas,
prevaleciam as normas regulatórias por efeito da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro
de 1995 (Lei de Concessões de Serviços Públicos), cujo art. 9o determina que a
tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora
da licitação. Exigir o pagamento da assinatura básica era uma demanda peculiar
ao equilíbrio econômicofinanceiro da concessão. Como reforço argumentativo, o
STJ recordou que também havia julgado um grupo de casos no qual se debatia se
os usuários de companhias de abastecimento de água poderiam ser obrigados a
pagar uma tarifa mensal mínima. Por identidade de razão, o STJ entendeu que
seria lícita tal exigência, “cuja natureza jurídica é a mesma da ora discutida, a
qual garante ao assinante o uso de, no máximo, 90 pulsos, sem nenhum
acréscimo ao valor mensal. O consumidor só pagará pelos serviços utilizados
que ultrapassarem essa quantificação”.448
O voto do min. Humberto Martins, que tomou parte nesse julgamento, ao
se referir ao capítulo recursal no qual se alegava a incidência do CDC nessa
relação jurídica, foi mais preciso teoricamente do que o voto do relator do
acórdão, o que recomenda sua transcrição literal, com as escusas por sua
extensão, mas que se justifica pela importância de seu conteúdo para esta tese:
“Finalmente, tem-se o problema da aplicação do Código de Defesa do
Consumidor e da teoria da onerosidade excessiva (art. 51, § 1o, II, do CDC). O
relator, em uma aproximação de figuras jurídicas, afastou essa argumentação e
comparou a assinatura básica à tarifação mínima no serviço de fornecimento de
água, que é amplamente aceita por esta Corte. (...)
Sobre esse capítulo do recurso, creio que é necessário estabelecer uma
premissa antecedente.
Há, neste Tribunal e em diversos juízos brasileiros, uma pletora de ações
que tocam o problema do tensionamento das regras de Direito do Consumidor e
as regras de outras províncias jurídicas, como o Direito Administrativo ou o
Direito Civil.
No campo da regulação de serviços de telecomunicações, a questão assume
contornos ainda mais perturbadores.
Em grande medida, a responsabilidade por essa zona cinzenta é atribuível à
doutrina especializada. Por se dedicar ao estudo de uma área com grandes
interesses econômicos imediatos, as Telecomunicações, a dogmática setorial
mantém-se alheia a problemáticas mais sensíveis, como a Metodologia Jurídica,
a Filosofia do Direito e a Teoria do Direito. Esses temas só frequentam os livros
sobre regulação como berloques ou enfeites, que conferem algum verniz ao
estudo publicado. Nada, porém, de se definir tecnicamente pontos essenciais
como se há estatuto científico próprio ao Direito das Telecomunicações ou se
existem princípios especiais e afetos a esse Direito.
Ora, se essa matéria fosse analisada com o rigorismo científico, não se
chegaria ao absurdo de se confrontar as normas de Direito do Consumidor com
as regras fundadas no Direito das Telecomunicações, como as ora debatidas
neste recurso especial. A cobrança de assinatura básica é tema alheio às relações
de consumo, quando se observa que seu fundamento é o regime tarifário advindo
da delegação normativa à ANATEL, por força da Constituição, e concretizado
em regulamentos, editais de licitação e em contratos de concessão. A empresa
operadora do STFC - Serviço de Telefonia Fixa Comutada não exige esses
quantitativos com base em direito seu, mas, como decorrência da equação
econô-mico-financeira que lastreia seu vínculo com a Administração Pública.
O Direito do Consumidor qualifica as relações jurídicas entre usuários e
operadoras naquilo que não for objeto de regulação ou quando a regulação
extrapolar os limites científicos do Direito das Telecomunicações e passar a
invadir a órbita daquela província. A cobrança indevida de ligações não
efetuadas é questão nitidamente consumerista. A exigência da assinatura básica,
por seu turno, é tema específico da regulação dos serviços de
telecomunicações."449

O voto sintetizou com precisão o problema: o contrato entre a companhia


concessionária e o consumidor não deixa de se regular pelo Direito Privado. Mas
ele também se submete ao Direito Administrativo Regulador e ao Direito das
Telecomunicações. Haveria três ou quatro regimes jurídicos a disputar sua
incidência sobre o contrato ou parte dele. Não se perde a natureza privada do
contrato, mas há partes dele que vão se deixar qualificar juridicamente de modo
diverso das previsões do Código Civil ou do CDC.
Não se pode admitir que se confunda essa solução, tão bem fixada no voto
do min. Humberto Martins, com sincretismo metodológico, publicização do
Direito Privado ou natureza híbrida do contrato. Essas contingências, ligadas ao
processo de qualificação, acham-se presentes em várias modalidades contratuais,
particularmente aquelas reguladas.
Nos contratos bancários, outra modalidade fortemente regulada pelo
BACEN e pelo CMN, o STJ decidiu-se pela incidência do CDC nessas espécies
contratuais,450 ainda que o tribunal haja reservado espaços de aplicação das
normas dos agentes reguladores do sistema financeiro nacional.451
Veja-se agora a imensidão de contratos de Direito Privado celebrados
quotidianamente no Brasil e em todo mundo, que envolve os serviços over-the-
top-contents (OTT’s). Quem baixa um aplicativo em seu telefone celular ou em
seu computador pessoal, como Viber, Skype, Whatsapp, Netflix ou Waze
subordinar-se-á a normas de Direito Administrativo? Esse ato é associado a uma
contratação de um serviço, em geral não oneroso ou com preços relativamente
módicos, posto que o utilizador remunere indiretamente a empresa com o uso de
seus dados pessoais, a cessão de informações a terceiros sobre seus hábitos de
consumo ou a visualização compulsória de publicidade. Esses serviços não se
sujeitam – até agora – a normas regulatórias da ANATEL.
Em mais uma demonstração da vitalidade do sistema privado, essas
relações formam-se e extinguem-se no plano exclusivamente civil ou de
consumo, a depender da qualificação jurídica dada ao negócio, após sua
submissão à teoria finalista moderada. A natureza privada da relação tem gerado
contestações por parte das empresas autorizadas a prestar serviços de
telecomunicações, que se submetem ao peso do regime administrativo-
regulatório.
A eficiência da solução criada na entropia e no caráter acidental do mundo
privado, contudo, tem colocado em xeque tais argumentos, até pelo
comparativamente baixo índice de infrações às normas de Direito do
Consumidor, provavelmente em razão do modelo de negócios que permite a
resilição unilateral a qualquer tempo pelo contratante. Outros serviços, como o
Uber, são mais complexos porque apresentam sérios “conflitos de fronteiras”
com o Direito Administrativo Regulador, se comparados com o serviço de
transporte individual clássico, o táxi.
A existência de “conflitos de fronteira”, como se nota, é inerente à “grande
dicotomia”. A ampliação da autonomia privada e de seus efeitos formativos no
plano negocial dará ensejo a que os espaços do Direito Privado também se
dilatem. Em paralelo, essas mesmas áreas poderão despertar o interesse estatal
tributário, regulatório ou administrativo em sentido estrito (exercício do poder de
polícia). Haverá, então, a necessidade de se rever as zonas limítrofes, com maior
ou menor restrição aos espaços de ambas as faixas fronteiriças. De modo a
comprovar tal hipótese, veja-se que, após a primeira edição desta tese haver sido
publicada, o Congresso Nacional aprovou a Lei no 13.640, de 26 de março de
2018, que regulamentou o transporte remunerado privado individual de
passageiros, de modo a normatizar o serviço de “realização de viagens
individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários
previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação
em rede” (nova redação do art. 4o, inciso X, da Lei no 12.587, de 3 de janeiro de
2012).
É natural que determinadas atividades econômicas, por sua importância ou
por seu impacto na sociedade, mais cedo ou mais tarde, entrem na alça de mira
do legislador ou do administrador. Desde então, haverá normas legais ou
administrativas para tipificar as criações da autonomia privada, desde que
atendam aos pressupostos de generalização e de aceitação social, ou, em casos
mais extremos, para restringir a autonomia privada por meio de um emaranhado
de regras públicas nos diversos setores de interesse do Estado. Nada disso é
novo. Nada disso diminui o Direito Privado, colo-niza-o ou derrui sua posição
autárquica. Muito menos é confundível com um mélange entre sistemas
jurídicos, uma mixagem de normas ou um diálogo de fontes.452
d) A insuficiência das teorias sobre a diferenciação sistemática. O estudo
das teorias sobre a summa divisio do Direito Público e do Direito Público é
marcado por um repasse crítico de seus principais fundamentos, findando com o
repúdio a todas elas, a escolha de uma teoria ou a combinação de duas ou mais
para se chegar a um fundamento menos lacunoso. Esse proceder, que é
praticamente universal, termina por incutir no leitor um ceticismo, quando não
uma postura cínica,453 ante a capacidade dessas teorias conferirem segurança
argumentativa no debate sobre a permanência da diferenciação sistêmica.
A respeito das teorias e sua recepção ao longo dos séculos, António
Menezes Cordeiro recorda que o tema da “contraposição entre Direito público e
Direito privado, em termos modernos, tem vindo a ocupar” a doutrina
portuguesa há mais de 200 anos: “cerca de 10 gerações de juristas”. Nesse
processo, percebe-se que “a contraposição iniciou-se pela doutrina do sujeito;
regressou a material, com diversos elementos de síntese”.454
As teorias, por conseguinte, têm sido prestigiadas ou descartadas, conforme
as tendências históricas, políticas e a evolução econômica. Não que isso as
desacredite ou as torne dispensáveis. Adotar tal ou qual teoria sobre a
diferenciação sistêmica implica admitir alguns pressupostos ideológicos ou
teóricos.
A variação de fundamentos teóricos é algo natural no Direito Civil. Vejam-
se as teorias sobre o negócio jurídico e sua diversidade, bem como a prevalência
de teorias voluntaristas no século XIX e teorias preceptivas no século XX.455
Não é possível dissociar as últimas do momento autoritário no qual foram
concebidas ou postas em prática. Chegou-se mesmo a decretar a morte do
negócio jurídico como categoria operacional do Direito Civil. Nada disso,
porém, afetou a valência prática do negócio jurídico e a impediu a continuidade
de estudos doutrinários de alto nível sobre esse tópico nuclear da Teoria Geral
do Direito Civil.456
Ao se referir ao sentido romanístico da “grande dicotomia”, Guido Alpa
adverte os “juristas de hoje” sobre a investigação das “fronteiras entre o Direito
Público e o Direito Privado”: se é que ela existe, deve ser buscada
exclusivamente na “realidade concreta” e não “no renascimento de fórmulas
obsoletas”.457 A exclusiva vinculação à “realidade concreta” parece um tanto
exagerada. Mas o abandono de “fórmulas obsoletas” é de ser considerado. A
despeito disso, quando se estuda a “grande dicotomia”, há de se considerar que o
problema não está na insuficiência das teorias, afinal quase todas possuem
lacunas ou contradições. Diga-se mais, com Hans Julius Wolff, Otto Bachof e
Rolf Stober, que dessas insuficiências não é possível negar a existência
autônoma do Direito Privado.458 Mais grave do que tais limitações é a falta de
coerência epistemológica em sua utilização. E essa incoerência radica-se em dois
aspectos: a identificação com o monismo jurídico e a postura ideológica perante
o Direito Privado.
e) O monismo jurídico e unidade do sistema jurídico. Na sequência do
item anterior, ver-se-á com maior nitidez o referido problema da coerência
epistemológica. Na abertura do Capítulo Primeiro, pôs-se a necessária ênfase na
determinante influência de Hans Kelsen para o combate da diferenciação
sistemática. Sem sua tese de livre-docência de 1911 e os posteriores
desenvolvimentos teóricos de sua obra, dificilmente os ataques à distinção do
Direito Público e do Direito Privado teriam sido tão exitosos.459 Ocorre que os
maiores críticos contemporâneos à “grande dicotomia” jamais se reconheceram
como kelsenianos ou positivistas, em quaisquer de suas divisões internas.
O estatalismo jurídico é uma visão do ordenamento que remonta, ao menos
em termos mais organizados teoricamente, a Georg Jellinek e sua teoria da
subordina-ção-coordenação. Com Kelsen, uma forma mais extrema de
estatalismo ganhou corpo e é sintetizável pela fórmula “todo Direito é Direito
Público”.460 Não se confundam os termos do problema: a produção do Direito é
unicamente pública e, por consequência, também sua natureza. Poder-se-ia
argumentar que até o Direito Privado, como produto do legislador, tem origem
pública. Mas essa afirmação ignora o fato de que a máxima de Kelsen vai além
dessa trivialidade: “todo Direito é Direito Público” significa a inexistência de um
Direito Privado essencialmente distinto do Direito Púbico, dotado de autonomia
e de unidade de princípios. O sentido finalístico do estatalismo, por sua vez,
apresenta-se de outro modo, expressável por uma famosa máxima do Direito
Administrativo italiano, de autoria de Oreste Ranelletti: “É público tudo aquilo
que, direta ou indiretamente, é do Estado”.461 Os ecos desse pensamento também
chegaram ao Brasil, como se observa deste trecho de Afonso Arinos de Melo
Franco: “Mesmo para o jurista a distinção é irrelevante, se êle se colocar na
observação da gênese do Direito, porque provindo sempre, para êle, o direito do
Estado, pouca diferença faz que se trate de Direito privado ou público, uma vez
que, genèticamente, todo o Direito é estatal e, por isto, público”.462
A melhor crítica a essa maneira de configurar o Direito Privado deve-se a
Konrad Hesse:

“Importância decisiva do Direito Constitucional para o Direito Privado: isso não


significa, no entanto, que a Constituição hoje se tornou fundamento de todo o
Direito e por ele também do ordenamento ju-rídico-privado. A Constituição não
é, para se valer de uma observação irônica de Ernst Forsthoff, ‘o ovo do mundo,
a célula jurídica germinal da qual tudo procede’. Certamente, estão no centro do
Direito Constitucional e do Direito Privado os mesmos homens, em ambos os
casos se trata de alcançar uma ordem justa para a convivência humana. Mas,
como mostra uma simples olhada na História, o Direito Privado deriva em maior
medida de outras fontes que do Direito Constitucional. Inclusive se já não
encarna em um sistema fechado, isolado das demais partes do ordenamento
jurídico, segue sendo um setor jurídico autônomo. E a Constituição é certamente
a ordem jurídica fundamental da Coletividade. Mas, de forma alguma, regula
tudo, senão apenas singulares aspectos – em geral particularmente importantes –
da vida estatal e social, abandonando o resto da configuração aos poderes
estatais por ela constituídos, em particular ao legislador democrático.”463

A citação de Ernst Forsthoff tornou-se famosa por sintetizar ironicamente


uma visão do ordenamento jurídico na qual, em suas palavras, é suficiente olhar
para a Constituição, deixando-se de lado o direito ordinário, afinal, ela é o “ovo
do mundo jurídico, a partir do qual tudo procede, do Código Penal à lei de
fabricação de termômetros clínicos”.464
Não há problema em ser kelseniano e defender o fim ou a mitigação radical
da “grande dicotomia”. É necessário tão somente que se assumam as
consequências dessa vinculação teórica.
f) Ideologia autoritária e o combate à “distinção sistemática”. A
publicização do Direito Privado, durante o Estado Novo, foi uma parte
importante do discurso oficial e serviu de elemento pragmático e ideológico para
fundamentar a reforma dos códigos nos anos 1940, especialmente com a criação
de códigos setoriais.465
Na Europa, no mesmo período, o fim da diferenciação sistemática assumiu
contornos radicalmente mais profundos e com outra pauta ideológica, que uniu
juristas italianos e alemães, representativos das correntes jurídicas de inspiração
fascista e nazista, ao exemplo da comissão ítalo-alemã, constituída no final da
década de 1930, que registrou posição majoritária em favor do fim da autonomia
do Direito Privado e da recondução a um Direito único, sem distinções público-
privado.466
Durante o período nacional-socialista, empreendeu-se uma luta contra a
categoria “direito subjetivo”, que passou a ser considerada ultrapassada e
substituída pela “situação jurídica subjetiva”. Ele seria um conceito de tradição
liberal-burguesa, que deveria ceder espaço ante o “conceito concreto e
impregnante de órgão da comunidade do povo”.467 Para esse fim, tornou-se
indispensável apagar as linhas divisórias entre Direito Público e Direito Privado
e a própria ideia de Direito Privado como uma parte diferenciada do
ordenamento jurídico, que se pautava pela autonomia sistêmica.468 Karl Larenz
foi o líder desse processo de desconstrução da dicotomia, pois, a seu entender,
“um sistema autônomo de Direito Privado”, com tais características, “não é
conciliável com nosso ordenamento de vida popular”. A autonomia do sistema
de Direito Privado era incompatível com a “völkischen Lebensordnung”, a
ordem jurídica völkische, um dos postulados mais importantes do Direito
nazista.469
As razões para esse ataque à diferenciação e à autonomia do Direito
Privado recaem sobre três causas: a) o Direito Privado como núcleo de um
sistema essencialmente autônomo e distinto do Direito Público referenda a
existência de uma “esfera de relações nas quais o interesse meramente privado
prevalece, em contraste com o princípio na-cional-socialista da absoluta,
permanente e penetrante superioridade do interesse geral sobre o interesse
particular”; b) a diferenciação confronta-se com o núcleo da doutrina jurídica
nacional-socialista na própria conceituação de dever jurídico, entendido pela
visão clássica como um dever em relação a um indivíduo. Para o Direito
nacional-socialis-ta, o dever jurídico corresponde essencialmente a um dever em
relação à comunidade. A partir de agora, ao se vincular juridicamente, o
indivíduo não o faz somente em relação a outrem, mas em relação à sociedade;
c) o Direito Privado não pode mais ser um sistema autônomo e independente das
demais áreas do Direito. Segundo Larenz, a ordem nacional-socialista tende “a
subordinar cada âmbito jurídico a princípios de Direito Público, e a identificar
estes com os princípios de uma concreta moral e de uma concreta ideologia e
prática política, quer dizer, com os princípios do nacional-socialismo”.470
É importante assinalar o significado dos conceitos de unidade do Direito e
de liberdade contratual como função social no regime nacional-socialista.
Quanto a este último, segundo Larenz, a liberdade contratual existiria “só na
medida em que o ordenamento social e econômico em seu conjunto deixa-lhe
um espaço, e pode ser exercida como deveres que derivam para o particular das
tarefas e da responsabilidade social”. O exemplo dessa concepção de autonomia
contratual como função social desenvolvida pelo particular estaria no caso de
um comerciante de alimentos, que é o único fornecedor da região. Pela doutrina
clássica do Direito Civil, ele poderia se recusar a vender a alguém. Mas, pelos
princípios sociais do nacional-socialismo e da autonomia privada condicionada
pela função social, ele seria obrigado a vender os alimentos para todos. Larenz
concebe a dicotomia público-privado como um óbice à unidade do Direito como
“ordenamento da vida nacional”.471
No regime fascista italiano, pode-se somar mais uma razão: o fim da
dicotomia apresentava-se como uma justificação para que o poder interventivo
do Estado não encontrasse limites. Era a oportunidade para uma regulação total
da vida privada.472
É óbvio que se pode defender o fim da separação Direito Público-Direito
Privado com argumentos não ideológicos e metodologicamente consistentes,
como o positivismo jurídico kelseniano. Mas, não se admite a utilização de
argumentos ao estilo dos propostos por Karl Larenz para defender uma solução
que arruíne as fronteiras e a autonomia do Direito Privado. Infelizmente, é mais
comum do que se imagina encontrar tais argumentos em textos jurídicos de
absoluta boa-fé, que ignoram as raízes mais profundas (e mais abjetas) dessa
maneira de se encarar a relação do Direito Privado com outras áreas.
g) O terceiro setor. É recente a formulação de uma nova divisão de
interesses, de serviços e de pessoas jurídicas. Haveria o interesse privado, o
público e o estatal, sendo que a espécie intermediária (interesse público) não
necessariamente guardaria a natureza pública. Aproveitando-se de uma
linguagem sociológica, passou-se a utilizar também a terminologia terceiro
setor, no qual se conformariam variadas espécies, como: a) organização social;473
b) organização da sociedade civil de interesse público (OSCI-P);474 c) fundação
privada e associação, nelas compreendidas as entidades dotadas de certificados
de filantropia ou de interesse público; d) serviço social autônomo. Em sendo
personalizados, e a quase totalidade deles o são, tais plexos assumem a natureza
de pessoa jurídica de direito privado, de entre as previstas no art. 44, incisos I a
V, CC/2002.
O termo “terceiro setor” é altamente equívoco, pois retrata um espaço de
atuação que seria distinto dos outros dois setores (o mercado e o Estado). Tendo
origem nos Estados Unidos da América, na década de 1970, o “terceiro setor”
designa uma experiência muito diversa daquela compreendida no Brasil a partir
do chamado “marco legal do terceiro setor”, que surgiu no âmbito do PDRAE,
sobretudo com a Lei no 9.790, de 23 de março de 1999, e da Lei no 9.637, de 15
de maio de 1998. O marco legal do terceiro setor brasileiro, em última análise,
qualificaria pessoas jurídicas de direito privado para receber recursos públicos
em sentido amplo.
Nesse marco legislativo, segundo Rodrigo Xavier Leonardo, haveria “uma
qualificação que capacita pessoas jurídicas de direito privado a contratar com a
administração pública para, por meio dessa relação jurídica, receber recursos,
que podem ser monetários, podem ser bens móveis ou imóveis ou, inclusive, a
cessão de funcionários para o desenvolvimento de atividades da entidade”. O
Direito brasileiro, nesse aspecto, deu conformação funcionalista ao conceito de
terceiro setor, o que afasta o problema da “distinção sistemática”. Isso se
justifica por que “tal qualificação, e também os benefícios dela consequentes,
não retiram o caráter de direito privado de tais entidades”. Não se pode
confundir os efeitos jurídicos da percepção de recursos públicos e a eventual
submissão aos órgãos de controle e a exigências de prestação de contas com a
modificação da natureza jurídica dos entes que operam sob o “terno” do terceiro
setor. Essa condição de entidades que giram dinheiro público tão somente as
“insere em um regime jurídico especial, que convive com a estrutura e a função
de direito privado”.475
h) Os microssistemas e as interpenetrações. A ideia de microssistemas é
resultante de uma construção teórica dos anos 1960, elaborada na Itália por
Natalino Irti. Para ele, o crescimento da nomogênese de leis extravagantes, após
a redemocratização italiana no final da década de 1940, implicou uma alteração
no eixo gravitacional da ordem jurídica: a centralidade dos códigos e a
acessoriedade dessas leis extravagantes invertia-se. A setorização do sistema
jurídico apresentava-se com tal intensidade que elas perdiam o caráter residual e
temporário. As leis especiais, segundo ele, apropria-ram-se de matérias
anteriormente confinadas aos códigos e, com o passar do tempo, desenvolveram
“lógica autônoma” e “princípios orgânicos” próprios. Em um primeiro momento,
esses princípios se contrapõem “àqueles fixados no Código Civil” e, ao final,
logram “suplantá-los de todo”. Passa-se de uma fase de conflito para um
“estágio final” de “prevalência e substituição”.476 Era essa uma das faces do
processo de descodificação, a respeito de que já se comentou nesta Primeira
Parte.
Ricardo Luís Lorenzetti popularizou uma metáfora a respeito dessa nova
realidade no sistema de fontes: os códigos comparavam-se aos velhos centros
das metrópoles. Cada vez mais os citadinos afastam-se dos centros e transferem-
se para bairros afastados, com seus modernos centros de compras e as
facilidades dos projetos urbanísticos modernos. Abandonam, então, os centros
históricos e lá só voltam esporadicamente para resolver algum problema.477 A
teoria dos microssistemas foi recepcionada no Brasil em um dos últimos
trabalhos de Orlando Gomes. Esse texto insere-se na desilusão de Gomes com as
codificações. À altura, ele já não mais acreditava nos códigos, particularmente
no projeto Reale, que seria aprovado em 1984 na Câmara dos Deputados.478
A despeito de ser praticamente desconhecida fora da Itália, em especial na
Alemanha, França e Reino Unido, a teoria dos microssistemas adquiriu uma
influência sem precedentes no Brasil. Seu campo mais fecundo na atualidade é o
Direito do Consumidor. Não há praticamente um trabalho sobre o CDC ou seus
princípios que não reforce a particularidade do Direito do Consumidor como um
microssistema jurídico, o que demandaria um tratamento interdisciplinar da
matéria.
Não é objetivo da tese examinar o conceito de microssistema e seus
fundamentos, embora se prefira a solução de Frank Bydlinski para a
especificidade normativa do que ele chama de “regulação privada especial”.479
Mas a teoria dos microssistemas interessa à dicotomia público-privado quando é
usada para contestá-la. E isso tem ocorrido em duas vertentes: (i) o caráter
multidisciplinar de alguns microssistemas, particularmente o Direito do
Consumidor; (ii) a comprovação de que um microssistema pode assumir caráter
híbrido e, como tal, existir à margem da “distinção sistemática”.
É ordinário haver disciplinas ou códigos que conjuguem normas oriundas
do Direito Público com normas do Direito Privado. O CC/2002 ou o CPC/2015
são exemplos clássicos dessa combinação normativa, conquanto haja evidente
preponderância de normas privatísticas no primeiro e de normas publicísticas no
segundo. A Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei no 11.101, de 9 de
fevereiro de 2005), que é o núcleo normativo do Direito Falimentar e
Recuperacional, também pode ser referida como exemplo de um diploma com
regras pertencentes ao Direito Público e ao Direito Privado, embora com um
nível de preponderância muito menor do último em relação ao primeiro.
Nenhum exemplo, porém, se aproxima do Direito do Consumidor, daí ser ele
referido permanentemente como o exemplo de microssistema. Na Faculdade de
Direito do Largo de São Francisco, v.g., essa é uma disciplina interdepartamental
(Direito Civil, Direito Processual e Direito Penal), o que acentua esse caráter.
Se a multiplicidade de normas com vinculações distintas em uma mesma
lei não é algo invulgar, em que afetaria a diferenciação público-privado o
conceito de microssistema? Se ele for entendido como um espaço híbrido, no
qual não há como se alocar um direito específico nos campos do Direito Público
ou do Direito Privado, tem-se aí um problema. A multidisciplinariedade em si
não afeta a “grande dicotomia”. Se é certo que o CDC tem essa natureza, porque
comporta “questões que se acham inseridas nos Direitos Constitucional, Civil,
Penal, Processuais Civil e Penal, Administrativo”,480 não se pode,
exclusivamente por essa razão, argumentar que o Direito do Consumidor, como
espécie de um microssistema jurídico, é uma objeção permanente à distinção
sistemática. Em outras palavras, a coexistência, em um dado microssistema, de
campos distintos, não é um reforço apriorístico que sirva à comprovação do fim
da distinção. Corresponde, pelo contrário, a uma acomodação de regras que, de
algum modo, acabam por se reconduzir a diferentes ramos jurídicos.
i) Direito de Família e sua natureza especial. Dois argumentos, de caráter
complementar, são muito utilizados para se justificar o enfraquecimento ou o fim
da distinção entre o Direito Público e o Direito Privado: a) a publicização do
Direito de Família;481 b) que seria comprovável por sua crescente autonomização
como disciplina que não mais teria conexão epistemológica com o Direito Civil.
É importante examinar o primeiro argumento em conexão. Para isso, faz-se
uma síntese das principais ideias de Bernardo B. Queiroz de Moraes sobre as
relações entre o Direito de Família e o Direito Civil, que guardam estreita
conexão com os postulados defendidos nesta tese: a) o Direito de Família é um
dos ramos do Direito Civil que mais “tardiamente tiveram reconhecida sua
autonomia (ao interno do sistema dos Códigos)”, o que decorria a absorção da
matéria pelo Direito Canônico; b) a passagem do Direito de Família para as
codificações modernas ocorreu de modo pouco sistemático, com avanços e
recuos, tendo importância nesse processo as obras de Kant e Savigny,
especialmente este último que desenvolveu o conceito de “relação de família”,
de entre as espécies de relações jurídicas, e de Direito de Família, como o
“conjunto de institutos jurídicos (aos quais essas relações se referem)”; c) essa
evolução implicou uma mudança no Direito de Família: no século XVIII, “os
temas centrais do direito de família vinham mesclados com temas típicos do
direito público (como a previsão de crimes)”, ao passo em que, no século XX,
“havia apenas uma ênfase no papel da família para a sociedade em geral, não
uma crítica à sua natureza preponderantemente privada”; d) no Direito dos
países socialistas, destacou-se a tendência a codificações setoriais no Direito de
Família, o que seria uma “consequência do reconhecimento de uma
característica supranacional da família e da tentativa de delineação da sociedade
pelo Estado (enfatizando o seu viés público)”. Esse modelo soviético de Direito
de Família justificava-se pela preponderância da “função educativa” da família,
dada a “necessidade de formação de uma nova consciência popular, pautada em
uma suposta superioridade moral desse direito”.482
O Direito de Família, ao menos com esse nome, foi substancialmente
alterado após as invasões napoleônicas, com o perdão do trocadilho, aos
territórios ocupados tradicionalmente pela Igreja, seja ela católica ou protestante,
nas relações familiares, no estado das pessoas (nacionalidade, registro civil e
matérias correlatas, como estado civil, reconhecimento da capacidade civil,
filiação) ou no tratamento dispensado aos mortos. Deu-se a transposição para o
Direito estatal de matérias secularmente mantidas sob o Direito Canônico ou o
Direito Eclesiástico, que, em alguns países, por conveniência ou por interesse
recíproco, também figuravam, de modo parcial ou total, em leis positivas dos
Estados medievais e em seus sucessores Estados nacionais. Tal indistinção pode
ser notada até aos dias de hoje nas ordens jurídicas muçulmanas mais
tradicionais. Nestas há fontes complementares de direito positivo, direito natural
e direito divino, muita vez, com eficácia equivalente.
A entrada do Direito de Família no Code Civil de 1804 veio acompanhada
de normas não exclusivamente privatísticas, mas também de conteúdo
administrativo e processual. Isso não é novidade. Nas Ordenações do Reino e
nas consolidações do Iluminismo era esse o padrão. E mesmo nos dias atuais, é
algo ordinário encontrar-se nos códigos civis um conjunto de normas
processuais, tributárias e administrativas no âmbito do Direito de Família e do
Direito das Sucessões (v.g. tutela, alimentos, inventário e partilha).
No Brasil, essa migração do Direito Canônico-Direito Eclesiástico não foi
singela. A CI/1824 não tratava do Direito de Família, salvo as regras sobre a
Família Imperial, mas isso era (e ainda é) um padrão nas constituições
monárquicas em todo o mundo, dado que esse é um assunto de Estado.483 O
Decreto Imperial no 1.144, de 11 de setembro de 1861, foi o primeiro marco
legislativo da “laicização” do Direito de Família no Brasil, ao estender os efeitos
civis dos casamentos, celebrados na forma das leis imperiais, aos matrimônios
das pessoas que professassem credos que não o oficial do Império. Além disso,
determinava que fossem “regulados ao registro e provas destes casamentos e dos
nascimentos e óbitos das ditas pessoas, bem como as condições necessárias para
que os pastores de religiões toleradas possam praticar atos que produzam efeitos
civis”.
Uma das últimas medidas do Gabinete Ouro Preto, nos estertores da
monarquia, anunciada em 7 de junho de 1889, foi a de apresentar ao Parlamento
um projeto de lei para o casamento civil. Com o golpe de 15 de novembro de
1889, instaurou-se a república no Brasil e o novo regime, em 24 de janeiro de
1890, baixou o Decreto no 181, que criou o casamento civil no país. O CC/1916,
elaborado no espírito laico da CF/1891, marcou em definitivo a migração das
normas sobre família e casamento do âmbito canônico-eclesiástico para o direito
positivo estatal.
É perceptível a tensão intrínseca a esse processo em uma passagem da
doutrina do início do século XX. Martinho Garcez, em obra de 1914, escrita
tomando por base o projeto do CC/1916, informa que o conselheiro Lafayete
Rodrigues tinha “repugnância”, ao estilo de Savigny, em “considerar o
casamento um contrato”, a qual adviria “da influência da Igreja católica que
transformou o contrato matrimonial em sacramento, para tirá-lo do poder civil”.
Ocorre que, “hoje que o direito se emancipou completamente da tutela
teocrática, e que a Constituição da República (art. 72 § 4) só reconhece o
casamento civil, não há mais razão, como bem pondera Clovis, (Direito da famil.
§ 6), para esse exotismo de sacramento ser considerado um contrato, mais solene
que qualquer outro, sem dúvida, mas que pode ser colocado ao lado da compra e
venda como um contrato consensual”.484
A presença do Direito de Família no Direito Civil e, por consequência, no
Direito Privado não se deveu por razões ligadas à “grande dicotomia” e sim a
um embate para atrair essa área para o direito positivo estatal, o que não
significa confundir esse conceito com o de Direito Público. Essa indistinção
conduziu a um crescente entendimento, de grandes doutrinadores, reitere-se, em
ordem a nela identificar uma “publicização” do Direito de Família. Essa
percepção foi acentuada por outra contingência histórica: a constitucionalização
(no sentido de elevação das normas ordinárias à Constituição) das normas de
Direito de Família.
Não era apenas necessário retirar a matéria do campo moral-religioso, era
mandatório assegurar que os valores laicos e positivistas (no sentido comtiano
do termo) que levaram ao golpe de 1889 não fossem desacreditados por hábitos
e valores morais arraigados na sociedade brasileira.485 Daí haver a CF/1891
prescrito com ênfase: “A Republica só reconhece o casamento civil, cuja
celebração será gratuita” (§ 4o do art. 72). Uma república laica não admitia a
pluralidade de fontes, especialmente uma não estatal, em matéria de Direito de
Família. Seu locus era o Código Civil, mas seria bom reforçar na Constituição a
natureza não confessional do instituto que ocupava, então, o núcleo do Direito de
Família. Essa constitucionalização vai prosseguir cada vez mais intensa nas
demais constituições republicanas do século XX.
Falar em constitucionalização do Direito de Família no Brasil, a partir de
1988, é ignorar sua ocorrência desde o golpe republicano e a promulgação da
CF/1891. Em 1934, o propósito de sedimentar a laicização do casamento é
reafirmado: a família constitui-se pelo casamento, que é laico e indissolúvel
(art. 144). A nova constituição, porém, adiciona um novo componente: a família
“está sob proteção especial do Estado” (art. 144, in fine). São tempos novos, de
avanços e sucessos do totalitarismo e do autoritarismo na Europa. É o momento
de encarar a família, de onde nascem os operários, os soldados, os servidores
públicos, como a espinha dorsal do Estado. A visão platônica de uma
participação estatal na formação dos filhos surge nesse momento e vai perdurar
desde aquele instante. Não mais caberia à Igreja “proteger” a família. É ao
Estado que compete essa função, dentro de uma ideologia laica e interventiva. A
concessão religiosa dá-se no art. 146, ao se reconhecer efeitos civis ao
casamento religioso, desde que observados os preceitos da legislação comum
(art. 146).
Em paralelo, contudo, segue o programa de retirada dos conceitos morais
da família, algo que o próprio Clóvis Beviláqua tentou fazer, mas foi impedido e
ainda acusado, por exemplo, de fomentar a criação de casamentos a contento, a
um passo das “uniões livres”.486 No parágrafo único do art. 144, cuida-se do
desquite e da anulação do casamento (matérias tratadas no CC/1916). E no
art. 147, introduziu-se uma regra para facilitar o reconhecimento dos filhos
naturais.487
A CF/1937, que também incluiu um título especial sobre a família,
conserva os preceitos sobre a família constituída pelo casamento indissolúvel e
sob a proteção estatal, acrescidos da criação de compensações às famílias
numerosas (art. 124, CF/1937). A proteção à infância e à juventude e o apoio aos
pais sem recursos também são inseridos no texto constitucional (art. 127,
CF/1937). É o reflexo de medidas idênticas, adotadas pelo regime fascista
italiano, que precisava de soldados e operários, para aumento da prole. Mais que
isso: a educação dos filhos, de acordo com o programa platônico, passa a ser
compartilhada com o Estado (art. 125, CF/1937). Idêntica regra de facilitação do
reconhecimento dos filhos ilegítimos é conservada (art. 126, CF/1937).
Em 1946, o novo texto constitucional reproduz o conteúdo da CF/1937,
com pequenas diferenças. Uma delas recai no tratamento mais condescendente
com o casamento religioso.488 A CF/1967, elaborada no período ditatorial, é fiel
ao modelo de regulação da família que se inaugurou em 1934-1937.489
A vitória do laicismo tem seu marco histórico na Emenda Constitucional
do Divórcio de 1977 e a respectiva lei, que modificou o CC/1916. Desde então,
como também se salientou, o Direito de Família passa por um novo processo,
que foi construído pela alteração dos valores sociais e reconhecido mais
recentemente na jurisprudência e na doutrina, que é o de ampliação dos espaços
da autonomia privada. Sobre isso não se vai reiterar o quanto já escrito. Fica
evidente que não é o Direito de Família uma espécie de cavalo de Troia para a
entrada do Direito Público no Direito Privado. Ele foi, na verdade, o epicentro de
uma guerra entre valores morais e norma, Direito Canônico-Direito Eclesiástico
e Direito positivo estatal. Regras de “proteção” à família, presentes em 1934,
1937 e 1946, constituíram-se em uma forma de tutela do Estado, segundo
valores platônicos, ora fascistas, ora socialistas, e depois solidaristas (no sentido
do solidarismo cristão pós-1945), mas não interferiram no caráter privado do
Direito de Família.
Uma prova do quanto essas tensões ocorreram em vários países do mundo
está no processo de elaboração do BGB. Um dos maiores entraves ao projeto de
reforma da Constituição alemã para instituir competências necessárias à edição
de um Código Civil nacional estava no Direito de Família.490 Os Estados alemães
do Sul (católicos) e o Reino da Saxônia (protestante), um dos maiores opositores
à unificação alemã, temiam que um Código Civil invadisse suas competências
em matéria de família.491 Nesses Estados, o prestígio do Direito Canônico-
Direito Eclesiástico e as boas relações com a Igreja Católica e as Igrejas
protestantes eram muito maiores do que na desenvolvida Prússia, que combinava
uma classe Junker e seu campesinato, ambos devotos em seu protestantismo
antigo, mas que também já formava amplos contingentes de uma classe operária
e de uma classe média muito mais indiferentes ao tema religioso. Estavam em
jogo o Partikularrecht e o Direito de Família prestava-se com enorme qualidade
para ser usado como aríete moral e ideológico nessas discussões.492 Não é sem
razão que o Direito de Família se somou às questões fundiárias e societárias no
mêlée em que se transformaram os debates parlamentares sobre o futuro BGB. 493
Os desenvolvimentos históricos do Direito de Família comprovam sua
“entrada” para o universo normativo estatal em sentido estrito há pouco mais de
200 anos, ao menos na Europa. Essa apropriação do Direito de Família deveu-se
às razões já delineadas neste item: conflitos com as Igrejas católica e
protestantes, em paralelo à secularização da vida familiar; necessidade de
implantação de políticas platônicas sobre a família e a prole, vistas como parte
do esforço estatal por soberania e controle social; criação do registro público de
pessoas naturais e aperfeiçoamento dos institutos de estatística e recenseamento,
além de causas particulares, ligadas à realidade de cada Estado-nação. O
discurso da publicização do Direito de Família avançou no século XX, reforçado
pelo aumento da presença do Estado em outras áreas, como a Economia e a
prestação de novos serviços públicos. O final do século XX, porém, deu início a
outro processo: a “saída” do Estado do núcleo das relações familiares,
especialmente do controle exercido sobre o casamento e as formas de sua
constituição e dissolução.
Superado, pois, o problema da função publicizadora do Direito Privado
pelo Direito de Família, a qual, como exposto e a despeito de vozes respeitáveis
em sentido contrário, não se revelou tão intensa a ponto de ser reconhecida como
uma fissura à “grande dicotomia”.
j) A constitucionalização do Direito Civil e a eficácia dos direitos
fundamentais em relação aos particulares. Estes dois fundamentos para se
afirmar o fim da “grande dicotomia” são merecedores de um exame autônomo,
dada a complexidade e a importância de seus postulados para a compreensão de
um sistema de Direito Privado autárquico. Sobre esses dois tópicos, remete-se o
leitor às Partes Segunda e Terceira, respectivamente.
§23. CONCLUSÕES PARCIAIS DA PRIMEIRA PARTE
Franz Bydlinski, na última parte de seu artigo sobre a “distinção
sistemática”, define o Direito Privado como o “direito da sociedade
relativamente independente do Estado”. Ele compreende vínculos jurídicos e
atividades humanas para os quais não concorrem o Estado, seus entes ou seus
órgãos. É nesse núcleo que se radica a divisão de fronteiras entre o Direito
Privado e o Direito Público. Não se pode tratar da dicotomia com a “obsessão
pelos problemáticos campos complementares”.494 Longe de obsoleta, a separação
é útil, preserva importantes espaços de autodeterminação, justifica indiretamente
a autonomia epistemológica do Direito Privado, tem fundamento histórico e
permite a solução de casos da realidade prática com grande êxito.495
Se as teorias que se ocupam da delimitação do direito objetivo são
susceptíveis de críticas, remanescendo todas com algum tipo de contradição, é
inadequado adotar um modelo sincrético. Mais importantes do que as respostas
eventualmente contraditórias que essas teorias oferecem ao problema central
desta Primeira Parte é o reconhecimento de que o monismo jurídico está na raiz
da crítica mais bem fundamentada à “distinção sistemática”. Não é possível fugir
da contradição essencial do discurso antipositivista aliado a um ataque contínuo
à “grande dicotomia”. Ser positivista jurídico é opor-se a um Direito Privado
ontologicamente autônomo. É uma posição legítima teoricamente e que exige o
respeito de todos por sua coerência.
Os argumentos de matriz histórica, que até hoje são repetidos em diversas
obras de Direito Civil, merecem uma ampla revisão. Não existem mais as
condições históricas que ameaçaram a “grande dicotomia” no século XX. E
mesmo que elas voltem a se manifestar, dada a natureza cíclica do processo
histórico, o longo intervalo de hegemonia da publicização do Direito Privado
(1930-1980) mostrou-se incapaz de arruinar a autonomia privatística. Mais que
isso, o argumento histórico só poderia ser usado a favor da diferenciação de
sistemas. A dicotomia conheceu inimigos famigerados no interregno de 1930-
1945. Mesmo derrotados, suas ideias penetraram na cultura jurídica romano-
germânica e até hoje se fazem presentes por meio de fórmulas que, se forem
examinadas de perto, revelariam a imagem verdadeira no retrato de Dorian
Gray.
O apelo permanente à Constituição, à unidade da ordem jurídica
constitucionalizada e à recondução geral do Direito aos princípios
constitucionais não tem forças para apagar as fronteiras do Direito Privado.
Ainda com Franz Bydlinski, é preciso recordar que os direitos fundamentais
nasceram como uma proteção aos indivíduos contra os excessos do Estado. Mas
a simples garantia constitucional é precária, até pelo caráter vago das normas de
direitos fundamentais, cuja interpretação pode resvalar para “apreciações
totalmente livres” ou cercadas por um “positivismo dos valores”, ambos
igualmente contraditórios e potencialmente perigosos para a liberdade intrínseca
ao Direito Privado.
A “distinção sistemática”, que venceu “a prova do pior totalitarismo”,496
segue renovada tanto pela ação criativa da autonomia privada, quanto pela
renovação metódica que o Direito Privado começa a receber em vários setores da
dogmática.
Os problemas ligados à autonomia epistemológica do Direito Civil
persistem, embora possam ser bastante reduzidos com a reafirmação da
“distinção sistemática”. Na Segunda Parte, ter-se-á a oportunidade de identificar
outro sério obstáculo: a falta de acordo semântico sobre o que seja a
constitucionalização do Direito Civil e, até pela ausência de limites objetivos, a
consequente tendência à sobreconstitucionalização.

377 Disponível em:


http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Divulga%C3%A
debalan%C3%A7oestat%C3%ADsticoencerra oanonasse%C3%A7%C3%B5esdotribunal. Acesso em
3012017. Esses dados não consideram os processos sobrestados.
378 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.

321.
379 Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/pesquisasjudiciarias/pesquisa_100_maiores_liti
gantes.pdf. Acesso em 3012017.
380 O avanço da centralização política no Império, entre 1822 e 1850, ano da edição do Código
Comercial, teria provocado “o deslocamento da atividade dos juristas para o campo do direito
privado, principalmente, o Direito Comercial e o Direito Civil de Família e Sucessões” (GEDIEL, José
Antonio Peres. Teixeira de Freitas: Um civilista do Império do Brasil. In. FONSECA, Ricardo Marcelo;
SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Orgs.). História do Direito em perspectiva: Do Antigo Regime à
Modernidade. 1. ed., 4. reimpr. Curitiba: Juruá, 2012. p. 355).
381 BASTOS, Aurélio Wander. O ensino jurídico no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 45.
382 Resolução CNE/CES 5/2018, DOU de 18 de dezembro de 2018, Seção 1, p. 122, republicada no DOU
de 19 de dezembro de 2018, Seção 1, p. 4748.
383 Para uma visão das principais teorias sobre a aquisição de personalidade no quadro das pessoas

naturais: CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu. Tutela civil do nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000. p.
135160. Essa autora, como se sabe, filiase à tese concepcionista (Tutela civil do nascituro...p. 161:
“Colocamonos entre os adeptos da doutrina verdadeiramente concepcionista, isto é, aquela que
considera o início da personalidade desde a concepção”).
384 “O direito ao nome não é o mesmo que o direito de dar um nome. O primeiro é próprio do indi víduo;

o segundo, dos pais (...).” O indivíduo “tem o direito de receber e possuir um nome; mas a escolha do
nome é algo que, em princípio, não lhe cabe, mas aos seus descendentes. Tanto é assim que somente
nos casos autorizados em lei o sujeito pode alterar seu nome. A escolha dos pais, em princípio, é
definitiva e insusceptível de mudança. A rigor, cuidase não somente de um direito, mas também de
um dever. Temse, na verdade, um poderdever dos pais quanto à escolha do nome do filho”
(MONTEIRO, Arthur Maximus. Direito ao nome da pessoa natural no ordena mento jurídico brasileiro.
In. MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JR., Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (Orgs.). Direitos da
personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 359396).
385 “O parágrafo traz inovação digna de aplausos, reconhecendo legitimação a terceiros para a defesa

dos direitos da personalidade do morto. O brocardo jurídico mors omnia solvit não se aplica aos
direitos da personalidade que se estendem desde a concepção e para além da vida da pessoa na-
tural” (CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu. Comentários ao art. 12. In. COSTA MACHADO, Antonio
Cláudio da (Org.); CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu (Coord.). Código Civil Interpretado. 8. ed.
Barueri: Manole, 2015. p. 3940); RIBEIRO, Ney Rodrigo Lima. Direito à proteção de pessoas fale cidas.
Enfoque lusobrasileiro. In. MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JR., Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato
(Orgs.). Direitos da personalidade...p. 424462.
386 ANCONA LOPEZ, Teresa. Comentários ao art. 607. In. ANCONA LOPEZ, Teresa. Comentários ao Código
Civil: Parte Especial: Das várias espécies de contratos: da Locação de Coisas; do Empréstimo; da
Prestação de Serviço; da Empreitada; do Depósito. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p. 232237.
387 WALD, Arnoldo. Comentários ao art. 1.028. In. WALD, Arnoldo. Comentários ao novo Código Civil: Livro

II – Do Direito de Empresa (arts. 966 a 1.195). Rio de Janeiro: Forense, 2005. v. XIV. p. 222 225.
388 “Considerase aberta a sucessão no instante mesmo ou no instante presumido da morte de al guém,
fazendo nascer o direito hereditário e operando a substituição do falecido por seus suces sores a
título universal nas relações jurídicas em que aquele figurava. Não se confundem, todavia. A morte é
antecedente lógico, é pressuposto, é causa. A transmissão é consequente, é efeito da morte”
(HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Comentários ao art. 1.784. In. HIRONAKA, Giselda Maria
Fernandes Novaes. Comentários ao Código Civil: Do Direito das Sucessões. São Paulo: Saraiva, 2003. v.
20. p. 21).
389 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht...p.

319.
390 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB e da doutrina alemã no Direito Civil brasileiro do

século XX...p. 62.


391 ZIMMERMANN, Reinhard. The New German Law of Obligations...p. 21.
392 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB e da doutrina alemã no Direito Civil brasileiro do
século XX...p. 58 ss.
393 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht...p.
319.
394 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht...p.

320.
395 Sobre associações, cf. a obra de referência sobre o tema em língua portuguesa: LEONARDO, Rodrigo
Xavier. Associações sem fins econômicos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
396
“Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: (...) IV as organizações religiosas. § 1o São livres a
criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo
vedado ao poder público negarlhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários
ao seu funcionamento (...).
397 Para uma interessante discussão sobre a natureza jurídica das associações religiosas: CHAVES,
Antonio. Associações religiosas: natureza jurídica. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, v. 76, p. 6374, 1981.
398 Sobre o processo de mutação social provocado na modernidade, com a dissolução dos “contornos

da sociedade industrial”: BECK, Ulrich. Risikogesellschaft: Auf dem Weg in eine andere Moderne.
Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1986. p. 14.
399 No original, ungleiche Konsumstile, cf. BECK, Ulrich. Risikogesellschaft...p. 125.
400 No Livro do Apocalipse VI, 2, o apóstolo S. João, em sua terceira visão profética, revelou quatro
cavaleiros, que traziam consigo a peste, a guerra, a fome e a morte. A chegada dos cavaleiros é o
prenuncio da grande tribulação, que terminaria com a batalha do Armagedom. A metáfora aqui
utilizada relacionase à percepção que milhares de pessoas tiveram, durante a Primeira Guerra
Mundial, de que o conflito seria uma comprovação da profecia apocalíptica. O sofrimento das po-
pulações europeias no período de 19141918 foi agravado pela fome, guerra, morte e pela peste (a
gripe espanhola, que ceifou milhões de vidas).
401 NAM, KiYeon. Persönlichkeitsrechtsschutz in Ungleichgewichtslagen – am Beispiel des Sports. Frankfurt
am Main; Berlin; Bern; Wien: Lang, 2007. passim.
402 CARRÁ, Bruno Leonardo Câmara. Responsabilidade civil sem dano: Uma análise crítica. Limites
epistêmicos a uma responsabilidade civil preventiva ou por simples conduta. São Paulo: Atlas, 2015.
p. 1718.
403 MALUF, Carlos Alberto Dabus. Limitações ao direito de propriedade: De acordo com o Código Civil de
2002 e com o Estatuto da Cidade. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 108 ss.
404 Nesse sentido: “(...) a despeito do silêncio doutrinário a respeito do assunto, foramse elaborando, no
âmbito dos tipos taxativamente previstos pelo legislador, negócios jurídicos que provocam profunda
evolução dos direitos reais, passandose ao largo da discussão acerca da vigência do princípio do
numerus clausus. Não se pode negar, nesta direção, que as servidões prediais e as grandes
incorporações imobiliárias constituíramse de tipos abertos, cujo conteúdo foi sendo fixado, não sem
ousadia, pelo operador econômico, delineandose um quadro riquíssimo de servidões rurais,
condomínios com di mensões fabulosas, empreendimentos de shoppings centers,
multipropriedades imobiliárias e condo mínios de fato, utilização de espaços em cemitérios, tudo isso
sem que houvesse previsão legal especí fica” (TEPEDINO, Gustavo. Teoria dos bens e situações
subjetivas reais. In. TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. t. II, p.
143). O STJ acolheu a tese de Gustavo Tepedino ao conceder natureza de direito real à
multipropriedade imobiliária, ainda que nascida da autonomia da vontade (STJ. REsp 1546165/SP, rel.
Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, rel. para o acórdão Min. João Otávio de Noronha, Terceira Turma, j.
26/04/2016, DJe 06/09/2016). Registrando a preocupação com os efeitos dos contratos de time-
sharing sobre o direito dos consumidores: MARQUES, Claudia Lima. Contratos de “timesharing” e a
proteção dos consumidores: Crítica ao Direito Civil em tempos pós modernos. Revista de Direito do
Consumidor, no 22, p. 6486, abr./jun. 1997.
405 GRIMALDI,Michel. Problèmes actuels des sûretés réelles Rapport Français. AA.VV. Les garanties de
financement: Travaux de l’Association Henri Capitant – Journées Portugaises. Paris: LGDJ, 1998.
t.XLVII, p. 155; GRIMALDI, Michel. Projet de réforme du droit des sûretés. Revue des Contrats, no 3,
2005, p. 782. Em língua portuguesa, cf. o abrangente estudo sobre esse novo tratamento
epistemológico do “Direito das Garantias” em: SILVA, Fábio Rocha Pinto e. Sistema de garantias no
Direito brasileiro: Análise sistemática das garantias positivadas e uma proposta para sua reforma. Tese
de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, 2016.
406 PINHEIRO, Jorge Alberto Caras Altas Duarte. O núcleo intangível da comunhão conjugal: Os deve res

conjugais sexuais. Coimbra: Almedina, 2004. p. 509 e ss.


407 BODIN DE MORAES, Maria Celina. A responsabilidade civil e a reparação civil no Direito de Família. In.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Tratado de direito das famílias. Belo Horizonte: IBDFAM, 2015. p.
805831. cit. p. 819825 (com indicação jurisprudencial); MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 6.
ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 376386, confronta a “doutrina amplamente
permissiva”, a “doutrina restritiva” e a “doutrina contrária” ao dano mo ral no Direito de Família;
GOMIDE, Alexandre Junqueira. Abandono afetivo. In. LAGRASTA NETO, Caetano; SIMÃO, José
Fernando (Coords.). Dicionário de Direito de Família. São Paulo: Atlas, 2015. v. 1 (AH). p. 2731
(concluindo que “a violação do dever de cuidar, educar e dar afeto ao seu próprio filho pode ser
considerada conduta que viola direitos da personalidade da criança e do adolescente, de modo a
ensejar a reparação pelo dano moral”, cit. p. 30).
408 TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Reparação civil na separação e no divórcio. São Paulo: Saraiva,

1999. p. 153 ss.


409 Aholding familiar tem como marca característica “o fato de se encartar no âmbito de determinada
família e, assim, servir ao planejamento desenvolvido por seus membros (...)”. Ela seria uma “con-
textualização específica”, e não “um tipo específico”, podendo constituirse em uma “holding pura ou
mista, de administração, de organização ou patrimonial (...)” (MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduar da
Cotta. Holding familiar e suas vantagens...p. 5). Em qualquer hipótese, é uma forma eloquente de
inserção de conteúdos preponderantemente econômicos no universo das relações familiares.
410 Sobre a relevância do Direito das Sucessões no século XXI, especialmente com notas comparativas
entre o sistema brasileiro e o alemão: “(...) o Direito das Sucessões se transforma em uma matéria
tremendamente interessante, mas que, infelizmente, é pouco pesquisada. Além disso, é claro, o
assunto é de grande importância prática, particularmente em um país como a Alemanha onde os
membros da geração que está prestes a falecer construíram suas fortunas nos tempos de paz após a
Segunda Guerra Mundial. Ao mesmo tempo, as pessoas tentam instituir “trusts” [patrimônios
fideicomissários] e utilizar outros artifícios (falase, inclusive, em “substitutos testamentários”) para
transmitir seu patrimônio às gerações mais novas, o que também dá margem a questões muito in-
teressantes” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sergio. Entrevista com Reinhard Zimmermann e
Jan Peter Schmidt...p. 345346, trecho citado da p. 345).
411 Para os fundamentos da prescrição e decadência: SIMÃO, José Fernando. Prescrição e decadência:

início dos prazos. São Paulo: Atlas, 2013. p. 135155.


412 “Inaplicabilidade à hipótese da prescrição constante do Código Civil porque a relação de direito ma-
terial que deu origem ao crédito em cobrança foi uma relação de Direito Público, em que o Estado,
com o seu jus imperii, impôs multa ao administrado. O prazo prescricional para a cobrança da multa,
crédito de natureza administrativa, deve ser fixado em cinco anos, não podendo a União, o Estado ou
o Município gozar de tratamento diferenciado em relação ao administrado, porquanto não se
verifica, nesse entendimento, risco de prejuízo ao interesse público (STJ. AgRg no Ag 1045273/RS, rel.
Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, j. 18/11/2008, DJe 15/12/2008).
413 SOARES DE FARIA, S. Esfera da aplicação do Decreto 20.910 de 6 de janeiro de 1932. Revista da

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 39, p. 231239, 1944. p. 232.


414 “A prescrição civil pode ser renunciada, após sua consumação, visto que ela apenas extingue a
pretensão para o exercício do direito de ação, nos termos dos arts. 189 e 191 do Código Civil de 2002,
diferentemente do que ocorre na prescrição tributária, a qual, em razão do comando normativo do
art. 156, V, do CTN, extingue o próprio crédito tributário, e não apenas a pretensão para a busca de
tutela jurisdicional” (STJ. REsp 1210340/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j.
26/10/2010, DJe 10/11/2010).
415 ZIMMERMANN, Reinhard. Direito Romano e cultura jurídica europeia. Tradução de Otavio Luiz

Rodrigues Jr. e Marcela Paes de Andrade Lopes de Oliveira. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v.
7, p. 243278, abr./jun. 2016. p. 271276.
416 Omais perfeito exemplo desse recuo acabou, de certo modo, assumido pelo próprio Natalino Irti,
autor do clássico estudo L’età della decodificazione, de 1979, aqui utilizado com esta referência: IRTI,
Natalino. L’età della decodificazione. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 3, no
10, p. 1533, out./dez. 1979. Em 1999, em uma quarta edição desse livro, Irti afirma que não se dedicou
a uma defesa da supressão das codificações, mas à descrição de uma realidade existente à época, e
que já não mais se verificava no contexto dos anos 1990. Aqui utilizada com esta referência: IRTI,
Natalino. L’età della decodificazione. 4. ed. Milano: Giuffrè, 1999. p. 9 ss.
417 O movimento antirrecodificação foi intenso e liderado, na época, por expressivos nomes do Direito

Civil Brasileiro: “Na contramão dessas mudanças, inaugurase um novo diploma legislativo, o qual não
guarda nem atende aos anseios sociais desse sujeito concreto da contemporaneidade” (FACHIN, Luiz
Edson. Sujeito, poder e Direito na contemporânea principiologia axiológica civil constitucional. In.
TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito e poder: nas instituições e nos valores do público e do
privado contemporâneos: Estudos em homenagem a Nelson Saldanha. Barueri: Manole, 2005. p. 609-
632, cit. p. 612); JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Insuficiências, defi ciências e desatualização do
projeto de Código Civil na questão da boafé objetiva nos contratos... cit.; TEPEDINO, Gustavo. Código
Civil, os chamados microssistemas e a Constituição: Premissas para uma reforma legislativa. Revista
da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, no 6/7, p. 1325, 1998/1999.
418 Há 29 anos, também se dizia que “o processo de codificação do direito privado, ora sob a forma
concentrada, ora sob a de grandes cortes setoriais, não se interrompeu”. Como exemplos cita vamse
como “suas mais recentes manifestações” os códigos civis de Portugal (1966), Alemanha Oriental
(1975), Bolívia (1975), Peru (1984), Paraguai (1985), República Popular da China (1986), Etiópia (1960),
Sudão (1971), Somália (1973) e Argélia (1975), além do código de obrigações da Iugoslávia, de 1978
(VILLELA, João Baptista. Introdução. In. NONATO, Orosimbo; GUIMARÃES, Hahnemann; AZEVEDO,
Philadelpho. Anteprojeto de Código de Obrigações. Introdução, organiza ção e notas de João
Baptista Villela. Arquivos do Ministério da Justiça, v. 41, no 174, p. 7150, out./ dez. 1988. p. 10). Em
sentido idêntico: AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução...p. 204.
419 Nesse sentido: “Mas, respeitando a história, podemos dizer que a hora é atualmente a da re-

codificação” (ASCENSÃO, J. Oliveira. Concorrência de fontes, “diálogo das fontes” e unidade da


ordem jurídica. In. BARROS E SILVA NETO, Francisco Antônio de; KOEHLER, Frederico Augusto
Leopoldino; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ALBUQUERQUE JÚNIOR, Roberto Paulino de; COSTA
FILHO, Venceslau Tavares (Coords.). Relações e influências recíprocas entre direito material e direito
processual: Estudos em Homenagem ao Professor Torquato Castro. Salvador: JusPodivm, 2016. p.
414). Para uma análise dos principais movimentos de codificação e recodificação no Direito
Comparado, incluindo uma observação das modificações mais recentes: DELGADO, Mário Luiz.
Codificação, descodificação e recodificação do Direito Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 76135.
Especificamente sobre a recodificação, p. 259 ss; MORAES, Bernardo B. Queiroz de. Parte Geral: Código
Civil...cit. p. 137143 (com enfoque na influência do BGB e na ideia de que permaneceu operacional a
inserção da Parte Geral na estrutura dos códigos dos séculos XX e XXI).
420 “A verdade, porém, é que o ideal codificador se mantém vivo na família jurídico romanogermânica.
Revelao o surgimento em diversos países, na última década e meia, de novas codificações civis (...), e
também a circunstância de vários países dotados de codificações mais antigas terem procurado
ultimamente recodificar o Direito Civil, incorporando nos códigos parte da legislação avulsa entre-
tanto publicada” (VICENTE, Dário Moura. Direito comparado: Introdução, sistemas jurídicos em geral.
4. ed., rev. e atual. (edição brasileira). São Paulo: Almedina, 2018. v. 1. p. 137138).
421 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português... v. 1, t. 1. p. 4546.
422 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português... v. 1, t. 1. p. 45.
423 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português... v. 1, t. 1. p. 45.
424 Para uma visão ampla sobre as transformações no regime de proteção de dados pessoais desde os
anos 1970: DONEDA, Danilo. Princípios de proteção de dados pessoais. In. DE LUCCA, Newton; SIMÃO
FILHO, Adalberto; LIMA, Cíntia Rosa Pereira de (Coords.). Direito & Internet III: Marco Civil da Internet
(Lei nº 12.965/2014). São Paulo: Quartier Latin, 2015. t. I. p. 369384.
425 Internet das coisas (em inglês, Internet of Things - IoT) é um modelo tecnológico que integra o mundo

físico e o ambiente virtual: aparelhos variados podem ser conectados à Internet, o que viabiliza seu
acesso remoto e controle através de dispositivos ligados à rede. Esse mecanismo permite maior
planejamento, segurança e precisão na utilização dos bens, o que se dá através da acumulação
inteligente de informações sobre eles. Prevêse um impacto positivo não apenas na vida doméstica,
mas também em setores estratégicos, a exemplo da agropecuária, da saúde e da educação. Cf.
GUBBI, Jayavardhana et al. Internet of Things (IoT): A vision, architectural ele ments and future
directions. Future Generation Computer Systems, v. 29, p. 16451660, 2013. esp. p. 16451646 (onde se
destaca que o novo “modelo” gerará uma quantidade imensa de dados, que precisarão ser
armazenados e processados de forma fácil e eficiente).
426 Era dos dados é um termo bastante amplo que pode, contudo, ser usado para descrever o mo mento

de expansão quase incalculável do volume de informações da atualidade, após a revolução


tecnológica dos anos 19902000. Algumas expressões próximas ganham espaço, como Big Data,
aplicada a bancos de dados digitais onde o volume de informação supera mesmo as capacidades dos
dispositivos de absorvêlas, gerando, então, o típico desafio da “nova era”: criar mecanis mos de
organização e processamento inteligente desses dados (cf. MAYERSCHÖNBERGER, Viktor; CUKIER,
Kenneth. Big data: A revolution that will transform how we live, work, and think. Boston New York: An
Eamon DolanHoughton Mifflin Harcourt, 2013. esp. p. 150184).
427 Sobre a “ampliação do campo temático do Direito Civil” como consequência das novas tecnolo gias:

AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução...p. 205.


428 GEDIEL, José Antonio Peres; CORRÊA, Adriana Espíndola. Proteção jurídica de dados pessoais: a
intimidade sitiada entre o Estado e o mercado. Revista da Faculdade de Direito - UFPR, Curitiba, no 7, p.
141153, 2008. p. 142.
429 “(...) Com o desenvolvimento tecnológico, a complexidade das relações sociais exigiu uma nova

concepção de intimidade e de qual tutela lhe deve ser atribuída. O tratamento jurídico pressupõe a
inevitabilidade do aumento do fluxo de dados pessoais em razão da interação global promovida
pelas tecnologias da telecomunicação e da informática. De um lado, relativizase a intimidade,
ampliandose a possibilidade de acesso a dados e informações de natureza pessoal; de outro, buscase
fortalecer a proteção da pessoa inserindo nos poderes do titular desse direito de perso nalidade o
controle não só sobre o acesso, mas também no que se refere ao seu tratamento, à sua utilização e à
sua circulação” (GEDIEL, José Antonio Peres; CORRÊA, Adriana Espíndola. Proteção jurídica de dados
pessoais: a intimidade sitiada entre o Estado e o mercado...p. 143).
430 Normas extravagantes sobre proteção de dados já se encontram em vigor em alguns países ou
ordenamentos comunitários: a) Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho,
de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento
de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/ CE (Regulamento
Geral sobre a Proteção de Dados); b) Lei nº 19.628, de 28 de agosto de 1999, sobre a proteção de
dados de caráter pessoal (Chile); c) Lei nº 67/98, de 26 de outubro de 1998, Lei de Proteção de Dados
Pessoais (Portugal); d) Lei nº 25.326, de 4 de outubro de 2000, que dispõe sobre os princípios gerais
relativos à proteção de dados (Argentina).
431 Para Danilo Doneda (Princípios de proteção de dados pessoais...p. 379), durante muito tempo, no

Brasil, o CDC constituiu “a única norma que tratou da proteção de dados de forma mais específica
(exceção feita à norma que regulamenta a ação de habeas data que, no entanto, no Brasil jamais
evoluiu no sentido de proporcionar um patamar geral de proteção aos dados pessoais”. A referên cia
é aos arts. 43 e 44 do CDC.
432 Pela insuficiência do CC/2002 ou do CDC, na ausência de uma lei de proteção de dados pessoais
específica: VERONESE, Alexandre; MELO, Noemy. O projeto de lei nº 5.276/2016 em contraste com o
novo regulamento europeu (2016/679 EU). Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 12, jul./ago., p.
7179, 2017. Pela suficiência do CDC e do MCI, até que se aprove uma lei de proteção de dados
pessoais: MENDES, Laura Schertel. A tutela da privacidade do consumidor na Internet: uma análise à
luz do Marco Civil da Internet e do Código de Defesa do Consumidor. In. DE LUCCA, Newton; SIMÃO
FILHO, Adalberto; LIMA, Cíntia Rosa Pereira de (Coords.). Direito & Internet III: Marco Civil da Internet
(Lei nº 12.965/2014). São Paulo: Quartier Latin, 2015. t. I. p. 471501.
433 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.

328.
434 BYDLINSKI,Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p.
329.
435 WOLFF, Hans J.; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Verwaltungsrecht...cit. § 22, II, 1, b.
436 “A responsabilidade criminal do servidor é apurada mediante processo penal, nos respecti vos juízos.

É possível que a mesma conduta configure infração administrativa, acarrete dano à Administração e
seja tipificada como crime. Neste caso, o servidor arcará com as consequências da responsabilidade
administrativa, civil e criminal, pois as três têm fundamento e natureza di versos. O mesmo se aplica
na ocorrência de duas modalidades de infração” (MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo
moderno...p. 345346).
437 Para uma análise da conversão do negócio jurídico no direito intermédio, cf. DEL NERO, João Alberto

Schützer. Conversão substancial do negócio jurídico. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 175187.
438 Problemas de qualificação referemse aqui não ao “momento da nomogênese jurídica”, no qual se
“observa a experiência jurídica da perspectiva genética, como complexo de fatos e avaliações que
culminam no estabelecimento de uma certa norma jurídica”. Esse ato de qualificação jurídica
“antecede a norma jurídica e nela se objetiva, constituindo objeto de estudo próprio da filosofia do
direito, da política do direito e da teoria geral do direito”. O sentido utilizado ao se aludir aos
“problemas de qualificação” diz com “o momento da aplicação dos modelos normativos”, o que se
constitui em “objeto de estudo próprio da dogmática jurídica ou teoria dogmática do direito, a que o
momento monogenético, embora não constitua aspecto típico de exame, não é estra nho, dada sua
relevância para a atividade de interpretação” (DEL NERO, João Alberto Schützer. Conversão
substancial do negócio jurídico...p. 1213.
439 Sobre o Direito Regulatório e seus vínculos com outras áreas do Direito: WALD, Arnoldo. O Direito da

Regulação, os contratos de longo prazo e o equilíbrio econômico financeiro. Revista dos Tribunais,
São Paulo, v. 96, no 866, p. 1123, dez. 2007. p. 1215.
440 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Negócio jurídico: existência, validade e eficácia. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 16 (para a análise do negócio jurídico como categoria – “fato jurídico abstrato” – e
como fato – “fato jurídico concreto”, ou seja, “todo fato jurídico consistente em de claração de
vontade, a que o ordenamento jurídico atribui os efeitos designados como queridos, respeitados os
pressupostos de existência, validade e eficácia impostos pela norma jurídica que sobre ele incide”).
441 “O vendedor, ainda depois da entrega, fica responsável pelos vícios e defeitos ocultos da coisa ven-

dida, que o comprador não podia descobrir antes de a receber, sendo tais que a tornem imprópria ao
uso a que era destinada, ou que de tal sorte diminuam o seu valor, que o comprador, se os
conhecera, ou a não comprara, ou teria dado por ela muito menor preço” (art. 210, CCom/1850);
“Tem principalmente aplicação a disposição do artigo precedente quando os gêneros se entregam
em fardos ou debaixo de coberta que impeçam o seu exame e reconhecimento, se o comprador,
dentro de 10 (dez) dias imediatamente seguintes ao do recebimento, reclamar do vendedor falta na
quantidade, ou defeito na qualidade; devendo provarse no primeiro caso que as extremidades das
peças estavam intactas, e no segundo que os vícios ou defeitos não podiam acontecer, por caso
fortuito, em seu poder. Essa reclamação não tem lugar quando o vendedor exige do comprador que
examine os gêneros antes de os receber, nem depois de pago o preço” (art. 211, CCom/1850).
442
Art. 178, § 2o, CC/1916 (prazo de quinze dias, conquanto fosse considerado de natureza pres-
cricional), correspondente de modo parcial ao art. 445, CC/202 (prazo de 30 dias, se a coisa for móvel,
e de um ano, se for imóvel, considerado como decadencial. Há variações sobre o início da contagem
do prazo).
443 “O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: I trinta dias,

tratandose de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis; II noventa dias, tratandose de


fornecimento de serviço e de produtos duráveis” (art. 26, CDC).
444 “A aquisição de bens ou a utilização de serviços, por pessoa natural ou jurídica, com o escopo de
implementar ou incrementar a sua atividade negocial, não se reputa como relação de consumo e,
sim, como uma atividade de consumo intermediária. Recurso especial conhecido e provido para
reconhecer a incompetência absoluta da Vara Especializada de Defesa do Consumidor, para decretar
a nulidade dos atos praticados e, por conseguinte, para determinar a remessa do feito a uma das
Varas Cíveis da Comarca” (STJ. REsp 541867/BA, 2ª Seção, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, rel. p/
acórdão Min. Barros Monteiro, j. 10.11.2004, DJ 16.05.2005. p. 227).
445 FERREIRA, Antonio Carlos. Revisão judicial dos contratos: Diálogo entre a doutrina e a jurisprudên cia

do Superior Tribunal de Justiça. Revista de Direito Civil Contemporâneo. v. 1, ano 1, p. 2739, out./dez.
2014. p. 3637. No mesmo sentido: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Um “modelo de revisão contratual por
etapas”... cit., p. 476.
446 “É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa” (Súmula STJ 356).
447 STJ. REsp 911.802/RS, rel. Min. José Delgado, Primeira Seção, j. 24/10/2007, DJe 01/09/2008.
448 Trecho da ementa do REsp 911.802/RS, rel. Min. José Delgado, Primeira Seção, j. 24/10/2007, DJe
01/09/2008.
449 Trecho do votovogal do min. Humberto Martins no REsp 911.802/RS, rel. Min. José Delgado, Primeira

Seção, j. 24/10/2007, DJe 01/09/2008.


450 “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras” (Súmula STJ 297).
451 São exemplos desses espaços reservados ao Direito Regulatório: a) “Nos contratos bancários pos-
teriores ao início da vigência da ResoluçãoCMN no 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a
tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira” (Súmula
STJ 566); b) “A pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou
outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores
ao início da vigência da ResoluçãoCMN no 3.518/2007, em 30/4/2008” (Súmula STJ 565); c) “É
permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos ce lebrados com
instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP no 1.96317/2000,
reeditada como MP no 2.17036/2001), desde que expressamente pactuada” (Súmula STJ 539); d) “Os
juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de
inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao
percentual contratado” (Súmula STJ 296); e) “A Taxa Referencial (TR) é inde xador válido para
contratos posteriores à Lei no 8.177/91, desde que pactuada” (Súmula STJ 295); f) “Não é potestativa a
cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado
apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato” (Súmula STJ 294).
452 Sobre esse conceito, vejase: ASCENSÃO, J. Oliveira. Concorrência de fontes, “diálogo das fontes” e
unidade da ordem jurídica. In. BARROS E SILVA NETO, Francisco Antônio de; KOEHLER, Frederico
Augusto Leopoldino; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ALBUQUERQUE JÚNIOR, Roberto Paulino de;
COSTA FILHO, Venceslau Tavares (Coords.). Relações e influências recíprocas entre direito material e
direito processual...p. 409.
453 No sentido próprio da doutrina de Antístenes de Atenas (444365 a.C.) e de Diógenes de Sinope (400-

325 a.C.), de ser impossível a conciliação das normas e convenções sociais com a realidade da vida
virtuosa. O cinismo estaria assim na descrença de que as teorias possam se amoldar aos fenômenos
jurídicos em sua exteriorização no mundo real.
454 MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português...v. 1, t. 1. p. 52.
455 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Negócio jurídico: existência, validade e eficácia...p. 414; MARINO,
Francisco Paulo de Crescenzo. Interpretação do negócio jurídico. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 2129.
456 Com referência a essa crise do negócio jurídico: “(...) há décadas que se fala em crise: crise do negócio

jurídico, crise do contrato, crise do direito contratual, declínio do contrato ou da liberdade contratual,
desagregação da doutrina do contrato, corrupção do pensamento contratual, aporia da autonomia
privada ou tão somente crise da concepção liberal do contrato (...)” (FERREIRA DE ALMEIDA, Carlos.
Texto e enunciado na teoria do negócio jurídico. Coimbra: Almedina, 1992, p. 11).
457 ALPA, Guido. Diritto Privato e Diritto Pubblico. Un questione aperta...p. 109110.
458 WOLFF, Hans J.; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Verwaltungsrecht...§ 22, item 3.
459 Por uma questão de honestidade intelectual é importante dizer que a tese de Kelsen sobre a “grande

dicotomia” evoluiu ao longo de seus trabalhos de 1911, 1922, 1924, 1934, 1945 e 1960. O fato de ele
ter voltado tantas vezes ao tema é revelador de sua importância e de sua permanência como uma
pauta central da Teoria do Direito desde o início do século XX até os dias de hoje. Ele passa da tese da
impossibilidade de se elaborar um critério satisfatório para a distinção ao pos terior reconhecimento
de que haveria duas teorias prevalentes: a teoria do interesse e a teoria da vontade. Sua posição final
é a de que a distinção Direito PúblicoDireito Privado não tem valor teórico, mas apenas valor prático
(PUPOLIZIO, Ivan. Materiali per uno studio sociologico della distinzione tra Diritto Pubblico e Diritto
Privato. Sociologia del Diritto. v. XXXIX, no 2, p. 735, 2012. p. 1213).
460 Em alemão, alles Recht ist Staatsrecht. Cf. KELSEN, Hans. Hauptprobleme der Staatsrechtslehre... p. X;
DIAS, Gabriel Nogueira. O positivismo jurídico e a Teoria Geral do Direito...p. 133, nota de rodapé 8.
461 RANELLETTI, Oreste. Il concetto di ‘pubblico’ nel diritto...p. 337 ss.
462 MELO FRANCO, Afonso Arinos de. Curso de Direito Constitucional brasileiro. 3. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2019. item 21 (embora o autor reconheça a importância prática da distinção sistemática e
que ela se expressa também no plano da formação e da atuação profissional no Direito).
463 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...cit. p. 39.
464 FORSTHOFF, Ernst. Der Staat der Industriegesellschaft: Dargestellt am Beispiel der Bundesrepublik
Deutschland. 2. ed. inalterada. München: Beck, 1971. p. 143144.
465 MEDEIROS, Jarbas. Ideologia autoritária no Brasil: 19301945. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas,
1978. p. 30.
466 MOLITOR, Erich. Über Öffentliches Recht und Privatrecht. Eine rechtssystematische Studie. Karlsruhe: C.

F. Müller, 1949. p. 18.


467 BARCELLONA, Pietro. Diritto Privato e società moderna. Colaboração de Carmelita Camardi. Napoli:
Jovene, 1996. p. 129.
468 LA TORRE, Massimo. La lucha contra el derecho subjetivo: Karl Larenz y la teoría nacionalsocialista del

Derecho. Tradução de Cristina García Pascual. Madrid: Dykinson, 2008. p. 259267, cit. esp. p. 259.
469 LA TORRE, Massimo. La lucha contra el derecho subjetivo: Karl Larenz y la teoría nacionalsocialista del
Derecho...p. 260.
470 LA TORRE, Massimo. La lucha contra el derecho subjetivo: Karl Larenz y la teoría nacionalsocialista del

Derecho...p. 260.
471 LA TORRE, Massimo. La lucha contra el derecho subjetivo:Karl Larenz y la teoría nacionalso cialista del
Derecho...p. 275277, citando Larenz em: LARENZ, Karl. Die Rechtsordnung als völ kische
Lebensordnung. In. AAVV. Tag des deutschen Rechts, 1939. 6. Reichstagung d. Nat.soz.
Nationalsozialistischer Rechtswahrerbund. Berlin: Deutscher Rechtsverlag, 1939. p. 557574.
472 MAGGIORE, Giuseppe. L’aspetto pubblico e privato del Diritto e la crisi dello Stato moderno...cit. p.

141.
473
Lei no 9.637, de 15 de maio de 1998. Essas organizações celebram os chamados contratos de gestão
com a Administração, com vistas ao estabelecimento de parcerias para a consecução de atividades
variadas (ensino, pesquisa, cultura, saúde, desenvolvimento tecnológico etc.), de modo que “o poder
público deixará de ser executor direto de atividades ou serviços naquelas áreas, para ser
incentivador, fornecedor de recursos e fiscal da execução” (MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo
moderno...p. 115).
474
Lei no 9.790, de 23 de março de 1999.
475 LEONARDO, Rodrigo Xavier. Associações sem fins econômicos...p. 280.
476 IRTI, Natalino. L'età della decodificazione. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial,
1979...p. 2627.
477 LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do Direito Privado. Tradução de Vera Maria Jacob de Fradera.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 34.
478 GOMES, Orlando. A caminho dos microsistemas. In. GOMES, Orlando. Novos temas de Direito Civil. Rio
de Janeiro: Forense, 1983. p. 4150.
479 BYDLINSKI, Franz. System und Prinzipien des Privatrechts...p. 426429.
480 FILOMENO, José Geraldo Brito. Dos direitos do consumidor. In. GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN,
Antônio Herman de Vasconcellos e; et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado
pelos autores do anteprojeto. 11. ed., rev., atual. e reform. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 11.
481 Há fórmulas mais brandas, as quais, no entanto, não negam a natureza privatística do Direito de
Família. Uma delas é a que reconhece a analogia de natureza e de estrutura da relação jurídica de
Direito de Família com a relação jurídica de Direito Público. Em defesa dessa analogia: ALIMENA,
Francesco. Osservazioni sulla distinzione del Diritto in pubblico e privato...p. 18 e 27.
482 MORAES, Bernardo B. Queiroz de. Código Civil e Direito de Família: (In)conveniência de um mi-

crossistema. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 4, p. 211238, jul./set. 2015.


483 Na CI/1824, o art. 47, inciso I, definia como competência privativa do Senado o conhecimento dos

“delitos individuais” cometidos por membros da Família Imperial, além de outros dignitários do
Estado. No Título 5º da CI/1824 (“Do Imperador”) havia um Capítulo III, intitulado “Da Familia Imperial,
e sua Dotação” (arts. 105 a 115). Na Constituição Espanhola de 1978, o Título II (“De la Corona”)
contém diversos artigos sobre a família real, como os de números 57, 58, 60 e 65.
484 GARCEZ, Martinho. Do Direito de Família segundo o projecto de Código Civil Brazileiro. Rio de Janeiro:
Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1914. p. 1011.
485 Embora a última comissão governamental do Império para o Código Civil, constituída em 1º de julho

de 1889, tenha deliberado e atingido o consenso para incluir em seu projeto o “casamento ci vil; o
homestead; o sistema Torrens; a livre disposição testamentária; a personalidade, o estado, a
capacidade civil e os direitos de família; a lei de personalidade segundo as sucessões legítima e
testamentária; a preferência dos cônjuges aos colaterais na ordem da sucessão legítima; o divórcio
no caso de adultério” (LOBO, Abelardo Saraiva da Cunha. Curso de Direito Romano: História; sujeito e
objecto do direito; instituições jurídicas...p. 609). Essa comissão era composta pelo ministro da
Justiça, Conselheiro Cândido de Oliveira, além de Olegário H. de Aquino e Castro, Afonso A. Moreira
Pena, Antônio Coelho Rodrigues, José da Silva Costa, M. P. de Souza Dantas e Barão de Sobral. O
imperador D. Pedro II participou de todas as sessões e foi seu presidente de facto (MEIRA, Silvio A. B.
Pedro II e as grandes codificações imperiais: um novo Justiniano. Revista de Direito Civil, Imobiliário,
Agrário e Empresarial, v. 1, no 1, p. 211226, jul./set. 1977. p. 222).
486 “Eis a que extremos cahiu a secularisação do matrimônio. Para ser um casamento a contento, apenas

faltalhe o prazo. Um passo mais, e entraremos no regimen das uniões livres. E nem pre cisaria tanto,
com as facilidades que o Projecto offerece, para que dentro de curto período mu lheres, remodelados
os tempos de Seneca, non consulum numero sed maritorum, annos suos computent. Nesta relação,
bem poderíamos accommodar um trecho das observações do sr. dr. Clovis Beviláqua ao Projecto do
Código Civil: o erro essencial no art. 223, é mais um ‘expediente que, sobre as ruinas de uma familia,
ergue a possibilidade de outras ruinas, formando uma triste cadeia de matrimônios ephemeros, na
qual se vae a dignidade ensombrando, a noção do dever apagando e a organisação da familia
dissolvendo’” (MACHADO, Brasílio. A instabilidade da família, mercê do Projeto do Código Civil
brasileiro. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, v. 9, p. 143169, 1901. p. 169).
487 “O reconhecimento dos filhos naturais será isento de quaisquer selos ou emolumentos, e a heran ça,

que lhes caiba, ficará sujeita, a impostos iguais aos que recaiam sobre a dos filhos legítimos” (art. 147,
CF/1934).
488 “A família é constituída pelo casamento de vínculo indissolúvel e terá direito à proteção especial do
Estado. § 1º O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equiva lerá ao
civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer o celebrante ou
qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público. § 2º O casamento
religioso, celebrado sem as formalidades deste artigo, terá efeitos civis, se, a requerimento do casal,
for inscrito no Registro Público, mediante prévia habilitação perante a autoridade compe tente” (art.
163, CF/1937).
489 “Art 167 A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos. § 1º -

O casamento é indissolúvel. § 2º O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casa mento
religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer
o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público. § 3º O
casamento religioso celebrado sem as formalidades deste artigo terá efeitos civis se, a requerimento
do casal, for inscrito no Registro Público mediante prévia habilitação perante, a autoridade
competente. § 4º A lei instituirá a assistência à maternidade, à infância e à adoles cência” (art. 167,
CF/1967).
490 A abordagem do tema e parte das fontes utilizadas, como exposta neste parágrafo, correspondem ao

que foi desenvolvido anteriormente pelo autor em: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A influência do BGB
e da doutrina alemã no Direito Civil brasileiro do século XX...p. 52 e 56.
491 SCHULTENÖLKE, Hans. Die schwere Geburt des Bürgerlichen Gesetzbuchs. Neue Juristische
Wochenschrift. v. 49, p. 170517010, 1996. p. 17051706.
492 WIEACKER, Franz. Der Kampf des 19. Jahrhunderts um die Nationalgesetzbücher. In. KASER, Max et alii

(Orgs.). Festschrift für Wilhelm Felgentraeger: Zum 70. Geburtstag. Göttingen: O. Schwartz, 1969. p. 409-
422.
493 SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER, Roland (Hrsg). Op. cit., notas marginais 910.
494 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht... p.

340.
495 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht... p.

346.
496 BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der Unterscheidung von privatrecht und öffentlichem Recht...p.
351.
SEGUNDA PARTE

A autonomia do Direito Privado em relação ao Direito Público foi


exaustivamente demonstrada na Primeira Parte. Apresentaram-se os
fundamentos técnico-jurí-dicos e metajurídicos, baseados em fontes legislativas,
jurisprudenciais, doutrinárias e históricas, que confirmam a hipótese ali
formulada: Direito Público e Direito Privado ocupam espaços diferentes na
ordem jurídica e, mesmo com escaramuças de fronteira, essa “diferenciação
sistêmica” permanece útil e teoricamente sustentável.
Não é possível sustentar a autonomia do Direito Civil contemporâneo sem
que se entenda o que é e, acima de tudo, o que não é a constitucionalização.
Empiricamente, é comprovável o interesse assimétrico na literatura brasileira
sobre a constitucionalização do Direito Civil, o que se percebe pela produção
quantitativamente desproporcional de livros e artigos nesse campo.
A Segunda Parte divide-se nos seguintes capítulos: i) Capítulo Quinto: o
problema da falta de acordo semântico sobre a constitucionalização no contexto
do formalismo jurídico, do neoconstitucionalismo e do pós-positivismo; ii)
Capítulo Sexto: o que não é constitucionalização do Direito Civil; iii) Capítulo
Sétimo: o que é constitucionalização do Direito Civil.
Constitucionalização, neoconstitucionalismo e pós-positivismo são
conceitos usualmente associados. Conhecer os dois últimos e segregá-los é um
expediente prévio ao estudo detalhado da constitucionalização. Apesar de muito
referida e utilizada (em excesso) com fundamento de farta literatura em Direito
Privado, faz-se necessário um modelo teórico que sirva para eliminar os desvios
conceituais em torno da constitucionalização. A partir de modelos estrangeiros,
nesta Segunda Parte, apresentar-se-á um modelo que respeite as especificidades
do Direito Privado no Brasil, com seus avanços e retrocessos dos últimos 40
anos.
Somente com algumas precisões conceituais sobre a constitucionalização
será possível avançar para outra importante questão proposta na tese: como o
Direito Civil deve-se relacionar com os direitos fundamentais. Esse será o objeto
da Terceira Parte.
CAPÍTULO QUINTO

O DIREITO CIVIL ENTRE A AUTONOMIA E A


CONSTITUCIONALIZAÇÃO: EM BUSCA DE UM ACORDO
SEMÂNTICO (OU SOBRE COMO SERVIR VINHO VELHO
EM TAÇAS NOVAS)

SUMÁRIO. § 24. A “metáfora das ilhas do Canal” e os acordos semânticos.


24.1. Introdução: vinho velho em taças novas. 24.2. As Ilhas do Canal:
tropas de ocupação ou imigrantes ile gais? § 25. O impacto da
constitucionalização do Direito Civil na literatura jurídica brasileira. § 26.
A crise de formalismo jurídico e as novas escolas jurídicas: o avanço do
não positivismo no fi nal do século XX. § 27. A “roupa nova do
imperador”: neocons titucionalismo, póspositivismo e
constitucionalização.
§24. A “METÁFORA DAS ILHAS DO CANAL” E OS ACORDOS SEMÂNTICOS

24.1. Introdução: vinho velho em taças novas


O título deste capítulo é um duplo trocadilho, com dupla inspiração. O
primeiro sentido (e a primeira inspiração) encontram-se no primeiro capítulo da
obra de Reinhard Zimmermann (The New German Law of Obligations Historical
and Comparative Perspectives. Oxford: Oxford University Press, 2006. p. 1-38,
item 10), quando ele comenta sobre a interpretação do BGB pelos tribunais da
Alemanha no século XX, que teria gerado uma “revolução do direito
pretoriano”, com um número significativo de “descobertas jurídicas” a partir
desse olhar lançado pela jurisprudência sobre o texto legal, segundo alguns
comparatistas por ele citados. A ironia de Zimmermann, que gerou o trocadilho,
está em dizer que “frequentemente nós também encontramos vinho velho sendo
servido em novas taças” (no original, “old wine being poured into new vessels”).
Com isso, ele quer dizer que parte significativa dessa revolução produzida pelos
tribunais na verdade era uma reelaboração de antigas doutrinas dos séculos
XVIII e XIX, remoçadas pela mera circunstância de virem em novas “taças”,
embora não fosse dado o crédito a seus verdadeiros criadores. O trocadilho
dentro do trocadilho está em que Reinhard Zimmermann fez, com seu habitual
refinamento, uma paráfrase irônica à “parábola do vinho novo em odres velhos”,
referida nos Evangelhos de S. Mateus IX:14-17, S. Marcos II:18-22 e S. Lucas
V:33-39.497 A mensagem bíblica possui interpretações diferentes, conforme a
filiação teológica do intérprete. Uma delas, que este autor considera mais
próxima de suas convicções, é a de que a boa nova de Jesus Cristo não seria
adaptável aos preceitos do Antigo Testamento. Zimmermann ironiza ao afirmar
que antigas doutrinas e teorias eram apresentadas como novidades pela
jurisprudência ao interpretar o BGB. É este o segundo trocadilho. O título, como
se verá, apresenta o problema da constitucionalização do Direito Civil à luz de
inúmeros autores dos séculos XIX e XX. Seria esse problema mais um caso de
“vinho velho sendo servido em novas taças”?498
24.2. As Ilhas do Canal: tropas de ocupação ou imigrantes ilegais?
As Ilhas do Canal, também conhecidas como Ilhas da Mancha ou Ilhas
Anglo-Normandas, são a parte que restou do Ducado da Normandia sob domínio
dos sucessores de Guilherme, o Conquistador, a saber, os soberanos do que hoje
se conhece por Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte. Essas ilhas
gozam de relativa autonomia no concerto dos domínios britânicos, possuindo
algumas delas governo próprio, embora sob a chefia de Estado da Rainha
Elizabeth II. Durante a Segunda Guerra Mundial, até por sua proximidade à
costa francesa, as Forças Armadas alemãs ocuparam essas ilhas, as quais foram a
única parte do território britânico efetivamente invadidas em todo o conflito
bélico de 1939 a 1945. Não houve propriamente combates na ocupação, pois a
maioria dos ilhéus foi transferida para a Grã-Bretanha ou os domínios no
Canadá, e não havia forças militares britânicas nessas ilhas. Por questões
estratégicas, os Aliados não retomaram as ilhas, mesmo após a Operação
Suserano, nome dado à Invasão da Normandia em 1944. Somente em 8 de maio
de 1945, quando se deu o fim oficial do conflito, é que os oficiais alemães se
renderam. Uma história apócrifa narra as circunstâncias exóticas com que se deu
tal rendição: a mais alta patente militar alemã dirigiu-se ao governador britânico
pro tempore das ilhas de Jersey, que permanecera durante toda a ocupação para
defender os interesses dos que ali ficaram, e apresentou a rendição formal. O
governador, com uma fleuma que se atribui aos britânicos daqueles tempos,
reagiu desse modo: “Nunca as Ilhas do Canal foram invadidas por potências
estrangeiras desde Guilherme, o Conquistador. Os senhores são estrangeiros sob
hospitalidade de Sua Majestade. Se quiserem sair das Ilhas, que o façam de
maneira oficial e apresentem seus passaportes”. O alemão, sem entender bem o
que ocorria, insistiu: “Não temos passaportes. Somos militares e agimos sob
ordens superiores para ocupar estas ilhas”. O governador prosseguiu, com
crescente indignação: “Sem passaportes? Isso é ainda mais grave. Os senhores
são, portanto, imigrantes ilegais”. A paciência do alemão atingira seu limite. “Eu
não estou entendendo nada. O senhor bem sabe quem nós somos e o que viemos
fazer aqui. Vamos ser objetivos: onde podemos depor nossas armas?”, disse o
alemão. A resposta do governador dei-xou-o estupefato: “Imigrantes ilegais e
ainda por cima armados! Só há uma alternativa: os senhores serão deportados!
Aguardem os navios da Marinha Real para levá-los de volta à Alemanha. Mas,
preparem-se, seu Governo ou os senhores terão de arcar com os custos da
deportação!”
Se non è vero, è ben trovato. Independentemente da veracidade desse
diálogo, ele serve muito bem para colorir um dos mais graves problemas
enfrentados quando se tenta definir um estatuto epistemológico para o Direito
Civil contemporâneo, que vem a ser um acordo semântico sobre o que é a
“constitucionalização”. Na Primeira Parte, foi demonstrada a especificidade e a
divisão de trabalho que tornam o Direito Privado dotado de autonomia em
relação ao Direito Público. Alcançado esse primeiro objetivo, para se atingir o
segundo propósito desta tese, que é o de provar a autonomia metódica e
dogmática do Direito Civil, faz-se indispensável a solução de um dos maiores
obstáculos contemporâneos a esse modelo: a tese de que se deu uma ampla
constitucionalização do Direito Civil, o que determinaria a eficácia direta e
imediata de princípios constitucionais e de direitos fundamentais a essa
província jurídica e às relações a ela subordinadas.
Não se pretende antecipar posição sobre se é aceitável tal eficácia direta e
imediata e, em sendo admissível, como e em que limites ela se manifestaria.
Esse problema, que é nuclear, será objeto de análise intensiva na Terceira Parte.
Por agora, é necessário enfrentar um objetivo: chegar a um acordo semântico
sobre o que é constitucionalização, particularmente do Direito Civil. Entendido
esse conceito, ou o que ele não é, podem-se estudar dois problemas derivados e
também conexos: a relação do Direito Civil com princípios constitucionais e
com direitos fundamentais, tendo-se, em ambos os casos, sempre em
consideração as relações entre os particulares.
Em certa medida, procura-se aqui evitar os inúmeros malefícios
decorrentes da “metáfora das Ilhas do Canal”, como se poderia definir a lendária
história da rendição alemã ao governador da Ilha de Jersey, em 1945. Afirmar ou
negar que o Direito Civil foi “constitucionalizado”, seja a disciplina, seja parte
de seus institutos, categorias ou figuras jurídicas, é como uma conversa entre o
comandante alemão e o governador: pode-se até chegar a um resultado que todos
aceitem (a volta das tropas à Alemanha), mas sobre o qual ninguém se entende
(soldados derrotados ou imigrantes ilegais armados) e que não define quem deva
pagar os custos argumentativos e o quanto eles valem (transporte militar de
cortesia ou ressarcimento pela deportação de estrangeiros ilegais). Para se chegar
a tais acordos semânticos é importante percorrer alguns caminhos abertos pela
doutrina do Direito Constitucional brasileiro, que, com originalidade,
conduziram à preservação do estatuto epistemológico do Direito Civil.499
Identicamente, podem-se citar autores de Direito Privado que tentaram delimitar
criticamente os efeitos e o conteúdo da chamada constitucionalização do Direito
Civil.500
A constitucionalização e seus limites semânticos serão apresentados, nesta
Segunda Parte, sob as lentes de um civilista e para se resolver um problema do
Direito Civil. Não se pode, contudo, negar os méritos do Direito Constitucional e
dos constitucionalistas no pioneirismo dos estudos sistemáticos sobre a matéria,
que serviu de inspiração, em várias passagens, a este texto.501
§25. O IMPACTO DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL NA
LITERATURA JURÍDICA BRASILEIRA
O sucesso do discurso da constitucionalização é mensurável pelo número
de publicações sobre o tema no Brasil, seja em relação ao Direito em geral, seja
quanto ao Direito Civil em particular. Em pesquisa na RVBI, compreensiva do
período de 1o de março de 1950 a 1o de março de 2017, encontraram-se nada
menos do que 83 livros e capítulos de livros que tratavam da
constitucionalização, dos quais 59 referem-se ao Direito Civil. Se a análise fosse
voltada ao Direito Privado, nele também se compreendendo o Direito do
Trabalho, o percentual seria ainda maior.
Restringida a pesquisa, em idêntico período, apenas a revistas, esse número
chega a impressionantes 212 artigos. Dedicados especificamente ao Direito Civil
en-contraram-se 80 artigos. Identicamente ao que se destacou quanto a livros e
capítulos, a quantidade de artigos sobre constitucionalização do Direito Privado,
com a inserção do Direito do Trabalho, incrementaria essa quantidade em termos
expressivos.
Na coleta de dados, além do requisito da delimitação temporal, levou-se em
conta o seguinte em relação a capítulos e livros: a) se o capítulo foi
posteriormente publicado sob a forma de artigo, ou vice-versa, mantiveram-se
ambas as fontes no cômputo das respectivas tabelas; b) se houve citação de
capítulo e do livro, também se optou por conservá-las sem distinção; c) para se
permitir a reprodução desta coleta de dados por outros pesquisadores, a
investigação limitou-se à RVBI. Fosse a pesquisa realizada em outras bases, a
hipótese é que o resultado seria ainda mais significativo em termos de obras
referentes à constitucionalização do Direito Privado; d) a pesquisa limitou-se a
textos publicados em língua portuguesa no Brasil. Não foram citadas
publicações de autores não brasileiros em outros países, embora aqui se tenham
computado textos de autores lusófonos (nacionais ou não) em livros ou
periódicos brasileiros ou portugueses, escritos em vernáculo; e) se houve
reedições, mencionou-se apenas a primeira edição encontrada; f) utilizaram-se
somente dois metadados (constitucionalização e ci-vil-constitucional); g) o
critério foi a presença do termo no título ou em tópico relevante para o texto. Se
houve resultados repetidos, um deles foi eliminado.
As Tabelas 1 e 2 apresentam os resultados da pesquisa:

Tabela 1 – Livros e capítulos sobre constitucionalização do Direito e


constitucionalização do Direito Civil

(1B) Número de obras sobre (1C) Número de obras


(1A) Ano ou intervalo de constitucionalização do exclusivamente sobre (1D) Número total de obras
anos da publicação Direito (excluído o Direito constitucionalização do no respectivo ano (1B+1C)
Civil) Direito Civil
1950-1988 1 - 1
1989-1993 1 - 1
1994 1 - 1
1995 1 - 1
1996 2 - 2
1997 1 1 2
1998 1 - 1
1999 - - -
2000 1 1 2
2001 - 2 2
2002 - 2 2
2003 - 3 3
2004 - 1 1
2005 1 3 4
2006 2 4 6
2007 2 3 5
2008 2 5 8
2009 - 6 6
2010 - 7 7
2011 - 2 2
2012 - 3 3
2013 4 1 5
2014 2 7 9
2015 1 4 5
2016 - 3 3
2017 (*) - 1 1
TOTAL 24 59 83

(*) Até 1o.3.2017.


Fonte: RVBI 2017.

Tabela 2 – Artigos publicados em periódicos científicos sobre


constitucionalização do Direito e constitucionalização do Direito Civil

(2B) Número de artigos


(2C) Número de artigos
sobre (2D)Número total de
(2A) Ano ou intervalo de exclusivamente sobre
constitucionalização do artigos no respectivo ano
anos da publicação constitucionalização do
Direito (excluído o (2B+2C)
Direito Civil
Direito Civil)
1950-1955 - - -
1956 1 - 1
1957-1969 - - -
1970 1 - 1
1971-1986 - - -
1987 - 1 1
1988-1990 - - -
1991 1 - 1
1992 - - -
1993 1 2 3
1994-1995 - - -
1996 2 - 2
1997 - 1 1
1998 - 2 2
1999 2 3 5
2000 1 - 1
2001 1 1 2
2002 3 1 4
2003 2 4 6
2004 3 3 6
2005 5 3 8
2006 12 2 14
2007 9 4 13
2008 15 9 24
2009 8 6 14
2010 10 7 17
2011 6 6 12
2012 14 9 23
2013 10 6 16
2014 7 5 12
2015 12 4 16
2016 4 1 5
2017 (*) 2 - 2
TOTAL 132 80 212

(*) Até 1o.3.2017.


Fonte: RVBI 2017.
Esses dados, como assinalado, são puramente quantitativos. Uma pesquisa
qualitativa demandaria muito mais tempo e fugiria do objeto desta tese. Os
resultados podem ser assim resumidos:
a) Livros e capítulos de livros sobre constitucionalização do Direito. Pelos
dados da coluna 1D (soma de 1B e 1C), houve estagnação de publicações de
1950-1988 a 1995. Na coluna 1C (exclusiva para o Direito Civil), a primeira
publicação só ocorre em 1997. Na coluna 1D, percebe-se um crescimento nas
publicações a partir de 1996, mas ele segue praticamente estável até 2003, com
uma leve queda em 2004. A coluna 1D acompanha essa tendência. Em 2005, na
coluna 1D tem início uma série histórica de crescimento contínuo e expressivo,
interrompida em 2007, 2009 e 2012-2013. Nos anos de 2015 a 2017, há
alternância de crescimento e queda. A coluna 1C, segue um padrão muito
próximo.
b) Artigos publicados em periódicos sobre constitucionalização do
Direito. A primeira publicação sobre constitucionalização do Direito é de 1956
(coluna 2B) e a primeira sobre constitucionalização do Direito Civil é de 1987.
Tanto a coluna 2B quanto a 2C apresentam uma série histórica de estagnação
que vai de 1950 a 1998. Com pequenas quedas entre 1998 e 2002, a partir de
2003, tem início um processo de crescimento contínuo, com algumas quedas
(2007, 2009, 2011, 2014). Em 2016 e 2017, nota-se uma tendência de queda. As
colunas 2B e 2C são muito similares em suas séries históricas. No período de
2005 a 2015, portanto, 10 anos, concentra-se o intervalo com maior número de
publicações sobre a constitucionalização em geral e constitucionalização do
Direito Civil em particular.
Ressalve-se que os dados refletem a realidade plena do universo de
publicações jurídicas e isso tem-se agravado pelo crescimento do número de
revistas jurídicas eletrônicas, muitas das quais não estão incluídas na base de
dados da RVBI. Uma hipótese bastante provável é que se a pesquisa fosse mais
ampla, quanto a sua base, e incluísse essas revistas, os resultados indicariam um
número muito maior de textos sobre o objeto pesquisado.
Pesquisa semelhante, feita na base internacional HeinOnLine, com uso do
metadado “constitutionalization” que captura dados de mais de 1.350 periódicos
(principalmente) dos Estados Unidos da América, relativa aos anos de 1950 a
2017, resultou em 106 artigos sobre constitucionalização do Direito em geral.
Restringida a pesquisa ao metadado “constitutionalization private law”, o
resultado cai para 5 entradas.502 Na base Jstor, que abrange os principais
periódicos jurídicos do mundo, esse número, em igual período de tempo, cai
para 21 artigos, usando-se o mesmo metadado.
A literatura sobre constitucionalização é, portanto, um fenômeno
internacional,503 mas que, no Brasil, parece ter tomado proporções maiores do
que o necessário ou esperável. Nos §§ 26 e 27, o tema será analisado em um
contexto maior: a crise do formalismo jurídico (3) e sua inserção aparente no
“movimento” neoconstitucionalista e no chamado pós-positivismo, com ênfase
no problema central deste Capítulo: em que medida isso causou impacto no
Direito Civil e em seus institutos.
§26. A CRISE DE FORMALISMO JURÍDICO E AS NOVAS ESCOLAS
JURÍDICAS: O AVANÇO DO NÃO POSITIVISMO NO FINAL DO SÉCULO
XX
O formalismo é um conceito filosófico, embora tenha sido apropriado pela
linguagem comum, que lhe conferiu o sentido de algo afeito à exterioridade, às
aparências, em contraponto ao que é substancial, interior.504 Não é essa uma
conotação destituída de vínculos com a Filosofia e com a Teologia. No último
caso, observadas algumas passagens das Sagradas Escrituras, no Novo
Testamento, há muitos versículos que associam o formalismo à hipocrisia,
aproximação muito pouco favorável àquele. Essa vinculação entre formalismo e
hipocrisia ganhou enormes espaços na Literatura e nas Artes, ao longo dos
séculos. O Evangelho segundo S. Mateus, a propósito, é repleto de menções ao
farisaísmo como expressão de práticas formais, em detrimento da essência da fé
religiosa. É assim que o evangelista condena os adeptos dessa seita – cujo nome
é, desde então, sinônimo de hipocrisia – por orarem de pé nas esquinas e nas
ruas, a fim de que possam ser vistos e reconhecidos por sua devoção (S. Mateus,
VI, 5). O apóstolo condena a exteriorização do jejum pelos que o fazem, ao
assumirem ar de abatimento e de tristeza para receber o aplauso dos homens (S.
Mateus VI, 16).505
O formalismo encontrou seus símbolos na Literatura, quase sempre
representados por personagens negativas. Victor Hugo construiu em Os
miseráveis sua expressão máxima no inspetor Javert, cuja visão da Justiça
confundia-se com a Lei e sua forma exterior. Javert era o arquétipo da
condenável mentalidade formalista que o Oitocentos insistia em conservar, a
despeito dos sucessos da Revolução em França. É obra do século XIX, sem
embaraço de contribuições significativas de outros séculos, a síntese entre o
formalismo e o Direito. Essa apropriação foi bem assumida pelo Positivismo
Jurídico, de modo tardio, pois a própria ideia de Ciência já se utilizava do
formalismo. Obediência às formas era algo necessário ao cumprimento do
método científico, com seus grupos-teste e os controles rígidos dos
experimentos. Na Estética, o império do formalismo não se deixaria de notar.
Antonio Junqueira de Azevedo apresenta a elegante imagem do homem
ocidental do Oitocentos, vestido de terno e gravata, com todas as partes do corpo
encobertas, à exceção da cabeça – símbolo da Razão – e das extremidades –
símbolo do Trabalho. Eis a perfeita formulação do dístico católico dos monges
beneditinos da Idade Média, ora et labora (reza e trabalha), sob as novas vestes
do laicismo – cogita et labora (pensa e trabalha).506
Essa disputa entre forma e substância não é indiferente ao Direito. É
celebre a polêmica entre proculeanos e sabinianos sobre a precedência da forma
ou da substância quando as espécies eram objeto de comistão, adjunção ou
confusão. A espécie nova era propriedade do especificador ou do titular da
matéria-prima?507 O CC/1916 respondia desse modo a essa pergunta: “Se da
mistura de materiais de natureza diversa se formar nova espécie, a confusão terá
a natureza de especificação, para o efeito de atribuir o domínio ao respectivo
autor” (art. 617). João Manuel de Carvalho Santos, depois de advertir que esse
preceito não deveria ser interpretado “a êsmo” – já que isso corresponderia a
afirmar que sempre que se misturassem dois materiais diferentes haveria
especificação, o que não é verdade – explica que o resultado deve ser uma
espécie “que seja conhecida e tenha valor econômico”.508 E anotava ainda que
deveria ser regulada pelas regras de especificação a hipótese de má-fé do autor
respectivo, afinal aquele a quem se atribuiria o domínio da nova espécie.509
Na Idade Média, recorde-se a polêmica dos universais, que envolveu a
Ordem dos Franciscanos e o Papado, sob a liderança invulgar de Guilherme de
Ockham.510 A questão fervilhava nas universidades da época. De um lado os
realistas, que acreditavam na existência de universais independentemente de sua
formulação pelo pensamento; e de outro os nominalistas, defensores da tese de
que os universais não possuem existência autônoma, sendo apenas nomes que se
conferem aos atributos comuns dos elementos particulares. O nominalismo, ao
negar a existência dos universais, considera que a natureza das coisas é um mero
produto do espírito do homem. Politicamente, essa época viu crescer uma
oposição entre Igreja e Estado, consubstanciada na divisão entre os seguidores
do Papado, reunidos sob a rubrica comum da bula Unam Sanctam, de Bonifácio
VIII, e os seguidores das teses de Marsílio de Pádua de caráter laicista.
Em O nome da rosa (Il nome dela rosa), de Umberto Eco (1932-2016),
Guilherme de Ockham é simbolizado pelo frade franciscano Guilherme de
Baskerville, mestre do jovem Adso de Melk, filho do Barão de Melk. Ambos,
mestre e discípulo, chegam no ano de 1327 a um mosteiro beneditino nos Alpes
italianos para um encontro com representantes do papa João XXII, então no
Cativeiro de Avinhão. Frei Guilherme é surpreendido, nos dias que passa no
mosteiro, por uma situação desoladora: o misterioso assassinato de diversos
monges, a cuja investigação se dedica. A certo ponto, o problema dos universais
entra em cena, quando Adso pergunta para o nominalista Frei Guilherme se é
possível absorver uma essência de todos os cavalos a partir das pegadas deixadas
no chão por esses animais. A questão parece retomar a famosa provocação de
Antístenes: “Vejo os cavalos, mas não vejo a cavalidade”.511
Eis que o formalismo teve seu prestígio em outras áreas do conhecimento
humano. Tem-se o formalismo lógico, de matriz kantiana, que se utiliza das
normas da Lógica como instrumentos ou convenções desconectados da realidade
ou dos seres. Retomava-se o combate com os metafísicos de extração
aristotélica. O formalismo matemático é outro exemplo. As relações matemáticas
expressam construções formais. Não há espaço para o verdadeiro ou falso, assim
considerados como juízos de valor. Não se esqueça do formalismo gnosiológico,
segundo o qual o tempo ou o espaço são meras categorias do pensamento
humano, como já dissera Santo Agostinho,512 capazes de filtrar a realidade a
partir delas, como pressupõe Immanuel Kant.513
No Direito, ao longo do século XX, especialmente após o fim da Segunda
Guerra Mundial e com a Revolução da Contracultura nos anos 1960, assistiu-se
à crise do formalismo em níveis tão profundos que se cogita na própria
superação desse conceito por tanto tempo hegemônico. A partir do segundo pós-
guerra, tentou-se restaurar o jusnaturalismo, sob diferentes tendências, como o
(i) neotomismo de Messner, Marcic e Verdross; (ii) o protestantismo de
Forsthoff; (iii) a filosofia dos valores da fenomenologia de Coing; e (iv) o
existencialismo de Maihofer e Fechner,514 após o desastre que foi o período
ditatorial de 1933-1945 na Alemanha.
Gustav Radbruch, o “convertido”,515 é o símbolo dessa era de dúvidas e de
busca por novos fundamentos para o Direito, cujos reflexos no Tribunal
Constitucional Federal alemão fizeram-se sentir nos anos 1950 com a teoria da
natureza das coisas (Natur der Sache), que aparece pela primeira vez no célebre
caso Lüth, de 1958,516 como alternativa ao jusnaturalismo e ao positivismo.
A natureza das coisas atendia ao questionamento nuclear dos
antipositivistas: a complexa (e para alguns, mal explicada) passagem do ser para
o dever ser. Nesse aspecto, ela seria o tópos no qual convergem ser e dever ser,
o “lugar metódico no qual se realiza a conexão (correspondência) da realidade e
dos valores”.517 A natureza das coisas é suportada pelo pensamento analógico e
tipológico. Não é lógico-formal, embora também não se possa dizê-la “não
lógica” ou circular.518
O jusnaturalismo, em suas diversas tendências, não foi, porém, capaz de
responder à altura a essa ânsia de superação do formalismo. Muito menos a
doutrina da “natureza das coisas”, que encontra, até hoje, algum sucesso na
jurisprudência alemã, posto que de modo residual.519
O abandono dos trajes formais, da linguagem culta, da música chamada
erudita e a alteração dos padrões de comportamento socialmente aceitos são
exteriorizações visíveis de uma mudança de mentalidade que também se refletiu
no Direito, o que é observável com a explosão de dezenas de movimentos e
escolas jurídicas, cuja conformação mal e mal cabe nos antigos rigores
categoriais do Positivismo e do Naturalismo. Isso está conectado com as
dificuldades de se encontrar elementos de aproximação e de diferenciação entre
ambas as escolas jurídicas, a partir de critérios clássicos como a distinção entre
moral e direito,520 tema que “ocupou um lugar central na filosofia do direito
contemporânea e constitui-se num dos pontos essenciais do positivismo jurídico
clássico e contemporâneo, razão pela qual foi abordado como uma questão
metodológica essencial em todos os principais trabalhos de teoria do direito
desde o início do século XX”.521 Atualmente, fala-se em positivistas e não
positivistas, no lugar da antiga dicotomia entre positivistas e naturalistas,
embora, em relação à primeira clivagem, “o debate entre positivistas e não
positivistas” tenha “chegado a um tal nível de complexidade que seria necessária
uma lupa para identificar os pontos exatos que os diferenciam”.522
Carla Faralli, em um interessante opúsculo intitulado A filosofia
contemporânea do Direito: temas e desafios, procedeu ao inventário dessas
novas manifestações do pensamento jurídico.523 É algo significativo que uma
obra com essa ambição tenha somente 140 páginas, fato que não passou
despercebido ao prefaciador do livro, Mario Losano, para quem essa concisão é
outra marca de nosso tempo: os leitores não se dispõem a enfrentar obras
enciclopédicas, a leitura tem de ser ágil, sob pena de não ter interessados.524
Pois bem, Carla Faralli alista autores com perfis procedimentalistas e
substancialistas, os quais, de algum modo, ainda permitem que se rastreiem suas
ligações com o Positivismo e o Naturalismo, ao exemplo de John Rawls, Ronald
Dworkin, Jürgen Habermas e Robert Alexy.525 Em seguida, apresenta
neojusnaturalistas, como J. M. Finnis, com ideias não muito divulgadas ou
conhecidas no Brasil e que propõem a validade de argumentos morais absolutos,
contra o relativismo ora imperante sob o fundamento do respeito às convicções e
à autodeterminação de grupos sociais.526 Posteriormente, apresentam-se as
“escolas” do neoinstitucionalismo, com raízes em Ota Weinberg;527 dos Critical
Legal Studies, do Direito como paixão, cuja expressão maior é o professor de
Harvard, o brasileiro Mangabeira Unger;528 do Law and Economics, com Guido
Calabresi, Ronald Coase e Richard Posner, que transportaram para o Direito os
preceitos da Escola Neoclássica de Economia de Chicago;529 da teoria feminista
do Direito;530 da teoria da diferença racial;531 do raciocínio jurídico;532 do
Direito e Literatura;533 da Lógica Jurídica;534 da Informática Jurídica;535 da
Bioética536 e do Direito e Multiculturalismo.537
São tantos e tão diferentes movimentos e escolas que sua simples
enumeração, seguida de algumas explicações fundamentais sobre seu conteúdo e
a exposição de seus principais líderes, é causa de “fascínio e estupor”, para se
valer da velha figura de Immanuel Kant, relativa ao efeito do céu estrelado sobre
nossas cabeças e a lei moral em nossos corações. Diz-se que são movimentos e
escolas com alguma imprecisão, pois nem essas categorias resistem ao cotejo
com esse inventário de manifestações no âmbito da Filosofia do Direito. Há
correntes que nem se pretendem compreensivas de uma explicação global da
Ciência Jurídica, seja por não a considerarem como tal, seja por entenderem ser
essa uma missão impossível de se levar a efeito.
§27. A “ROUPA NOVA DO IMPERADOR”: NEOCONSTITUCIONALISMO,
pós-positivismo e constitucionalização
Omitiu-se uma dessas “escolas”, constante do rol apresentado por Carla
Faralli. Assim se decidiu como recurso retórico e com a finalidade de salientar
sua posição periférica – ou, diga-se, de importância relativa – no contexto maior
desses movimentos. É o chamado movimento do neoconstitucionalismo, a
respeito do qual é quase tão intensa a literatura produzida nos últimos 20 anos
quanto a já mencionada sobre a constitucionalização do Direito.
Não há propriamente uma “escola” do Neoconstitucionalismo, mas um
conjunto de autores que, com diferentes fundamentos, alinhar-se-iam ao
entendimento de que, no segundo pós-guerra, haveria surgido um “novo
constitucionalismo”, o qual teria por norte os princípios constitucionais
(especialmente a dignidade da pessoa humana), a força normativa da
Constituição (que deixaria de ser um documento político), a eficácia dos direitos
fundamentais e a criação de poderosos tribunais constitucionais, que
transformaram a clássica tripartição de poderes.538
Evidentemente que esse conjunto de características do
neoconstitucionalismo não é monolítico, nem corresponde a um constructo
elaborado por um caput scholae ou vinculado a certa escola jurídica. Uma das
marcas mais nítidas do neoconstitucionalismo é o número exponencial de
profetas e um número ainda maior de credos. Essa plasticidade conceitual em
torno do que seja neoconstitucionalismo tem um duplo efeito: todos se sentem
por ele representados, ainda que parcialmente, e não há como se estabelecer
acordos semânticos em torno do que se está a discutir. Daí resulta que as pessoas
tendem a se acomodar e não investigar a fundo o que seja o
neoconstitucionalismo, a despeito de algumas obras de qualidade sobre o
tema,539 porque se avançarem nessa pesquisa encontrarão resultados
desconcertantes ou contraditórios.540
Outra consequência sensível está em que a continuidade do estágio de
aceitação acrítica do neoconstitucionalismo permite que ele se expanda cada vez
mais, dado o senso de apropriação que isso confere à “teoria”. Dito de outro
modo, a ductilidade e a plasticidade do neoconstitucionalismo, infelizmente
geradas pelo caráter superficial de muitos de seus “postulados”, têm a força
propagadora de um credo religioso, em relação ao qual todos se sentem
integrados. E mais do que isso, sentem-se condôminos de seus dogmas. A crítica
a esse credo converte-se em heresia. Tal circunstância não passou incólume a
parte da doutrina, que tem buscado desconstruir o “neoconstitucionalismo”,
posto que tais iniciativas sejam francamente minoritárias.541 É possível encontrar
alternativas ao neconstitucionalismo, articuladas sob a forma de correntes
teóricas pautadas pelo pluralismo na Faculdade de Direito do Largo de São
Francisco. Ressalte-se que tais concepções se apresentam autônomas,
independentemente de posições ideológicas de seus professores, o que, por si só,
é muito revelador da seriedade acadêmica dessas críticas.542
Outro conceito fluído é o de pós-positivismo. Embora não coligido no
estudo de Carla Faralli, o pós-positivismo é encontrado também em numerosos
textos doutrinários brasileiros543 e em não pequena quantidade de acórdãos de
tribunais superiores,544 a significar um movimento surgido no segundo pós-
guerra, que teria abandonado os postulados do Positivismo Jurídico e adotado
um modelo teórico timbrado por cargas valorativas, recurso a princípios
constitucionais e abandono da interpretação rígida e literal das normas.
Deve-se estabelecer aqui outro acordo semântico: de que pós-positivismo
se está a falar?
Na literatura científica, há o pós-positivismo como equivalente parcial ao
pósempirismo, desenvolvido como reação ao positivismo comtiano, de Augusto
Comte (1798-1857), muito influente no Brasil durante a Primeira República, e
ao positivismo lógico (empirismo lógico ou neopositivismo) do Círculo de
Viena, que durou de 1907 a 1938. Os expoentes do pós-positivismo seriam sir
Karl Popper (1902-1994, austrohúngaro naturalizado britânico, autor do livro
Conjecturas e Refutações, um marco da Filosofia da Ciência no século XX) e
Thomas Kuhn (1922-1996, filósofo da Ciência, conhecido pela expressão
“mudança de paradigma”, que se popularizou em todo o mundo). Esse pós-
positivismo contesta algumas premissas do pensamento e do método científicos,
ora se referindo a uma “estrutura das revoluções científicas”, ora criticando a
eficácia do experimentalismo e a real possibilidade de separação entre o sujeito
cognoscente e o objeto cognoscível. O pesquisador deveria buscar a verdade
científica por meio de conjecturas, que seriam depois refutadas em um processo
contínuo de crítica e reformulação. A realidade é apreensível sempre de forma
imperfeita e probabilística. O investigador deverá controlar seu viés e não o
deixar expresso em sua pesquisa.
Em Direito, o conceito de pós-positivismo foi formulado, em língua
inglesa, por Neil MacCormick, no final de sua carreira acadêmica, com um
propósito muito específico de se desvencilhar de problemas teóricos do
Positivismo jurídico relativos à justificação de decisões judiciais emitidas em
acordo com os critérios de validade. Para ele, é possível reconhecer um caráter
argumentativo ao Direito e não apenas uma essência puramente normativa, além
de haver uma prestação implícita de justiça. Neste aspecto, ele rompe com a
dicotomia entre instâncias de validade e instâncias de valor, tão caras ao
Positivismo jurídico kelseniano. Retomando-se a questão conceitual, vê-se que o
pós-positivismo de MacCormick nada tem com o pós-positivismo descrito por
parte da doutrina brasileira.545
Na língua alemã, a expressão pós-positivismo (Nachpositivismus) aparece
na obra de Friedrich Müller, quando ele concebeu a teoria estruturante do
Direito, que distingue a norma e o texto normativo.546 Em nada se conecta com
um Direito fundado em princípios e normas ou em uma constitucionalização do
Direito, como ordinariamente se lê em alguns acórdãos e escritos doutrinários
brasileiros. Na Alemanha, a teoria estruturante de Müller não obteve número
significativo de adeptos.
Mais recentemente, Eric Engle publicou um estudo monográfico intitulado
Pós-positivismo, no qual ele mobilizou uma história das principais correntes da
Ontologia e da Epistemologia, desde a Antiguidade Clássica, passando pela
Idade Média (Escolástica e Nominalismo), até alcançar a Modernidade com as
polêmicas entre Direito Natural, teorias contratualistas e Positivismo jurídico.
Engle examina as teorias contratualistas contemporâneas (Dworkin, Rawls), os
libertários (Nozick), o realismo jurídico norte-americano, o movimento de Law
and Economics e a Escola de Viena (Mises e Hayek). Kelsen recebe uma
especial atenção, seguido dos Critical Legal Studies e outras escolas menos
representativas. O pós-positivismo funcionaria como um conceito guarda-chuva
para diversas expressões contemporâneas de uma explicação não-lógico-formal
das relações entre Moral e Direito.547
Nenhuma dessas acepções de pós-positivismo, seja a oriunda da Filosofia
do Conhecimento, seja a formulada por alguns juristas estrangeiros, guarda a
menor identidade com o que se pode chamar de pós-positivismo à brasileira.548
Trata-se de um conceito com características tipicamente brasileiras, sem
qualquer fundamento teórico respeitável, que não o de atacar o espantalho de
sempre, o Positivismo jurídico.549
Há alguns slogans associados a esse pós-positivismo à brasileira, embora a
maior parte deles já compusesse o arsenal teórico antipositivista. Um dos mais
repetidos é que o juiz não mais pode ser a “boca da lei”, um intérprete maquinal
do Direito, quase um autômato, que se vale da subsunção como as antigas
máquinas perfuradoras de cartões dos gigantescos “cérebros eletrônicos” dos
anos 1960.
Para se restringir a essa petitio principii, veja-se a crítica de Michael
Stolleis: a) os juízes do Ancien Régime valiam-se de fontes como o Direito
Romano, os precedentes e, circunstancialmente, até de textos de doutrina; b) tais
etapas do processo decisório, contudo, eram meros expedientes, mais ou menos
necessários, para se chegar à etapa realmente essencial, que consistia em exarar
seu pronunciamento, sempre em nome do rei ou em nome do Império (ou do
imperador); c) ao decidir, o juiz agia como último elo de um encadeamento de
autoridade, que procedia do rei ou do imperador, e chegava até ele, uma
autêntica boca-da-lei (ou do imperador); d) a função jurisdicional, de
interpretação jurídica, portanto, integrava-se ao Poder Executivo. No Antigo
Regime, o juiz não era independente porque se constituía em uma longa manus
do soberano; e) é nesse contexto que surge a famosa descrição de Montesquieu
sobre o Judiciário como bouche de la loi (Espírito das Leis, XI, 6, quando este
afirma que o juiz seria a boca que pronuncia as palavras da lei, não podendo
moderar nem sua força, nem seu rigor), a qual se encaixa perfeitamente no que
era a relação juiz-soberano.550
Como esclarece Michael Stolleis, “essa descrição é frequentemente objeto
de incompreensão, assim como as conotações que ela implica para a separação
dos poderes”. Na verdade, o juiz “boca da lei” não é o autômato (os “seres
inanimados”, na linguagem de Montesquieu), que dispensa os expedientes
ligados ao ato de interpretar, os quais, como dito, o magistrado não só conhecia
como utilizava. Ser “boca da lei” é uma descrição que “não implica ser a
interpretação judicial inútil, mas tão somente que o Direito – em um sentido
mecânico – contém soluções para tudo, e o juiz desempenha o papel de boca da
lei para dizê-lo em voz alta”.551 Assim entendida a metáfora de Montesquieu, ela
não representa um “endosso ao compromisso dos dias de hoje ao rule of law
(état de droit), nem à ideia de que é proibido ao Judiciário dele se desviar”.
Montesquieu apenas descreveu “a relação jurídica entre o monarca e o
Judiciário, e, a esse respeito, a metáfora é apta”, na medida em que “meramente
denota a hierarquia do Direito como uma decorrência do soberano”.552
A hipótese de Stolleis comprova-se ainda por fontes históricas primárias:
sentenças ou acórdãos de tribunais austro-húngaros, alemães e japoneses, e
italianos, para se ficar nestes exemplos, tinham por preâmbulo o estilo “em nome
do imperador e rei”, “em nome do imperador” e “em nome do rei”,
respectivamente. Os magistrados eram aqueles quem sentenciavam “em nome”
do soberano, como se fosse este a pronunciar sua voz pela boca dos juízes, dado
que não poderia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. O magistrado era a
“boca da lei” porque se constituía na “boca do rei”.553
Em comum ao que se chama de pós-positivismo e ao
neoconstitucionalismo está a ideia de constitucionalização do Direito, embora
este último conceito possa existir independentemente dos dois primeiros. É
inegável, porém, que no Brasil eles são frequentemente associados, ainda que de
modo não muito preciso.554
É difícil estabelecer com segurança quando surge o termo
neoconstitucionalismo. Em doutrina, há quem atribua a primeira utilização dessa
terminologia a Susanna Pozzolo, em 1998, no artigo “Neoconstitucionalimo y
especificidad de la interpretación constitutional”, resultado de sua comunicação
oral no XVIII Congresso Mundial de Filosofia Jurídica e Social, em Buenos
Aires, Argentina. Seus estudos foram posteriormente aprofundados e ampliados
em sua tese doutoral de 2001, na Universidade de Gênova.
Neoconstitucionalismo serve para “designar uma corrente de pensamento no
âmbito da filosofia do direito que adota um modelo axiológico de Constituição,
compreendida por princípios que precisam ser moralmente interpretados para
ganhar vida”. Para a autora, o neoconstitucionalismo teria “Ronald Dworkin,
Robert Alexy, Gustavo Zagrebelsky e Carlos Santiago Nino como os precursores
desse modo de pensar o direito”.555 Susanna Pozzolo admite que Dworkin, Alexy
e Zagrebelsky “provavelmente (...) não se reconhecem dentro de um movimento
unitário”, embora, a partir do estudo de seus argumentos, se torna possível
agrupá-los “dentro de uma única corrente filosófica”, cujas características seriam
estas: 1) princípios versus normas; 2) ponderação versus subsunção; 3)
Constituição versus independência do legislador; 4) juízes versus liberdade do
legislador. É preciso compreender o texto da autora como uma tentativa de
descrever um movimento que ela denominou neoconstitucionalismo, embora ela
se apresente de modo crítico quanto a seu objeto.556
Carlos Bastide Horbach,557 ao estudar essa “corrente de pensamento”,
comparou alguns dos “postulados” neoconstitucionalistas com insuspeitas
passagens do civilista e constitucionalista Carlos Maximiliano, o famoso autor
de Hermenêutica e Aplicação do Direito, obra do início do século XX.558
A “nova interpretação constitucional” é considerada pelos
neoconstitucionalistas como um instrumento que “não faz do juiz um mero
escravo da lei, mas o coloca na posição de principal realizador do texto
constitucional, concretizando princípios, que, graças ao pós-positivismo, passam
a ter valor normativo”. Sobre isso, Carlos Maximiliano, em 1924, escreveu que:
“A tendência racional para reduzir o juiz a uma função automática, apesar da
infinita diversidade dos casos submetidos a seu diagnóstico, tem sempre e por
toda a parte soçobrado ante a fecundidade persistente da prática judicial”. 559
Outro princípio caro aos neoconstitucionalistas é o da interpretação conforme à
Constituição, segundo o qual “o aplicador da norma infraconstitucional, dentre
mais de uma interpretação, deverá buscar aquela que a compatibilize com a
Constituição, ainda que não seja a que mais obviamente decorra do seu texto”.
Carlos Maximiliano, em outra passagem, escreveu que: “sempre que for
possível, sem fazer demasiada violência às palavras, tão restritivamente se
interprete a linguagem da lei que se torne constitucional à medida”.560
Dentre outras conclusões do texto, Carlos Bastide Horbach anota que “com
base nessa mais do que resumida análise, é possível concluir - a menos que
Carlos Maximiliano seja o precursor da ‘nova hermenêutica’ brasileira e John
Marshall o pai do ‘pós-positivismo’ - que não se está diante de uma revolução
em termos de interpretação do texto constitucional”. Talvez Carlos Maximiliano
fosse um neoconstitucionalista sem o saber ou muitos dos principais
fundamentos do “novo constitucionalismo” estejam na obra desse jurista nascido
em 1873 e falecido em 1960, sem que os créditos lhe hajam sido reconhecidos.
Dada a natureza desta tese, não é o caso de se deter mais verticalmente no
exame do neoconstitucionalismo e suas contradições.561 O § 27 tem um objetivo:
apresentar ao leitor uma hipótese, que consiste em reconhecer em certas
acepções do conceito da constitucionalização do Direito Civil algumas
características associadas ao discurso do neoconstitucionalismo, a saber: a
ausência de acordos semânticos sobre sua natureza e extensão e a assimilação de
postulados e teses muito antigas como se fossem novidades teóricas.
Essa hipótese só pode ser testada por meio do método de comparações, o
que se fará nos §§ seguintes. Como um trabalho acadêmico, ao menos em tese,
não pode ser o mero exercício de um niilismo intelectual, faz-se necessário
propor a solução dos problemas eventualmente encontrados, o que consiste em
tentar estabelecer um acordo sobre o sentido da “constitucionalização do Direito
Civil”. O interesse em se atingir esse objetivo, por sua vez, não é alienado da
estrutura desta tese. Saber o que é “constitucionalização do Direito Civil”
termina por ser uma tarefa essencial para a compreensão do estatuto
epistemológico e dos limites dogmáticos do Direito Civil na contemporaneidade.

497 Gustavo Tepedino (Editorial: Vinhos novos para odres novos: tributo a Antonio Junqueira de
Azevedo. Revista Trimestral de Direito Civil – RTDC, v. 40, nº 10, p. IIIIV, out.dez. 2009. p. IV) tam bém se
refere a essa parábola, lembrando as lições de Antonio Junqueira de Azevedo: “Ao invocar trecho do
Evangelho de sua predileção (Marcos 2:2122), deixa o Professor Antonio Junqueira aconselhamento
precioso para o futuro do direito civil brasileiro: ‘Ninguém costura remendo de pano novo em veste
velha; porque o remendo novo tira parte da veste velha, e fica maior a rotu ra. Ninguém põe vinho
novo em odres velhos; do contrário, o vinho romperá os odres; e tanto se perde o vinho como os
odres. Mas põese vinho novo em odres novos’”.
498 A tradução para o português do primeiro capítulo do livro The New German Law of Obligations:

Historical and Comparative Perspectives foi publicada em: ZIMMERMANN, Reinhard. O Código Civil
alemão e o desenvolvimento do Direito Privado na Alemanha. Tradução, revisão e notas: Arthur
Maximus Monteiro, João Carlos Mettlach, Otavio Luiz Rodrigues Jr. e Jan Peter Schmidt. Revista de
Direito Civil Contemporâneo. vol. 12. ano 4. p. 317318, jul./set. 2017. Estas informações foram
reproduzidas na tradução, em nota de rodapé.
499 Cf.
SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito...esp. p. 17174; DIMOULIS, Dimitri;
MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 5. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: RT,
2014, p. 95114 (embora mais voltado ao conceito de eficácia dos direitos fundamentais em relação
aos particulares); DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos
fundamentais. Construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de con sumo. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 117; LEAL, Fernando. Seis objeções ao Direito Civil
constitucional. Direitos Fundamentais e Justiça, v. 9, no 33, p. 123165, out./dez. 2015 (embora seja um
trabalho mais voltado à crítica metodológica do Direito Civil Constitucional).
500 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O direito ontem e hoje: crítica ao neopositivismo constitucio nal e

à insuficiência dos direitos humanos. Revista do Advogado, v. 28, no 99, p. 714, set., 2008; CASTRO
JUNIOR, Torquato. Constitucionalização do Direito Privado e mitologias da legislação: Código Civil
versus constituição. In. SILVA, Artur Stamford da (Org.) O judiciário e o discurso dos direitos humanos.
Recife: EDUFPE, 2011. p. 5966; BORGES, Roxana Cardoso; LINS, Emanuel. Igualdade substancial e
autonomia privada no Código Civil brasileiro de 2002. In. SILVA, Rafael Peteffi da; AMUNÁTEGUI
RODRIGUEZ, Cristina. (Orgs.) III Encontro de Internacionalização do CONPEDI/ Universidad Complutense
de Madrid: Direito Mercantil, Direito Civil, Direito do Consumidor, Novas Tecnologias Aplicadas ao
Direito. Madrid: Ediciones Laborum, 2015, v. 8, p. 29; COSTA FILHO, Venceslau. Não mencione o
Código de Napoleão! Análise crítica da pesquisa no ambiente das pósgraduações em Direito Civil. In.
RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski; SOUZA, Eduardo Nunes de; BEZERRA DE MENEZES, Joyceane;
ERHARDT JUNIOR, Marcos (Orgs.). Direito Civil constitucional: A ressignificação da função dos
institutos fundamentais do Direito Civil contemporâneo e suas conse quências. Florianópolis:
Conceito, 2014. p. 609 ss; TIMM, Luciano Benetti. “Descodificação”, cons titucionalização e
reprivatização no Direito Privado: O código civil ainda é útil? The Latin American and Caribbean
Journal of Legal Studies, v. 3, fascículo 1, p. 127, 2008. p. 22; FIUZA, César. Direito Civil: Curso
completo...p. 145150; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um
caso de “constitucionalização” do Direito Civil...cit.
501 Particularmente, a obra pioneira de Virgílio Afonso da Silva (A constitucionalização do Direito
Privado...cit.), que, para além de seus méritos intrínsecos, optou por um caminho honesto inte-
lectualmente ao não defender a “colonização” do Direito Privado pelo Direito Constitucional.
502 A distribuição temporal dos dados é esta (ano e número de artigos): a) 2010 até agora (48); b) 2005 a

2010 (26); c) 2000 a 2005 (24); d) 1990 a 1999 (24); e) 1980 a 1989 (5); f) 1970 a 1979 (1); g) 1960 a 1969
(1); h) 1950 a 1959 (1).
503 CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und Privatrecht, 1999...cit. p. 1011.
504 Háevidentemente vários formalismos e igualmente diversas acepções de formalismo. O combate ao
formalismo, não raramente, conduziu a críticas baseadas em argumentos caricatos, como os que se
encontram à obra de Hans Kelsen, muito apropriadamente denominado de “o formalista expiatório”,
em um belo trocadilho, por Fernando Leal (O formalista expiatório: leituras impuras de Kelsen no
Brasil. Revista Direito GV, v. 10, no 1, p. 245268, jan./jun. 2014).
505 No Evangelho de S. Mateus (VI, 12) está a condenação àqueles que apenas fazem justiça diante de
outros homens, para serem vistos e elogiados, bem assim os que fazem “tocar trombetas na frente”
quando dão esmolas. Ainda em S. Mateus (VI, 34), podese encontrar a célebre recomen dação sobre a
forma correta de se fazer a caridade: “Ao contrário [dos hipócritas], quando você der esmola, que a
sua esquerda não saiba o que a sua direita faz, para que a sua esmola fique escondida; e seu Pai, que
vê o escondido, recompensará você”.
506 “Do ponto de vista antropológico, em segundo lugar, o homem não é ‘uma mente’, que tem um

corpo; ele todo é corpo. O racionalismo iluminista, que deu origem à concepção insular, corres ponde
visualmente à figura do homem europeu: o terno que veste deixalhe à mostra somente a cabeça e as
mãos (= razão + ação, ou vontade); o resto do corpo é a parte oculta do iceberg a natureza física, cuja
essência, no homem, aquela filosofia ignora. Essa parte do corpo (entre pa rênteses, observamos que
insensivelmente o ‘corpo’ é pensado por nós muitas vezes à europeia como a parte de nosso ser que
não é a cabeça), essa parte do corpo, repetimos, é considerada uma ‘máquina’ ou um ‘mecanismo’
tido pela mente. (...) O presente texto resulta de comunicação feita em congresso realizado em Ouro
Preto, onde há, em algumas igrejas, ‘santos de roca’ da época do Iluminismo; essas imagens também
servem muito bem para ilustrar a concepção insular da pessoa humana: somente têm cabeça e mãos,
o resto é ‘roupa’. Não deixa de ser curioso observar como essas imagens não são apreciadas pelos
brasileiros. É claro – elas não correspondem à nossa formação africana e indígena, que valoriza o
corpo e a vida” (JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Caracterização jurídica da dignidade da pessoa
humana. In. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Estudos e pareceres de Direito Privado. São Paulo:
Saraiva, 2004. p. 56 e nota de rodapé 4).
507 “Os sabinianos julgavam que o novo produto deveria pertencer ao dono da matériaprima, por que
sine materia nulla species effici potest. Os proculianos defendiam a tese contrária pois, se gundo êles, a
propriedade da coisa pertenceria ao especificador quia quod factum est autem nullius fuit. De acôrdo
com a doutrina dêstes últimos, o trabalho era um modo de aquisição da propriedade. Alguns
romanistas acham que a tese dos sabinianos recebera influência da escola estóica, que imprimia
grande importância à essência das coisas, ao passo que os proculianos se inspiravam nas idéias da
escola aristotélica, que dava maior importância à forma da coisa” (LONDRES DA NÓBREGA, Vandick.
História e sistema do direito privado romano. 3. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1962. p. 252253). Cf.
também KASER, Max. Direito privado romano...p. 158 (reconhecendo a influência, sobre esses casos,
muito mais de doutrinas filosóficas do que de critérios práticos).
508 CARVALHO SANTOS, João Manuel de. Código Civil brasileiro interpretado (principalmente do pon to-

devista prático). 9. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1961. v. VIII (direito das coisas). p. 271.
509 CARVALHO SANTOS, João Manuel de. Código Civil brasileiro interpretado...cit. v. VIII. p. 272.
510 Com farta indicação bibliográfica sobre o tema e especial análise sobre a vida e obra de Guilherme de

Ockham (e sua complexa evolução intelectual): CANELLA, Giulio. Il nominalismo e Guglielmo d’Occam:
Studio critico di storia dela filosofia medievale (IX a XIV secolo). Firenze: Libreria Editrice Fiorentina,
1907. p. 164 ss. Cf. também, como obra mais geral: GILSON, Étienne. A filosofia na Idade Média.
Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 794816, com indicação
bibliográfica.
511 ECO, Umberto. O nome da rosa. Tradução de Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade.

Rio de Janeiro: O Globo, 2003. p. 3032.


512 Agostinho, bispo de Hipona, não observa o problema do tempo dentro de uma perspectiva on-
tológica, mas psicológica. A partir da especulação sobre o modo de apreender o tempo é que
formula a célebre passagem: “Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicálo clara e brevemente?
Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras, o
seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o do tem po?
Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem
quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o
quiser explicar a quem me fizer esta pergunta, já não sei. Porém, atrevome a declarar, sem receio de
contestação que, se nada sobreviesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não
existia o tempo presente” (SANTO AGOSTINHO. Confissões. Tradução do original latino por J. Oliveira
Santos e A. Ambrósio de Pina. 5. ed. Porto: Livraria Apostolado da Imprensa, 1955. p. 306. Confirase
também a nota I, dos tradutores, na mesma página).
513 KANT, Immanuel. Kritik der reinen Vernunft. Mit einer Einleitung und Anmerkungen herausgege ben

von Dr. Erich Adickes. Berlin: Mayer & Müller, 1889. p.7179 (espaço) e p.8088 (tempo).
514 KAUFMANN, Arthur. Analogía y naturaleza de la cosa: hacia una teoría de la comprensión jurídica.
Tradução de Enrique Barros Bourie. Santiago: Editorial Juridica de Chile, 1976. p. 12, nota 3.
515 O discípulo de Radbruch, Arthur Kaufmann (Filosofia do direito. Tradução de António Ulisses Cortês.

Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2004. p. 63 e 65), dá o tom sobre essa famosa “conversão” de seu mestre
e a polêmica em torno dela: “Na literatura sobre Radbruch surgiu uma forte con trovérsia sobre se na
sua vida e especialmente na sua filosofia jurídica existiu uma ‘ruptura’, ou mesmo uma ‘experiência
de Damasco’, ou se a transformação, nele indubitavelmente ocorrida e nunca por si negada, foi
apenas expressão de um desenvolvimento contínuo e ininterrupto. Mais claramente: tornouse o
outrora ‘positivista’ Radbruch um ‘jusnaturalista’ sob o impacto do Estado de nãoDireito do nacional-
socialismo? Há passos na obra de Radbruch com a quais se po deria comprovar tal ruptura. Mas
também se pode, sem dificuldade, invocar citações em sentido contrário (...). Por outro lado, mesmo
sob o influxo do Estado de nãoDireito, Radbruch não se desligou totalmente do positivismo jurídico.
Ele nunca sacrificou a segurança jurídica, como uma parte constitutiva da ideia de direito, a um vago
pensamento jusnaturalista E ainda: “Em Radbruch o direito justo apenas existe ‘aproximadamente’,
mas o ‘direito infame’ nunca foi por ele aceite, nem mesmo no seu período inicial. A teoria de
Radbruch acerca da nulidade da ‘lei injusta’, com que causou grande sensação em 1946, é
fundamentalmente uma consequência do seu, já antes formulado (nos Grundzügen de 1914),
conceito de direito; apenas mudou a acentuação: nos pri meiros tempos, ela radicava na segurança
jurídica, no período tardio, na justiça material”.
516 BVerfGE 7, 198.
517 KAUFMANN, Arthur. Analogia y naturaleza de la cosa...p. 91.
518 KAUFMANN, Arthur. Analogia y naturaleza de la cosa...p. 108.
519 BGH, j. 20.3.2002, XII ZR 176/00 (Jena), NJW 2002; BGH, j. 12.11.1997, IX ZR 274/96 (Hamm), NJW 1998,

894; BGH, j. 25.11.2009, XII ZR 92/06 (OLG Koblenz), NJW 2010, 998.
520
LEAL, Fernando. O projeto metodológico do não positivismo de Alexy. Quaestio Iuris. v. 10, no 1, p.
258273, 2017. p. 261262.
521 MACEDO JR., Ronaldo Porto. Do xadrez à cortesia: Dworkin e a teoria do direito contemporânea. São

Paulo: Saraiva, 2013. p. 22, nota de rodapé 16.


522 LEAL, Fernando. O projeto metodológico do não positivismo de Alexy...p. 258 (em referência aos
dizeres de Robert Alexy em uma de suas aulas).
523 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito: temas e desafios. Tradução de Candice Premaor

Gullo. Revisão da tradução por Silvana Cobucci Leite. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
524 “Nas últimas décadas, a multiplicação das publicações, em todos os campos do saber, acompa nhou
a fragmentação das correntes tradicionais de pensamento. Outro multiplicador do saber foi sua
internacionalização, que hoje obriga todo estudioso a examinar também textos em idiomas
estrangeiros. Disso resulta uma série de escolas, correntes, tendências e muitas vezes de modis mos
que se entrecruzam e complicam tanto o acesso ao saber quanto a classificação dos fragmen tos que,
com frequência crescente, chovem sobre a escrivaninha de quem estuda. A filosofia do direito não
fugiu a esse destino comum” (LOSANO, Mário. Prólogo à edição brasileira. In. FARALLI, Carla. A
filosofia contemporânea do Direito...cit. p. IX).
525 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 120.
526 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 2125.
527 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 2731.
528 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 3235.
529 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 3537.
530 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 3740.
531 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 4041.
532 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 4356.
533 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 5455.
534 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 5766.
535 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 6773.
536 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 7378.
537 FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do Direito...p. 7883.
538 Sobre a dificuldade de se caracterizar o neoconstitucionalismo, ora entendido como movimento,
teoria jurídica, corrente de pensamento ou metodologia interpretativa, sem que haja coerência ou
rigor em tais acepções: DREHMER DE MIRANDA, Roberta. A "reinvenção" do direito alternativo:
neoconstitucionalismo, garantismo penal e "direito das minorias". Porto Alegre: S.A. Fabris, 2014, esp. p.
136138.
539 CARBONELL, Miguel; GARCIA JARAMILLO, Leonardo. El canon neoconstitucional. Madrid: Trotta, 2010;

HESPANHA, António; BELEZA, Teresa (Orgs.). Teoria da argumentação e neoconstitucionalismo.


Coimbra: Almedina, 2011.
540 Em um sentido aproximado, com foco nos problemas criados pela má recepção do neoconstitu-

cionalismo no Brasil: “Nesse sentido, tornase necessário afirmar que a adoção do nomen juris
‘neoconstitucionalismo’ certamente é motivo de ambiguidades teóricas e até de malentendidos”
(STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso. 5. ed. revista, modificada e ampliada. São Paulo: Saraiva,
2014. p. 46).
541 Em língua portuguesa, com um viés crítico em relação ao neoconstitucionalismo: MORAIS, Carlos
Blanco de. O controlo de inconstitucionalidade por omissão no ordenamento brasileiro e a tu tela
dos direitos sociais: um mero ciclo activista ou uma evolução para o paradigma neoconsti-
tucionalista? Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 20, no 78, p. 153227, jan./mar. 2012;
STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso...cit. p. 4547; GALVÃO, Jorge Octávio Lavocat. O
neoconstitucionalismo e o fim do Estado de Direito. São Paulo: Saraiva, 2014; DIMOULIS, Dimitri. Crítica
do neoconstitucionalismo. Revista do Programa de Pós-graduação em Direito da UFBA, no 22, p. 179-
203, 2011; ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Princípios e retorno do pêndulo: crítica ao cha mado
neoconstitucionalismo. Interesse público, v. 16, no 87, p. 6367, set./out. 2014; DREHMER DE MIRANDA,
Roberta. A "reinvenção" do direito alternativo: neoconstitucionalismo, garantismo penal e "direito das
minorias"...cit., esp. p. 136145 (demarcando o neoconstitucionalismo como um sucessor do programa
políticojurídico do “direito alternativo”); ÁVILA, Humberto. “Neoconstitucionalismo”: entre a “ciência
do direito” e o “direito da ciência”. Revista Brasileira de Direito Público - RBDP, v. 6, nº 23, p. 9 30,
out./dez. 2008. Em espanhol: GARCÍA AMADO, Juan Antonio. Derechos y pretextos. Elementos de
crítica del neoconstitucionalismo. In. CARBONELL, Miguel (Ed). Teoría del neoconstitucionalismo:
Ensayos escogidos. Madrid: Trotta, 2007. p. 237264; PRIETO SANCHÍS, Luis. Justicia constitucional y
derechos fundamentales. Madrid: Trotta, 2003. p. 101 e ss.
542 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O direito ontem e hoje: crítica ao neopositivismo constitucio nal e

à insuficiência dos direitos humanos. Revista do Advogado, v. 28, no 99, p. 714, set., 2008; SILVA,
Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito...cit.; RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial:
Parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 279 (um texto forte, que conside ra o
neoconstitucionalismo um “modismo intelectual”); BERCOVICI, Gilberto. Die dirigierende Verfassung
und die Krise der Verfassungslehre am Beispiel Brasiliens. Verfassung und Recht in Übersee -VRÜ...cit.;
AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Constitucionalismo e neoconstitucio nalismo: O
constitucionalismo. In. FRANCISCO, José Carlos (Coord.). Neoconstitucionalismo e atividade
jurisdicional: do passivismo ao ativismo judicial. Belo Horizonte: Del Rey, 2012; ÁVILA, Humberto.
“Neoconstitucionalismo”: entre a “ciência do direito” e o “direito da ciência”... cit.; RODRIGUES JR.,
Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito civil contemporâneo na tradição de civil law em face
do neoconstitucionalismo e dos princípios...p. 5663.
543 Cf. SPLICIDO, Christiane. A validade do princípio da dignidade da pessoa humana e o póspositi vismo.

Revista Direito e Práxis. v. 3, no 4, p. 7495, 2012; MAIA, Antonio Cavalcanti. Sobre a teoria
constitucional brasileira e a Carta Cidadã de 1988: do póspositivismo ao neoconstitucionalismo.
Revista Quaestio Iuris, v. 4, no 1, p. 186, 2011; BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e
filosóficos do novo Direito Constitucional brasileiro: (pósmodernidade, teoria crítica e póspo-
sitivismo). Interesse público, v. 3, no 11, p. 4273, jul. 2001; GUERRA FILHO, Willis Santiago. Pós-
modernismo, póspositivismo e a Filosofia do Direito. Nomos: Revista do Curso de Mestrado em Direito
da UFC, v. 15, no 1/2, p. 1317, jan./dez. 1996. (Os autores citados não necessariamente apoiam ou
enaltecem o póspositivismo nestes textos.)
544 Em alguns acórdãos, evidenciamse as “possibilidades” hermenêuticas em nome do pósposi tivismo:
“as assertivas de que a Constituição Federal faz expressamente constar todas as hipó teses de
imprescritibilidade, sendo que, dentre elas, não está prevista a indenização pelos atos praticados no
regime de exceção, é inarredável. Sucede que essa questão deve ser relegada a segundo plano, já
que a nova ordem de interpretação principiológica da Lei Fundamental, à luz do póspositivismo,
sinaliza que a solução do litígio, principalmente em se tratando de direitos fundamentais, deve estar
voltado para a quaestio apresentada, e não para a norma em si” (STJ. AgRg no REsp 1056333/RJ, rel.
Min. Denise Arruda, rel. para o acórdão Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j. 25/05/2010, DJe
18/06/2010); Rcl 11243, rel. Min. Gilmar Mendes, rel. para o acórdão Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j.
08/06/2011, DJe191 5102011, RTJ 2221/184 (com a defesa da tese de que o “póspositivismo jurídico”
não admite mais o reconhecimento de uma “autêntica dicotomia entre atos vinculados e
discricionários, mas, isto sim, em diferentes graus de vinculação dos atos administrativos à
juridicidade”); STJ. REsp 1111743/DF, Rel. Min.Nancy Andrighi, rel. para o acórdão Min. Luiz Fux, Corte
Especial, j. 25/02/2010, DJe 21/06/2010; STJ. EDcl AgRg no Ag 886.162/PR, rel. Min. José Delgado, rel.
para o acórdão Min. Luiz Fux, Primeira Turma, J. 18/12/2007, DJe 04/09/2008.
545 MACCORMICK, Neil. Institutions of law. Oxford: Oxford University, 2007. p. 278.
546 MÜLLER, Friedrich. Teoria estruturante do direito I. Tradução de Peter Naumann e Eurides Avance de
Souza. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, passim.
547 ENGLE, Eric. Post Positivism. Berlim: Duncker & Humblot, 2014. p. 4564, teoria jurídica em Aristóteles;

p. 6575, Escolástica e o problema dos “universais”; p. 86108, o problema do Direito Natural; p. 124137,
teorias contratuais sociais contemporâneas (Dworkin e Rawls); p. 137147, libertários; p. 155179,
realismo jurídico; p. 225236, Law and Economics; p. 264286, Kelsen.
548 Em sentido aproximado: “Não é difícil perceber que, em países como o Brasil, houve uma espécie de
mixagem entre a incorporação da jurisprudência de valores e um certo positivismo sociológico, tudo
entendido como sendo ‘póspositivismo’ – ou seja, pensando que o positivismo era simples mente
igualar Direito e Lei, parte da comunidade jurídica passou a colocar no patamar da crítica qualquer
perspectiva que pudesse ultrapassar a ‘letra da lei’ (como se essa fosse dotada de um ‘mal em si’)”
(STRECK, Lenio Luiz. 30 anos da CF em 30 julgamentos: uma radiografia do STF. Rio de Janeiro: Forense,
2018. p. 269).
549 Evidentemente que há exceções na doutrina brasileira: cf. trabalhos que utilizam adequadamente o

conceito de póspositivismo: BUSTAMANTE, Thomas da Rosa. Sobre o caráter argumentativo do


direito: uma defesa do póspositivismo de MacCormick. Revista Brasileira de Estudos Políticos, nº 106, p.
263313, jan.jun. 2013; NERY JUNIOR, Nelson; ABBOUD, Georges. Noções fundamentais sobre pós-
positivismo e direito. Revista de Direito Privado, v. 14, nº 53, p. 1120, jan.mar. 2013.
550 STOLLEIS, Michael. Judicial interpretation in transition from the Ancien Régime to constitutiona lism.
In. MORIGIWA, Yasutomo; STOLLEIS, Michael; HALPÉRIN, JeanLouis (Eds.). Interpretation of the law in
the age of Enlightenment. From the rule of the king to the rule of law. Dordrecht, Heidelberg, London,
New York: Springer, 2011, p. 317, cit. p. 6; MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, barão de La
Brède e de. Oeuvres complètes: De l'esprit des lois (primeira parte). Prefácio de Georges Vedel.
Apresentação e notas de Daniel Oster. Paris: Éditions du Seuil, 1964. p. 589.
551 STOLLEIS, Michael. Judicial interpretation in transition from the Ancien Régime to constitutiona lism.

In. MORIGIWA, Yasutomo; STOLLEIS, Michael; HALPÉRIN, JeanLouis (Eds.)…p. 6.


552 STOLLEIS, Michael. Judicial interpretation in transition from the Ancien Régime to constitutiona lism.
In. MORIGIWA, Yasutomo; STOLLEIS, Michael; HALPÉRIN, JeanLouis (Eds.)…p. 7.
553 No acervo digital da Biblioteca Municipal de Viena encontrase a sentença de uma Corte Marcial de 25

de agosto de 1809, que condenou à morte oficiais intendentes da Guarda Imperial, cuja epígrafe é
“Em nome do imperador e rei” (disponível em:
https://www.digital.wienbibliothek.at/wbrobv/content/titleinfo/660264. Acesso em 422019). Outro
exemplo, extraído da Biblioteca Regional do Vêneto, é uma sentença do Tribunal Cível e Correicional
de Florença, de 1887, ini ciada com o estilo: “Em nome de Sua Majestade Humberto I, por graça de
Deus e pela vontade da Nação, rei da Itália” (disponível em:
http://binp.regione.veneto.it/SebinaOpac/resource/inno medisuamaestaumberto1pergraziadidioe-
pervolontadellanazionereditaliailtrinunal/ VIA2802246. Acesso em 522019).
554 Sobre a associação dos conceitos no Brasil: MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo e
teoria da interpretação. Revista da EMERJ, v. 11, no 43, p. 247268, 2008; SARMENTO, Daniel. O neo-
constitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais -
RBEC, v. 3, no 9, p. 95133, jan./mar. 2009. p. 113114. No Direito estrangeiro: GARCÍA FIGUEROA,
Alfonso. A Teoria do Direito em tempos de constitucionalismo. Revista Brasileira de Estudos
Constitucionais - RBEC, v. 1, no 4, p. 77102, out./dez. 2007. p. 83.
555 GALVÃO, Jorge Octávio Lavocat. O neoconstitucionalismo e o fim do Estado de Direito...p. 60.
556 POZZOLO, Susanna. Neoconstitucionalismo y especificidad de la interpretación constitucional.
Tradução de Josep M. Vilajosana. Doxa: Cuadernos de Filosofía del Derecho, no 21, fascículo 2, p. 339-
353, 1998. p. 339 e p. 340 342. A autora respondeu a seus críticos em: POZZOLO, Susanna. Metacritica
del neocostituzionalismo. Una risposta ai critici di “Neocostituzionalismo e positivis mo giuridico”.
Diritto & questioni pubbliche, v. 3, p. 5170, 2003.
557 HORBACH, Carlos Bastide. A nova roupa do direito constitucional: neoconstitucionalismo, pós-

positivismo e outros modismos. Revista dos Tribunais, v. 859, p. 8191, maio, 2007.
558 Essa abordagem de Carlos Bastide Horbach é muito parecida com a que adotou Stathis Banakas (The

constitutionalisation of Private law in the UK: Is there an emperor inside the new clo thes? In.
BARKHUYSEN, Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law. Leiden, Boston:
Martinus Nijhoff, 2006. p. 8396), ao comparar decisões seculares dos tribunais ingleses com decisões
do Tribunal Europeu de Direitos Humanos em matéria de direitos funda mentais.
559 HORBACH, Carlos Bastide. A nova roupa do direito constitucional: neoconstitucionalismo, pós-
positivismo e outros modismos...§ 3.
560 HORBACH, Carlos Bastide. A nova roupa do direito constitucional: neoconstitucionalismo, pós-
positivismo e outros modismos...§ 3.
561 Para uma crítica sistemática ao conceito de neoconstitucionalismo e sua recepção no Brasil: “O

Neoconstitucionalismo encontrase, então, em uma encruzilhada. Enquanto pretensão apre sentase


como um discurso totalizante, sendo um descendente direto do constitucionalismo dirigente, cujo
objetivo era preparar a transição para o socialismo. A ausência de um substrato normativo
semelhante transforma essa doutrina em um discurso vazio, desaguando numa das mais virulentas
versões do pragmatismo jurídico, em que nem as normas devem ser respeita das, nem há um rumo a
ser tomado, abrindose espaço para o arbítrio” (GALVÃO, Jorge Octávio Lavocat. O
neoconstitucionalismo e o fim do estado de direito...cit. p. 311).
CAPÍTULO SEXTO

O QUE NÃO É CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO


CIVIL

SUMÁRIO. § 28. Colocação do problema. § 29. Constitucionali zação


como “sobreinterpretação” ou reinterpretação das nor mas ordinárias a
partir da Constituição. § 30. Constitucionaliza ção como elevação da
dignidade da pessoa humana a elemento funcionalizante do Direito Civil.
§ 31. Constitucionalização como a colocação da Constituição no centro
do ordenamento jurídi co. § 32. Constitucionalização como controle de
constitucio nalidade e de interpretação constitucional das normas. § 33.
Constitucionalização como uso de cláusulas gerais e como “per turbação
das prestações”, sem relação direta com a Constitui ção. § 34.
Constitucionalização como interpretação progressista ou como
socialização do Direito Civil. § 35. Conclusões parciais.
§28. COLOCAÇÃO DO PROBLEMA
Descobrir o que é “constitucionalização do Direito Civil” implica antes
saber o que não é “constitucionalização do Direito Civil”. Há alguns modelos
teóricos que se propõem a explicar e delimitar esse conceito de
constitucionalização, que, não somente aqui, é objeto de toda sorte de
imprecisões. Apesar da possibilidade de alguma omissão, na literatura brasileira,
o único autor que apresentou tais modelos de forma sistemática foi Virgílio
Afonso da Silva.562 Essa circunstância só reforça a necessidade de que o
problema seja analisado por outros autores, particularmente por privatistas, dada
sua intensa vinculação com o Direito Civil.563
Embora ele já exista há mais de século, quanto a seus efeitos sensíveis, a
terminologia “constitucionalização do Direito”, segundo Louis Favoreu, não
teria mais do que 15 anos, sendo que sua afirmação é de 1996. Para ele, portanto,
o nascimento da expressão recairia em 1980, o que denota ser algo muito recente
sob qualquer óptica.564 No que respeita aos mencionados modelos, eles serão
examinados no Capítulo Sétimo. Entende-se, porém, que é necessário contribuir
para seu estudo no país sob a óptica da pré-exclusão conceitual. Mais importante
do que encontrar um modelo adequado é eliminar tudo o que não corresponda ao
conceito e que tem sido causa de enorme sincretismo metodológico. Se tudo é
constitucionalização, nada terminará por sê-lo. E isso não interessa nem aos
críticos sinceros dessa terminologia, muito menos a seus defensores honestos.
Os §§ deste capítulo objetivam examinar diferentes acepções da
constitucionalização do Direito Civil, encontradas na vasta literatura sobre o
tema. Após uma rápida apresentação da hipótese, tenta-se demonstrar sua
inadequação, seja por técnicas de contra-argumentação, seja por técnicas de
comparação com textos que definem idêntica qualidade ou característica
associando-as a outros conceitos, institutos ou categorias.
Ressalve-se que a enumeração de excertos não representa uma crítica aos
autores que formularam as concepções sobre constitucionalização do Direito
Civil abaixo reproduzidas. Em larga medida, essas citações tem a exclusiva
função de demonstrar a variedade conceitual sobre o tema, cuja responsabilidade
não é propriamente dos autores, constituindo antes um problema genético da
constitucionalização (como dito, não específico do Brasil) e da falta de acordos
semânticos mínimos sobre o que ela seja. O propósito deste capítulo, como já
assinalado, não é criticar e sim expurgar do conceito os elementos que não
servem para sua distinção de outros homólogos e preexistentes. Em síntese,
deseja-se evitar os transtornos da “metáfora das Ilhas do Canal”.
§29. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO “SOBREINTERPRETAÇÃO” OU
REINTERPRETAÇÃO DAS NORMAS ORDINÁRIAS A PARTIR DA
CONSTITUIÇÃO
Um dos primeiros sentidos que se atribui à constitucionalização é o de
permitir a “sobreinterpretação dos princípios jusfundamentais”, tida como
“característica mais importante do processo de constitucionalização do direito”,
o que implicaria interpretar as normas de direito ordinário à luz e a partir das
normas constitucionais.565
Sobreinterpretação é um neologismo criado por Riccardo Guastini,
aplicado ao texto constitucional, assim explicado por esse autor: “A
sobreinterpretação permite extrair do texto constitucional normas idôneas para
disciplinar qualquer aspecto da vida social e política”. Desse modo, “quando a
Constituição é sobreinterpretada não restam espaços vazios de – ou seja, ‘livres’
do – Direito Constitucional: toda decisão legislativa é pré-disciplinada (talvez
também minuciosamente disciplinada) por uma ou outra norma constitucional.
Não existem leis que possam escapar do controle de legitimidade
constitucional”.566
Entre os dois autores citados (Eduardo Ribeiro Moreira e Riccardo
Guastini) já se observa alguma contradição ou ambiguidade. Sobreinterpretar
tanto implicaria interpretar o direito ordinário com base na Constituição,
quanto delimitar ex ante a “decisão legislativa” (seja lá o que isso signifique) por
uma norma constitucional.
Em ambos os sentidos, essa delimitação conceitual não é aceitável.
Primeiramente, o princípio da supremacia hierárquica da Constituição, ao menos
desde a República, é indiscutível no Brasil. Os civilistas, se não todos, a grande
maioria, nunca negaram esse princípio e, em diversos textos, trataram
adequadamente os efeitos de um novo texto constitucional sobre o Código Civil
e a legislação ordinária civilista, ao reconhecerem a necessidade de se admitir a
inconstitucionalidade, a não recepção ou a interpretação dessas regras em
obediência à Constituição. É evidente que os autores mais antigos não usaram de
expressões desenvolvidas na Teoria Constitucional alemã do segundo pós-
guerra. Eles, no entanto, nunca deixaram de reconhecer a supremacia hierárquica
e a obrigatoriedade da adequação interpretativa. Um exemplo extraído de obra
do século XIX, embora reeditada no Novecentos, está na distinção do desforço
possessório, prerrogativa conferida ao possuidor, que é esbulhado da coisa, de
“tomá-la por sua própria força e autoridade, contanto que o faça em ato
seguido”.567 Em nota de rodapé, na mesma página, Lafayette Rodrigues Pereira,
esclarece que esse conceito deriva das Ordenações (L. 4, T, 58, § 2), ressaltando
que ele se aplica a todos os casos de desforço, “porquanto por incompatível com
as teses fundamentais da nossa Constituição política, não prevalece mais a
distinção que fazia a citada Ord. entre pessoas de pequena condição e fidalgos e
cavalheiros para dar a estes maior espaço para o desforço”.568
De modo sistemático e exaustivo, demonstrou-se alhures que os principais
civilistas brasileiros do século XX, ao estudarem o direito de propriedade,
reconheceram os efeitos dos novos textos constitucionais quanto aos limites
externos ao exercício da propriedade ditados pelo elemento social.569 Lafayette
Rodrigues Pereira, Carlos Maximiliano, Virgílio de Sá Pereira, Clóvis
Beviláqua, Francisco Clementino de San Tiago Dantas, Waldemar Ferreira e
Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, para se limitar aos civilistas do período
anterior a 1988, nos termos da pesquisa já publicada, escreveram páginas
decisivas sobre o efeito das normas constitucionais ou da própria interpretação
autóctone do Direito Civil sobre o conceito de propriedade e seus limites
sociais.570 Como advertido no trabalho citado, a pesquisa foi exclusivamente
doutrinária, mas, por si só, já é um elemento convincente de que não se pode
denominar de “constitucionalização do Direito Civil” a interpretação de suas
próprias normas, especialmente as ordinárias, de acordo, nos limites ou em
conformidade à Constituição. Note-se que o instituto escolhido, o direito de
propriedade, é o mais referido em trabalhos sobre o individualismo ou o
patrimonialismo “exacerbado” do Direito Civil. Se nele não incidem tais
reservas por parte dos civilistas, o que se esperar de outros institutos ou figuras
jurídicas “existenciais”?
Uma conferência de Clóvis Beviláqua, proferida em janeiro de 1935, na
Casa de Juvenal Galeno, logo após a vigência da Constituição de 1934, é muito
útil à confirmação do postulado aqui defendido. Ao mencionar os efeitos da
nova Constituição sobre o Direito Privado, Beviláqua declara que “(…) o
Codigo Civil recebeu modificações ou confirmações directas, em logar de
repercussões logicas”. Os mais diversos campos do Direito Civil foram atingidos
pela CF/1934, ao estilo da resenha de Beviláqua, sobre a qual se anotarão apenas
alguns tópicos: a) a propriedade de empresas jornalísticas políticas ou noticiosas
por estrangeiros foi vedada pela CF/1934, a despeito da orientação do CC/1916,
de “sentido liberal”, porque não distinguia entre nacionais e estrangeiros para a
aquisição e o gozo dos direitos civis. Para ele, “ainda que se não pronunciem
conflictos, porque o Codigo Civil estará modificado, automaticamente, (...) a
differença de orientação é patente”; b) a CF/1934 alterou o regime da
responsabilidade civil do Estado em contraste com o art. 15 do CC/1916: agora
se estabeleceria a solidariedade entre o servidor causador do dano e a Fazenda
Nacional; c) “o conceito de propriedade se apresentava no Codigo Civil sob um
cunho algum tanto rígido, apesar da tentativa de o adaptar ás exigencias da vida
social, que propuzera o Projecto primitivo”. A CF/1934 “fixou a verdadeira
doutrina social da propriedade” ao adotar uma “formula feliz”, na medida em
que conjuga elementos sociais e individuais.571
Esse texto de Clóvis Beviláqua tem sido muito citado em trabalhos sobre
constitucionalização do Direito Civil, como se fosse o estudo precursor no Brasil
sobre a constitucionalização. É de se replicar com a pergunta de Carlos Bastide
Horbach sobre Carlos Maximiliano, o jurista de Santa Maria da Boca do Monte,
e o neoconstitucionalismo: seria o jurista de Viçosa do Ceará, sem o saber, um
defensor de uma certa ideia de constitucionalização do Direito Civil?
A resposta pode ser dada por outro civilista, Caio Mario da Silva Pereira,
em dois artigos também dos anos 1930, embora não sobre a Constituição de
1934, mas relativos à Constituição de 1937, do Estado Novo.572 No primeiro
artigo,573 Caio Mario da Silva Pereira dedica-se ao impacto dos arts. 16,574 inciso
XIV,575 XVI,576 XVII577 e XX,578 17,579 18,580 36581 e 37582 sobre o Direito Civil.
Enquanto que, no segundo texto,583 ele examina a influência dos arts. 2o,584
124,585 125,586 126,587 137,588 142,589 148590 e 152,591 CF/1937, sobre o Direito
Civil. Segundo Caio Mário da Silva Pereira, a CF/1937 imprimiu “ao nosso
regime político uma orientação ‘estatocrática’, por isso mesmo que aumenta a
força da organização estatal” e estabelece limites “à absorção avassaladora do
individualismo civil”.592 Sobre o direito de propriedade, ele informa que “a
promessa fantasista dos adeptos de Moscou seduz muitas vezes os espíritos
menos firmes”, daí ser necessário assegurar “ao indivíduo a propriedade desta, e
dos acessórios que lhe permitam explorá-la”. Quanto ao Direito de Família, após
descrever as ações e reações à introdução do divórcio no país, Caio Mário da
Silva Pereira anota qual foi a opção da CF/1937: “a Constituição agiu certo,
mantendo o casamento indissolúvel, porque o caráter espiritualista da nossa
educação moral não comporta a cindibilidade do laço nupcial”.593
É bem nítida a influência dos tempos históricos então vividos sobre
algumas das expressões utilizadas pelo autor nos dois artigos. Vivia-se o
momento imediatamente posterior à instituição do Estado Novo, com o rechaço
dos movimentos integralista e comunista, que tentaram derrubar o regime em
1937. Esse elemento contextual é importante, mas o núcleo do texto está no
reconhecimento de que a CF/1937 alterou profundamente o Direito Civil. Além
disso, a leitura permite constatar que não há uma conexão necessária entre essas
mudanças e o progressismo que geralmente se associa aos processos de
constitucionalização. Regimes ditatoriais também possuem constitutições e nem
por isso perdem sua natureza infame.
Tito Fulgêncio é outro civilista da primeira metade do século passado que
deve ser citado para demonstrar a naturalidade com que se entendia o papel da
Constituição como norma delimitadora dos espaços de aplicação e de
interpretação do CC/1916: “A Constituição Federal garante a propriedade em
toda a sua plenitude, necessidade econômica que isso é para as sociedades
civilizadas, de populações compactas, e o Código Civil de 1916 contém os
princípios de realização da promessa constitucional”.594
Sobreinterpretar ou reinterpretar normas de Direito infraconstitucional,
nomeadamente aquelas do Código Civil, tendo por norte a Constituição é
expediente ordinário no Brasil há várias décadas, antes mesmo do surgimento do
conceito de “constitucionalização do Direito”. Para se avançar no acordo
semântico, é necessário excluir essa acepção, sob pena de se transformar o
objeto deste capítulo em um “museu de grandes novidades”.
§30. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO ELEVAÇÃO DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA A ELEMENTO FUNCIONALIZANTE DO DIREITO
CIVIL
Constitucionalização do Direito Civil e dignidade da pessoa humana são
conceitos que se apresentam corriqueiramente em vários textos sobre o tema,
embora não sejam todos que explicitamente definam a constitucionalização
como um efeito do reconhecimento da dignidade humana. Revela-se nesta
segunda acepção a ideia de que constitucionalização do Direito Civil foi
“marcada pela ascensão da dignidade da pessoa humana a elemento
funcionalizante de toda a estrutura civilística”.595
Na literatura jurídica nacional, encontra-se hoje um pequeno número de
textos que põem em causa o uso abusivo da dignidade da pessoa humana no
Direito Privado.596 Na jurisprudência, o acórdão mais importante sobre os
excessos argumentativos quanto à dignidade humana foi julgado pelo STF, com
relatoria do min. Dias Toffoli, em cuja fundamentação ele deixou assentado que
“é necessário salvar a dignidade da pessoa humana de si mesma, se é possível
fazer essa anotação um tanto irônica sobre os excessos cometidos em seu nome,
sob pena de condená-la a ser, como adverte o autor citado,597 ‘um tropo oratório
que tende à flacidez absoluta’. E parece ser esse o caminho a que chegaremos, se
prosseguirmos nessa principiolatria sem grandes freios”.598
Todas essas críticas são mais do que adequadas. Esta parte da tese não é o
espaço apropriado para uma análise abrangente do conceito da dignidade
humana. O objetivo aqui deve ser limitado a um problema: é possível dizer que
constitucionalização do Direito Civil expressa-se pela “elevação da dignidade da
pessoa humana a elemento funcionalizante do Direito Civil”?
A resposta há de ser negativa. As razões para isso são de variada ordem.
A dignidade humana não é um conceito criado pelo Direito Constitucional,
antecedendo-o historicamente, na verdade. Giovanni Pico della Mirandola é
reputado como seu “criador”, ao desenvolvê-lo em seu Discurso sobre a
dignidade do homem,599 posto que esse tema não haja sido ignorado em obras
filosóficas ou teológicas como as de Boécio, Santo Tomás de Aquino600 e Santo
Agostinho. O essencial no Discurso de Giovanni Pico della Mirandola está no
antropocentrismo,601 um traço que se impregnou em toda a literatura filosófica
posterior, especialmente em Immanuel Kant, cujos vestígios se encontram até
aos dias atuais, inclusive no Código Civil, sob as vestes do “personalismo
ético”.602 Kant, no livro Metafísica dos Costumes, afirma que o homem é um fim
em si mesmo, isto é, um ente não precificável, o que se extrai de sua essência
como ser racional. A dignidade é seu valor intrínseco, e se projeta no
reconhecimento pela razão humana de uma lei instituída por ele mesmo, o que
pode ser visualizado na enunciação da segunda fórmula do imperativo
categórico.603
Essa concepção kantiana foi objeto de restrições de Antonio Junqueira de
Azevedo por se voltar para um suposto caráter autocentrado e autorreferente do
conceito de dignidade da pessoa humana, o qual se fundaria no “dualismo ‘corpo
e alma’, que provêm da filosofia moderna”, embora seja mal explicada a
“articulação entre os dois elementos”. Por essa razão, a partir do sentido atual de
dignidade da pessoa humana, “os animais não têm alma, nem muito menos o
restante da natureza, reduzido à condição de coisa pelo personalismo ético. A
ideologia da dignidade da pessoa humana como vem sendo sustentada não só
não corresponde ao conhecimento atual da ciência, que fornece à ética
fundamento biológico, como também não contribui para a mudança da
mentalidade coletiva que a defesa da vida exige hoje”.604
A “conspícua dignidade humana”, em termos de Direito Constitucional
positivo, só chegou aos ordenamentos jurídicos no século XX, e sua presença em
textos constitucionais não tem o efeito imunizante que muitos podem esperar.
Luís Roberto Barroso informa que as primeiras constituições a incorporá-la
foram a do México (1917) e a Constituição alemã de Weimar (1919), sendo que
“esteve presente em textos com pouco pedigree democrático, como o Projeto de
Constituição do Marechal Pétain (1940), na França, durante o período de
colaboração com os nazistas, e em Lei Constitucional decretada por Francisco
Franco (1945), durante a longa ditadura espanhola”.605 Ainda conforme Luís
Roberto Barroso, no segundo pós-guerra deu-se sua expansão para um número
não desprezível de constituições nacionais (Japão, Itália, Portugal, Espanha,
África do Sul, Brasil, Israel, Hungria e Suécia, dentre outras). Este complemento
de seu texto é muito oportuno para o que ora se expõe: “E mesmo em países nos
quais não há qualquer menção expressa à dignidade na Constituição, como
Estados Unidos e França, a jurisprudência tem invocado sua força jurídica e
argumentativa, em decisões importantes”.606
Seguindo-se tal ordem de ideias, não há margem para dúvidas quanto: a) ao
caráter precedente da dignidade humana, tanto em termos cronológicos quanto
em termos axiológicos, em relação aos textos constitucionais; b) a circunstância
de que sua presença ou sua ausência em norma constitucional expressa não é
garantia nem é impeditivo de sua utilização, mesmo por cortes constitucionais.
Não é garantia na medida em que uma constituição de um país totalitário poderia
muito bem incluí-la como vértice do sistema constitucional, sem que isso
signifique grande mudança na vida das pessoas, sujeitas que estarão ao arbítrio e
à barbárie de governos indiferentes à dignidade humana. E não é óbice a sua
observância, dado que países com larga tradição democrática, como Estados
Unidos e França, citados por Luís Roberto Barroso, ou o Reino Unido da Grã-
Bretanha e Irlanda do Norte, não a incluíram em seus documentos
constitucionais e nem por isso há déficit de proteção a seus cidadãos e súditos
por essa ausência.
A esse propósito, convém reproduzir aquilo que Anderson Schreiber, com
ironia, denominou de “vistosa afirmação”: “Para nós, o respeito aos direitos
humanos não nasce somente do mandamento da lei ou das declarações
internacionais, mas é resultante da nossa cristã e profunda convicção de que a
dignidade do homem representa um valor fundamental”. O autor desse hino à
dignidade humana chamava-se Jorge Rafael Videla (1925-2013), ditador
argentino de 1976 a 1981 e responsável por centenas de crimes hediondos. De
fato, “a surpreendente autoria revela como a invocação da dignidade humana em
um grau elevado de abstração assume pouco ou nenhum significado” e, com
identidade de razão, “seu uso indiscriminado pode conduzir à banalização de um
conceito que ocupa posição central na ordem jurídica contemporânea”.607
Em conclusão, é incompatível com a natureza da dignidade humana
mencio-ná-la como expressão, aspecto ou causa da constitucionalização do
Direito Civil. Podese dizer que a dignidade humana, ao menos no Brasil, foi
constitucionalizada expressamente em 1988, com sua inclusão de entre os
fundamentos da República (art. 1o, inciso III). Ela, no entanto, não precisava
dessa constitucionalização para ser o que é.
§31. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO A COLOCAÇÃO DA
CONSTITUIÇÃO NO CENTRO DO ORDENAMENTO JURÍDICO
A hierarquia das normas jurídicas é um dado quase axiomático do Direito
contemporâneo. É referido sem maiores explicações e quase sempre se utiliza da
figura de uma pirâmide para lhe dar uma carga imagética. Como bem ressalta
Gabriel Nogueira Dias, uma coisa é a hierarquia das normas, desenvolvida por
Hans Kelsen com base na obra de seu “genial discípulo”608 Adolf Julius Merkl,
outra coisa é a “classificação hierárquica das normas de um ordenamento
jurídico”, a qual “remonta certamente à Antiguidade e à Idade Média”, como se
depreende das leis divina, eterna, natural e positiva, de claro sabor teológico.609
Como afirma Virgílio Afonso da Silva, ao se estudar a constitucionalização do
Direito, a referência ao fato de que “a constituição ocupa o topo da pirâmide
normativa”, com a natural decorrência de que as demais normas jurídicas hão de
lhe ser subordinadas, é “trivial e genérico demais para ter alguma força
explicativa acerca da relação da constituição com os outros ramos do direito”.610
Assim, salvo se o objetivo for explorar a literatura jurídica do século XIX,
não há como defender que, especialmente após os anos 1920, alguém
considerasse possível o Código Civil contrariar uma norma constitucional, seja
diretamente por ação do legislador, seja por meio de interpretações que
ignorassem ou violassem o texto constitucional.611 Outra decorrência lógica
dessa observação está em que, uma vez definida a posição hierárquica da
Constituição no sistema de fontes (algo que tem, como dito, sabor medieval) e
no sistema jurídico (algo mais “moderno”), seria inimaginável que um civilista
(um penalista, um administrativista ou um comercialista) dissesse algo como “o
Código Civil é central no ordenamento jurídico ou no sistema de fontes”. Ad-
mitindo-se que tal afirmação é de natureza aberrante, não seria esperável que
alguém, a partir do postulado não contrariável da supremacia hierárquica da
Constituição, dele extraísse um discurso que legitimasse, explicasse ou
fundamentasse a “constitucionalização do Direito Civil”.
Muito bem, não é o que ocorre. A centralidade constitucional no
ordenamento jurídico (ou de entre as fontes do Direito) é mencionada, com não
rara frequência, como uma das acepções da “constitucionalização do Direito
Civil”. Diz-se que o Código Civil “perdeu o caráter de centro do sistema de
fontes que antigamente possuía”, tendo sido substituído pela Constituição,
“norma hierarquicamente superior”.612
Associando a constitucionalização ao neoconstitucionalismo, o que
também não é invulgar, encontram-se textos sobre a “constitucionalização do
Direito de Família” como um “estágio” do neoconstitucionalismo, responsável
por incutir “no centro normativo a Constituição, “que por sua vez, passou a
exigir o respeito incondicional aos direitos fundamentais”.613
Essa afirmação não se confina aos limites da dogmática, mas também é
reproduzida em alguns acórdãos brasileiros.614
Não se pode atribuir às fontes citadas uma crença na elevação da
Constituição ao centro do ordenamento jurídico como se tratasse de um
momento de epifania jurídica ocorrido após 1988. A maior parte dos juristas,
com certeza, compreende os mecanismos da hierarquia das normas e a posição
de preeminência hierárquica da Constituição. Alguns não consideram que essas
premissas também são conhecidas e aceitas no Direito Civil há tanto tempo
quanto os constitucionalistas as conheciam e as aceitavam. O mais provável é
que esses autores tenham sido contaminados pela empolgação de um discurso
que, por sua ductilidade e plasticidade, parece inibir a formação de juízos
críticos sobre seu conteúdo. Mais ainda, por veicularem elementos metajurídicos
extremamente simpáticos a qualquer ser humano, são de difícil combate, salvo
se o antagonista assumir o risco de ser (indevidamente) acusado de insensível,
antissocial, individualista e outros adjetivos semelhantes.615
Nunca faltou aos civilistas, mesmo do século XIX, a noção de que “sob o
impulso das paixões e interesses pessoaes o homem coloca-se em contradicção
com o direito, e exorbita das rais da liberdade jurídica”. Cabe ao Estado,
“restabelecer a ordem perturbada, e restituir ao direito a sua existencia e o seu
imperio contestado”, porque só este “póde exercer com segurança esta grande e
espinhosa missão, confial-a aos indivíduos fôra sujeital-a aos azares da força e
substituir uma violencia a outra violencia”. É “esta a principal missão do
Estado”. E, “definida assim a influencia do Estado no direito privado, e
especialmente no civil, é lógica a consequência do direito publico interno sobre
este”. Em conclusão, “é evidente que o diverso modo porque o Estado fôr
constituido hade necessariamente influir sobre a natureza, a extensão e a
segurança dos direitos civis”.616
“A Constituição é a lei básica da organização política. Nos governos
presidenciais, essa predominância da Constituição tem um caráter mais
imperioso. Por isso, o poder judiciário é chamado a velar por sua
inviolabilidade”, por meio da declaração de ineficácia dos atos que lhes sejam
ofensivos. Essas afirmações são de Clóvis Beviláqua e se põem em coerência
com o estado-da-arte da matéria, não só dentre os civilistas, no início do século
XX.617
Carlos Maximiliano, na primeira edição de seu livro sobre Hermenêutica
Jurídica, de 1925, há quase cem anos, afirmava que a Constituição era uma lei
que possuía “mais força do que as outras às quais sobreleva de caso de
conflito”.618 Em 1929, agora sob as vestes do comentador da CF/1891, o mesmo
Carlos Maximiliano pronunciava, a respeito do CC/1916, que “a lei ordinária
não pode ficar em desacordo com a fundamental”. Essa assertiva era lançada no
contexto da interpretação do art. 591, CC/1916, em face do art. 80, CF/1891. O
texto da constituição republicana, dispunha que “no estado de sítio”, eram
impostas exclusivamente “restrições quanto às pessoas”. De tal modo que
“cessam, em absoluto, as garantias constitucionais referentes às coisas, logo
desaparece a cláusula da indenização prévia”. O art. 591, CC/1916, era mais
abrangente ao prever que “em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção
intestina, usem os bens dos particulares as autoridades, obrigadas, entretanto, a
ressarcir o prejuízo dos detentores, posteriormente”. O texto constitucional,
quanto ao estado de sítio, era mais restritivo que a lei ordinária. Os bens dos
particulares, em caso de estado de sítio, não seriam ressarcíveis, segundo o autor,
se o Estado os requisitasse.619 Poder-se-ia até discutir se a proteção
constitucional era menos abrangente do que a prevista no CC/1916, o que dá
margem a um cotejo axiológico entre as duas espécies normativas, com clara
prevalência para o Código Civil. Não é este, porém, o objetivo desta seção.
Basta demonstrar que não se pode confundir a constitucionalização do Direito
Civil com o reconhecimento da primazia hierárquica constitucional.
Para concluir este § 31, cita-se um clássico da literatura autoralista da
primeira metade do século XX.620 Em seu livro, Pedro Orlando examinou um
parecer do diretor da Casa Rui Barbosa, Américo Lacombe, de 31 de outubro de
1939, que analisou, a pedido do ministro de Estado da Educação e Saúde, a
seguinte questão jurídica: uma editora comercial indagou ao ministro se seria
autorizada a reedição de duas obras de Rui Barbosa, a Oração aos moços e O
discurso no Colégio Anchieta (“Palavras à Juventude”), as quais seriam
vendidas “a preços populares, em pequenos volumes de cem páginas
aproximadamente”.621 O diretor da Casa Rui Barbosa, em sua manifestação,
pesquisou os atos legislativos que tratavam da “aquisição, pelo governo, dos
direitos autorais das obras” de Rui Barbosa, tendo encontrado o Decreto
Legislativo no 4.789, de 2 de janeiro de 1924, em cujo art. 1o se autorizou o
Poder Executivo a “adquirir: ‘a propriedade intelectual das obras do eminente
brasileiro’”. Como salientou o parecerista, a “aquisição não tinha por fim
unicamente indenizar os seus herdeiros”, com o objetivo de que a obra caísse em
domínio público, mas ainda o de atribuir ao Estado brasileiro “os respectivos
direitos autorais”.622
Américo Lacombe, na sequência, passa a examinar a legislação brasileira
sobre direitos autorais. Matéria tratada inicialmente no Código Criminal do
Império, ela foi “constitucionalizada” em 1891, com a primeira constituição da
República, que, em seu art. 72, § 26, dispôs que se assegurava aos autores de
“obras literárias e artísticas” o “direito exclusivo de reproduzi-las pela imprensa
ou por qualquer outro processo mecânico”. O legislador ordinário foi chamado a
regulamentar o dispositivo constitucional, tendo-o feito pela Lei Medeiros (Lei
no 496, de 1o de agosto de 1898). Américo Lacombe, ao examinar a relação entre
a lei e a Constituição de 1891, avançou que a Lei Medeiros contrariou a “própria
determinação constitucional que ela vinha completar”. A dúvida suscitada pelo
parecerista consistia na natureza dos direitos autorais, se enquadráveis ou não no
conceito de direito de propriedade. Em outra passagem, ele menciona o art. 13
da Lei Medeiros, que torna “indispensável para entrar no gôzo dos direitos do
autor” a formalidade consistente no “registro na Biblioteca Nacional” da obra.
Ao contrapor a exigência do registro, tal como em lei prevista, o diretor da Casa
Rui Barbosa declara que: “Não há a menor dúvida que a Lei Medeiros exorbitou
criando o registro como origem do direito”, o que seria uma hipótese de
inconstitucionalidade.623 O parecer concluiu ser possível autorizar, a título
excepcional, a publicação “isolada de algumas obras menores” do jurista e
senador, desde que condicionada ao placet do Governo, ouvida a Casa Rui
Barbosa, que deverá examinar as provas da edição e receber 200 exemplares “a
fim de distribuição às bibliotecas brasileiras”. Afinal, não haveria
“inconveniente, senão vantagem” na divulgação das obras de Rui Barbosa.624
Toda a argumentação de Américo Lacombe é fundamentada em citações de
Clóvis Beviláqua e João Barbalho Uchôa Cavalcanti, respectivamente os
primeiros comentaristas do Código Civil de 1916 e da Constituição de 1891,
além de Armando Vidal, Visconde de Carnaxide (autor de um clássico tratado
sobre a propriedade literária e artística), Filadelfo Azevedo (civilista e futuro
ministro do STF, além de autor de um anteprojeto de Código das Obrigações na
década de 1940), e de sentenças judiciais do período. Mais do que isso, é
louvada em dispositivos da Constituição e do Código Civil, que são
interpretados sempre tendo em vista a conformidade do segundo com a primeira,
como fator de correção da norma ordinária. Encerra-se o comentário desse
interessante parecer com a transcrição de parte da sentença625 do juiz de direito
Vítor Manuel de Freitas, de 7 de junho de 1921, citada no livro de Pedro
Orlando, com o seguinte teor: “Aliás esse preceito (o registro) pecava
diretamente contra a Constituição, art. 72, § 26, que assegurava, aos autores, o
direito exclusivo de reproduzir as suas obras literárias e artísticas,
independentemente de qualquer formalidade...”.626
A centralidade da Constituição no ordenamento jurídico era admitida no
século XIX, mas sem grande rigor metodológico. O Direito e a Teoria do Estado
ainda se formavam; a rigidez constitucional era um conceito ainda carente de um
desenvolvimento adequado, a se ver pelas constituições flexíveis ou semirrígidas
como a britânica e a brasileira de 1824; não havia tribunais constitucionais no
sentido moderno, posto que existissem interessantes experiências como o
Conselho de Estado imperial no Brasil. Encontrar a reverência do direito
ordinário à Constituição em obras de civilistas do século XIX, como se
identificou nesta tese, é algo muito revelador da postura aberta da doutrina
(embora não necessariamente da jurisprudência) aos influxos constitucionais no
Direito Privado.
A consolidação da centralidade constitucional no século XX é, sobretudo,
uma obra de Hans Kelsen e de seu Positivismo jurídico. As ideias de supremacia
constitucional e de hierarquia das normas devem muito a Kelsen (e a seu
discípulo Merkl), sendo que a primeira está hoje sob forte ataque na União
Europeia, graças aos avanços dos órgãos supranacionais. Kelsen teve a invulgar
capacidade de antever o dilúvio que cairia sobre a Humanidade no século XX.
Ele percebeu, antes que outros juristas, o fim do edifício histórico-jurídico
europeu, representado pela experiência austro-húngara (uma espécie de União
Europeia em miniatura, mas sem natureza democrática), e decidiu-se a recolher
os tesouros do pensamento jurídico e a organizar o Direito para o desastre que
chegaria, tão certo quanto a morte. Ter sido ele um vienense do fin de siècle, um
habitante da “monstruosa residência de um rei já morto e de um deus ainda por
nascer” ou do “laboratório do Apocalipse”, conferiu-lhe posição privilegiada
para construir um santuário das melhores tradições jurídicas europeias e, o mais
importante, para organizar todo aquele conhecimento em uma teoria que
permitisse ao Direito atravessar duas guerras mundiais, genocídios, fome e peste
em escala nunca antes vista. Apesar de suas fragilidades (v.g., sua teoria da
interpretação) e contradições (v.g., a cambiante “norma hipotética
fundamental”), são kelsenianas as estruturas que até hoje sustentam o Direito e o
Estado na maior parte do mundo. Um dos pilares desse edifício, que, como
explicado, já existia no Oitocentos, foi a colocação da Constituição no centro da
ordem jurídica.
Como se explorará mais adiante (vide §§ 37 e 69), a supremacia
constitucional não se confunde, de modo necessário, com a supremacia dos
valores. A concepção kelseniana sobre a natureza hierarquicamente superior da
Constituição nasceu da experiência austro-húngara. Como organizar, manter e
administrar uma monarquia dual, com ordens jurídicas reais, imperiais, reais-
imperiais e imperiais e reais, com 12 idiomas diferentes, 22 unidades políticas
mais ou menos autônomas, subordinadas à Áustria e à Hungria? Os conflitos
entre normas eram frequentes e o papel unificador do sistema recaia sobre o
imperador (e rei apostólico). A manutenção desse modelo exigiria que um
documento jurídico – a Constituição – ocupasse o lugar do imperador e, no lugar
do Exército (Real e Imperial), um tribunal constitucional assumisse o papel de
moderador dos conflitos federativos. Essas ideias foram levadas ao último
imperador por Kelsen, mas já era tarde demais. Na República da Áustria, nascida
das cinzas imperiais, após a horrenda Primeira Guerra Mundial, a teoria
kelseniana foi posta em ação, embora não originalmente (veja-se a experiência
checoslovaca de 1920). Razões de caráter histórico e pragmático explicam o
surgimento desse modelo, que não nasceu com pretensões de superioridade
axiológica.
O equívoco de se associar constitucionalização do Direito Civil à
supremacia constitucional é, portanto, de quatro ordens: a) histórica, como já
demonstrado na descrição de suas origens; b) doutrinária, pois nunca houve
contestação séria na dogmática do Direito Civil a seu caráter normativo
ordinário e à sua subordinação constitucional; c) prática, a Constituição como
centro da ordem jurídica foi um arranjo destinado a resolver problemas
federativos e de conflitos de fontes; d) metodológica, trata-se de uma afirmação
óbvia e tão genérica que impede a formação de um modelo de
constitucionalização nela baseado.
Mesmo nos Estados Unidos da América, com as peculiaridades de sua
ordem jurídica, é axiomática a prevalência da Constituição e a vinculação do
direito ordinário a seus preceitos, como demonstram os precedentes da Suprema
Corte norte-americana.627
A supremacia hierárquica da Constituição não é uma expressão da
“constitucionalização do Direito Civil”.
§32. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE E DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL
DAS NORMAS
Retoma-se aqui um argumento já examinado, que diz respeito à
interpretação constitucional como “constitucionalização do Direito”, mas
associado a outro, que diz respeito ao controle de constitucionalidade.
Há de se distinguir essas duas acepções, embora estejam conexas nas
fontes que as adotam. A primeira compreende o (i) controle de
constitucionalidade, a (ii) interpretação conforme a Constituição e (iii) a
declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, as duas
últimas são o resultado da ação criativa do TCF. Segundo parte da doutrina, “a
interpretação conforme à Constituição, ao contrário do que pode fazer supor o
seu nome, não constitui método de interpretação, mas técnica de controle de
constitucionalidade”. Por meio da interpretação conforme, impede-se “a
declaração de inconstitucionalidade da norma mediante a afirmação de que esta
tem um sentido – ou uma interpretação – conforme à Constituição”.628 A
segunda é a interpretação do direito ordinário baseada na Constituição.
Quanto à primeira acepção, Luís Roberto Barroso apresenta-a como efeito
da constitucionalização sobre os diferentes poderes do Estado. Sobre o legislador
e o administrador, até pela natureza desta tese, que se ocupa do Direito Civil,
não se irá examinar essa ordem de ideias. Quanto ao Poder Judiciário, diz Luís
Roberto Barroso que “a constitucionalização, no entanto, é obra precípua da
jurisdição constitucional” e que tem por finalidade realizar, de modo concreto, a
“supremacia formal e axiológica da Constituição”, o que “envolve diferentes
técnicas e possibilidades interpretativas, que incluem:

“a) o reconhecimento da revogação das normas infraconstitucionais anteriores à


Constituição (ou à emenda constitucional), quando com ela incompatíveis; b) a
declaração de inconstitucionalidade de normas infraconstitucionais posteriores à
Constituição, quando com ela incompatíveis; c) a declaração da
inconstitucionalidade por omissão, com a conseqüente convocação à atuação do
legislador; d) a interpretação conforme a Constituição, que pode significar: (i) a
leitura da norma infraconstitucional da forma que melhor realize o sentido e o
alcance dos valores e fins constitucionais a ela subjacentes; (ii) a declaração de
inconstitucionalidade parcial sem redução do texto, que consiste na exclusão de
uma determinada interpretação possível da norma – geralmente a mais óbvia – e
a afirmação de uma interpretação alternativa, compatível com a Constituição”.629

Tais delimitações encontram-se presentes em outras obras. Para esses


autores, o controle de constitucionalidade, a interpretação conforme à
Constituição e a declaração de inconstitucionalidade parcial apresentam-se como
mecanismos de constitucionalização do Direito (nisto incluído o Direito Civil).630
A segunda acepção é mais ampla e conecta-se parcialmente com o que se
estudou no § 29. É nesse campo que se alude à constitucionalização do Direito
Civil como: a) uma releitura do Código Civil e do direito privado ordinário “à
luz da Constituição”;631 b) uma forma de se interpretar a legislação civil
conforme a Constituição, quando esta “for claramente incompatível com os
princípios e regras constitucionais” e “for possível seu aproveitamento”. De
modo algum, “deverá ser adotada a disfarçada resistência conservadora, na
conduta freqüente de se ler a Constituição a partir do Código Civil”.632
Sobre o controle de constitucionalidade e as variantes da interpretação
conforme à Constituição, a maior parte delas desenvolvida na jurisdição
constitucional alemã e introduzidas no STF pelo min. Moreira Alves, é de se
supor que tal acepção haja sido empregada com mero conteúdo retórico para a
constitucionalização do Direito.633 Não se amoldariam exclusivamente a um
processo de constitucionalização do Direito, até porque todas essas espécies se
prestam a exercer um controle de validade das normas jurídicas ordinárias, que
toma como fator de correção interno a própria Constituição.634
No final do século XIX, já no período republicano, o STF “firmou o
princípio de que cabia ao Judiciário em todos os seus graus o poder de controle
de constitucionalidade das leis e dos atos administrativos nos casos concretos
que lhe fossem submetidos”. 635 Na vigência da Constituição de 1891, João
Barbalho Uchôa Cavalcanti, seu grande comentarista, reconheceu que o Poder
Judiciário republicano foi “investido do poder de conhecer igualmente da
legalidade da lei”. Não se julgou mais suficiente, em referência ao modelo
norte-americano, o controle dos atos parlamentares exercido pelo presidente da
República, por intermédio do veto, até porque este pode, “por erro ou má
inspiração”, “sanccionar lei contrária à Constituição” e, ainda assim, com o veto,
ainda resta às câmaras, por quórum qualificado, “manter a lei inconstitucional
vetada”. João Barbalho, recordando o precedente Marbury v. Madison,
considerado o case que fundou o controle de constitucionalidade incidental no
mundo, anota que é uma resultante natural da atividade judiciária “assegurar-se a
supremacia da Constituição sobre todas as leis e actos governamentais e de
administração”.636
Nas demais constituições brasileiras (1934, 1946, 1967/1969 e 1988), o
controle de constitucionalidade evoluiu ao se instituir o controle concentrado,
reduzir-se drasticamente o papel do Senado, embora previsto nas Constituições,
e ao se ampliarem ou se introduzirem formalmente na legislação os mecanismos
de jurisdição constitucional alemã no Direito brasileiro, ao exemplo da Lei no
9.868, de 10 de novembro de 1999. Disso resulta que não há como se admitir a
primeira acepção de “constitucionalização do Direito Civil” como uma forma
particular de todos esses processos de controle da validez do direito ordinário em
face da Constituição. É provável que os autores que desenvolveram tais teses
hajam se utilizado de expressões figurativas ou retóricas para dar uma carga
mais forte aos avanços da “constitucionalização”. Como o objetivo deste
capítulo é chegar a um acordo semântico sobre esse conceito, não haverá
prejuízos em se descartar essa acepção do rol de possíveis sentidos de tão
plurívoco termo.
Carlos Alberto Bittar foi um dos primeiros privatistas brasileiros que se
dedicou ao exame dos efeitos da CF/1988 sobre o Direito Privado. Quanto aos
efeitos da “reforma constitucional” sobre a “ordem jurídica anterior”, Bittar
destaca estes aspectos: a) a reforma constitucional revoga a ordem constitucional
pretérita; b) “novos princípios e novas regras” constituem-se “nos mandamentos
fundamentais da nova ordem jurídica”; c) em relação à “matéria constitucional”,
as inovações aplicam-se “imediatamente, tornando, sem efeito as normas
contrárias ou incompatíveis com o seu sistema”; d) quanto à “matéria não
constitucional”, essa aplicação “dependerá de adaptação, da legislação interna”;
e) haverá situações excepcionais, de vigência imediata ou diferida a certo prazo,
quando expressamente o constituinte dispuser em sentido diverso.637
Mesmo em face da interpretação conforme, formula-se uma restrição
teórica das mais severas a sua utilização em detrimento dos critérios e padrões
hermenêuticos do Direito Civil. Dito de outro modo, a interpretação conforme
não significa ignorar o Direito Civil e os métodos clássicos de interpretação. A
esse respeito, Paulo Bonavides acentua que “o método de interpretação
conforme a Constituição se distingue da interpretação usual num ponto básico, a
saber: o sentido da lei é extraído da própria lei. Desse modo deve-se recorrer ao
‘Verfassungskonforme Auslegung’ após o emprego normal dos métodos
clássicos”.638
Remanesce a segunda acepção, de interpretação do direito ordinário de
acordo com o texto constitucional. Dá-se aqui, identicamente ao que se exaltou
quanto à primeira acepção, que mesmo na literatura do início do século XIX já
se entendia que uma nova Constituição produziria efeitos sobre a legislação de
Direito Civil, obrigando o reconhecimento da não recepção de normas com ela
incompatíveis ou determinando que se interpretassem tais leis em conformidade
com as regras e os princípios constitucionais.
Os exemplos são copiosos e seriam dispensáveis de se relacionar. Essa
segunda acepção acha-se de tal maneira incorporada à linguagem dogmática e
aos julgados contemporâneos que se torna, porém, necessário enumerar algumas
obras, todas muito antigas, que põem em causa se a interpretação de normas
ordinárias à luz da Constituição é realmente uma forma de se
“constitucionalizar” o Direito Civil.
O art. 408 da Consolidação das Leis Civis definia que as “as questões sobre
o estado, e a idade, de estrangeiros residentes no Império, quanto á capacidade
para contractar, serão também reguladas pelas leis, e usos, dos paizes
estrangeiros”. Ao comentar esse dispositivo, Augusto Teixeira de Freitas foi
enfático ao afirmar que a nacionalidade não era uma “qualidade do estado civil”,
porque “pela Constituição do Império a nacionalidade entre nós é qualidade do
estado político”.639
Lourenço Trigo de Loureiro, ao examinar dispositivo das Ordenações (Liv.
4, tít. 81, § 4), que negava o poder de testar ao herege (“o que sustenta e propaga
por factos, ou por escriptos alguma opinião contraria á algum dos dogmas da
Religião do Estado”)640 e ao apóstata (“o que abandona a Religião do Estado
para abraçar outra”), afirma que ambos estão isentos dessa restrição, por efeito
da interpretação conjunta do “art. 5o641 e do art. 179, § 5,642 da Constituição do
Império”.643
Nas notas de atualização à obra de Lafayette Rodrigues Pereira, elaboradas
por José Bonifácio de Andrada e Silva, este último ressalta o impacto do art. 72,
§§ 4o e 7o, CF/1891,644 sobre o Direito Civil: “Da disposição constitucional – art.
72 § 4o – proveio a necessidade do Código Civil prescrever as formalidades para
o casamento civil, único que pôde produzir effeitos nas relações de família”.645
Nessa mesma obra, agora em passagem escrita pelo próprio autor, Lafayette
Rodrigues Pereira, comenta-se sobre os apanágios, rendas pagas à mulher do
nobre para a viuvez, e os alfinetes, pensões para enfeites e adornos, que lhe eram
mensalmente pagas. Essas rendas e pensões derivavam de leis extravagantes
portuguesas e só incidiam nos casamentos da nobreza. Segundo o autor, “esta
legislação cessou de vigorar no Império depois do juramento da Constituição
política do Império, a qual aboliu a odiosa distincção de fidalgos e plebeus, um
dos fundamentos do antigo regimen”.646 Exemplifique-se também a diferença de
tratamento dada à viúva pródiga, que foi mulher de desembargador ou cavaleiro,
a quem as Ordenações (Liv. 4, Tít. 107) concediam o privilégio de “não ser
privada administração dos seus bens pelas justiças da terra antes de o fazerem
saber ao Imperante, para mandar o que for direito sem escândalo de sua
geração”. Conforme a doutrina de Lourenço Trigo de Loureiro, ele entendia
revogada essa disposição “pelo art. 179, § 16 da Constituição,647 e
comprehendida a dita viuva na generalidade do principio da mesma
Ordenação”.648
Na jurisprudência do STF em matéria de Direito Civil, anterior à CF/1988,
encontram-se acórdãos com os seguintes conteúdos: a) “o direito de propriedade,
qual o conceitua o art. 122, no 14, da Carta Constitucional de 10 de Novembro de
1937, deve ser adaptado a necessidades e interesses sociais, não colidindo com o
art. 572 do Código Civil um decreto administrativo que visa a estimular as
construções que o proprietário pode levantar em seu terreno”;649 b) “o uso da
propriedade está condicionado ao bem-estar social. O vizinho de uma carvoaria,
em zona sem gás, não pode obrigar o fechamento da mesma, para não sofrer
nenhum inconveniente de sua proximidade”;650 c) é de se reconhecer a proibição
de despejo de estabelecimento de ensino que ocupa prédio locado, salvo por
violação de deveres contratuais, em razão da constitucionalidade de norma da
Lei do Inquilinato (Lei no 1.300, de 28.12.1950), pois se cuida de “restrição
imposta ao direito de propriedade, em homenagem à socialização do Direito
Civil hodierno. Pela própria Constituição, o uso da propriedade deve ser
condicionado ao bem-estar social (art. 147, [CF/1946])”.651
Os três acórdãos foram prolatados na vigência da CF/1937 e da CF/1946.
Servem ambos para demonstrar que a interpretação do Código Civil e da
legislação extravagante se dava em respeito aos valores constitucionais de cada
época. É sempre problemático argumentar com base na jurisprudência, como se
tem reiterado nesta tese, porque: (a) não há parâmetros objetivos de controle do
número de julgados e de sua publicação total (exceto os do STJ), o que abre o
flanco para eventuais críticas por acórdãos não citados ou desconhecidos; (b) a
jurisprudência reflete mais os valores de uma sociedade e os interesses do poder
dominante (ou dos grupos de pressão) do que a orientação da dogmática, como
se pode notar mais fortemente em questões de moral e costumes. Não deixa de
ser interessante, contudo, identificar em acórdãos do STF, pré-1988, uma
resposta objetiva ao tema da segunda acepção de constitucionalização: era algo
ordinário interpretar o Direito Civil em reverência ao texto das Constituições.
Agir desse modo não é constitucionalizar o Direito, mas tão-somente usar das
técnicas de controle da validade das normas pelo critério hierárquico. Outra
derivação útil desta pesquisa está em revelar (alguma) aderência do STF ao que
os autores mais importantes do Direito Civil pré-1988 compreendiam como
função social (ou interesse social) no direito de propriedade. Infelizmente, essas
eram (e continuam a ser) respostas jurídicas para problemas que possuem
natureza econômica e que, por essa razão, permanecerão irresolúveis (vide § 34,
sobre os limites da chamada “interpretação progressista” do Direito Civil).
A segunda acepção deve ser afastada do conceito de constitucionalização
do Direito Civil.
§33. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO USO DE CLÁUSULAS GERAIS E
COMO “PERTURBAÇÃO DAS PRESTAÇÕES”, SEM RELAÇÃO DIRETA
COM A CONSTITUIÇÃO
Essa aproximação conceitual da constitucionalização do Direito Civil tem-
se tornado mais frequente nos últimos 10 anos no Brasil, como se pode observar
da data das publicações com essa tendência.652 A introdução de figuras jurídicas,
doutrinas ou institutos como a violação positiva do contrato, o adimplemento
substancial, a quebra antecipada do contrato e o dever de mitigar os próprios
danos tornaram-se “provas evidentes” ou símbolos da constitucionalização do
Direito Civil. Por outro lado, cláusulas gerais como a boa-fé objetiva (e suas
figuras parcelares, como o venire contra factum proprium e o tu quoque) e os
bons costumes, em sua aplicação específica às relações negociais, teriam
idêntica função: servir de instrumentos “constitucionalizadores” do Direito
Civil.653
Quanto ao papel das cláusulas gerais como meios de irradiação dos direitos
fundamentais para casos específicos envolvendo particulares, disso se tratará
oportunamente na Terceira Parte. É um tema delimitado e muito particular, que
envolve a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos privados. Não
convém adiantar aqui esse debate, mas é certo que essa função é absolutamente
diversa da que se há conferido a essas cláusulas gerais. Servir como “centros de
irrupção” de direitos fundamentais é algo diferente de se utilizar a boa-fé
objetiva para alguma das funções de preenchimento de lacunas, correção de
normas e de controle do excesso no exercício de direitos.654 É o que os alemães
denominam de “metáfora dos feixes de luz (Lichtausstrahlung)”, que
atravessariam as fronteiras do Direito Constitucional e penetrariam no Direito
Privado, como se atravessassem frestas de uma janela, cuja abertura caberia às
cláusulas gerais.655 A doutrina portuguesa, no que é acompanhada da brasileira,
reconhece esse papel às cláusulas gerais de tipo extensivo, “que asseguram, aos
seus destinatários, a tutela prevista em acordos e tratados internacionais e na
legislação ordinária”, além, é evidente, da Constituição.656
Tal função de abertura, contudo, não significa que as cláusulas gerais
constitucionalizariam de per si o Direito Privado. Mesmo na atualidade,
especialmente após as últimas mudanças no BGB, assiste-se a uma redução à
“área de atuação funcional” (Funktionsbereich) do § 242, BGB, dispositivo
nuclear da boa-fé objetiva no Direito Civil alemão, por efeito da autonomização
de diversas de suas antigas figuras parcelares em regras próprias, como se verá a
seguir.657
A boa-fé objetiva é uma figura jurídica milenar e, mesmo sendo
considerada no perfil jurídico que lhe emprestou o século XX pela doutrina e
jurisprudência alemãs, a partir da década de 1900, não tem conexão direta com o
papel de intermediadora entre o Direito Privado e as normas e os valores da
Constituição.658 Mesmo antes da edição do BGB, havia previsões legislativas
sobre a boa-fé objetiva nos códigos do Grão-Ducado de Baden (1810), da
Renânia (1814), do Reino da Saxônia (1863), no projeto de Código Civil do
Reino da Baviera (1861), no projeto de Dresden de uma Lei Geral das
Obrigações para a Alemanha (1866).659
Em grande medida, a boa-fé e suas figuras parcelares (suppressio,
surrectio, tu quoque, venire contra factum proprium) atuaram para suprir
deficiências (ou insuficiências) do sistema de responsabilidade delitual alemão,
que prudentemente só conhece a proteção aquiliana quando se violam direitos
absolutos. Houve uma natural tendência a explorar as possibilidades da
responsabilidade contratual e nisso a boa-fé terminou por ser determinante.
Exemplos muito citados no Brasil, como o caso do linóleo, são criações do
Reichsgericht, ainda da primeira década do século XX, sem nenhum fundamento
constitucional.660 Esse é um dos exemplos do que a doutrina alemã insere dentre
as “estratégias para contornar o § 831”, regra que trata da responsabilidade pelos
fatos dos prepostos,661 citado por Reinhard Zimmermann e Dirk Verse como uma
das reações do BGH à nova codificação civil alemã.662 Some-se a tal distorção o
fato de que esse problema no Brasil seria resolvido pelas regras da
responsabilidade aquiliana, abrigada sob uma cláusula geral, sem necessidade ao
menos de se valer da boa-fé. Mas essa é outra discussão e não cabe nos limites
desta tese.
Especificamente em relação à suppressio, já se identificou o princípio
constitucional da solidariedade como seu fundamento: os comportamentos
contraditórios, a suppressio em particular e o “abuso de direito como um todo”
teriam como base o referido princípio,663o que não passou sem a necessária
crítica. De modo correto, já se disse que “francos exageros têm sido cometidos
em sede da leitura supostamente constitucional da vedação à contradição”.664
A doutrina alemã majoritária desconhece essa forma peculiar de
aproximação entre boa-fé e constitucionalização do Direito Civil. Na raiz dessa
crítica está o respeito ao princípio da normatividade, que deita suas raízes no
Direito Romano e na herança cultural grega, e que faz contraponto a um modelo
jurídico baseado no conceito de Kadijustiz,665-666 expressão cunhada por Richard
Schmidt em um artigo publicado em 1908. Posteriormente, a expressão foi
adotada por Max Weber, que a formulou como um tipo ideal (Idealtypus).667
Idêntica impropriedade é cometida quando se confundem com a
constitucionalização do Direito Civil um grupo de institutos, categorias e figuras
jurídicas criados ou reelaborados pela doutrina e pela jurisprudência alemães do
século XX, pela jurisprudência inglesa do século XVIII e pelo comparatismo da
segunda metade do século XX, ao exemplo da alteração das circunstâncias, da
violação positiva do contrato, do adimplemento substancial e da quebra
antecipada do contrato. Algumas dessas figuras jurídicas ou doutrinas são
compreendidas em uma expressão alemã traduzível por “perturbação das
prestações”,668 como a impossibilidade, a mora, a alteração da base do negócio, a
violação positiva do contrato, a culpa in contrahendo e o contrato em proteção
de terceiros.669
Logo após a edição do BGB, os autores e tribunais alemães perceberam as
limitações decorrentes do binômio adimplemento-inadimplemento no Direito
Obrigacional. Havia situações que não permitiam identificar claramente se a
parte adimpliu ou não a obrigação. São clássicos os exemplos da alteração
superveniente das circunstâncias que, a depender do modelo teórico e da
qualificação jurídica das relações, pode determinar a resolução-revisão do
negócio por onerosidade excessiva, pela teoria da imprevisão (ou por ambas
conjugadamente) ou a modificação por alteração da base do negócio. Após
décadas de soluções pretorianas, respaldadas ou não pelos doutrinadores, o BGB
introduziu o § 313, que legitimou um século de construções
acadêmicojurisprudenciais.670 Em momento algum, seja nos projetos da Lei de
Modernização do Direito das Obrigações, seja nos escritos doutrinários, fez-se
qualquer alusão à constitucionalização do Direito Civil ou à influência dos
direitos fundamentais nas relações entre particulares.
No Direito brasileiro, essa matéria é objeto do CC/2002 (arts. 478-480) e
do CDC (art. 6o, inciso V c/c art. 51, § 1o, inciso III), que adotam,
respectivamente, a teoria da onerosidade excessiva combinada com a teoria da
imprevisão, e a teoria da onerosidade excessiva isoladamente.671 Qualquer
fundamento constitucional aqui seria expletivo ou retórico, dada a previsão legal
expressa, que, por sua vez, incorporou construções teoréticas muito antigas.672 A
Constituição pode até ser usada em situações extremas, mas nunca para que se
afirme ter sido um efeito da constitucionalização do Direito Civil a criação ou a
introdução no país da alteração das circunstâncias, cuja presença no
ordenamento brasileiro tem seus primeiros registros doutrinários em 1919.673 E,
na jurisprudência do STF, sua aparição deu-se em 1938, com fundamento na
cláusula rebus sic stantibus.674
A violação positiva do contrato é outro exemplo da ação criativa da
doutrina, diante das lacunas do modelo binário de adimplemento-
inadimplemento do BGB, e, com maior causa, pelo restrito conceito de mora
adotado na Alemanha, que é caracterizado pelo inadimplemento relativo no
tempo, ao revés do modelo brasileiro, que amplia as hipóteses de mora para o
tempo, o modo e o espaço. A teoria surgiu pela primeira vez em um escrito do
advogado alemão, de ascendência judaica, Hermann Staub,675 em 1902, e
terminou por ser amplamente utilizada pela jurisprudência no século XX.676 Com
a reforma do BGB, em 2002, a violação positiva foi codificada no § 280,
apartado 1, BGB. A mera consulta aos textos de Staub e aos acórdãos do BGH
que se fundamentam em sua teoria, demonstra que não foi necessário o recurso à
Constituição, muito menos que a violação positiva do contrato tenha nela se
inspirado ou sirva para a irradiação de direitos fundamentais em relação aos
particulares.677
A “quebra antecipada do contrato” é uma cláusula de aceleração, cujo
estudo e conhecimento no Brasil remontam a trabalhos doutrinários dos últimos
40 anos,678 embora se possa afirmar que “a carta de nascimento da figura
chamada de anticipatory breach of contract está em decisão da jurisprudência
inglesa de 1853, no caso Hochster vs. De La Tour, que até hoje serve de
paradigma para a longa lista de cases julgados pelas cortes inglesas e norte-
americanas”.679 O inadimplemento do contrato faz nascer o direito de resolução.
O primeiro é uma condição para o exercício do segundo. Em situações estritas,
pode-se acelerar o direito de resolução. O fundamento metajurídico dessa
aceleração está em que não é lógico “obrigar o credor a esperar o incumprimento
da obrigação do devedor para declarar a resolução do contrato”. De tal sorte que
o credor pode declarar antecipadamente a resolução do negócio, como forma de
“proteção preventiva contra uma contravenção futura”.680 O CC/2002, segundo o
entendimento da doutrina, prevê hipóteses de adimplemento antecipado nos arts.
477 (diminuição superveniente do patrimônio de uma das partes, que pode
comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou), 495
(insolvência do vendedor antes da tradição) e 590 (mudança da situação
econômica do mutuário antes do vencimento da obrigação).681 No âmbito do
Direito Comparado e dos mecanismos de uniformização e de harmonização do
Direito Privado europeu, podem-se mencionar alguns exemplos de dispositivos
que a preveem, ao exemplo dos Princípios Unidroit (art. 7.3.3) e dos arts. 1.219,
apartado 2, e 1.460, do Código Civil italiano.682 Na CISG, a “violação antecipada
do contrato” tem sua sedes materiae nos arts. 71 a 72.
Inexistem bases constitucionais imediatas ou mediatas para a “quebra
antecipada do contrato”.683 A “quebra antecipada” não é um exemplo de
constitucionalização do Direito Civil.
O adimplemento substancial é uma doutrina desenvolvida pela
jurisprudência inglesa do século XVIII. No século XX, “há poucos julgados que
utilizam a substantial performance”.684 Os primeiros casos de adimplemento
substancial na justiça inglesa foram Kingston v. Preston [1773]685 e Boone v.
Eyre [1777].686 Em nenhum deles faz-se qualquer registro à boa-fé objetiva ou à
algum equivalente conceitual da época, Constituição, cláusulas gerais e
quejandos, o que é óbvio dada a época em que foram prolatadas essas decisões.
Mesmo em casos mais “modernos”, todos do século XX, permanece o caráter
residual da aplicação da teoria, além de sua desvinculação a valores
constitucionais ou a cláusulas gerais, bem como de uma eventual proteção ao
contratante mais fraco. A título de exemplo, em 1921, o Tribunal de Apelações
de Nova York julgou o caso Jacob & Youngs, Inc. v. Kent,687 acompanhando o
voto do juiz Benjamin Cardozo, no qual se utilizou da substantial performance
como ratio decidendi. Um empreiteiro foi contratado para construir uma casa.
Havia especificações muito detalhadas sobre o material a ser usado,
particularmente a marca dos tubos e conexões para a instalação hidráulica. O
contratante, após as obras estarem próximas do fim, descobriu que foi usada uma
marca diferente da estipulada no contrato e pretendeu em juízo a demolição de
parte da construção para que fossem substituídas as tubulações. O empreiteiro
alegou que seria muito caro fazer a alteração e que o material empregado era de
qualidade. O contratante não pagou a parcela final do contrato. O tribunal
entendeu que o inadimplemento havia sido insignificante e que os materiais se
equivaliam em qualidade. Não havia, por conseguinte, razão para negar o
adimplemento substancial pelo empreiteiro. Para além de não se necessitar de
fundamento em normas da Constituição norte-ame-ricana, deve-se perceber que
o julgamento foi favorável à parte, em tese, mais forte.
Como é notável, em sua origem, nem ao menos se cogitava de boa-fé
objetiva ou de “constitucionalização” como base para o adimplemento
substancial. Quando essa doutrina foi adaptada ao Direito brasileiro, graças à
obra de Clóvis Veríssimo do Couto e Silva688 e aos julgados do min. Ruy Rosado
de Aguiar Júnior,689 passou-se a utilizar a boa-fé objetiva como seu fundamento,
o que seria esperável dada essa “continentalização” da referida doutrina. A
correlação entre adimplemento substancial e boafé objetiva terminou por
prevalecer no Direito brasileiro.690 Não é possível, contudo, estender tais liames
ao Direito Constitucional.691 Essa ordem de ideias, que sempre se adotou na
jurisprudência do STJ, foi adequadamente sistematizada no julgamento do REsp
1.581.505/SC, de relatoria do min. Antonio Carlos Ferreira.692
É muito provável que o processo de identificação dessas doutrinas, teorias
e figuras jurídicas com a constitucionalização do Direito Civil tenha duas causas.
A primeira, como já referido, está no “abuso de linguagem” que normalmente se
tem levado a efeito com relação à boa-fé objetiva. A segunda está em que, ao
menos no Brasil, algumas delas, como o adimplemento substancial ou o dever de
mitigar o próprio dano, têm sido enxergadas como forma de se proteger a parte
mais fraca da relação jurídico-negocial. E, como também se tornou frequente,
“constitucionalizar o Direito Civil” equivaleria a aumentar os meios protetivos
aos vulneráveis. Essa última acepção é inadequada porque não respeita a história
dos institutos mencionados. Se não fosse assim, deixando de lado a genealogia
das ideias e dos conceitos, ter-se-ia de perguntar se esse raciocínio também
valeria para constituições outorgadas, como as de 1937 e 1967/1969.
Uma vez mais, este não é um sentido assimilável para a
constitucionalização do Direito Civil.
§34. CONSTITUCIONALIZAÇÃO COMO INTERPRETAÇÃO PROGRESSISTA
OU COMO SOCIALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
Um dos pontos mais delicados no estudo da constitucionalização do Direito
Civil está na dificuldade de se dissociar essa acepção de alguns conceitos que
hoje são tidos como positivos, embora historicamente isso nem sempre tenha
sido assim. Da mesma forma que é difícil estabelecer acordos semânticos ou um
discurso dotado de racionalidade quando se confronta a relação entre dignidade
humana e constitucionalização do Direito Civil, é também complexo pôr em
dúvida a existência de relação de causalidade entre constitucionalizar e socializar
ou interpretar o Direito Civil de modo progressista.
As transformações do Direito Civil nos campos da propriedade e família,
por exemplo, são saudadas como um efeito da constitucionalização do Direito
Civil. É possível fazer duas objeções fortes a essa aproximação semântica.
(a) A primeira objeção está em que institutos ligados ao direito de
propriedade foram constitucionalizados, no sentido da elevação das normas ao
texto constitucional, desde 1824. Além disso, o problema dos limites sociais ao
exercício do direito de propriedade está presente em todas as constituições
brasileiras, embora a partir de 1934 haja sido adotada uma fórmula mais forte de
limite social a esse exercício, o que se deu por influência do período histórico
(Revolução de 1930, Revolução Russa de 1917 e New Deal) e da experiência
constitucional comparada (Weimar e México, v.g.).693 No texto de Weimar, tem-
se a já conhecida enunciação: “A propriedade obriga. Seu uso deve, ao mesmo
tempo, servir ao bem da coletividade”,694 embora suas raízes estejam na
civilística alemã do século XIX.695 A partir da CF/1934, o legislador “poderia
limitar livremente o direito de propriedade, que perdia, assim, seu caráter a-
histórico de absolutividade”.696
A CF/1937 “manteve o novo conceito de propriedade” em seu art. 122,
inciso 14. Com a redemocratização, elaborou-se a CF/1946, que manteve o
elemento social como limitador ao direito de propriedade (art. 141, § c/c
art. 147), embora tenha havido “retrocesso em matéria de desapropriação”. Tal
retrocesso constitucional poder-se-ia explicar “como uma reação da Assembléia
Constituinte ao intervencionismo consagrado no Estado Novo”.697
O princípio da função social da propriedade inseriu-se expressamente no
direito positivo brasileiro graças a uma das primeiras iniciativas legislativas do
regime militar de 1964 no âmbito fundiário, a saber, o Estatuto da Terra (Lei no
4.504, de 30 de novembro de 1964), que declarava solenemente ser “assegurada
a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua
função social” (art. 2o, caput).698 Nos termos da lei, a propriedade desempenharia
“integralmente a sua função social” quando favorecesse (i) o bem-estar dos
proprietários e dos trabalhadores da terra, bem como suas famílias; mantivesse
níveis satisfatórios de produtividade; (ii) assegurasse a conservação dos recursos
naturais e (iii) observasse as disposições legais sobre as “justas relações de
trabalho entre os que a possuem e a cultivem”.699 A lei é pródiga em fornecer
conteúdo jurídico à função social da propriedade, expressão que aparece 6 vezes
no Estatuto da Terra.700
Os fundamentos ideológicos do Estatuto da Terra transparecem da
Mensagem Presidencial, que enviou o projeto de lei ao Congresso Nacional. De
acordo com o texto, a futura norma almejava reintegrar “a propriedade em sua
natural função social, condicionando seu aproveitamento ao bem-estar geral”,
além de criar, “com base no conceito modular de área do estabelecimento rural,
um sistema que permite a formação de propriedades de tamanho econômico em
relação ao conjunto familiar”.701
Originalmente positivada no direito ordinário, a função social foi
constitucionalizada no art. 157, CF/1967-1969, que contém os princípios da
ordem econômica. No texto constitucional, esses princípios “tem por fim realizar
a justiça social”, dentre eles a “função social da propriedade”.702 Não é correto
afirmar que a propriedade passou a se condicionar pela função social ou, como
querem outros, que ela se funcionalizou a partir de 1988. Se isso realmente
ocorreu, deve-se recuar esse marco histórico para muito antes e, se há uma data
precisa, ela seria 1964 ou 1967, quando os dois textos normativos do regime
militar foram editados. O mais grave é que, e sobre isso já se disse no § 32 desta
tese, nenhum desses documentos conseguiu realmente dar um caráter social à
propriedade no Brasil, o que é revelador da impotência das normas jurídicas em
transformar a realidade social de per si.703
(b) A família, como já exposto, não foi constitucionalizada em 1988 e sim
desde 1891 (em relação ao casamento civil) e mais fortemente a partir de 1934,
quando se lhe conferiu título próprio na CF/1934, o que se vem repetindo até ao
texto constitucional de 1988. O progressismo na interpretação do Direito de
Família não se deu por efeito de sua constitucionalização e sim por
transformações sociais profundas no modo como o povo brasileiro passou a lidar
com as relações conjugais, a parentalidade, a filiação e as relações amorosas.
Essa mudança de valores, hábitos e padrões morais conduziu a uma
transformação das práticas, depois da jurisprudência e, finalmente, da
Constituição, do CC/1916 e do CC/2002.704
O direito pretoriano é sempre a primeira fronteira do Direito em contato
com o universo das mudanças de costumes sociais. Isso é comprovável pela
Súmula STF 380, segundo a qual, “comprovada a existência de sociedade de fato
entre os concubinos”, caberia “sua dissolução judicial, com a partilha do
patrimônio adquirido pelo esforço comum”. Embora possa ser considerada
insuficiente e até discriminatória pelos leitores contemporâneos, não se pode
esquecer – até por honestidade histórica e intelectual – que sua edição se deu em
sessão plenária do STF de 3 de abril de 1964 e os primeiros casos que
permitiram a consolidação do entendimento do tribunal, a ponto de se criar uma
súmula, datam dos anos 1940.705 Como já defendido, é ainda preponderante
nessa mudança de orientação jurisprudencial a época histórica: os anos 1960
foram marcados pela contracultura e pelo início da crise dos valores morais de
tradição cristã.
O percurso seguido para se admitir um vínculo de caráter societário, não
familiar, portanto, que protegesse os direitos das pessoas que conviviam mas não
eram casadas, foi a antessala para a entrada dessas relações no Direito de
Família, o que veio a ocorrer com o § 3o do art. 226, CF/1988, e, na sequência,
no direito ordinário, com a Lei no 8.971, de 29 de dezembro de 1994 e a Lei no
9.278, de 10 de maio de 1996.706 Décadas depois, essa mesma estratégia foi bem-
sucedida em relação às uniões de pessoas do mesmo sexo, que começaram com
ações para reconhecimento de sociedades de fato,707 indicação de beneficiários
de direitos previdenciários708 e evoluíram para postulações típicas do Direito de
Família.709
Pode ser considerado como presunção do Direito (e dos juristas) imaginar
que esses câmbios se dão por uma generosa vontade semidivina do constituinte,
do legislador, dos magistrados ou dos doutrinadores. Se é certo que há vozes que
se antecipam às alterações normativas ou jurisprudenciais, elas só conseguem
transformar seus vaticínios em realidade quando o povo passa a neles acreditar
ou a tornar aceitável aquilo que se passou a praticar de modo cada vez mais
generalizado.710 Este é um espaço típico de condicionamento da norma pela
realidade social e não o contrário.
Um exemplo é suficiente para assim o demonstrar. Em nenhuma
Constituição brasileira definiu-se que o casamento era um vínculo entre homem
e mulher. Todos os textos constitucionais, a partir de 1891, só cuidavam da
indissolubilidade do matrimônio e da proteção do Estado à família. A CF/1988
foi a primeira a afirmar textualmente que “para efeito da proteção do Estado, é
reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”711 e que “os direitos e
deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e
pela mulher”.712 Tal literalidade e objetividade do texto constitucional impediria
qualquer interpretação da própria Constituição ou da legislação ordinária que
admitisse o casamento igualitário ou mesmo a união estável entre pessoas do
mesmo sexo. Ao constitucionalizar o Direito de Família, na forma como se
operou na CF/1988, criou-se um forte obstáculo à extensão desse direito a todos.
Em muitos países, como Argentina, Espanha e Portugal, não havia norma
constitucional que limitasse o conceito de casamento ou de união estável como a
CF/1988. Lá a mudança ocorreu por força de simples alteração no código civil,
por meio de lutas políticas explícitas, nas quais a sociedade como um todo foi
chamada a se manifestar. Nesses embates, acabaram por se colocar em confronto
diferentes visões de mundo.713 No Brasil, o STF teve de contornar a literalidade
da CF/1988 e recorreu à “interpretação conforme à Constituição” para excluir do
art. 1.723, CC/2002,714 “qualquer significado que impeça o reconhecimento da
união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família.
Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas
consequências da união estável heteroafetiva”.715
Dito de outro modo, interpretou-se conforme à Constituição uma norma de
direito ordinário que era conforme à Constituição (§ 3o do art. 226, CF/1988)
com base no fato de que ela não seria conforme à Constituição.716 E o resultado
do julgamento pré-excluiu a possibilidade de conversão das uniões entre pessoas
do mesmo sexo em casamento ou que eles adotassem filhos de modo conjunto.
Um leitor estrangeiro que lesse o acórdão do STF e fosse ao CC/2002
encontraria, de imediato, um problema lógico: reconheceu-se a união estável
igualitária, mas se lhe negou a possibilidade de conversão em casamento. Ocorre
que o código civil é taxativo em afirmar que: “A união estável poderá converter-
se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no
Registro Civil” (art. 1.726, CC/2002). Logo, se era possível constituir a união
estável, tal como declarado pelo STF, não se lhe aplicaria a restrição dos
impedimentos matrimoniais (art. 1.723, § 1o, CC/2002). Assim, não se teria
como restringir aos companheiros do mesmo sexo o pedido de conversão em
casamento previsto no art. 1.726, CC/2002. Essa incoerência só veio a ser
resolvida, também de modo heterodoxo quanto à via, pela Resolução CNJ no
175, de 14 de maio de 2013, que dispôs sobre “a habilitação, celebração de
casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas
de mesmo sexo”.
Não houve maiores contestações sociais ou da comunidade jurídica porque
o acórdão do STF e a Resolução do CNJ atenderam a uma transformação dos
valores da sociedade. Tanto é assim que tramita com celeridade o PLS 612/2011
(Estatuto das Famílias), que altera o CC/2002 para qualificar a união estável
como um vínculo entre duas pessoas e não entre homem e mulher como está na
CF/1988.
Toda essa descrição serve para comprovar que o simples fato de se
constitucionalizar um instituto ou uma figura jurídica não significa conferir a
eles uma interpretação progressista. Fosse outra a composição do STF, mesmo
com os câmbios ocorridos na sociedade brasileira em relação ao tema, haveria
uma forte barreira constitucional à mudança da legislação ordinária e seria
preciso esperar uma mudança na CF/1988 para se admitir o casamento e a união
estável igualitários.717
Como o processo histórico é imparável, agora já se assiste a um movimento
em sentido contrário: a sociedade demanda pelo retorno a certos padrões de
moralidade social que se refletem no conceito jurídico de família. Exemplo disso
está na tramitação do PL 6.583/2013 (Estatuto da Família), elaborado como
reação ao Estatuto das Famílias. O PL 6.583/2013, de entre outras disposições,
define “entidade familiar como o núcleo social formado a partir da união entre
um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por
comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. Se for
aprovado esse projeto de lei, haverá o curioso problema de se examinar sua
constitucionalidade: sua redação é uma reprodução quase literal do conteúdo do
art. 226, §3o, CF/1988. O STF ver-se-á diante do paradoxo de declarar a
inconstitucionalidade de uma lei redigida de modo idêntico ao texto
constitucional, se quiser guardar coerência com a decisão na ADPF 132.
Essa reversão demonstra o acerto da tese ora defendida: (a) o progressismo
ou o conservadorismo não se confundem com o processo de
constitucionalização; (b) a sociedade define seus valores e “consensos
sobrepostos” conforme critérios raramente sindicáveis por padrões de
racionalidade; (c) o Poder Judiciário, quando muito, expressa tais valores por
meio de suas decisões; (d) a única esfera pública na qual esses valores poderiam
ser legitimamente exteriorizados e convertidos em normas é o Parlamento, por
meio da luta política, cabendo aos tribunais um controle ex post dos excessos e
dos desvios na fase deliberativa.
Identicamente, é preciso dizer que constitucionalizar o Direito Civil não é
so-cializá-lo. Sobre o conceito de socialização do Direito, remete-se o leitor para
a Primeira Parte da tese, Capítulo Primeiro. É de se recordar a série de
conteúdos possíveis para a socialização, inclusive aquele emprestado ao Direito
Penal.718 Mais do que isso, em diversos países que possuem um regime político-
econômico socialista, por exemplo, não há previsão constitucional de regras
como a função social da propriedade, do contrato ou da empresa, como é o caso
da China.719 E, em outros, com altos índices de desenvolvimento humano, as
respectivas constituições nem ao menos se referem ao direito de propriedade
como direito fundamental.720 Em paralelo, a CF/1967, que serviu de fundamento
à mais longa ditadura da História brasileira, não pode ser chamada de
conservadora em matéria de direito de propriedade.
§35. CONCLUSÕES PARCIAIS
Poder-se-ia seguir nesse método e haveria outras acepções da chamada
“constitucionalização do Direito Civil”, circunstância que, por si mesma, é
autoexplicativa em relação ao sincretismo metodológico em torno do tema, o
qual leva ao seguinte paroxismo: se tudo é “constitucionalização do direito”,
provavelmente nada o será de fato.
Chega-se à conclusão de que não é constitucionalização: a)
sobreinterpretar ou reinterpretar as normas ordinárias conforme a Constituição;
b) elevar a dignidade humana à condição de elemento funcionalizante do Direito
Civil; c) colocar a Constituição no centro do ordenamento jurídico; d) exercer
atos típicos da jurisdição constitucional, como o controle de constitucionalidade
ou a interpretação das normas ordinárias conforme a Constituição; e) utilizar
cláusulas gerais e figuras típicas da “perturbação das prestações” para resolver
quaisquer casos de Direito Privado, sem relação direta com a Constituição; f)
conferir interpretação progressista ou socializar o Direito Civil.
Deve-se agora, até para cumprir a promessa que inaugura esta Segunda
Parte: chegar-se a um acordo semântico sobre o que seja a constitucionalização
do Direito Civil, ao menos no Direito brasileiro. É do que se cuidará no próximo
capítulo.

562 No Brasil, praticamente só a obra de Virgílio Afonso da Silva (A constitucionalização do direito...p. 38-
49) apresentou sistematicamente os modelos de constitucionalização do Direito. O re conhecimento
dessa lacuna no Direito Civil não é uma crítica sem destinatário, mas uma consta tação sobre o
estado da arte da literatura privatística relativamente a um aspecto central da teoria geral do Direito
Civil brasileira.
563 Há excelentes e pioneiros trabalhos sobre a constitucionalização do Direito Civil no país, mas que não

se ocupam do problema dos modelos de constitucionalização. Citamse exemplos desses es tudos de


referência no Direito Civil (excluídos autores não brasileiros): LÔBO, Paulo Luiz Netto.
Constitucionalização do Direito Civil. Revista de Informação Legislativa, a. 36, no 141, p. 99109,
jan./mar. 1999. p. 108109; TEPEDINO, Gustavo. Premissas metodológicas para a constitucionali zação
do Direito Civil. Revista de Direito do Estado: RDE, no 2, p. 3753, abr./jun., 2006; BODIN DE MORAES
TEPEDINO, Maria Celina. A caminho de um direito civil constitucional. Revista de Direito Civil,
Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 17, no 65, p. 2132, jul./set., 1993; FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil:
sentidos, transformações e fim. Rio de Janeiro: Renovar, 2015.
564 FAVOREU, Louis. La constitutionalisation du droit. In. AUBY, JeanBernard et alii (Ed.). L’unité du Droit:
Mélanges en hommage à Roland Drago. Paris: Economica, 1996. p. 25.
565 “Por isso, toda e qualquer norma jurídica – não só as leis, mas a sua concretização, a jurisprudên cia –

deve condicionarse à sobreinterpretação dos princípios jusfundamentais. Essa é a carac terística mais
importante do processo de constitucionalização do direito, em suma, a ‘teoria da interpretação a
partir da Constituição parece que já não pode ser a mesma que a teoria da inter pretação a partir da
lei: as normas constitucionais estimulam outro gênero de raciocínio jurídi co’(Cf. Luis Prieto Sanchís,
Constitucionalismo y Positivismo, p. 22.)” (MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo e teoria
da interpretação. Revista da EMERJ...p. 255).
566 GUASTINI, Riccardo. A constitucionalização do ordenamento jurídico e a experiência italiana. In.
SARMENTO, Daniel Antonio de Moraes; SOUZA NETO, Cláudio Pereira (Orgs.). A constitucionalização
do Direito: Fundamentos teóricos e aplicações específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 271-
293, esp. cit. p. 276.
567 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direito das Coisas. Adaptação ao Código Civil por José Bonifacio de

Andrada e Silva. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1943. v. 1. p. 95.


568 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direito das Coisas...v. 1. p. 96, nota 44.
569 “Algumas conclusões, porém, ficaram apresentadas. A primeira é que se faz necessária a revisão,
especialmente por parte dos civilistas, do papel da Ciência do Direito Civil na construção teórica do
instituto da propriedade. A pesquisa, ainda que limitada à parte dogmática, revelou a antítese do
discurso geralmente aceito do compromisso civilista com uma concepção estéril do individua lismo
no campo do Direito das Coisas” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame
crítico de um caso de “constitucionalização” do Direito Civil...p. 89).
570 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um caso de “constitu-
cionalização” do Direito Civil...p. 7380.
571 BEVILÁQUA, Clóvis. A Constituição e o Código Civil. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 97, p. 3138, set.

1935. p. 32 (exemplo também citado em: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social:
Exame crítico de um caso de “constitucionalização” do Direito Civil...p. 76). Em 1999, Roberto Rosas
(Direito Civil e Constituição: relações do projeto com a Constituição. Revista CEJ, v. 3, no 9, p. 511,
set./dez. 1999. p. 11) publicou texto com idêntico teor sobre as relações do projeto da futura CF/1988
e o então Código Civil vigente: "Por termos uma Constituição minuciosa em normas e princípios
sobre todos os assuntos, não ficariam o Direito Civil e fatalmente a legislação civil e, especialmente, o
Código Civil imunes a uma aproximação entre a Constituição e o Direito Civil".
572 Na pesquisa referida (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um
caso de “constitucionalização” do Direito Civil...p. 77) há um trecho muito importante para revelar
que o Direito Civil mantevese preocupado com a questão do uso socialmente adequado da pro-
priedade, mesmo com a supressão, na Constituição de 1937, da referência a seu uso em face do
interesse social ou coletivo: “A Constituição de 1937 manteve a redação tradicional das constituições
republicanas, ao incluir a propriedade no rol de direitos assegurados aos nacionais e estrangeiros
aqui residentes. Retirou, entretanto, a menção ao uso da propriedade contrariamente ao interesse
social ou coletivo. Caberia ao legislador ordinário definir o conteúdo e os limites da propriedade e de
seu exercício. A irradiação da propriedade com limites sociais, entrementes, já se havia operado.
Independentemente dessa ablação do texto constitucional, a melhor dogmática civilista entendia
não ser mais possível fazer essa dissociação, como que a provar a inexistência de supremacia axioló-
gica da Constituição. A despeito da opção do texto de 1937, o Direito Civil (por seus melhores dou-
trinadores) reconhecia que ‘(…) a primeira restrição e a mais genérica a que o direito de propriedade
está sujeito é a submissão do direito de propriedade ao interesse da coletividade’”. O autor citado
como um de “seus melhores doutrinadores” é Francisco Clementino de San Tiago Dantas.
573 PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937. Revista

Forense, v. 73, no 415, p. 510514, mar. 1938.


574 “Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias: (...)” (art. 16, caput,

CF/1937).
575 “XIV os bens do domínio federal, minas, metalurgia, energia hidráulica, águas, florestas, caça e pesca
e sua exploração;” (art. 16, inciso XIV, CF/1937).
576 “XVI o direito civil, o direito comercial, o direito aéreo, o direito operário, o direito penal e o di reito

processual;” (art. 16, inciso XVI, CF/1937).


577 “XVII o regime de seguros e sua fiscalização;” (art. 16, inciso XVII, CF/1937).
578 “XX direito de autor; imprensa; direito de associação, de reunião, de ir e vir; as questões de esta do
civil, inclusive o registro civil e as mudanças de nome;” (art. 16, inciso XX, CF/1937).
579 “Nas matérias de competência exclusiva da União, a lei poderá delegar aos Estados a faculdade de
legislar, seja para regular a matéria, seja para suprir as lacunas da legislação federal, quando se trate
de questão que interesse, de maneira predominante, a um ou alguns Estados. Nesse caso, a lei
votada pela Assembleia estadual só entrará em vigor mediante aprovação do Governo federal” (art.
17, CF/1937).
580 “Independentemente de autorização, os Estados podem legislar, no caso de haver lei federal so bre a

matéria, para suprirlhes as deficiências ou atender às peculiaridades locais, desde que não dispensem
ou diminuam as exigências da lei federal, ou, em não havendo lei federal e até que esta regule, sobre
os seguintes assuntos: a) riquezas do subsolo, mineração, metalurgia, águas, energia hidrelétrica,
florestas, caça e pesca e sua exploração; b) radiocomunicação; regime de eletricida de, salvo o
disposto no nº XV do art. 16; c) assistência pública, obras de higiene popular, casas de saúde, clínicas,
estações de clima e fontes medicinais; d) organizações públicas, com o fim de conciliação
extrajudiciária dos litígios ou sua decisão arbitral; e) medidas de polícia para proteção das plantas e
dos rebanhos contra as moléstias ou agentes nocivos; f) crédito agrícola, incluídas as cooperativas
entre agricultores; g) processo judicial ou extrajudicial” (art. 18, CF/1937).
581 “São do domínio federal: a) os bens que pertencerem à União nos termos das leis atualmente em
vigor; b) os lagos e quaisquer correntes em terrenos do seu domínio ou que banhem mais de um
Estado, sirvam de limites com outros países ou se estendam a territórios estrangeiros; c) as ilhas
fluviais e lacustres nas zonas fronteiriças” (art. 36, CF/1937).
582 “São do domínio dos Estados: a) os bens de propriedade destes, nos termos da legislação em vigor,

com as restrições do artigo antecedente; b) as margens dos rios e lagos navegáveis desti nadas ao
uso público, se por algum título não forem do domínio federal, municipal ou particular” (art. 37,
CF/1937).
583 PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937. Revista
Forense, v. 74, no 418, p. 2530, abr. 1938.
584
Relativo aos símbolos nacionais (art. 2o, CF/1937).
585 “A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Às famí-
lias numerosas serão atribuídas compensações na proporção dos seus encargos” (art. 127, CF/1937).
586 “A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será

estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execu ção
ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular” (art. 125, CF/1937).
587 “Aos filhos naturais, facilitandolhes o reconhecimento, a lei assegurará igualdade com os legíti mos,
extensivos àqueles os direitos e deveres que em relação a estes incumbem aos pais” (art. 136,
CF/1937).
588 O art. 137, CF/1937, traz uma série de direitos que serão observados pela “legislação do traba lho”, ao

exemplo de contratos coletivos (alínea a); modalidades de salário (alíneas b e c); repouso semanal aos
domingos e, nos limites das exigências técnicas da empresa, aos feriados civis e reli giosos, de acordo
com a tradição local (alínea d); licença anual remunerada (alínea e); indenização por despedimento
imotivado, de caráter proporcional aos anos de serviço, quando não houver garantia de estabilidade
(alínea f); continuidade das relações laborais após mudança de controle da empresa (alínea g); salário
mínimo (alínea h); jornada diária de oito horas de trabalho (alínea i); adicional por trabalho noturno
(alínea j); proibição de trabalho a menores de catorze anos e de trabalho noturno a menores de
dezesseis, e, em indústrias insalubres, a menores de dezoito anos e a mulheres (alínea k); assistência
médica e higiênica ao trabalhador e à gestante, com licença para esta última (alínea l); seguros “de
velhice, de invalidez, de vida e para os casos de acidentes do trabalho” (alínea m); prestação de
assistência administrativa e judicial aos trabalhadores por parte das associações sindicais (alínea n).
589 “A usura será punida” (art. 142, CF/1937).
590 “Todo brasileiro que, não sendo proprietário rural ou urbano, ocupar, por dez anos contínuos, sem
oposição nem reconhecimento de domínio alheio, um trecho de terra até dez hectares, tor nandoo
produtivo com o seu trabalho e tendo nele a sua morada, adquirirá o domínio, mediante sentença
declaratória devidamente transcrita” (art. 148, CF/1937).
591 “A vocação para suceder em bens de estrangeiros situados no Brasil será regulada pela lei nacional
em benefício do cônjuge brasileiro e dos filhos do casal sempre que lhes não seja mais favorável o
estatuto do de cujus” (art. 152, CF/1937).
592
PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937... no 415, p.
510514.
593 PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937... p. 2530,
1938...cit. p. 2527.
594 FULGÊNCIO, Tito. Da posse das ações possessórias: Teoria legal e prática. 9. ed. revista e atualizada por

José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro: Forense, 1997. v. 1. p. 81 (o final do parágrafo citado faz remissão,
em nota de rodapé, ao art. 153, § 3o, CF/1969, inserida pelo atualizador).
595 MARTINS, Samir José Caetano. Neoconstitucionalismo e seus reflexos nas relações jurídicas pri vadas:

Em busca de parâmetros de aplicação direta dos direitos fundamentais. Revista de Direito Privado, v.
30, p. 265304, abr./jun. 2007. Item 4.
596 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Crítica ao personalismo ético da Constituição da República e do
Código Civil. Em favor de uma ética biocêntrica. Revista Trimestral de Direito Civil – RTDC. v. 35, p. 2941,
jul./set. 2008; VILLELA, João Baptista. Variações impopulares sobre a dignidade da pessoa humana. In.
AA.VV. Superior Tribunal de Justiça...cit. p. 559581; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto
epistemológico do Direito Civil contemporâneo na tradição de civil law em face do
neoconstitucionalismo e dos princípios...p. 6364; MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JR., Otavio Luiz;
FRUET, Gustavo Bonato. Principais problemas dos direitos da personalidade e estadodaarte da
matéria no Direito Comparado...p. 124; LEAL, Fernando. Seis objeções ao direito civil constitucio-
nal...p. 140 145; TOLEDO, Cláudia Mansani Queda de. Breves reflexões sobre as eficácias direta e
indireta dos direitos fundamentais: Entre a dignidade humana na CF/88 e a dignidade do Direito
Privado. Revista Jurídica Eletrônica do Tribunal de Justiça de São Paulo, v. 3, p. 5976, fev. 2019. esp. p.
7275.
597 O autor citado é João Baptista Villela, no texto “Variações impopulares sobre a dignidade da pes soa

humana” ...cit.
598 STF. RE 363889, rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, j. 262011, DJe238 16122011. Em sentido
aproximado, quanto ao abuso na utilização de princípios: “Um sistema jurídico não é mau nem bom
pelo fato de, em seus processos, princípios serem usados com muita frequência. O problema não está
neles, mas na comodidade que podem oferecer para os espertos e para os preguiçosos. (...) Espertos
e preguiçosos sempre existirão: o mal é que sua esperteza fique oculta, por conse guirem iludir os
espectadores com truques de mágica – com a simples declaração de princípios. Para que, no debate
jurídico, os princípios não sirvam como ar mas de espertos e preguiçosos, é preciso impor, a quem os
emprega, os ônus que lhes são inerentes” (SUNDFELD, Carlos Ari Vieira. Princípio é preguiça? In.
MACEDO JR., Ronaldo Porto; BARBIERI, Catarina Helena Cortada (Orgs.). Direito e interpretação:
racionalidades e instituições. São Paulo: Saraiva, FGV, 2011. p. 295).
599 PICO DELLA MIRANDOLA, Giovanni. Discurso sobre a dignidade do homem. Tradução e apresen tação

de Maria de Lourdes Sirgado Ganho. Estudo pedagógico introdutório de Luís Loia. Lisboa: Edições 70,
2006.
600 Santo Tomás de Aquino (Suma Teológica: Teologia, Deus, Trindade. Tradução de CarlosJosaphat Pinto

de Oliveira et alii. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2016. v. 1. p. 527) assim afirma: “O particular e o indivíduo
realizamse de maneira ainda mais especial e perfeita nas substâncias racionais que têm o domínio de
seus atos e não são apenas movidas na ação como as outras, mas agem por si mesmas. Ora, as ações
estão nos singulares. Por isso, entre as outras substâncias os indivíduos de natureza racional têm o
nome especial de pessoa” (Suma Teológica, I, q. 29, a. 1). Mais adiante (Suma Teológica, I, q. 29, a. 3),
encontrase essa outra referência: “Pessoa significa o que há de mais perfeito em toda natureza, a
saber, o que subsiste em uma natureza racional” (TOMÁS DE AQUINO, Santo. Suma Teológica...cit., p.
533). Para concluir que “é grande dignidade subsistir em uma natureza racional. Por isso dáse o nome
pessoa a todo indivíduo dessa natureza, como foi dito” (Suma Teológica, I, q.29, a.3).
601 Nesta passagem, fica bem nítido o antropocentrismo no Discurso: “Coloqueite no meio do mun do

para que daí possas olhar melhor tudo o que há no mundo. Não te fizemos celeste nem terreno, nem
mortal nem imortal, a fim de que tu, árbitro e soberano artífice de si mesmo, te plasmasses e te
informasses, na forma que tiveres seguramente escolhido. Poderás degenerar até aos seres que são
as bestas, poderás regenerarte até às realidades superiores que são divi nas, por decisão do teu
ânimo” (PICO DELLA MIRANDOLA, Giovanni. Discurso sobre a dignidade do homem...p. 53).
602 LARENZ, Karl. Allgemeiner Teil des bürgerlichen Rechts...cit. p. 2122. José de Oliveira Ascensão (Direito
Civil: Teoria geral. Introdução. As pessoas. Os bens. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 18),
complementando a posição de Karl Larenz, afirma que o personalismo ético é, na verdade, “o
fundamento de todo o nosso direito”.
603 KANT, Immanuel. Grundlegung zur Metaphysik der Sitten. Mit einer Einleitung herausgegeben von

Bernd Kraft und Dieter Schönecker. 2 ed. Hamburg: Felix Meiner, 2016. p.27 e ss.
604 JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. Crítica ao personalismo ético da Constituição da República e do
Código Civil. Em favor de uma ética biocêntrica...p. 40.
605 BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâ neo:

natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação. Interesse Público, v. 14, no 76, p. 2970,
nov./dez. 2012. § 3.
606 BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâ neo:
natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação... § 3.
607 SCHREIBER, Anderson. Direitos da personalidade. 3. ed., rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2014. p. 8.
608 Expressão usada por Gabriel Nogueira Dias (Positivismo jurídico e a Teoria Geral do Direito...p. 353, nota

de rodapé 1), assim referido por Kelsen e a quem ele deu o “título de coautor da Teoria Pura do
Direito”.
609 DIAS, Gabriel Nogueira. Positivismo jurídico e a Teoria Geral do Direito...p. 208.
610 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito...p. 122.
611 Ainda que se dedique ao estudo de obras do século XIX, é possível encontrar referências no Direito
Civil que resguardam o papel singular da Constituição dentre as demais normas jurídicas. Vejase esta
passagem de Lourenço Trigo de Loureiro (Instituições de Direito Civil brasileiro... t. 1. p. 24): “As fontes
do direito civil, que tem fôrça de lei no Brasil, além da sua Constituição Política, são as seguintes”,
enumerando, na sequência, Ordenações, leis, regimentos, alvarás, decretos e resoluções, da
monarquia portuguesa, da Regência, das Cortes portuguesas, todos recepcionados pela Constituição
Política do Império, e as demais normas promulgadas após a Independência.
612 GOMES. Daniela Vasconcellos. A evolução do sistema do Direito Civil: Do individualismo à sociali-
dade. Revista de Direito Privado, v. 27, p. 3263, jul. set. 2006.
613 MEDEIROS, Anna Paula Alves de; NELSON, Rocco Antonio Rangel Rosso. A redefinição do conceito de

família na perspectiva do neoconstitucionalismo. Revista de Direito Privado, v. 55, p. 265310, jul. set.
2013. § 1.
614 “Com a doutrina do Neoconstitucionalismo, a Carta Fundamental se desloca para o centro do sistema

jurídico, marcada por intensa carga axiológica, como norma jurídica dotada de impera tividade e
superioridade. O que se busca é a eficácia da Constituição, especialmente com a con cretização dos
direitos fundamentais” (TST. RR 37194.2012.5.18.0008, 1ª T., Min. Walmir Oliveira da Costa, j.
12/8/2015); “(...) a lei que eventualmente restrinja direitos deve passar no teste da proibição do
retrocesso jurídico, hoje elevado a princípio do neoconstitucionalismo, hipervaloriza dor do direito à
ampla defesa” (STJ. AgRg no REsp 1.453.745 MG, 1ª Turma, Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j.
19/3/2015, DJe 17/4/2015).
615 “(...)
é certo que a ampla aceitação de um discurso comprometido com valores tão caros à
Constituição e convergente com aquilo que se tornou entre nós a maior expressão da vanguarda e
da sofisticação da teoria constitucional e da metodologia jurídica torna a tarefa de apontar possíveis
problemas do movimento civil constitucional, em alguma medida, árdua. Os ônus de justificação a
serem superados por quem formula críticas, são, nesse contexto, reforçados” (LEAL, Fernando. Seis
objeções ao direito civil constitucional...p. 131).
616 RIBAS, Antonio Joaquim. Curso de Direito Civil brasileiro...v. 1. p. 8889.
617 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria Geral do Direito Civil...p. 22.
618 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do Direito. Porto Alegre: Globo, 1925. p. 311.
619 MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição brasileira. 3. ed. ampl. e posta de acordo com a
reforma constitucional de 19251926. Porto Alegre: Globo, 1929. p. 766.
620 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais: seu conceito, sua prática e respectivas garantias em face das
Convenções Internacionais, da legislação federal e da jurisprudência dos tribunais. São Paulo: Nova
Jurisprudência, 1939. p. 2739.
621 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 27.
622 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 28.
623 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 2931.
624 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 3839.
625 Publicada na Gazeta dos Tribunais, de 20 de junho de 1921.
626 ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 33.
627 New York Times Co. v. Sullivan 376 U.S. 254 (1964).
628 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito
Constitucional. 4. ed. ampl. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 1210. Em sentido contrário, considerandoa
“técnica interpretativa”: MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33. ed. São Paulo: Atlas, 2017.
p. 806.
629 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do

Direito Constitucional no Brasil)...item 2.3.3.


630 GUASTINI, Riccardo. A constitucionalização do ordenamento jurídico e a experiência italiana. In.
SARMENTO, Daniel Antonio de Moraes; SOUZA NETO, Cláudio Pereira (Orgs.). A constitucionalização
do Direito...p. 274279; BARATA, Pedro Paulo Barradas. A Constituição e o Código Civil: Reflexões sobre
a eficácia dos direitos fundamentais. Revista de Direito Privado, v. 37, p. 185 208, jan./mar. 2009. p.
195197; CASTRO DE CIFUENTES, Marcela. Constitución y Derecho Privado (Nota Editorial). Revista de
Derecho Privado da Facultad de Derecho de Universidad de Los Andes, v. 10, p. 18, jun. 1996. p. 18
(embora a autora critique os excessos da constitucionalização).
631 PERLINGIERI, Pietro. Il Diritto Civile nella legalità costituzionale. Nápoles: Edizioni Scientifiche Italiane,

1991. p. 189.
632 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Revista de Informação Legislativa, a. 36,
o
n 141, p. 99109, jan./mar. 1999. p. 108109.
633 O reconhecimento ao min. Moreira Alves por seu papel fundamental na criação do moderno sistema

de controle de constitucionalidade brasileiro deuse na seguinte obra: MENDES, Gilmar Ferreira.


Moreira Alves e o controle de constitucionalidade no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 341416
(interpretação conforme à Constituição e declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto,
com referência à Representação no 948/SE, Representação no 1.417/DF, ADI no 319/DF e à ADI no
491/AM; p. 432449, declaração de constitucionalidade e lei ainda constitu cional, citando o HC no
70.514/RS; p. 739823, mencionando a contribuição sobre o controle de constitucionalidade de
normas constitucionais, referenciando a ADI no 815/DF, o MS no 20.257/DF e a ADI 8307/DF).
634 É o que Ivo Dantas (Direito Comparado como ciência. Revista de Informação Legislativa, v. 34, nº 134,
p. 231249, abr./jun. 1997. p. 240) denomina posição intra-sistêmica na qual se coloca o jurista, dado
que só lhe é permitido “enxergar pela óptica do sistema, razão pela qual cumprelhe apontar
inconstitucionalidades, nulidades e ilegalidades de normas e atos, mas sempre – repita mos – em
razão do modelo jurídico como um todo, nunca motivado por preferências pessoais”.
635 MOREIRA ALVES, José Carlos. Controle de constitucionalidade difuso e concentrado. Fórum

Administrativo - Direito Público - FA, ano 8, no 92, p. 914, out. 2008.


636 BARBALHO UCHÔA CAVALCANTI, João. Constituição Federal brazileira: commentarios. Rio de Janeiro:
Companhia LithoTypographia, 1902. p. 222224.
637 BITTAR, Carlos Alberto. A Constituição de 1988 e sua interpretação. Revista dos Tribunais, São Paulo, v.

77, no 635, p. 3236, set. 1988. § 2 (Interpretação e aplicação da Constituição).


638 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros,
2001. p. 480.
639 TEIXEIRA DE FREITAS, Augusto Teixeira. Consolidação das leis civis...p. 280281.
640 LOUREIRO, Lourenço Trigo de. Instituições de Direito Civil brasileiro...t. 1. p. 308, nota de rodapé 1.
641 “Art.
5º. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as
outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso des-
tinadas, sem fórma alguma exterior do Templo” (CI/1824).
642 “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a

liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela


maneira seguinte: (...) V. Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite
a do Estado, e não offenda a Moral Publica” (CI/1824).
643 LOUREIRO, Lourenço Trigo de. Instituições de Direito Civil brasileiro...t. 1. p. 308, nota de rodapé 1.
644 “Art. 72. A Constituição assegura a brazileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos

direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos se guintes. (...)
§ 4º. A Republica só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita. (...) § 7º. Nenhum
culto ou igreja gozará de subvenção official, nem terá relações de dependencia, ou alliança com o
Governo da União, ou o dos Estados” (CF/1891).
645 ANDRADA E SILVA, José Bonifácio de. Annotações e adaptações ao Código Civil. In. PEREIRA,

Lafayette Rodrigues. Direitos de Familia...p. 35.


646 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos de Familia...p. 210.
647 O autor referese à Constituição Política do Império. Esse dispositivo tem a seguinte redação: “Art. 179.

A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade,
a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira
seguinte. (...) XVI. Ficam abolidos todos os Privilegios, que não forem essencial, e inteira mente
ligados aos Cargos, por utilidade publica” (CI/1824).
648 LOUREIRO, Lourenço Trigo de. Instituições de Direito Civil brasileiro...t. 1. p. 189.
649 STF. RE 4001, rel. Min. Waldemar Falcão, j. 21/10/1941, Coletânea de Acórdãos nº 134, p. 9.
650 STF. AI 25132, rel. Min. Ribeiro da Costa, Segunda Turma, j. 25/07/1961, DJ 17081961, p. 2006.
651 STF. RE 24065,rel. Min. Luiz Gallotti, Primeira Turma, j. 24/06/1954, DJ 05081954, p. 9393.
652 A título de exemplo, citamse: FIGUEIREDO, Silvia Bellandi Paes de. Boafé objetiva e constitu-
cionalização do direito privado. Os deveres anexos e a violação positiva do contrato. Conceitos
parcelares da boafé objetiva. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, v. 12, no 87, p. 53 71,
jan./fev. 2014; BRAGA, Diogo de Melo. A constitucionalização das relações obrigacionais: a violação
positiva do contrato. Revista Fórum de Direito Civil, v. 2, no 2, p. 149171, jan./abr. 2013; BECHARA,
Guilherme Fontes. O adimplemento substancial como reflexo da constitucionalização do Direito Civil.
Revista brasileira de Direito Civil, Constitucional e Relações de Consumo, v. 4, no 13, p. 149194, jan./mar.
2012.
653 Essa não é uma orientação unânime na doutrina. Encontramse autores que criticam essas apro-
ximações conceituais, conforme se observa em: COSTA FILHO, Venceslau Tavares. Tendências do
Direito Civil nos países de tradição romanogermânica: Transnacionalização e recodifica ção. Uma
análise a partir da reforma do Direito obrigacional alemão. In. BARROS E SILVA NETO, Francisco
Antônio de; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ALBUQUERQUE
JÚNIOR, Roberto Paulino de; COSTA FILHO, Venceslau Tavares (Coords.). Relações e influências
recíprocas entre direito material e direito processual: Estudos em Homenagem ao Professor Torquato
Castro. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 538. Ou aqueles que, de modo correto, simplesmente
dispensam tais vinculações para explicar o papel das cláusulas gerais no Direito Civil: AMARAL,
Francisco. Direito Civil: Introdução...p. 114115.
654 KRÜGER, Wolfgang. § 242. Leistung nach Treu und Glauben. In. SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER,

Roland; OETKER, Hartmut; LIMPERG, Bettina (Eds.). Münchener Kommentar zum BGB: Schuldrecht.
Allgemeiner Teil. 7. ed. München: Beck, 2016. v. 2. notas marginais 24 e 5762.
655 MARTINS, Leonardo. Liberdade e Estado constitucional: Leitura jurídicodogmática de uma com plexa
relação a partir da teoria liberal dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2012. p. 101.
656 MARTINSCOSTA, Judith. A boa-fé no Direito Privado: critérios para a sua aplicação. 2. ed. São Paulo:

Saraiva, 2018. p. 142; MENEZES CORDEIRO, António. Da boa-fé no Direito Civil. Coimbra: Almedina,
1984. v. 2. p. 1184.
657 KRÜGER, Wolfgang. § 242. Leistung nach Treu und Glauben. In. SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER,
Roland; OETKER, Hartmut; LIMPERG, Bettina (Eds.). Münchener Kommentar zum BGB...cit. nota
marginal 23.
658 KRÜGER, Wolfgang. § 242. Leistung nach Treu und Glauben. In. SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER,

Roland; OETKER, Hartmut; LIMPERG, Bettina (Eds.). Münchener Kommentar zum BGB...cit. nota
marginal 17.
659 KRÜGER, Wolfgang. § 242. Leistung nach Treu und Glauben. In. SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER,
Roland; OETKER, Hartmut; LIMPERG, Bettina (Eds.). Münchener Kommentar zum BGB...cit. nota
marginal 18.
660 O caso do linóleo (RGZ 78/239) referese a uma situação na qual um cliente, ao entrar em uma loja, foi

atingido por um rolo de linóleo (tecido impermeável, confeccionado a partir de juta e untado com
cortiça em pó e óleo de linhaça, que foi muito usado no século XX para revestir pavimentos), que
havia sido negligentemente empilhado por um dos empregados. O problema que a jurisprudência
enfrentou foi basicamente este: como responsabilizar o dono da loja por um ato de seu empregado
quando não existia relação negocial ainda aperfeiçoada e as regras da responsabilidade delitual não
compreendiam a proteção a direitos relativos? Nesta hipótese, fezse a utilização da culpa in
contrahendo, que havia sido “descoberta” por Rudolf von Jhering em um texto de 1861 (LORENZ,
Stephan. Grundwissen Zivilrecht: Culpa in contrahendo (§ 311 II, III BGB). Jus: Juristische Schulung, no
5, p. 398401, 2005. Itens I1 e II1). Mais amplamente sobre os principais casos que inspiraram o
desenvolvimento dos deveres anexos e das figuras parcelares da boafé objetiva no Direito alemão:
NUNESFRITZ, Karina. A boafé objetiva e sua incidência na fase negocial: um estudo comparado com
base na doutrina alemã. Revista de Direito Privado, no 29, p. 201237, jan./mar. 2007.
661 WAGNER, Gehrard. § 831. Haftung für den Verrichtungsgehilfen. In. SÄCKER, Franz Jürgen; RIXECKER,
Roland; OETKER, Hartmut; LIMPERG, Bettina (Eds.). Münchener Kommentar zum BGB: Schuldrecht.
Allgemeiner Teil. 7. ed. München: Beck, 2017. v. 5. nota marginal 2.
662 ZIMMERMANN, Reinhard; VERSE, Dirk. Die Reaktion des Reichsgerichts auf die Kodifikation des

deutschen Deliktsrechts (19001904). In. FALK, Ulrich; MOHNHAUPT, Heinz (Eds.) Das Bürgerliche
Gesetzbuch und seine Richter. Frankfurt a. M.: Klostermann, 2000. v. 16. p. 319341., cit. p. 319 e p. 335.
663 NEVES, Julio Gonzaga Andrade. A suppressio (Verwirkung) no Direito Civil. São Paulo: Almedina Brasil,
2016. p. 150.
664 NEVES, Julio Gonzaga Andrade. A suppressio (Verwirkung) no Direito Civil...p. 152.
665 Nesse sentido: PAWLOWSKI, HansMartin. Verfassungsrechtliche Vorgaben für die Auslegung des §
242 BGB. JuristenZeitung, ano 57, no 13, p. 627633, Jul. 2002. p. 632633.
666 Kadijustiz significa literalmente “justiça do alcaide” ou “justiça do kádi” (preferese a forma usual em

português, alcaide), o juiz árabe, que decidia com base em juízos de equidade, morais e pes soais, de
modo discricionário (WEBER, Max. Economia e sociedade: Fundamentos da Sociologia compreensiva.
Tradução de Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Revisão técnica de Gabriel Cohn. 4. ed., 2. reimpr.
Brasília: EdUnB, 2009. p. 150151, p. 213218, p. 253260 e p. 281). Sua uti lização popularizouse graças
ao justice Frankfurter, que a empregou no julgamento de Terminiello v. Chicago (1949), ao dizer que o
tribunal exercia uma competência recursal e não poderia se comportar como um juízo que agia sem
os limites de pautas normativas. Segundo Frankfurter, os membros do juízo “não nos sentamos como
um alcaide, debaixo de uma árvore, dispensando justiça de acordo com juízos de conveniência
individual” (ROSEN, Lawrence. Equity and discretion in a modern islamic legal system. Law & Society
Review, v. 15, no 2, p. 217246, 19801981. p. 217).
667 SCHNEIDER, Irene. Qādī und Qādī-Justiz im vormodernen und modernen islamischen Recht. In.
SCHOLLER, Heinrich; TELLENBACH, Silvia (Eds.). Position und Aufgaben des Richters nach westlichem
und nach islamichem Recht. Tübingen: Mohr Siebeck, 2007. p. 5586. cit. p. 55.
668 No original, Leistungsstörungen.
669 Essa relação é dilatável ou reduzível, a depender da corrente doutrinária, cf. MENEZES CORDEIRO,
António. A perturbação das prestações. In. MENEZES CORDEIRO, António. Da modernização do Direito
Civil: Aspectos Gerais. Coimbra: Almedina, 2004. p. 101.
670 Nesse sentido: REIMANN, Mathias. The Good, the Bad, and the Ugly: The reform of the German Law of
Obligations. Tulane Law Review, v. 83, p. 877918, 20082009. p. 911.
671 Essadivisão de fundamentos teóricos é majoritária na doutrina e na jurisprudência nacionais. O STJ,
desde o julgamento do REsp 472594/SP, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, rel. p/ Acórdão Min.
Aldir Passarinho Junior, Segunda Seção, j. 12/02/2003, DJ 04/08/2003, p. 217, as sim temse orientado.
Identicamente, na doutrina, entendem que o CC/2002 combina as duas teorias, ao passo em que o
CDC adota, de modo exclusivo, a onerosidade excessiva: KHOURI, Paulo R. Roque A. A revisão judicial
dos contratos no novo Código Civil, Código do consumidor e Lei no 8.666/93: A onerosidade excessiva
superveniente. São Paulo: Atlas, 2006. p. 28; ASCENSÃO, José de Oliveira. Alteração das circunstâncias
e justiça contratual no novo Código Civil. Revista Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 7, no 25, p. 93118,
jan./mar. 2006. p. 101; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: Autonomia da
vontade e teoria da imprevisão. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 128134; OLIVEIRA, James Eduardo C.
M. Código Civil anotado e comentado: doutrina e jurisprudência. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p.
497; DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Onerosidade excessiva e revisão contratual no direito
brasileiro. In. FERNANDES, Wanderley (Coord.) Contratos empresariais: fundamentos e princípios dos
contratos empresa riais. São Paulo: Saraiva: FGV, 2007. p. 348350. Em sentido contrário: BRITO,
Rodrigo Toscano de. Onerosidade excessiva e a dispensável demonstração de fato imprevisível para
a revisão ou reso lução dos contratos. In. BARROSO, Lucas Abreu (Org.). Introdução crítica ao Código
Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 119 e ss. Existem também autores que consideram ser a teoria
alemã da base do negócio jurídico o fundamento adequado para a alteração das circunstâncias no
CDC: MARQUES, Cláudia Lima. Sociedade de informação e serviços bancários: primeiras observações.
Revista de Direito do Consumidor, no 39, p. 4974, jul./set. 2001. nota de rodapé 97.
672 Em sentido contrário: SIRENA, Hugo Cremonez. A alteração contratual pela quebra da equivalência

subjetiva do elemento objetivo: uma reformulação das teorias revisionais do contrato. Revista Fórum
de Direito Civil, v. 2, no 4, p. 4975, set./dez. 2013.
673 Parecer de José de Castro Magalhães, de 25 de setembro de 1919, esforçado na cláusula rebus sic
stantibus para admitir a “resolução do contrato pela simples alteração de facto existente na ocasião
em que o contracto teve início”: CASTRO MAGALHÃES, J. A cláusula “rebus sic stantibus”: parecer.
Revista Forense, p. 4546, jan./jun. 1920. p. 46.
674 “A construção de doutrinas jurídicas não reguladas na lei positiva jamais poderá ferir a letra da lei,

para dar lugar ao recurso extraordinário. A admissão daquele recurso por diversidade de interpre-
tação da lei, pressupõe espécies que se ajustem perfeitamente. A regra rebus sic stantibus não é
contrária a texto expresso da lei federal” (STF. RE no 2.675DF, j. 5.1.1938, rel. Min. Costa Manso). Cf.
RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: Autonomia da vontade e teoria da
imprevisão...p. 152.
675 “Hermann Staub não foi professor universitário. Contudo, apesar de sua morte prematura em 1904,
então com 48 anos, foi ele importante autor, responsável por obras até hoje utilizadas, como é o caso
dos seus comentários ao Código Civil alemão [HGB]. (...) O fato de Staub não ser professor, mas
advogado foi, provavelmente, o propulsor para a sua rápida percepção do proble ma no recém
vigente BGB, tanto que o autor parte, para desenvolver seu estudo, da análise de casos práticos e não
da análise de conceitos abstratos como o de ‘inadimplemento’, de ‘impossi bilidade’ ou de ‘mora’”
(SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A boa-fé e a violação positiva do contrato. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
p. 13).
676 STAUB, Hermann. Die positiven Vertragsverletzungen und ihre Rechtsfolgen. Festschrift für den XXVI.
Deutschen Juristentag. Berlin: J. Guttentag, 1902. p. 2956. Em 1904, publicouse uma ver são expandida
desse trabalho: STAUB, Hermann. Die positiven Vertragsverletzungen. Berlin: J. Guttentag, 1904. A nova
versão deveuse às contestações dirigidas contra o texto primitivo. A segunda edição é mais completa
e tem sido a base para os estudos contemporâneos sobre o tema (SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A
boa-fé e a violação positiva do contrato...p. 13).
677 A observação estrita do BGB como base investigativa de Staub fica clara já pela primeira página de

sua exposição: ele parte da codificação (§ 286 BGB) e, por intermédio de conceitos fixados pela
ciência privatística, constrói sua tese, ao perceber a ausência de uma resposta sistemática pronta
para o problema de uma quebra do contrato por ato positivo (STAUB, Hermann. Die positiven
Vertragsverletzungen. 2. ed. org. por Eberhard Müller. Berlin: J. Guttentag, 1913. p. 5).Em sentido
contrário, associando a violação positiva à constitucionalização do Direito das Obrigações: BRAGA,
Diogo de Melo. A constitucionalização das relações obrigacionais: a violação positiva do contrato.
Revista Fórum de Direito Civil, v. 2, no 2, p. 149171, jan./abr. 2013.
678 AZULAY, Fortunato. Do inadimplemento antecipado do contrato. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1977;
BECKER, Anelise. Inadimplemento antecipado do contrato. Revista de Direito do Consumidor, v. 12, p.
6878, out./dez. 1994.
679 Hochster vs. De La Tour (1853) 2 E&B 678. Cf. a respeito: MARTINSCOSTA, Judith. A recepção do

incumprimento antecipado no Direito brasileiro: configuração e limites. Revista dos Tribunais, São
Paulo, v. 98, no 885, p. 3048, jul. 2009. § 1º.
680 KUYVEN, Fernando; PIGNATTA, Francisco Augusto. Comentários à Convenção de Viena: Compra e
venda internacional de mercadorias. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 703.
681 TERRA, Aline de Miranda Valverde. O chamado inadimplemento antecipado. Revista de Direito

Privado, v. 60, p. 135157, out./dez., 2014. Item 2.2.


682 MARTINSCOSTA, Judith. A recepção do incumprimento antecipado no Direito brasileiro: configu-
ração e limites...cit. § 1º.
683 Corretamente situando a quebra antecipada no Direito de common law e usando fundamentos in-

fraconstitucionais para sua aplicação: GOBBI, Rafael Nossa. A possibilidade da quebra antecipada do
contrato. Revista Fórum de Direito Civil, v. 5, no 11, p. 177188, jan./abr. 2016.
684 FERREIRA, Antonio Carlos. Coluna Direito Civil Atual: A interpretação da doutrina do adimple mento
substancial (Parte 1). Revista Consultor Jurídico. 9 fev. 2015. Disponível em: [www.conjur.com.br/2015-
fev09/direitocivilatualinterpretacaodoutrinaadimplementosubstancialparte]. Acesso em: 20 mar.
2017. No mesmo sentido: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: Autonomia da
vontade e teoria da imprevisão...p. 7172.
685 Kingston v. Preston, 2 Doug. 689 [K.B. 1773].
686 126 Eng. Rep. 160(a), Boone v. Eyre [K.B. 1777].
687 230 N. Y. 239, Jacob & Youngs, Inc. v. Kent.
688 COUTO E SILVA, Clóvis Veríssimo do. O princípio da boa fé no Direito brasileiro e português. In. AA.VV.

Estudos de Direito Civil Brasileiro e Português: Jornada LusoBrasileira de Direito Civil (1979, Porto
Alegre). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980. p. 4372, cit. p. 56.
689 STJ.
REsp 76.362/MT, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j. 11/12/1995, DJ 01/04/1996, p.
9917; STJ. REsp 113.710/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j. 25/02/1997, DJ
31/03/1997, p. 9640; STJ. REsp 272.739/MG, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j.
01/03/2001, DJ 02/04/2001, p. 299.
690 Autores
brasileiros que utilizam a boafé objetiva como fundamento do adimplemento substan cial:
BECKER, Anelise. A doutrina do adimplemento substancial no Direito brasileiro e em perspec tiva
comparatista. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, v. 9, no 1, p.
6077, nov. 1993; MARTINS COSTA, Judith. A boafé objetiva e o adimplemento das obrigações. Revista
Brasileira de Direito Comparado, v. 25, p. 229281, 2. sem. 2003; SCHREIBER, Anderson. A boafé objetiva
e o adimplemento substancial. In. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; TARTUCE, Flávio
(Coord.). Direito contratual: temas atuais. São Paulo: Método, 2007. p. 125146 (criticando a
disparidade entre as decisões dos tribunais em termos quantitativos para a fixação do adimplemento
substancial, bem como a “ausência de uma análise qualitativa, imprescindível para saber se o
cumprimento nãointegral ou imperfeito alcançou ou não a função que seria desempenhada pelo
negócio jurídico em concreto”, op. cit. p. 140). No STJ, o adimplemento substancial tem sido
tradicionalmente fundado na boafé objetiva: STJ. REsp 1622555/MG, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta
Turma, j. 22/02/2017, DJe 16/03/2017; STJ. REsp 1255179/RJ, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, j. 25/08/2015, DJe 18/11/2015 (esp. no voto vista); STJ. REsp 877965/SP, rel Min. Luis
Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 22/11/2011, DJe 01/02/2012.
691 Quanto ao fundamento exclusivamente infraconstitucional: PRADO, Augusto Cézar Lukascheck.

Adimplemento substancial: fundamento e critérios de aplicação. Revista de Direito Civil


Contemporâneo. v. 9, ano 3, p. 373407, out./dez. 2016. p. 385390; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Revisão
judicial dos contratos: Autonomia da vontade e teoria da imprevisão...p. 7172.
692 STJ. REsp 1581505/SC, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 18/08/2016, DJe 28/09/2016.

Em acórdão mais recente, essa orientação foi reafirmada: STJ. HC 439.973/MG, rel. Min. Luis Felipe
Salomão, rel. para o acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 16/8/2018, DJe
04/09/2018.
693 Em grande medida, a influência da WRV no Brasil devese ao trabalho de estudo e de divulga ção

desse texto constitucional e da doutrina que lhe deu conteúdo interpretativo levado a efeito por
autores brasileiros. A tanto que, em 1924, “aparecia no Rio, o livro de Aprígio C. de Amorim Garcia,
contendo a tradução daquela constituição, sob o título A Constituição Alemã de 1181919”
(VALLADÃO, Haroldo. Influência do Direito alemão na codificação civil brasileira (1857/1922). Jurídica:
Revista Trimestral (Rio de Janeiro), v. 18, no 123, p. 4152, out./dez. 1973. p. 51).
694 No original: “Eigentum verpflichtet. Sein Gebrauch soll zugleich dem Wohle der Allgemeinheit dienen.”
(art. 153, apartado 3, WRV).
695 Como afirma Martin Wolff (Reichsverfassung und Eigentum. In. AA.VV. Festgabe der Berliner

Juristischen Fakultät für Wilhelm Kahl. Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1923. t. 4. p. 10), essa
concepção de propriedade limitada pelo elemento social não é nova e já se encontrava presente na
obra de Otto Gierke, pela teoria do direito subjetivo e pela jurisprudência do Reichsgericht.
696 BERCOVICI, Gilberto. O direito de propriedade e a Constituição de 1988: Algumas considerações
críticas. Cadernos de Direito – Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), v. 3, no 5, p. 6777, dez.
2003. p. 72.
697 BERCOVICI, Gilberto. O direito de propriedade e a Constituição de 1988: Algumas considerações
críticas...p. 72.
698 Nesse sentido: “No Brasil, a legislação consagrou o termo ‘função social da propriedade’ no Estatuto

da Terra (Lei no 4.504, de 30 de novembro de 1964), porque substancialmente, a emen ta desta lei é a
regulamentação deste princípio” (TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. O Direito Civil na disciplina jurídica
do patrimônio cultural brasileiro. Tese de LivreDocência. São Paulo: Universidade de São Paulo,
Faculdade de Direito, Departamento de Direito Civil, 2016. p. 186). Sobre o desperdício histórico que
foi a baixa eficácia do Estatuto da Terra: BERCOVICI, Gilberto. O direito de propriedade e a
Constituição de 1988: Algumas considerações críticas...p. 74.
699
Art. 2o, § 1o, alíneas a, b, c e d, Estatuto da Terra.
700
Além do já mencionado art. 2o, § 1o, há também os seguintes dispositivos que fazem menção
expressa à função social no Estatuto da Terra: Art. 2o, § 2o. “É dever do Poder Público: (...) b) zelar para
que a propriedade da terra desempenhe sua função social, estimulando planos para a sua racional
utilização, promovendo a justa remuneração e o acesso do trabalhador aos benefícios do aumento
da produtividade e ao bemestar coletivo”; Art. 12. “À propriedade privada da terra cabe
intrinsecamente uma função social e seu uso é condicionado ao bemestar coletivo previsto na
Constituição Federal e caracterizado nesta Lei”; Art. 13. “O Poder Público promoverá a gradativa
extinção das formas de ocupação e de exploração da terra que contrariem sua função social”; Art. 18.
“A desapropriação por interesse social tem por fim: a) condicionar o uso da terra à sua função social,
(...)”; Art. 47. “Para incentivar a política de desenvolvimento rural, o Poder Público se utili zará da
tributação progressiva da terra, do Imposto de Renda, da colonização pública e particular, da
assistência e proteção à economia rural e ao cooperativismo e, finalmente, da regulamentação do
uso e posse temporários da terra, objetivando: I desestimular os que exercem o direito de
propriedade sem observância da função social e econômica da terra, (...)”.
701 LOPES, José Reinaldo de Lima; QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo; ACCA, Thiago dos Santos. Curso de
História do Direito. 3. ed., rev. São Paulo: Método, 2013. cap. 10.
702 Sobre a constitucionalização do direito de propriedade ao longo da história constitucional bra sileira:

RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um caso de
“constitucionalização” do Direito Civil...loc. cit. Sobre a criação de mecanismos limitadores ao
exercício do direito de propriedade na CF/1934 e na CF/1937: BEVILÁQUA, Clóvis. A Constituição e o
Código Civil... loc. cit.; PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro
de 1937...p. 510514; PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro
de 1937...p. 2530.
703 “A Constituição brasileira de 1967 estabeleceu a função social da propriedade como um dos prin-
cípios da ordem econômica (art. 157, III), prevendo a desapropriação da propriedade rural que
contrariasse os princípios da ordem econômica” (TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. O Direito Civil na
disciplina jurídica do patrimônio cultural brasileiro...p. 186). Sobre o caráter “extremamente ingê nuo”
(extrem naive) de certas visões do constitucionalismo brasileiro sobre os direitos individuais e sociais
e a desconsideração de outros fatores explicativos como o jogo político, as representa ções sociais e
as redes de grupos de poder: SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. Verfassung und Verfassungsrecht
in Brasilien (18241988). Rechtsgeschichte - Rg, v. 16, p. 97103, 2010. p. 99.
704 Nesse sentido, quanto às mudanças no direito de filiação: “A restrição inicial do legislador do Código
Civil era com relação aos incestuosos e adulterinos. Estes últimos, à época do Código Civil, tinham
vedada a possibilidade do reconhecimento. Passo a passo, porém, essa categoria de filhos ganhou
direitos, digase, graças à incansável luta de nossos doutrinadores e às tendências liberais de nossos
Tribunais” (ALMEIDA, José Luiz Gavião de. O novo estatuto da filiação. In. BITTAR, Carlos Alberto. O
Direito de Família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 153186, cit. p. 162). Em sentido
aproximado, quanto ao Direito de Família e o direito de filiação: “Em verdade, podese constatar que o
longo processo de superação dos motivos que inspiraram a arquitetura do direito de família no
Código Civil de 1916 já se iniciara entre nós bem antes de 1988, conforme revelam as sucessivas
normas de proteção aos filhos e a notável construção jurisprudencial de amparo à companheira, as
quais contribuíram, de modo eficaz, para retirar diversas famílias da ‘ilegitimidade’ que lhes havia
sido destinada pela Lei Civil (BARBOZA, Heloisa Helena. O Direito de Família e o Código Civil de 2002:
Algumas considerações gerais. In. LEITE, Eduardo de Oliveira; PACHECO, José da Silva. Revista Forense:
Edição comemorativa 100 anos. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 401418, especificamente: p. 406). A
autora, no entanto, afirma que “tal fato, porém, em nada diminui o papel primordial da Constituição
da República no estabelecimento dos fundamen tos de um direito de família comprometido com a
valorização do ser humano” (BARBOZA, Heloisa Helena. O Direito de Família e o Código Civil de 2002:
Algumas considerações gerais. In. LEITE, Eduardo de Oliveira; PACHECO, José da Silva...p. 406).
705 STF. RE 52217, DJ de 12/09/1963; STF. RE 49064, DJ de 18/01/1962; STF. RE 26329, DJ de 11/08/1961;

STF. AI 24430, DJ de 15/06/1961; STF. RE 44108, DJ de 04/08/1960, RTJ 14/231; STF. RE 19561, DJ de
29/10/1953; STF. RE 9855, DJ de 28/05/1948; STF. AI 12991, DJ de 21/08/1947.
706 Para uma análise pormenorizada dessas leis: AZEVEDO, Alvaro Villaça. Estatuto da família de fato. São
Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2001. p. 358377 (Lei nº 8.971/94) e p. 378405 (Lei nº 9.278/96).
707 “A união entre homossexuais juridicamente não existe nem pelo casamento, nem pela união es tável,

mas pode configurar sociedade de fato, cuja dissolução assume contornos econômicos, re sultantes
da divisão do patrimônio comum, com incidência do Direito das Obrigações” (STJ. REsp 502.995⁄RN,
rel. Min. Fernando Gonçalves, Quarta Turma, j. 26/04/2005, DJ 16/05/2005).
708 “Comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do mesmo sexo, é de se reconhecer o
direito do companheiro sobrevivente de receber benefícios previdenciários decorrentes do plano de
previdência privada no qual o falecido era participante, com os idênticos efeitos operados pela união
estável. (...) O direito social previdenciário, ainda que de caráter privado complemen tar, deve incidir
igualitariamente sobre todos aqueles que se colocam sob o seu manto protetor. Nessa linha de
entendimento, aqueles que vivem em uniões de afeto com pessoas do mesmo sexo, seguem
enquadrados no rol dos dependentes preferenciais dos segurados, no regime geral, bem como dos
participantes, no regime complementar de previdência, em igualdade de condi ções com todos os
demais beneficiários em situações análogas” (STJ. REsp 1.026.981/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, j. 04/02/2010, DJe 23/02/2010).
709 “Assentando o Tribunal local restar comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do

mesmo sexo, é de se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente à meação dos bens ad-
quiridos a título oneroso ao longo do relacionamento, independentemente da prova do esforço
comum, que nesses casos, é presumida, conforme remansosa jurisprudência do STJ” (STJ. EDcl no
REsp 633.713/RS, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 11/02/2014).
710 Exemplo do quão é determinante o desejo social de mudança está no anteprojeto de código civil de
Orlando Gomes, cuja não conversão em lei se deveu, de modo não exclusivo, mas por causa
preponderante, à oposição social aos câmbios que ele introduzia no Direito de Família: “Apreciando
o projeto de Código Civil já tivemos o ensejo de esclarecer que poderia, eventual mente, abalar as
bases da família. (...) Um projeto de Código Civil que refletisse as aspirações da sociedade brasileira
deveria, pois, dirigindo os costumes e reagindo contra as distorções exis tentes, apresentar como
instrumento adequado e eficaz para fortalecer a família. Não cabe ao Código abrir estradas mais
largas para a dissolução dos costumes e o enfraquecimento da união conjugal” (WALD, Arnoldo. A
elaboração e revisão dos projetos de códigos. Revista de Direito da Procuradoria Geral - Governo do
Estado da Guanabara, no 21, p. 166189, 1969. p. 169, com referências à campanha contra a aprovação
do projeto de código civil liderada pelo monsenhor Arruda Câmara, e p. 174, a segunda parte da
transcrição).
711 § 3º do art. 226, CF/1988.
712 § 5º do art. 226, CF/1988.
713 No Reino de Espanha, a Lei 13 de 2005 introduziu a possibilidade de casamento entre pessoas do
mesmo sexo, acrescentando o seguinte parágrafo ao art. 44 do Código Civil: “El matrimonio tendrá los
mismos requisitos y efectos cuando ambos contrayentes sean del mismo o de diferente sexo”. Em
Portugal, a Lei nº 9, de 31 de maio de 2010, alterou alguns artigos do Código Civil de 1966 (arts.
1.577º, 1.591º e 1.690º), passando o art. 1.577º a dispor que: “Casamento é o con trato celebrado
entre duas pessoas que pretendem constituir família mediante uma plena comu nhão de vida, nos
termos das disposições deste Código”. A redação anterior desse dispositivo era: “Casamento é o
contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem consti tuir família mediante
uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código”. Na República Argentina, a
Lei nº 26.618, de 21 de julho de 2010, em seu art. 2º, modificou o Código Civil de 1869, cujo art. 172
passou a ter esta redação: “Es indispensable para la existencia del matrimonio el pleno y libre
consentimiento expresado personalmente por ambos contrayentes ante la autoridad competente para
celebrarlo. El matrimonio tendrá los mismos requisitos y efectos, con independencia de que los
contrayentes sean del mismo o de diferente sexo. El acto que careciere de alguno de estos requisitos no
producirá efectos civiles aunque las partes hubieran obrado de buena fe, salvo lo dispuesto en el artículo
siguiente”. No atual Código Civil argentino (2015), esse dispositivo ganhou um equivalente no Livro
Segundo (Relações de Família), Titulo I (Matrimonio), Capítulo 1 (Princípios de Liberdade e de
Igualdade): art. 402. “Interpretación y aplicación de las normas. Ninguna norma puede ser interpretada ni
aplicada en el sentido de limitar, restringir, excluir o suprimir la igualdad de derechos y obligaciones de los
integrantes del matrimonio, y los efectos que éste produce, sea constituido por dos personas de distinto o
igual sexo”.
714 “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na
convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”
(art. 1.723, caput, CC/2002).
715 STF. ADPF 132, rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, j. 05/05/2011, DJe198 14102011.
716 Em seu voto, o min. Cezar Peluso anotou que essa técnica interpretativa somente seria possível no
caso em apreciação porque não haveria total correspondência semântica entre o art. 1.723 do
CC/2002 e o art. 226, § 3º da CF/88: “Começo por dizer que teria alguma dificuldade de ordem teórica
para conhecer das demandas como ações diretas de inconstitucionalidade, não fosse o fato de que o
disposto no artigo 1.723 do Código Civil não é reprodução estrita do artigo 226, § 3º, da Constituição
Federal. Porque, se o fosse, obstáculo teórico e, a meu ver, constitucional, estaria em que não seria
possível cogitarse de interpretação conforme à Constituição de norma infraconstitu cional que se
limitaria, nessa hipótese, a reproduzir texto constitucional. Estaríamos, sim, diante de um caso de
pura interpretação constitucional, que não poderia ser objeto de ação de inconstitu cionalidade sob
pretexto de que teríamos que interpretar a própria Constituição de acordo com a Constituição. Mas a
diversidade de redação das normas permite, e acho que isto é, de modo muito consistente, a sua
racionalidade, a decisão da Corte de conhecer das demandas, exatamente com base na não
coincidência semântica entre as duas normas, de tal modo que é possível enxergar o disposto no
artigo 1.723 como preceito susceptível de revisão à luz do artigo 226, § 3º, e de outras normas
constitucionais, que constam, aliás, como causa de pedir de ambas as demandas”.
717 Sobre isso, confirase: “Essa mistura entre a determinação normativa, resultante de opções de-

mocráticas, e a ‘hermenêutica teleológica’, se fossem trocados os sinais, permitiria, em uma so-


ciedade fortemente submetida a paradigmas morais (como as islâmicas), que os valores religiosos
servissem para se interpretar “teologicamente” normas constitucionais que anuíssem com o casa-
mento homossexual, impedindo essas uniões em nome de Deus. Entre a interpretação ‘teológica’ e a
‘teleológica’, para se usar de um trocadilho infame, estaria o sacrifício de direitos assegurados
literalmente na Constituição. O risco é o mesmo, ainda que se não queira admitir” (RODRIGUES JR.,
Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo...p. 54).
718 AZEVEDO, Noé. A socialização do Direito Penal... loc. cit.
719 “A Constituição da República Popular da China (artigo 13) possui um dos regimes de proteção ao
direito de propriedade privada mais próximos do modelo norteamericano e da matriz clássica do
século XIX, quando prescreve que os bens particulares (lícitos) dos cidadãos são invioláveis. Em
seguida, diz que o Estado, de acordo com a lei, deve proteger esses direitos, inclusive os de herança.
Admitese a desapropriação ou a requisição de propriedade privada, em conformidade com a lei e
para realização do interesse público, por meio de justa indenização” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz.
Propriedade e função social: Exame crítico de um caso de “constitucionalização” do Direito Civil...p.
66).
720 “Por fim, é de ser considerado que a mera constitucionalização do direito de propriedade não

implica, de per si, um elemento ótimo para seu exercício. Os exemplos do Canadá e da Austrália,
países notoriamente conhecidos pela estabilidade de suas relações jurídicopúblicas e jurídico-
privadas, comprovam a ausência desse vínculo de causalidade necessária” (RODRIGUES JR., Otavio
Luiz. Propriedade e função social: Exame crítico de um caso de “constitucionalização” do Direito
Civil...p. 70).
CAPÍTULO SÉTIMO

O QUE É CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL

SUMÁRIO. § 36. Colocação do problema. § 37. Constitucionaliza ção por


elevação de normas ordinárias ao texto constitucional. § 38.
Constitucionalização por reforma legislativa. § 39. Cons titucionalização
por juridicização das normas constitucionais. § 40. Constitucionalização
por transformação das instituições e dos direitos ou por irradiação do
Direito Constitucional. § 41. Excursus: Constitucionalização em sentido
jurídicopolítico (cons titucionalização e reconstitucionalização) e jurídico-
sociológico (constitucionalização simbólica). § 42. Conclusões parciais.
§36. COLOCAÇÃO DO PROBLEMA
Afastados os conceitos sincréticos de constitucionalização do Direito,
existem algumas tentativas consistentes de sua caracterização nas obras de
Gunnar Folke Schuppert e Christian Bumke,721 na Alemanha, e de Louis
Favoreu,722 em França, os quais foram divulgados no Brasil em obras como as de
Virgílio Afonso da Silva723 e Leonardo Martins,724 além de uma tradução de
Robert Alexy.725 Essas teses podem ser alocadas no grupo de teorias não
sincréticas. Não se vai desenvolver aqui o conteúdo de cada uma delas
isoladamente.726 Para isso, remete-se o leitor aos textos originais ou aos estudos
que a eles se referiram, todos já citados.727
Neste capítulo, tentar-se-á oferecer a resposta à questão que lhe dá título.
Quando necessário, far-se-á menção às teorias não sincréticas, especialmente
para mostrar a aproximação ou o distanciamento dos conceitos nelas
desenvolvidos. Optou-se pelo caminho mais difícil de se procurar uma resposta
adequada ao Direito Civil. Para tanto, não se apresenta uma reprodução literal de
algum dos modelos não sincréticos já referidos. Dadas as peculiaridades da
constitucionalização do Direito Civil no país, de difícil comparação com outras
experiências mais conhecidas na Europa, entendeu-se mais adequado formular
não propriamente um modelo (ou, simplesmente, reprodu-zi-lo). Objetivou-se
dizer em que situações haveria a constitucionalização do Direito Civil. Se disso
resultar um modelo autônomo, é algo positivo, embora não tenha sido o móvel
desta tese.
Negar a constitucionalização do Direito Civil, em pleno século XXI, é
impossível. E, como exposto, ao menos em uma de suas formas de expressão,
isso nunca foi ousado pelos grandes civilistas brasileiros dos últimos dois
séculos. E é também óbvio que a maior parte dos civilistas citados nos capítulos
anteriores não teria como se referir à constitucionalização do Direito Civil, uma
vez que essa terminologia é muito recente. Isso, contudo, só demonstra que eram
conhecidos e aceitos muitos dos fenômenos ou das consequências jurídicas do
que hoje se denomina de constitucionalização.
§37. CONSTITUCIONALIZAÇÃO POR ELEVAÇÃO DE NORMAS
ORDINÁRIAS AO TEXTO CONSTITUCIONAL
Esta acepção é identificável na obra de Louis Favoreu, mais
particularmente, em um capítulo de obra coletiva sobre a constitucionalização do
Direito, tomando por base a experiência francesa a partir da década de 1980.
Louis Favoreu criou a expressão “constitucionalização-elevação”, por ele
situada dentre os “efeitos diretos” da constitucionalização.728 É necessário, no
entanto, aproveitar o nomen iuris proposto por Louis Favoreu sem
necessariamente admitir sua recepção total no Direito brasileiro. Explica-se.
(Para isso, o leitor haverá de favorecer a explicação com suas memórias sobre
elementos de Direito Constitucional). É ordinariamente conhecido que o sistema
constitucional francês se alterou de modo nada sutil com a instauração da V
República, após o referendo de 22 de setembro de 1958 e a consequente
aprovação da Constituição da República Francesa, de 4 de outubro de 1958, até
hoje em vigor. A V República e a Constituição de 1958 são as filhas diletas do
general de brigada Charles de Gaulle, que havia assumido o poder em França,
pela segunda vez na História do país, em maio de 1958, para debelar a crise
política com a Guerra da Argélia, que quase levou os franceses a uma guerra
civil. Desde Napoleão Bonaparte, os franceses criaram um sistema jurídico-
político baseado no Parlamento e no Poder Executivo. O Poder Judiciário, por
seus vínculos históricos com o Antigo Regime, nunca foi verdadeiramente
confiável, o que se observa, por exemplo, pela criação de tribunais
administrativos, alheios ao controle dos juízes togados. A Constituição de 1958
começou a alterar esse cenário. O controle preventivo de constitucionalidade das
leis foi introduzido com uma emenda à Constituição em 1974.729 Trinta e cinco
anos depois, por meio da Lei Orgânica no 2009-1523, de 11 de dezembro de
2009, per-mitiu-se aos cidadãos franceses questionar diretamente a
constitucionalidade de uma lei que viole direitos e liberdades assegurados na
Constituição Francesa, por meio da questão prioritária de constitucionalidade.730
Com isso, deu-se um poder nunca suposto pelos revolucionários de 1789 a um
órgão como o Conselho Constitucional. Ademais, os franceses têm enorme zelo
pelas distinções entre leis e regulamentos. Tentou-se trazer para o Brasil o
interesse teórico por essas diferenciações, mas isso terminou por ser considerado
pouco útil, levando-se em conta o tratamento limitado que o STF deu ao poder
regulamentar no país, em geral consubstanciado em decretos. Esse expediente,
de tanto ser contestado judicialmente, levou a uma legalização de inúmeras
matérias contidas em decretos, as quais poderiam muito bem ser confinadas no
plano infralegal. Essa, porém, é uma discussão que ultrapassa os limites desta
tese e sobre ela recomen-da-se a literatura especializada.731
Por essas razões, não é possível ler Louis Favoreu e seu conceito de
constitu-cionalização-elevação sem considerar tantas particularidades do sistema
francês. Isso parece que está bem. Volte-se ao pensamento de Louis Favoreu.
Para ele, a consti-tucionalização-elevação tem dois sentidos: a) mudança no
sistema de fontes ou de produção de normas; b) a elevação de dignidade
normativa de matérias regulamentares para legislativas e destas para
constitucionais, seguindo-se, como ele afirma, um “movimento ascendente”.
Quanto ao sentido a), ele não interessa ao Brasil. Ao menos no
constitucionalismo republicano, nunca se teve aqui um problema, como há em
França, de aplicação do princípio Kompetenz-Kompetenz732 nas relações entre o
legislador constitucional e o legislador ordinário. Este último jamais ditou os
limites do primeiro. A “reserva da lei” não é usada para conter, limitar ou
condicionar o poder constituinte derivado. Ao reverso, a Constituição no Brasil
tudo pode em relação à lei. Quanto ao sentido b), Favoreu só lhe dedicou um
pequeno parágrafo final no texto. Ele é, contudo, o único que se aproveita para
fins de recepção conceitual ao Direito brasileiro.
Para se evitar mais confusões em um tema já permeado por elas, optou-se
por denominar esta espécie de “constitucionalização por elevação de normas
ordinárias ao texto constitucional”, a qual corresponde parcialmente ao conceito
de Louis Favoreu de “constitucionalização-elevação” e tem a vantagem de ser
autoexplicativa. Constitucionaliza-se o Direito, qualquer que seja ele, por meio
de processos típicos de escolha de parte da legislação ordinária a fim de que seja
elevada à dignidade de norma constitucional. É disso que se trata e nada mais.
Evidentemente que a constitucionalização por elevação de normas
ordinárias ao texto constitucional há de ocorrer de modo controlado e
excepcional. Ninguém supõe que toda a legislação ordinária tenha necessidade
ou aptidão para se converter em norma constitucional. Esse expediente, se
generalizado, teria por efeito dilatar de tal modo a Constituição que ela perderia
sua natureza e sua finalidade. Seria o equivalente a transformar a Constituição
em uma daquelas “codificações”733 do século XVIII, como o Allgemeines
Landrecht für die Preußischen Staaten – ALR, o código para os estados
prussianos elaborado entre 1783 e 1788, que chegou a contar com 19.194
artigos, compreensivo do Direito Público e do Direito Privado. A marca desses
textos legislativos eram suas ambições iluministas, elaborados por déspotas
esclarecidos e que acreditavam nas codificações como meio de expor sua adesão
ao rol de nações cultas.734 A despeito disso, nota-se que, em constituições com
perfil parecido com a brasileira, esse tipo de constitucionalização pode-se
revelar, muita vez, excessivo, ao exemplo de normas como: a) a que prevê o
dever do Poder Público de fazer a chamada dos alunos no ensino fundamental
(art. 208, § 3o, CF/1988); b) a que determina que o Colégio Pedro II, ,
“localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal”
(art. 242, § 2o, CF/1988); c) ou a que determina que a Imprensa Nacional e
demais gráficas dos entes federativos “promoverão popular do texto integral da
Constituição”, “de modo que cada cidadão brasileiro possa receber do Estado um
exemplar da Constituição do Brasil” (art. 64, ADCT). Embora possam ser
considerados comandos muito importantes, é razoável afirmar que não deveriam
compartilhar o espaço constitucional com regras de dignidade muito superior em
termos axiológicos ou de importância material.735
Esse deslizamento para cima, a se usar a expressão de Louis Favoreu, é
muito comum na História brasileira. Como visto nos artigos de Clóvis
Beviláqua736 e de Caio Mário da Silva Pereira,737 respectivamente, sobre as
Constituições de 1934 e de 1937, diversas matérias de Direito Civil, em relação
à propriedade e à família, foram constitucionalizadas por elevação. Silvio
Rodrigues entende que a CF/1934 inaugurou a constitucionalização do Direito
de Família no país, porquanto, a partir dela, todas as demais Constituições
trouxeram preceito “dizendo que a família, constituída pelo casamento de
vínculo indissolúvel, está sobre a proteção especial do Estado (Constituição de
1934, art. 144, Constituição de 1946, art. 163, Constituição de 1969, Emenda
Constitucional no 1, art. 175)”.738 A tal respeito, não se pode falar em grandes
inovações nessa modalidade, o que não é de se diminuir, porém, o ganho
dogmático em se reconhecer sua existência e as vantagens semânticas de se
qualificar a constitucionalização como elevação de normas de direito ordinário
ao texto constitucional.
Na doutrina, embora sem o caráter sistemático que ora se propõe,
encontramse autores que já se ocupavam dessa forma de constitucionalização.
No Direito Público, por exemplo, citem-se: a) Paulo Bonavides, quando
mencionou a “constitucionalização administrativa das regiões”;739 b) Elival da
Silva Ramos,740 ao cuidar da constitucionalização dos partidos políticos (art. 17,
CF/1988); c) Ingo Wolfgang Sarlet, quando menciona a “presença do Direito
Privado na Constituição”;741 d) Leonardo Martins e a “constitucionalização do
direito trabalhista (art. 7o ao 11 da CF).742 Jónatas E. M. Machado refere-se ao
processo de “constitucionalização das liberdades da comunicação”, com
exemplos históricos e comparatísticos de sua ocorrência nos Estados Unidos da
América, em França e na Alemanha, desde o final do século XVIII até o século
XX.743
Alguns autores utilizam-se da expressão Direito Civil Constitucional
“como as normas de direito civil consagradas na constituição”, o que é, como
bem assinala Virgílio Afonso da Silva, “claramente um equívoco”, dado que
“normas de direito civil não deixam de ser normas de direito civil pelo simples
fato de estarem consagradas pelo texto constitucional”. De fato, “o texto que as
veicula é, nesse ponto, irrelevante, pelo menos para justificar a criação de um
direito civil constitucional”.744-745 No Direito Privado, pode-se citar Joaquim de
Sousa Ribeiro, quando este se refere a setores da legislação civil que passaram a
compartilhar do locus e da “dignidade constitucionais”.746
Constitucionalizar por elevação de leis ordinárias ao texto constitucional
não é algo essencialmente bom. É possível sustentar a não existência de uma
correlação entre hierarquia normativa e hierarquia axiológica:
constitucionalizar não implica necessariamente converter em uma norma óptima
a que foi submetida a esse processo. A norma apenas mudou de locus, por meio
de um processo legislativo diferenciado, alterando sua posição no quadro de
fontes do direito. Muito mais do que isso não pode ser objeto de afirmação, sem
que se proceda a um exame mais verticalizado sobre seu conteúdo, o que só
pode ser feito de modo tópico. Cada norma terá conteúdo axiológico
diferenciado, mesmo que tenha sido incluída no texto constitucional. Em geral, a
constitucionalização deve-se a fatores muito mais pragmáticos do que
propriamente dotados de superioridade moral. A transformação axiológica, que
pode ocorrer, é outra questão.
Outra razão igualmente destituída de superioridade moral está na solução
de problemas advindos da interpretação do direito ordinário, após uma série de
controvérsias judiciais. O exemplo mais colorido desse intuito de se
constitucionalizar o direito ordinário está no Capítulo I – Do Sistema Tributário
Nacional, do Título VI – Da Tributação e do Orçamento, da CF/1988. Esse
capítulo possui 19 artigos, contando-se o 149-A, dos quais apenas 9 não foram
alterados por revogação, modificação ou inclusão de texto, após sucessivas
emendas constitucionais.747 Tal capítulo da CF/1988 não pode ser referido como
o mais desfigurado por emendas. Ele é importante, contudo, porque é possível
identificar, em vários dos artigos cambiados, a presença de algum contencioso
judicial relevante para os entes federados e que, diante de derrotas no STF, se
optou pela saída mais simples: constitucionalizar por elevação o Direito
Tributário e tollitur quaestio. Um dos exemplos de maior eloquência está na
progressividade do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU. Por mais de
uma década, discutiu-se sobre se as alíquotas desse tributo poderiam ser
progressivas, o que era de interesse dos municípios, premidos pelo aumento de
competências (e de despesas correlatas) introduzido pela CF/1988. A matéria
chegou ao STF e, com voto dissidente vencedor do civilista min. Moreira Alves,
fundado em argumentos tributários e civilísticos, terminou por se reconhecer a
inconstitucionalidade incidental da cobrança de IPTU por meio de alíquotas
progressivas.748 Em resposta a isso, a matéria foi constitucionalizada por efeito
da EC no 29, de 13 de setembro de 2000, que alterou os arts. 34, 35, 156, 160,
167 e 198 da CF/1988. Hoje há quem defenda entre os tributaristas a
desconstitucionalização de grande parte do Sistema Tributário Nacional em face
do uso que se deu à constitucionalização como a relatada.749
Se é possível constitucionalizar, é também admissível
desconstitucionalizar normas presentes na Constituição, sem que isso implique
perdas qualitativas para o sistema jurídico.750 Aqui não é necessário ir ao Direito
Tributário para se encontrar tais exemplos. O Direito Civil fornece-os com
superior utilidade. O primeiro, que já foi tratado no Capítulo Segundo, § 12, diz
respeito à separação judicial, prevista expressamente no § 6o do art. 226 da
CF/1988, que, com a EC no 66, de 13 de julho de 2010, teve suprimido o
requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada
separação de fato por mais de 2 anos. Não se vai aqui retomar o debate sobre se
a separação judicial continua a subsistir no ordenamento jurídico brasileiro após
a EC no 66/2010. O essencial é que os defensores de sua extinção não aludem ao
fato de que, independentemente de haver sido a separação judicial mantida no
Direito como um instituto sediado na legislação ordinária751 ou simplesmente ab-
rogada da CF/1988 com efeitos sobre o direito ordinário, a hipótese é típica de
desconstitucionalização. Assim, encontra-se um argumento a reforçar a tese de
que a constitucionalização ou a desconstitucionalização, consideradas em si, não
acarretam perdas ou ganhos em termos axiológicos. A se entender de maneira
diversa, para os adeptos da tese do fim da separação judicial no Brasil, a
desconstitucionalização operada pela EC no 66/2010 terá operado um efeito
óptimo para o ordenamento.752
O segundo exemplo de desconstitucionalização por deslizamento para um
patamar inferior da ordem jurídica está na revogação do § 3o do art. 192,
CF/1988, que estabelecia a limitação a doze por cento ao ano do valor das taxas
de juros reais. Aos que não respeitassem o limite constitucional, a norma
imputava a prática do delito criminal de usura. A única ressalva estava na parte
final do parágrafo: “nos termos que a lei determinar”.753 A EC no 40, de 29 de
maio de 2003, para a tranquilidade dos agentes financeiros nacionais,
desconstitucionalizou o limite de doze por cento ao ano para a taxa de juros.754
Essa alteração constitucional apenas consolidou a ineficácia do § 3o do art. 192,
CF/1988, porque o STF, por meio de copiosa jurisprudência, de que resultou a
Súmula STF 648,755 nunca reconhecera a produção de efeitos dessa norma
constitucional enquanto não editada a lei complementar nela mencionada.
Conclui-se com o reconhecimento de que é possível firmar um acordo
semântico quanto ao que seja constitucionalização: elevação de normas
ordinárias ao texto constitucional. Sendo importante repetir a ressalva de
Virgílio Afonso da Silva: uma norma de Direito Civil que tenha sido
“constitucionalizada” não perde sua natureza civilística. Existem dezenas de
normas de Direito Internacional,756 Direito Administrativo,757 Direito Penal,
Direito Processual e Direito Tributário na CF/1988 e nem por isso perderam sua
vinculação a essas províncias jurídicas. Da mesma maneira, as normas de Direito
Previdenciário, Direito do Trabalho e de Direito Ambiental, três ramos
fortemente constitucionalizados com a CF/1988, não deixaram de ser
dispositivos previdenciários, trabalhistas e ambientais.758
É certo que o modo como se dá essa constitucionalização por elevação às
vezes conduz a um nível de concretude da norma na Constituição, que termina
por esvaziar o sentido e qualquer utilidade da norma correspondente ordinária.
Sobre esse ponto, contudo, cuidar-se-á na Terceira Parte, quando será
examinada a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
§38. CONSTITUCIONALIZAÇÃO POR REFORMA LEGISLATIVA
A entrada em vigor da CF/1988, assim como de todas as anteriores,
produziu efeitos sobre toda a ordem jurídica, independentemente do setor do
Direito. A jurisprudência do STF não declara inconstitucional uma lei anterior à
constituição vigente, porque o legislador não “poderia infringir Constituição
futura”. Quem elabora as leis não tem o dom da presciência constitucional. Fala-
se pura e simplesmente em revogação do direito ordinário que se mostra
incompatível com a nova ordem constitucional.759 Diz-se ainda que essa
contrariedade superveniente implica a não recepção do direito ordinário na nova
ordem constitucional.760
Em diversos parágrafos desta tese citaram-se vários civilistas que
descreveram os efeitos das novas Constituições sobre a legislação ordinária,
particularmente o Código Civil, ao exemplo de normas sobre propriedade
(função social, direito minerário, reforma agrária, desapropriação e meio
ambiente), família (casamento, filiação e direito protetivo) e contratos (relações
de consumo e livre-iniciativa).761 No Capítulo Sexto, relativo ao que não é
constitucionalização do Direito Civil, fez-se referência expressa ao controle de
constitucionalidade das leis. Embora seja figura que goze de relativa autonomia
e, para alguns, situada no plano do direito intertemporal, a não recepção de
normas em face de uma nova ordem constitucional foi incluída nas hipóteses não
alcançadas pela constitucionalização. Afirmar o contrário é simplificar o
conceito de constitucionalização e reabrir as portas para o desacordo semântico,
objeto de franco combate nesta Segunda Parte.
Apresentada essa distinção, passe-se a outro aspecto da matéria, o qual
pode ser útil ao propósito desta tese. Se uma nova Constituição deixa de
recepcionar as normas anteriores com ela incompatíveis, haverá um conjunto de
normas ordinárias não recepcionado e que criará enormes problemas no processo
de realização do Direito.762 A solução jurídica imediata para essa situação é
provocar o Poder Judiciário, em demandas concretas ou por meio da ADPF, para
que este declare a não recepção das normas ordinárias assim consideradas.
A CF/1988 foi de tal modo detalhada em vários de seus preceitos que
tornou óbvia a não recepção de artigos do CC/1916. O exemplo mais
característico está no § 6o do art. 227, CF/1988, que igualou os filhos legítimos
aos havidos fora da relação conjugal e aos adotivos.763 A fórmula constitucional
foi taxativa: todos esses filhos, a partir da vigência da CF/1988, passaram a ter
“os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação”.764
A lei ordinária não poderia mais qualificar os filhos de acordo com a
célebre classificação dos manuais de Direito de Família: legítimos, naturais,
ilegítimos, adulterinos, incestuosos e sacrílegos,765conquanto em relação aos
adulterinos já houvesse câmbios normativos desde a década de 1940. José Luiz
Gavião de Almeida detalha essas alterações: a) o Decreto-lei no 4.737, de 24 de
setembro de 1942, “veio permitir o reconhecimento dos filhos de desquitados”;
b) a Lei no 883, de 21 de outubro de 1940, “alargando o entendimento, veio
possibilitar o reconhecimento dos filhos adulterinos após a dissolução da
sociedade conjugal, qualquer que fosse a sua forma”; c) a Lei no 6.515, de 26 de
dezembro de 1977, permitiu fossem os adulterinos reconhecidos por testamento
cerrado, “ainda durante a constância da sociedade conjugal”, além de determinar
que “reconhecimento feito incidentalmente em ação de alimentos torne certa a
filiação após a dissolução da sociedade conjugal”; d) a Lei no 7.250, de 14 de
novembro de 1984, tornou possível o reconhecimento do filho adulterino
“durante a constância da sociedade conjugal, desde que separado, o casal, de
fato, há mais de 5 anos”.766
Essas designações discriminatórias foram comuns na quase totalidade dos
ordenamentos civis do século XX. Na Alemanha, por exemplo, mesmo após a
LF/1949, elas persistiram até uma série de reformas no BGB, que começaram no
final da década de 1960. O art. 6o, apartado 5, LF/1949, não introduziu o
princípio da igualdade entre filhos legítimos e ilegítimos, mas determinou que a
legislação ordinária criasse “as mesmas condições de desenvolvimento físico e
espiritual e de posição na sociedade” para filhos legítimos e ilegítimos.
Rigorosamente, a constituição alemã determinou que, por reforma legislativa, o
princípio da igualdade fosse introduzido no direito de filiação. A despeito do
comando constitucional, apenas com a Lei sobre a Posição Jurídica dos Filhos
Ilegítimos,767 de 18 de agosto de 1969, é que as mudanças tiveram início. A Lei
de Igualdade Sucessória de Filhos Ilegítimos768 só foi aprovada em 16 de
dezembro de 1997, com vigência a partir de 1o de abril de 1998, o que implicou
a equiparação de filhos ilegítimos aos legítimos em direitos à sucessão.
O caso brasileiro foi uma exceção no âmbito da experiência legislativa
comparada. Na maior parte do mundo, as reformas legislativas (não reformas
constitucionais) alteraram esse tratamento diferenciado no campo da filiação, o
qual era resultado de um consenso social, com base em valores morais, de que
assim se deveria tratar a prole.
O CC/1916 era claramente discriminatório quanto aos filhos ilegítimos.
Com a CF/1988, não haveria mais como subsistir essa distinção. O argumento
não era axiológico e sim normativo: uma norma posterior (e hierarquicamente
superior) revogou os artigos do CC/1916. Mas, haveria, como dito, a
necessidade formal de uma declaração do Poder Judiciário se os agentes
privados se recusassem a assim admitir em seus negócios jurídicos ou atos
unilaterais. Os advogados, membros do Ministério Público, professores e
estudantes, em seus pareceres, petições, livros e provas, poderiam interpretar
essas normas de acordo com a nova ordem constitucional e, de imediato,
reconhecer sua não recepção. As pessoas, em sua vida quotidiana, ganharam o
direito de não reconhecer tais dispositivos do código civil contrários à
Constituição.
Uma saída mais prática, universal e objetiva seria alterar o texto do
CC/1916 para ajustá-lo à CF/1988. A isso poder-se-ia denominar de reforma
legislativa. Logo após a entrada em vigor da CF/1988, a reforma teve início. O
art. 358, CC/1916, proibia o reconhecimento de filhos incestuosos e adulterinos.
Esse dispositivo foi revogado expressamente pela Lei no 7.841, de 17 de outubro
de 1989. Os arts. 332, 337 e 347, CC/1916, revogaram-se, de modo expresso,
pela Lei no 8.560, de 29 de dezembro de 1992, que regula a investigação de
paternidade dos filhos havidos fora do casamento. O art. 332, por exemplo,
afirmava que o parentesco era “legitimo, ou ilegítimo”, segundo procedesse “ou
não de casamento”. E poderia ser também “natural, ou civil, conforme resultar
de consangüinidade, ou adoção”. O art. 337 definia os filhos legítimos como os
que foram concebidos na constância do casamento, mesmo que anulado ou nulo,
se contraído de boa-fé.
Tal forma de constitucionalização foi defendida, embora não com a
linguagem aqui empregada, por Carlos Alberto Bittar quando ele afirmou, em
relação às leis ordinárias, que se fossem incompatíveis com o novo texto
constitucional teriam “de ser substituídas por outras, ditadas consoante os novos
cânones, ou ter declarada a sua inconstitucionalidade em casos específicos
porventura existentes”.769
Essa reforma legislativa não foi completa. Muitos dispositivos não
recepcionados permaneceram em vigor, o que implicou um redobrado trabalho
do Poder Judiciário para resolver conflitos entre os que se prevaleciam das
regras do CC/1916 e os que se favoreciam pela mudança constitucional.
Somente com a vigência do CC/2002 é que se eliminaram normativamente, ao
menos nesse setor do direito ordinário, todas as discriminações quanto à filiação.
Esse processo foi definido por Gunnar Folke Schuppert e Christian Bumke como
constitucionalização por reforma legislativa.770 Essa é a terceira acepção
adequada de constitucionalização.
A constitucionalização por reforma legislativa tem as mesmas vantagens
da constitucionalização por elevação: a) é objetivamente qualificável; b) não é
trivial ou óbvia, a ponto de não precisar de um locus específico na dogmática; c)
evita o efeito colateral dos discursos retóricos. Evidentemente que ela não se
confunde com a (i) não recepção de normas ordinárias incompatíveis com a nova
ordem constitucional. Muito menos é equiparável à (ii) interpretação de normas
infraconstitucionais em conformidade com a Constituição. As hipóteses (i) e (ii),
quando vistas de per si, estão compreendidas no quadro do que não é
constitucionalização. Ainda que a não recepção seja notável, como no exemplo
dos artigos do CC/1916 de caráter discriminatório no âmbito da filiação, ela será
apenas a causa eficiente da reforma legislativa, que pode até demorar muito ou
mesmo nunca ocorrer. Se a reforma, porém, foi iniciada e concluída, tem-se um
exemplo típico desta segunda acepção adequada da constitucionalização do
Direito Civil.771
A desvantagem da constitucionalização por reforma legislativa está em
que, como dito, ela pode ser excessivamente lenta ou mesmo nunca se ultimar.772
A demora em sua conclusão levará, ainda que não seja a causa exclusiva desse
efeito, a uma judicialização das normas ordinárias incompatíveis com a
Constituição. Isso é algo negativo, pois enfraquece a autonomia do Direito Civil,
fortalece o ímpeto intervencionista do Poder Judiciário, especialmente dos
tribunais constitucionais, e pode implicar uma supressão da margem de
conformação normativa atribuída ao legislador ordinário pela própria
Constituição.
A causa dos conflitos institucionais está precisamente nessa zona cinza
entre o exercício da legitimidade democrática do Parlamento para alterar as
normas ordinárias, a fim de constitucionalizá-las em face da nova ordem, e a
atuação como autêntico legislador positivo dos tribunais constitucionais.
O exemplo do § 6o do art. 227, CF/1988, é muito bom para mostrar como a
constitucionalização por reforma legislativa pode-se dar em termos equilibrados
e objetivos. Mas o que fazer diante da invocação do princípio da igualdade entre
filhos antes da reforma legislativa, quando não há uma regra como o § 6o do
art. 227, CF/1988? Note-se: o princípio da igualdade está positivado
constitucionalmente no Brasil desde 1824. Ainda que se desqualifique a
CI/1824, porque sob sua vigência manteve-se a escravidão em território
nacional, observem-se constituições como as de 1934 e 1946, que vigoraram em
períodos democráticos: seria possível resolver a questão da isonomia entre filhos
antes da reforma legislativa?
Esse exemplo demonstra a importância da reforma legislativa, posto que
sua resposta não seja simples e termine por adiantar o tema da
constitucionalização por transformação ou irradiação e, de certo modo, a
questão do espaço da intermediação legislativa.
§39. CONSTITUCIONALIZAÇÃO POR JURIDICIZAÇÃO DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS
Uma terceira acepção adequada de constitucionalização do Direito
consistiria em reconhecer a natureza jurídico-normativa e não apenas política
dos preceitos constitucionais. Konrad Hesse iniciou sua aula-magna de Friburgo
para o ano letivo de 1959 combatendo o conceito lassalliano de uma constituição
“pedaço de papel” e negando ao Direito Constitucional as funções de uma
disciplina auxiliar da Ciência Política.
No Brasil, desde meados dos anos 1990, o Direito Constitucional
apresenta-se como uma disciplina cada vez mais preocupada com questões
jurídicas do que com os fatores jurídico-políticos. Essa transformação é notável
pela maneira como se escreve sobre Direito Constitucional e como se estuda
Direito Constitucional.
Esse descasamento entre a realidade política e o texto constitucional daria
espaço para uma tese autônoma e ainda seria passível de críticas porque essa é
uma realidade cambiável conforme a história jurídica e o desenvolvimento das
instituições de cada na-ção. A prevalência do elemento político sobre o elemento
jurídico é também reconhecível nos textos de teóricos marxistas ou de autores
influenciados pelas ideias de Marx e Engels. Abstraindo essa posição, que é
plenamente defensável nos dias atuais, volte-se ao problema aqui suscitado: a
Constituição chegou a ter caráter não jurídico-norma-tivo? Se não toda a
Constituição, pode-se admitir que partes do texto constitucional foram
considerados, por muitos anos, como programáticos e destituídos de eficácia
jurídica plena. Há decisão do STF que declara o preâmbulo como uma parte do
texto da Constituição que “não se trata de norma de reprodução obrigatória na
Constituição estadual, não tendo força normativa”. O preâmbulo “não constitui
norma central”, no caso, a parte na qual se invoca a proteção de Deus.773 O
art. 67, ADCT, que concede o prazo de 5 anos para a conclusão do processo de
demarcação das terras indígenas seria um exemplo de norma programática.774
Delimitado o problema, mesmo com ressalvas de que haveria muito a se
discutir sobre o caráter meramente político das normas constitucionais no Brasil,
é certo que se verificou um crescente uso de conceitos jurídicos indeterminados
e princípios constitucionais para tornar operacionais direitos que o Estado não
entendia como exigíveis, salvo com previsão orçamentária ou comandos legais
específicos. Essa “evolução” no constitucionalismo brasileiro é também uma
caixa de Pandora para discussões autônomas, como, v.g., a recepção das teorias
alemãs da “reserva do possível” e do “mínimo existencial”, a maior parte das
vezes mal compreendidas ou sem a necessária contextualização histórica.775
A juridicização constitucional, com todas as ressalvas sobre o que dela se
fez no Brasil, é uma realidade e permite a formulação de um conceito próprio de
constitucionalização a ela associado. É o que, com as particularidades do Direito
francês, propôs Louis Favoreu,776 ao realçar a vinculação das autoridades
administrativas ao caráter jurídico-normativo da Constituição.777 É possível aqui
traçar um paralelo com Hesse, quando ele afirma que todas as autoridades
políticas se vinculam à Constituição.778
Constitucionalizar o Direito Civil é reconhecer a juridicização da
Constituição, com as ressalvas presentes na jurisprudência do STF e na teoria
constitucional. A constitucionalização do Direito Civil, nesta terceira acepção,
implica que as normas constitucionais não podem deixar de ser cumpridas, sob o
argumento de que elas seriam meros programas políticos, envolvidos em uma
forma jurídica.
Isso parece bem, ao menos para que se chegue a um acordo semântico
sobre essa terceira acepção. Mas, qual sua utilidade para o Direito Civil?
Considere-se que são relativamente poucos os preceitos constitucionais
diretamente ligados ao Direito Civil, como os relativos à propriedade, à família,
aos direitos da personalidade e à livre iniciativa, dentre outros. A maioria possui
um marco infralegal próprio. Após isso, é o caso de se inquirir: há espaço para
que um particular alegue que não cumprirá o texto constitucional por ter este
conteúdo meramente político ou programático? Evidentemente que a resposta é
negativa. Mas essa conclusão não chega ao absurdo do simplismo de se afirmar
que uma norma constitucional, por ser autoaplicável e de eficácia imediata, para
se usar da antiga classificação, incidiria diretamente sobre toda e qualquer
relação privada, ignorando o aparato normativo infraconstitucional.
Essa confusão é infelizmente muito corriqueira e tem levado a abusos
interpretativos, como se o juiz, ao interpretar uma regra ou um princípio da
CF/1988, possuísse o “toque de Midas constitucional”.779 Mais ainda quando se
nota que, especialmente quanto aos princípios constitucionais, sua generalidade
e ductilidade exigem muito mais autocontenção judicial, diante dos sérios riscos
de se “desprestigiar o direito legislado nos códigos em favor de uma retórica da
potencialização da eficácia do texto constitucional”.780 Mesmo quem defende a
eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos particulares, dentro dos
limites ortodoxos da doutrina alemã e de sua recepção no Brasil, não chega ao
exagero de confundir uma “norma constitucional autoaplicável e de eficácia
imediata” com a eficácia direta de direitos fundamentais em relação aos
particulares.781
É nessa zona cinzenta conceitual que se tem instalado um caos semântico
muito difícil de se debelar, seja porque interessa a quem dispõe da chave do
código semântico dizer qual é e qual não é o momento para sua abertura; seja
porque ela permite que uma oligarquia jurídica se aproprie da chave do código
semântico e diga o que a norma significa, cobrando muito caro para fazer uso da
chave.782
Essa preocupação é manifestada também por escritores de matriz
luhmanniana, como é o caso de Marcelo Neves, a propósito da
“constitucionalização simbólica” em países capitalistas periféricos como o
Brasil. Ele ressalta que essa constitucionalização pode ser compreendida como
“álibi em favor dos agentes políticos dominantes e em detrimento da
concretização constitucional”.
Haveria aí um duplo álibi: o “Estado” apresenta-se “como identificado com
valores constitucionais que não se realizam no presente por ‘culpa’ do
subdesenvolvimento da ‘sociedade’”, enquanto, “na retórica de grupos
interessados em transformações reais nas relações de poder, os quais pretendem
frequentemente representar a ‘subcidadania’, invocam-se os direitos
proclamados no textos constitucional para renunciar a ‘realidade constitucional
inconstitucional’ e atribuir ao Estado/governo dos ‘sobrecidadãos’ a culpa pela
não realização generalizada” dos direitos previstos na Constituição. A retórica
favorece a ambos os espectros. Até porque, “a concretização normativa do texto
constitucional pressuporia uma radical revolução nas relações de poder”.783
Este trabalho não segue a orientação luhmanniana e, por coerência, não
adere ao modo de estruturação teórica perceptível no texto de Marcelo Neves. É,
contudo, aproveitável a preocupação de Marcelo Neves com o caráter
reducionista da juridicização (ou juridificação, como ele prefere) como elemento
transformador de per si da realidade social em um país tão assimétrico e com
desigualdades sociais históricas.
A constitucionalização-juridicização, ao menos no Brasil, é importante
para acordos semânticos. Em comparação com a experiência constitucional de
outros países, ainda pode significar muito. No caso brasileiro e do Direito Civil,
é improvável que algum civilista contemporâneo afirme terem caráter puramente
político ou programático os incisos I, V, IX, X, XVII-XXI, XXII-XXIII, XXIV-
XXVI, XXVII-XXIX, XXX-XXXI, LXVII e LXXVI, todos do art. 5o, CF/1988.
Parte dos conteúdos desses incisos foram constitucionalizados por elevação em
1988, posto que vários outros já haviam sido elevados ao texto constitucional em
1934, 1937, 1946 ou 1967-1969, como a função social da propriedade, ou antes
ainda, como a propriedade, que figura em constituições nacionais desde 1824. A
juridicização total é mais recente, embora, como também se demonstrou pela
reprodução de antigas opiniões doutrinárias, ela já fosse encontrável desde o
século XIX. O certo é que esta terceira acepção presta-se adequadamente ao
acordo semântico almejado neste capítulo. Advirta-se, porém, que não se lhe
deve emprestar maior elasticidade conceitual do que a devida.
§40. CONSTITUCIONALIZAÇÃO POR TRANSFORMAÇÃO DAS
INSTITUIÇÕES E DOS DIREITOS OU POR IRRADIAÇÃO DO DIREITO
CONSTITUCIONAL
A quarta acepção de constitucionalização do Direito Civil é mais
complexa, problemática e difícil de se delimitar de entre as até agora
apresentadas. Há quem a considere ser a mais universalizável em termos
conceituais e a mais próxima do real sentido de constitucionalização.784 Nesta
acepção, estão muito próximas as construções teóricas de Louis Favoreu785 e dos
alemães Gunnar Folke Schuppert e Christian Bumke.786-787
Para Favoreu, haveria uma impregnação dos diferentes ramos do Direito,
que lhes transforma internamente. Além dos institutos jurídicos, há uma
mudança nas instituições, particularmente as administrativas e jurisdicionais,
embora seja o impacto da constitucionalização perceptível ainda no Direito
Privado. Essa transformação das instituições seria conectada com o papel dos
direitos fundamentais no ordenamento jurídico. Os efeitos da
constitucionalização seriam de três ordens: modernização do ordenamento
jurídico, unificação da ordem jurídica e sua simplificação.
Gunnar Folke Schuppert e Christian Bumke trabalham de perto com as no-
ções de Favoreu, posto que não haja referências recíprocas em suas obras. De
um modo geral, os autores procederam a um inventário de acontecimentos
jurídicos na Alemanha desde o caso Lüth e interpretaram-nos como se
integrassem um movimento sincrônico de: (i) subordinação do ordenamento aos
princípios e valores constitucionais, especialmente do Direito Privado; (ii)
adoção do conceito de Constituição como uma “ordem objetiva de valores”, ao
estilo dos fundamentos do TCF no caso Lüth, mesmo quando essa construção
tenha assumido, por vezes, um caráter retórico; (iii) a vinculação dos poderes do
Estado aos direitos fundamentais e, independentemente da forma direta ou
indireta, dos particulares.788
Convém proceder a um repasse crítico de alguns postulados e de algumas
conclusões apresentados por Favoreu e Schuppert-Bumke. Não se atentará muito
à precedência entre postulados e conclusões. Interessa aqui identificar o que é
aproveitável de cada modelo proposto à realidade brasileira:
(a) Unificação, simplificação e modernização da ordem jurídica. Neste
capítulo e no anterior, bem como ao longo de toda a Primeira Parte, conseguiu-
se demonstrar com enorme grau de verticalidade que a constitucionalização, em
suas diferentes acepções, não tem o poder de unificar a ordem jurídica. A
“grande dicotomia” resiste e, nos últimos 30 anos, só tem dado sinais de
fortalecimento. A simplificação é também equívoca. A ordem jurídica cada vez
mais se torna complexa e a manutenção dos espaços do Direito Privado como
um ambiente com princípios e valores autônomos é recognoscível como um
dado intrínseco a seu próprio sistema. Evidentemente que essa premissa não é
válida para positivistas jurídicos, no que é compreensível essa exceção em
relação a esse grupo. Constitucionalistas respeitáveis do século XX, como José
Horário Meirelles Teixeira, já enfatizavam essa diferenciação que, em ultima
ratio, é metodológica:

“Como acentuam os autores, a cada ramo do Direito corresponde um método,


uma técnica, regras especiais de interpretação. É evidente que normas de Direito
Privado não podem interpretar-se do mesmo modo, isto é, com o mesmo
espírito, segundo as mesmas regras, que normas de Direito Público. E dentro de
cada uma destas duas grandes divisões do Direito, a cada grupo especial de
normas jurídicas, em que se subdividem, deve corresponder uma técnica especial
de exegese”.789

Quanto à modernização da ordem jurídica, é certo que muitos avanços no


Direito Civil brasileiro em matérias sensíveis como família e propriedade
ocorreram por efeito do advento de novas constituições. Sobre esse aspecto,
todavia, está suficientemente documentado em termos históricos que é uma
contingência ter sido a Constituição o veículo de “transformação” desses
institutos. Em Direito de Família, as mudanças se deram no plano do direito
ordinário, como na Alemanha, em Portugal, Espanha e França. No direito de
propriedade, a constitucionalização por elevação (e não por irradiação ou
transformação) foi a responsável pelos câmbios conceituais no instituto. Quanto
a este último ponto, no entanto, as condições de exercício da propriedade agrária
no Brasil permaneceram problemáticas, com conflitos fundiários recorrentes e
baixa eficácia dessa constitucionalização-transformação, o que também se
explica pelo fato de que há limites fáticos a qualquer intervenção jurídica na
realidade.
(b) Subordinação do Direito Privado. No Capítulo Sexto, dedicou-se
generoso espaço à demonstração de que não é documentada na doutrina qualquer
voz relevante em prol da insubmissão do Direito Privado aos textos
constitucionais que se sucederam na História brasileira. Lourenço Trigo de
Loureiro, Teixeira de Freitas, Clóvis Beviláqua, Carlos Maximiliano, Martinho
Garcez, Pontes de Miranda, Serpa Lopes, Clóvis do Couto e Silva, Washington
de Barros Monteiro, Carlos Alberto Bittar e Rubens Limongi França, para se
limitar a civilistas dos séculos XIX e XX, cujas obras foram reproduzidas de
modo recorrente neste trabalho, enfatizaram o poder transformador da nova
ordem jurídico-constitucional sobre o Direito Civil e o Direito Privado. Esse
poder, contudo, não deriva de uma expressão peculiar da
constitucionalizaçãotransformação ou irradiação e sim, como todos eles
ressaltaram, do princípio hierárquico e do princípio da sucessão de normas no
tempo.
Volta-se, portanto, ao problema inicial: o caráter aberto e dúctil da
constitucionalização por irradiação ou por transformação, no qual há espaço
para clichês, imprecisões e uma vacuidade linguística que aproxima o intérprete
autorizado de um intérprete leigo. Para uma disciplina técnica e com um aparato
teórico tão antigo quanto moderno, a submissão a semelhantes imprecisões e
ductilidade, a longo prazo, pode ser desastroso.
Resultam, porém, como aproveitáveis dessa ideia de constitucionalização-
irra-diação, algumas premissas:
(aa) Os direitos fundamentais e sua intervenção nas relações privadas.
Tanto Favoreu quanto Schuppert-Bumke estão corretos quando põem ênfase no
papel dos tribunais constitucionais na irradiação. Se há um meio de se
constitucionalizar o Direito Civil – e todo o ordenamento - é pela intervenção
dos direitos fundamentais nas relações privadas. Entenda-se: a atuação desses
direitos fundamentais não é nova e vem sendo objeto de referências na doutrina
há décadas. Mais que isso, a jurisprudência do STF serve de comprovação a esse
papel. A grande mudança está na intensidade e na forma de intervenção dos
direitos fundamentais nas relações privadas, o que será objeto de amplo estudo
na Terceira Parte. O marco desse câmbio foi o caso Lüth, decidido pelo TCF em
1958, e que até hoje repercute em todo o mundo. A partir desse julgamento, a
existência de uma “ordem objetiva de valores” e de uma “irradiação dos direitos
fundamentais” incorporou-se à realidade jurídica de uma maneira irreversível.
A irradiação é, por conseguinte, o meio expressivo da constitucionalização
do Direito Civil na acepção aqui examinada. Mas é absolutamente inócuo assim
o reconhecer e transformar essa frase em um slogan. Deve-se estudar essa
irradiação por intermédio dos direitos fundamentais e se propor um modelo que
contole esse processo, o que será objeto da Terceira Parte da tese.
(bb) O papel dos tribunais constitucionais. A constitucionalização por
irradiação dá-se também por intermédio da ação dos tribunais constitucionais. E
como se dá essa intervenção? Antes de responder à pergunta, uma precisão
terminológica é indispensável: os tribunais agem por meio da jurisdição
constitucional. O controle de constitucionalidade, em suas diferentes formas, é o
meio por excelência dessa atuação, embora, no caso brasileiro, dada sua
complexidade, isso não seja totalmente verdade. É possível, por meio de
julgamento de recursos extraordinários ou de reclamações, encontrar efeitos de
irradiação. Assim, estaria arruinada a tese do § 32, no sentido de que
constitucionalização não se confunde com controle de constitucionalidade e com
a interpretação constitucional das normas? Não. A tese ali apresentada volta-se
contra o argumento trivial de que o controle de constitucionalidade (e a
interpretação constitucional) seriam de per si meios efetivos de
constitucionalização do Direito. Controlar a validade de normas ordinárias ou
adaptar-lhes o sentido para a nova ordem constitucional são expedientes
necessários em um Estado de Direito Democrático e nada têm de excepcional na
normalidade institucional de democracias. Eventualmente, porém, os tribunais
constitucionais utilizam-se desses mecanismos para dirigir impulsos de
transformação à ordem jurídica. Nesses casos específicos é que a
constitucionalizaçãoirradiação se apropria de tais meios como simples veículos
para seu propósito transformador. Não é possível condundir o conteúdo e o
continente.
A constitucionalização por reforma legislativa do direito de filiação na
Alemanha ocorreu porque o TCF, em alguns julgamentos reconheceu a
inconstitucionalidade de dispositivos do BGB (§§ 1671, 1738 e 1596, v.g.) em
face do art. 6o, apartados 2 e 5, LF/1949.790 Por efeito dessas diretrizes oriundas
de julgados do TCF, o legislador alemão adotou medidas para reorientar o
código civil ao texto constitucional. Nesse aspecto, deu-se um exemplo notório
de constitucionalização-irradiação que gerou uma constitucionalização por
reforma legislativa.
Independentemente do juízo de valor que se possa fazer a respeito, diversas
intervenções do STF podem ser associadas à constitucionalização-irradiação,
mas de uma forma que dificilmente seria identificável plenamente com um
exercício natural dessa função por uma corte constitucional. Em certa medida, a
mutação constitucional tem sido o veículo, declarado ou não, para servir a
autênticas mudanças da CF/1988, algumas das quais, ao entender deste autor,
caberiam apenas ao constituinte derivado. Em vez de agir como um tribunal
contramajoritário, o STF termina por se comportar como uma microconstituinte
permanente. A proteção das minorias termina por ser uma imposição das
minorias, em subversão aos princípios da democracia eleita, embora exercida por
pessoas bem-intencionadas, de notável saber jurídico e com os sinceros
propósitos de fazer o melhor pela ordem jurídica e pelos cidadãos.
Esse efeito potencialmente perigoso foi identificado em trabalhos de Ernst
Forsthoff,791 Uwe Diederichsen792 e Ernst-Wolfgang Böckenförde.793 Robert
Alexy, ao dialogar com esses autores, alude ao problema da
sobreconstitucionalização, que haveria sido objeto das críticas nos estudos por
eles desenvolvidos. Ao menos na experiência alemã, Robert Alexy considera que
não houve abusos por parte do TCF.794 Reconhece ele, todavia, que “uma
constitucionalização adequada somente é possível obter sobre o caminho,
pedregoso e cheio de manhas, de uma dogmática do espaço, como o problema da
constitucionalização, no fundo, além do âmbito dos direitos fundamentais”.795 É
precisamente no que se acredita nesta tese: a constitucionalização é inevitável.
Para se obstar os males da sobreconstitucionalização que, no caso do Direito
Civil, poderá ter efeitos asfixiantes, é essencial resolver problemas de espaço (o
que se tentou fazer nesta Segunda Parte) e de incidência (dos direitos
fundamentais, o objetivo da Terceira Parte).
§41. EXCURSUS: CONSTITUCIONALIZAÇÃO EM SENTIDO jurídico-político
(constitucionalização e reconstitucionalização) e jurídico-
sociológico (constitucionalização simbólica)
O processo de constitucionalização do Direito Civil, que se insere na
constitucionalização do Direito e, por extensão, da ordem jurídica, é
problemático em termos conceituais. Para além das acepções inadequadas e das
acepções adequadas, existem algumas outras que são importantes para o Direito
Constitucional e a Teoria do Estado, mas que não possuem igual relevância para
o Direito Civil. Exclusivamente por uma preocupação metodológica, far-se-á
referência a duas delas, como um fechamento do capítulo.
A primeira, que tem caráter jurídico-político, é a constitucionalização ou
reconstitucionalização. É um sentido muito antigo e quase sempre associado a
atos fundacionais ou à restauração de uma ordem jurídica. Quando se dá a
independência política, como no Brasil, em 7 de setembro de 1822, uma das
primeiras iniciativas das forças que conquistaram o novo status quo é dotar o
Estado de uma constituição. No Brasil-Império, após a independência houve
uma sequência de sangrentas batalhas contra forças terrestres e marítimas da
metrópole, a maioria delas estacionadas no Nor-te-Nordeste do país, com ordens
de Lisboa para resistir ao novo Governo no Rio de Janeiro e conduzir a situação
para um modus vivendi que resultasse na separação de parte do território
nacional, que permaneceria vinculado à Coroa portuguesa. A guerra interna e as
dificuldades naturais de criação de uma ordem político-jurídica soberana
conduziram à constitucionalização do Império do Brasil apenas em 25 de março
de 1824. É nesse sentido jurídico-político que se fala em constitucionalização de
um Estado. Algo semelhante ocorreu nos Estados Unidos da América, que se
tornaram independentes em 4 de julho de 1776, mas a Constituição de Filadélfia
é de 17 de setembro de 1787. Constitucionalizar, nessa acepção, é dotar um
Estado de uma Constituição, ainda que não escrita, com os institutos próprios a
uma organização estatal moderna (poderes do Estado, carta de direitos, normas
de tributação e de eleição, v.g.).
Como decorrência dessa acepção jurídico-política, está a
reconstitucionalização, que ocorre quando um país sai de um regime ditatorial
ou do estado de anarquia, responsável pela ruptura da ordem jurídica anterior e
que deixou de respeitar a carta de direitos, a separação dos poderes do Estado e
outros elementos essenciais de um Estado constitucional. Após revoluções,
golpes de Estado, guerras civis e outras convulsões políticas dessa envergadura,
as Constituições são geralmente as primeiras vítimas do novo regime. Não é sem
causa que um dos argumentos mais fortes a favor da autonomia epistemológica
do Direito Civil é sua perenidade e sua estabilidade em comparação com os
textos constitucionais. O Brasil teve em sua história apenas 2 códigos civis,
enquanto já vigoraram 7 (ou 8, se for considerada como uma constituição
autônoma a EC no 1/1969) constituições desde sua independência política.796 O
retorno à normalidade democrática dá-se, em geral, com a convocação de uma
assembleia constituinte e a promulgação de uma nova constituição. Esse
processo leva à reconstitucionalização da ordem jurídica.
Marcelo Neves desenvolveu, a partir de seu marco teórico luhmanniano,
uma acepção jurídico-sociológica de constitucionalização, que ele qualificou de
simbólica, mencionada anteriormente. Não é também este o espaço adequado
para desenvolver essa acepção em toda sua plenitude. Far-se-á apenas o registro
dessa acepção: qual o sentido de uma Constituição, dotada de um amplo
catálogo de direitos fundamentais, que não os consegue garantir ou efetivar? De
que adianta falar em constitucionalização do ordenamento jurídico, se há um
déficit eficacial nos direitos fundamentais, que não se explica por questões
técnicas (natureza programática ou não dessas normas) e sim pela circunstância
de o Brasil ser um país capitalista da modernidade periférica? Ter-se-ia uma
hipérbole da função simbólica da Constituição, que pouco ou nada aproveitaria a
seus súditos em uma república desigual e funcionalmente pobre como a
brasileira. Para além disso, a constitucionalização simbólica operaria como um
amortecedor de conflitos socais, de dissimulador dos problemas
socioeconômicos e um anteparo contra transformações efetivas da estrutura de
poder político e social. Esse efeito anestesiador da constitucionalização
simbólica é exemplificável por decisões do STF em Direito Civil, como as
relativas à propriedade rural, às relações familiares ou à livre-iniciativa que
resolvem topicamente os conflitos, retirando-os do âmbito parlamentar ou da
pressão política das ruas, mas que não oferecem respostas consistentes e
definitivas.
Essas duas acepções, como dito, alheiam-se do objeto propriamente dito da
tese, mas seria uma omissão deixar de referi-las ainda que em um excurso. De
modo especial, a constitucionalização simbólica é importante para reforçar uma
parte do discurso que permeia toda a tese, que é a de se evitar a mistificação dos
direitos fundamentais e de seu papel no ordenamento. Eles são essenciais, mas
não podem tudo. A eles não é dado substituir-se ao Direito Civil em seu caráter
autárquico e epistemológico.
§42. CONCLUSÕES PARCIAIS
O diálogo que serviu de base à “metáfora da Ilhas do Canal” poderia ser
reproduzido nos dias atuais. No lugar do oficial alemão e do bailio da Ilha do
Canal, estariam bem representados um jurista estrangeiro e um homólogo
brasileiro. Qual seria o resultado dessa conversação? Possivelmente, idêntico ao
verificado na lendária entrevista de 1945.
Não se vai nestas conclusões parciais proceder a uma síntese das acepções
préexcluídas de constitucionalização do Direito Civil. Muito menos pretende-se
repetir as acepções que se entende adequadas à delimitação conceitual. O
objetivo deste fecho da Segunda Parte é salientar a importância do que Alexy
denominou, em feliz expressão, de “problemas de espaço”. A
constitucionalização está muito longe de ser um conceito consensual. E, apesar
de seu sucesso em diversos países, persiste carente de um conteúdo objetivo (e
objetivável). No Brasil, começam a sair obras monográficas sobre
constitucionalização de outras áreas do Direito. O CPC/2015 tem servido de
impulso a essas novas produções bibliográficas. Apesar de centenas de páginas
escritas sobre o tema, não se encontra em algumas dessas obras um conceito
operacional de “constitucionalização” do Direito a que se refere. Tal fluidez
semântica é ótima como estratégia de combate, pois transforma a
constitucionalização em um conceito de guerrilha: nunca se sabe onde está, o
que é, suas dimensões e seus efetivos. Pode estar em todos os lugares e em lugar
algum. Como estratégia de combate, é um excelente modo de se fomentar o
desenvolvimento de um conceito, até porque inviabiliza qualquer crítica
sistemática ou tentativa de controle. Para quem decide e não tem grandes
preocupações com os custos argumentativos ou a prestação de contas
democrática, é um ótimo meio de justificar escolhas aleatórias e jogar com a
constitucionalização e seu enorme acervo de princípios e direitos fundamentais
para se liberar de qualquer conformação racional dos atos decisórios.
Não se sabe se isso é possível, até por não se ter alcançado tal nível de
desenvolvimento na maior parte do mundo, mas seria fundamental que a
constitucionalização deixasse de servir como um conceito de guerrilha e se
tornasse um conceito de combate convencional. Essa seria a única forma de se
poder discutir cientificamente um tema que, salvo exceções já citadas nesta
Segunda Parte (Luiz Edson Fachin, Gustavo Tepedino, Maria Celina Bodin de
Moraes, de entre outros), permanece como uma cidade aberta.
A contribuição dada nesta Segunda Parte é insuficiente se não vier
acompanhada de uma proposta de tratamento do problema da eficácia dos
direitos fundamentais nas relações privadas. É o que se procurará fazer a seguir.

721 SCHUPPERT, Gunnar Folke; BUMKE, Christian. Die Konstitutionalisierung der Rechtsordnung: Die
Konstitutionalisierung der Rechtsordnung: Überlegungen zum Verhältnis von verfassungsrechtli cher
Ausstrahlungswirkung und Eigenstandigkeit des „einfachen“ Rechts. BadenBaden: Nomos, 2000.
722 FAVOREU, Louis. La constitutionalisation du droit. In. AUBY, JeanBernard et alii (Ed.). L’unité du Droit:

Mélanges en hommage à Roland Drago. Paris: Economica, 1996; FAVOREU, Louis. Les des tinataires
des droits fondamentaux. In. FAVOREU, Louis (Coord.) Droit des libertés fondamentales. 3. ed. Paris:
Dalloz, 2005. p. 98112 (especialmente p. 110112); FAVOREU, Louis; LÖIC, Philip. Le Conseil
Constitutionnel (Que saisje?). 7. ed. Paris: PUF, 2005; FAVOREU, Louis. La légitimité du juge
constitutionnel. Revue Internationale de Droit Comparé. v. 2, ano 46, p. 557581, avr./jui. 1994.
723 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito...p. 3849.
724 MARTINS, Leonardo. Liberdade e Estado constitucional: Leitura jurídicodogmática de uma com plexa
relação a partir da teoria liberal dos direitos fundamentais...p. 8588.
725 ALEXY, Robert. Direito Constitucional e direito ordinário: jurisdição constitucional e jurisdição es-
pecializada...cit. (especialmente, p. 3638).
726 A constitucionalização do Direito é também objeto de outras obras monográficas, no âmbito das

quais o tema invariavelmente se conecta com o Direito Privado. Esses livros, porém, apresen tam um
escopo mais amplo do que o desenvolvido nesta tese e por isso não são assinalados como fontes
para um modelo universal de constitucionalização. Convém, todavia, mencioná los: RENSMANN,
Thilo. Wertordnung und Verfassung. Das Grundgesetz im Kontext grenzüber schreitender
Konstitutionalisierung. Tübingen: Mohr Siebeck, 2007 (especialmente, p. 68119); TERHECHTE, Jörg
Philipp. Konstitutionalisierung und Normativität der europäischen Grundrechte. Tübingen: Mohr
Siebeck, 2011 (com ênfase na questão dos direitos fundamentais no espaço eu ropeu, vide esp. p. 7-
10 e p. 9596, com citação de SchuppertBumke).
727 Gunnar Folke Schuppert (1943) e seu antigo assistente Christian Bumke (1963) são publicis tas, tendo

o último se especializado na problemática dos direitos fundamentais. Louis Favoreu (19362004)


lecionou Direito Administrativo e Direito Constitucional na Universidade de Aix Marseille III. Ele é
internacionalmente reconhecido como o renovador do Direito Constitucional francês, aproximandoo
do direito pretoriano e retirandoo de uma posição subalterna em re lação à Ciência Política e à Teoria
do Estado. Favoreu soube tirar proveito das transformações ocorridas com a instauração da V
República Francesa, particularmente em relação ao papel do Conselho Constitucional e às aberturas
dadas ao controle de constitucionalidade. Grande parte de sua influência fora do território francês é
atribuída a seu empenho pelo Direito Constitucional Comparado (com maior detalhe, confirase:
SAUNDERS, Cheryl. The interesting times of Louis Favoreu. International Journal of Constitutional Law.
v. 5, fascículo 1, p. 116, 2007). No Brasil, ele se tornou mais conhecido com a adoção pelo STF de sua
teoria do “bloco de constitucionalidade” (STF. ADI 514/PI, Tribunal Pleno, rel. Min. Celso de Mello, DJe
28/03/2008, publicado 31/03/2008, j. 24.3.2008).
728 FAVOREU, Louis. La constitutionalisation du droit...p. 38. Citado ainda em: SILVA, Virgílio Afonso da. A
constitucionalização do Direito...p. 47.
729
Tratase da Lei Constitucional no 29/74, “que ampliou a legitimidade para impugnações perante o
Conselho Constitucional, possibilitando o acesso de 60 deputados ou 60 senadores, o controle de
constitucionalidade e a proteção aos direitos fundamentais tornaramse mais efetivos”. Sendo certo
que antes mesmo dessa emenda, em duas decisões – de 16 de julho de 1971 (decisão 7144DC) e de
27 de dezembro de 1973 – o Conselho Constitucional exerceu controle preven tivo de
constitucionalidade de leis francesas com base na proteção aos direitos fundamentais (MORAES,
Alexandre de. Jurisdição constitucional e tribunais constitucionais: Garantia suprema da Constituição.
São Paulo: Atlas, 2000. p. 147148).
730 Em francês, question prioritaire de constitutionnalité.
731 VERONESE, Alexandre Kehrig. A judicialização das políticas públicas de telecomunicações e as
demandas dos consumidores:...cit. p. 197208 (com uma análise das noções de judicialização da política
e politização do judiciário).
732 O princípio Kompetenz-Kompetenz, oriundo da organização judiciária alemã, define que o juiz é
competente para apreciar sua própria competência: “O princípio que domina os incidentes e
questões sôbre competência é o de que todo órgão judiciário é juiz da própria competência (a
chamada Kompetenz-Kompetenz dos alemães). Êle deriva da regra de que todo o juiz tem atribui ções
para decidir a respeito dos pressupostos da relação processual; e como as questões de com petência
dizem respeito ao processo, à regularidade do judicium (e não à res in judicio deducta), é claro que o
juiz pode decidir sôbre sua própria competência, sem, no entanto, vincular outro juiz, a essa decisão
(...)” (MARQUES, José Frederico. Instituições de Direito Processual Civil...v. I. p. 466).
733 Talvez melhor seria dizer “consolidações” e não “codificações”, considerandose o conceito mo derno

de código (DELGADO, Mário Luiz. Codificação, descodificação e recodificação do Direito Civil brasileiro.
São Paulo: Saraiva, 2011. p. 39 e 5055 (neste último intervalo de páginas, tratase da distinção entre
código, condensação, consolidação e compilação).
734 Parcialmente neste sentido: ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da codificação: Crônica de um
conceito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 6971.
735 Exemplo da justificativa para normas dessa natureza integrarem o texto constitucional foi dado por

quem afirma que o Colégio Pedro II foi relevante para a formação do Estado brasileiro, por isso “sua
manutenção na órbita federal de ensino é uma demonstração do Constituinte da vinculação que o
Colégio tem com a sociedade brasileira como um todo (...)” (MALISKA, Marcos Augusto. Comentário
ao art. 242. In. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang;
STRECK, Lenio Luiz (Coords.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, Almedina, 2013.
p. 2173).
736 BEVILÁQUA, Clóvis. A Constituição e o Código Civil...passim.
737 PEREIRA,Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937...p. 510514;
PEREIRA, Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937...p. 2530.
738 RODRIGUES, Silvio. Breve histórico sobre o Direito de Família nos últimos 100 anos...p. 241.
739 BONAVIDES, Paulo. A Constituinte de 19871988 e a restauração do estado de direito. In. CANOTILHO,

José Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lenio Luiz (Coords.).
Comentários à Constituição do Brasil...p. 58.
740 RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial: Parâmetros dogmáticos...p. 254.
741 “Neste sentido, apontase com inteira razão para o fato de que a assim designada constitucionaliza-
ção do direito (e, portanto, também do direito privado) se manifesta por duas vias: a) a presença da
Constituição no direito privado, onde se cuida da influência das normas constitucionais, via concre-
tização legislativa e/ou judicial sobre as normas do direito privado e as relações entre particulares, e
b) a presença do direito privado na Constituição, onde se cuida de institutos originalmente do direito
privado previstos na Constituição que, por sua vez, irá influenciar o direito privado situa ção em que,
no fundo, se está a falar de direito constitucional e não propriamente de um direito civil-
constitucional” (SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais sociais, mínimo existencial e Direito
Privado. Revista de Direito do Consumidor, v. 61, p. 90125, jan./mar. 2007. § 1o).
742 MARTINS, Leonardo. Direito fundamental à igualdade entre homem e mulher. In. CANOTILHO, José
Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lenio Luiz (Coords.).
Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, Almedina, 2013. p. 236.
743 MACHADO, Jónatas E. M. Liberdade de expressão: Dimensões constitucionais da esfera pública no

sistema social. Coimbra: Coimbra Editora, 2002. p. 5679 (com maior interesse para o processo
ocorrido na Alemanha, p. 7479).
744 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito...p. 172. Em sentido aproximado: “A
locução ‘direito civil constitucional’ é um tanto equívoca, à medida que conduz à idéia de um
possível direito civil inconstitucional, o que é obviamente um contrasenso. Afinal, desde Marshall e a
supremacia da Constituição, o direito tem de ser constitucional, caso contrário ou será nulo ou
inexistente, conforme se adote uma ou outra teoria a respeito do fenômeno de inconstitucio-
nalidade: se nem sequer direito é, muito menos direito adjetivado de civil será. (...) A verdade,
portanto, é que se sacrificou o purismo científico visando até um fim político: atenuar o caráter
individualliberal ainda imperante no nosso direito civil. Talvez, melhor ainda, adotar ‘constitucio-
nalização do direito...’, para marcar o caráter dinâmico do processo, sobre o qual ainda não se tem
conclusões definitivas, gozando ainda do mérito de desviar a incoerência terminológica” (GEHLEN,
Gabriel Menna Barreto von. O chamado Direito Civil Constitucional. In. MARTINSCOSTA, Judith (Org.).
A reconstrução do Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 184, nota 22).
745 R. Limongi França (O Direito Civil como direito constitucional. Revista do Tribunal de Justiça do Estado

do Pará, v. 36, no 55, p. 2129, jan./mar. 1992. p. 2427), na aula inaugural dos cursos jurídicos das
Arcadas, em 4 de março de 1991, fez uso da expressão “Direito Civil como Direito Constitucional”, a
qual não pode ser confundida com uma nova forma de constitucionalização por um leitor mais
desatento. Em suas palavras, “quando falamos em Direito Civil como Direito Constitucional, o enfoque
não é o da hierarquia apriorística, senão do que concerne à essência do fenômeno jurídico, de tal
modo que o valor hierárquico se apresenta a posteriori, como uma consequência da necessidade que
tem a generalidade das regras jurídicas, inclusive a própria Constituição Política, de atender aos
preceitos impostos pelo Direito Civil, no que tange à vigên cia, à revogação e à aplicação da norma,
além do que respeita ao conflito de leis no tempo e no espaço”.
746 “Aqui, neste sector da tutela constitucional de bens da pessoa já objeto de direitos de personalida de,

pode falarse, sem reservas, de uma autêntica ‘constitucionalização do direito civil’, no sentido preciso
de que direitos inicialmente consagrados na legislação civil para operarem nas relações interprivadas
sobem um degrau na pirâmide normativa, passando a gozar também de assento e dignidade
constitucionais” (RIBEIRO, Joaquim de Sousa. Constitucionalização do Direito Civil. Boletim da
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no 74, p. 729755, 1998. p. 736).
747 Os artigos são os seguintes: 145, 147, 148, 151, 152, 154, 157, 161 e 162, CF/1988.
748 STF. RE 153771, rel. Min. Carlos Velloso, rel. para o acórdão Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, j. 2011-

1996, DJ 591997, p. 496, RTJ 1622/726.


749 QUEIROZ, Cid Heráclito de. A desconstitucionalização do sistema tributário. Consulex: Revista Jurídica,

v. 10, no 232, p. 5051, set. 2006. Nesse texto, o autor sugere o texto para uma PEC, que objetiva a
supressão de mais de 80 dispositivos da CF/1988 e altera a redação de alguns artigos, partindo do
entendimento elementar de que o texto constitucional não deve comportar a regula mentação das
variegadas espécies tributárias. Em outro escrito, focalizando novamente as possi bilidades de uma
reforma tributária no Brasil, o autor aponta as vantagens desse modelo proposto
(desconstitucionalização): “Além da simplificação do Sistema, aspiração de todos os contribuintes,
especialmente todo o empresariado nacional, a desconstitucionalização do Sistema Tributário im-
portaria numa apreciável redução na carga de trabalho do Supremo Tribunal Federal, uma vez que,
hoje, todos os litígios judiciais em questões fiscais acabam sendo submetidos a essa Corte de Justiça,
mediante recursos extraordinários, por envolverem matéria tratada pela Constituição, dis torção essa
que não se verifica em outros países. A grande vantagem da desconstitucionalização do Sistema
Tributário reside no fato de que as divergências e controvérsias passarão a girar em torno de simples
projetos de lei, como ocorre em todos os países do mundo civilizado” (QUEIROZ, Cid Heráclito de. A
reforma tributária possível. Carta Mensal - Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e
Turismo, no 690, p. 331, set. 2012, cit. p. 13).
750 Em doutrina, há quem dê ao conceito de desconstitucionalização um sentido mais amplo, como
antônimo do processo de juridicização constitucional (CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Constituição dirigente e vinculação do legislador: Contributo para a compreensão das normas
constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra Editora, 1994. p. 471).
751 Arts. 23, 53, 189, 693, 731, 732 e 733, CPC/2015.
752 O STJ já reconheceu a supervivência da separação judicial no ordenamento brasileiro, ao se pro-
nunciar que admitir os efeitos revocatórios da EC no 66/2010 equivaleria a conceder que essa
mudança “suprimiu a existência da separação extrajudicial ou judicial levaria à interpretação de que
qualquer assunto que não fosse mais tratado no texto constitucional por desconstitucionali zação
estaria extinto, a exemplo também do que ocorreu com a separação de fato, cuja existência não é
objeto de dúvida”. Tratase de recurso especial cujo número não foi divulgado, em razão do segredo
de justiça. A relatora do acórdão foi a min. Isabel Gallotti, da 4ª Turma do STJ (Superior Tribunal de
Justiça. Notícias. Quarta Turma define que separação judicial ainda é opção à disposi ção dos
cônjuges. 2232017). Em sentido idêntico: STJ. REsp 1431370/SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, j. 15/08/2017, DJe 22/08/2017.
753 “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento

equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que
disporá, inclusive, sobre: (...) § 3º As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras
remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a
doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido,
em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar” (Redação original da CF/1988).
754 “O grande debate jurídico sobre a limitação das taxas de juros reais em 12% ao ano, constante do §

3º da redação original, foi afastado pela EC 40/2003” (SCAFF, Fernando Facury; SCAFF, Luma
Cavaleiro de Macedo. Comentário ao art. 192. In. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar
Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lenio Luiz (Coords.). Comentários à Constituição do Brasil.
São Paulo: SaraivaAlmedina, 2013. p. 1892).
755 “A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros

reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar” (Súmula STF
648).
756 Nos anos 1970, já se discutia a constitucionalização por elevação do Direito Internacional nos escritos

de Celso Lafer (Ordem, poder e consenso: caminhos da constitucionalização do Direito Internacional.


In. AA.VV. As tendências atuais do Direito Público: Estudos em homenagem ao pro fessor Afonso Arinos
de Melo Franco. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 91110).
757 Desde os anos 1950, ao menos no Brasil, já se conhecia essa modalidade de constitucionalização por

elevação: SARAIVA, Oscar. Constitucionalização da administração pública. Revista de Direito da


Procuradoria Geral da Prefeitura do Distrito Federal, no 3, p. 18, 1956.
758 No âmbito do Direito do Trabalho, expeditamente a doutrina laboral reconheceu essa constitucio-

nalização por elevação das normas ordinárias trabalhistas: OLIVEIRA, Ary Brandão de. A constitu-
cionalização do Direito do Trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8 Região, v. 24, no 46,
p. 5973, jan/jun 1991; PIMENTEL, Marcelo. Constitucionalização do Direito do Trabalho. Genesis:
Revista de Direito do Trabalho, v. 1, no 1, p. 813, jan 1993.
759 “Lei anterior não pode ser inconstitucional em relação à Constituição superveniente; nem o le-
gislador poderia infringir Constituição futura. A Constituição sobrevinda não torna inconstitucio nais
leis anteriores com ela conflitantes: revogaas. Pelo fato de ser superior, a Constituição não deixa de
produzir efeitos revogatórios. Seria ilógico que a lei fundamental, por ser suprema, não revogasse, ao
ser promulgada, leis ordinárias. A lei maior valeria menos que a lei ordinária. 2. Reafirmação da antiga
jurisprudência do STF, mais que cinquentenária” (STF. ADIn 2, rel. Min. Paulo Brossard, Pleno, j.
06.02.1992, DJU 21.11.1997).
760 Nesse sentido: “O conflito de norma com preceito constitucional superveniente resolvese no campo

da não recepção, não cabendo a comunicação ao Senado prevista no inciso X do art. 52 da CF” (STF.
RE 387.271, rel. min. Marco Aurélio, j. 882007, DJ de 1º22008; STF); STF. ADPF 156, rel. min. Cármen
Lúcia, j. 1882011, DJ de 28102011; STF. ADPF 33, rel. min. Gilmar Mendes, j. 7122005, DJ de 27102006
(equipara “ilegitimidade” a “não recepção” de norma contrária à nova ordem constitucional, assim
declarada em arguição de descumprimento de preceito funda mental); STF. RE 565.714, rel. min.
Cármen Lúcia, j. 3042008, DJ de 882008.
761 LOUREIRO, Lourenço Trigo de. Instituições de Direito Civil brasileiro...t. 1. p. 189; PEREIRA, Lafayette
Rodrigues. Direitos de Família...p. 210; BEVILÁQUA, Clóvis. A Constituição e o Código Civil...p. 32;
ORLANDO, Pedro. Direitos Autorais...p. 2931; GARCEZ, Martinho. Do Direito de Família segundo o
projecto de Código Civil Brazileiro...p. 1011; MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição
brasileira...p. 766; BITTAR, Carlos Alberto. A Constituição de 1988 e sua interpretação... § 3; PEREIRA,
Caio Mário da Silva. O Direito Civil na Constituição de 10 de novembro de 1937...p. 510 514; ALMEIDA,
José Luiz Gavião de. O Direito de Família e a Constituição de 1988...p. 382; RODRIGUES, Silvio. Breve
histórico sobre o Direito de Família nos últimos 100 anos...p. 244.
762 A desatualização de parte considerável do direito ordinário foi um dos efeitos supervenientes à

vigência da CF/1988. No Direito Civil, essa desconformidade criou óbices à incidência dos princí pios
da nova Constituição. Como consequência, Carlos Alberto Bittar e Carlos Alberto Bittar Filho (Direito
Civil constitucional. 3. ed. rev. e atual. da 2. ed. da obra O Direito Civil na Constituição de 1988. São
Paulo: RT, 2003. p. 19 e 24) entendem que as regras contidas na CF/1988 no âmbito do Direito de
Família só alcançaram plena eficácia após a entrada em vigor do CC/2002.
763 A CF/1937 já havia iniciado esse processo de eliminação de distinções entre os filhos, ao asse gurar,
em seu art. 126, que filhos naturais e legítimos equipararseiam, o que implicou fosse “revogada a
desigualdade consignada no art. 1.605, § 1º, do Cód. Civil” (PICANÇO, Melchiades. A filiação no
Direito brasileiro. Revista dos Tribunais, v. 121, p. 434445, set. 1939). Idem: ALMEIDA, José Luiz Gavião
de. O novo estatuto da filiação. In. BITTAR, Carlos Alberto. O Direito de Família e a Constituição de 1988.
São Paulo: Saraiva, 1989. p. 153186, cit. p. 163.
764 ALMEIDA, José Luiz Gavião de. O Direito de Família e a Constituição de 1988. In. MORAES, Alexandre

de. Os 20 anos da Constituição da República Federativa do Brasil...p. 386.


765 É necessário recuperar a definição doutrinária dessas distinções. Citase, para esse fim, a obra de
Clóvis Beviláqua (Direito da Família. Recife: Ramiro M. Costa e Filhos, 1903. § 67, p. 431): “Filhos
illegitimos são todos aquelles que procedem de união sexual a que o direito não presta seu re-
conhecimento. Si o pae ou a mãe, ao tempo da concepção ou do parto, se achava ligado por ma-
trimonio com outrem, o filho se diz adulterino: si os progenitores são, entre si, parentes em grau tam
próximo que não se poderiam validamente casar, o filho se denomina incestuoso. Estas duas
subespécies, a dos adulterinos e a dos incestuosos, formam a espécie dos bastardos ou, antes,
espúrios. Aquelles cujos’ procreadores estavam em condição de realisar um matrimonio legal entre si,
ao tempo da concepção ou do parto, por outros termos, aquelles que não forem adulterinos nem
incestuosos, tomam o nome de simplesmente naturaes ou naturaes em espécie”. Beviláqua repu diava
essas distinções. Ele próprio era um filho sacrílego, a saber, aquele “nascido de pessoas das quais,
pelo menos uma, tinham votos solenes de castidade ou filhos de indivíduos com ordens sacras ou
profissão religiosa” (FRANCO, João Melo; MARTINS, Herlander Antunes. Conceitos e princípios jurídicos
(na doutrina e jurisprudência). Coimbra: Almedina, 1983, p. 340). Clóvis Beviláqua (Direito da
Família...p. 421, nota de rodapé 2), não sem algum travo na linguagem, esclarece a posição jurídica
dessa última espécie: “Não ha mais, perante a lei, a filiação sacrílega; nem têm mais razão de ser as
expressões deprimentes — de punível e damnado coito, de que usou a ord. 4, 93”.
766 ALMEIDA, José Luiz Gavião de. O novo estatuto da filiação. In. BITTAR, Carlos Alberto. O Direito de
Família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 153186, cit. p. 163.
767 Em alemão, Gesetz über die rechtliche Stellung der nichtehelichen Kinder.
768 Com a alteração legislativa, o § 1.924, (4), BGB, ficou assim redigido: “Os filhos herdam em partes
iguais”.
769 BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Direito Civil constitucional. 3. ed. rev. e atual. da

2. ed. da obra O Direito Civil na Constituição de 1988. São Paulo: RT, 2003. p. 24.
770 SCHUPPERT, Gunnar Folke; BUMKE, Christian. Die Konstitutionalisierung der Rechtsordnung... cit.p. 10.
771 Sobre os efeitos da CF/1988 em relação ao Direito de Família, Carlos Alberto Bittar (A Constituição de

1988 e sua interpretação...cit. § 4) entendia que: “a) as regras estipuladas na Carta represen tam
diretrizes traçadas para o legislador, ou seja, constituem apenas formalmente normas cons-
titucionais; b) estão em vigor os princípios, mas com sua aplicação condicionada, em concreto, à
adaptação da legislação ordinária, no caso, o próprio Código Civil e certas leis especiais; c) assim, se o
legislador quisesse que essa matéria fosse desde logo aplicada, teria feito inserir a regra de
interpretação que editou para os direitos fundamentais; d) portanto, não se pode, ainda, invocar os
princípios expostos para a solução de conflitos existentes, nem com base neles se desfazer situações
concretas; e) mas nenhuma lei nova poderá contrariálos, sob pena de inconstitucio nalidade; f) se
assim não fosse quanto a situações existentes, terseia a esdrúxula admissão de vacatio legis em todas
as regras de cunho pessoal sobre o relacionamento conjugal, pois o princí pio da igualdade dos
cônjuges põe por terra as regras, dentre outras, de chefia do lar conjugal, de representação da
família, de administração de bens da família, de fixação do domicílio do casal, todas com
proeminência para o marido, bem como as de privilégio da mulher, como as sobre bens reservados,
sobre mera colaboração nos encargos familiares etc.”.
772 SCHUPPERT, Gunnar Folke; BUMKE, Christian. Die Konstitutionalisierung der Rechtsordnung...p. 10. Em
sentido idêntico: “(...) embora esse processo de constitucionalização seja o menos controver tido, não
é ele necessariamente o mais rápido de todos. A lentidão com que os princípios da Constituição
brasileira de 1988 e as tarefas que ela impõe são concretizados pela legislação ordi nária é exemplo
claro disso. Mas, ao contrário do que o lugar comum faz pensar, isso não é um problema de falta de
‘vontade política’ do legislador brasileiro, mas uma característica inerente à lentidão do legislador
para se adaptar a novos paradigmas. E isso em todo o mundo” (SILVA, Virgílio Afonso da. A
constitucionalização do direito...p. 3940).
773 STF. ADI 2076, rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, j. 15/08/2002, DJ 08082003, p. 86.
774 STF. RMS 26212, rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, j. 03/05/2011, DJe 1852011.
775 Parauma crítica ao consenso sobre o conceito de “mínimo existencial” estritamente vinculado às
concepções do TCF, prevalecentes no Brasil: BERCOVICI, Gilberto. Constituição econômica e dig-
nidade da pessoa humana. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 102 p. 457-
467 jan./dez. 2007. p. 460462.
776 FAVOREU, Louis. La constitutionalisation du droit...p. 36.
777 Ambos os autores são referidos também em: SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do
Direito...p. 4649.
778 HESSE,Konrad. Die normative Kraft der Verfassung: Freiburger Antrittsvorlesung. Tubingen: Mohr
(Siebeck), 1959. p. 1012.
779 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil Contemporâneo...p. 59.
780 CASTRO JR., Torquato. Constitucionalização do Direito Privado e mitologias da legislação: Código
Civil versus Constituição. In. SILVA, Artur Stamford da (Org.)...p. 6465.
781 Issojá foi percebido por Thiago Reis (Dogmática e incerteza normativa: crítica ao substancialismo
jurídico do direito civilconstitucional. Revista de Direito Civil Contemporâneo...cit.): “De um lado,
denunciase a ‘invocação irresponsável’ da dignidade humana como mera ‘patifaria intelectual’. De
outro, alertase para a ‘carta branca’ dada aos magistrados para que disfarcem suas convic ções
pessoais sob a ‘invocação genérica de algum princípio constitucional’. Discricionariedade e
imprevisibilidade das decisões judiciais representariam hoje um ‘perigo crescente’ a exigir do civilista
uma ‘necessária calibragem’”. Realmente, essa é uma preocupação de alguns privatistas
contemporâneos cuja seriedade intelectual não se põe em dúvida: “Qualquer conclusão que se possa
extrair do panorama geral traçado será apenas prospectiva. Contudo, exatamente nesta linha, é
importante alertar que a consolidação da metodologia póspositivista e da constituciona lização do
direito civil em nossa doutrina e, especialmente, em nossos tribunais, tem sinalizado para um perigo
crescente. A necessária superação do formalismo por uma perspectiva mais flexí vel e principiológica
foi efetivada, e agora nos deparamos com o alerta do risco oposto. O receio dos juristas mais
tradicionais parece encontrar eco quando se veem decisões que, sob o pretexto da
constitucionalização e da aplicação dos princípios, mais parecem realizar o que vem sendo chamado
de banalização do Direito” (BODIN DE MORAES, Maria Celina. Do juiz bocadalei à lei segundo a boca-
dojuiz: Notas sobre a aplicaçãointerpretação do Direito no início do século XXI. In. CASSETTARI,
Christiano (Coord.); CAMARGO VIANA, Rui Geraldo (Orient). 10 anos de vigência do Código Civil
Brasileiro de 2002: Estudos em homenagem ao professor Carlos Alberto Dabus Maluf. São Paulo:
Saraiva, 2013, p. 5071, citada a p. 68). Em sentido aproximado: “Registre se, a propósito, que nada
está mais distante da metodologia civilconstitucional que a invocação irresponsável da ‘dignidade
humana’, para sustentar as demandas indenizatórias de caráter frívo lo, ou a menção oportunista à
‘função social do contrato’ no afã de justificar o descumprimento de deveres contratuais
legitimamente assumidos. A metodologia civilconstitucional reclama a aplicação dos princípios
constitucionais, mas tal aplicação se dá necessariamente de modo téc nico e criterioso, por meio de
uma fundamentação controlável, ancorada no dado normativo. A invocação velhaca dos valores
constitucionais nada tem de civilconstitucional: é patifaria intelec tual, que, longe de privilegiar,
esvazia a densidade das normas fundantes do ordenamento jurídico brasileiro” (SCHREIBER,
Anderson. Direito Civil e Constituição. São Paulo: Atlas, 2013. p. 23). Na li nha da crítica à “ubiquidade
constitucional” e à banalização do Direito Constitucional: EHRHARDT JÚNIOR, Marcos. Acertos e
desacertos do processo de constitucionalização dos direitos: Uma re flexão sobre os perigos da
ubiquidade constitucional no Direito Civil brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 11, no
44, p. 235256, out./dez. 2010; SARMENTO, Daniel. Ubiqüidade constitucional: os dois lados da moeda.
Revista de direito do Estado: RDE, no 2, p. 83118, abr./jun. 2006 (com enfoque mais amplo para todo o
Direito Constitucional. Ressaltese que este autor é constitucionalista).
782 Em sentido aproximado, Bernhard Schlink (German constitutional culture in transition. Cardozo Law

Review, v. 14, nº 34, p. 711736, 19921993. esp. 719721) considera que houve uma perda de
determinabilidade do conteúdo e da extensão dos direitos fundamentais. Isso tornou quase
impossível uma prognose metodologicamente adequada. As decisões envolvendo direitos funda-
mentais dependeriam menos da técnica jurídica do que do conhecimento de tendências jurispru-
denciais, da personalidade dos magistrados e suas inclinações subjetivas, bem assim da atmosfera
política dentro dos tribunais constitucionais.
783 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Acadêmica, 1994. p. 152153.
784 Éo que pensa Virgílio Afonso da Silva (A constitucionalização do Direito Privado...p. 4748), para quem
esta acepção tem a vantagem de não se adstringir à experiência constitucional francesa, embora
tenha sido Louis Favoreu um de seus mais importantes teóricos.
785 FAVOREU, Louis. La constitutionalisation du droit...p. 36.
786 SCHUPPERT, Gunnar Folke; BUMKE, Christian. Die Konstitutionalisierung der Rechtsordnung... p. 1821.
787 Ambos referidos por: SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito Privado...p. 3848.
788 SCHUPPERT, Gunnar Folke; BUMKE, Christian. Die Konstitutionalisierung der Rechtsordnung... p. 1819.
789 TEIXEIRA,José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Texto organizado e atualizado por
Maria Garcia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 274.
790 BVerfGE 61, 358; BVerfGE 79, 256; BVerfGE 90, 263; BVerfGE 85, 80.
791 FORSTHOFF, Ernst. Der Staat der Industriegesellschaft...p. 144.
792 DIEDERICHSEN, Uwe. Das Bundesverfassungsgericht als oberstes Zivilgericht: ein Lehrstück der
juristischen Methodenlehre...p. 171.
793 BÖCKENFÖRDE, ErnstWolfgang. Diritto fondamentali come norme di principio. In. BÖCKENFÖRDE,
ErnstWolfgang. Stato, Costituzione, democrazia: Studi di Teoria della Costituzione e di Diritto
Constituzionale. Organização de Michele Nicoletti e Omar Brino. Milano: Giuffrè, 2006. p. 209 262.
794 ALEXY, Robert. Direito constitucional e direito ordinário: jurisdição constitucional e jurisdição es-

pecializada...p. 3738.
795 ALEXY, Robert. Direito constitucional e direito ordinário: jurisdição constitucional e jurisdição es-
pecializada...p. 38.
796 Neste sentido: “Uma Constituição pode ser fruto de uma criação cerebrina ou de uma Assembléia

Constituinte improvisada e condicionada. O Código Civil é fruto de um processo histórico, resul tado
de um amadurecimento social e econômico segundo as exigências que brotam no seio da sociedade.
(...) Também por isso, mostrase mais razoável a preservação do Código Civil como eixo central do
sistema de direito privado, pois apresenta maior estabilidade que a Constituição” (REALE, Miguel. O
projeto do Código Civil. São Paulo: Saraiva, 1986. p. X).
TERCEIRA PARTE

A Terceira Parte pretende atingir os seguintes objetivos: i) analisar a


reconstrução do sistema jurídico alemão no segundo pós-guerra, com ênfase no
papel da Constituição como centro unificador das lealdades cidadãs e da
identificação nacional; ii) apresentar os elementos descritivos do caso Lüth; iii)
expor os fundamentos da decisão Lüth, que são reveladores da preocupação do
TCF com a reserva de espaços autárquicos para o Direito Civil; iv) analisar os
pressupostos da teoria da eficácia direta dos direitos fundamentais; v) descrever
o modo como essa teoria foi recepcionada no Brasil; vi) apresentar a doutrina da
eficácia indireta, segundo as ideias de Dürig. Far-se-á um pequeno excurso para
se mencionar as teorias: i) da negativa da eficácia dos direitos fundamentais em
relação aos particulares (Uwe Diederichsen); ii) da convergência estatista
(Jürgen Schwabe); iii) dos três níveis (Robert Alexy); e da state action.
No Capítulo Décimo Primeiro apresentar-se-á o modelo fraco de eficácia
indireta, o qual se revelará como o mais adequado à realidade brasileira.
A questão da nomenclatura teórica (eficácia, vinculação, horizontalidade
etc) foi objeto de seção específica no capítulo de Metodologia da Pesquisa. O
tratamento marginal dos temas do excurso justifica-se de modo objetivo: esta
não é uma tese sobre eficácia dos direitos fundamentais e sim sobre o estatuto
epistemológico do Direito Civil e sua conexão com a Drittwirkung.
CAPÍTULO OITAVO

DIREITO CIVIL E DIREITOS FUNDAMENTAIS: O


NASCIMENTO DE UM NOVO OBJETO EPISTEMOLÓGICO

SUMÁRIO. § 43. Introdução. § 44. O renascimento de uma nação: do


“patriotismo imperial” ao “patriotismo constitucio nal”. 44.1. A
reconstrução nacional pós1945 e a reconstitu cionalização da Alemanha
com os “avós fundadores”. 44.2. Em busca de um “guardião da
Constituição”. 44.3. O alvorecer do Tribunal Constitucional e o Direito
Civil: o caso Lüth. § 45. O Lüth-Urteil (ou como se resolver um caso de
Direito Civil na ju risdição constitucional com respeito aos métodos
civilísticos). 45.1. Introdução. 45.2. Contexto histórico do caso Lüth: cine-
ma, política e justiça. 45.3. Elementos descritivos do caso Lüth e a decisão
do TCF. 45.4. Os fundamentos jurídicos do caso Lüth: interpretação
constitucional e Direito Civil. 45.4.1. Estu do analítico internoexterno dos
fundamentos do caso Lüth. 45.4.2. Ponto de partida: a doutrina de
Jellinek. 45.4.3. Res peito à “grande dicotomia”. 45.4.4. Interpretação
gramatical. 45.4.5. Interpretação lógicosistemática. 45.4.6. Interpretação
histórica. § 46. A introdução do conceito de “ordem objetiva de valores” e
o uso da ponderação em um caso de Direito Civil. 46.1. A “ordem objetiva
de valores”. 46.2. A ponderação e o Direito Civil. § 47. Os legados do caso
Lüth ao discurso meto dológico do Direito Civil. 47.1. O despertar para
uma nova rea lidade metodológica. 47.2. Respeito aos métodos, aos
padrões decisórios e à gramática do Direito Civil. 47.3. A complexidade
interpretativa e a ponderação. 47.4. Eficácia indireta dos direi tos
fundamentais.
§43. INTRODUÇÃO
Na abertura de sua conferência na Faculdade de Direito do Largo de São
Francisco, em 8 de agosto de 2016, Sybille Kessal-Wulf, juíza do TCF, lembrou
que, em seu período de estudante na Alemanha, um ou outro jurista, a título de
ironia, afirmava que as pessoas, em muitas ocasiões, teriam de sair à rua
munidas de um guarda-chuva não para se protegerem do sol ou da chuva, mas
para se prevenirem contra os danos causados pela intensa radiação dos direitos
fundamentais, que emana de todos os lados. Ridendo castigat mores. A narrativa
de Sybille Kessal-Wulf ilustra uma preocupação também manifestada por
Matthias Jestaedt, em um texto cujo título é um trocadilho com a frase “A
revolução devora seus filhos”, atribuída ao girondino Pierre Victurnien
Vergniaud (1753-1793). Jestaedt considera que a expansão das funções e do
âmbito de proteção dos direitos fundamentais dá-se ao custo de sua perda
qualitativa e da redução de sua efetividade funcional. Reconhecer tais
circunstâncias não é ignorar a existência de profundas desigualdades sociais no
País. É antes de tudo negar ao Direito a capacidade de eliminálas, dada sua
conexão intrínseca com o próprio sistema econômico.797 Nem pobres, nem
vulneráveis serão favorecidos por esse barateamento dos direitos
fundamentais.798
Para além da ironia da observação, essa passagem justifica a importância
desta Terceira Parte: a dogmática do Direito Civil precisa enfrentar o problema
da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares. É inegável que
o tema vem sendo tratado no Brasil há mais de duas décadas. Recepcionou-se,
contudo, a teoria alemã da eficácia direta dos direitos fundamentais como se ela
fosse um dado axiomático.799 Salvo exceções, a maior parte delas concentrada no
Direito Constitucional,800 praticamente não há interesse em se contestar
criticamente os fundamentos dessa teoria e indagar sobre sua adequação ao
Direito brasileiro. Mais do que isso, parece haver a necessidade de uma
aclimatação do problema à dogmática do Direito Civil. Dito de outro modo, é
preciso começar a estudar a questão da eficácia dos direitos fundamentais em
relação aos particulares também com as ferramentas teóricas do Direito Civil.
Se antes poderia ser criticada a omissão dos civilistas em se ocupar das
relações entre o Direito Privado e os direitos fundamentais, agora o problema é
de outra ordem: existe excesso de reconhecimento desses vínculos e
preocupação menor em se discutir como se operacionalizam tais relações. Essa é
uma crítica aos privatistas que começa a ser lançada na literatura jurídica e que
precisa ser recebida sem reservas ou preconceitos.801
Existem artigos e livros de privatistas sobre constitucionalização do Direito
Civil, alguns deles de enorme qualidade e já referidos na Segunda Parte da tese.
A eficácia dos direitos fundamentais, porém, é um tema pouco explorado de
maneira autárquica (no sentido de ser analisado sob uma perspectiva interna e
também no sentido de ser estudado isoladamente) e com distanciamento do
modelo hegemônico no Brasil. É a isso que se propõe esta parte da tese.
Ao estilo da Primeira Parte, a autonomia do Direito Civil, como
consequência da “distinção sistemática”, tem como principal contestação séria a
sobreconstitucionalização.802 Em ordem a se compatibilizar teoricamente a
autonomia e a constitucionalização, fenômeno comum ao Direito na
contemporaneidade, formulou-se na Segunda Parte uma proposta de acordo
semântico sobre o que é e o que não é constitucionalização do Direito Civil.
Delimitadas as fronteiras conceituais, chegou-se à conclusão de que a mais
problemática das acepções da constitucionalização era a que se manifesta por
transformação ou irradiação.
O mérito da Segunda Parte foi segregar as acepções não problemáticas da
constitucionalização, assim entendidas aquelas que decorrem naturalmente do
princípio hierárquico, do que não seria tout court constitucionalização. Mas a
constitucionalização por irradiação precisa ser apreciada em conjunto com um
modelo de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. A falta de
sintonia entre esses dois elementos é causa permanente de perturbação ao
estatuto epistemológico do Direito Civil, o que termina por invalidar os esforços
em se reafirmar a “diferenciação sistêmica”. Chega-se, portanto, à Terceira
Parte com o objetivo de demonstrar como e em que medida os direitos
fundamentais vinculam os particulares no Direito Civil. Essa resposta só é
possível de ser dada a partir do estudo do caso Lüth, decidido pelo TCF em 1958
e que representou o nascimento de um novo objeto epistemológico tanto para o
Direito Constitucional quanto para o Direito Civil: a eficácia dos direitos
fundamentais no âmbito privado.
§44. O RENASCIMENTO DE UMA NAÇÃO: DO “PATRIOTISMO IMPERIAL”
AO “PATRIOTISMO CONSTITUCIONAL”

44.1. A reconstrução nacional pós-1945 e a reconstitucionalização da


Alemanha com os “avós fundadores”
A moderna Alemanha resulta da reconstrução da banda ocidental do país,
dividida em três zonas de ocupação militar (norte-americana, britânica e
francesa), após a Segunda Guerra Mundial. O território do Oriente, ocupado pela
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, organizou-se como a República
Democrática Alemã e veio a se unificar com a então República Federal da
Alemanha somente em 1990. Para este capítulo, interessa falar apenas da
experiência jurídico-histórica da Alemanha Ocidental. Ao término da guerra,
com o país arrasado e com boa parte de sua elite política, militar e econômica
implicada com o nacional-socialismo, os Aliados iniciaram um processo de
desnazificação, de modo a que a burocracia civil e o oficialato fossem privados
de elementos comprometidos com o regime hitlerista. Embora essa
desnazificação te-nha-se afrouxado na medida em que avançava a Guerra Fria
contra a União Soviética e se tornava necessário aproveitar homens e mulheres
experientes e conhecedores da máquina estatal, ainda que tivessem vínculos com
o passado, os líderes da Alemanha Ocidental, em sua maioria, eram pessoas não
implicadas, muitos deles com atuação na Resistência alemã. Exemplo disso foi
Konrad Hermann Joseph Adenauer (1876-1967), com razão considerado o
fundador da Alemanha contemporânea e da União Demo-crata-Cristã-UDC, que
reuniu (de modo impensável poucos anos antes) protestantes e católicos. Konrad
Adenauer foi perseguido e preso durante o hitlerismo. Ele foi libertado pelas
forças aliadas, assumiu a prefeitura de Colônia em 1945, tendo sido eleito em
1949 para o cargo de chanceler da recém-criada República Federal da Alemanha.
Adenauer é um exemplo muito apropriado do tipo de pessoas que acabou
por liderar a refundação nacional. Praticamente toda a população em idade
militar enga-jou-se no esforço de guerra. Nos últimos anos 1944-1945, com o
fantasma da derrota pairando sobre o regime nacional-socialista, adolescentes
foram convocados em massa para a defesa da pátria-mãe na fase do conflito que
passou à História como totaler Krieg (guerra total), conforme a denominou o
ministro da Propaganda Joseph Goebbels, em um célebre discurso de 18 de
fevereiro de 1943. Finda a guerra, a governança da Alemanha coube à geração
dos avós. Os pais estavam mortos, presos ou implicados. Os netos ainda eram
muito jovens. Pode-se dizer que a democracia constitucional alemã, em 1949,
não teve “pais fundadores”, mas “avós fundadores”.
Esses homens e mulheres, a maioria deles nascidos no último quartel do
século XIX, participaram da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e
experimentaram a grande desilusão que sobreveio com o fim das quimeras
imperialistas da elite militar do Reich, aliada a um ciclotímico e despreparado
soberano, o Kaiser Guilherme II, o homem errado na hora errada. Proclamada a
República de Weimar, essas pessoas assistiram ao fracasso da instável
democracia de feição social inaugurada em 1919 e que terminou por sucumbir a
um cabo da Boêmia,803 de nome Adolf Hitler, que se fez líder do Partido
Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães e ganhou as eleições, o que lhe
permitiu ser indicado para o cargo de chanceler do Reich alemão.804
Majoritariamente formado por grupos políticos católicos e protestantes,
organizados agora sob a bandeira da União Democrata-Cristã, além de um
expressivo número de socialistas moderados, oriundos do respeitado e
tradicional Partido Social-Democrata da Alemanha, essas pessoas reuniram-se
em 1948 para elaborar a Lei Fundamental alemã, no Palácio de Herrenchiemsee,
em uma ilha, onde Luís II, o rei louco da Baviera, iniciou a construção do Novo
Palácio de Herrenchiemsee, nunca concluído.805 Foi nesse local bucólico e
isolado, que os “avós fundadores” da Alemanha deram início à reconstrução
constitucional do país, tendo como inspirações a Constituição de Weimar e a
Constituição de Paulskirche de 1848, a fracassada e efêmera experiência
constitucional que tentou unificar os territórios de língua alemã sob um projeto
democrático (ao menos para os padrões da época).806
O novo sistema constitucional alemão teria de ser democrático, igualitário,
fundado de bases liberais e repudiar todas as práticas autoritárias e militaristas,
tão recorrentes desde a unificação do país em 1871.807
É importante lembrar que a Alemanha manteve, ao menos até meados do
século XX, uma relação muito peculiar com a figura do soberano, que ora
correspondeu a Carlos Magno e aos imperadores do Sacro Império Romano-
Germânico (lembre-se de Frederico Barba-Ruiva), e depois, com a unificação
em 1871, ao “Kaiser alemão” (o título nunca foi Kaiser da Alemanha, mas
“alemão”, o que representava a conservação do poder nominal dos príncipes, reis
e grão-duques dos antigos Estados pré-unificação).808 Como já se escreveu
alhures, essa imagem era vista com simpatia pelo povo, na medida em que o
imperador se contrapunha às injustiças e aos abusos cometidos pelos nobres
locais no sistema feudal e mesmo após seu fim. Esse dualismo é comparável ao
que representou o sebastianismo em Portugal e o czarismo na Rússia pré-
Revolução de 1917.809 Essa imagem fica muito nítida no filme austríaco Das
weiße Band (traduzido no Brasil por A fita branca e, em Portugal, O laço
branco), de 2009, dirigido por Michael Haneke, que se passa no Norte da
Alemanha, em uma vila rural, predominantemente luterana, às vésperas da
Primeira Guerra Mundial. A personagem do barão local, dono da propriedade
em torno da qual gira a economia do lugar, é mostrada como de alguém
antipático e pouco menos do que tolerado pelos camponeses. Semelhante
contradição entre o fidalgote de aldeia que não respeita as leis e abusa dos
camponeses e dos burgueses está em uma novela de 1810, escrita por Heinrich
von Kleist,810 intitulada Michael Kohlhaas, que marcou época na literatura alemã
pela temática social nele explorada.811

44.2. Em busca de um “guardião da Constituição”


Não é por acaso que Adolf Hitler autoproclamou-se o Führer (líder) do
Reich alemão e desenvolveu em torno de si um culto a sua figura pública com
objetivo de assumir o legado de lealdade, patriotismo e de admiração do povo
pelo imperador.812 Os ideólogos nacional-socialistas, com apoio dos juristas do
regime, desenvolveram um princípio de autoridade incondicional do líder
alemão, denominado Führerprinzip, que se exteriorizava na concentração da
fonte de legitimidade do poder e da autoridade do Estado na pessoa do Führer.813
Antes mesmo do surgimento desse princípio, em nome do qual todas as
ordens superiores eram consideradas legítimas e não se admitia seu
descumprimento, porque emanadas do Führer, a Alemanha de Weimar conheceu
a polêmica entre Hans Kelsen, Heinrich Triepel e Carl Schmitt sobre quem
deveria ser o “guardião da Constituição” (Hüter der Verfassung). Fique-se
apenas com o primeiro e o último, dadas as dimensões e a natureza desta tese.
Schmitt, que viria a se comprometer com o Nacional-Socia-lismo, em grave
prejuízo a sua imagem como acadêmico e jurista, defendia que esse papel era
nomeadamente político. Ele não caberia, porém, ao Parlamento e sim ao
Reichspräsident, o presidente do Reich, sucessor do Kaiser, em termos jurídicos
e políticos em sua função de poder neutro em uma sociedade fragmentada e
pluralmente dividida entre vários partidos. Ao contrário, Hans Kelsen acredita
que esse papel (de guarda da Constituição) deveria ser exercido pelo Tribunal
Constitucional, sob um viés eminentemente jurídico e não propriamente político.
Ao Tribunal Constitucional atribuir-se-ia uma função de “legislador negativo”
(der negative Gesetzgeber), que controlaria os excessos do Poder Legislativo,
por meio de um papel de cassar leis inconstitucionais, tidas como inexistentes
por Kelsen, mas que não substituiria o papel de nomogênese do Parlamento.814
As preocupações de Schmitt seguem extremamente atuais: um Tribunal
Constitucional com tamanhos poderes terminaria por politizar a Justiça e colocar
os juízes em uma posição de decisão sobre o status quo político sem
legitimidade para tanto, aproximando-se dos velhos esquemas aristocráticos de
exercício do poder.815
Esse é um debate extremamente atual e que ainda atrai as atenções dos
constitucionalistas, especialmente com a (aparente) realização da profecia de
Carl Schmitt no Brasil, com o STF não apenas funcionando como “legislador
negativo” como também na condição de “legislador positivo”, quando emite
sentenças aditivas e aparentemente reelabora o sentido da Constituição e das leis,
por meio de fenômenos mais ou menos caracterizados como mutações
constitucionais.816 Atuação essa que se dá também no Direito Privado.817
Não é preciso dizer quem venceu essa batalha político-jurídica na
Alemanha de 1933 a 1945. Como resultado disso, os “avós fundadores” de
Herrenchiemsee procuraram um “guardião da Constituição”, na linguagem
jurídica dos anos 1920, mas que não fosse um sucedâneo do Kaiser. O
presidente da República Federal da Alemanha, com suas funções protocolares e
cerimoniais, não se prestava a esse papel. O chanceler federal, líder de um
governo (sempre) transitório, menos ainda. Coube essa missão ao
Bundesverfassungsgericht, literalmente Tribunal Constitucional Federal, nos
moldes imaginados por Hans Kelsen, mas com poderes que vinculariam o
Executivo e o Legislativo e em igualdade de armas em relação a estes.818 Não
desejavam os constituintes de 1948 criar um leão sem dentes para incutir medo
em futuros cabos da Boêmia ou um equivalente que surgisse, com novas roupas,
na segunda metade do imprevisível século XX. A ideia naquele momento era de
que “tribunais constitucionais não poderiam prevenir revoluções; eles poderiam,
no entanto, contribuir para que os cidadãos sentissem que eles seriam tratados de
acordo com a lei”.819 Diferentemente do modelo norteamericano, a composição
do Tribunal Constitucional dar-se-ia por membros indicados pelo Bundestag, o
Parlamento Federal, e o Bundesrat, o órgão de representação dos Estados-
membros da federação alemã.820 Os magistrados não seriam vitalícios e, como a
História veio a comprovar, representariam alternadamente os espectros
políticoideológicos da sociedade alemã, refletidos em seus principais partidos.821
Esse tribunal constitucional, que substituiria o fracassado
Staatsgerichtshof,822 da República de Weimar, é tido, ao lado do “formidável
esquema” de jurisdição constitucional previsto na LF/1949, como “uma das mais
importantes criações” da Convenção Constitucional de Herrenchiemsee.823

44.3. O alvorecer do Tribunal Constitucional e o Direito Civil: o caso Lüth


Inaugurado oficialmente em 28 de setembro de 1951, na tranquila cidade
de Karlsruhe, em Baden-Württemberg, o Tribunal Constitucional experimentou
inúmeros conflitos, nos anos 1950-1960, com o Parlamento e o Poder Executivo,
especialmente com o primeiro chanceler Konrad Adenauer, que o considerava
invasivo das competências dos poderes eleitos. Os 60 anos de criação do
Tribunal Constitucional foram celebrados com orgulho pelos alemães, que nele
reconhecem um patrimônio imaterial de sua cultura jurídica, com enorme
impacto em todo o mundo. Andreas Voßkuhle, presidente do tribunal, no
discurso proferido na cerimônia que reuniu as principais lideranças alemãs,
referiu-se ao elemento simbólico que, em suas palavras, une os alemães: o
patriotismo constitucional (Verfassungspatriotismus).824 Ele teria substituído
crenças unificadoras anteriores, baseadas em mitos, tradições nacionais, unidade
étnica e cultural.825 Em suma, tudo aquilo que o imperador e seus sucedâneos
encarnaram na História alemã por todos os séculos. Essas palavras
correspondiam, com fidelidade ao papel desempenhado pela Lei Fundamental de
1949, a Constituição alemã, e, implicitamente, o que dela foi feito pelo TCF.826
O êxito no cumprimento de sua missão jurídico-política na Alemanha e a
repercussão de seu modelo de jurisdição constitucional em todo o mundo não
teriam sido possíveis, contudo, sem um ponto de virada na história do TCF, seja
pelo tipo de conflito que passou a resolver, seja pelo que sinalizou à sociedade e
pela circunstância de isso ter ocorrido nos anos 1950, a década de sua
consolidação como um dos poderes do Estado alemão. Esse momento histórico
foi o julgamento do caso Lüth,827 em janeiro de 1958, considerado como um dos
mais importantes do tribunal em seus mais de 60 anos de existência,828 o que
pode ser medido ainda pela quantidade de vezes em que esse Urteil é referido na
jurisprudência do TCF e de outros tribunais germanófonos.829 Ocorre que esse
julgado não recai sobre matéria de Direito Público. Ele tem por subjacente a
interpretação de um artigo do BGB em face do exercício da liberdade de
expressão. Essa peculiaridade somou-se ao fato de que o objeto da decisão, em
última análise, era saber se entre particulares poderiam incidir direitos
fundamentais. Além disso, as ideias de um renomado civilista, Hans Carl
Nipperdey, estavam no centro da polêmica que se formaria antes e depois do
Lüth-Urteil,830 sobre como se daria essa incidência, a saber, direta ou
indiretamente.
Em suma, o Direito Civil foi o elemento nuclear da reconhecidamente mais
importante decisão da história do TCF em termos de influência internacional e
foi a partir do Lüth-Urteil que, em todo o mundo, se formou uma copiosa
literatura, nas mais diversas línguas, sobre a eficácia dos direitos fundamentais
em relação aos particulares. Gerhard Casper, que alude a uma “República de
Karlsruhe” para enfatizar o poder do TCF na estrutura jurídico-institucional
alemã do pós-guerra, afirma que se pudesse designar uma única decisão
importante do tribunal, sem dúvida seria o Lüth-Urteil. E não porque Casper
concorde “plenamente com o veredicto”, mas “precisamente por causa de sua
relevância” para a construção da República de Karlsruhe. Para ele, o core da
decisão é a assertiva de que os direitos fundamentais são primordialmente
defesas do cidadão contra o Estado, mas a Constituição é uma ordem objetiva de
valores, que deve vincular todas as áreas do Direito.831
A se comprovar esse impacto no Brasil, note-se que o STF cita o Lüth-
Urteil em quatro acórdãos: i) STF. ADI 4815, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno, j. 10-6-2015, DJe-018 1o-2-2016 - caso das biografias; ii) STF. ADPF
130, Rel. Min. Carlos Britto, Tribunal Pleno, j. 30-4-2009, DJe-208, 6-11-2009,
RTJ 213-1/20 – caso da Lei de Imprensa); iii) STF. HC 82424, Rel. Min.
Moreira Alves, Rel. para o acórdão Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, j. 17-
9-2003, DJ 19-03-2004, p. 17 – caso Ellwanger; iv) STF. RE 201819, Rel. Min.
Ellen Gracie, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 11-
10-2005, DJ 27-10-2006, p. 64, RTJ 209-2/821- caso da União Brasileira de
Compositores- UBC).832 Não por acaso, são quatro dos mais relevantes casos já
decididos na história contemporânea do STF.833
§45. O Lüth-UrteiL (ou como se resolver um caso de direito CIVIL NA
JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL COM RESPEITO AOS métodos
civilísticos)

45.1. Introdução
O § 44 serviu para esclarecer as circunstâncias do nascimento desse
modelo cujo impacto no Brasil é sem par com outros países, seja pela
intensidade de sua aplicação, seja por seus excessos. No § 45, cuidar-se-á do
Lüth-Urteil, mas não sob a óptica que se tornou comum nos textos brasileiros,
qual seja, de descrever o caso e resumir os fundamentos do TCF. Pretende-se
reconstruir o modo como o tribunal desenvolveu a solução para o caso. E, nesse
processo, demonstrar que a técnica por ele utilizada é muito mais próxima dos
métodos tradicionais do Direito Civil, que deitam suas raízes em Savigny.
Menos do que uma prova da supremacia metodológica do Direito
Constitucional, o caso Lüth é um exemplo de como o Direito Civil deve ser
preservado em qualquer julgamento que envolva o que os alemães denominam
de eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares. Enfrentar essa
questão é hoje uma das maiores necessidades do Direito Civil para continuar a
existir como uma disciplina dotada de estatuto epistemológico e autonomia
metodológica.
Em livros e artigos sobre eficácia dos direitos fundamentais em relação aos
privados, não é incomum iniciar-se com uma referência ao caso Lüth.834 Em
português, há uma tradução dos principais trechos da decisão do TCF, o que
permitiu seu conhecimento por um público consideravelmente maior.835
Exclusivamente por uma questão de ordem de ideias, far-se-á uma síntese do
contexto histórico, dos elementos descritivos e do dispositivo da decisão.
Interessa aqui, examinar o modo como o tribunal construiu seu raciocínio
jurídico para chegar ao resultado que tornou o caso Lüth tão famoso
internacionalmente e tão singular para a História do Direito Privado Moderno,
quando não também (e principaliter) para a Alemanha contemporânea.
45.2. Contexto histórico do caso Lüth: cinema, política e justiça
O cinema, que é uma arte geralmente associada aos Estados Unidos da
América, encontrou na Alemanha um espaço de desenvolvimento singular na
década de 1920, em plena efervescência da República de Weimar.836 Aqueles
anos, imediatamente posteriores à tragédia do conflito mundial de 1914-1918,
ficaram conhecidos como os “anos loucos”, com a juventude, parte dela ainda
traumatizada pelo pesadelo da guerra, cheia de cinismo e de fome de viver, que
comporia o quadro do que a História chamou de “geração perdida”. Houve uma
ruptura estética: era o tempo das melindrosas, com o abandono do espartilho e a
adoção do corte de cabelo le garçon. Os “anos loucos” timbraram-se pelas festas
ininterruptas, o consumo de álcool e drogas, a liberação feminina e a frouxidão
de costumes só comparáveis ao que viria a ocorrer nos anos 1960. The Great
Gatsby, do escritor estadunidense Francis Scott Fitzgerald, de 1925, é a obra-
síntese da “geração perdida”. Na Alemanha, não foi muito diferente, a ponto de
se ter formado uma aura de decadência moral em torno da República de Weimar,
particularmente de Berlim, que ficou conhecida como a Sodoma europeia,
circunstância bastante explorada pelos nacional-socialistas para se contrapor à
“degeneração” dos tempos democrático-liberais que eles viriam a soterrar em
1933.
Nessa atmosfera de liberação é que o cinema de Weimar prosperou, tanto
em termos de público quanto em termos de refinamento artístico. Foram os anos
do Expressionismo e da Nova Objetividade, com diretores e filmes
internacionalmente famosos, como Ernst Lubitsch (que ficaria mais conhecido
nos Estados Unidos, com películas como Ninotchka, com Greta Garbo), Fritz
Lang (Metropolis e M, o vampiro de Düsseldorf), Joseph von Sternberg (O anjo
azul, com Marlene Dietrich), Friedrich Wilhelm Murnau (Nosferatu, uma
sinfonia do horror) e Georg Wilhelm Pabst (A caixa de Pandora).837 Os nazistas
compreenderam a força do cinema na sociedade alemã, seja como arma de
propaganda, seja como instrumento para conter os ânimos da população.838 A
sétima arte passou a contar com apoio e financiamento públicos maciços, com
supervisão direta ou interesse manifesto de Goebbels e do próprio Hitler.839
Cineastas como Leni Riefenstahl (O triunfo da vontade, 1943), considerada
como a “preferida” de Hitler, Veit Harlan (O judeu Süß, em alemão Jud
Süß,1940) e Wolfgang Liebeneiner (Bismarck, 1940) integram a elite artística do
regime.
O último longa-metragem de propaganda, rodado na Alemanha nazista,
lançado em janeiro de 1945, foi um filme histórico (Kolberg), que reproduz a
defesa da homônima cidade-fortaleza, sitiada pelas tropas francesas em 1807,
durante as Guerras Napoleônicas.840 A defesa de Kolberg841 é liderada pelo
coronel-conde August Wilhelm von Gneisenau, que resistiu a forças muito
superiores às suas até o fim da guerra com a celebração do Tratado de Tilsit. A
película, rodada em cores, tem uma hora e meia de duração e contou com
milhares de figurantes em cenas de batalhas, o que é incrível a se considerar o
momento em que foi produzida. Ela faz um apelo evidente à capacidade de
resistência do povo alemão e à necessidade de manter a fidelidade a seus líderes.
Finda a guerra, Veit Harlan (1899-1964) foi o único cineasta alemão a ser
levado a julgamento por crimes contra a humanidade, em razão de haver dirigido
Jud Süß, uma das obras mais abjetas e antissemitas do cinema moderno.842 Para
os padrões atuais, o filme foi um blockbuster, com 22 milhões de
expectadores,843 tendo retratado a vida de Joseph Süß Oppenheimer, um ministro
das finanças do Ducado de Württemberg, de ascendência judia, que viveu no
século XVIII e que se tornou muito rico e poderoso. Com a morte do soberano,
ele é preso e condenado à forca. O filme mostra que seriam características
“próprias” do povo hebreu a ganância e avidez, em detrimento dos interesses do
Estado. No final, a população judia é obrigada a deixar Württemberg, em uma
mal disfarçada comparação com o que ocorria na Alemanha nos anos 1940. O
regime nacional-socialista justificava-se com o exemplo da ira popular contra os
judeus.
A ação contra Harlan foi movida pela Associação de Vítimas do Regime
Nazista844 e seu julgamento em Hamburgo, ocorrido em 23 de abril de 1949,
resultou em sua absolvição por: (i) não se haver demonstrado sua culpa; (ii) não
se estabelecer o nexo de causalidade entre seu exercício profissional como
cineasta e o genocídio; (iii) ele ter trabalhado sob ordens de Goebbels.845 Em
grau de recurso, o processo subiu para o Supremo Tribunal de Justiça para a
Zona de Ocupação Britânica,846 em Colônia, que anulou a decisão absolutória e
devolveu o caso para o Tribunal de Hamburgo.847 Veit Harlan, no entanto, foi
absolvido em novo julgamento, que se passou em abril de 1950, desta vez a
cargo do Tribunal Distrital de Hamburgo.848-849
Em todas as audiências, apoiadores e adversários de Veit Harlan
manifestaramse, com maior incidência dos primeiros. É fundamental pôr ênfase
no fato de que o cineasta não era uma pessoa pouco conhecida na Alemanha,
além de ter sido coautor do roteiro do filme Jud Süß. Isso não fica muito bem
evidenciado nos textos sobre o caso Lüth, ao menos em língua portuguesa,
embora seja importante para se compreender o contexto no qual se desenrolaria
o julgamento no TCF. O que estava em jogo não era um homem, mas uma arte a
serviço do regime, um público de milhões de expectadores e a exposição brutal
de um povo (o hebreu) nas telas do cinema. Não era algo irrelevante, pois, como
constou da sentença do OGHBrZ, o filme Jud Süß nem de longe foi uma
“ferramenta insignificante” para fomentar o genocídio.
O cineasta, uma vez absolvido, tentou prosseguir em sua carreira.850
Perceba-se que Leni Riefenstahl (1902-2003), a “cineasta predileta” de Hitler,
amargou quatro anos de prisão, após a guerra, em um campo de prisioneiros
francês. Por falta de provas, ela não foi condenada como nazista, mas como
simples simpatizante, tendo alcançado sua liberdade. Leni Riefenstahl foi
boicotada e não mais conseguiu produzir filmes, o que a levou a trabalhar como
fotógrafa. Esse ponto da biografia de ambos é relevante: ela também sofreu
boicote a sua atividade profissional, mas não levou a matéria aos tribunais.851
Provavelmente estimulado por sua vitória na Justiça, com o apoio de
inúmeros simpatizantes, em 1950, Veit Harlan dirigiu e roteirizou o filme
Amada imortal.852 Ainda na fase de produção, a película foi alvo de protestos.
Antes de sua estreia no Natal de 1950, Erich Lüth (1902-1989) liderou o
chamamento ao boicote do filme de Harlan, por ele considerado um expoente do
cinema nacional-socialista e um agente do antissemitismo.853 O boicote não
começou com o discurso de Lüth, pronunciado no Clube de Imprensa da Cidade
Livre e Hanseática de Hamburgo, e não se resumiu a protestos nessa unidade da
federação alemã, mas a atos (inclusive de violência) em várias cidades alemãs,
com o objetivo de impedir o acesso ou sensibilizar as pessoas a não irem ao
cinema para assistir ao filme de Veit Harlan.854

45.3. Elementos descritivos do caso Lüth e a decisão do TCF


Embora não tenha sido o único a protestar contra a exibição de Amada
imortal, Erich Lüth foi processado por Herzog-Film GmbH (distribuidora do
filme) e Domni-ck-Film-Produktion GmbH (empresa do produtor), com pedido
cominatório, fundado no § 826, BGB,855 que concede pretensão a exigir uma
abstenção contra quem, por ato ofensivo à cláusula geral dos bons costumes,856
causar dano a outrem, sob pena de responder pecuniariamente. A abstenção que
as empresas almejavam impor a Lüth era a de não instigar ou exortar as pessoas
a boicotarem o filme. O discurso de Lüth, em 20 de setembro de 1950, proferido
durante a abertura da “Semana do Cinema Alemão”, atacava diretamente o
cineasta, sua obra (especialmente a película Jud Süß) e o que ambos
representavam para o mundo em termos de imagem da Alemanha no pós-guer-
ra, de modo particular em relação aos judeus.857
Lüth perdeu no primeiro (LG Hamburg) e no segundo grau de jurisdição
(HansOLR) da Cidade Livre e Hanseática de Hamburgo.858 Como resultado, sob
pena de pagar uma sanção pecuniária compulsória ou pena corporal (prisão),
Lüth não poderia mais conclamar o público alemão a deixar de assistir ao filme e
exortar os donos de cinema ou as empresas distribuidoras a que não incluíssem
Amada Imortal em suas programações.
O LG Hamburg entendeu que as condutas de Lüth impediriam o exercício
profissional de Harlan, dado que este poderia ser sempre associado às atividades
cinematográficas do período da guerra. Segundo o LG Hamburg: (i)
objetivamente, Harlan foi absolvido no juízo criminal, com trânsito em julgado,
das acusações relativas a sua participação no filme Jud Süß; (ii) ele se submeteu
ao processo de desnazificação e foi considerado dispensado de qualquer restrição
a suas atividades profissionais; (iii) o delito de Lüth não foi de opinião (contra
Harlan ou o filme), mas de promover o boicote, o que atingiria a esfera jurídica e
provocaria prejuízos às empresas de produção e de distribuição de Amada
imortal; (iv) a ordem de abstenção impediria a continuidade do delito civil de
Lüth e se enquadraria perfeitamente no § 826, BGB.859
O TCF admitiu reclamação constitucional860 de Erich Lüth, a qual se
fundamentou no art. 5o, I, apartado 1, LF/1949. A tese era simples: Lüth não
violou o § 826, BGB, porque ele exercera o direito fundamental de liberdade de
expressão e, nesse sentido, não se poderia decidir o caso com regras de
Responsabilidade Civil. À luz do Direito Público, a conduta do reclamante seria
admissível e o Direito Civil não poderia ser usado para sancioná-lo, dada a
precedência constitucional sobre essa área do direito ordinário.861

45.4. Os fundamentos jurídicos do caso Lüth: interpretação constitucional e


Direito Civil

45.4.1. Estudo analítico interno-externo dos fundamentos do caso


Lüth

Os fundamentos do TCF no caso Lüth são facilmente encontrados em


português, seja em versão com os principais excertos, seja em paráfrases ou
resenhas.862 A contribuição que esta tese pode oferecer está na descrição do
modo como se construíram os argumentos do TCF. A partir dessa narrativa
interna da decisão, duas coisas ficarão evidentes: (i) o respeito do tribunal ao
Direito Civil; (ii) o uso dos métodos de interpretação de Savigny como
mecanismos antecedentes à tomada de decisão final, a saber, o reconhecimento
de que Lüth exerceu o direito à liberdade comunicativa, na modalidade “livre
expressão do pensamento”, e, desse modo, não poderia sofrer uma restrição a
direito fundamental. A admissão de que Lüth agiu sob o império de um direito
fundamental em face de um particular, era parcialmente inovadora.
Tradicionalmente, os direitos fundamentais nasceram como direitos de defesa
contra agressões do Estado ao indivíduo.863 Passou-se a assistir a seu uso contra
terceiros, o que já era possível nos tempos de Weimar, ainda que timidamente.864
O novo estava em como e em que limites essa utilização atípica dos direitos
fundamentais ocorreria doravante.
Assim exposta a questão, passe-se a esse estudo analítico interno-externo
dos fundamentos da decisão do TCF de 1958.

45.4.2. Ponto de partida: a doutrina de Jellinek

Tornou-se razoavelmente conhecida, por ser referida em alguns manuais de


Direito Constitucional,865 a doutrina do status866 de Georg Jellinek, que se dividia
em (i) status negativus ou status libertatis; (ii) status positivus ou status civitatis;
e (iii) status activus.867
O status negativus metaforicamente é o escudo que o sujeito usa para se
defender do Estado. O direito de propriedade, previsto em todas as constituições
brasileiras, é um escudo contra a expropriação indevida dos bens de uma pessoa
por autoridades públicas. Rigorosamente, esse status negativus está na origem
remota dos direitos fundamentais e, mais que isso, da própria ideia de carta de
direitos. Os lordes espirituais e temporais, que forçaram o rei João Sem Terra a
aceitar os “artigos dos barões” em 1215, criaram formas rudimentares de
proteção em face dos abusos de um governante contra as pessoas e seus bens. A
Magna Charta contém alguns dispositivos que se enquadrariam no status
negativus. Nos dias de hoje, o status negativus corresponde ao conceito de
direitos de resistência (ou de defesa).868 Em tempos de eficácia dos direitos
fundamentais nas relações privadas nunca é demais lembrar a origem e a função
primitiva desses direitos: defender o cidadão contra o tirano. Mesmo em um
Estado de Direito, seja ele democrático ou social, há ainda muitos espaços de
defesa (ou resistência) contra os avanços estatais sobre as liberdades subjetivas.
O status positivus, correspondente às liberdades positivas. Mantendo-se o
colorido das metáforas, é a espada que o sujeito empunha para demandar direitos
necessários à sua existência ou sua vida social. Tanto mais dilatado será o status
positivus quanto forem os compromissos estatais com esses direitos.
Contemporaneamente, essa ampliação das liberdades positivas é sensível ao se
observar a presença cada vez maior de direitos sociais no texto das constituições.
No século XIX, eram direitos à segurança pública, à justiça ou à proteção
militar. Nos últimos cem anos, as prestações positivas esperadas do Estado
abrangem novos conteúdos como educação, saúde e segurança alimentar.
Finalmente, o status activus é o que concede direitos ao cidadão para que
este tome parte ativa na vida política e social. A ele correspondem os direitos
cívicos. O exemplo clássico do status activus é o direito de votar e ser votado,
que pode muito bem açambarcar a investidura em cargos públicos. Outra espécie
seria a participação nas Forças Armadas.
Evidentemente que o indivíduo não tem apenas o escudo e a espada a
mediar sua relação com o Estado. Ele também se sujeita aos comandos estatais
positivos e negativos.869 Não faria sentido esquecer do status subiectionis quando
se estuda a doutrina do status de Jellinek. Cumprir determinações
administrativas como as prescritas nas normas de trânsito, pagar tributos ou se
abster de cometer crimes são expressões dessa sujeição indivíduo-Estado.
Nessa chave, Lüth exercitara seu direito à liberdade de expressão. Mas,
poderia ele se proteger (direito de resistência) contra a ação do Estado, mesmo
quando o atingido pelos efeitos do exercício de seu direito fundamental fosse um
particular (o terceiro, da expressão alemã Drittwirkung)? Como visto na
Primeira Parte, a se manter a divisão entre Direito Público e Direito Privado,
deve-se conceder uma diferença essencial entre os vínculos indivíduo-indivíduo
e indivíduo-Estado, com as exceções de estilo. Qualquer solução para o caso
Lüth poderia colocar em dúvida essa distinção: ele não limitara sua liberdade de
modo voluntário, o que se daria, v.g., pela assinatura de um contrato com os
produtores ou distribuidores do filme Amada imortal. Por outro lado, o exercício
do direito conferido pelo § 826, BGB, no sentido de se demandar a cessação de
atos infratores aos bons costumes, parecia extrapolar os limites do Direito
Privado. Os produtores e distribuidores aparentemente queriam censurar Lüth e
esse comando só seria aceitável por meio de uma sujeição. Entraria aqui o status
subiectionis, ao qual Lüth não se vinculava, exceto em relação ao Estado.
Levado à última instância, o ato de proibir a emissão de proclamações,
dirigidas a terceiros, seria o mesmo que limitar as liberdades comunicativas pela
ação de um particular.

45.4.3. Respeito à “grande dicotomia”

O TCF poderia ter simplesmente ignorado a doutrina do status de Jellinek


e, algo mais simples, afirmado que não subsistiria a diferenciação sistemática
entre Direito Público e Direito Privado. Se tivesse entendido dessa forma, abria-
se o caminho para o apelo direto aos direitos fundamentais. Por consequência,
também se poderia afirmar que os “valores” contidos nos direitos fundamentais
teriam aplicação imediata ao Direito Civil e às relações entre particulares.
Por que o TCF não agiu assim?
A resposta há de ser dada em dois níveis.
(a) O primeiro é de ordem metodológica. O TCF não considerou
arruinados os marcos divisórios entre o Direito Público e o Direito Privado. Em
1958, esse raciocínio mostrou-se adequado. Estava-se no auge do que se tornou
conhecida como “sociedade industrial” e também da publicização do Direito
Civil. Ainda assim, o TCF conservou-se fiel à “grande dicotomia”. Em 2018, 60
anos depois, essa opção permanece válida e, após a exaustiva demonstração
teórica e empírica da Primeira Parte da tese, ainda atual e útil.
(b) O segundo nível de resposta é mais singelo: não havia em 1958 (e
continua a não haver em 2017) uma norma constitucional na Alemanha que
autorize a eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
Não se vai adiantar aqui uma das críticas à doutrina da eficácia direta, que é a
interpretação dada ao art. 5o, § 1o, CF/1988, para dele extrair essa autorização.870-
871 O fato é que não há na LF/1949 uma norma como o art. 8.2 da Constituição

da África do Sul, que afirma existir vinculação aos direitos fundamentais em


relação às pessoas naturais ou jurídicas, levando-se em conta a natureza do
direito e a natureza do dever imposto pelo direito.872
Agora, é necessário recuperar as lições de Savigny quanto aos critérios
hermenêuticos.

45.4.4. Interpretação gramatical

O primeiro dos métodos hermenêuticos de Savigny é o gramatical. O TCF,


ainda que não tenha feito referência a Savigny, em primeiro lugar, interpretou
literalmente o art. 1o, apartado 3, LF/1988, que assim está redigido: “Os direitos
fundamentais, discriminados a seguir, constituem direitos diretamente aplicáveis
e vinculam os poderes legislativo, executivo e judiciário”.
A primeira parte do artigo - “direitos diretamente aplicáveis”, em uma
interpretação literal, significaria que os direitos fundamentais produziriam
efeitos no plano vertical, em sua função clássica (Estado-cidadão-Estado), mas
também horizontais, atingindo os particulares envolvidos. Mas, a continuação do
artigo desmente essa primeira ideia: “e vinculam os poderes legislativo,
executivo e judiciário”. Pela literalidade da norma, essa vinculação não teria
efeitos sobre terceiros. O TCF não quis ler algo que não estava escrito no texto
constitucional.

45.4.5. Interpretação lógico-sistemática

Embora não esteja explícita na fundamentação essa forma de se apreciar o


problema, o TCF investigou se no texto da LF/1949 haveria alguma norma que
permitisse a vinculação de particulares, no plano horizontal, aos direitos
fundamentais. Com muito esforço, poder-se-ia admitir que o art. 9o, apartado 3,
LF/1949, teria semelhante alcance ao determinar que qualquer negócio jurídico
entre particulares, que seja contrário à liberdade de associação, considerar-se-á
nulo.
Essa leitura, ainda que seja controversa, não permite que a partir de uma
regra excepcional se retirem consequências generalizantes. Tal se explica pela
leitura sistemática do art. 19, apartado 4, e do art. 93, apartado 1, número 4a. O
primeiro dos dispositivos citados assegura a toda pessoa, cujos direitos
houverem sido violados pelo poder público, o acesso à função jurisdicional, que,
em princípio, será exercida pelos tribunais ordinários. O art. 93 dispõe sobre a
competência do TCF, prevendo o apartado 1, número 4a, que as reclamações
constitucionais podem ser ajuizadas por “qualquer um”873 – com alegação de
ofensa a direito fundamental também pelo poder público. Ambas as normas
indicariam que só violações de direitos pelo Estado (e não por particulares)
permitiriam o acesso ao TCF.
A interpretação sistemática conduz, portanto, à conclusão provisória de que
não haveria eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos
particulares. Por outro lado, situações excepcionais não se prestam a ser objeto
de generalizações, a ponto de servirem como uma regra para a eficácia direta.
Em sendo assim, ultrapassa-se mais uma das etapas de um processo
hermenêutico clássico.

45.4.6. Interpretação histórica

Se a eficácia em relação a terceiros não é viável gramatical e


sistematicamente, talvez fosse possível resolver o paradoxo por meio da
interpretação histórica do art. 1o, apartado 3, CF/1949. Segue-se de perto a
cadeia de critérios interpretativos de Savigny. O tribunal faz expressa referência
ao processo evolutivo da “ideia do direito fundamental”, baseando-se nos
“acontecimentos históricos” que conduziram os direitos fundamentais às
constituições políticas de vários países.874
O apartado 3 do art. 1o da LF/1949 não foi uma criação insólita dos avós
fundadores da Alemanha Ocidental. As raízes dessa norma jurídica deitam-se
em solo norte-americano. É possível rastrear a ideia de que os direitos
fundamentais são aplicáveis diretamente e vinculam os três poderes até à
Primeira Emenda da Constituição da Filadélfia de 1791. Os pais fundadores dos
Estados Unidos desejavam restringir os poderes legisferantes do Congresso da
nova república. Essa restrição incidiria em matérias que, na linguagem
contemporânea, denominar-se-iam “direitos fundamentais”. O teor da Primeira
Emenda é autoexplicativo: o Congresso não deverá editar qualquer lei sobre a
instituição de religião, ou proibir seu livre exercício; ou restringindo a liberdade
de expressão, ou de imprensa; ou o direito de as pessoas pacificamente se
reunirem, e de formularem petições ao Governo para se obter reparações por
agravos.875
O Estado é visivelmente o destinatário desse comando constitucional e não
outros particulares.
Outra pesquisa histórico-legislativa poderia recair sobre a evolução dos
textos constitucionais alemães. Se for consultada a Constituição de 1848, a
célebre constituição da Igreja de São Paulo, também não se encontrará um
dispositivo que sirva de base para vinculação de terceiros. Note-se que a
Constituição de Paulskirche possui um capítulo inteiro dedicado aos “direitos
fundamentais do povo alemão”. No § 130 informa-se que os direitos conferidos
pela Constituição são fundamentais e não podem ser restringidos por ato
normativo estatal de quaisquer dos entes que integram o Reich alemão. A
liberdade de imprensa não poderia ser violada por medidas governamentais, de
poder de polícia ou de natureza legislativa.876 Uma vez mais, observa-se o caráter
de resistência ou de defesa das liberdades individuais contra a atuação estatal.
A Constituição de Weimar não possuía uma norma similar ao art. 1o,
apartado 3, CF/1949. A redação definitiva do art. 107 da WVR não manteve o
estilo original, o qual era bem próximo do conteúdo do futuro art. 1o, apartado 3,
LF/1949. O texto aprovado da Constituição de Weimar declarava simplesmente
que os tribunais administrativos existem para defender os indivíduos contra os
atos estatais de natureza administrativa.877 Não há parâmetro de comparação
normativa entre o texto de Weimar e a redação da LF/1949.
Embora, como já registrado, houvesse alguma flexibilidade na
interpretação de dispositivos constitucionais como o art. 117, WVR (violação de
correspondência). Essa regra chegou a comportar interpretação no sentido de
admitir eficácia em relação a um terceiro que violasse o conteúdo postal de
alguém.878 Note-se que a violação de correspondência era o meio típico pelo qual
agiam os órgãos de polícia secreta na Alemanha e na Áustria-Hungria. Nos
impérios centrais, o cargo de diretor dos Correios era acumulado com o de
ministro da Justiça. Pensar em uma quebra do sigilo postal por particulares era
algo novo no início do século XX. Por essa circunstância, mereceu atenção dos
constituintes de Weimar. Mas não a ponto de se criarem condições para uma
prematura teoria da eficácia dos direitos fundamentais em relação a terceiros.
Chega-se ao final com a pesquisa sobre o projeto de constituição de
Herrenchiemsee.879 O art. 21, apartado 2, do projeto, é a base para o atual art. 1o,
apartado 3, LF/1949: Os direitos fundamentais vinculam diretamente o
legislador, os juízes e a administração. É interessante observar que o apartado 3
do art. 21 do projeto aponta até “mesmo para a ideia de primazia de
conhecimento do direito privado”, quando dispõe que “os direitos fundamentais
deveriam ser compreendidos no marco da ordem jurídica geral, salvo
entendimento diverso resultante do seu conteúdo”.880
A interpretação histórica não se afastou dos resultados obtidos com os
métodos gramatical e lógico-sistemático.
§46. A INTRODUÇÃO DO CONCEITO DE “ORDEM OBJETIVA DE VALORES”
E O USO DA PONDERAÇÃO EM UM CASO DE DIREITO CIVIL

46.1. A “ordem objetiva de valores”


O conceito de ordem objetiva de valores881 foi consagrado no vocabulário
jurídico após o caso Lüth.
A solução encontrada pelo TCF não foi interpretar a LF/1949 por meio da
leitura de palavras não existentes em seu texto. Não se apelou para a “mutação
constitucional”, o que seria, no mínimo, excêntrico dado o pouco tempo de
vigência da LF/1949.
Primeiramente, o tribunal constitucional dispunha de um aparato teórico
retirado dos escritos de Günter Dürig (1920-1996), defensor da eficácia indireta
dos direitos fundamentais nas relações privadas.882
Em seguida, o tribunal reconheceu que os direitos fundamentais existem,
“em primeira linha”, como direitos de resistência. São meios de se assegurar a
liberdade privada contra as intervenções estatais e a reclamação constitucional
seria o meio jurídico adequado para a prevalência desses direitos.
A extensão dos direitos fundamentais para além da estrutura clássica deu-
se com a admissão de que o ordenamento jurídico não é neutro axiologicamente
e que a LF/1949 criou uma ordem objetiva de valores, baseada no
desenvolvimento da personalidade e em sua dignidade, ao estilo das ideias de
Dürig.883 Em sendo a primeira linha dessa ordem de valores, os direitos
fundamentais vinculariam diretamente as funções do Estado (Administração,
Legislativo e Judiciário). O Direito Civil, como parte do ordenamento, seria
também atingido por esses valores contidos nos direitos fundamentais, por meio
(Medium) das normas do próprio Direito Civil.884 Essa solução do TCF, para
alguns autores, também revelaria um receio: abrir as portas da reclamação
constitucional para casos de Direito Privado, numericamente muito mais
frequentes que os de Direito Público, poderia implicar uma enxurrada de
recursos no tribunal. Criar esse filtro da “ordem objetiva de valores” permitiria
ao TCF rejeitar casos que, a contrario sensu, não a desrespeitassem.885
Conforme o TCF, apesar dessa influência dos direitos fundamentais sobre a
relação jurídico-cível, não há mudança em sua natureza, que permanece de
Direito Civil. Mais que isso: sua interpretação e sua aplicação há de seguir o
Direito Civil, posto que haja a necessidade de se adequar ao Direito Público e à
Constituição. Essa vinculação será tanto maior quanto o caráter indisponível das
normas de Direito Civil.886
A “entrada” dos direitos fundamentais (e seus valores) para o Direito Civil
dar-se-á principaliter (embora não exclusivamente) pelas “cláusulas gerais” do
campo jurídico privado. Eventualmente, e esse é um ponto que merece atenção
no julgado Lüth, pode-se recorrer a critérios extrajurídicos, de entre os quais os
“bons costumes”. O recurso a elementos metajurídicos em uma ordem jurídica
positiva não deixa de ser perigoso. O tribunal fez uma concessão arriscada a algo
que, em outros tempos, poderia ter sido denominado de Direito Natural. Esse
tipo de argumentação poderia conduzir ao surgimento de um cavalo de Troia no
sistema interno: quem define o conteúdo desses valores metajurídicos? Esse
apelo a “critérios extrajurídicos” não seria uma forma de se introduzir no sistema
um fator de correção externo? Essa crítica acompanharia o TCF desde então.
Assim como no Brasil, há críticas na Alemanha quanto aos excessos do TCF na
interpretação do Direito (não somente o ordinário). Uwe Diederichsen afirma
que a decisão Lüth foi para o Direito uma verdadeira “queda do homem” [em
alemão, Sündenfall]: a passagem do estado de inocência para o de culpa e
insubmissão a Deus, quando Adão e Eva experimentaram o fruto proibido, do
que resultou sua expulsão do Paraíso. Segundo ele, o TCF cometeu um ato
conscientemente urdido de “usurpação” e, a partir daí, há submetido o Direito
Civil a controles excessivos, por intermédio de conceitos vagos, geradores de
insegurança jurídica e dogmática.887 Comparativamente ao que ocorreu no
Brasil, porém, não é incorreto dizer que o TCF se comporta com excessiva
timidez.
Na continuidade, o TCF tenta explicar qual seria o conteúdo dos “critérios
extrajurídicos”, ao esclarecer que o conteúdo dos valores que informam a
Constituição e os direitos fundamentais há de ser extraído das concepções
axiológicas de um povo no momento histórico e que se fixaram na Constituição.
Permanece o problema de se definir quem dirá quais são essas “concepções
axiológicas”? O próprio TCF, sem dúvida. Tal resposta vem acompanhada de
uma inquietação: são os juízes (constitucionais) os donos da chave que abre o
ordenamento para essa “ordem objetiva de valores”? Para o Direito Civil,
interessa que o TCF reconduziu esse trabalho interpretativo ao campo civilístico,
quando se refere às cláusulas gerais, citando Dürig, como os “pontos de entrada”
dos direitos fundamentais no Direito Civil.888
Ao juiz, segundo a decisão, caberia o papel de selecionar quais normas de
Direito Civil, por ele utilizadas no caso, seria ou não influenciadas pelos direitos
fundamentais. Se for necessária tal incidência, o Direito Privado será modificado
por efeito desse contacto com os direitos fundamentais. Seria esse o sentido da
vinculação judicial aos direitos fundamentais, prevista no art. 1o, apartado 3,
LF/1949.889
O exame material da qualidade da decisão do juiz cível é limitado ao que o
TCF denominou de “efeitos de irradiação”,890 termo que ganhou o mundo e
serviu de argumento para a metáfora do guarda-chuva protetor contra a radiação
emanada pelos direitos fundamentais. Os “efeitos de irradiação” atingiram em
cheio a jurisprudência brasileira. Essa expressão é encontrável em diversos
acórdãos, embora nem sempre com o sentido correspondente ao desenvolvido
pelo TCF.891
O tribunal tenta justificar o uso da reclamação para reexaminar casos de
Direito Civil em outro trecho do julgado: esse recurso teria por função
subordinar os atos do Executivo, do Legislativo e do Judiciário aos direitos
fundamentais. Esse papel do TCF não o transformaria em uma instância revisora
ou super-revisora dos atos dos tribunais ordinários.892 Esse aspecto é objeto de
constantes ataques ao TCF por setores da doutrina alemã, que o acusam de
haver-se transformado em uma suprema corte de direito ordinário.893
O aresto volta-se para a especificidade do caso Lüth: o conflito subjacente
envolve o direito fundamental da liberdade de expressão do pensamento,
protegido tanto pela LF/1949, em seu art. 5o,894 quanto pela WVR (art. 118), nos
limites das “leis gerais” (apartado 2 do art. 5o, LF/1949). Então, o TCF retorna à
interpretação histórica: o direito à liberdade de expressão é uma emanação direta
da personalidade humana e foi recepcionado na Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão de 1789 (art. 11). Sem ele, não se pode constituir uma
ordem estatal de caráter livre e democrática. A experiência constitucional norte-
americana, que deriva da Primeira Emenda, foi também recuperada com uma
citação de Benjamin Nathan Cardozo sobre a liberdade de expressão,
considerada pelo justice norte-americano como a matriz, a condição
indispensável de quase todas as outras formas de liberdade.895
Diante desse aparato histórico-normativo, ao entender do TCF, seria
impossível relativizar o alcance desse direito por uma lei ordinária, ainda que de
caráter geral. Essas leis gerais devem ser interpretadas de modo compatível com
a noção de “trocas recíprocas”: elas limitam o direito fundamental e este, por seu
sentido valorativo, influencia aquelas normas ordinárias.896 Este excerto do
julgado é importante porque confirma a ideia de que os direitos fundamentais (e
a própria Constituição, por extensão) estabelecem uma relação de implicação-
polaridade com o direito ordinário, que se dá pela via de influências recíprocas.
Limitado o exame ao direito fundamental da liberdade de expressão e suas
conexões com leis gerais, o TCF entendeu, com base em interpretação histórica,
que as leis gerais não podem impedir que o ato de se expressar produza efeitos
intelectuais sobre o meio. Forma-se a opinião coletiva ao se usar da palavra, ao
se exteriorizar o pensamento. Daí por que os juízos de valor, que almejam
convencer terceiros, são protegidos constitucionalmente (art. 5o, I, apartado 1,
LF/1949), como afirma o TCF. Não seria materialmente possível separar a
expressão protegida e seus efeitos sobre terceiros.897
O tribunal passa a se referir à necessidade de proceder a uma ponderação
de interesses ou bens jurídicos. Em alemão, usa-se a palavra Güterabwägung. Na
literatura e na jurisprudência brasileiras, a forma mais simples Abwägung, ora
traduzida por ponderação, ora por balanceamento, assumiu proporções de uma
verdadeira erva daninha. Não por conta de seu sentido técnico, que é importante
para diversas teorias discursivas contemporâneas, especialmente a de Robert
Alexy, mas pelo que dela fizeram. Para não se perder a lógica da exposição,
deixar-se-á para um depois esse importante tópico (vide 46.2).
O TCF, após todo o percurso literal, histórico e lógico-sistemático,
concluiu que estava diante de uma hipótese de fato na qual um bem jurídico
individual foi violado pela conduta de outrem, que exercita sua liberdade de
expressão. Lüth, em tese, haveria causado danos ao produtor e ao distribuidor do
filme Amada imortal. A leitura do art. 5o, apartado 2, LF/1949, permitiria
entender que a liberdade de expressão é limitável por uma “lei geral” e não há
como negar tal status às normas de Direito Civil. Como ressaltou o TCF, se essa
correlação não foi ainda suposta na doutrina é por uma causa singela: não se
enxergava a possibilidade de uma eficácia dos direitos fundamentais nas relações
privadas. Para que divagar sobre um papel limitante do Direito Civil aos direitos
fundamentais se estes funcionavam como escudo dos cidadãos contra o Estado e
não contra terceiros? 898
Admitida essa nova função ao Direito Civil como agente limitador de um
direito fundamental, não se pode negar o efeito reverso: o efeito limitador dos
direitos fundamentais em relação ao Direito Civil. Este é o ponto culminante da
viragem operada na dogmática dos direitos fundamentais e do Direito Civil pela
decisão Lüth. O ponto de partida fora a afirmação de que a ordem jurídica tinha
uma hierarquia axiológica, que deitava raízes em um conteúdo vago (concepções
axiológicas de um povo no momento histórico e que se fixaram na Constituição).
Embora seja um fundamento até hoje discutível por setores da doutrina alemã,899
a noção de “ordem objetiva de valores” permitiu que se chegasse a este ponto do
julgado: o Direito Civil limita direitos fundamentais e por eles pode ser limitado.

46.2. A ponderação e o Direito Civil


Por intermédio de uma técnica de ponderação, o TCF iria concluir o exame
do conflito trazido a seu conhecimento por uma reclamação constitucional. Eis
os critérios utilizados pelo tribunal:900 a) Lüth manifestou-se para contribuir com
a formação da opinião pública. Os efeitos colaterais de sua intervenção na esfera
privada de terceiros não foram o objetivo central de suas declarações; b) a
liberdade de expressão não se volta, em caráter principal, contra um bem jurídico
privado, quando não é movida por interesses econômicos ou fins egoísticos; c) a
liberdade de expressão, ao assumir contornos de uma contribuição para o debate
de ideias, a luta intelectual em torno de um tema essencial para a opinião
pública, é presumivelmente legítima.901 Saber, portanto, se o ato de Lüth (ou
algum equivalente) é contrário aos bons costumes exige: (i) uma investigação
sobre os motivos, o objeto e o fim das declarações da parte; (ii) verificar se, ao
tentar atingir seu objetivo, a parte não agiu desproporcionalmente em relação à
outra parte, assim entendido: os objetivos e os propósitos do cineasta, cujos
interesses se refletiam na demanda das empresas de produção e de distribuição
da película.902
Após lançar esses critérios em tese, o tribunal aplicou-os aos fatos da
reclamação: a) Lüth não agiu com propósitos econômicos. Ele não concorria
com o cineasta nem com as empresas envolvidas; b) o juízo de origem não
identificou tais elementos na intenção de Lüth; c) o reclamante agiu para
demonstrar ao mundo que o povo alemão havia adotado uma nova ordem de
valores e a atividade cinematográfica de Harlan enquadrava-se nos antigos
padrões morais do regime deposto. Admitir sua continuidade, no modo e na
forma como exercidos em Amada imortal, seria desmentir essa nova atitude do
povo alemão, assumida não por um senso de oportunismo e sim por uma adesão
sincera à democracia, representando um repúdio ao vergonhoso passado
recente.903
O resultado do julgamento é notório. Lüth não praticou um ato contrário
aos bons costumes. A decisão do tribunal de origem violou seu direito
fundamental à liberdade de expressão e deveria ser, como foi, cassada.
§47. OS LEGADOS DO CASO LÜTH AO DISCURSO METODOLÓGICO DO
DIREITO CIVIL

47.1. O despertar para uma nova realidade metodológica


Uma decisão judicial não tem, em princípio, consequências metodológicas.
Mas, é adequado aceitar que essa particular decisão gerou impacto sensível no
modo como o Direito Civil se operacionaliza e, por meios indiretos, em seu
discurso metodológico. Considerados os ataques sem quartel que a “grande
dicotomia” passou a sofrer desde a propagação da tese de livre-docência de Hans
Kelsen, associados a intuitos ideológicos (dos regimes totalitários ou
autoritários) alheios à vocação democrática de Kelsen, a decisão Lüth poderia ter
servido para reforçar esse estado de coisas. Isso não foi o que aconteceu.
É óbvio que a decisão obrigou os civilistas a enfrentarem a
constitucionalização e a eficácia dos direitos fundamentais em relação a
terceiros. Na Alemanha, isso ocorreu e não foi de forma pacífica, até porque
esses temas não estão isolados de questões maiores como a judicialização da
política, o papel dos tribunais constitucionais, a perda de legitimidade
democrática, a dignidade da legislação e tantos outros que se põem no centro da
agenda do Direito Constitucional e da Teoria do Estado. Remete-se o leitor para
a Segunda Parte em relação a diversos desses tópicos.
A desconstrução de certos “consensos sobrepostos” sobre a publicização e
a perda de autonomia epistemológica, que se tentou fazer na Primeira Parte, foi
acompanhada de perto da delimitação semântica da constitucionalização do
Direito Civil. Agora, é o momento de atingir o núcleo do terceiro marco desta
tese: o modelo adequado de eficácia dos direitos fundamentais para o Direito
Civil.
Uma etapa indispensável a esse propósito era expugnar o caso Lüth, não
apenas como uma decisão isolada, a despeito de ser, de per si, suficiente para
qualquer exame. Era necessário contextualizá-la histórica, jurídica e socialmente.
Diante do amplo cenário que se construiu e da interpretação de seu conteúdo
decisório, concede-se que se apresentem algumas de suas consequências, nas
subseções seguintes (vide 47.2 e 47.3).

47.2. Respeito aos métodos, aos padrões decisórios e à gramática do Direito


Civil
Em momento algum no caso Lüth assistiu-se a uma desconstrução ou
crítica aos métodos do Direito Civil, muito menos a seus padrões decisórios. O
TCF, em certa medida, deles se aproveitou para chegar à conclusão sobre a
implicação-polaridade entre o efeito limitador do Direito Civil (tomado como
“lei geral”) em relação aos direitos fundamentais e destes em relação ao Direito
Civil. Não se percebe também um discurso retórico, triunfalista ou depreciativo
ao Direito Civil. Ele não é anacrônico, hostil ao novo, ultrapassado,
incompatível com novos valores, muito menos insuficiente para resolver
questões de...Direito Civil. A crítica do TCF aos juízos ordinários não foi
substantiva, mas metodológica. Após um demorado processo interpretativo
gramatical, lógico-sistemático e histórico, o TCF não permitiu que a liberdade de
expressão de um particular fosse limitada por outro particular sob o pretexto de
se invocar a proteção de uma norma de Direito Civil. A leitura atenta do caso é
reveladora, contudo, de que essa relação poder-se-ia alterar se algumas variáveis
também cambiassem: os fins do ataque de Lüth; os seus propósitos e seus laços
com o setor do cinema; a condição histórica peculiar do cineasta. A decisão do
TCF não foi um exercício de prestidigitação jurídica, um jogo vazio de palavras.
É claro que esses elementos descritivos pesaram no juízo de “ponderação”
que o tribunal levou a efeito. Veit Harlan não era um cineasta, ele era o cineasta
do regime, ao lado de uns poucos eleitos, como Leni Riefenstahl, que nunca
pôde voltar a exercer sua profissão. Nas instâncias ordinárias, Harlan teve um
julgamento constrangedor para a imagem da Alemanha perante as forças de
ocupação e as nações ocidentais. O triunfalismo e o apoio popular após a decisão
absolutória em Hamburgo não devem ter sido bem recebidos por setores da
sociedade alemã. É provável que essas questões tenham influenciado a
“ponderação” feita pelo TCF sobre os motivos de Lüth.
Nesse ponto, é necessário registrar que o caso Lüth representou um ponto
de inflexão na jurisprudência do tribunal constitucional que, nos sete anos
anteriores, se havia comprometido ora com teses restauracionistas, ora com
teses reconstrutivistas.904 A despeito de críticas metodológicas ao julgamento, é
importante reconhecer que, visto com o distanciamento histórico, a decisão foi
acertada. De modo precoce, ela provocou um acerto de contas com o passado,
embora longe de ter sido suficientemente amplo para expurgar elementos
irremediavelmente comprometidos com o regime. Embora, segundo Uwe
Diederichsen, o julgamento do TCF em favor de Lüth já estivesse
predeterminado em razão das pressões políticas e sociais sobre os juízes.905
A decisão Lüth, portanto, sob o aspecto medotológico, só reforçou a
autonomia do Direito Civil e sua gramática normativa.

47.3. A complexidade interpretativa e a ponderação


A técnica da ponderação está firmemente ligada ao processo de
constitucionalização do Direito, embora não se ignore a resistência a seus
amplos desdobramentos na Alemanha.906 Não se pretende importar para esta tese
essa polêmica, embora não se possa afastar totalmente essa questão. Para esta
seção é necessário apenas demarcar que a Abwägung, embora não tenha nascido
no caso Lüth (na verdade, teoricamente é bem anterior à LF/1949 e a seu
constitucionalismo), teve nesse julgamento sua aplicação em face do Direito
Civil.
As consequências do uso da ponderação para o discurso metodológico
privatista, agora em sentido mais amplo, podem ser divididas em duas ordens.
A primeira está em que o tribunal não ponderou de qualquer forma. Ainda
que sejam criticáveis seus métodos, a ponderação – da maneira como realizada –
permite algum tipo de controle argumentativo. E, o mais importante, não
substituiu o método do Direito Privado.
A segunda está na diferença entre a ponderação na Alemanha e sua
recepção no Brasil. Com exceções notáveis, a ponderação chegou a um tal nível
de descontrole semântico, metodológico e discursivo no país que começa a ser
criticada por defeitos que não possui e sim por problemas imputáveis à praxe
jurisprudencial e à incompreensão doutrinária.907 Rigorosamente falando, não
seria este um legado do caso Lüth para o Direito Civil.
Nesse aspecto, o Direito Civil tornou-se um imenso laboratório de
ponderações alquímicas. É difícil comparar o Direito Civil com alguma outra
área jurídica na qual a ponderação atingiu semelhante nível de excessos. Mesmo
em conflitos que dispensariam perfeitamente o recurso a direitos fundamentais,
procede-se à “ponderação de princípios”. É comum o uso da “ponderação” para
encobrir julgamentos por equidade ou ao estilo do “decido conforme minha
consciência”, denunciados por Lenio Luiz Streck.908
O mais grave, porém, é o apoio que esses expedientes encontram em parte
da doutrina, que reforça o apelo direto a técnicas ponderacionistas, sem que se
haja concluído o percurso necessário (e próprio do Direito Civil) pelos caminhos
da legislação.909 Esses exageros chegaram a outras áreas do Direito, como o
Direito Administrativo e o Direito Processual. Desta vez, as vítimas dos
excessos de um ponderacionismo sem método são os súditos do Estado,
precisamente aqueles para quem os direitos fundamentais nasceram (no sentido
de protegê-los dos excessos dos detentores do poder).
Tanto nos espaços normativos nos quais a teoria clássica se conserva útil,
dada a persistência de vínculo cidadão-Estado, quanto no Direito Civil, surge o
problema da arbitrariedade e da dependência de valorações subjetivas. Insista-se:
há dois debates em torno do uso da ponderação, seja no caso Lüth ou em outras
decisões do TCF envolvendo Direito Privado.
O primeiro debate, de natureza e origem alemãs, é mais complexo e
envolve uma escolha sobre qual o melhor modelo teórico para os direitos
fundamentais. Os críticos alinham-se tanto em torno de representantes da teoria
liberal dos direitos fundamentais, como Karl-Heinz Ladeur910 e Bernhard
Schlink,911 quanto em redor de autores norte-americanos ligados ao movimento
dos Critical Legal Studies, como Duncan Kennedy.912 Alude-se a uma passagem
do Estado de Direito para o Estado da Jurisdição Constitucional como resultante
desse processo de erosão dos métodos de trabalho do Direito Civil, da
fundamentalização de quase todos os conflitos jurídicos e da perda de
referências entre o universo jurídico e o político.913 De entre alguns privatistas
alemães há idêntico desconforto quanto ao recurso à chamada “ponderação de
valores”.914 Esse é um debate interessante e deve ser travado também no Brasil.
Infelizmente, contudo, a maior urgência está no segundo debate: o controle
dos abusos em nome da ponderação. Se isso ao menos ocorresse, talvez fosse
possível entrar no primeiro debate com maior vigor. Em certa medida, na
metódica do Direito Civil, ainda se precisa chegar ao estágio alcançado após o
caso Lüth. Não que isso signifique subscrever teses sobre um “atávico atraso
intelectual brasileiro” em contraponto aos avanços europeus, as quais são, muita
vez, pautadas em preconceituosas leituras estruturalistas. Propõe-se algo muito
mais simples: o respeito a uma tradição secular da dogmática brasileira, da qual
se pode e deve ter orgulho, e a investigação, em primeira linha, por meio e por
critérios próprios do Direito Civil.

47.4. Eficácia indireta dos direitos fundamentais


O terceiro dos mais importantes legados da decisão Lüth para o Direito
Civil foi definir o modelo da eficácia indireta dos direitos fundamentais em
relação aos particulares como o mais adequado para resolver os problemas
ínsitos ao Direito Constitucional e ao Direito Privado. O estudo analítico deste
modelo ficará para os próximos capítulos.

797 “Parece um equívoco histórico continuar crendo na autonomia de disposições [constitucionais]


libertárias: esta autonomia é construída no âmago da política, da construção e superação do conflito
com o qual toda sociedade verdadeiramente democrática convive” (LIMA, Martonio Mont’Alverne
Barreto. Judiciário versus Executivo/Legislativo: o dilema da efetivação dos direitos fundamentais
numa democracia. Pensar, v. 11, p. 185191, fev. 2006. p. 191).
798 Conferência intitulada “Efeitos dos direitos fundamentais em relação aos particulares: a jurispru-

dência do Tribunal Constitucional Federal do ‘Caso Lüth’ ao ‘Caso Flashmob’”, proferida no audi tório
da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, a convite do Departamento de Direito Civil e
da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo. O texto de Matthias Jestaedt intitula se “Die
Grundrechtsrevolution frisst ihre Kinder”, traduzível por “A revolução dos direitos funda mentais
devora seus filhos”. A referência é esta: JESTAEDT, Matthias. Die Grundrechtsrevolution frisst ihre
Kinder: Bedachtes und Bedenkliches aus fünf Jahrzehnten Grundrechtsdeutung. Journal für
Rechtspolitik - JRP, v. 8 p. 99113, 2000.
799 Ainda que essa teoria seja objeto de severas restrições na Alemanha, cf. SILVA, Virgílio Afonso da. A
constitucionalização do direito...p. 81 (explicando que a doutrina majoritária alemã segue o modelo de
eficácia indireta, ao estilo da jurisprudência do Tribunal Constitucional).
800 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito...p. 5457; LEAL, Fernando. Seis obje ções ao

direito civil constitucional...p. 131140 (com críticas às deficiências metodológicas de teo rias que
referendam o que ele chama de “onipresença da Constituição”, o que acaba por se esta belecer um
ambiente de irracionalidade); TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. São
Paulo: Saraiva, 2016. p. 386: “(...) com a eficácia direta e imediata correse o grave risco, especialmente
no Brasil, de constitucionalizar todo o Direito e todas as relações particula res, relegando o Direito
privado a segundo plano no tratamento de tais matérias” (embora o autor não tome posição
expressa em relação aos modelos da eficácia direta ou da eficácia indireta); DUQUE, Marcelo Schenk.
Direito Privado e Constituição...p. 117 ss. Dentre os civilistas, a título de exemplo: JUNQUEIRA DE
AZEVEDO, Antonio. RTDC: Entrevista com o Prof. Antonio Junqueira de Azevedo. In. JUNQUEIRA DE
AZEVEDO, Antonio. Novos estudos e pareceres de Direito Privado. Sao Paulo: Saraiva, 2009. RODRIGUES
JR., Otavio Luiz. Propriedade e função social...p. 71 ss; REIS, Gabriel Valente dos. Dignidade da pessoa
humana e constitucionalização do Direito Civil: Origens e riscos metodológicos. Revista de Direito do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no 82, p. 92109, jan./mar. 2010.
801 REIS, Thiago. Dogmática e incerteza normativa...§ 2.
802 ALEXY, Robert. Direito constitucional e direito ordinário: jurisdição constitucional e jurisdição es-
pecializada...p. 3738.
803 Adolf Hitler nasceu no Império AustroHúngaro, em 29 de abril de 1889, na cidade de Braunau sobre o

Inn, na região da Baixa Áustria. Ele se encontrava em Munique, Baviera, quando estourou a Primeira
Guerra Mundial. Hitler não se alistou no Exército Imperial e Real austrohúngaro e decidiu ingressar no
Exército Imperial alemão. O soldado Hitler lutou no front ocidental como mensageiro de trincheira, o
que lhe expunha a permanente perigo. Após terse ferido em combate, ele foi pro movido à patente
de cabo e, em 1918, foi condecorado com a Cruz de Ferro de 1ª Classe, “distinção que raras vezes era
concedida aos componentes da tropa” (FEST, Joachim. Hitler. Traduzido por Analúcia Teixeira Ribeiro,
Antônio Nogueira Machado, Antônio Pantoja, Francisco Manuel da Rocha Filho. 4. ed. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1976. p. 77). Sua baixa patente militar e sua naturali dade austrohúngara fizeram com
que ele fosse recebido com desprezo pelo alto oficialato alemão quando foi nomeado para o cargo
de chanceler do Reich. O presidente do Reich, marechal de cam po Paul von Hindenburg, que o
nomeou para a função, disse sobre Hitler que ele não passava de um “cabo da Boêmia”. A Boêmia
havia sido parte do Império AustroHúngaro. O título de Hitler era duplamente depreciativo. E
indicava o desconforto dos marechais alemães por serem submetidos a um comandante supremo
que não passava de um cabo. Desde então, “cabo da Boêmia” passou a designar ditadores que
ascenderam rapidamente, vindos de baixas patentes das Forças Armadas e que possuíam sonhos de
grandeza e poucos limites morais para realizar suas ambições.
804 Sobre a ascensão política de Hitler nesse primeiro momento: FEST, Joachim. Hitler...p. 457489.
805 A CDU e o SPD estavam representados por 27 delegados de cada um desses dois partidos. Os
pequenos partidos tiveram representações menores (BOROWSKI, Martin. The beginnings of
Germany’s Federal Constitutional Court. Ratio Juris. v. 16, no 2, p. 155186, jun. 2003. p. 163).
806 O ano de 1848 passou à História como a “esquina do mundo”. Por todo o continente europeu, hou ve

um despertar das forças adormecidas ou sufocadas após a Restauração de 1815, quando os re gimes
absolutistas retomaram o poder na Europa pósnapoleônica. Nacionalistas húngaros, irlan deses,
italianos e poloneses incendiaram os territórios submetidos às ordens imperiais austríacas, britânicas
e russas. Trabalhadores franceses sublevaram Paris e a França. Nos territórios alemães, eclodiu a
Revolução de Março de 1848 (Märzrevolution), um movimento inserido no contexto das Revoluções
de 1848. Sob a bandeira do pangermanismo e de um forte nacionalismo, protestavase contra a
ordem estabelecida nos Estados da Confederação Germânica, em nome das liberdades civis e da
unidade política. Thomas Nipperdey (Deutsche Geschichte: 18001866 (Bürgerwelt und starker Staat).
5. ed. München: C. H. Beck, 1991. v.1. p. 606) afirma que a Revolução visava à for mação do Estado
nacional e de um parlamento alemão, este último uma verdadeira “criatura” da Revolução. Após uma
série de arranjos políticos, deuse uma reunião prévia do Parlamento, entre março e abril de 1849, na
Igreja de São Paulo (Paulskirche) em Francoforte sobre o Meno, com um total de 574 deputados,
representantes dos diversos Estados alemães e austríacos, cada um deles com as mais variadas
propostas políticas. Houve consenso na reorganização da nova Alemanha sob uma monarquia
federal, a ser comandada pelo rei da Prússia, Frederico Guilherme IV, a quem foi oferecida a coroa. O
texto constitucional elaborado na Igreja de São Paulo é conhecido como Paulskirchenverfassung.
Tratase de uma das mais belas constituições já escritas. Ela contém um amplo catálogo de direitos
fundamentais, assim realmente denominados no original alemão, e antecipou diversos avanços só
encontráveis na LF/1949 e em sua antecessora, a Constituição de Weimar. Todo o projeto de Estado
pangermânico e de uma constituição ruiu após a recusa do rei da Prússia em aceitar a coroa
oferecida pelo Parlamento. A reação conservadora recuperou o terreno, enterrando a
Paulskirchenverfassung e retardando em mais algumas décadas a unifica ção alemã, que só ocorreria
em 1871. A Constituição da Igreja de São Paulo nunca entrou em vigor.
807 A unificação alemã foi o resultado da habilidade política e da vontade férrea de Otto von Bismarck,

ministro do Reino da Prússia, que conduziu o país a três guerras contra o Reino da Dinamarca (1864),
o Império AustroHúngaro (1866) e o Segundo Império Francês (1870). Vitoriosa nesses conflitos, a
Prússia aglutinou em seu redor os Estados alemães e, na Galeria dos Espelhos, no Palácio de
Versalhes, Guilherme da Prússia foi coroado imperador alemão e, formalmente, unifi cou o país em
1871.
808 Em alemão: Deutscher Kaiser.
809 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A formação de um jurista na Alemanha. In. ROSA, Alexandre Morais da;
TRINDADE, André Karam; TASSINARI, Clarissa; SANTOS, Márcio Gil Tostes do; OLIVEIRA, Rafael Tomas
de. Hermenêutica, Constituição e decisão judicial: estudos em homenagem ao professor Lenio Luiz
Streck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016, p. 337340.
810 Bernd Heinrich Wilhelm von Kleist (17771811) foi um dos maiores dramaturgos alemães. Membro de

uma família aristocrática da Prússia Oriental, seu pai fora um major prussiano morto em combate em
fins do século XVIII. Heinrich von Kleist teve uma vida conturbada. Ele serviu na Campanha do Reno
(1796) contra os Exércitos da França revolucionária. Após abandonar a carrei ra militar em 1799, von
Kleist passou um breve período na Universidade de Frankfurt. Suicidouse antes de completar 35 anos
de idade, após ter feito um pacto de morte com uma mulher em do ença terminal. Apesar de ser
muito pouco reconhecido, sua obra é cada vez mais vista como um marco na literatura alemã,
mesmo com a controvérsia que a cerca. Sob muitos aspectos, a obra de von Kleist antecipa os
escritos de Franz Kafka, que era seu declarado admirador. Notas biográficas podem ser encontradas
em: BREUER, Ingo. Biograpische Skizze. In. BREUER, Ingo (Org.). Kleist Handbuch: Leben.Werk.Wirkung.
Stuttgart: J. B. Metzler, Springer, 2013. p. 14 (com indicação de bibliografia específica).
811 O romance narra a história de um comerciante de cavalos, que parte em busca de justiça, após ter

seus cavalos retidos em um posto de fronteira, de modo ilegal, por um fidalgote rural, que vivia de
extorquir os transeuntes de uma estrada sobre a qual exercia direitos feudais. Sua caracterização de
homem honrado e religioso acaba, por vezes, entrando em contradição com o intuito de fazer justiça
pelas próprias mãos. Esse contraste, no entanto, é exposto por von Kleist logo no início da história,
quando Kohlhaas é descrito como uma das pessoas “mais justas e ao mesmo tempo mais terríveis de
sua época”. O contraste (marca da obra de von Kleist) aparece também em termos de classe. O
protagonista é um representante da classe burguesa, envolto por figuras de outros tan tos estratos,
que vão de Martinho Lutero ao Kaiser do Sacro Império RomanoGermânico. O livro foi traduzido para
o português: KLEIST, Heinrich von. Michael Kohlhaas. Traduzido por Marcelo Backes. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2014.
812 Uma vez eleito pelo voto popular, Hitler foi investido legalmente no cargo de chanceler do Reich em

30 de janeiro de 1933. Em 1º de fevereiro de 1933, o Reichstag foi dissolvido. Um novo Reichstag,


contando apenas com recémeleitos parlamentares nacionalsocialistas e nacionalistas alemães, “após
a inconstitucional exclusão do Poder Comunista”, aprovou uma lei de delegação, de 23 de março de
1933, ao Poder Executivo para que este pudesse baixar leis, ainda que modi ficativas da Constituição
de Weimar. Por essa lei, o Reichstag ficava dispensado de participar do processo legislativo. Em 14 de
julho de 1933, o NSDAP foi convertido em partido único. A Lei de 14 de fevereiro de 1934 extinguiu o
Reichsrat. Uma lei de 1º de agosto de 1934 eliminou os cargos de presidente do Reich
(Reichspräsident) e de chanceler do Reich (Reichskanzler). Suas atribuições concentraramse nas mãos
de Hitler, que se elevou à condição de Reichsoberhaupt (chefe supre mo do Reich). Com o juramento
de lealdade ao Führer pelas Forças Armadas alemãs, um sucedâ neo do juramento prestado ao
imperador, completavase a instauração da ditadura no país, sendo o Führerprinzip a pedra angular
jurídica do regime (WOLFF, Hans J.; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Verwaltungsrecht...cit. § 10, I, 2).
813 WOLFF, Hans J.; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Verwaltungsrecht...v. 1., cit. § 10, I, 2. Sobre o papel desse

princípio no combate à “distinção sistemática”: BYDLINSKI, Franz. Kriterien und Sinn der
Unterscheidung von Privatrecht und öffentlichem Recht...p. 322323.
814 Embora seja possível admitir que a fórmula do “legislador negativo” pode ser usada para “ʻescon derʼ

a verdadeira e inevitável tarefa interpretativa da Corte Constitucional, a qual, ao manipular o texto


constitucional in abstrato para aplicação ao caso concreto, estaria indo muito além de uma tarefa
minimalista de verificação formal de requisitos de validade da norma à luz da Carta Magna para,
então, proceder a sua pontual cassação (rectius: derrogação)” (DIAS, Gabriel Nogueira. “Legislador
negativo” na obra de Hans Kelsen: Origem, fundamento e limitações à luz da própria “Reine
Rechtslehre”. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais – RBEC, v. 4, no 15, p. 91116, jul./set. 2010.
Item 3, alínea b).
815 SCHMITT, Carl. O guardião da Constituição. Tradução de Geraldo de Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey,
2007. p. 33.
816 Sobre esse debate, cf.: MORAIS, Carlos Blanco de. As mutações constitucionais implícitas e os seus
limites jurídicos: autópsia de um acórdão controverso. In. FELLET, André; NOVELINO, Marcelo;
SARLET, Ingo Wolfgang. Constitucionalismo e democracia. Salvador: JusPodivm, 2013. p. 487526;
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Alteração e mudança da Constituição: o caso brasileiro. In.
FELLET, André; NOVELINO, Marcelo; SARLET, Ingo Wolfgang. Constitucionalismo e democracia.
Salvador: JusPodivm, 2013. p. 561577; DIMOULIS, Dimitri; LUNARDI, Soraya Gasparetto. O “legis lador
negativo” no controle judicial de constitucionalidade: Reflexões sobre a inaptidão teórica de uma
construção. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais - RBEC, v. 4, no 15, p. 161181, jul./ set. 2010;
TAVARES, André Ramos. A inconsistência do Tribunal Constitucional como “legislador negativo” em
face de técnicas avançadas de decisão da Justiça Constitucional. Revista Brasileira de Estudos
Constitucionais – RBEC, v. 4, no 15, p. 117130, jul./set. 2010; NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Sentenças
aditivas e o mito do legislador negativo. Revista de Informação Legislativa, v. 43, no 170, p. 111141,
abr./jun. 2006.
817 V. particularmente: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico do Direito Civil Con-

temporâneo...p. 51.
818 BOROWSKI, Martin. The beginnings of Germany’s Federal Constitutional Court…p. 160 e 172.
819 BOROWSKI, Martin. The beginnings of Germany’s Federal Constitutional Court…p. 159.
820 BOROWSKI, Martin. The beginnings of Germany’s Federal Constitutional Court…p. 170.
821 Art.94, LF/1949; §§ 110, Lei sobre o Tribunal Constitucional Federal, de 12 de março de 1951 (BGBl. I
S. 3546).
822 OStaatsgerichtshof für das Deutsche Reich (Tribunal de Estado do Reich Alemão), instituído pelo art.
108, WVR, exercia sua jurisdição sobre alguns tipos de conflitos constitucionais (STOLLEIS, Michael.
Judicial, Administrative, and Constitutional Review in the Weimar Republic. Ratio Juris, v. 16, no 2, p.
266280, jun. 2003. p. 276). Ele foi considerado uma espécie de “tribunal constitu cional”, ao menos
pelos critérios jurídicohistóricos e no contexto da República de Weimar. A qua lificação de um
“tribunal fracassado” explicase por sua incapacidade de desempenhar um papel de moderação
federativa e política, como veio a ser exercido pelo TCF. A polêmica envolvendo Kelsen e Schmitt
sobre o “guardião da Constituição” assentase precisamente no caráter ambíguo do Staatsgerichtshof.
Com a chegada dos nazistas ao poder, o tribunal foi extinto. Em seu lugar, bastava o Führerprinzip
(FRIESENHAHN, Ernst. Hüter der Verfassung? Zeitschrift für Rechtspolitik, ano 6, fascículo 8, p. 188193,
Aug. 1973; JASPER, Gotthard. Justiz und Politik in der Weimarer Republik. Vierteljahrshefte für
Zeitgeschichte, ano 30, fascículo 2, p. 167205, Apr. 1982).
823 BOROWSKI, Martin. The beginnings of Germany’s Federal Constitutional Court…p. 159.
824 Verfassungspatriotismus (patriotismo constitucional), como reconhece o presidente do Tribunal
Constitucional Federal alemão Andreas Voßkuhle, é um conceito desenvolvido por Jürgen Seifert,
Dolf Sternberger e Jürgen Habermas, de entre outros, embora se dê a precedência a Dolf
Sternberger. Não é um conceito imune a críticas, particularmente por retomar antigas teses ilumi-
nistas, como a da religião civil do Estado, que foi, em alguns momentos históricos, apropriada por
ditadores como Napoleão Bonaparte e outros menos dignos. Seu platonismo também permite que o
“patriotismo constitucional” seja objeto de restrições pelos que vislumbram nessas ideias um
conteúdo autoritário de fundo estatalista. Independentemente disso, o Verfassungspatriotismus
ganhou enorme popularidade na Alemanha e na Europa, a ponto de ser referido expressamente
como fundamento da unidade nacional. Outra crítica recairia sobre as impossibilidades concei tuais
em face da realidade. Persistiriam na Alemanha os elementos impeditivos da integração que o
“patriotismo constitucional” almejaria representar. Sobre o tema, consultese: GRIMM, Dieter. Identität
und Wandel das Grundgesetz 1949 und heute. Leviathan, v. 37, no 4, p. 603 616, 2009; STEIN, Tina.
Gibt es eine multikulturelle Leitkultur als Verfassungspatriotismus? Zur Integrationsdebatte in
Deutschland. Leviathan, v. 36, no 1, p. 3353, mar. 2008; BORCHARD, Michael (Ed.). Dolf Sternberger zum
100. Geburtstag. Berlin: KonradAdenauerStiftung, 2007.
825 Cf. VOSSKUHLE, Andreas. Ansprache des Präsidenten des Bundesverfassungsgerichts, Prof. Dr.

Andreas_Voßkuhle,_beim_Festakt_zum_Tag_der_Deutschen_Einheit_am_3._Oktober_2011_in_
Bonn. Disponível em: https://www.bundesregierung.de/Content/DE/Bulletin/2010-
2015/2011/10/1022praesbvgfestakt.html. Acesso em 2232017.
826 O autor desta tese morava na Alemanha quando das celebrações dos 60 anos do Tribunal

Constitucional Federal e assistiu às comemorações pela televisão. Ele sentiuse tocado pela vene-
ração que observou, por parte dos alemães, em relação a sua Constituição. Finalmente, parecia que a
força unificadora da nacionalidade, que se concentrara em um líder dotado de legitimida de
dinástica ou carismática, haviase transferido para um documento constitucional. Três anos depois, já
tendo retornado ao Brasil, escreveu, em coautoria com o min. Dias Toffoli, um artigo em homenagem
aos 200 anos da Constituição Política do Império, que se comemoravam em 25 de março de 1824,
que foi publicado na Folha de S. Paulo. Na abertura do artigo, recordam os autores que, ao menos na
literatura do século XIX e nas impressões deixadas por Machado de Assis, parece ter havido algo de
semelhante no Brasil: “O conselheiro Aires, em seu diário, no dia 25 de março, fez a seguinte
anotação: ‘Era minha ideia hoje, aniversário da Constituição, ir cum primentar o imperador...’.
Personagem fictício do último romance de Machado de Assis, intitulado Memorial de Aires, o velho
diplomata do Império, nessa discreta passagem, destacava o significa do da Constituição de 1824
para o Brasil do século 19. Passados 190 anos, a primeira Constituição brasileira, outorgada por um
imperador da dinastia portuguesa dos Bragança e casado com uma arquiduquesa do Império
austríaco, ainda hoje deixa suas marcas na vida constitucional do país. (...) Os alemães, após a
constituição democrática de 1949, desenvolveram o conceito de ‘patriotis mo constitucional’, como
superador da antiga identificação do povo e do Estado com um símbolo de poder ou com um
arquétipo de base ideológica, fornecido por grupos da classe dominante. A data de 25 de março foi
muito representativa para os brasileiros do século 19, como elegantemen te descreveu Machado de
Assis, de um sentimento incipiente de pertencimento a um Estado de Direito, com todas as suas
imperfeições. Em todo o Brasil, há dezenas de ruas nomeadas em honra do aniversário da
Constituição de 1824. Em São Paulo, a rua 25 de Março, a mais importante via de comércio popular
do país, é uma bela metáfora de que é possível, ainda que por razões inson dáveis, a reinvenção
simbólica do poder” (DIAS TOFFOLI, José Antonio; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A primeira
Constituição do Brasil. Folha de S. Paulo, 28 de março de 2014. p. A03.)
827 BVerfGE 7, 198.
828 Como já se afirmou sobre o caso Lüth, por ocasião dos 50 anos de criação do TCF: “Há um julgado
cuja importância primordial é, no entanto, fora de qualquer dúvida” (GRIMM, Dieter. Die Karriere
eines Boykottaufrufs. Wie ein Drehbuchautor Rechtsgeschichte machte. Zum 50. Geburtstag des
Bundesverfassungsgerichts. Die Ziet. 27. Sep. 2001. Disponível em:
http://www.zeit.de/2001/40/Die_Karriere_eines_Boykottaufrufs. Acesso em 222017. De modo
semelhante: “Tratase, talvez, da decisão mais conhecida e citada da jurisprudência do TCF. Nela,
foram lançadas as bases, não somente da dogmática do direito fundamental da liberdade de
expressão e seus limites, como também de uma dogmática geral (Parte Geral) dos direitos
fundamentais” (SCHWABE, Jürgen (Org.). Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional
Federal Alemão. Organização e introdução de Leonardo Martins. Tradução de Beatriz Henning,
Leonardo Martins, Mariana Bigelli de Carvalho, Tereza Maria de Castro e Vivianne Geraldes Ferreira.
Prefácio de Jan Woischnik. Montevideo: KonradAdenauerStiftung, 2005. p. 381).
829 BVerwGE 64, 274; BVerwGE 22, 286; BGHZ 65, 325; BGHZ 33, 145; BVerfG 1 BvQ 13/01; BVerfGE 137,
273; BVerfGE 128, 226; BVerfGE 124, 300; BVerfGE 120, 180; BVerfGE 117, 244; BVerfGE 115, 320;
BVerfGE 115, 51; BVerfGE 114, 339; BVerfGE 113, 63; BVerfGE 112, 332; BVerfGE 111, 147; BVerfGE 111,
54; BVerfGE 110, 226; BVerfGE 107, 275; BVerfGE 103, 89; BVerfGE 102, 347; BVerfGE 101, 361; BVerfGE
99, 185; BVerfGE 98, 365; BVerfGE 97, 391; BVerfGE 97, 169; BVerfGE 97, 125; BVerfGE 96, 375; BVerfGE
95, 267; BVerfGE 95, 220; BVerfGE 95, 28; BVerfGE 94, 1; BVerfGE 93, 352; BVerfGE 93, 266; BVerfGE 93,
213; BVerfGE 92, 140; BVerfGE 91, 186; BVerfGE 91, 125; BVerfGE 90, 255; BVerfGE 90, 241; BVerfGE 90,
27; BVerfGE 89, 214; BVerfGE 86, 1; BVerfGE 85, 248; BVerfGE 85, 1; BVerfGE 84, 192; BVerfGE 82, 272;
BVerfGE 82, 236; BVerfGE 81, 242; BVerfGE 77, 65; BVerfGE 76, 143; BVerfGE 74, 297 – 5; BVerfGE 74,
102; BVerfGE 73, 261; BVerfGE 71, 162; BVerfGE 69, 315; BVerfGE 69, 257; BVerfGE 67, 157; BVerfGE 66,
116; BVerfGE 64, 108; BVerfGE 62, 230; BVerfGE 61, 1; BVerfGE 60, 234; BVerfGE 59, 231; BVerfGE 57,
295; BVerfGE 57, 250; BVerfGE 54, 208; BVerfGE 54, 129; BVerfGE 53, 257; BVerfGE 52, 131; BVerfGE 50,
290; BVerfGE 50, 234; BVerfGE 49, 89; BVerfGE 47, 198; BVerfGE 44, 197; BVerfGE 43, 130; BVerfGE 42,
163; BVerfGE 42, 143; BVerfGE 42, 133; BVerfGE 39, 334; BVerfGE 39, 1; BVerfGE 35, 202; BVerfGE 35, 79;
BVerfGE 34, 269; BVerfGE 33, 1; BVerfGE 32, 98; BVerfGE 31, 58; BVerfGE 30, 336; BVerfGE 30, 173;
BVerfGE 30, 1; BVerfGE 28, 386; BVerfGE 28, 191; BVerfGE 28, 175; BVerfGE 28, 55; BVerfGE 28, 51;
BVerfGE 28, 36; BVerfGE 27, 71; BVerfGE 27, 18; BVerfGE 27, 1; BVerfGE 26, 186; BVerfGE 25, 256;
BVerfGE 25, 167; BVerfGE 25, 69; BVerfGE 25, 44; BVerfGE 24, 278; BVerfGE 24, 119; BVerfGE 23, 191;
BVerfGE 21, 362; BVerfGE 21, 271; BVerfGE 20, 162; BVerfGE 20, 56; BVerfGE 19, 303; BVerfGE 19, 206;
BVerfGE 18, 85; BVerfGE 17, 337; BVerfGE 17, 108; BVerfGE 13, 318; BVerfGE 12, 151; BVerfGE 12, 113;
BVerfGE 8, 71; BVerfGE 7, 377; BGHSt 23, 46 (Informações extraídas do projeto de compilação de
decisões germanófonas, promovido por pesquisadores das Universidades de Berna, Cornell,
Würzburg, Hamburgo e Hagen, sob a liderança do catedrático Axel Tschentscher, da Universidade de
Berna. Não há indicação de critérios metodológicos para a realização dessa pesquisa, seja quanto à
delimitação cronológica, seja quanto à natureza das decisões. O metadado utilizado foi BVerfGE 7,
198, que corresponde à fonte na qual o Lüth-Urteil foi publicado).
830 Nesta tese, adotarseá o critério de tradução sugerido por Leonardo Martins para uso da expres são

Urteil: o BVerfG pode exarar decisões por Beschluss ou por Urteil. Na última forma (Urteil), a decisão “é
prolatada quando houve uma audiência pública, com sustentações orais das partes”, embora em
alguns processos não exista polo passivo ou mesmo partes, “além possivelmente de vários outros
órgãos estatais ou entidades da sociedade civil convidadas a participar da audiên cia” pelo BVerfG.
Dáse, porém, que “as categorias de decisão Urteil e Beschluss assumem, na jurisdição ordinária,
contornos diversos do ora aludido”: “uma Beschluss é uma decisão judicial simplificada, que,
dependendo do caso, até dispensa fundamentação”. Por sua vez, a “decisão Urteil é a decisão judicial,
que atende a pressupostos mais rigorosos (uma terceira espécie de decisão judicial é a Verfügung – a
medida judicial)”. Conclui, então, Leonardo Martins: “Em todo caso, as traduções mais literais ‘Urteil’
por ‘sentença’ e ‘Beschluss’ por ‘acórdão’ são totalmen te incorretas, tendo em vista que, pelo menos
no sistema jurisdicional brasileiro, sentença é uma decisão judicial de primeira instância e acórdão
uma decisão judicial de segunda instância ou superior”. Segundo a orientação sugerida por Leonardo
Martins, nesta tese optouse “pela tradução como ‘decisão’ seguida da explicitação em alemão Urteil
ou Beschluss, principalmente porque não há figuras correspondentes no direito processual brasileiro”
(MARTINS, Leonardo. Introdução à jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal alemão. In.
SCHWABE, Jürgen (Org.). Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal
Alemão...p. 102).
831 CASPER, Gerhard. Die Karlsruher Republik. Zeitschrift für Rechtspolitik, ano 35, v. 5, p. 214219, Mai.
2002. p. 215216.
832 Pesquisa realizada no sítio eletrônico do STF (http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/), com uso

dos metadados “Lüth” (excluiuse um acórdão no qual o nome Lüth aparecia, mas era o patro nímico
de uma das partes) e “eficácia dos direitos fundamentais”, compreendendose o período de 1º.1.1950 a
30.3.2017. Há outro acórdão que reconheceu repercussão geral sobre os limites da liberdade de
expressão em face de um “sítio eletrônico de entidade de proteção aos animais, que denunciava a
crueldade da utilização de animais em rodeios”. Não houve decisão de mérito, por essa razão não se
computou esse acórdão, o qual, no entanto, cita o caso Lüth (STF. RE 662055 RG, rel. Min. Roberto
Barroso, j. 2782015, DJe173 392015). Em qualquer pesquisa empírica sobre dados do STF, baseada
em seu portal eletrônico, é obrigatório registrar que o tribunal não publica todas as suas decisões
colegiadas ou monocráticas, salvo no DJU. Para se ter absoluta certeza quanto ao universo das
decisões do STF, seria necessário pesquisar em todos os DJU’s, o que não se fez por extrapolar o
objeto desta tese. A afirmação de que o STF só utilizou o caso Lüth em 4 acórdãos é de ser entendida
no contexto da limitação da base de dados oferecida pelo tribunal ao público.
833 Essa influência não é um privilégio brasileiro. Ela contribuiu para disseminar o tema da eficácia dos
direitos fundamentais através de “países tão diversos quanto a África do Sul e o Canadá”, ao exemplo
de julgados da Suprema Corte sulafricana (Du Plessis v. De Klerk, 1996 (3) S.A. 850, que cita Lüth
diversas vezes, especialmente nos parágrafos 40 e 103) e da Suprema Corte canadense (RWDSU v.
Dolphii Delivery Ltd., [1986] 2 S.C.R. 573), conforme: BOMHOFF, Jaccob. Lüth’s 50th anniversary: Some
comparative observations on the German foundations of judicial balancing. German Law Journal. v. 9,
no 2, p. 121124, 2008. p. 121.
834 CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und Privatrecht: eine Zwischenbilanz. Berlin: New York: Walter

de Gruyter, 1999. p. 2733; MACCRORIE, Benedita Ferreira da Silva. A vinculação dos particulares aos
direitos fundamentais...p. 2628; ABRANTES, José João Nunes. A vinculação das entidades privadas aos
direitos fundamentais. Lisboa: Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1990. p. 41-
42; TUSHNET, Mark V. The issue of state action/horizontal effect in Comparative Constitutional law.
International Journal of Constitutional Law, v. 1, no 1, p. 7998, Jan. 2003. p. 83.
835 SCHWABE, Jürgen (Org.). Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal
Alemão...p. 381395.
836 Sobre a preeminência norteamericana no cinema, mais particularmente da cinematografia de
Hollywood: MORATO, Antonio Carlos. Limitações aos direitos autorais na obra audiovisual. Tese (Livre-
Docência). São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Departamento de Direito
Civil, 2016. p. 8.
837 Nem todos eles eram alemães. Pabst, Lang e von Sternberg eram austrohúngaros. Todos emigra ram

para os Estados Unidos. Pabst e Lang fugiram por perseguição ou por discordarem do regime
nacionalsocialista. Esses austrohúngaros trouxeram para o cinema alemão todo o refinamento
cultural de Viena, a destruída “Nova Atenas” da Europa de fins do século XIX até à primeira década do
século XX, com sua explosão de filósofos, economistas, juristas e artistas incomparáveis.
838 Adolf Hitler, na obra central do movimento nacionalsocialista, Mein Kampf, escreveu explicita mente

sobre o poder do cinema sobre as pessoas, permitindo uma rápida compreensão da men sagem
transmitida, em comparação com os demorados e laboriosos processos mentais para se entender
algo por intermédio da leitura.
839 Não somente do Estado nazista: “Há, na obra audiovisual, um intenso interesse estratégico que
orienta políticas públicas de Estados com matizes ideológicos diversos, porquanto a mensagem
transmitida pela imagem é facilmente perceptível em comparação com aquela que é difundida por
meio do texto como ocorre na obra literária” (MORATO, Antonio Carlos. Limitações aos direitos
autorais na obra audiovisual...p. 10).
840 Sobre as circunstâncias e a mobilização para se produzir Kolberg: “(...) em 1945, quando a União

Soviética já cruzava a Prússia Oriental, [Hitler e Goebbels] acreditaram que o filme Kolberg teria um
impacto maior do que uma vitória militar e, para tanto, não só destinaram 8,5 milhões de Reichmarks
como também 187 mil soldados e 4.000 marinheiros de plantão” (MORATO, Antonio Carlos.
Limitações aos direitos autorais na obra audiovisual...p. 12).
841 Antiga cidade da Pomerânia Ocidental alemã, hoje pertencente à Polônia, com o nome de Kołobrzeg.
842 Há quem defina Jud Suß como um trabalho artístico “geralmente conhecido por ter sido o mais
violento filme antisemita da era nazista” (QUINT, Peter E. A return to Lüth. Roger Williams University
Law Review, v. 16, p. 7385, 2011. p. 75).
843 Sem dúvida, o maior sucesso comercial do período nazista (QUINT, Peter E. A return to Lüth...p. 75).
844 Em alemão, Vereinigung der Verfolgten des Naziregimes – VVN.
845 QUINT, Peter E. A return to Lüth…p. 75.
846 ObersterGerichtshof für die Britische Zone – OGHBrZ ou OGH, com sede em Colônia, funcionou de
março de 1948 a setembro de 1950, com jurisdição sobre os territórios de SchleswigHolstein,
Hamburgo, Bremen, Baixa Saxônia e Renânia do NorteVestfália. A jurisprudência do OGH é ainda hoje
citada e goza de enorme respeito nos meios jurídicouniversitários alemães. Seus membros eram
reconhecidamente perseguidos, opositores ou resistentes ao regime nacionalsocialista, além de
imigrantes que retornaram à Alemanha após 1945.
847 RAAP, Maike. Veit HarlanProzess. In. FISCHER, Torben; LORENZ, Matthias N. (Eds.). Lexikon der
“Vergangenheitsbewältigung” in Deutschland: Debatten und Diskursgeschichte des National-
sozialismus nach 1945. Bielefeld: Transcript, 2007. p. 9697.
848 No original, Landgericht Hamburg.
849 RAAP, Maike. Veit HarlanProzess. In. FISCHER, Torben; LORENZ, Matthias N. (Eds.). Lexikon der
“Vergangenheitsbewältigung” in Deutschland...p. 96.
850 JUNG, Gerrit. Veit Harlan – Ein Filmemacher im Faschismus. Hamburg: Diplomica, 2009. p. 16.
851 Para uma aproximação entre Harlan e outras figuras de liderança da indústria do cinema no perí odo

nazista (incluindose Leni Riefenstahl), cf. JUNG, Gerrit. Veit Harlan...p. 123.
852 Título original, Unsterbliche Geliebte. A película foi produzida por Hans Domnick e a sueca Kristina
Söderbaum, uma famosa atriz de filmes de propagada do regime nacionalsocialista, interpretou a
personagem principal.
853 Erich Lüth, o homem que se tornou mundialmente célebre por dar nome ao caso mais importante do

TCF, combateu na Segunda Guerra Mundial no Afrika Korps, na campanha norteafricana, e depois na
Itália, onde terminou preso. Ao retornar à Alemanha, estabeleceuse em Hamburgo, a meca da mídia
alemã, assumiu a Imprensa Oficial da Hamburgo e ligouse ao SPD, tendo sido sena dor (equivalente a
membro do poder legislativo local) da Cidade Livre e Hanseática de Hamburgo. Lüth, desde 1951,
liderou campanhas de reaproximação com o Estado de Israel e o povo judeu.
854 FRENZEL, Eike Michael. Zugänge zum Verfassungsrecht: Ein Studienbuch. Tübingen: Mohr Siebeck,
2009. p. 1925 (relevantes informações sobre o caso Lüth, inseridas em uma apresentação sobre a
história do constitucionalismo alemão; com indicação de bibliografia específica).
855 “Lesão dolosa contra os bons costumes. Quem, de forma contrária aos bons costumes, causar do-

losamente danos a outrem, fica obrigado a indenizálos” (§ 826, BGB). No original:„Sittenwidrige


vorsätzliche Schädigung. Wer in einer gegen die guten Sitten verstoßenden Weise einem anderen
vorsätzlich Schaden zufügt, ist dem anderen zum Ersatz des Schadens verpflichtet” (§ 826, BGB).
856 Em alemão, gute Sitten.
857 BVerfGE 7, 198. O inteiro teor do acórdão está disponível em: http://www.bundesverfassungs
gericht.de/SharedDocs/Entscheidungen/DE/1958/01/rs19580115_1bvr040051.html. Acesso em 34-
2017.
858 KÜBLER, Friedrich. Lüth: eine sanfte Revolution (BVerfGE 7, 198 ff). Kritische Vierteljahresschrift für
Gesetzgebung und Rechtswissenschaft - KritV. v. 83, no 3/4, p. 313322, 2000. p. 313.
859 BVerfGE 7, 198.
860 Em alemão, Verfassungsbeschwerde. Embora seja mais comum no Brasil traduzirse como “recla mação

constitucional”, encontrase também “recurso constitucional”.


861 BVerfGE 7, 198.
862 Exemplificativamente: NOVAIS, Jorge Reis. As restrições aos direitos fundamentais não expressamente
autorizadas pela Constituição. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2010. p. 466470; DUQUE, Marcelo
Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais: cons trução de um
modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
Item 3.2.6, a partir da p. 231; SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito...p. 8081;
MARTINS, Leonardo. Do vínculo do Poder Judiciário aos direitos fundamentais e suas implicações
práticas. Revista da Escola Paulista da Magistratura, v. 5, no 2, p. 89127, jul./ dez. 2004. p. 92.
863 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte. Staatsrecht II. 20. ed. atual. Heidelberg: C. F. Müller,

2004. p. 4142.
864 HOFFMANNRIEM, Wolfgang. Innovationsoffenheit und Innovationsverantwortung durch Recht:
Aufgaben rechtswissenschaftlicher Innovationsforschung. Archiv des öffentlichen Rechts - AöR, v. 131,
fascíulo 2, p. 255277, abr. 2006, p. 131.
865 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional...cit. p. 517; SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI,
Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional...cit. p. 347348; TAVARES, André
Ramos. Curso de Direito Constitucional...cit. p. 349; MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 661.
866 Em alemão, Statuslehre.
867 JELLINEK, Georg. System der subjektiven öffentlichen Rechte. Freiburg: J.C.B. Mohr (Paul Siebeck), 1892.
p. 89108 (status negativus ou status libertatis); p. 109129 (status positivus ou status civitatis); p. 129-
1140 (status aktivus).
868 Em alemão, Abwehrrechte.
869 JELLINEK, Georg. System der subjektiven öffentlichen Rechte...p. 86.
870 “As
normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (art. 5º, § 1º,
CF/1988).
871 Ver a respeito: DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição…p. 136142; SILVA, Virgílio
Afonso da. A constitucionalização do Direito...p. 5758.
872 “A provision of the Bill of Rights binds a natural or a juristic person if, and to the extent that, it is applicable,

taking into account the nature of the right and the nature of any duty imposed by the right” (Art. 8.2,
Constituição da África do Sul). No sentido da eficácia imediata dos direitos funda mentais na África do
Sul: KENDE, Mark S. Constitutional rights in two worlds: South Africa and the United States. Cambridge:
Cambridge University Press, 2009. p. 48.
873 No original, jedermann.
874 BVerfGE 7, 198.
875 No original: “Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free
exercise thereof; or abridging the freedom of speech, or of the press; or the right of the people peaceably to
assemble, and to petition the Government for a redress of grievances”.
876 Íntegra do texto está disponível em: http://www.verfassungen.de/de/de0666/verfassung48i.htm.

Acesso em 2722017.
877 A íntegra do texto da WVR está disponível em:
https://de.wikisource.org/wiki/Verfassung_des_Deutschen_Reichs_(1919). Acesso em 2232017.
878 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamen tais...p.

231, nota de rodapé 869. Essa aceitação correspondia a se reconhecer a existência de uma “conexão
sistemática entre um direito fundamental e uma cláusula geral do código civil, atribuindo à parte que
lesasse um direito fundamental garantido pela constituição o dever de indenizar” (DUQUE, Marcelo
Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fun damentais...p. 231).
879 Em alemão, é conhecido como Herrenchiemsee-Entwurf. A íntegra do projeto está disponível em:
http://www.verfassungen.de/de/de49/chiemseerentwurf48.htm. Acesso em 1552017.
880 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamen tais...p.

137138.
881 Em alemão, objektive Wertordnung.
882 O papel de Dürig na construção dos fundamentos da decisão Lüth é objetivamente apreciável pelo
fato de o TCF ter citado dois de seus trabalhos, além das recorrentes menções ao papel da dignidade
humana e da ordem objetiva de valores. Sobre a influência de Dürig no caso: QUINT, Peter E. A return
to Lüth...p. 74.
883 DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner
Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung: Festschrift zum 75. Geburtstag von Hans Nawiasky.
München: Isar, 1956. p. 157190. p. 176 ss.
884 BVerfGE 7, 198.
885 KÜBLER, Friedrich. Lüth: eine sanfte Revolution (BVerfGE 7, 198 ff)...p. 313.
886 BVerfGE 7, 198.
887 DIEDERICHSEN, Uwe. Die Selbstbehauptung des Privatrechts gegenüber dem Grundgesetz.
Juristische Ausbildung – JURA. fascículo 2, p. 5764, fev. 1997. p. 57. Apreciações críticas quan to aos
riscos de excessos praticados pelo TCF vêm até mesmo de seus integrantes (atuais ou passados),
como se vê em: LIMBACH, Jutta. Das Bundesverfassungsgericht als politischer Machtfaktor. Humboldt
Forum Recht, 12, p. 114, 1996. p. 3 (com ênfase na responsabilidade política do legislador);
RENSMANN, Thilo. Wertordnung und Verfassung...p. 2542 (para quem a doutrina da "ordem objetiva
de valores" é uma miscelânea entre a teoria constitucional de Rudolf Smend, o antipositivismo tardio
de Gustav Radbruch e a doutrina social da Igreja); LEPSIUS, Oliver. „Die maßstabsetzende Gewalt.„ In.
JESTAEDT, Matthias; LEPSIUS, Oliver; MOELLERS, Christoph; SCHÖNBERGER, Christoph. Das entgrenzte
Gericht. Eine kritische Bilanz nach sechzig Jahren Bundesverfassungsgericht. Berlin: Suhrkamp, 2011.
p. 182200). Aproximadamente nesse sentido: MÜNCH, Ingo von. ¿El Tribunal Constitucional Federal
como actor político? Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, v. 6, p. 567581, 2002, p. 579:
“Sin embargo, de la jurisprudencia del TCF debe señalarse críticamente que él mismo no siempre se atiene
a su propia máxima de moderación judicial. A veces, es ostensiblemente aplicable a la actividad
jurisdiccional de los jueces de un Tribunal Constitucional el refrán francés «L’appetit viens a manger» (el
apetito viene comiendo)”.
888 BVerfGE 7, 198.
889 BVerfGE 7, 198.
890 Em alemão, Ausstrahlungswirkung.
891 Ou apenas para se referir ao precedente alemão e a seu desenvolvimento: STF. RE 201819, rel. Min.
Ellen Gracie, Rel. para o acórdão min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 11102005, DJ 27 102006, p.
64, RTJ 2092, p. 821 (com reprodução de trechos do caso Lüth); STJ. REsp 962.980/ SP, rel. Min. Luis
Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 13/03/2012, DJe 15/05/2012; TJSP. Arguição de
Inconstitucionalidade 005682894.2015.8.26.0000, rel. Des. Tristão Ribeiro, j.17/8/2016 (com referência
à obra de Alexy e ao RE 201819).
892 BVerfGE 7, 198.
893 DIEDERICHSEN, Uwe. Das Bundesverfassungsgericht als oberstes Zivilgericht...passim, esp. p. 239243;
BÖCKENFÖRDE, ErnstWolfgang. Diritto fondamentali come norme di principio. In. BÖCKENFÖRDE,
ErnstWolfgang. Stato, Costituzione, democrazia... esp. p. 244262.
894 “Liberdade de expressão, de arte e ciência. (1) Todos têm o direito de expressar e divulgar livre mente

seu pensamento por via oral, por escrito e por imagem, bem como de ser informado, sem óbices, em
fontes de acesso geral. A liberdade de imprensa e a liberdade de informar através da radiodifusão e
do cinema são asseguradas. Não será exercida censura. (2) Estes direitos são limitados por
disposições das leis gerais, regulamentos legais para a proteção da juventude e pelo direito à honra
pessoal. (3) A arte e a ciência, a pesquisa e o ensino são livres. A liberdade de en sino não dispensa da
fidelidade à Constituição” (art. 5º, LF/1949).
895 Proferida no seguinte julgamento: Palko v. Connecticut, 302 U.S. 319, 327, (1937).
896 BVerfGE 7, 198.
897 BVerfGE 7, 198.
898 BVerfGE 7, 198.
899 SCHMITT, Carl. Die Tyrannei der Werte. In. BUVE, Sergius (Ed). Säkularisation und Utopie: Ebracher
Studien für Ernst Forsthoff zum 65. Geburtstag. StuttgartBerlinKölnMainz: Kohlhammer, 1967. p. 37 -
62, com ênfase no problema moral do que ele chama de “tirania dos valores”; FORSTHOFF, Ernst. Die
Umbildung des Verfassungsgesetzes. In. BARION, Hans; FORSTHOFF, Ernst; WEBER, Werner (Eds.).
Festschrift für Carl Schmitt zum 70. Geburtstag - dargebracht von Freunden und Schülern. Berlin:
Duncker & Humblot, 1959, p. 3562.
900 KÜBLER, Friedrich. Lüth: eine sanfte Revolution (BVerfGE 7, 198 ff)...p. 314.
901 BVerfGE 7, 198.
902 BVerfGE 7, 198.
903 BVerfGE 7, 198.
904 Os restauracionistas eram nacionalistas, admitiam alguns méritos do regime nazista e reconhe ciam o

passado como parte indissociável da nação. Os reconstrucionistas formavam um grupo de


antagonistas ao regime e havia certa identidade de propósitos com as forças de ocupação franco-
britânicoamericanas. Para eles, houve participação de amplos setores da sociedade alemã duran te o
nazismo e era necessária uma reconstrução de valores, ainda que isso levasse a uma “ame-
ricanização” da Alemanha para se alcançar objetivos democráticos. As decisões do TCF nos anos 1950
mostramse pendulares em relação a essas duas visões de mundo da sociedade alemã. Não se pode
esquecer o papel de vários professores universitários em ordem a defender valores res tauracionistas
e que permaneceram sem qualquer responsabilização no pósguerra. Muitos deles até mesmo foram
prestigiados, como Theodor Maunz (QUINT, Peter E. A return to Lüth…p. 7781).
905 DIEDERICHSEN, Uwe. Die Selbstbehauptung des Privatrechts gegenüber dem Grundgesetz...p. 58 59.
Quanto ao “acerto de contas histórico” e seus efeitos sobre as cátedras universitárias alemãs:
“Abstraindose de Carl Schmitt como grande exceção, após 1945, como se sabe, praticamente
nenhum representante da ciência do direito, conforme ao sistema nazista, perdeu sua cátedra. Por
isso, na primeira discussão crítica do pósguerra, um proeminente e (sobretudo) desempos sado
professor universitário obteve uma função de substituto, enquanto seus colegas, igualmen te
envolvidos, mantiveram o poder de definição científica mesmo no processo de superação do
passado científicojurídico que, simultaneamente, era o seu próprio passado” (MAUS, Ingeborg.
Vinculação legal do Judiciário e estrutura das normas jurídicas nazistas. In. MAUS, Ingeborg (Org.). O
Judiciário como superego da sociedade. Tradução de Geraldo de Carvalho e Gercélia Batista de Oliveira
Mendes. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 42).
906 LADEUR, KarlHeinz. Kritik der Abwägung in der Grundrechtsdogmatik: Plädoyer für eine Erneuerung der

liberalen Grundrechtstheorie. Tübingen: Mohr, 2004. p. 5870; JESTAEDT, Matthias. Doctrine of


balancing: its strengths and weaknesses. In. KLATT, Matthias (Ed.). Institutionalized reason: The
jurisprudence of Robert Alexy. Oxford: Oxford University Press, 2012. p. 165 ss; SCHLINK, Bernhard.
Freiheit durch Eingriffsabwehr. Rekonstruktion der klassischen Grundrechtsfunktion... cit.; WINDISCH,
Florian. „Abwägung“: total, formal oder strukturiert? Ansätze einer Methodik rechtsgebundener
Wertzumessung. Rechtstheorie, v. 44, fascículo 1, p. 61102, 2013. p. 71 73; OLIVEIRA, Renata Camilo de.
Zur Kritik der Abwägung in der Grundrechtsdogmatik: Beitrag zu einem liberalen
Grundrechtsverständnis im demokratischen Rechtsstaat. Berlim: Duncker & Humblot, 2013. esp. p.
216231.
907 “Neste ponto, ainda que a proporcionalidade seja amplamente evocada entre diferentes tribunais
constitucionais, sua aptidão para controlar racionalmente as valorações empreendidas por toma-
dores de decisão que recorrem a princípios é questionável. Por um lado, porque a incorporação do
discurso dos princípios na prática forense brasileira costuma ser retratada como desorientada, fruto
de oportunismo ou reflexo de um modismo. Como efeito desses traços, a proporcionali dade
costuma se resumir a um topos argumentativo vazio, de apelo meramente retórico, já que raramente
tribunais como o Supremo Tribunal Federal efetivamente realizam os três exames que estão por trás
das etapas de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Por outro lado (...), há
críticas estruturais que afirmam tanto déficits de racionalidade vinculados aos exames, como
consideram delírios racionalistas as pretensões de Alexy de governar, por meio de um conhecimento
profundo sobre a estrutura da ponderação, processos de tomada de decisão jurídica que envolvem a
‘ponderação’ de princípios colidentes” (LEAL, Fernando. Seis objeções ao direito civil
constitucional...p. 138139).
908 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? 5. ed. rev. e atual. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2015. p. 47 e ss.


909 No âmbito do Direito Civil brasileiro, encontramse críticas a esses excessos em alguns auto res,
embora não necessariamente se faça referência direta à ponderação: RODRIGUES JR., Otavio Luiz.
Estatuto epistemológico do Direito Civil Contemporâneo...p. 45. ss; CASTRO JR., Torquato.
Constitucionalização do Direito Privado e mitologias da legislação: Código Civil versus Constituição.
In. SILVA, Artur Stamford da (Org.)...p. 6465; REIS, Thiago. Dogmática e incerteza normativa: crítica ao
substancialismo jurídico do direito civilconstitucional. Revista de Direito Civil Contemporâneo...cit.;
BODIN DE MORAES, Maria Celina. Do juiz bocadalei à lei segundo a boca dojuiz: Notas sobre a
aplicaçãointerpretação do Direito no início do século XXI. In. CASSETTARI, Christiano (Coord.);
CAMARGO VIANA, Rui Geraldo (Orient)...p. 68; SCHREIBER, Anderson. Direito Civil e Constituição...p. 23.
910 LADEUR, KarlHeinz. Kritik der Abwägung in der Grundrechtsdogmatik: Plädoyer für eine Erneuerung der

liberalen Grundrechtstheorie...cit. p. 5870.


911 SCHLINK, Bernhard. Freiheit durch Eingriffsabwehr. Rekonstruktion der klassischen Grundre-
chtsfunktion...cit. p. 457468.
912 BOMHOFF, Jaccob. Lüth’s 50th anniversary: Some comparative observations on the German foun-

dations of judicial balancing…p. 123.


913 OLIVEIRA, Renata Camilo de. Zur Kritik der Abwägung in der Grundrechtsdogmatik...cit. p. 221231.
914 Em alemão, Wertabwägungen. Nesse sentido: PAWLOWSKI, HansMartin. Verfassungsrechtliche
Vorgaben für die Auslegung des § 242 BGB...p. 631632 (com citação de exemplos da jurisprudên cia
alemã).
CAPÍTULO NONO

EFICÁCIA DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA


ALEMANHA E NO BRASIL: A CONSTITUIÇÃO COMO
NOVA “PARTE GERAL” DO ORDENAMENTO JURÍDICO

SUMÁRIO. § 48. Hans Carl Nipperdey: o civilista criador da dou trina da


eficácia direta dos direitos fundamentais. § 49. A teoria de Nipperdey e a
jurisprudência do BAG sobre a eficácia dos direitos fundamentais. 49.1.
Principais postulados da teoria de Nipperdey. 49.2. A doutrina da eficácia
direta na jurisprudência do BAG: ascensão e queda de um marco teórico.
§ 50. Princi pais postulados da eficácia direta no Direito Alemão. § 51. Si-
tuação atual da doutrina da eficácia direta na Alemanha. 51.1. Panorama
na doutrina alemã. 51.2. Panorama na jurisprudên cia do TCF. § 52. A
exportação da doutrina da eficácia direta dos direitos fundamentais em
relação aos particulares. § 53. Pano rama da recepção da doutrina da
eficácia direta dos direitos fundamentais nas relações privadas no Direito
brasileiro. § 54. Principais postulados da teoria da eficácia direta dos
direitos fundamentais no Brasil. 54.1. Dualidade de modelos de eficácia
direta. 54.2. Modelo fraco de eficácia direta. 54.3. Modelo forte de eficácia
direta. 54.4. Modelo sincrético (ou um não modelo).
§48. HANS CARL NIPPERDEY: O CIVILISTA CRIADOR DA DOUTRINA DA
EFICÁCIA DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A eficácia direta ou imediata dos direitos fundamentais915 deve sua origem
ao civilista alemão Hans Carl Nipperdey (1895-1968), professor da Universidade
de Colônia, onde lecionou Direito Civil, Direito do Trabalho e Direito
Comercial, além de ter assumido o decanato da Faculdade de Direito, com
interrupções, de 1933 a 1945.916 No Brasil, ele é conhecido por ser o atualizador
do Tratado de Direito Civil de Ludwig Enneccerus, Theodor Kipp e Martin
Wolff, cuja edição espanhola foi muito difundida na América Latina.917 Ele foi o
primeiro presidente do BAG,918 o equivalente alemão ao tribunal superior em
matéria trabalhista do Brasil, no período de 1954 a 1963.
Compreender a pessoa e as circunstâncias em torno de Nipperdey é
importante para dimensionar sua contribuição teórica.
Considerado um dos mais importantes juristas alemães do século XX,
Nipperdey fez parte da geração que perdeu sua juventude nos campos de batalha
da Primeira Guerra Mundial. Após ter ingressado na Faculdade de Direito da
Universidade de Heidelberg em 1913, interrompeu os estudos em 1914 para
combater no Exército alemão durante a guerra, na condição de voluntário. Em
1916, foi aprovado no Primeiro Exame de Estado e, após o Segundo Exame,
trabalhou com Heinrich Lehmann e Justus Wilhelm Hedemann em Jena. Sua
habilitação em Direito Civil e Direito Comercial ocorreu em outubro de 1920.
Ele se tornou catedrático em 1924. Tendo ingressado como docente na
Universidade de Colônia, ali permaneceu até 1963, quando se tornou professor
emérito.919
A vida de Nipperdey durante o nacional-socialismo foi controvertida. Uma
das primeiras medidas administrativas do regime foi aprovar a Lei de
Restauração do Serviço Público, de 7 de abril de 1933, que afastou milhares de
servidores alemães. Hans Kelsen havia sido eleito para o cargo de decano da
Faculdade de Direito da Universidade de Colônia em 6 de julho de 1932, com
“todos os votos e uma abstenção”.920 Ele foi atingido pela nova lei e perdeu o
decanato e o cargo de catedrático em Colônia por ser considerado politicamente
inconfiável em razão de suas tendências socialistas. Juntamente com ele
perderam o cargo juristas como Hermann Heller (1891-1933), Hermann Ulrich
Kantorowicz (1877-1940), Karl Loewenstein (1891-1973) e Hugo Sinzheimer
(1875-1945).921 Só posteriormente é que o afastamento de Kelsen foi “reforçado”
por ser judeu, além de social-democrata. Nipperdey protestou contra a demissão
de Kelsen, tendo recolhido assinaturas dos catedráticos da Faculdade de Direito
para respaldar o pedido de reconsideração ao ministro Rust. Todos firmaram o
documento, menos Carl Schmitt, a única assinatura que realmente importava.922
Essa atitude de Nipperdey na defesa de colegas perseguidos pelo regime,
como Kelsen e Haymann, pesa a seu favor no balanço histórico. Talvez a
ascendência judaica de Nipperdey (sua avó era judia, nascida em uma família de
classe média ilustrada) haja influenciado a postura corajosa naquele momento.923
Há, no entanto, o outro lado do comportamento de Nipperdey durante o
nefasto intervalo de 1933-1945. Ele participou da famigerada Academia do
Direito Alemão, já referida neste trabalho como a congregação de juristas a
serviço do regime, tendo sido presidente da segunda comissão elaboradora do
Volksgesetzbuch.924 Nesse período, ele atuou de perto com seu antigo mentor,
Justus Wilhelm Hedemann, que presidiu a Academia do Direito Alemão.
Nipperdey também escreveu textos em conformidade à ideologia
nacionalsocialista, defendendo a adaptação de matérias jurídicas (especialmente
do Direito do Trabalho) aos postulados nazistas. As obras mais comprometidas
ideologicamente são de 1934 a 1939, ao exemplo dos comentários à lei nazista
de organização do trabalho de 1934, com disposições inumanas para o emprego
de mão de obra judaica, cigana e polonesa. Nos comentários, Nipperdey e os
coautores Rolf Dietz e Alfred Hueck escrevem que a nova lei trabalhista de 1934
era crucial para o desenvolvimento das relações na Alemanha. O legislador
cuidou de desenvolver as bases e os valores fundamentais para uma Constituição
Social no país. Além de citar a obra-mestra de Adolf Hitler, eles mencionam o
papel da nova legislação para “superar a luta de classes”, a ser substituída pela
ordem de valores da “comunidade” do trabalho.925
Joachim Rückert anota que Nipperdey comportou-se como muitos juristas
brilhantes de sua geração. O certo é que, em outubro de 1946, ele foi saneado de
suas funções e submetido a um processo de desnazificação pelo Governo Militar
da Zona Britânica de Ocupação da Alemanha Ocidental.926
A reintegração de Nipperdey à cátedra universitária deu-se muito
rapidamente em maio de 1947. Ele, assim como vários outros professores (Karl
Larenz, Rudolf Huber, Georg Dahm, Wolfgang Siebert, Franz Wieacker e
Theodor Maunz), sofreu relativamente poucas consequências funcionais em
razão de seu envolvimento com instituições nacional-socialistas.927 A retomada
de suas atividades acadêmicas deu-se com êxito. Em pouco tempo, como anotou
Joachim Rückert, ele ganhou enorme reputação nos meios jurídicos, em certa
medida graças a um círculo de estudantes notáveis e uma brilhante equipe de
apoio, como Rudolf Reinhardt (após a guerra, foi reitor da Universidade de
Marburgo, ex-membro do Partido Nazista), Rolf Dietz (já era famoso
especialista em Direito do Trabalho e ex-membro do Partido Nazista), Günther
Wiese (futuro catedrático de Direito Civil e Direito do Trabalho da Universidade
de Mannheim), Gerhard Schnorr, Gustav Adolf Bulla, Wolfgang Hefermehl (na
guerra, foi primeiro-tenente da SS928 e chegou a catedrático da Universidade de
Heidelberg), Hermann Stumpf (orientando de doutorado de Nipperdey,
combateu na Segunda Guerra Mundial e tornou-se juiz do BAG), Eugen
Stahlhacke (futuro juiz do LAG de Colônia), Dirk Neumann e Franz Jürgen
Säkker.929
Graças a esse grupo, Nipperdey conseguiu, em menos de uma década,
compor uma enorme produção bibliográfica, a ponto de suscitar dúvidas sobre a
autoria individual desses trabalhos. Apesar de ele ter a “soberania espiritual” de
suas obras, muitas das que se editaram nos anos 1950-1960 foram escritas por
seus assistentes e alunos, embora ele tenha firmado a autoria de todas elas.930
A influência de Hans Carl Nipperdey no Direito do Trabalho e no Direito
Civil foi profunda. O desenvolvimento da doutrina da eficácia direta dos direitos
fundamentais pode ser considerado uma das causas para o fato de sua reputação
haver perdurado até aos dias de hoje, ao lado da atualização do Tratado de
Direito Civil e de seus escritos na área trabalhista.
§49. A TEORIA DE NIPPERDEY E A JURISPRUDÊNCIA DO BAG SOBRE A
EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

49.1. Principais postulados da teoria de Nipperdey


Não há dúvidas quanto à primazia de Hans Carl Nipperdey na formulação
teórica da eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
Foi, no entanto, na jurisprudência do BAG, tribunal que integrava como juiz, que
a doutrina ganhou contornos operacionais.
Em termos literários, a eficácia direta aparece em 1954, em capítulo de um
manual sobre direitos fundamentais, coordenado por Nipperdey, Franz Leopold
Neumann e Ulrich Scheuner.931 O capítulo tem o sugestivo título de A dignidade
humana.932 Em 1962, após o julgamento do caso Lüth, Nipperdey publicará
Direitos fundamentais e Direito Privado, em um liber amicorum para os 75 anos
de Erich Molitor.933 O livre desenvolvimento da personalidade é o trabalho que
representa o amadurecimento final da doutrina da eficácia direta sob sua
concepção.934 O texto constitui-se em um capítulo publicado no manual de
direitos fundamentais, agora em um volume organizado por Nipperdey e Karl
August Bettermann. Nota-se certa variação no pensamento de Nipperdey nesses
três textos. Mas isso não impede a formulação de um sumário sobre suas
concepções a respeito da doutrina, que, em linhas gerais, não perdeu sua
unidade.
A decomposição dos argumentos de Hans Carl Nipperdey, que levaram à
doutrina da eficácia direta, é importante para os objetivos desta tese:
(a) A dignidade humana é o fundamento do ordenamento jurídico geral, no
que se compreende também o Direito Privado. Tal deriva do art. 1o, apartado 1,
LF/1949, constituindo-se a finalidade última e o próprio sentido do ordenamento
a preservação da dignidade humana.935 Todos os particulares hão de se submeter
ao princípio de que a dignidade humana estatui um direito subjetivo
irrenunciável e oponível a todos os outros sujeitos em ordem a conservar e
observar essa mesma dignidade.936
(b) O princípio do Estado Social estabelece limites à liberdade e estabelece
a vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais. O particular,
especialmente aquele economicamente mais forte, não se deve prevalecer de sua
condição e se lhe é vedado infringir interesses gerais sem uma justificativa
aceitável. É necessário impor limites aos abusos decorrentes do exercício do
poder econômico.937
(c) A LF/1949 criou vários direitos fundamentais, cujos conteúdos são
bastante distintos. Alguns deles têm natureza programática, servindo como
parâmetros para futura concretização pelo legislador, ao exemplo do art. 6o,
apartado 5, LF/1949, que determina à futura legislação o estabelecimento de
condições iguais de “desenvolvimento físico e espiritual” e de idêntica “posição
na sociedade” para os filhos ilegítimos, em comparação com os legítimos.938
Em O livre desenvolvimento da personalidade, Hans Carl Nipperdey deixa
mais claro o pensamento sobre a diferença de conteúdo dos direitos
fundamentais: não serão todos os direitos fundamentais a vincular diretamente os
particulares. É necessária uma apreciação mais refinada do caso, embora aqueles
relacionados à dignidade humana e ao livre desenvolvimento da personalidade
devam ser entendidos como imediatamente eficazes.939 (d) Persistem na ordem
jurídica aqueles direitos fundamentais de perfil clássico, que se apresentam
como direitos de defesa contra o Estado (status negativus), direito à prestações
em face do Estado (status positivus) ou que permitem uma intervenção do
indivíduo na vida político-estatal (status civitatis).940 Dá-se, contudo, uma nova
configuração no âmbito de outros direitos fundamentais, que não só restringem a
atuação do legislador privado, mas também dos indivíduos ao celebrarem
negócios jurídicos de natureza privada. São exemplos os direitos à família, ao
exercício de atividade profissional e à propriedade.941 Eles vinculam os
particulares entre si.
(e) A eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares não
pode ter tratamento diferenciado de sua vinculação aos poderes públicos. É
equivocada a exigência da intermediação de cláusulas gerais, como a boa-fé e os
bons costumes. A doutrina da eficácia indireta baseia-se em uma concepção
oitocentista dos direitos fundamentais como “direitos de defesa”. Nesse aspecto,
o TCF está correto ao afirmar que a nova ordem constitucional não é
axiologicamente neutra, ao contrário do que pensa Forsthoff. Ela é uma ordem
objetiva de valores e, como tal, há de reconhecer uma eficácia absoluta dos
direitos fundamentais em razão da unidade do Direito. Os direitos fundamentais
não precisam de pontos de irrupção, como as cláusulas gerais, para incidirem no
Direito Privado.942
(f) Os particulares podem pretender direitos fundamentais em relação a
outros particulares de modo idêntico ao qual se dá quando demandam seus
direitos fundamentais em face do Estado.943 Haveria também a transposição para
as relações privadas de princípios do Direito Penal, como o nulla poena sine lege
ou ne bis in idem, ou de Direito Processual, como o direito de ser ouvido
(audiatur et altera pars) no âmbito da aplicação de penas privadas (sanções
privadas-administrativas ou sanções negociais-administrativas), ao exemplo das
penas condominiais ou das penas aos empregados na relação de trabalho.944

49.2. A doutrina da eficácia direta na jurisprudência do BAG: ascensão e


queda de um marco teórico
Não é possível separar o teórico Nipperdey e o magistrado Nipperdey.945
Primeiro presidente do recém-criado BAG,946 ele rapidamente se ocupou da
questão social em uma Alemanha que se reconstruía a passos rápidos, mas que
encontrava em sua vizinha Alemanha Oriental um eterno contraponto, com as
promessas de um paraíso socialista para a classe trabalhadora. A ausência de um
catálogo de direitos sociais na LF/1949, diferentemente do que ocorre na
CF/1988, tornava a realidade alemã ainda mais peculiar, se comparada com o
quadro normativo brasileiro pós-1988.
Em 15 de janeiro de 1955, o tribunal federal alemão especializado em
matéria trabalhista, o BAG, declarou a nulidade de contratos coletivos, normas
internas de empresas ou contratos individuais que criassem, de qualquer forma,
um tratamento assimétrico e discriminatório na remuneração paga a homens e
mulheres. É o caso das “cláusulas de desigualdade salarial”, cuja decisão
fundou-se no princípio da igualdade (art. 3o, LF/1949), que, ao entender do
BAG, vincularia os poderes públicos e as entidades privadas. O BAG citou
expressamente Nipperdey947 algumas vezes para afirmar que, não todos, mas um
número expressivo de direitos fundamentais não assume apenas a função de
direitos de liberdade contra o Estado. Eles também vinculam diretamente as
relações entre os indivíduos. Com base na dignidade humana, é de se reconhecer
que os direitos fundamentais não afetam apenas a relação indiví-duo-Estado,
mas também o indivíduo em face de terceiros, como membros de uma
comunidade de pessoas organizada sob os princípios da LF/1949. O julgado
refere-se expressamente a uma eficácia direta privada das disposições relativas
aos direitos fundamentais.948-949
O caso do “acordo das cláusulas de celibato”950 foi outro precedente
famoso do BAG, com enorme repercussão pública e na literatura jurídica, no
qual se reafirmou, em 1957, a doutrina da eficácia direta.951 A situação, antes do
julgamento pelo BAG já se mostrava juridicamente relevante, a ponto de se
publicarem artigos sobre a validade dessas cláusulas, que, na prática, criavam o
direito de denúncia do contrato de trabalho em face de empregados que se
casassem durante o vínculo.952
O julgamento, que ocorreu em 10 de maio de 1957, resultou na declaração
de invalidade de qualquer cláusula do contrato de trabalho que atribuísse ao
empregado, na hipótese de casar, o dever de denunciar o contrato. A ação
envolvia um hospital privado e uma enfermeira. Os elementos descritivos dos
autos eram os seguintes: i) a formação do enfermeiro pressupõe dois anos de
aprendizagem, a qual se encerra com a submissão a um exame; ii) se profissional
decidir casar, por efeito de cláusula contratual, obriga-se a pedir demissão no
mês em que se realizar a cerimônia; iii) uma enfermeira casou-se e comunicou
posteriormente o fato ao hospital, o que resultou no exercício pela empresa do
direito potestativo de denunciar o contrato de trabalho; iv) a enfermeira, sob o
argumento de que a “cláusula de celibato” era nula, processou o hospital e
requereu indenização no valor de 304 marcos alemães; v) o hospital alegou que a
“cláusula de celibato” era válida e fundava-se no § 158, no 2, BGB,953 até porque,
com o casamento, terminava a ratio da atividade de enfermeira.954
O BAG construiu a seguinte linha argumentativa: i) as “cláusulas de
celibato” são lesivas aos direitos fundamentais à proteção da família e do
casamento (art. 6o, apartado 1, LF/1949),955 à dignidade humana (art. 1o, apartado
1, LF/1949),956 ao livre desenvolvimento da personalidade (art. 2o, apartado 1,
LF/1949);957 ii) os direitos fundamentais tem originalmente a finalidade de
proteger a esfera da liberdade individual de uma interferência do Estado; iii) no
entanto, seu significado mudou e deu-se sua expansão, de modo que agora os
direitos fundamentais, embora não todos, vinculam os particulares e incidem
diretamente sobre suas relações jurídicas, como se afirmou no precedente BAGE
1, 185.958
Na fundamentação do BAG, percebe-se o efeito causado pelo texto de
Günter Dürig, publicado em 1956, intitulado Direitos fundamentais e jurisdição
civil, no qual ele formula a doutrina da eficácia indireta dos direitos
fundamentais. O tribunal ocupou-se de refutá-lo expressamente.959 Sente-se o
peso da pena de Nipperdey nessa contestação. Segundo o BAG, Dürig tentou se
“agarrar à alegada autonomia fundamental do Direito Civil” contra o sistema
constitucional dos direitos fundamentais, com isso, ele termina por ignorar o
“significado jurídico” do caráter absoluto inerente a um grande número de
direitos fundamentais. A liberdade contratual sujeita-se à ordem constitucional e
a seu sistema de valores. Não é necessário, ao contrário do que pensa Dürig, o
recurso à cláusula geral contida no § 138, BGB, para se realizar o conteúdo dos
direitos fundamentais sob análise, reforça o BAG.960
O tribunal concluiu o julgamento reafirmando, como fizera no caso das
“cláusulas de desigualdade salarial”, que há normas de ordenação da vida social,
que ultrapassam as fronteiras do Direito Constitucional e chegam ao Direito
Privado e aos negócios jurídicos celebrados em seu âmbito. Ao analisar a
decisão, Ingo von Münch entende que o BAG afirma que os contratos de Direito
Civil não podem violar o que se chamaria de uma ordre public da ordem jurídica
estatal. Conforme von Münch, o BAG entende existir um compromisso
fundamental da LF/1949 com um Estado Social, o que se apresentaria como um
reforço argumentativo à defesa da doutrina da eficácia direta nas relações
privadas.961
O BAG seguiu fiel à teoria de Nipperdey mesmo após o caso Lüth, o que
não pode ser considerado surpreendente: era a teoria de seu primeiro presidente e
de um magistrado que exerceu sua influência de modo decisivo na construção
daquele tribunal federal especializado no pós-guerra. A virada jurisprudencial
ocorreu apenas em 1984, quando o BAG, pela primeira vez, abandonou a
eficácia direta.962 Trata-se de um julgado de 20 de dezembro de 1984, no qual se
discutia a resolução de um contrato de trabalho por objeção de consciência.963
Os elementos descritivos do caso são estes: a) o reclamante, desde 1980,
era empregado de uma gráfica-editora; b) ele é um reconhecido objetor de
consciência, além de presidir a sucursal local da Associação de Vítimas do
Regime Nazista-Liga Antifascista; c) ele se recusou a realizar trabalhos
determinados por sua chefia, sob alegação de que o material continha mensagens
que incitavam ao militarismo e ao passado bélico da Alemanha; d) em razão
disso ele foi demitido. A discussão era sobre se as objeções de consciência
autorizavam ou não o direito de resolução do contrato de trabalho, quando elas
se chocavam com o poder de determinação do empregador. Na fundamentação,
o BAG recordou precedente de 1960, no qual se afirmou que um alemão não
pode ser obrigado, por força do contrato laboral, a trabalhar para uma revista que
ataca o regime democrático e o Estado de Direito, glorifica ou diminui o grau de
violência do regime nazista. O empregado tem direito a exercer objeções de
consciência em face de determinações do empregador.964
No caso de 1984, o BAG entendeu que haveria uma eficácia indireta do
direito fundamental à liberdade de consciência (art. 4o, apartado 1, LF/1949), que
se valeria da cláusula geral do § 315, I, BGB,965 para se impedir que o
empregador atribua trabalho ao empregado que lhe coloque diante de uma
ofensa irrazoável a suas convicções.
Em seus julgados, o tribunal federal para o Direito do Trabalho na
Alemanha reconhece os postulados da ordem objetiva de valores, nos termos do
que o TCF há defendido até hoje, e que essa ordem influi no Direito Privado,
fazendo-o por intermédio das cláusulas gerais. Embora muito abstratas essas
considerações, na prática, elas representam um iter hermenêutico para o BAG: o
tribunal analisa o caso primeiramente à luz do Direito Privado e depois confronta
a solução encontrada com a ordem de valores estabelecida pelos direitos
fundamentais.966
§50. PRINCIPAIS POSTULADOS DA EFICÁCIA DIRETA NO DIREITO
ALEMÃO
Apresentados os pontos essenciais do pensamento de seu criador, Hans
Carl Nipperdey, e a gênese jurisprudencial da teoria da eficácia direta na
Alemanha, deve-se agora formular uma síntese dos postulados originais dessa
doutrina.
Para esse fim, vale-se do que Marcelo Schenk Duque denomina de “pilares
fundamentais da eficácia direta”, a saber:967 (i) o “fundamento da ordem jurídica
geral” é a dignidade humana. O Direito Privado integra a ordem jurídica e
também se reconduz a esse fundamento comum; (ii) os direitos fundamentais
assumem a qualidade de meios de “expressão de valores supremos”, cuja
efetividade há de ser assegurada na vida social. Essa realização dos direitos
fundamentais decorre de seu “próprio conteúdo material”, o que demanda sua
eficácia e sua proteção de modo amplo “no interesse do particular”; (iii) os
direitos fundamentais transformaram-se em seu alcance e em seu significado.
Eles deixaram de ser meros direitos de defesa contra o Estado e agora são meios
de defesa dos particulares contra “os poderes sociais privados”; (iv) os direitos
fundamentais, a partir de sua “interpretação histórica” assumiram natureza
multidirecional ou universal. Eles não mais se limitam “às relações com o
Estado”. Essa tendência multidirecional dos direitos fundamentais (Walter
Leisner) é uma resposta aos problemas e “carências de uma sociedade moderna”;
(v) não há fundamento para que se considerem os direitos fundamentais
imediatamente vinculantes em relação aos poderes públicos e não se lhes
reconheça idêntica qualidade no âmbito das relações privadas.
Percebe-se a identidade de vários desses “pilares fundamentais da eficácia
direta” com as ideias de Hans Carl Nipperdey. Houve pouca evolução na teoria
da eficácia direta desde sua concepção inicial, podendo-se ressalvar a
originalidade e a importância de Walter Leisner, que publicou em 1960 a tese
Direitos fundamentais e Direito Privado,968 saudada por Nipperdey969 como a
“primeira monografia abrangente” sobre o tema da eficácia absoluta dos direitos
fundamentais.970
Walter Leisner reforçou e complementou a doutrina da eficácia direta do
seguinte modo: (i) não há diferenciação estrita entre as liberdades, sejam
negativas ou positivas, no âmbito dos direitos fundamentais, os quais poderão
ser diretamente dirigidos em face de terceiros ou do Estado. Ter-se-ia, desse
modo, a multidirecionalidade dos direitos fundamentais, rompendo com as
concepções históricas de matriz liberal;971 (ii) a eficácia direta operaria de modo
diferenciado a depender da causa obrigacional. Em relação a delitos civis
(responsabilidade civil), a intensidade da eficácia será sempre maior do que em
relação a negócios jurídicos, pois a intervenção na autonomia privada de ser
mais branda, dada a capacidade dos indivíduos, por meio de renúncias a direitos
fundamentais, abdicarem de sua ampla proteção em um contrato; (iii) mesmo nas
hipóteses de eficácia dos direitos fundamentais em relações extracontratuais,
espaço imune a renúncias a esses direitos, deve ocorrer uma ponderação entre os
interesses envolvidos.972
O fracasso da teoria de Nipperdey é indiscutível, mas não desvaloriza sua
contribuição para a dogmática do Direito Privado e do Direito Constitucional,
em simultâneo, no século XX. Ela teve impacto na discussão da eficácia dos
direitos fundamentais nas relações privadas, mas também em toda a ordem
jurídica nos anos seguintes. A Drittwirkung tornou-se o “grande tema” da
doutrina de Direito Público nos anos 1950 e início dos anos 1960, tendo ainda
alcançado o mérito de ingressar no âmbito teórico do Direito Privado.973
§51. SITUAÇÃO ATUAL DA DOUTRINA DA EFICÁCIA DIRETA NA
ALEMANHA

51.1. Panorama na doutrina alemã


Na Alemanha, os privatistas e os constitucionalistas contemporâneos não
se tem mais ocupado com essa teoria, ao menos em sua formulação tradicional.
Evidentemente que, com o passar das décadas, apareceram novas teorias sobre a
eficácia dos direitos fundamentais (convergência estatista e teoria dos três níveis,
respectivamente de Schwabe e Alexy, v.g.). Mas nenhuma delas pode ser
apresentada como uma renovação ou uma continuidade da teoria da eficácia
direta.
Uma das consequências da doutrina da eficácia direta nos moldes
propostos por Nipperdey é que alguns direitos fundamentais podem ser aplicados
às relações privadas sem qualquer espécie de transformação, adaptação ou
aclimatação. Veja-se o exemplo do princípio da igualdade, que, em Direito
Constitucional, possui um significado bastante diverso daquele que lhe é
atribuído no Direito Civil.974 Este exemplo pode significar o avanço sobre o
universo de críticas à teoria e não é este o objetivo desta seção. Realçou-se com
o exemplo uma tomada de posição: admitir a eficácia direta implica o
reconhecimento de diversas consequências fáticas. Ainda que alguns possam
conceder que haja uma simetria de efeitos práticos, se comparadas às doutrinas
da eficácia direta e da eficácia indireta, todavia remanescem “questões teóricas
estruturais”, cuja resolução, de um modo ou de outro, terminam por interferir no
mundo prático.975 Não há bizantinismos nessa dualidade de teorias.
Na dogmática este é o cenário mais atual.

51.2. Panorama na jurisprudência do TCF


O TCF não deu sinais nos últimos 50 anos de que mudaria o curso de sua
jurisprudência para reconhecer a eficácia direta.
Exemplos recentes confirmam essa tendência no âmbito da mais
importante corte judiciária do país:
(a) Caso do Kronprinz.976 O TCF decidiu uma reclamação constitucional
que tinha por subjacente a interpretação e a execução do testamento do herdeiro
presuntivo da Coroa alemã, o príncipe Guilherme da Prússia, filho mais velho do
falecido Kaiser Guilherme II.
Nesse processo, discutia-se a validade de cláusulas aparentemente
discriminatórias em relação aos sucessores que se casaram sob o regime
morganático, o que lhes impedia de herdar os bens e as funções de chefia da
Casa de Hohenzollern.977 Esse regime era muito comum nas monarquias dos
Estados alemães: o herdeiro do trono que casasse desigualmente (com pessoas
plebeias ou de extratos inferiores da nobreza), ou com pessoas de religião
diferente daquela oficialmente adotada pela dinastia, era excluído da linha
sucessória. A ratio desse tipo de matrimônio, que era reconhecido em leis
dinásticas ou tolerado por meio de cláusulas testamentárias, consistia na
indivisão do patrimônio, obstando-se seu fracionamento entre irmãos e irmãs. O
processo do Kronprinz sofreu reviravoltas nos tribunais ordinários, cujos
julgamentos terminaram cassados pelo TCF, que valorou uma declaração de
1943, de Guilherme da Prússia, reconhecendo que a exigência de um matrimônio
não morganático poderia ser dispensada pelo chefe da Casa de Hohenzollern, em
circunstâncias excepcionais. Guilherme da Prússia registrou, na ocasião, que o
número de mulheres de religião luterana e possuidoras de igual hierarquia
nobiliárquica a dos príncipes era extraordinariamente pequeno e vinha-se
reduzindo ano a ano, o que tornava a escolha de um cônjuge cada vez mais
limitada e difícil.
O TCF afirmou que “a interpretação e a aplicação da lei ordinária é
exclusivamente atribuída aos tribunais ordinários competentes”. Desse modo, o
limiar de uma violação do direito fundamental, que o Tribunal Constitucional
Federal precise corrigir, só é ultrapassado quando as interpretações dos tribunais
civis possam ser consideradas equívocas, por se haverem baseado em uma visão
fundamentalmente incorreta do significado de um direito fundamental, em
especial, a extensão de seu alcance e sua relevância material para um caso
jurídico específico.978
(b) Caso do Aeroporto (Caso Fraport). O segundo exemplo recai sobre os
protestos no Aeroporto de Frankfurt. Esse caso foi julgado pelo TCF em 22 de
fevereiro de 2011, em uma reclamação constitucional cujo objeto era o direito de
protestar e distribuir panfletos contra a deportação de refugiados em áreas
próximas aos guichês das companhias e dos acessos ao embarque de passageiros.
O aeroporto era administrado em regime de parceria público-privada pela
sociedade anônima Fraport, com 52% do capital em nome do poder público,
quando do ajuizamento da reclamação constitucional. A empresa proibiu o
acesso dos manifestantes ao aeroporto, daí o conflito judicial, cuja base foi a
ofensa ao direito fundamental de liberdade de reunião (art. 8o, LF/1949). No
recurso constitucional, tentou-se levantar a tese da eficácia direta dos direitos
fundamentais. O TCF entendeu que ao aeroporto se transmitia a natureza de
entidade pública, ainda que sua organização jurídica assumisse formas privadas
(equivalentes a uma empresa pública ou sociedade de economia mista) em razão
do tipo de serviço prestado. Mas, não concedeu que haveria uma vinculação
direta dos particulares aos direitos fundamentais.979
(c) Caso Stadionverbot. O Primeiro Senado do TCF, em decisão de 27 de
abril de 2018, analisou uma reclamação constitucional em face de uma “ordem
de proibição de acesso a estádio” (Stadionverbot) emitida por um clube, a qual
foi subscrita pela Federação Alemã de Futebol e por todos os times da
Bundesliga, contra um torcedor de futebol, com eficácia para todo o país. Em
2006, aos 16 anos, o reclamante assistiu a um jogo de futebol entre o Bayern de
Munique e o MSV Duisburg. Após a partida, ele se envolveu, juntamente com
outros torcedores, em uma briga da qual resultaram lesões corporais, dano à
propriedade privada e distúrbios em área pública.
Os envolvidos foram processados pelo equivalente alemão ao Ministério
Público, e contra eles o clube MSV Duisburg emitiu uma ordem de proibição de
acesso a estádio, a qual foi acatada e reproduzida pela Federação Alemã de
Futebol e pelos times da Bundesliga. O processo-crime não avançou, pois os
delitos terminaram por se classificar como contravenções. O clube, porém, sem
audiência do torcedor, manteve a ordem de proibição de acesso. A reclamação
constitucional foi inicialmente proposta para a suspensão da ordem. O
reclamante aditou o pedido e requereu que fosse declarada a ilegalidade da
ordem emanada do clube.
O TCF rejeitou o pedido do reclamante, embora haja reconhecido que
ordens dessa natureza só haveriam de ser emitidas quando baseadas em fatos
determinados. O essencial é que o tribunal reafirmou a doutrina da eficácia
indireta dos direitos fundamentais entre os particulares. O direito das entidades
privadas de sancionar seus membros não depende da existência de processo-
crime, bastando que haja elementos factuais inspiradores de preocupação
razoável com a prática de atos nocivos. A doutrina da eficácia indireta, nos
termos da fundamentação do acórdão, foi reiterada como base para a solução de
casos entre particulares nos quais haja pretensão suportada em direitos
fundamentais.980
A jurisprudência do TCF, desde o caso Lüth, tem evoluído nos últimos 10
anos e ampliado o nível de complexidade da teoria da eficácia indireta. Essa
evolução há sido detectada pela doutrina mais recente, que alude a uma
“interpretação conforme plus” ou a um maior controle dos atos de grandes
grupos.981 Até o presente momento, contudo, não se identificam abalos
estruturais na adesão do tribunal a esta teoria.
§52. A EXPORTAÇÃO DA DOUTRINA DA EFICÁCIA DIRETA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS EM RELAÇÃO AOS PARTICULARES
As ideias de Nipperdey tiveram mais notoriedade fora da Alemanha do que
em seu país de origem.
A eficácia direta possui um número significativo de adeptos em Portugal,
posto que não se possa afirmá-la como a doutrina majoritária.982 Um grupo de
doutrinadores não é classificável objetivamente em nenhum dos modelos, por
considerarem a necessidade de soluções diferenciadas.983 Há ainda um número
respeitável de autores que defendem a eficácia indireta,984 ainda que em
variantes menos intensas, como na hipótese de uma violação ao núcleo essencial
da dignidade humana, que permitiria a eficácia direta excepcionalmente.985 Em
recente pesquisa empírica sobre o uso dessas doutrinas no âmbito do Tribunal
Constitucional português entre 2006 e 2015 não se encontrou qualquer acórdão
que abordasse a questão da eficácia direta ou indireta dos direitos fundamentais
nas relações privadas. A investigação baseouse em uma série de metadados,
tendo-se chegado a 147 acórdãos (após sucessivas exclusões de julgados
repetidos ou superpostos em razão dos diferentes metadados). Concluiu-se que o
tema “não é uma preocupação enfrentada pela Corte portuguesa, nesses últimos
dez anos”, dado que apenas um acórdão (de número 582/2013) examinou o
problema à luz dos direitos fundamentais, mas sem relação com a
Drittwirkung.986
Na Espanha, encontram-se “distintas posições sobre a eficácia inter
privatos dos direitos e liberdades constitucionais”.987 O debate não terminou,
muito menos produziu uma definição sobre qual “modalidade ou tipo de
eficácia” os direitos fundamentais exercem nas relações entre os particulares,
seja quanto à “medida ou à intensidade dessa influência”.988 Quanto à
jurisprudência, persiste igual indefinição: “Não se pode falar, em termos
rigorosos, de uma doutrina do Tribunal Constitucional espanhol que defina com
clareza sua posição” sobre a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos
particulares. É certo que haverá o reconhecimento de uma maior intensidade
eficacial quando se tratar de direitos trabalhistas, mas não se tem como ignorar a
postura cautelosa do Tribunal Constitucional do Reino de Espanha quanto a
tomar partido em uma disputa que seus próprios juízes reconhecem como
“espinhosa”.989 Esse quadro permanece idêntico a uma radiografia da
jurisprudência tomada em 1997, 2007 ou 2017: o Tribunal Constitucional
prefere não definir “com clareza sua posição a respeito” da eficácia dos direitos
fundamentais nas relações privadas.990
Na Itália, Pietro Perlingieri é o grande representante da doutrina da eficácia
direta, embora seus escritos não se voltem tanto para as características dessa
teoria e sim para problemas como a unidade do ordenamento jurídico, a
interpretação do Direito Civil em conformidade à Constituição, o esmaecimento
da “grande dicotomia” e conceitos como a “despatrimonialização” e a
“funcionalização” do direito.991
A abertura do novo Código Civil e Comercial da República Argentina, na
primeira parte de seu art. 1o, dá-se com certa trivialidade, ao declarar que “os
casos regidos por este Código devem ser resolvidos segundo as leis que resultem
aplicáveis, conforme à Constituição Nacional e os tratados de direitos humanos
dos quais haja tomado parte a República”. Em complementação, o art. 2o
determina que a “lei deve ser interpretada levando-se em conta suas palavras,
suas finalidades, as leis análogas, as disposições que decorrem dos tratados sobre
direitos humanos, os princípios e os valores jurídicos, de modo coerente com
todo ordenamento”. Ricardo Luis Lorenzetti, conquanto não assuma posição
expressa sobre as teorias da eficácia direta e indireta, defende que “a norma
constitucional deixa de ser exclusivamente uma regra que unicamente continha
elementos de Direito Público para se referir também às relações entre os
particulares. Por esta razão, a Constituição é fonte de Direito Privado, não só
enquanto fonte imediata, mas enquanto contém disposições que estão dirigidas
aos cidadãos, e tem operatividade direta”. Com isso, ele aparenta filiar-se à
doutrina da eficácia direta e essa orientação, até pelo prestígio de quem dirigiu
os trabalhos de reforma do Direito Civil codificado argentino, terá inegável peso
em seu país, de modo especial junto aos civilistas.992
Na República do Peru, a eficácia direta é preponderante na jurisprudência
do Tribunal Constitucional, embora não se adote um modelo forte, tal como
imaginado por Nipperdey. O tribunal peruano, posto que afirme a eficácia
imediata, ressalva que a aplicação dos direitos fundamentais nas relações
privadas há de se dar mediante ponderação e com avaliação casuística da
intensidade eficacial.993
Finalmente, a África do Sul é o exemplo perfeito da recepção da doutrina
da eficácia direta, o que é compreensível dada a existência de norma
constitucional que prevê expressamente essa modalidade de eficácia para os
direitos fundamentais nas relações privadas.994 A jurisprudência do Tribunal
Constitucional sul-africano também já se definiu, em precedente muito
conhecido, pela eficácia direta, a despeito de um belo voto dissidente do juiz
Kriegler.995
Como se observa, a doutrina da eficácia direta tem granjeado prestígio em
alguns países. Não há como, porém, afirmar que se trata de um modelo
preeminente em termos internacionais. Até mesmo nos ordenamentos que o
adotam, há distinções muito relevantes em sua configuração, a ponto de gerar
dúvidas sobre a estrita correspondência à matriz formulada por Nipperdey e
aperfeiçoada por Leisner.
§53. PANORAMA DA RECEPÇÃO DA DOUTRINA DA EFICÁCIA DIRETA
DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS NO
DIREITO BRASILEIRO
O modelo da eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos
particulares, a despeito de haver sido criado na Alemanha nos anos 1950 e de
não ter predominado naquele país, encontrou no Brasil uma acolhida sem
comparação em qualquer outro lugar do mundo. São raríssimos os trabalhos
escritos que refutam o modelo de eficácia imediata no país.
Essas características da recepção do modelo no Brasil são compreensíveis.
A indiferença dos círculos civilísticos tradicionais em relação ao tema, o
surgimento de uma nova Constituição, após duas décadas de regime militar, a
troca de guarda geracional e a competência com que os defensores da eficácia
direta formularam as bases do modelo são causas prováveis para essa
hegemonia, alcançada em pouco menos de vinte anos. Existem, de fato,
trabalhos que procuram refutar esse modelo, apresentar alternativas ou defender
a eficácia indireta. Eles ainda são poucos e não alcançaram, salvo alguns
manuais de Direito Constitucional, o público leitor de obras propedêuticas de
Direito Civil.
Em relação às críticas à tese da eficácia direta, ainda são poucos os textos
que se ocuparam de contraditá-las. É algo natural, dado que as primeiras
refutações são relativamente recentes. Uma das primeiras críticas a essa
refutação, embora não seja a única, tenta apresentar o argumento de que a defesa
da eficácia indireta é uma forma de importar para o Brasil um debate
tipicamente alemão e com características alemãs, sem se considerar as
peculiaridades nacionais.996 Nesse caso, não deixa de ser uma afirmação
interessante quando se percebe que a eficácia direta também é resultante de um
debate alemão, com características alemãs, com a única diferença de que, no país
de origem, essa é uma teoria minoritária.997
A adoção da eficácia direta, em si, é uma opção metodológica. Há autores e
trabalhos muito sérios que defendem esse modelo no Brasil.998 Graves,
infelizmente, são os excessos cometidos em nome da eficácia direta. Essa
postura termina por sim-plificá-la de tal modo que essa doutrina passa a servir de
justificação ao sincretismo metodológico e, mais que isso, ao enfraquecimento e
à colonização do Direito Civil pelo Direito Constitucional.
Tais consequências, evidentemente não desejadas pelos defensores (sérios)
do modelo da eficácia direta, são notáveis no Brasil, especialmente pelo caráter
retórico e quase religioso que assumiu o discurso da “constitucionalização” e da
“eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas”, como se esses dois
conceitos fossem necessariamente implicados. É necessário que se estabilize o
problema em bases mais objetivas até para que os teóricos da eficácia direta
possam apresentar seus argumentos sem que se confundam com teses marcadas
pelos desvios já assinalados.
§54. PRINCIPAIS POSTULADOS DA TEORIA DA EFICÁCIA DIRETA DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL

54.1. Dualidade de modelos de eficácia direta


A doutrina da eficácia direta no Brasil não pode ser enquadrada em um
modelo com características uniformes. Mesmo com o risco de se perder algumas
nuances, po-de-se dividir o modelo em três: (i) um fraco, que concebe a eficácia
direta como ultima ratio e que deve ser empregada em caráter residual (embora
não se exija a mediação legislativa como obrigatória); (ii) um forte, que utiliza a
eficácia direta dos direitos fundamentais em caráter primário; (iii) um sincrético,
cujas características não são bem definidas e torna-se difícil de enquadrar nas
subdivisões anteriores.
O pensamento dos autores que adotam a eficácia direta, até pelo
surgimento das primeiras críticas ao modelo, tem-se alterado ou sido
reelaborado. É possível que haja alguma variação no discurso de um mesmo
autor, ao longo do tempo. Essas dificuldades de identificação das características
do modelo chegam até à jurisprudência, como se observa do RE 201819, o
acórdão por meio do qual o STF expressamente aderiu à eficácia direta.999 Na
fundamentação do julgado encontram-se elementos que o aproximam da teoria
norte-americana da state action.

54.2. Modelo fraco de eficácia direta


Após esse esclarecimento inicial, principia-se com o estudo do modelo
fraco de eficácia direta dos direitos fundamentais nas relações privadas. O
primeiro texto a cuidar sistematicamente desse modelo no Brasil é de autoria de
Ingo Wolfgang Sarlet,1000 embora existam artigos anteriormente publicados que
tenham tomado posição em favor da eficácia direta ou que tenham examinado o
tema da constitucionalização do Direito Civil. Esses trabalhos, porém, não
desenvolveram um tratamento sistemático da doutrina da eficácia direta, até
porque não era esse o foco principal da exposição.1001
O artigo de Ingo Wolfgang Sarlet possibilita descrever os principais
postulados do modelo fraco de eficácia direta:1002
(a) O fundamento constitucional da eficácia direta é o art. 5o, § 1o,
CF/1988, ao proclamar que “as normas definidoras de direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”, “o que, por si só, já bastaria para
demonstrar o tratamento diferenciado (e privilegiado) que os direitos
fundamentais reclamam no âmbito das relações entre Constituição e Direito
Privado”.1003
(b) O problema da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais
“poderá ser tido como superado” tão somente no que diz respeito ao
“reconhecimento da existência (isto é, do ‘se’)” dessa vinculação, “quando se
tratar de normas de direitos fundamentais que expressamente têm por
destinatário (ao menos também) entidades privadas e os particulares em geral”.
São exemplos dados por Ingo Wolfgang Sarlet: (i) a reparação por dano moral
ou material “no caso de abuso do direito de livre manifestação do pensamento”
(art. 5o, incisos IV e V, CF/1988); (ii) o direito à inviolabilidade domiciliar
(art. 5o, inciso XI, CF/1988); (iii) o sigilo de correspondência e de comunicações
(art. 5o, inciso XII, CF/1988); (iv) os direitos dos trabalhadores (art. 7o e ss,
CF/1988).1004
(c) Dúvidas sobre a vinculação dos particulares só terão cabimento em face
“dos direitos fundamentais que não têm por destinatário exclusivo os órgãos
estatais”. Ele ressalva, contudo, que os direitos fundamentais que se dirigem
“‘exclusivamente’ ao poder público não deixam, em certa medida, de ter uma
eficácia no âmbito das relações privadas, dado que, consoante já assinalado,
vinculam diretamente o legislador privado, da mesma forma como vinculam os
juízes e Tribunais ao aplicarem o Direito Privado à luz da Constituição e dos
direitos fundamentais”.1005
(d) Após examinar os principais postulados da eficácia indireta, ocasião na
qual ele reconhece serem legítimas as preocupações com alguns exageros na
intervenção do Direito Constitucional no Direito Privado, Ingo Wolfgang Sarlet
manifesta sua divergência em relação a Konrad Hesse, ao afirmar que o “dogma
da autonomia”, se é que ainda possa ser sustentado, não tem o poder “de afastar
uma vinculação direta dos particulares”. 1006
(e) É equivocado limitar a irradiação dos direitos fundamentais no Direito
Privado à intermediação das cláusulas gerais: “todas as normas de Direito
Privado, independentemente de sua qualidade, podem e devem ser consideradas
para efeitos de uma interpretação embasada nos direitos fundamentais”.1007
(f) Em seguida, ele passa a definir os elementos do que chama de eficácia
direta prima facie, que vem a ser o núcleo de seu modelo fraco: (i) “o princípio
da dignidade da pessoa humana, ao menos como fundamento e medida para uma
vinculação direta dos particulares, poderá assumir, portanto, relevância
autônoma apenas onde não se estiver em face de uma vinculação desde logo
expressamente prevista no texto constitucional”; (ii) há um “dever geral de
respeito” aos direitos fundamentais, que a todos vincula, seja Estado, sejam os
particulares; (iii) as violações aos direitos fundamentais “decorrem tanto do
Estado quanto – e talvez até mesmo em maior número – dos particulares (sejam,
ou não, detentores de poder social)”; (iv) as agressões de particulares “não
podem ser imputadas”, de modo genérico e exclusivo, “diretamente ao Estado”;
(v) não é admissível limitar a “vinculação dos particulares apenas às hipóteses
nas quais tenhamos uma situação de inequívoca desigualdade fática
(econômica/social)”. No Brasil, diferentemente da Alemanha, há níveis de
assimetria social muito mais fortes, o que reforça a pouca adaptabilidade do
modelo alemão preponderante a este país; (vi) as normas de direitos
fundamentais não são homogêneas e têm “diversos graus de eficácia e gerando
efeitos peculiares”, essas circunstâncias, somadas à procedência parcial de
“significativa parcela dos argumentos esgrimidos pelos defensores de uma
eficácia apenas indireta”, não impede que se reconheça “uma eficácia direta
prima facie”. Tal consideração implicaria conceder a inviabilidade “de soluções
uniformes”, porquanto “o adequado manejo da eficácia direta nas relações entre
particulares e a intensidade da vinculação destes aos direitos fundamentais deve
ser pautada de acordo com as especificitudes do caso concreto”.1008
O modelo fraco de eficácia direta, nos termos apresentados por Ingo
Wolfgang Sarlet em 2000, tem sido aperfeiçoado por ele em textos mais
recentes. Pode-se até afirmar que se deu um estreitamento na via da eficácia
direta. Em artigo de 2012, encontra-se a tese de que haveria um “relacionamento
dialético e dinâmico de influência recíproca” entre o Direito Privado e a
Constituição.1009 Ademais, o autor afirma que “não nos parece a solução mais
adequada – pelo menos em termos terminológicos – falar em um Direito Civil-
Constitucional ou de um Direito Privado com ‘status’ ou hierarquia
constitucional”.1010

54.3. Modelo forte de eficácia direta


No Brasil, o modelo forte de eficácia direta dos direitos fundamentais é
mais difícil de ser reconduzido a uma obra específica. Na verdade, ele se
apresenta difuso em vários textos de Direito Civil e de Direito Constitucional.
Em comum, está a defesa da eficácia direta sem a necessidade da intermediação
legislativa, ainda que esta não seja negada, e a vinculação à dignidade humana.
Convém, todavia, proceder a uma resenha de seus principais fundamentos:
(a) A CF/1988, diferentemente da LF/1949, prevê hipóteses de eficácia
direta em vários dispositivos, ao exemplo de todos os direitos trabalhistas, além
disso, “o sistema de direitos fundamentais inscrito na Carta brasileira está mais
caracterizado pela socialidade do que o sistema germânico”. A CF/1988, “na
linguagem adotada pelo constituinte” para as “liberdades fundamentais”,
previstas em seu art. 5o, “transmite a ideia de uma vinculação passiva
universal”.1011
(b) As desigualdades sociais brasileiras são muito maiores do que as
existentes em outros países, como Alemanha e Estados Unidos da América. Esse
quadro demandaria uma intervenção mais forte na tutela dos direitos
fundamentais no Brasil.1012
(c) A autonomia privada tem regime de proteção constitucional específica,
o que não permite a identificação absoluta das relações submetidas ao Direito
Público com aquelas nas quais há prevalência da autonomia privada. De tal
forma, não se pode considerar o modelo de eficácia direta inimigo da
“autodeterminação das pessoas”. Até porque só há autonomia privada em
sentido pleno quando a parte é aliviada dos efeitos da desigualdade e dos
embaraços materiais a seu exercício. A eficácia direta fortaleceria a autonomia
privada.1013
(d) A eficácia direta não é antidemocrática. O legislador tem um “espaço
legítimo” para que “pondere a autonomia privada com os direitos fundamentais,
estabelecendo a partir daí as normas de regência das relações privadas”. A
eficácia direta será possível quando não houver legislação ou a aplicação da lei
“revelar-se em descompasso com as normas e valores constitucionais”.1014
(e) O pós-positivismo introduziu maior elasticidade, dinamismo e riqueza
axiológica na interpretação e na aplicação do direito, o que pressupõe
flexibilização do conceito de segurança jurídica, algo que não é peculiar às
relações entre os direitos fundamentais e o Direito Privado.1015
(f) O princípio da dignidade humana é o centro da ordem jurídica, o que
determina a eficácia direta dos direitos fundamentais sobre as relações privadas.
A concretização desse princípio no Direito Privado não poderia ser condicionada
ou limitada pela vontade do legislador ou pela “interpretação das cláusulas
gerais e conceitos jurídicos indeterminados do Direito Privado”.1016
(g) A CF/1988 é progressista e suas normas, apesar de algumas exceções,
traduzem um “generoso projeto de emancipação social dos excluídos”.1017
(h) A unidade do ordenamento jurídico é uma característica do modelo,
dado que “ou bem o ordenamento é uno ou não é ordenamento”.1018 A
Constituição tem o “papel unificador do sistema, permitindo a harmonização da
pluralidade de fontes normativas”.1019 Em razão dessa “visão unitária do
ordenamento”, é equívoco admitir a influência recíproca de normas
constitucionais e normas de direito ordinário. A própria ideia de “civilização do
Direito Constitucional” não é aceitável.1020 Rigorosamente, “os princípios e
valores constitucionais devem se estender a todas as normas do ordenamento,
sob pena de se admitir a concepção de um ‘mondo in frammenti’, logicamente
incompatível com a idéia de sistema unitário”.1021
(i) É equivocada a corrente teórica que defende o papel de “decodificador”
da norma constitucional pelo direito ordinário. A norma constitucional deve
reger a interpretação da norma de direito ordinário e não o inverso.1022
(j) O conceito de microssistema, ainda que se lhe atribua sentido
meramente didático, deve ser rejeitado: “Seu emprego, desta feita, demonstra-se
perigoso, por admitir uma visão fragmentada do sistema”.1023
(k) A ponderação não deve ficar limitada à colisão de direitos, a saber, “a
casos patológicos de restrição à liberdade individual”. O Direito Civil italiano
consente, desde os anos 1970, que “a liberdade individual há de ser permanente
e intrinsecamente ponderada, como outros princípios fundamentais que se
agregam às liberdades”.1024
(l) A diferenciação de eficácias (direta ou indireta) na vinculação aos
particulares aos direitos fundamentais apresenta-se “talvez como um falso
problema”.1025

54.4. Modelo sincrético (ou um não modelo)


Quanto ao modelo sincrético, até por sua característica de indiferenciação
objetiva, é difícil identificar traços que o definam com precisão. Em verdade,
salvo importantes exceções, é muito comum haver adaptações argumentativas
quando se submetem alguns dos postulados da eficácia direta a testes de estresse.
Temas como a desigualdade material das partes, o papel da autonomia privada e
os graus de intervenção diferenciada dos direitos fundamentais são objeto de
utilização dúctil quando alguns dos argumentos coerentes da eficácia direta
conduzem a resultados insustentáveis.
O não modelo ou modelo sincrético da eficácia direta caracteriza-se pela
conjugação de referências ao neoconstitucionalismo, ao pós-positivismo, à teoria
dos princípios, ao ponderacionismo e ao fim da distinção sistemática com
postulados da doutrina da eficácia direta forte (não mediação legislativa,
aplicação imediata dos direitos fundamentais às relações privadas e
reconhecimento dos “poderes privados”). Essa pluralidade de elementos torna
incoerente esse modelo sincrético, embora seja cada vez mais ordinário
encontrá-lo em textos sobre os mais diferentes temas do Direito Civil. Como
modelo operacional, é inservível e sua menção dá-se tão somente com o objetivo
de não ignorar esse subproduto – indesejado – da recepção da doutrina da
eficácia direta forte no Brasil.

915 Em alemão: Unmittelbare Drittwirkung der Grundrechte.


916 O título do capítulo é uma menção ao livro de Thorsten Hollstein (Die Verfassung als “Allgemeiner Teil”:

Privatrechtsmethode und Privatrechtskonzeption bei Hans Carl Nipperdey (1895–1968). Tübingen:


Mohr Siebeck, 2007), traduzível por “A Constituição como Parte Geral”.
917 A obra compõese de vários tomos. Fezse a referência apenas do primeiro: ENNECCERUS, Ludwig;
KIPP, Theodor; WOLFF, Martin. Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts: Allgemeiner Teil des Bürgerlichen
Rechts. 15 ed. revista por Hans Carl Nipperdey. Tübingen: Mohr Siebeck, 1959. v. 1. Em espanhol:
ENNECCERUS, Ludwig; KIPP, Theodor; WOLFF, Martin.Tratado de Derecho Civil. 15. rev. por Hans Carl
Nipperdey. Trad. de la 39. ed. alemana. 3. ed. Barcelona: Bosch, 1981. t. 1., vol. 1.
918 Em alemão, Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho).
919 RÜCKERT, Joachim. Hans Carl Nipperdey. In. HISTORISCHEN KOMMISSION BEI DER BAYERISCHEN
AKADEMIE DER WISSENSCHAFTEN (Ed.). Neue Deutsche Biographie (NDB). Berlin: Duncker & Humblot,
1999. v. 19. p. 280; PREIS, Ulrich. Hans Carl Nipperdey – mythische Leitfigur des herr schenden
deutschen Arbeitsrechts. Arbeit und Recht, v. 64, nº 5, p. G9G12, maio, 2016. p. G9.
920
“A edição matinal do Stadt-Anzeiger für Köln und Umgebung de 14.4.1933, no 191, trazia, no verso do
‘Primeiro Caderno’, a manchete ‘Professores universitários demitidos. Ordens do ministro do Culto
prussiano, Rust’. O primeiro subtítulo dizia: ‘Em Colônia o professor Kelsen’” (KELSEN, Hans.
Autobiografia de Hans Kelsen...p. 95, nota de rodapé 162, elaborada por Matthias Jestaedt).
921 KELSEN, Hans. Autobiografia de Hans Kelsen...p. 95 e nota de rodapé 161, elaborada por Matthias
Jestaedt).
922 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; DIAS TOFFOLI, José Antonio. Estudo Introdutório à Autobiografia de

Hans Kelsen. In. KELSEN, Hans. Autobiografia de Hans Kelsen...p. XLIIIXLIV.


923 HOLLSTEIN, Thorsten. Die Verfassung als „Allgemeiner Teil“...p. 13 e 17.
924 RÜCKERT, Joachim. Hans Carl Nipperdey...p. 280281; PREIS, Ulrich. Hans Carl Nipperdey – mythis che
Leitfigur des herrschenden deutschen Arbeitsrechts...p. G9.
925 As citações são do prefácio (p. V) e da p. 30, nota marginal 35, da primeira edição, de 1934, do livro
Gesetz zur Ordnung der nationalen Arbeit. Kommentar, publicado em Munique e Berlim. A obra
consultada para obtêlas foi: WEIßHUHN, Christian. Alfred Hueck, 1889-1975. Sein Leben, sein Wirken,
seine Zeit. Frankfurt am Main: Peter Lang, 2009. p. 146. Sobre a legislação do tra balho na era nazista
e suas trágicas consequências para as populações das zonas ocupadas e os trabalhadores escravos
(especialmente, judeus, ciganos e poloneses), com citações de trabalhos de Nipperdey, de 1942:
RÜTHERS, Bernd. Recht als Waffe des Unrechts Juristische Instrumente im Dienst des NS-
Rassenwahns. Neue Juristische Wochenschrift – NJW, v. 45, p. 28252836, 1988. p. 2830 (nota de rodapé
65) e p. 2835 (nota de rodapé 149).
926 RÜCKERT, Joachim. Hans Carl Nipperdey...p. 280.
927 MAUS, Ingeborg. Vinculação legal do Judiciário e estrutura das normas jurídicas nazistas. In. MAUS,
Ingeborg (Org.). O Judiciário como superego da sociedade...p. 42.
928 Ele foi um SS Obersturmführer, que correspondia, no painel de equivalência às patentes das Forças

Armadas alemãs, a primeirotenente do Exército. Em 2015, a Universidade de Salzburg cassou o título


de doutor honoris causa que lhe havia sido concedido em razão de sua contribuição ativa para a
ideologia nazista.
929 RÜCKERT, Joachim. Hans Carl Nipperdey...p. 281.
930 ADOMEIT, Klaus. Hans Carl Nipperdey als Anreger für eine Neubegründung des juristischen Denkens.

In. GRUNDMANN, Stefan; RIESENHUBER, Karl (Orgs.) Deutschsprachige Zivilrechtslehrer des 20.
Jahrhunderts in Berichten ihrer Schüler. Eine Ideengeschichte in Einzeldarstellungen. Berlin: De
Gruyter, 2007, v. 1. p. 148165, especialmente cit. p. 163.
931 NIPPERDEY, Hans Carl. Die Würde des Menschen. In. NEUMANN, Franz Leopold; NIPPERDEY, Hans
Carl; SCHEUNER, Ulrich (Orgs.). Die Grundrechte. Handbuch der Theorie und Praxis der Grundrechte.
Berlin: Duncler & Humblot, 1954. v. 2. p. l50.
932 Aqui cabe um parêntesis: a organização do volume 2 de Direitos fundamentais. Manual da teoria e

prática dos direitos fundamentais com Franz Leopold Neumann e Ulrich Scheuner diz muito sobre a
habilidade de Nipperdey. Franz Leopold Neumann, que faleceria no ano da publicação do livro
(1954) em acidente de automóvel na Suíça, era um jurista alemão, que se exilou nos Estados Unidos,
após ter fugido antes de ser preso pelos nazistas. Ele se tornou mundialmente conheci do pelo livro
Estrutura e prática do nacional-socialismo (1942), considerado o primeiro trabalho acadêmico a
dissecar metodologicamente o pensamento nazista. Por sua vez, Ulrich Scheuner (19031981), aluno
de Rudolf Smend e Heinrich Trieppel, os grandes teóricos liberais de Direito do Estado da República
de Weimar, abandonou a teoria liberal e tornouse um expoente da teoria jurídica nazista,
combatendo o individualismo e defendendo a ideologia racial. Ter ao lado um representante da
resistência nazista e um teórico do NacionalSocialismo diz muito sobre as habi lidades de Nipperdey,
especialmente em um livro que tem por objeto parcial a dignidade humana.
933 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.). Festschrift für
Erich Molitor zum 75. Geburtstag: 3. Oktober 1961. München, Berlin: Beck, 1962. p. 1733.
934 NIPPERDEY, Hans Carl. Freie Entfaltung der Persönlichkeit. In. BETTERMANN, Karl August; NIPPERDEY,

Hans Carl (Orgs.). Die Grundrechte. Handbuch der Theorie und Praxis der Grundrechte. Berlin: Duncler
& Humblot, 1962. v. IV, p. 741825.
935 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item AII, p. 17-

18.
936 NIPPERDEY, Hans Carl. Die Würde des Menschen. In. NEUMANN, Franz Leopold; NIPPERDEY, Hans

Carl; SCHEUNER, Ulrich (Orgs.). Die Grundrechte...v. 2. p. 35.


937 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item AIV, p. 19-

20.
938 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item BII.
939 NIPPERDEY, Hans Carl. Freie Entfaltung der Persönlichkeit. In. BETTERMANN, Karl August; NIPPERDEY,

Hans Carl (Orgs.). Die Grundrechte...v. 4. p. 747748.


940 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item BIII, esp.
p. 23.
941 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item BIV, p. 23.
942 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)…item BVI, p. 24-

26.
943 NIPPERDEY, Hans Carl. Die Würde des Menschen. In. NEUMANN, Franz Leopold; NIPPERDEY, Hans
Carl; SCHEUNER, Ulrich (Orgs.). Die Grundrechte...v. 2. p. 18 e 20.
944 NIPPERDEY, Hans Carl. Grundrechte und Privatrecht. In. NIPPERDEY, Hans Carl. (Org.)...BIX, p. 2822,

esp. p. 28.
945 Nesse sentido: GARCÍA TORRES, Jesús; JIMÉNEZBLANCO, Antonio. Derechos fundamentales y
relaciones entre particulares...p. 21.
946 Ele integrou o tribunal de 1954 até 1963 (RÜCKERT, Joachim. Hans Carl Nipperdey...p. 281).
947 NIPPERDEY, Hans Carl. Die Würde des Menschen. In. NEUMANN, Franz Leopold; NIPPERDEY, Hans
Carl; SCHEUNER, Ulrich (Orgs.). Die Grundrechte...v. 2. p. 243 ss.
948 No original, unmittelbare privatrechtliche Wirkung der Grundrechte Bestimmungen.
949 BAGE 1, 185, publicado em NJW 1955, p. 606608.
950 Em alemão, Vereinbarung von Zölibatsklauseln.
951 BAGE 4, 274, publicado em DÖV 1958, 780.
952
KUNZE, Otto. Die „Zölibatsklausel“ im Einzelarbeitsvertrag. Arbeit und Recht, v. 1, no 3, p. 7678, mar.
1953. esp. p. 77(citando Nipperdey e defendendo a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos
privados); MOLITOR, Erich. Die Unzulässigkeit von Zölibatsklauseln in Einzelarbeitsverträgen
(Rechtsgutachten). Arbeit und Recht, v. 1, no 12, p. 353359, dez. 1953. esp. p. 358359.
953 Negócio jurídico subordinado a condição resolutiva: o negócio deixa de ser eficaz quando do cum-
primento da condição (§ 158, apartado 2, BGB).
954 BAGE 4, 274, publicado em DÖV 1958, 780.
955
“O casamento e a família estão sob proteção especial do Estado” (art. 6o, apartado 1, LF/1949).
956 “A dignidade da pessoa humana é inviolável. Respeitála e protegêla é dever de todo o poder público”

(art. 1º, apartado 1, LF/1949).


957 “Todos têm o direito ao livre desenvolvimento da personalidade, desde que não violem os direitos de

outrem e não atentem contra a ordem constitucional ou os costumes” (art. 2º, apartado 1, LF/1949).
958 Ver também BAGE 4, 274, publicado em DÖV 1958, 780.
959 A referência é esta: DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor. Vom
Bonner Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung. Festschrift zum 75. Geburstag von Hans
Nawiasky. München: Isar, 1956. p. 157190.
960 BAGE 4, 274, publicado em DÖV 1958, 780.
961 MÜNCH, Ingo von. Die Drittwirkung von Grundrechten in Deutschland. In. MÜNCH, Ingo von;
SALVADOR CODERCH, Pablo; FERRER I RIBA, Josep. (Orgs.). Zur Drittwirkung der Grundrechte...p. 14.
962 HOLLSTEIN, Thorsten. Die Verfassung als „Allgemeiner Teil“: ...cit. p. 198.
963 BAGE 47, 363, publicado em NJW 1986, 85.
964 BAGE 47, 363, publicado em NJW 1986, 85.
“Se a prestação deve ser determinada por uma das partes contratuais, em dúvida, devese enten der
965
que a determinação devese adotar de acordo com critérios de equidade” (§ 315, I, BGB).
966 STARCK, Christian. Derechos fundamentales y Derecho Privado. Tradução de María J. Roca. Revista
Española de Derecho Constitucional, ano 22, no 66, p. 6590, 2002. p. 6869.
967 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais …p.

106109, esp. p. 108 e 109.


968 LEISNER, Walter. Grundrechte und Privatrecht. München: Beck, 1960.
969 NIPPERDEY, Hans Carl. Freie Entfaltung der Persönlichkeit. In. BETTERMANN, Karl August; NIPPERDEY,

Hans Carl (Orgs.). Die Grundrechte...v. 4. cit., nota de rodapé 28.


970 A expressão “eficácia absoluta” tem dado margem para desacordos semânticos e merece es-
clarecimento, como sugere Virgílio Afonso da Silva (A constitucionalização do Direito...p. 8789, esp. cit.
p. 89): “O que Nipperdey, em suma, quer dizer com efeitos absolutos nada mais é do que o que aqui e
em boa parte da doutrina se tem chamado de aplicabilidade direta dos direi tos fundamentais às
relações privadas”. A expressão alemã é absolute Wirkung (eficácia absolu ta) de determinados
direitos fundamentais, cit. em: NIPPERDEY, Hans Carl. Freie Entfaltung der Persönlichkeit. In.
BETTERMANN, Karl August; NIPPERDEY, Hans Carl (Orgs.). Die Grundrechte...v. 4. p. 747. ss; NIPPERDEY,
Hans Carl. Allgemeiner Teil des Bürgerlichen Rechts. Allgemeine Lehren, Personen, Rechtsobjekte. In.
ENNECCERUS, Ludwig; KIPP, Theodor; WOLFF, Martin. Lehrbuch des Bürgerlichen Rechts. 15. ed. atual.
Tübingen: Mohr, 1959. t. 1. p. 94.
971 LEISNER, Walter. Grundrechte und Privatrecht...p. 312332.
972 LEISNER, Walter. Grundrechte und Privatrecht...p. 379396.
973 HOLLSTEIN, Thorsten. Die Verfassung als „Allgemeiner Teil“...p. 198.
974 STARCK, Christian. Derechos fundamentales y Derecho Privado...p. 1617.
975 Neste sentido: ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de

1976...p. 246247.
976 Kronprinz é um título tradicional alemão para o herdeiro aparente do trono real, imperial ou ducal.
Literalmente, significa “príncipe da Coroa”. No Brasil, equivale ao título de príncipe do GrãoPará,
assim como no Reino Unido ao título de príncipe de Gales.
977 A Casa de Hohenzollern é uma antiga família da nobreza europeia, de origem suábia, cujo primeiro

chefe foi Frederico, burgrave de Nuremberga, no século XII. Posteriormente, os Hohenzollern assu-
miram o Eleitorado de Brandemburgo, no Sacro Império RomanoGermânico. Em 1701, converteu se
no Reino da Prússia. Após sucessivas gerações e diversas guerras, a Prússia expandiuse e liderou a
formação do Império alemão em 1871. Os reis da Prússia acumularam o título de imperadores
alemães até 1918, quando a dinastia caiu com a abdicação de Guilherme II. A expressão “casamento
morganático” (matrimonĭum ad morganaticam) caracteriza o matrimônio no qual o marido garantia à
mulher e sua descendência a “morganática”, uma dádiva oferecida na manhã do casamento (daí a
origem alemã, Morgengabe, dádiva da manhã) em contrapartida à renúncia aos direitos sucessórios e
aos títulos nobiliárquicos do cônjuge.
978 1BvR 909/08, publicado em NJW-RR 2010, 156.
979 1BvR 699/06, publicado em NJW 2011, 1201. 1BvR 699/06, publicado em NJW 2011, 1201. Sobre o
caso, afirmando a tese da manutenção do modelo da eficácia indireta: MICHAEL, Lothar; MORLOK,
Martin. Grundrechte. 6. ed. BadenBaden: Nomos, 2017. p. 240241; FUCHS, MarieChristine. O efei to
irradiante dos direitos fundamentais e a autonomia do Direito Privado: a “decisão Lüth” e suas
consequências. Tradução por Patrícia Cândido Alves Ferreira. Revisão da tradução por Otavio Luiz
Rodrigues Jr. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 16, ano 5, p. 221232, jul.set. 2018. p. 230231.
980 980 BVerfG, 11.04.2018 1 BvR 3080/09.
981 No original: Verfassungskonforme Auslegung plus, extraído de: KULICK, Andreas. "Drittwirkung" als
verfassungskonforme Auslegung – Zur neuen Rechtsprechung des BVerfG. Neue Juristische
Wochenschrift -NJW, fascículo 31, p. 22362241, 2016. p. 20402041.
982 Apenas exemplificativamente: PRATA, Ana. A tutela constitucional da autonomia privada. Coimbra:
Almedina, 1982. p. 137 e ss.; ABRANTES, José João Nunes. A vinculação das entidades privadas aos
direitos fundamentais...cit. p. 94108; MACCRORIE, Benedita Ferreira da Silva. A vinculação dos
particulares aos direitos fundamentais...p. 8694, embora seguindo um modelo fraco de efi cácia direta.
983 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina,

1997. p. 12881289.
984 MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria Geral do Direito Civil...p. 73 79; MENEZES CORDEIRO, António.
Tratado de Direito Civil português, v. 1, t. 1. p. 374381 (com admissão excepcional da eficácia direta, v.
p. 381). Jorge Reis Novais (Direitos fundamentais: Trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra Editora,
2006, p. 69116, esp. p. 6976) defende a ideia dos deveres de prote ção, ao tempo em que registra a
paradoxal situação brasileira: a CF/1988, em vez da Constituição portuguesa, é praticamente
silenciosa sobre o tema, mas a doutrina do Brasil é majoritariamente adepta da eficácia direta.
985 MOTA PINTO, Paulo. A influência dos direitos fundamentais sobre o Direito Privado português. In.

PINTO MONTEIRO, António; NEUNER, Jörg; SARLET, Ingo Wolfgang (Orgs.). Direitos fundamentais e
Direito Privado: uma perspectiva de direito comparado. Coimbra: Almedina, 2007. esp. p. 156157.
986 OLIVEIRA JUNIOR, Francisco Dias de; PEARCE, Gabrielle Apoliano Gomes Albuquerque. A expe riência

portuguesa e o problema da eficácia dos direitos fundamentais entre os particulares na doutrina e na


jurisprudência. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 14, p. 131158, jan./mar. 2018. p. 151153.
987 Representando a doutrina da eficácia indireta: AGUILAREAL, Jesús Alfaro. Autonomía privada y

derechos fundamentales. Anuario de Derecho Civil, t. 46, p. 57122, 1993.


988 BILBAO UBILLOS, Juan María. La eficácia frente a terceiros de los derechos fundamentales en el
ordinamiento español. In. PINTO MONTEIRO, António; NEUNER, Jörg; SARLET, Ingo Wolfgang (Orgs.).
Direitos fundamentais e Direito Privado: uma perspectiva de Direito Comparado. Coimbra: Almedina,
2007. esp. p. 182. ss.
989 BILBAO UBILLOS, Juan María. La eficacia frente a terceros de los derechos fundamentales en el

ordinamiento español. In. PINTO MONTEIRO, António; NEUNER, Jörg; SARLET, Ingo (Orgs.)...p. 192;
ESTRADA, Alexei Julio. Los tribunales constitucionales y la eficacia entre particulares de los derechos
fundamentales. In. CARBONELL, Miguel (Ed.). Teoría del neoconstitucionalismo: Ensayos escogidos.
Madrid: Trotta, 2007. p. 133134.
990 BILBAO UBILLOS, Juan María. La consolidación dogmática y jurisprudencial de la Drittwirkung: Una
visión de conjunto. Anuario de la Facultad de Derecho de la Universidad Autónoma de Madrid –
AFDUAM, v. 21, p. 4374, 2017. p. 44 e 47; BILBAO UBILLOS, Juan María. La eficacia de los derechos
fundamentales frente a particulares. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 1997. p.
852.
991 PERLINGIERI, Pietro. A doutrina do Direito Civil na legalidade constitucional. In. TEPEDINO, Gustavo
(Org.). Direito Civil contemporâneo: Novos problemas à luz da legalidade constitucional. São Paulo:
Atlas, 2008. p. 111 (sem tomar partido expressamente em relação às teorias sobre a eficácia dos
direitos fundamentais); PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil
Constitucional. Tradução de Maria Cristina de Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 5 (Constituição
como documento fundante e unificador do ordenamento jurídico).
992 LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do Direito Privado...p. 254255.
993 Tais conclusões extraemse de acórdãos do Tribunal Constitucional da República do Peru: Exp. Nº 067-

93AA/TC; Caso Pacheco Chávez, Exp. 7132000AA/TC, de 2000; caso Calderón Díaz, Exp. 1012000-
AA/TC, de 2001); caso Noriega Gárate, Exp. 9022000AA/TC, de 2001; caso Cárdenas Torres, Exp. 1401-
2001AA/TC, de 2002; caso Quispe Huamán, Exp. 16122003AA/TC, de 2003. Os arestos peruanos estão
disponíveis em: "http://www.tc.gob.pe/tc/public/. Acesso em 20 42017. Na doutrina peruana, em
idêntico sentido: MENDOZA ESCALANTE, Mijail. La eficacia de los derechos fundamentales en las
relaciones entre particulares. Pensamiento Constitucional, v. 11, nº 11, p. 219271, 2005. p. 264270.
994
Art. 8º, 2, c/c art. 9o , 4, Constituição da África do Sul de 1996.
995 Tratase do caso Du Plessis v. De Klerk, 1996 (3) SA 850, 91415. Sobre a África do Sul, cf. GARDBAUM,

Stephen. The “horizontal effect” of constitutional rights. Michigan Law Review, v. 102, no 3, p. 387459,
dec. 2003. esp. p. 409.
996 “Olhando para a Alemanha, para a experiência alemã, dando as costas para a experiência brasi leira,
tem cada vez mais, se afirmado que não há que se cogitar de aplicação imediata e direta, porque a
normaprincípio envolveria a mediação da normaregra, ou do legislador infraconsti tucional. Por isso
postulam essa interposição necessária do Estado legislador ou do Estado juiz” (LÔBO, Paulo.
Metodologia do Direito Civil Constitucional. In. RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski; SOUZA, Eduardo
Nunes de; BEZERRA DE MENEZES, Joyceane; EHRHARDT JÚNIOR, Marcos (Orgs.). Direito Civil
constitucional: A ressignificação da função dos institutos fundamentais do Direito Civil
contemporâneo e suas consequências. Florianópolis: Conceito, 2014. p. 23).
997 Para um quadro completo desses trabalhos, vide a nota de rodapé no § 59.
998 São exemplos da seriedade com que o tema é tratado no Brasil, apresentados em ordem cro nológica

decrescente, enumerandose apenas obras que não somente descrevem os diferentes modelos mas
tomam partido em favor da eficácia direta dos direitos fundamentais em relação aos particulares:
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos
fundamentais na perspectiva constitucional. 12. ed., rev., atual. e ampl, 2. tiragem. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2015 (a mais completa obra sobre o tema em língua portuguesa com ênfase
na doutrina alemã, a qual o autor tem acesso diretamente); FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: sentidos,
transformações e fim...cit. (com uma síntese teórica dos principais postulados do Direito Civil-
Constitucional); SOMBRA, Thiago Luís Santos. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações
privadas...cit.; SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...cit.; SARLET, Ingo
Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e Direito Privado. 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006 (coletânea de textos, alguns dos quais não adotam a teoria da eficácia
direta); FACCHINI NETO, Eugênio. Reflexões históricoevolutivas sobre a constitucionali zação do
direito privado. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e Direito Privado.
2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006; TEPEDINO, Gustavo. Premissas
metodológicas para a constitucionalização do Direito Civil. Revista de Direito do Estado: RDE, no 2, p.
3753, abr./jun., 2006; TEPEDINO, Gustavo. A incorporação dos direitos fundamen tais pelo
ordenamento brasileiro: sua eficácia nas relações jurídicas privadas? Revista Jurídica, São Paulo, v. 54,
no 341, p. 1126, mar. 2006; MENDES, Gilmar Ferreira. A eficácia dos direitos funda mentais nas
relações privadas: exclusão de sócio da União Brasileira de Compositores...cit.; VALE, André Rufino do.
Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas...cit; STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos
particulares a direitos fundamentais...cit. FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do Direito Civil...2000...cit;
MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de Direito
Constitucional. 2. ed., rev. e ampl. São Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional: Celso
Bastos Editor, 1999; LÔBO, Paulo Luiz Neto. Constitucionalização do Direito Civil...1999; BODIN DE
MORAES TEPEDINO, Maria Celina. A caminho de um direito civil constitucional. Revista de Direito Civil,
Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 17, no 65, p. 2132, jul./ set., 1993 (trabalho pioneiro no Brasil sobre
Direito CivilConstitucional, cuja primeira publicação, todavia, ocorreu na Revista Estado, Direito e
Sociedade, v. 1, 1991).
999 STF. RE 201819, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j.

11/10/2005, DJ 27102006, p. 64, RTJ 2092/821.


1000 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no

da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2000. p. 107163.
1001 “O novo peso dado ao fenômeno importa em rejeitar a idéia de invasão da esfera pública sobre a
privada, para admitir, ao revés, a estrutural transformação do conceito de direito civil, ampla o
suficiente para abrigar, na tutela das atividades e dos interesses da pessoa humana, técnicas e ins-
trumentos tradicionalmente próprios do direito público como, por exemplo, a aplicação direta das
normas constitucionais nas relações jurídicas de caráter privado” (BODIN DE MORAES TEPEDINO,
Maria Celina. A caminho de um direito civil constitucional...p. 2324) – a autora faz expressa refe-
rência, na nota de rodapé 27, ao estudo de Pietro Perlingieri, de 1985, que “sustenta a aplicação
direta da Constituição nas relações de direito privado, na Itália”.
1002 Esse modelo foi expressamente adotado, em Portugal, por esta autora: “Por tudo isto, parecenos

que será de reconhecer uma vinculação direta prima facie, ou seja, a impossibilidade de uma
vinculação directa de feições absolutas, mas, ainda assim, uma vinculação directa dos particula res
aos direitos fundamentais. A inviabilidade de uma eficácia directa absoluta e a necessidade de
adoptar soluções diferenciadas decorre, também, da estrutura normativa e da natureza emi-
nentemente principiológica dos direitos fundamentais” (MACCRORIE, Benedita Ferreira da Silva. A
vinculação dos particulares aos direitos fundamentais...p. 8694, cit. p. 86). No Brasil, citese: STEINMETZ,
Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais...p. 295.
1003 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no
da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 108.
1004 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no

da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 116.
1005 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no
da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 116.
1006 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no

da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 145.
1007 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no
da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 146.
1008 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no

da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 150157.
1009 SARLET, Ingo Wolfgang. Neoconstitucionalismo e influência dos direitos fundamentais no direito
privado: algumas notas sobre a evolução brasileira. Civilistica: Revista Eletrônica de Direito Civil, ano 1,
no 1, p. 130, 2012. p. 9.
1010 SARLET, Ingo Wolfgang. Neoconstitucionalismo e influência dos direitos fundamentais no Direito

Privado: algumas notas sobre a evolução brasileira. Civilistica:...p. 10. Em sentido aproxima do:
DREHMER DE MIRANDA, Roberta. Algumas notas sobre a “constitucionalização” do Direito Privado.
Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. v. 4, n. 3, p. 122, 2009. p. 1112.
1011 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 238. De modo mais incisivo: LÔBO,
Paulo. A constitucionalização do Direito Civil brasileiro. In. TEPEDINO, Gustavo (Org.). Direito Civil
contemporâneo: novos problemas à luz da legalidade constitucional. Anais do Congresso
Internacional de Direito CivilConstitucional da Cidade do Rio de Janeiro. São Paulo: Atlas, 2008. p. 26.
Com fundamento diverso, o art. 5º da LICC: BODIN DE MORAES, Maria Celina. A caminho de um
direito civil constitucional. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 17, no 65, p. 21-
32, jul./set., 1993. p. 29.
1012 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 238239. Em sentido aproxi mado:

SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em torno da
vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 152153; LÔBO, Paulo. A
constitucionalização do Direito Civil brasileiro. In. TEPEDINO, Gustavo (Org.). Direito Civil
contemporâneo: novos problemas à luz da legalidade constitucional. Anais do Congresso
Internacional de Direito CivilConstitucional da Cidade do Rio de Janeiro. São Paulo: Atlas, 2008. p. 26.
1013 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 240.
1014 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 241. Em idêntico sentido:
STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais...p. 174175: “(...) os teóricos
da eficácia imediata não propõem que as ponderações do juiz devem se sobrepor às ponderações do
legislador democraticamente legitimado. Argumentam exatamente em sentido contrário. Se há
desenvolvimento legislativo de direitos fundamentais e se este desenvolvimento é compatível com a
Constituição, então o juiz não poderá se sobrepor a ele sob pena de violar os princípios democráticos
e da separação dos poderes”.
1015 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 243.
1016 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 244245; LÔBO, Paulo. A cons-
titucionalização do Direito Civil brasileiro. In. TEPEDINO, Gustavo (Org.). Direito Civil contemporâneo:
novos problemas à luz da legalidade constitucional. Anais do Congresso Internacional de Direito
CivilConstitucional da Cidade do Rio de Janeiro. São Paulo: Atlas, 2008. p. 26.
1017 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas...p. 245.
1018 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo
(Org.). Direito Civil contemporâneo: Novos problemas à luz da legalidade constitucional. São Paulo:
Atlas, 2008. p. 361, com referência a Pietro Perlingieri.
1019 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo

(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 363.


1020 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo
(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 363.
1021 BODIN DE MORAES, Maria Celina. A caminho de um direito civil constitucional. Revista de Direito Civil,

Imobiliário, Agrário e Empresarial, v. 17, no 65, p. 2132, jul./set., 1993. p. 24; TEPEDINO, Gustavo.
Premissas metodologicas para a constitucionalizacao do Direito Civil...cit. p. 4649.
1022 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo
(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 364.
1023 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo

(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 363.


1024 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo
(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 368.
1025 TEPEDINO, Gustavo. O Direito CivilConstitucional e suas perspectivas atuais. In. TEPEDINO, Gustavo

(Org.). Direito Civil contemporâneo...p. 368369.


CAPÍTULO DÉCIMO

EFICÁCIA INDIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS:


ORDEM OBJETIVA DE VALORES E AUTONOMIA DO
DIREITO CIVIL

SUMÁRIO. § 55. Introdução. § 56. O soldado do constituciona lismo da


“ordem objetiva de valores”. § 57. Principais postula dos da teoria de
Günter Dürig sobre a eficácia dos direitos fun damentais em relação aos
particulares. § 58. Situação da teoria da eficácia indireta na Alemanha. §
59. Estado atual da teoria da eficácia indireta no Brasil. § 60. Excursus: Não
eficácia dos direitos fundamentais (Diederichsen), modelo da
convergência estatista (Schwabe), modelo dos três níveis (Alexy) e
modelo da state action. 60.1. Introdução. 60.2. Modelo da não eficácia dos
direitos fundamentais. 60.3. Modelo da convergência estatista. 60.4.
Modelo de três níveis (Robert Alexy). 60.5. Modelo da state action. § 61.
Excursus: A “força normativa da Constituição” de Konrad Hesse e a
eficácia dos direitos fundamentais. 61.1. Introdução. 61.2. Konrad Hesse,
o jurista de Königsberg. 61.3. A força normativa da Constituição: o livro e
seu impacto na lite ratura internacional. 61.4. O que é afinal a “força
normativa da Constituição”? 61.5. A recepção da obra no Brasil.
§55. INTRODUÇÃO
A apresentação do modelo da eficácia indireta, em certa medida, já se deu
com o exame analítico da decisão Lüth. O objeto deste capítulo compreenderá os
seguintes tópicos: (i) os aspectos biobibliográficos sobre Günter Dürig, o criador
da doutrina da eficácia indireta dos direitos fundamentais em relação aos
particulares; (ii) os principais postulados da doutrina da eficácia indireta e as
nuances relativas ao que se pode chamar de suas variantes forte e fraca; (iii) a
situação da teoria no Brasil.
O capítulo será encerrado com dois excursos.
O primeiro (§ 60) tem por objetivo apresentar sucintamente 4 modelos
alternativos de eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares, os
quais, embora importantes, não são essenciais para o desenvolvimento da tese. A
menção a tais modelos dá-se por uma questão de método e porque é inadequado
ignorá-los em um estudo que envolva o tema da Drittwirkung no Brasil.
O segundo excurso (§ 61) é mais longo e tem por finalidade oferecer um
panorama amplo sobre o conceito de força normativa da Constituição, concebido
por Konrad Hesse. A forma como esse conceito terminou por ser recepcionada
no país é seguramente uma das causas do estado de assimetria metodológica no
âmbito da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares e do
papel da Constituição no Direito Civil. O § 61 terá a função de anteceder a
apresentação do modelo fraco de eficácia indireta, o qual, ao viso desta tese, é o
mais adequado ao Direito brasileiro.
§56. O SOLDADO DO CONSTITUCIONALISMO DA “ORDEM OBJETIVA DE
VALORES”
Günter Dürig nasceu na Alta Silésia, na então cidade alemã de Breslau,
atualmente Breslávia, território polonês, no ano de 1920. Era filho de um oficial
prussiano e ingressou aos 18 anos como cadete em um regimento de cavalaria.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, Dürig engajou-se no conflito no posto
de oficial de Cavalaria, em uma Divisão Panzer, designada para perigosas
missões de reconhecimento na frente russa. Por mais de uma vez, ele foi
gravemente ferido em combate, sendo a última em março de 1945, na Prússia
Oriental.1026 As sequelas do ferimento na cabeça acompanha-ram-no até à morte,
com algumas limitações físicas dolorosas, que ele tentou contornar para que não
impedisse o exercício da docência, algo que o motivava profundamente.
À semelhança da situação de Konrad Hesse, a guerra fê-lo atrasar seus
estudos superiores. Sua graduação na Universidade de Munique se deu em 1949,
aos 29 anos de idade.1027 Ele se doutorou no mesmo ano e fez a habilitação para
Direito Constitucional, Direito Administrativo e Teoria do Estado em 1952.
Tornou-se catedrático de Direito Público na Universidade de Tübingen no ano
de 1956.1028 Por muitos anos, ele e Otto Bachoff foram as figuras centrais do
Direito do Estado na Universidade de Tübingen.1029
O controvertido Theodor Maunz e Dürig são coautores dos clássicos
Comentários à Lei Fundamental alemã. Na verdade, sua produção literária foi
relativamente pequena. Sua contribuição mais notável foi a doutrina da
dignidade humana, que terminou por ser acolhida na jurisprudência do TCF.1030
Além da docência, Dürig foi magistrado do Tribunal Administrativo de
Baden-Württemberg, função na qual se aposentou em 1985. Sem envolvimento
político, ele sempre se considerou um patriota alemão. A reunificação alemã foi
um dos momentos mais especiais de sua vida.1031 Ele faleceu em 22 de novembro
de 1996.1032
O texto inaugural da chamada doutrina da eficácia indireta dos direitos
fundamentais em relação aos particulares intitula-se Direitos fundamentais e
jurisdição civil,1033 de 1956.1034 Não se pode, contudo, ignorar a importância de
seu escrito de 1952, cujo título é A concepção de pessoa humana da Lei
Fundamental.1035 Ambos refletem o estado de coisas na dogmática jurídica alemã
do segundo pós-guerra: a busca por uma pauta axiológica para dar fundamento a
uma ordem jurídica que, por quase 15 anos, se manteve exclusivamente sob o
prestígio do Führerprinzip.
Como já foi exaustivamente demonstrado, nesse processo de refundação da
ordem jurídica houve uma corrida ao final do arco-íris axiológico.
Jusnaturalistas, na-cional-socialistas “reinventados”, positivistas e liberais
tentaram oferecer a resposta adequada para os conflitos entre Direito e Moral,
que foram determinantes para a quebra da institucionalidade dentro da
institucionalidade nos anos 1932-1933.
A vitória do conceito de ordem objetiva de valores, tal como se deu no
caso Lüth, não pode ser celebrada de modo irrefletido. Ao mesmo tempo em que
se pode considerar uma conquista civilizatória a reorientação da ordem jurídica
para um “sistema de valores”, é também mandatório identificar as debilidades de
qualquer modelo axiológico. Marcelo Neves, a esse propósito, lança uma
advertência que merece reprodução:

“A experiência histórica é contundente a esse respeito. Durante o nacional-socia-


lismo, foram precisamente os juristas que proclamaram a importância de
princípios orientados por valores e teleologias, especialmente nos termos da
tradição hegeliana, que pontificaram nas cátedras. Autores ditos ‘formalistas’, os
quais Hauke Brunkhorst relacionou sugestivamente ao ‘positivismo jurídico
democrático’, destacando-se Hans Kelsen, foram banidos de suas cátedras ou
não tiveram acesso ao espaço acadêmico. Evidentemente, para o ‘Führer’, um
modelo com ênfase em regras constitucionais e legais seria praticamente
desastroso.”1036

Foram homens como Nipperdey, Larenz, Wieacker, Schmitt e Maunz, os


três primeiros no Direito Civil, os dois últimos no Direito de Estado, quem
forneceram as bases para uma ordem jurídica fundada nos valores da
“comunidade do povo alemão”, do “socialismo”, dos “valores do trabalho” e da
“igualdade” nos anos 1932-1945. E foram eles mesmos quem, após terem
rapidamente reconstruído suas carreiras, conseguiram liderar o movimento de
retorno aos valores, agora como apóstolos de uma sociedade democrática e
social.1037
A se comprovar tal assertiva, veja-se que Larenz, em seu Direito das
Obrigações (edição de 1987), é o defensor da preservação dos espaços da
autonomia privada. Ele, porém, em 1935, escreveu uma das páginas mais
sórdidas da literatura jurídica ao definir que somente o integrante da
“comunidade do povo alemão” (aquele que possui sangue ariano) é sujeito de
direito. Tal enunciado, segundo Larenz, poderia ser colocado no ápice do
ordenamento jurídico, em substituição ao conceito de capacidade jurídica do §1o,
BGB, referente a “todo ser humano”.1038
Ao menos de acordo com os registros históricos, Dürig foi uma exceção em
meio a esses juristas “reinventados”. Sua boa-fé intelectual transparece de seus
escritos, que servem de base para a formação da teoria que agora se analisa.
§57. PRINCIPAIS POSTULADOS DA TEORIA DE GÜNTER DÜRIG SOBRE A
EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM RELAÇÃO AOS
PARTICULARES
Com base nos textos de Günter Dürig far-se-á uma síntese da formulação
original da teoria da eficácia indireta:1039
(i) Os direitos fundamentais têm incidência nas relações privadas por meio
das “portas de entrada” no Direito Privado, que são as cláusulas gerais. Essa
circunstância, embora não exclusivamente, determina a natureza mediata dessa
eficácia. Eles são uma forma de apresentação do sistema de valores reconhecido
expressamente no art. 1o da LF/1949.1040
(ii) As cláusulas gerais não atuam como meros instrumentos de
intermediação dos direitos fundamentais no Direito Privado, mas também como
mecanismos de calibragem dessa penetração, que poderá ser maior ou menor, a
depender do tratamento dado pelo direito ordinário, suas insuficiências e suas
deficiências.1041
(iii) A dignidade da pessoa humana é o núcleo da ordem jurídica e tem
função de orientação da “ordem objetiva de valores”.
(iv) As cláusulas gerais são o continente dos direitos fundamentais em sua
entrada no Direito Privado. Elas terminam por auxiliar na salvaguarda da
autonomia do direito privado e, em paralelo, da unidade do sistema jurídico.1042
(v) Identificam-se três graus de intensidade no processo de preenchimento
das cláusulas gerais de Direito Privado pelos direitos fundamentais: a) no
primeiro grau, elas atuarão para esclarecer os conceitos; b) no segundo grau,
mais raro e também mais importante, está a função de atualização dos conceitos
do sistema jurídico. Um exemplo dessa função está no tratamento a ser dado à
proibição do casamento entre “ariano” e “não ariano”. Essa era uma norma
herdada do sistema pré-constitucional (anterior a 1949) e que não poderia mais
ser reconhecida na vigência da LF/1949 por sua incompatibilidade com a nova
ordem de valores; c) no terceiro grau, as cláusulas gerais exercerão a função de
colmatação de lacunas.1043
Se há uma nota característica na doutrina de Dürig ela recai na
essencialidade da mediação legislativa. O juiz não poderia desconsiderar a
legislação para recorrer diretamente ao texto constitucional. Como já se
escreveu, “aquilo que se deve entender por mediação na aplicabilidade dos
preceitos constitucionais às relações entre iguais é, afinal, a necessidade de
conciliar esses valores com a liberdade negocial e a autonomia privada no
direito civil”.1044
§58. SITUAÇÃO DA TEORIA DA EFICÁCIA INDIRETA NA ALEMANHA
Na Alemanha, a doutrina da eficácia indireta segue dominante. O TCF
permanece referindo-se a esse modelo em suas decisões mais recentes, embora
eventualmente mencione a teoria dos deveres de proteção do Estado,
desenvolvida por Claus-Wilhelm Canaris.1045 De fato, existem trabalhos que
renovaram o debate e podem ser considerados como variantes relativamente
autônomas da doutrina da eficácia indireta, como a teoria de Canaris. A eficácia
indireta evoluiu graças a tais contribuições, o que se reflete na fundamentação do
TCF.
Em parte da doutrina alemã contemporânea, nota-se ainda um movimento
incipiente para se mitigar a eficácia indireta, ao estilo da tese de Jörg Neuner
sobre o direito à antidiscriminação e, em trabalho publicado no Brasil, de Claus-
Wilhelm Canaris, no qual ele concedeu a possibilidade de eficácia direta
excepcional, em casos extremos de violação da dignidade humana no âmbito do
direito à antidiscriminação.1046
O pensamento majoritário no Direito alemão, entretanto, com maior ou
menor uniformidade, segue a estrutura do modelo eficácia indireta dos direitos
fundamentais nas relações privadas: a) não há direitos de defesa (suportados em
direitos fundamentais) exercíveis por um particular em face de outro; b) as
soluções jurídicas no âmbito da eficácia dos direitos fundamentais passam
primordialmente pelas cláusulas gerais, que se apresentam no Direito Civil como
verdadeiras autorizações legais para que os juízes tenham ingerência nos direitos
fundamentais a ele relativos. Elas concedem aos juízes uma competência para
que façam observar o mandamento de proteção dos direitos fundamentais em
determinadas situações (v.g., quebra da igualdade na relação contratual). Tal
circunstância obriga a um permanente esforço para se conferir contornos e dar
concretude às cláusulas gerais em sua aplicação aos casos práticos; c) quanto
maior for a intervenção legislativa na solução de conflitos jurídi-co-
fundamentais, mais estreita será a margem de apreciação dos magistrados e
menos expressivo será o papel dos direitos fundamentais nas decisões judiciais;
d) o legislador é o intérprete fundamental da Constituição; e) a interpretação e o
desenvolvimento jurisprudencial do direito ordinário são tarefas exclusivas dos
tribunais locais, regionais e superiores (excluído o tribunal constitucional), ainda
quando haja afetação do tema por direitos fundamentais.1047
Percebe-se idêntica orientação no Direito austríaco contemporâneo, sob
forte influência de Franz Bydlinski, do que resultam as seguintes premissas: a) a
legislação deve levar em conta os direitos fundamentais; b) a norma ordinária de
Direito Privado, ao ser interpretada, deve respeitar os direitos fundamentais.
Esse processo tem nas cláusulas gerais, como a dos bons costumes, seu principal
instrumento de realização.1048
Nenhuma dessas referidas mitigações alterou radicalmente o quadro da
preeminência da eficácia indireta e apenas veio a reforçar a noção de que a ruína
da eficácia direta na Alemanha, como modelo global e explicativo das relações
entre o Direito Privado e os direitos fundamentais, é uma tendência com baixas
possibilidades de reversão.
§59. ESTADO ATUAL DA TEORIA DA EFICÁCIA INDIRETA NO BRASIL
O Direito Civil brasileiro experimenta um amplo domínio da teoria da
eficácia direta dos direitos fundamentais nas relações entre privados. Há, porém,
um número não insignificante de autores que seguem o modelo de três níveis
(Robert Alexy), dos deveres de proteção (Canaris) e da eficácia indireta, mesmo
com variações. Existem também os que não seguem a doutrina da eficácia
direta.1049 Poder-se-ia ainda assinalar trabalhos que não se ocupam do problema
em termos conceituais, no entanto, em sua organização metodológica seguem a
doutrina da eficácia indireta.1050
Na jurisprudência do STF, o RE 201819 (caso da União Brasileira de
Compositores) é considerado um marco na tomada de posição no Direito
brasileiro em favor da eficácia direta, embora se possa discutir se os
fundamentos estão dispostos em ordem a deles se extrair tal conclusão. A
decisão reforça a ideia de que a entidade que expulsou o associado sem o direito
à ampla defesa agiria como se fosse entidade. Essa circunstância é mais
convergente com a doutrina norte-americana da state action do que a teoria da
eficácia direta. Esta última, porém, foi expressamente referida no acórdão como
seu fundamento.1051
§60. EXCURSUS: NÃO EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
(diederichsen), modelo da convergência estatista (schwabe),
modelo dos três níveis (alexy) e modelo DA STATE ACTION

60.1. Introdução
Como já anunciado no prólogo da Terceira Parte, o objetivo da tese não é
inventariar os diversos modelos teóricos da eficácia dos direitos fundamentais
em relação aos particulares. Esse é um ofício que se impõe a quem disserta sobre
a Drittwirkung como tema central do trabalho acadêmico. O exame dessas
teorias tem aqui um caráter instrumental. O Brasil fez uma opção definida pelo
modelo da eficácia direta. Um dos propósitos da tese é apresentar a eficácia
indireta como o mais adequado para a operacionalização e a preservação do
estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo.
Por essas razões, neste excurso far-se-á uma singela menção a quatro
modelos importantes, mas que não se tornaram preeminentes em seu país de
origem.

60.2. Modelo da não eficácia dos direitos fundamentais


Este não é propriamente um modelo e sim uma negação à possibilidade de
haver incidência dos direitos fundamentais em relação aos particulares. No
Brasil, não há autor que se tenha dedicado ao desenvolvimento dessa hipótese,
especialmente no universo dos civilistas. Por mais que possa parecer interessante
ou simpático aos civilistas um constructo teórico que imunize o Direito Civil às
influências do Direito Constitucional, a pletora de autores citados até agora nesta
tese serve de comprovação à hipótese de que não houve resistência histórica (ao
menos dos principais doutrinadores) do Direito Civil a se submeter ao princípio
da supremacia hierárquica da Constituição. Em torno dessa “insubmissão
inventada” (no sentido da “invenção das tradições”, de Eric Hobsbawm) há
fatores como preconceito, distorção histórica e também uma parcela de
estratégia de combate em relação à autonomia epistemológica do sistema de
Direito Privado. Infelizmente (ou não), esses fatores não são ordinariamente
identificáveis em obras de Direito Constitucional e sim nos trabalhos de alguns
civilistas.1052
Rigorosamente, o grande impulsionador desse modelo é um civilista
alemão, Uwe Diederichsen, conquanto se possa identificar, na teoria liberal dos
direitos fundamentais, alguns pontos de contato com as ideias desse autor.1053
Suas ideias, porém, não tiveram repercussão alguma no Brasil e, mesmo antes de
as haver formulado, como já exposto na tese, a civilística nacional, desde o
século XIX, nunca negou as relações entre a Constituição e o Direito Privado.
Em linhas bem gerais, a não eficácia baseia-se na existência de dois
sistemas normativos distintos, sem hierarquia recíproca, mas de verdadeira
implicação-polari-dade. Em razão disso, não haveria como se vaso comunicarem
pautas axiológicas, o que vai de encontro à teoria dominante no TCF, que
considera a Constituição como uma ordem objetiva de valores, cuja expansão
não encontraria limites nem no Direito Privado, ao estilo do caso Lüth.
Paralelamente, Uwe Diederichsen faz uma pesada carga contra o TCF e sua
intervenção excessiva nos casos de direito ordinário, especialmente de Direito
Civil. Para ele, o tribunal constitucional assumiria a natureza de uma super
instância de revisão de casos cíveis, o que o próprio TCF não se cansa de
refutar.1054

60.3. Modelo da convergência estatista


Desenvolvido por Jürgen Schwabe, esse modelo é bastante complexo e
consegue desviar-se do problema básico dos modelos da eficácia direta e da
indireta porque não reelabora a teoria clássica dos direitos fundamentais. A tese
de Schwabe, em síntese, considera a eficácia dos direitos fundamentais nas
relações privadas como um pseudoproblema. Para ele, o ato de um particular,
que viole direitos fundamentais de outro particular, deve ser confrontado com a
legislação. Há um parâmetro objetivo que diferenciará as soluções para o caso: a
existência de lei e, se ela existir, a conformidade com seu conteúdo. (i) Existindo
previsão legal, hipótese mais simples, tem-se a árvore de decisão: (a) o ato foi
lícito, porque realizou uma prescrição legal; (b) o ato foi ilícito, caberá então ao
Estado responder pela violação do direito fundamental. (ii) Se não houver
previsão legal para o ato, o Estado também responderá, na medida em que se
omitiu em sua função constitucional e se admite que ele anuiu com a ofensa ao
direito fundamental de um terceiro. A teoria baseia-se na premissa de que a
violação de direitos fundamentais entre particulares são espécies de intervenções
estatais: ao não as proibir, o Estado a está permitindo. Ao assim proceder, o
Estado participa das violações entre particulares e deve ser chamado a responder
por isso, o que se dá por meio de tutelas capazes de inibir ou conter esses atos
inter privados.1055

60.4. Modelo de três níveis (Robert Alexy)


O modelo de três níveis é uma criação de Robert Alexy1056 e que foi
introduzido no Direito brasileiro, com características próprias, por Virgílio
Afonso da Silva.1057 Mesmo com o risco de se perder algumas particularidades
do refinado modelo, apre-sentam-se seus principais tópicos.
A proposta de Alexy prevê, no primeiro nível (nível do dever estatal), o
dever dos tribunais, assim como cumpre ao legislador, quando exerce sua função
essencial, de respeitar a ordem objetiva de valores. O Estado vincula-se aos
direitos fundamentais para que não haja sua violação em face dos particulares.
Esse primeiro nível assume contornos muito próximos da eficácia indireta.1058
O segundo nível trabalha com pretensões dos particulares em face do
Estado, a fim de que sejam garantidos seus direitos fundamentais. Os direitos
fundamentais com função de resistência e de proteção conectam-se para que sua
realização se dê no âmbito jurisdicional.1059
O terceiro nível realiza-se no plano das relações entre os particulares. Há
aqui uma equivalência ao modelo da eficácia direta,1060 embora Alexy faça uso
de significativas distinções: i) a eficácia direta em face de terceiros não significa
que os direitos do cidadão perante o Estado sejam, em simultâneo, direitos
exercitáveis entre particulares; ii) não há equivalência de intensidade eficacial
quando os direitos fundamentais são exercidos em face do Estado e quando há
dois particulares em disputa. O sentido de eficácia direta, no terceiro nível,
ocorre por meio da dualidade entre direitos e não direitos, liberdades e não
liberdades, além de competências e não competências. Desse modo, o juiz cível
está vinculado prima facie ao Direito Civil, assim considerado o conjunto de leis
vigentes, a jurisprudência e a dogmática. Afastar-se dessa vinculação implica a
necessidade de se assumir os custos argumentativos inerentes.

60.5. Modelo da state action


É possível também mencionar o modelo norte-americano da state action
(ação estatal), desenvolvido pela Suprema Corte, cuja utilização permanece
dominante em sua jurisprudência, ao exemplo do caso Obergefell v. Hodges, 14-
556, U.S. 23 (2015) (reconhecimento do casamento de pessoas do mesmo sexo).
Haveria neste modelo uma vinculação estatal aos direitos fundamentais, o que é
a antítese dos modelos alemães da eficácia direta e da eficácia indireta, ao menos
quanto ao princípio da possibilidade de vinculação dos particulares. A violação
de direitos fundamentais pode ser imputável ao Estado, que não tomou as
medidas necessárias para evitar sua ocorrência. Os exemplos de manual da state
action recaem nas hipóteses de (i) exercício privado de funções públicas
delegadas (expedição de diploma por reitor de universidade particular) ou (ii) da
usurpação dessas funções por particulares (cárcere privado). No Direito
brasileiro, o mandado de segurança e o habeas corpus são writs constitucionais
utilizados para tutelar, respectivamente, os exemplos (i) e (ii).
§61. EXCURSUS: A “FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO” DE KONRAD
HESSE E A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

61.1. Introdução
De 1o de janeiro de 1950 a 1o de janeiro de 2017, na base de dados do STF,
aparecem 66 acórdãos que citam Konrad Hesse, o primeiro deles foi publicado
em 25.9.1987.1061 As obras referidas são: a) A força normativa da Constituição,
no original alemão, e nas traduções em português1062 e espanhol;1063 b) Elementos
de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, em alemão1064 e
na versão em português;1065 c) em alemão, um capítulo de Hesse no manual de
Direito Constitucional de Benda, Maihofer e Vogel, intitulado “Importância dos
direitos fundamentais”;1066d) um capítulo intitulado A interpretação
constitucional, traduzido para o espanhol.1067 Dentre todas, A força normativa da
Constituição sobressai-se como a mais citada. O repositório jurisprudencial do
STF é falho porque não contém todas as decisões publicadas no DJU, mesmo as
posteriores à CF/1988. Esses dados, portanto, hão de ser tomados sem maior
valor estatístico e sim como um indicativo da influência de Hesse na formação
do pensamento dos juízes do tribunal.
No STJ, a situação é diferente. A base de dados é completa e permite que
se defina o universo pesquisado como total. De 1o de janeiro de 1989 a 1o de
janeiro de 2017, pesquisando-se apenas os acórdãos, Konrad Hesse aparece em
28 entradas. As obras citadas de Hesse são as seguintes: a) Elementos de Direito
Constitucional da República Federal da Alemanha, em sua versão em
português;1068 b) Direito Constitucional e Direito Privado, na tradução
espanhola.1069-1070 Curiosamente, o livro A força normativa da Constituição é
citado uma única vez pelo STJ,1071 conquanto haja dezenas de invocações a
termos extraídos desse livro, como “vontade constitucional” ou “força normativa
da constituição”.1072 A popularidade das ideias de Hesse, nesse contexto, é
tamanha que parece ter havido um descolamento entre elas e o conteúdo de seus
escritos. Algumas de suas ideias-força converteram-se em dados axiomáticos.
O impacto de Konrad Hesse no Direito Civil brasileiro foi tamanho que
Benjamin Herzog lhe dedicou uma seção inteira de sua tese sobre o estado da
arte da metodologia civilística contemporânea no Brasil e em Portugal.1073
Infelizmente, toda essa popularidade resultou em consequências
inesperadas, ao menos para o Direito Civil e para a doutrina da eficácia indireta
dos direitos fundamentais, que é amplamente defendida por Hesse.
Pode-se até dizer que, em alguns casos, esses efeitos têm sido negativos,
como aliás é ordinário ocorrer quando a obra deixa de ser o que ela é e converte-
se naquilo que dizem que ela é. Daí ser necessário examinar um pouco mais de
perto qual o alcance e o sentido da chamada “força normativa da constituição”.
Em seguida, far-se-á um contraste com as ideias de Hesse em outro livro, Direito
Constitucional e Direito Privado, o que servirá de confirmação para algumas das
teses aqui levantadas.
Antes, porém, é importante conhecer alguns dados biográficos do autor e
sobre a importância jurídica do opúsculo A força normativa da Constituição na
Alemanha e no Direito Comparado.

61.2. Konrad Hesse, o jurista de Königsberg


Konrad Hesse nasceu em 1919, na antiga cidade-fortaleza de Königsberg e
terra natal de Kant, hoje Kaliningrado, um exclave russo entre a Polônia e a
Lituânia. Ele teve a desventura de atingir a vida adulta no início da Segunda
Guerra Mundial, quando interrompeu a graduação em Direito na Universidade
de Gotinga, serviu no conflito como oficial do Exército alemão, foi ferido e, em
suas palavras, perdeu “sete importantes anos” de sua vida. Por essa razão,
atrasou sua formação universitária. Seu doutoramento ocorreu em 1950, também
em Gotinga, sob orientação de Rudolf Smend. Sua habilitação deu-se em 1955 e,
no ano seguinte, tornou-se catedrático de Direito Público na Universidade de
Friburgo.1074 Em seu país, o prestígio intelectual de Hesse foi ampliado com a
publicação, a partir de 1967, de seus Elementos de Direito Constitucional da
República Federal da Alemanha. No ano de 1975, por uma indicação do SPD e
do FDP, Hesse tomou posse como juiz do TCF, onde permaneceu até 1987. Sua
chegada ao tribunal foi “no momento certo” de sua vida e a lembrança que
deixou como juiz foi de alguém “equidistante”.1075 Em termos doutrinários e
ideológicos, Hesse votava sua admiração aos weimarianos Smend (seu
orientador), Kelsen e Heller, enquanto mantinha todas as reservas quanto a
Schmitt, a ponto de não entender o movimento de “glorificação” tardia desse
jurista, que se iniciou nos anos 1970.1076

61.3. A força normativa da Constituição: o livro e seu impacto na literatura


internacional
A força normativa da Constituição, ao contrário do que se possa imaginar,
não foi um texto particularmente marcante na vida jurídica alemã, muito menos
na bibliografia de Hesse. Em seu obituário, Peter Häberle menciona esse
trabalho apenas uma vez.1077 Na coletânea de julgados do TCF, reunida por
Jürgen Schwabe, a única obra de Hesse citada é seu livro Elementos de Direito
Constitucional.1078 Em outra decisão, o TCF recorreu ao conceito de
“concordância prática”,1079 que foi desenvolvido por Hesse nos Elementos, posto
que o tribunal não tenha citado esse livro.1080 Não que o TCF seja pródigo em
citar obras doutrinárias. O tribunal, pelo contrário, é nisso muito econômico, mas
a ausência de A força normativa da Constituição é sintomática. Se for procedido
idêntico escrutínio em outras bases ou fontes de pesquisa, o resultado será
idêntico. Em artigos sobre constitucionalização do Direito Civil ou sobre direitos
fundamentais, elaborados por autores estrangeiros de diversas procedências
geográficas ou especialidades, A força normativa de Hesse não é referida em
momento algum: i) Alemanha – Robert Alexy,1081 Claus-Wilhelm Canaris,1082
Karl-Heinz Ladeur (Alemanha),1083 Christian Starck,1084 Gregor Bachmann,1085
Gert Brüggemeier;1086 ii) Portugal – José de Oliveira Ascensão,1087 António José
Avelãs Nunes,1088 Joaquim de Sousa Ribeiro,1089 Jorge Miranda,1090 Jorge Reis
Novais,1091 José Nunes Abrantes,1092 José Carlos Vieira de Andrade1093 e
Benedita Ferreira da Silva MacCrorie1094 (com exceção de José Joaquim Gomes
Canotilho1095 e Cristina Queiroz1096); iii) Holanda – Siewert Lindenbergh,1097 Jan
Smits1098 e Hans Nieuwenhuis;1099 iv) Estados Unidos da América – David D.
Meyer1100e Eric Engle;1101 v) Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte –
Gavin Phillipson e Alexander Williams,1102 Stathis Banakas1103 e Lorenzo
Zucca;1104 vi) Itália – Guido Alpa;1105 vii) Coréia do Sul – KyuHwan Park;1106
viii) Espanha – Juan Fernando López Aguilar;1107 ix) Argentina – Ricardo Luis
Lorenzetti;1108 x) Estônia – Irene Kull.1109
A ausência eloquente da doutrina da força normativa da Constituição, e do
livro que lhe conferiu o nome, em tantas obras e na própria jurisprudência do
TCF, permite formular algumas hipóteses.
A primeira, sobre o desconhecimento ou a irrelevância do autor, é absurda
e não merece cogitação. A importância teórica de Hesse não se põe em causa. A
segunda recai sobre a própria doutrina: seria ela irrelevante, óbvia, pouco
assimilada ou não teria alcançado projeção nos países mencionados? Essa é uma
hipótese que demandaria investigações muito mais profundas do que as
suportadas pelo objeto desta tese. É certo que o Brasil parece ser o paraíso das
“recepções tardias de teorias arruinadas em seus países de origem”,
particularmente se forem alemãs.1110 Esse problema da demora em se renovarem
os estudos dogmáticos a partir das ondas de atualização vindas da Alemanha não
é restrito ao Brasil.1111 Diante da impossibilidade de ao menos ser submetida a
testes de validez, essa segunda hipótese deve ser também eliminada. A terceira
hipótese é a de que a força normativa da Constituição deixou de se projetar em
outros países como se verificou no Brasil, particularmente no Direito Civil,
porque sua assimilação aqui se operou de modo retórico, excessivamente
abrangente ou como aríete para outras construções teoréticas. Essa terceira
hipótese apresenta condições de ser testada.
Para isso, é necessário entender o que realmente significa a força
normativa da Constituição.

61.4. O que é afinal a “força normativa da Constituição”?


O texto de Hesse, de 29 páginas, na verdade é uma aula magna inaugural
que o jovem professor de Friburgo proferiu em 1959. No ano anterior, o TCF
julgou o Lüth-Urteil, sobre o qual se cuidou no Capítulo Oitavo desta tese. Nessa
época, o TCF lutava para se afirmar como um poder independente na República
Federal da Alemanha. Os conflitos com o Poder Executivo eram frequentes e
havia resistências ao pleno desenvolvimento da jurisdição constitucional por um
Parlamento cioso de suas prerrogativas. Some-se a isso o desencanto dos
alemães com as fórmulas liberais-demo-cráticas da República de Weimar, que
não foram capazes de impedir a eleição legítima de Adolf Hitler em 1932 e, após
isso, a sucessiva prática de atos que conduziram à instauração da ditadura
nacional-socialista. Hesse era o filho intelectual do constitucionalismo de
Weimar. Ele, porém, não acreditava na capacidade do antigo modelo jurídico-
político de dar respostas apropriadas à nova Alemanha, ainda insegura em seus
primeiros 10 anos de existência.
Hesse, em sua conferência, demarca posições: ele repudia o positivismo
jurídico de Laband e Jellinek1112 e o que ele chama de “positivismo sociológico”
de Carl Schmitt. Seu alvo, porém, é um nome do século XIX: o político e
jornalista alemão de origem judaica Ferdinand Lassalle (1825-1864), um líder de
massas na Alemanha pré-unificação, defensor da socialdemocracia (o nome do
socialismo no Oitocentos), agitador da classe trabalhadora, aliado oculto de Otto
von Bismarck (de quem recebeu financiamento) e uma personagem excêntrica,
que morreu em um duelo por uma disputa amorosa envolvendo uma aristocrata
(Helena von Dönniges). Lassalle, em uma conferência de 1862, intitulada Sobre
a essência da Constituição,1113 criou a fórmula da Constituição como “um
pedaço de papel”,1114 a saber, ela seria apenas um documento político que pouco
ou nada valia contra os “fatores reais de poder” (os militares, os latifundiários e
os industriais).1115 Tanto essa interpretação da essência constitucional quanto a
desenvolvida pelos positivistas jurídicos (Jellinek) teriam contribuído para o
enfraquecimento de Weimar ou não conseguiram impedir seu fracasso, segundo
Hesse.1116
A alternativa proposta por Konrad Hesse passa pelos seguintes conceitos e
elementos operacionais: a) a Constituição não está isolada da realidade e é por
ela influenciada, porém, com independência relativa entre ambas; b) a força
normativa da Constituição depende de sua eficácia, mas isso só ocorrerá se
houver, por parte dos ocupantes de cargos políticos, o respeito à “vontade da
Constituição” e não apenas à “vontade do poder”; c) a ordem jurídica está em
permanente estado de legitimação, o que implica sua predisposição em se
adaptar às mudanças do tempo; d) a Constituição deve-se limitar a estabelecer
alguns poucos princípios constitucionais, do contrário, a revisão constitucional
poderá enfraquecê-la, por efeito de uma inevitável desvalorização de sua força
normativa. Esse cenário é visualizável quando se dá a “constitucionalização” de
interesses particulares ou contingenciais; e) os órgãos do Estado submetem-se à
Constituição, inclusive os partidos políticos, dado que a política interna foi
juridicizada. Uma das formas de exercício dessa vinculação à Constituição é o
controle de constitucionalidade.1117 Mesmo assim, esse conceito pode ser
confundido com outro de “máxima efetividade”, a saber: se houver a
necessidade de solução de “problemas jurídico-constitucionais”, dar-se-á
preferência à interpretação que confira às normas constitucionais uma
efetividade ótima.1118 Nesse campo, porém, ter-se-ia de discutir quais as
diferenças entre efetividade ótima e força normativa, o que é problemático e
pode gerar contradições.1119
Percebe-se quão modesta era a pauta de Hesse para a “força normativa da
Constituição”. Ao menos para os dias atuais.1120 Tendo-se em conta a época de
sua elaboração, imaginar que a Constituição vincularia os agentes políticos e os
partidos, além de se utilizar o controle de constitucionalidade como freio à
liberdade nomogenética era algo muito relevante para um país que conheceu
uma breve experiência democrática, era parlamentarista e se unificou havia
menos de 100 anos sob uma monarquia semiautocrática. Considerada a
delimitação temporal, a “força normativa da Constituição” apresentava conceitos
e elementos operacionais muito interessantes para a Alemanha da década de
1950.

61.5. A recepção da obra no Brasil


O problema, no entanto, está em sua recepção no Brasil e o que dela se
terminou por extrair. Essa expansão não imaginada do que seria realmente a
“força normativa da Constituição” ultrapassa as forças desta tese. Há, contudo,
um espaço que se abre para o objeto da tese: Hesse, em toda a conferência, faz
uma única menção ao Direito Civil. A saber: a “Constituição normativa”, como
a define Hesse (veja-se, ele não se refere à “força normativa” aqui), passou a
permitir que os tribunais constitucionais exercessem competência quase
ilimitada sobre os conflitos constitucionais e, nesse sentido, até mesmo o Direito
Civil, que antes aparentava estar “isolado”, passou a se submeter a essa
competência por intermédio da “jurisdição dos tribunais federais”.1121
O Direito Civil seria objeto do controle de constitucionalidade, o que,
como visto, ao menos no Brasil, nunca foi objeto de dúvidas na doutrina
privatista. O Direito Civil seria contrastável pelos tribunais federais, no caso
alemão, o BGH (como tribunal ordinário) ou o TCF (como tribunal
constitucional). Não haveria aí maior indagação no Brasil, especialmente se
consultada a jurisprudência do STF dos anos 1930-1960.1122 Dessa única frase do
livro de Hesse, porém, como anota Benjamin Herzog, extraíram-se conclusões
muito mais amplas em relação ao Direito Civil do que se poderia imaginar.1123
Essa dilatação de sentidos, no entanto, é bem maior do que se supõe e não se
restringe ao Direito Civil, o que se comprova pelo mero cotejo entre a
conferência de 1959 de Hesse e no que se transformou a “força normativa” no
Brasil.1124
Se a “única frase” sobre o Direito Civil em A força normativa da
Constituição gerou tantas consequências no âmbito da chamada
“constitucionalização do Direito Civil”,1125 qual teria sido o resultado desse
processo se o pensamento de Hesse fosse interpretado em conjunto com seus
Elementos de Direito Constitucional e o Direito Constitucional e Direito
Privado, as duas obras mais citadas pelos autores pesquisados neste excurso?
Hesse é, antes de tudo, um defensor da autonomia epistemológica do
Direito Privado, no qual obviamente se insere o Direito Civil. Primeiramente, ele
afirma que, de um modo geral, os direitos fundamentais não podem vincular os
particulares. Cabe ao legislador do Direito Privado, em primeiro lugar, a tarefa
de dar concretude ao conteúdo jurídico dos direitos fundamentais. Os tribunais,
por sua vez, não devem corrigir as decisões e a ponderação do legislador a
respeito dos direitos fundamentais, quanto este atua como regulador dessa
matéria.1126 Quando o legislador se utiliza de cláusulas gerais e conceitos
jurídicos indeterminados, surgiria uma carência de concretização normativo-
legal específica, o que faria surgir para o magistrado agir para lhes emprestar
aplicabilidade na relação entre os particulares, quando necessário. O Direito
Privado, por sua própria natureza, confere mais liberdade do que os direitos
fundamentais. Assim sendo, essa liberdade não pode ser objeto de restrição
excessiva.1127
Em Direito Constitucional e Direito Privado, uma obra da maturidade de
Hesse, escrita em 1988, quase trinta anos após A força normativa da
Constituição, fica mais nítida a impossibilidade de se ampliar o sentido dessa
expressão no âmbito do Direito Civil: a) o recurso direto e imediato aos direitos
fundamentais para se resolver conflitos entre particulares pode implicar uma
ameaça à identidade do Direito Privado, que tem antigos e sólidos fundamentos
históricos, em prejuízo da adequação à própria regulação dessas relações; b)
além disso, esse expediente põe em risco o “princípio fundamental de nosso
Direito Privado”, que vem a ser a autonomia privada;1128 c) a Constituição não se
tornou o fundamento de todo o Direito e, por via de consequência, do
ordenamento jurídico-privado;1129 d) o Direito Privado conserva sua autonomia,
embora encontre na Constituição uma fonte de “diretrizes e impulsos”.1130-1131 A
terceira hipótese (vide 61.3, in fine) sobre a assimilação retórica e
excessivamente abrangente da força normativa da Constituição parece responder
bem ao problema proposto.
Ela passou bem no teste a que se submeteu. Em muitos casos, sobre a força
normativa diz-se mais do que Hesse pretendeu afirmar. E, por efeito, tem-se a
presença de elementos retóricos mais do que uma real utilização do conceito no
Direito Civil, de modo particular. Nem sempre o caráter normativo da
Constituição é necessariamente equiparável ao conceito de “força normativa”
desenvolvido por Hesse.1132 O pior é que a “força normativa” se tornou um aríete
para a defesa de algumas construções teóricas ligadas ao neoconstitucionalismo,
ao pós-positivismo e à constitucionalização.1133 Provavelmente, se vivo estivesse,
Hesse consideraria muito estranho ser qualificado como um teórico
neoconstitucionalista.
A principal obra de Hesse para o Direito Civil é Direito Constitucional e
Direito Privado, que tem servido para fundamentar diversas passagens desta
tese. É nesse livro e em seus Elementos de Direito Constitucional que Hesse
afirma sua adesão à tese da eficácia indireta dos direitos fundamentais em
relação aos particulares.

1026 WEBER, Hermann. Günter Dürig zum 70. Geburtstag. NJW, p. 305306, 1990. p. 305.
1027 Nãohá registros sobre sua participação no Partido NacionalSocialista no período de 19331945. Em
uma obra sobre a História do Direito no Nacional-Socialismo, não há registros sobre Dürig, o que talvez
se compreenda pelo fato de haver passado todo o conflito engajado no teatro de operações
(STOLLEIS, Michael; SIMON, Dieter (Orgs.). Rechtsgeschichte im Nationalsozialismus: Beiträge zur
Geschichte einer Disziplin. Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1989).
1028
MAURER, Hartmut. Günter Dürig. Juristen Zeitung, ano 52, no 4 , p. 193194, Feb.1997.
1029 WEBER, Hermann. Günter Dürig zum 70. Geburtstag...cit. p. 306.
1030 MAURER, Hartmut. Günter Dürig...cit. p. 193194.
1031 HÄBERLE, Peter. Günter Dürig. NJW, p. 305306, 1997. p. 305.
1032 Elenunca deixou de ser um soldado. Em seu velório, tocouse o hino extraoficial dos militares
alemães, Alte Kameraden (Velhos Camaradas), cf. HÄBERLE, Peter. Günter Dürig. NJW, p. 305306, 1997.
p. 305.
1033 DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor. Vom Bonner Grundgesetz

zur gesamtdeutschen Verfassung...p. 157190.


1034 O reconhecimento do papel de Dürig na criação da teoria da eficácia indireta é inegável. Admi tese,
no entanto, a existência de precursores dessa concepção da Drittwirkung: “De fato, um olhar mais
atento à doutrina revela que outros autores, em escritos anteriores, já previam essa possibilidade,
ainda que sem a fundamentação minuciosa esposada por Dürig. Dentre eles, citam se os trabalhos de
Herbert Krüger, Walter Jellinek e Alfred Hueck. W. Jellinek, em 1950, destacou a influência da cláusula
geral de bons costumes para a aferição da legalidade de contratos privados à luz de preceitos
constitucionais, como o princípio da igualdade, inclusive no bojo de relações de trabalho,
salientando, na época, que os direitos fundamentais não represam faculdades privadas, desde que
sejam observados os limites impostos pelos bons costumes” (DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado
e Constituição...p. 195). Há quem defenda ainda que a própria ideia de eficácia dos direitos
fundamentais entre particulares já se desenvolvera na República de Weimar, com decisões de casos
dessa natureza sem recurso à ponderação (POSCHER, Ralf. Grundrechte als Abwehrrechte: Reflexive
Regelung rechtlich geordneter Freiheit. Tübingen: Mohr Siebeck, 2003. p. 234235).
1035 DÜRIG, Günter. Die Menschenaufassung des Grundgesetzes. Juristische Rundschau (JR), v. 7, p. 259-

263, 1952.
1036 NEVES, Marcelo. Entre Hidra e Hércules: Princípios e regras constitucionais como diferença para doxal

do sistema jurídico. Brasília: UnB, 2010. p. 175.


1037 O único a sofrer com maior intensidade e duração os efeitos de seu “exílio” político e acadêmico foi
Carl Schmitt, que se autodenominou o “Benito Cereno” do Direito alemão, em uma metáfora com a
personagem de Herman Melville, que fingira comandar o navio tomado pelos escravos rebelados
com o objetivo de preservar seus companheiros de marinharia (em sentido idêntico: RODRIGUES JR.,
Otavio Luiz; DIAS TOFFOLI, José Antonio. Estudo Introdutório à Autobiografia de Hans Kelsen. In.
KELSEN, Hans. Autobiografia de Hans Kelsen...p. XLIII). No mesmo sentido sobre a continuidade nas
cátedras desses docentes e a reelaboração de suas obras jurídicas nazistas após a Segunda Guerra
Mundial com base em valores constitucionais da nova Alemanha: RÜTHERS, Bernd. Verfälschte
Geschichtsbilder deutscher Juristen? Neue Juristische Wochenschrift: NJW, v. 69, fascículo 15, p. 1068-
1074, 2016. p. 10691070.
1038 LARENZ, Karl. Lehrbuch des Schuldrechts: Allgemeiner Teil. 14. ed. München: Beck, 1987. v. 1. § 4, IV, p.

5967, esp. p. 5961; FRASSEK, Ralf. Karl Larenz (19031993): Privatrechtler im Nationalso zialismus und
im Nachkriegsdeutschland. Juristische Schulung - JuS, p. 296301, 1998. §8.
1039 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição...
1040 DÜRIG,Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner
Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung...cit. § III.
1041 DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner
Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung...p. 177179.
1042 DÜRIG, Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner

Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung...cit. § III.


1043 DÜRIG,Günter. Grundrechte und Zivilrechtsprechung. In. MAUNZ, Theodor (Ed.). Vom Bonner
Grundgesetz zur gesamtdeutschen Verfassung...cit. § III.
1044 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976...p. 254.
1045 Em um julgamento de 7 de fevereiro de 1990, o TCF fez expresso uso da linguagem teórica inau gura

por Canaris (“deveres de proteção do Estado): BVerfGE 81, 242.


1046 Sobre a admissão excepcional de eficácia direta no âmbito da proibição de discriminações em
ordem a proteger a dignidade humana: CANARIS, ClausWilhelm. Considerações a respeito da po-
sição de proibições de discriminação no Sistema de Direito Privado. Revista Direitos Fundamentais e
Justiça, ano 7, nº 22, p. 1520, jan./ mar. 2013; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e Direito
Privado: Notas sobre a influência da dogmática alemã dos direitos fundamentais, em especial a
contribuição de ClausWilhelm Canaris, no direito brasileiro. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v.
12, ano 4, p. 6388, jul.set. 2017. esp. p. 8587.
1047 MICHAEL, Lothar; MORLOK, Martin. Grundrechte...p. 243247, p. 286287, p. 457458; HERDEGEN,
Matthias. Artikel 1, Abs. 3. In. MAUNZ, Theodor; DÜRIG, Günter. Grundgesetz Kommentar. 85. ed.
München: Beck, 2019. v. 1. nota marginal 59; GUCKELBERGER, Annette. Die Drittwirkung der
Grundrechte. JuS, fascículo 12, p. 11511157, 2003. esp. p. 1156 (realçando a prevalência da eficácia
indireta, mas informando sobre o aumento das teses em favor da doutrina dos deveres de proteção).
Em sentido idêntico ou complementar: FUCHS, MarieChristine. O efeito irradiante dos direitos
fundamentais e a autonomia do Direito Privado: a “decisão Lüth” e suas consequ ências...p. 228231;
ZUCK, Rüdiger. Das Recht der Verfassungsbeschwerde. 5. ed. rev. München: Beck, 2017, notas marginais
nº 579601 (o TCF não examinará a aplicação do direito ordinário pelos tribunais, cabendolhe sindicar
apenas se a decisão foi conforme ou não aos princípios cons titucionais, o que resulta da eficácia
indireta dos direitos fundamentais).
1048 BYDLINSKI, Franz. Thesen zur Drittwirkung von Grundrechten im Privatrecht. In. RACK, Reinhard

(Org.) Grundrechtsreform. Viena, Colônia, Graz: H. Böhlau, 1985. p. 173187; BYDLINSKI, Franz.
Bemerkungen über Grundrechte und Privatrecht. Österreichische Zeitschrift für öffentliches Recht-
ÖZöR, v. 12, p. 423460, 19621963; MAYER, Heinz. Nochmals zur sogenannten “Drittwirkung” der
Grundrechte. Juristische Blätter, p. 768, 1992. Percebese que não houve mudanças no cenário desde a
década de 1970: KHOL, Andreas. The protection of human rights in relationships be tween private
individuals: The Austrian situation. In. AA.VV. René Cassin. Amicorum discipulorumque liber: Protection
des droits de l’homme dans les rapports entre personnes privées, III. Paris: Pedone, 1972. p. 195213
(com afirmação textual nas p. 212213).
1049 Citemse como exemplos de trabalhos brasileiros, cujos autores não adotam o modelo da eficácia

direta em sua formulação predominante no Brasil ou que expressamente adotam o modelo da


eficácia indireta: “Um conflito entre privados sobre direitos e deveres de normas de conduta, ju-
rídicofundamentalmente influenciadas, do direito civil permanece, material e processualmente, um
conflito jurídico civil” (HECK, Luís Afonso. Direitos fundamentais e sua influência no Direito Civil.
Revista de Direito do Consumidor, no 29, p. 4054, jan./mar. 1999. p. 46); JUNQUEIRA DE AZEVEDO,
Antonio. RTDC: Entrevista com o Prof. Antonio Junqueira de Azevedo. In. JUNQUEIRA DE AZEVEDO,
Antonio. Novos estudos e pareceres de Direito Privado...cit. p. 603; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto
Epistemológico do Direito Civil Contemporâneo na tradição de civil law em face do
neoconstitucionalismo e dos princípios...loc. cit; FIUZA, César. Direito Civil: Curso com pleto...p. 145-
150; MAZUR, Maurício. A dicotomia entre os direitos de personalidade e os di reitos fundamentais. In.
MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JR., Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (Orgs.). Direitos da
personalidade. São Paulo: Atlas, 2012 p. 2564; MARTINS, Leonardo. Liberdade e estado
constitucional...cit. p. 89119; DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos
Fundamentais...p. 95114; DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos
direitos fundamentais...p. 117; “(...) a aplicação direta de prescrições constitu cionais configura um
verdadeiro totalitarismo constitucional, que não respeita os níveis essenciais do ordenamento
jurídico, os quais preveem para cada âmbito do direito a sua correta aplica ção” (DREHMER DE
MIRANDA, Roberta. Algumas notas sobre a “constitucionalização” do Direito Privado...cit. p. 1415;
SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do Direito Privado...cit., p. 96 98 (embora proponha um
modelo próprio, que não impede a eficácia direta em certas circuns tâncias); LEAL, Fernando. Seis
objeções ao Direito Civil constitucional...cit. (embora seja um tra balho mais voltado à crítica
metodológica do Direito CivilConstitucional); TAVARES, André Ramos. Curso de Direito
Constitucional...p. 386 (o texto não esclarece qual a doutrina seguida pelo autor); LEONARDO, Rodrigo
Xavier. Associações sem fins econômicos...cit. p. 115 116; REVERBEL, Carlos Eduardo Dieder.
Drittwirkung e ADi dos bancos: a proteção fundamental do consumidor ao não superendividamento.
Revista de Direito do Consumidor, v. 26, nº 110, p. 1741, mar./abr. 2017 (defendendo a “primazia do
conhecimento do Direito Privado”, embora acentue o caráter inter ventivo da CF/1988 nas relações
privadas); GUERRA FILHO, Willis Santiago. A dimensão processual dos direitos fundamentais. Revista
de Processo, v. 22, nº 87, p. 166174, jul./set. 1997. item I (com alusão ao problema do paralelismo dos
direitos fundamentais e dos direitos da personalidade). A lista revela também a preponderância de
constitucionalistas sobre civilistas na defesa de modelos contrários à eficácia direta dos direitos
fundamentais. Esse dado é importante para se compreen der o avanço da eficácia direta no Direito
Civil brasileiro contemporâneo.
1050 Citemse como exemplos de autores com esse perfil: CHINELLATO, Silmara Juny de Abreu. Liberdade

de expressão: direitos da personalidade e as biografias não autorizadas. Revista Brasileira de Direito


Comparado, v. 44/45, p. 201237, 2014; MORATO, Antonio Carlos. Quadro geral dos direitos da
personalidade. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. v. 106/107, p. 121158,
jan./dez. 2011/2012 (ambos consideram, por exemplo, que não há um di reito geral de personalidade
no CC/2002); MORAES, Bernardo B. Queiroz de. Código Civil e Direito de Família: (In)conveniência de
um microssistema...cit.
1051 STF. RE 201819, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j.

11/10/2005, DJ 27102006, RTJ 2092/821.


1052 A tese da suposta oposição dos civilistas à incidência dos direitos fundamentais nas relações pri-
vadas nunca individualiza os autores que a defendem expressamente. As menções são genéricas,
como esta: “São poucos os autores que negam a incidência dos direitos fundamentais na esfera do
Direito Privado. Todavia há quem considere que essa extensão contra natura de seu âmbito
tradicional de aplicação é desnecessária. As ameaças procedentes dos particulares contemplam se
nas leis cíveis e penais e não na Constituição, que só traça os limites que o poder público não pode
franquear. Esta é a posição daqueles que creem que a Constituição não exerce nenhum papel na
regulação das relações jurídicoprivadas” (BILBAO UBILLOS, Juan María. La consolidación dogmática y
jurisprudencial de la Drittwirkung: Una visión de conjunto...p. 5253). Nesta passa gem, o autor
escreve, na nota de rodapé 14, que “esses autores, civilistas em sua maioria, cha mam a atenção
sobre a lógica de liberdade que atravessa o Direito Privado”. Infelizmente, Bilbao Ubillos não cita
nome algum para fundamentar esse “discurso majoritário” dos civilistas. Ademais, defender soluções
primazes através do Direito Civil não significa negar a eficácia dos direitos fun damentais, mas expõe
um modo de pensar sobre “como” essa eficácia há de ocorrer.
1053 SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do Direito...p. 7073.
1054 DIEDERICHSEN, Uwe. Das Bundesverfassungsgericht als oberstes Zivilgericht: ein Lehrstück der
juristischen Methodenlehre...p. 239.
1055 SCHWABE, Jürgen. Die sogenannte Drittwirkung der Grundrechte...p. 140154; SCHUENER, Ulrich.

Fundamental rights and the protection of the individual against social groups and powers in the
constitutional system of the Federal Republic of Germany. In. AA.VV. René Cassin. Amicorum
discipulorumque liber: Protection des droits de l’homme dans les rapports entre personnes privées III.
Paris: Pedone, 1972. p. 253268 (esp. p. 255).
1056 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte...p. 484492. Na tradução para a língua portuguesa: ALEXY,
Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros,
2008. p. 533542.
1057 O modelo encontrase desenvolvido de modo didático e com rigor metodológico no capítulo sétimo,

com o título “Um modelo adequado”, cf. SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do
Direito...p. 132170, mais esp. a partir da p. 143. Evidentemente que o modelo de Virgílio Afonso da
Silva possui características próprias, até pela ressalva de que não se pretendeu (nem se poderia)
simplesmente transplantar um modelo feito para uma Constituição estrangeira, sem se atentar para
as especificidades nacionais (p. 143145).
1058 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte...p. 484485.
1059 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte...p. 488489.
1060 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte...p. 490491.
1061 STF. RE 109691, Rel. Min. Francisco Rezek, Segunda Turma, j. 1881987, DJ 2591987, p. 20415.
1062 HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 1991 (citamse datas diferentes para as edições).


1063 HESSE, Konrad. La fuerza normativa de la Constitución. In. HESSE, Konrad. Escritos de Derecho
Constitucional. Seleção, tradução e introdução de Pedro Cruz Villalon. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1983.
1064 HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland. 20. ed. Heidelberg:
C. F. Müller, 1999 (há também citações de edições anteriores, particularmente da décima sexta).
1065 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Tradução da

20. ed. alemã por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998.
1066 HESSE, Konrad. Bedeutung der Grundrechte. In. BENDA, Ernst; MAIHOFER, Werner; VOGEL, Hans-
Jochen. Handbuch des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland. Berlin: De Gruyter, 1994 (na
edição citada, omitese do título o complemento “der Bundesrepublik Deutschland” e indicase 1995
como o ano da edição, embora a última edição seja de 1994, reimpressa em 2012).
1067 HESSE, Konrad. La interpretación constitucional. In. HESSE, Konrad. Escritos de Derecho Constitucional.

Seleção, tradução e introdução de Pedro Cruz Villalon. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales,
1983.
1068 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha...cit.
1069 HESSE, Konrad. Derecho Constitucional y Derecho Privado. Tradução e introdução de Ignacio Gu-
tiérrez. Madrid: Civitas, 1995, traduzido de: HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...cit.
1070 Éo único acórdão de uma turma de Direito Privado do STJ: HC 12.547/DF, rel. Min. Ruy Rosado De
Aguiar, Quarta Turma, j. 01/06/2000, DJ 12/02/2001, p. 115.
1071 O acórdão é este: STF. REsp 976.648/PE, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 04/11/2008, DJe

01/12/2008. Não há, contudo, indicação dos elementos prétextuais da obra (edição, editora, data e
tradutor).
1072 Como exemplo, citase: “A Constituição Federal, no § 7º do art. 57, incluiu o pagamento referente à
sessão extraordinária no conceito de verba indenizatória, revelando a ‘vontade constitucional’, na
expressão de Konrad Hesse, sobre o regime jurídico aplicáveis à referida parcela (STJ. REsp
502.739/PE, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, p. 212).
1073 HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien – Eine rechts-

vergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive –


Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering...§ 20, III.
1074 HÄBERLE, Peter. Zum Tod von Konrad Hesse (1919 bis 2005). Archiv des öffentlichen Rechts - AöR, v.
130, 2005, p. 289293, 2005. p. 289.
1075 HÄBERLE, Peter. Zum Tod von Konrad Hesse (1919 bis 2005)...p. 290.
1076 HÄBERLE, Peter. Zum Tod von Konrad Hesse (1919 bis 2005)...p. 292.
1077 HÄBERLE, Peter. Zum Tod von Konrad Hesse (1919 bis 2005)...p. 289.
1078 SCHWABE, Jürgen (Org.). Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal
Alemão...p. 244, 230 (BVerfGE 80, 137, caso das cavalgadas na floresta); p. 530 (BVerfGE 69, 315, caso
da usina nuclear de Brokdorf).
1079 No original, praktische Konkordanz.
1080 SCHWABE, Jürgen (Org.). Cinqüenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal
Alemão...p. 373374 (BVerfGE 93, 1, caso do crucifixo).
1081 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte. 5. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1996 (cita Elementos de

Direito Constitucional da República Federal da Alemanha; um capítulo do Manual de Benda Maihofer-


Vogel e dois artigos); ALEXY, Robert. Theorie der juristischen Argumentation: Die Theorie des rationales
Diskurses als Theorie der juristischem Begründung. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1983.
1082 CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und Privatrecht. Archiv für die civilistische Praxis...cit. (cita
apenas os Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha na p. 222); CANARIS,
ClausWilhelm. Grundrechte und Privatrecht: eine Zwischenbilanz. Berlin: New York: Walter de Gruyter,
1999 (cita Direito Constitucional e Direito Privado; Die verfassungsrechtliche Kontrolle der
Wahrnehmung grundrechtlicher Schutzpflichten des Gesetzgebers capítulo de um liber amicorum
para Ernst Gottfried Marenholz); CANARIS, ClausWilhelm. A influência dos di reitos fundamentais
sobre o Direito Privado na Alemanha. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais, no 3, p.
373392, jan./jun. 2004.
1083 LADEUR, KarlHeinz. Ein Recht der Netzwerke für die Weltgesellschaft oder Konstitutionalisierung der

Völkergemeinschaft? Archiv des Völkerrechts, v. 49, no 3, p. 246275, Sep. 2011.


1084 STARCK, Christian. Derechos fundamentales y Derecho Privado...cit. p. 74 e p. 79 (cita Direito
Constitucional e Direito Privado, além dos Elementos de Direito Constitucional).
1085 BACHMANN, Gregor. Private Ordnung: Grundlagen ziviler Regelsetzung. Tübingen: Mohr Siebeck,

2006.
1086 BRÜGGEMEIER, Gert. Constitutionalisation of Private law: The German perspective. In. BARKHUYSEN,
Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law. Leiden, Boston: Martinus
Nijhoff, 2006. p. 5982 (citando Direito Constitucional e Direito Privado).
1087 ASCENSÃO, José de Oliveira. Pessoa, direitos fundamentais e direitos de personalidade. Revista

Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 7, no 26, p. 4366, abr./jun. 2006.


1088 NUNES, António José Avelãs. A Constituição européia: A constitucionalização do neoliberalismo.
Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais, no 6, p. 49119, jul./dez. 2005.
1089 RIBEIRO, Joaquim de Sousa. Constitucionalização do Direito Civil...cit. (cita Direito Constitucional e

Direito Privado).
1090 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 5. ed., rev. e actualizada. Coimbra: Coimbra
Editora, 2012. v. 4. (cita Direito Constitucional e Direito Privado).
1091 NOVAES, Jorge Reis. Direitos fundamentais: Trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra Editora, 2006

(cita Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha); NOVAIS, Jorge Reis. As
restrições aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição. 2. ed. Coimbra:
Coimbra Editora, 2010 (cita Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha e
capítulo do Manual de BendaMaihoferVogel).
1092 ABRANTES, José João Nunes. A vinculação das entidades privadas aos direitos fundamentais...cit.
1093 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976. 4. ed.
Coimbra: Almedina, 2008 (cita Direito Constitucional e Direito Privado).
1094 MACCRORIE, Benedita Ferreira da Silva. A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais... cit.

(refere Direito Constitucional e Direito Privado e capítulo do Manual de BendaMaihofer Vogel).


1095 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição...cit. Coimbra:
Almedina, 1997 (além de outras obras de Hesse, cita expressamente o “princípio da força nor mativa
da constituição”, sem mencionar Hesse, nas pp. 241242, 633, 10241025; com menção expressa ao
livro A força normativa da Constituição (sem indicação de página), p. 1014; com men ção expressa ao
livro A força normativa da Constituição (com indicação da página citada, p. 19 ss, na edição alemã), p.
1050; CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador...cit. (além
de outras obras de Hesse, cita a edição alemã de A força normativa da Constituição, p. 99 e 119).
1096 QUEIROZ, Cristina. Direitos fundamentais: Teoria Geral. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2010 (além

de outras obras de Hesse, cita a edição alemã de A força normativa da Constituição).


1097 LINDENBERGH, Siewert. The constitutionalisation of Private law in The Netherlands. In.
BARKHUYSEN, Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law. Leiden, Boston:
Martinus Nijhoff, 2006. p. 97128.
1098 SMITS, Jan. Private law and fundamental rights: A sceptical view. In. BARKHUYSEN, Tom;

LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law. Leiden, Boston: Martinus Nijhoff,
2006. p. 922.
1099 NIEUWENHUIS, Hans. Fundamental rights talk: An enrichment of legal discourse in Private law? In.
BARKHUYSEN, Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law. Leiden, Boston:
Martinus Nijhoff, 2006. p. 18.
1100
MEYER, David D. The constitutionalization of Family law. Family Law Quarterly, v. 42, no 3, fascículo
especial, p. 529572, outono, 2008.
1101
ENGLE, Eric. Third party effect of fundamental rights (Drittwirkung). Hanse Law Review, v. 5, no 2, p.
165173, 2009.
1102 PHILLIPSON, Gavin; WILLIAMS, Alexander. Horizontal effect and the constitutional constraint. The

Modern Law Review, v. 74, no 6, p. 878910, nov. 2011.


1103 BANAKAS, Stathis. The constitutionalisation of Private law in the UK: Is there an emperor inside the
new clothes? In. BARKHUYSEN, Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalisation of Private law.
Leiden, Boston: Martinus Nijhoff, 2006. p. 8396.
1104 ZUCCA, Lorenzo. Constitutional dilemmas: Conflicts of fundamental rights in Europe and the USA.

Oxford: Oxford University Press, 2008.


1105 ALPA, Guido. The constitutionalization of Private law in Italy. Oregon Review of International Law. v. 2,
p. 83107, 2000.
1106 PARK, KyuHwan. Die Drittwirkung der Grundrechte des Grundgesetzes im Vergleich zum koreanischen
Verfassungsrecht. (Tese de Doutorado). Faculdade de Direito, Universidade de Halle Wittenberg, 2004
(cita Elementos de Direito Constitucional, Direito Constitucional e Direito Privado, Significado dos
Direitos Fundamentais (no Manual de BendaMaihoferVogel e em uma versão publicada na EuGRZ
1978/429).
1107 LÓPEZ AGUILAR, Juan Fernando. Derechos fundamentales y libertad negocial: Sobre el espacio
constitucional para la autonomia de la voluntad entre particulares. Madrid: Ministerio de Justicia,
Secretaria General Tecnica, Centro de Publicaciones, 1990.
1108 LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do Direito Privado...cit.
1109 KULL, Irene. Principle of good faith and constitutional values in Contract law. Juridica International, v.

7, p. 142148, 2002.
1110 Expressão originalmente utilizada em: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. O direito ao nome, à imagem e
outros relativos à identidade e à figura social, inclusive a intimidade. In. SIMÃO, José Fernando;
BELTRÃO, Silvio Romero (Coords.). Direito Civil: Estudos em homenagem a José de Oliveira Ascensão.
São Paulo: Atlas, 2015. v. 2. p. 9.
1111 Sobre o apego a autores clássicos mais antigos, no âmbito do Direito Civil e sua metódica: MENEZES

CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português...v. 1, t. 1. p. 292.


1112 Paul Laband (18381918), professor de Direito da Universidade de Estrasburgo, representa uma fase
inicial do Direito Público na Alemanha do século XIX: um positivismo ainda muito influencia do pela
metodologia do Direito Privado, de inspiração pandectista. Georg Jellinek (18511911), professor de
Teoria Geral do Estado nas Universidades da Basileia e de Heidelberg, representava um positivismo
jurídico de matriz monista, baseado em três postulados: a) o direito é positivo; b) o Estado tem o
monopólio nomogenético; c) o Estado é dotado de personalidade e autonomia jurídica. A crítica de
Hesse quanto à compartimentalização entre Constituição e realidade política no pensamento de
Jellinek não é exagerada (BERCOVICI, Gilberto. Die dirigierende Verfassung und die Krise der
Verfassungslehre am Beispiel Brasiliens. Verfassung und Recht in Übersee -VRÜ, v. 37, p. 286330, 2004.
p. 290293).
1113 No original, Über Verfassungswesen.
1114 Em alemão, ein Stück Papier.
1115 HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien – Eine rechts-
vergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive –
Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering...p. 665.
1116 A respeito, vejase: “O papel dos juristas foi crucial para a consolidação deste modelo liberal de
Estado de Direito na Europa. Os modelos clássicos, talvez, possam ser os de Georg Jellinek, na
Alemanha, e de Raymond Carré de Malberg, na França. Jellinek pretendeu criar um sistema de
validade universal, à margem da história e da realidade” (BERCOVICI, Gilberto. As possibilidades de
uma Teoria do Estado. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, no 49, p. 81100, jul./dez., 2006. p. 83).
1117 HESSE, Konrad. Die normative Kraft der Verfassung: Freiburger Antrittsvorlesung. Tübingen: Mohr

(Siebeck), 1959, p. 3, 6, 9, 1012.


1118 HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland...p. 29, nota
marginal 75.
1119 Cf. SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação constitucional e sincretismo metodológico. In. SILVA,

Virgílio Afonso (Org.). Interpretação constitucional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: 2007. p. 132.
1120 Essapretensão “modesta”, segundo Virgílio Afonso da Silva (Interpretação constitucional e sin-
cretismo metodológico. In. SILVA, Virgílio Afonso (Org.). Interpretação constitucional... cit. p. 118)
estendese a outras obras de Konrad Hesse: “Não há indícios de que Hesse quisesse criar uma teoria
geral da interpretação constitucional. O título do seu manual, por si só, já aponta para uma
confirmação disso.” Embora, como realça Virgílio Afonso da Silva, não seja apenas o título do livro
Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha que patenteia seus limites. Os
conceitos de interpretação constitucional apresentados no livro podem ser facilmente encon trados
“em outras obras de direito constitucional alemão”.
1121 HESSE, Konrad. Die normative Kraft der Verfassung...p. 15.
1122 “Retrocessão. O artigo 35 do Declei 3.365 não revogou o art. 1.150 do Código Civil, que per manece

como garantia complementar de outra, maior, outorgada pelo art. 141, par16, da Constituição.
Recurso extraordinário conhecido e provido” (STF. RE 24190, rel. Min. Antonio Villas Boas, Segunda
Turma, j. 08/11/1957, DJ 12121957, p. 16456, RTJ 31, p. 784).
1123 HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien – Eine rechts-
vergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive –
Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering...p. 667670.
1124 Virgílio Afonso da Silva (Interpretação constitucional e sincretismo metodológico. In. SILVA, Virgílio

Afonso (Org.). Interpretação constitucional...cit. p. 120121) permite que se trace um paralelo en tre a
exarcebação do estudo (e das publicações) sobre constitucionalização do Direito Civil no país e no
exterior, com idênticos excessos em torno da interpretação constitucional, da força normati va da
Constituição e da obra de Hesse no Brasil: “A propagação que os ‘princípios de interpretação
constitucional’ alcançaram no Brasil pode ser considerada, por isso, exacerbada”. Na nota de roda pé
11, ele complementa: “Uma amostra interessante da discrepância entre a recepção das idéias de
Hesse na Alemanha e no Brasil – e também da obrigatoriedade do uso de expressões alemãs – pode
ser obtida via Internet. Em qualquer serviço de busca, basta pesquisar, por exemplo, os termos Hesse,
Einheit der Verfassung (‘unidade da constituição’) e normative Kraft der Verfassung (‘força normativa da
constituição’). Mesmo consultando esses ‘princípios’ apenas em alemão, o resultado é inusitado:
somente serão encontradas páginas brasileiras”.
1125 A palavra “constitucionalização” também só aparece uma única vez em A força normativa da
Constituição, quando Hesse se refere à “constitucionalização de interesses momentâneos ou par-
ticulares”.
1126 HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland...p. 159, nota

marginal 355.
1127 HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland...p. 159, nota
marginal 356.
1128 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 25.
1129 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 39.
1130 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 7.
1131 Essas ideias encontram aderência com o que escreve Heloisa Helena Barboza, quando ela analisa
passagens de Hesse em Verfassungsrecht und Privatrecht: BARBOZA, Heloisa Helena. O Direito de
Família e o Código Civil de 2002: Algumas considerações gerais. In. LEITE, Eduardo de Oliveira;
PACHECO, José da Silva. Revista Forense: Edição comemorativa 100 anos. Rio de Janeiro: Forense,
2006, p. 401418, especificamente: p. 403404.
1132 Exemplo disso é o trabalho de Antonio Baldassarre (La normatività della Costituzione e i suoi “ne-

mici”. Rivista di Diritto Costituzionale: Rivista dell’ Associazione “Gruppo di Pisa”, p. 351, 2007), que se
ocupa da normatividade da Constituição sob diferentes enfoques e tomando por base as obras
Rudolf Smend, Peter Häberle, Gustavo Zagrebelsky, Robert Bork, Antonin Scalia e Carl Schmitt.
1133 HERZOG, Benjamin. Anwendung und Auslegung von Recht in Portugal und Brasilien – Eine rechts-
vergleichende Untersuchung aus genetischer, funktionaler und postmoderner Perspektive –
Zugleich ein Plädoyer für mehr Savigny und weniger Jhering...p. 669670. Por uma questão de justiça,
registrese que nem Susanna Pozzolo (Neoconstitucionalismo y especificidad de la inter pretación
constitucional...cit. p. 339340) considera Konrad Hesse um neoconstitucionalista. Essa "privilégio" ela
reserva para Ronald Dworkin, Robert Alexy, Gustavo Zagrebelsky e "parcialmente" a Carlos Santiago
Nino.
CAPÍTULO DÉCIMO PRIMEIRO

EFICÁCIA INDIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS


RELAÇÕES PRIVADAS: PRINCIPAIS PROBLEMAS E
PROPOSTA DE UM MODELO

§ 62. O “jogo dos absurdos não aparentes” e duas posições realistas


sobre a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
§ 63. A interpretação do art. 5º, § 1o, CF/1988, e a questão da eficácia
dos direitos fundamentais em relação aos particulares. § 64. Natureza
tendencialmente abstrata das normas de direitos fundamentais. § 65. A
indispensabilidade da filtragem dos direitos fundamentais pelo Direito
Civil. § 66. As cláusulas gerais: função, suficiência e combinação com
nor mas objetivas. § 67. O barateamento dos princípios constitu-
cionais e a banalização dos direitos fundamentais. § 68. Direito Civil:
soluções intrassistemáticas e influência no sistema de Direito Público.
§ 69. Unidade da ordem jurídica e fundamen tação do Direito Civil: a
autonomia privada. § 70. Preservação do espaço normativo da lei. §
71. A questão dos poderes so ciais ou poderes privados. § 72. O fator
de correção interno e o modelo fraco de eficácia indireta dos direitos
fundamentais.
§62. O “JOGO DOS ABSURDOS NÃO APARENTES” E DUAS POSIÇÕES
REALISTAS SOBRE A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM
RELAÇÃO AOS PARTICULARES
Imaginem-se duas situações hipotéticas:
(1) uma pessoa é contratada por uma empresa para o cargo de gerente de
uma filial em um processo seletivo, de que participaram outros nove
concorrentes. O recrutamento constituiu-se de (i) uma redação, cujo objeto era
descrever sucintamente as experiências profissionais anteriores e quais as
ambições do candidato ao emprego; (ii) uma dinâmica de grupo, na qual os
candidatos se submetiam a brincadeiras infantis; e (iii) uma entrevista com o
gerente-geral da firma. Um dos candidatos não selecionado ingressou na justiça,
requereu a exibição dos documentos nos quais constasse a fundamentação
utilizada pela empresa para sua reprovação e a escolha do vencedor. No mérito,
requereu a nulidade do concurso por violação do princípio da impessoalidade e
da fundamentação dos atos administrativos, em razão do princípio da unidade da
ordem jurídica e da incidência imediata dos direitos fundamentais nas relações
privadas.
(2) um condômino organiza uma festa no salão do edifício e convida todos
os moradores, menos o ocupante do apartamento do primeiro andar. A
confraternização está marcada para o mês seguinte. O morador preterido
ingressa na Justiça e pede para ser incluído na lista de convidados, sob pena de
reparação por danos morais, porque a conduta do anfitrião violou os princípios
constitucionais da solidariedade e da isonomia. Como ponto de relevo em sua
argumentação está o fato de que ele seria o único locatário no condomínio. Sua
exclusão também revelaria traços discriminatórios.
Os elementos descritivos dos dois casos contêm traços aberrantes, mas o
caráter hiperbólico dos exemplos permite imaginar quais os efeitos do recurso
direto a princípios constitucionais e a direitos fundamentais nas relações
privadas. Hipóteses ainda mais curiosas poderiam ser formuladas: (i) um noivo
que exige a aplicação dos princípios do contraditório e da ampla defesa a sua
relação esponsalícia, que foi rompida pela noiva sem indicação dos motivos
determinantes; (ii) o sindicato que move uma ação contra determinada empresa
porque os filhos e o genro do presidente do Conselho de Administração ocupam
cargos na diretoria, o que seria um caso de nepotismo, condenável pelo princípio
da moralidade e da impessoalidade, aplicáveis diretamente às relações públicas e
privadas.
Esses exemplos, a se prosseguir a tendência de intervenção do Direito
Público, particularmente do Direito Constitucional, nos espaços do Direito
Privado, especificamente do Direito Civil, poderão se tornar reais ou frequentes
em um período relativamente curto de tempo.
Não se trata de argumentos apocalípticos sobre o futuro do Direito Civil
quando as relações jurídicas de natureza privada são submetidas à jurisdição
constitucional. Embora, até para que não se fique com a imagem de meros
exemplos hiperbólicos, já existem precedentes de ações de locatário contra
locador em razão (i) da recusa de se autorizar o primeiro a instalar antenas
parabólicas em prédios de apartamentos, em área comum;1134 (ii) de o locador
fumar dentro do imóvel locado, o que exalaria o odor do cigarro para os
apartamentos vizinhos, incomodando os demais condôminos.1135
Esses casos revelam os riscos de uma nova forma de autoritarismo estatal,
que não é mais aquele exclusivamente baseado no poder de polícia, na atividade
regulatória ou nos controles administrativos puros. Quanto a estes últimos,
prevalece a advertência de Konrad Hesse, ao invocar as lições de Alexis de
Tocqueville, que descreveu as consequências de um Estado autoritário “já há
cento e cinquenta anos”: é um “poder imenso e tutelar que se encarrega por si só
de assegurar seus gozos e de velar por seu destino”. Esse poder “é absoluto,
minucioso, regular, presciente e benigno”. Teria o perfil de um pátrio-poder, “se,
como ele, tivesse por objeto preparar os homens para a idade viril; mas, ao
contrário, não intenta mais do que fixá-los irremediavelmente na infância”. Ele
pretende que “os cidadãos gozem, desde que só pensem em gozar”. Esse Estado-
providencial “trabalha com interesse” para a felicidade dos cidadãos, “mas quer
ser seu único agente e seu árbitro exclusivo”. Zela por “sua segurança,
proporciona e garante suas necessidades, facilita seus prazeres, conduz seus
principais assuntos, dirige sua indústria, regula suas sucessões, divide suas
heranças”. Por que não lhes poderia liberar “por completo do transtorno de
pensar e do esforço de sobreviver?” A cada dia, ele “faz menos útil e mais raro o
emprego do livre-arbítrio”, ao tempo em que “encerra a ação da vontade em um
espaço menor”, privando o cidadão, aos poucos, “até da autodeterminação...”.1136
Esse quadro traçado por Konrad Hesse não é muito diverso do que autores
como Bernhard Schlink, Jutta Limbach, Uwe Diederichsen, Ernst-Wolfgang
Böckenförde, Ernst Forsthoff e Gunther Teubner já delinearam em seus estudos
sobre o tema dos direitos fundamentais, o papel da jurisdição civil ordinária e os
espaços normativos do Direito Privado. Não se vai aqui retomar a linha
argumentativa que há sido desenvolvida ao longo da tese e que passa pelo
reconhecimento da “grande dicotomia”, do controle conceitual da
constitucionalização do Direito Civil e, agora, pela definição de um modelo para
a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares.
De imediato, é importante tomar duas posições prévias sobre o objeto deste
capítulo.
(a) Impossibilidade de retorno às funções clássicas dos poderes do
Estado. Não haverá mais, ao menos enquanto durar o modelo de
constitucionalismo prevalecente nas democracias ocidentais, um retorno às
funções clássicas dos poderes do Estado, o que implica também uma negativa ao
regresso à teoria clássica dos direitos fundamentais, ainda que seja ela
extremamente sedutora e coerente. A verticalização da democracia, o abandono
da função pública (e dos processos eleitorais) por parte de uma elite política
tradicional e a demanda por soluções imediatas para os problemas da sociedade
(que se não compagina com demorados processos legislativos) são elementos
ácidos que corroem impiedosamente os esquemas tradicionais de organização
dos poderes estatais. Até que sobrevenha uma crise institucional nos tribunais
constitucionais, o que não é totalmente improvável em nações da “modernidade
tardia”, caberá a essas cortes o papel de moderar conflitos e, como efeito
colateral, o de resolver impasses que exercem a ação paralisante sobre os
parlamentos.
Nicolau Maquiavel “inventou” a Política a partir da observação dos
processos de conquista, manutenção e perda do poder em seu tempo. Sua
invenção, que lhe custou ver seu nome transformado em sinônimo de algo
sórdido e pérfido, revelou-se eficaz: a Política era uma forma mais limpa e
menos sanguinária de se conquistar o poder. Dispensavam-se os meios
truculentos e cruéis para esse fim, tão bem descritos por William Shakespeare
em uma certa peça escocesa cujo nome não é de bom-tom seja repetido. Hoje, a
Política parece ter-se deslocado para o Direito. Não no sentido de politização da
Justiça ou de judicialização da Política. A ideia subjacente está em que o
aparato judiciário é cada vez mais convidado a atuar como um órgão senatorial
de equilíbrio de interesses na luta quotidiana de grupos, corporações e agentes,
os quais antes se apresentavam apenas nos Parlamentos nacionais. Esse novo
papel da função jurisdicional do Estado dificilmente será reconduzido aos limites
clássicos da democracia liberal.1137
(b) O Direito Privado será irradiado pelos direitos fundamentais. A
intervenção dos direitos fundamentais no Direito Privado é outro dado
irrecusável trazido pelos tempos contemporâneos. Não que isso seja algo
inteiramente novo. As diversas formas de relacionamento da Constituição com o
Direito Privado acham-se documentadas e devidamente classificadas nesta tese.
A própria ideia de constitucionalização do Direito Privado pode ser, a partir dos
modelos aqui propostos, melhor organizada para que se compreendam seus
exatos limites. A principal diferença da contemporaneidade está no
reconhecimento, desde o caso Lüth, de que particulares podem pretender contra
particulares e, como fundamentação de seus pedidos, indicarão direitos
fundamentais. Essa é uma realidade que se deverá integrar às ferramentas
teóricas e às práticas dos privatistas.
Essas duas posições tem o potencial de liberar energias para a defesa dos
espaços realmente importantes e indispensáveis ao Direito Privado e ao Direito
Civil, em particular, nos dias atuais. Se os objetivos da Primeira Parte e da
Segunda Parte desta tese foram alcançados, o que torna desnecessário insistir
nos tópicos da autonomia epistemológica e das restrições à
sobreconstitucionalização, cabe agora definir como tornar operacional o modelo
de eficácia indireta ou mediata dos direitos fundamentais nas relações privadas.
Este capítulo tem por objetivo demonstrar a inadequação do modelo da
eficácia direta ao tempo em que se propõe a adoção do modelo fraco da eficácia
indireta no Brasil.
§63. A INTERPRETAÇÃO DO ART. 5º, § 1º, CF/1988, E A QUESTÃO DA
EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM RELAÇÃO AOS
PARTICULARES
Não é possível defender a eficácia direta com fundamento no art. 5o, § 1o,
CF/1988. Essa inviabilidade já foi devidamente exposta por autores do Direito
Constitucional.1138 Como já exposto alhures, essa aproximação demonstra haver
“uma confusão entre a eficácia dos direitos fundamentais, sua forma de produção
de efeitos e seu âmbito de aplicação”.1139 A norma constitucional brasileira
objetiva comprovar “que nem toda norma constitucional dependente de
regulamentação é norma programática, visto que o seu conteúdo é que
informará, ao final, se ela o é, ou não”. Assim, “o fato de que não se pode extrair
a conclusão, a partir do art. 5o, § 1o, da CF, que os direitos fundamentais são
diretamente aplicáveis nas relações privadas, não implica, necessariamente,
qualificá-los de normas programáticas ou termo afim”.1140
O argumento que nega a associação do art. 5º, § 1º, CF/1988, com a
Drittwirkung é reforçado por um exame da origem dessa regra. O constituinte,
ao proclamar que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais
têm aplicação imediata”, tratou de dar expressão jurídica às teorias sobre a
eficácia e aplicabilidade de normas constitucionais, cuja elaboração remonta às
aulas de José Horácio Meirelles Teixeira, posteriormente recopiladas em livro
por Maria Garcia, e de José Afonso da Silva. O primeiro autor (Meirelles
Teixeira) com a classificação das normas de eficácia plena e de eficácia limitada
ou reduzida, subdivididas as últimas entre as programáticas e as de legislação. O
segundo (Afonso da Silva) com a divisão entre normas de eficácia plena, contida
e diferida.1141
O debate sobre a necessidade de regulamentação ou não das normas
constitucionais para que fossem imediatamente aplicáveis era central logo após a
vigência da CF/1988. As disputas políticas entre as forças ditas conservadoras (o
Centrão) e as ditas progressistas obrigou a que muitas regras constitucionais
expressassem uma solução de compromisso, deixando para o legislador a
concretização do comando por meio de uma fórmula que aparece mais de 50
vezes no texto constitucional, a saber: “nos termos da lei”. A própria CF/1988
criou dois mecanismos para ultrapassar esse condicionamento ao legislador ou à
Administração, que consistem no mandado de injunção e na ação direta de
inconstitucionalidade por omissão. Com-prova-se a conexão entre o art. 5º, § 1º,
CF/1988, e essa controvérsia pelo número de textos publicados na primeira
década após a vigência da nova Constituição sobre o mencionado dispositivo e a
aplicabilidade imediata das normas constitucionais independentemente da edição
de lei pelo Congresso Nacional. Em muitos desses escritos analisaram-se os
limites do mandado de injunção e da ADO em face de certas normas magnas.1142
Houve até críticas ao constituinte pela redação do art. 5º, § 1º, CF/1988, por
trazer em si uma aparente contradictio in terminis, dado que a aplicabilidade
imediata dispensaria o writ da injunção e a ADO.1143 Outra censura, de autoria de
Pinto Ferreira, reputava de ilusórias as conquistas jurídicas que a própria
Constituição não tinha reais possibilidades de cumprir. Para isso, ele citava um
aforismo de Karl Marx: “Pode-se colocar na Constituição tudo o que se quiser,
contanto que não se aplique”.1144
José Afonso da Silva, em seu curso de Direito Constitucional, mesmo em
edições mais recentes, confirma a hipótese aqui apresentada: “A Constituição é
expressa sobre o assunto, quando estatui que as normas definidoras dos direitos e
garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Ocorre, porém, “que isso não
resolve todas as questões, porque a Constituição mesma faz depender de
legislação ulterior a aplicabilidade de algumas normas definidoras de direitos
sociais, enquadrados dentre os fundamentais”.1145
Note-se que não se está a examinar o acerto ou a atualidade da
classificação de José Afonso da Silva. Objetiva-se apenas descrever que o art. 5º,
§ 1º, CF/1988, foi pensado e redigido para a mencionada ordem de problemas,
tão relevante após a vigência da CF/1988 e que hoje deixou de ter maior
interesse prático em razão da virada jurisprudencial ocorrida no STF, ao conferir
força mandatória plena à injunção, no julgamento do MI 670/ES e do MI
708/PB.1146
A interpretação ora criticada é um equívoco infelizmente disseminado na
literatura jurídica nacional e que tem produzido efeitos muito negativos na
compreensão do problema da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos
particulares. Confun-de-se eficácia com aplicabilidade das normas
constitucionais e, com isso, extrai-se um comando impossível de ser encontrado
no art. 5o, § 1o, CF/1988.1147
O contraste desse dispositivo com a redação de outras constituições, como
a sul-africana (art. 8.2), é notável e não permite que se amplie o sentido da regra
brasileira, por mais que se deseje enxergar em sua redação uma pretensa
justificativa para a teoria da eficácia direta no país.
O art. 18o, item 1, da Constituição da República Portuguesa é outro bom
exemplo para desconstruir a tese da eficácia direta a partir do art. 5o, § 1o,
CF/1988. Seu teor é bastante objetivo: “Os preceitos constitucionais respeitantes
aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as
entidades públicas e privadas”. Mesmo com a evidente menção a entidades
públicas e privadas, a doutrina portuguesa reconhece que “se é certo que aí se
afirma claramente que os preceitos constitucionais vinculam as entidades
privadas, não se diz em que termos se processa essa vinculação e,
designadamente, não se estabelece que a vinculação seja idêntica àquela que
obriga os poderes públicos”.1148 Como já se demonstrou em pesquisas
bibliográfica e empírica sobre o comportamento da doutrina e da jurisprudência
de Portugal sobre a eficácia direta ou indireta, não há consenso sobre o tema,
embora se identifique uma tênue primazia do modelo da eficácia indireta.1149
É até possível a defesa da doutrina da eficácia direta com outros
argumentos, mas a autoridade do art. 5o, § 1o, CF/1988 não pode ser aceita para
tal fim. Nesse aspecto, o Direito Constitucional apresenta respostas muito
objetivas ante essa impossibilidade teórica, a despeito de posições em contrário
muito respeitáveis.
§64. NATUREZA TENDENCIALMENTE ABSTRATA DAS NORMAS DE
DIREITOS FUNDAMENTAIS
A segunda linha de defesa da eficácia indireta está na abstração das normas
de direitos fundamentais. É natural e até esperável que essas normas possuam
um nível de abstração maior do que as equivalentes situadas no direito ordinário.
Intimidade, função social, garantia da propriedade, igualdade e liberdade, para se
ficar apenas nesses exemplos, são conceitos com baixa capacidade operacional
dada sua (necessária) generalidade e sua (esperável) abstração. Quando
normatizados no texto constitucional, eles não perdem tais caracteres. Os
exemplos do § 62 assim o comprovam. Já se teve a oportunidade de aludir a uma
certa “cláusula Vito Corleone” para simbolizar a diferença estrutural do sistema
de Direito Privado e do sistema de Direito Público, bem como das relações
jurídicas que lhes são subjacentes.1150 A liberdade e a igualdade no Direito Civil
(ou no código civil) não correspondem a idênticos conceitos no Direito
Constitucional (ou na constituição).
A eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações jurídico-
civilísticas, sem a intermediação legislativa e principiológica do Direito Civil, é
problemática por degradar a Constituição e por ignorar os espaços de
discricionariedade e de conformação do legislador ordinário, de decisão dos
particulares e os âmbitos de racionalidade intrínseca ao Direito Privado: “Ao se
derivar diretamente uma vinculação privada dos direitos fundamentais, a obra do
legislador seria colocada de lado, em função da necessidade constante de
ponderação judicial entre dois titulares distintos de direitos fundamentais, que
nessa situação ao mesmo tempo estariam obrigados por esses direitos”.1151
Negar a eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares teria
as mesmas consequências, em termos de racionalidade argumentativa, que a
admissão da eficácia direta em sentido pleno. Ao menos esta é a leitura de
Konrad Hesse: “A consequência é que os tribunais da ordem civil argumentam
amplamente em seus fundamentos com os direitos fundamentais, e que ademais
se reforça a tendência a deixar fluir os direitos fundamentais no Direito Privado
também ali onde este de modo algum depende deles”.1152
Essa abstração dos direitos fundamentais resulta na necessidade de que
atue o legislador a fim de que eles ganhem uma dimensão objetiva nas relações
privadas. Não se deve temer por essa participação do legislador no processo de
concretização dos direitos fundamentais, até porque esse “deve emitir normas de
direito civil não contrárias à Constituição”, pois “o juiz e os órgãos
administrativos não devem aplicar normas inconstitucionais”.1153 Mais ainda: é
necessário proceder a “atenuações à plena afirmação de um ou outro princípio
constitucional, isoladamente considerado, por força de princípios fundamentais
de direito privado”, pois “sem esta atenuação a vida jurídico-privada, para além
das incertezas derivadas do carácter muito genérico dos preceitos
constitucionais, conheceria uma extrema rigidez, inautenticidade e irrealismo, de
todo ponto indesejáveis”.1154
Um argumento geralmente utilizado quando se examina este tópico é o
seguinte: se o particular age ou deixa de agir em função de uma norma, qual
diferença faz se esta é legal ou continente de um direito fundamental? A resposta
já foi oferecida pela doutrina alemã: as normas de Direito Civil podem ser
dispositivas, o que implica não possuírem competência sobre a autonomia dos
particulares, por seu amplo poder derrogatório sobre elas, ou preceptivas, como
algumas sobre retenção de benfeitorias ou o exercício do poder parental. As
normas continentes de direitos fundamentais, no geral, não apresentam tal
clivagem e são, por si sós, de elevado nível de intervenção na esfera privada. O
conteúdo jurídico dos direitos fundamentais é diverso daquele inerente às
normas ordinárias, posto que, em muitos casos, haja o paralelismo dos direitos
fundamentais, ou a concordância prática entre ambos. Mas, nessas hipóteses, a
passagem primária pelo Direito Civil permite, v.g., distinguir o que é dispositivo
e o que é preceptivo, além de preservar a intervenção para casos muito
excepcionais. A eficácia direta parte do princípio de que tudo pode ser objeto de
incidência dos direitos fundamentais. A eficácia indireta parte do princípio
inverso: é necessário justificar a incidência em uma determinada relação entre
privados, o que impõe elevados custos argumentativos e de fundamentação.1155
Não há uma concorrência por espaços entre a Constituição e o legislador
ordinário. Este último tem uma função de grande relevo para a democracia: ao
reduzir o grau de abstração constitucional, restringe a esfera de
discricionariedade de outros agentes públicos (o administrador e o juiz),
impondo-lhes uma valoração prévia, democrática e representativa das pautas
axiológicas escolhidas pelo povo em sua regular e periódica substituição de seus
procuradores ao Parlamento.1156 Trata-se, por conseguinte, de um problema de
legitimidade democrática para a transposição de valores à linguagem normativa.
Nem sempre é preferível que o legislador seja o responsável por servir de ponte
para essa normatização. Até hoje, entretanto, não se concebeu um ato mais
adequado para esse fim: o legislador presta contas regularmente por meio de
eleições livres; é substituível de tempos em tempos; precisa exercer sua
persuasão junto a seus pares e a seus eleitores; seus erros na interpretação da
vontade popular podem privá-lo de continuar no Parlamento; e, em ultima ratio,
seus erros ao legislar (ou ao não legislar) encontrarão a vigilante custódia do
tribunal constitucional.
§65. A INDISPENSABILIDADE DA FILTRAGEM DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS PELO DIREITO CIVIL
É indispensável a filtragem dos direitos fundamentais pelo Direito Civil.
Esse é um dos postulados da doutrina da eficácia indireta. Esse postulado é
defensável por argumentos de variegada ordem, ao exemplo destes: (a)
preservação do espaço democrático1157 e respeito à separação dos poderes; (b)
previsibilidade do Direito;1158 (c) restrição à transferência total do nível decisório
da autonomia privada para o âmbito judicial. Este último argumento tem clara
conexão com a natureza tendencialmente aberta do conteúdo normativo dos
direitos fundamentais, objeto do § 64.
Todos esses argumentos são defensáveis e reforçam a necessidade da
adoção de um modelo de eficácia mediata para reger a vinculação dos
particulares aos direitos fundamentais.
É necessário aprofundar o exame desses argumentos:

(a) Preservação do espaço democrático e respeito à separação dos


poderes.

Esses dois argumentos radicam-se na teoria clássica dos direitos fundamentais.


Ambos são adequados, mas a realidade brasileira não permite que neles se fie
para a defesa do modelo de eficácia mediata. Até que haja um câmbio de
orientação jurídico-política no STF, tais premissas não serão convincentes para o
único órgão que pode ser por elas comovido. A despeito de sua correção, ao
menos na realidade contemporânea, são hipóteses pouco eficazes, posto que
nada desprezíveis.
(b) Previsibilidade do Direito. Este é um argumento que se aclimataria
com maior facilidade ao Direito brasileiro. A linha de defesa da previsibilidade,
da clareza e da segurança jurídica já foi sustentada pelo TCF, quando este
entendeu não ser o Poder Judiciário capaz de cumprir exclusivamente (e de
modo pleno) tal exigência, emanada da LF/1949.1159 Konrad Hesse enfatiza, a
esse respeito, que “uma regulação legal materialmente diferenciadora, que
concretize os pressupostos e os efeitos da influência dos direitos fundamentais,
inclusive quando se utiliza de tais conceitos, conduz a uma maior determinação
da regulação normativa, a uma maior clareza, certeza e previsibilidade jurídicas
do que um recurso imediato aos direitos fundamentais”. E complementa: “Na
mesma medida, evitam-se os perigos expostos da invasão do Direito Privado
pelo Direito Constitucional”.1160
A previsibilidade interessa não somente ao Direito Civil. Sua importância é
ainda maior para outras áreas do Direito Privado, como o Direito Comercial. As
decisões empresariais são geralmente marcadas pela urgência e pelo senso de
oportunidade negocial. A utilização de signos muito abertos termina por
comprometer os níveis mínimos de segurança decisória de que carecem os
agentes econômicos.
Dois exemplos do Direito Civil são suficientes para colorir essa questão:
(i) no CC/1916, a idade mínima para casar era de 16 anos para mulheres e
de 18 anos para homens.1161 A diferença etária entre homens e mulheres
conviveu com todas constituições republicanas até 1988. Desde a Constituição
Imperial, contudo, o princípio da igualdade já era garantido. Admita-se que a
CF/1988 foi mais explícita quanto a essa isonomia em relação à diferenciação de
gênero. Conceda-se ainda que a dignidade humana ganhou novos contornos com
sua menção expressa no texto constitucional. Tudo isso está muito bem, mas,
qual seria a idade mínima para o casamento? Cada juiz decidiria no caso
concreto? O STF julgaria a matéria, com fundamento na dignidade humana e no
princípio da igualdade (repita-se, presente em todas as constituições brasileiras),
para fixar a idade mínima em 18 anos? Ou se chegaria a uma média aritmética
simples e a idade mínima seria fixada em 17 anos para ambos?
Abstraia-se o Direito Civil e coloque-se esse problema no âmbito do
Direito Penal, quanto à imputabilidade dos agentes. Cada juiz decidiria, com
base em um princípio constitucional ad hoc, qual a idade mais adequada para se
declarar inimputável o autor de um ilícito?
(ii) no CC/1916, o prazo de caducidade para o exercício do direito de
pleitear a anulação do casamento era de 10 dias, contados do matrimônio, na
hipótese de o marido descobrir que a mulher não era mais virgem.1162 Da mesma
forma que no exemplo (i), é possível argumentar com o princípio da isonomia:
como se resolver esta situação? Sempre haveria a resposta de se considerar não
recepcionado esse dispositivo porque atentatório à dignidade da mulher. Essa
seria uma resposta muito apropriada. Mas o problema, excetuada essa solução
pela tangente, continuaria sem uma resposta adequada pela via do princípio da
isonomia.
Esse mesmo teste poderia ser feito com base em outros dispositivos da
legislação civil, especialmente os vigentes após 1988. O art. 1720, CC/2002,
prevê que a administração do bem de família compete aos cônjuges. Se ambos
falecerem, conforme estabelece o parágrafo único desse artigo, “a administração
passará ao filho mais velho, se for maior, e, do contrário, a seu tutor”. O
art. 1792, CC/2002, afirma que “até o compromisso do inventariante, a
administração da herança caberá” a uma série de indicados. Em segundo lugar
na lista figura “o herdeiro que estiver na posse e administração dos bens”. Se
houver, no entanto, “mais de um nessas condições, ao mais velho” (inciso II do
art. 1792, CC/2002). Qual a justificativa dessa preferência pelo filho e pelo
herdeiro mais velhos? Uma investigação jurídico-histórica revelará a ratio
dessas normas, embora se possa creditá-la às raízes semíticas do Direito
brasileiro e recordar o papel da primogenitura (vide Esaú e Jacó) nas estruturas
familiares do Antigo Testamento. Independentemente disso, como esse critério
sobreviveria a uma eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações
privadas?
(c) Transferência do espaço decisório da autonomia privada para o
âmbito judicial. Este talvez seja o mais grave dos problemas da eficácia
imediata dos direitos fundamentais em relação aos particulares: o desrespeito aos
esquemas mentais, às circunstâncias metajurídicas e à racionalidade própria (ou
a falta dela) dos agentes que negociam sob o prestígio da autonomia privada.
O juiz não está aparelhado para decidir sobre um negócio jurídico com o
mesmo nível de informação, expertise e de interesse (inclusive egoístico) que o
detido pelas partes contratantes. Sua entrada para corrigir, limitar ou coadjuvar a
autonomia privada é aceitável e se faz presente nos códigos civis desde o século
XIX. Como já assinalado, “no direito civil, a liberdade é a regra. As partes
podem convencionar da maneira que melhor lhes aprouver, salvo as limitações
impostas pela legislação”, ainda que haja variáveis níveis de intensidade nessa
limitação (v.g., relações de consumo).1163 A filtragem dos direitos fundamentais
pelo Direito Civil tem por consequência preservar as esferas decisórias das
partes e isso não é um efeito puramente retórico. O Direito Civil é adaptado
historicamente a compreender o modo de funcionamento muita vez errático,
irracional e entrópico da atividade negocial. Os particulares são regidos, na
maior parte dos casos, por critérios insubsumíveis a padrões de racionalidade
objetiva, a consensos sobrepostos ou standards próprios do Direito Público. Essa
é uma das fontes privilegiadas da especificidade do Direito Civil. Ela fornece
pistas para que se compreenda porque a formação intelectual mais elevada não é
garantia de prosperidade econômico-finan-ceira ou porque mecanismos de
proteção às partes débeis terminam por falhar ante a auto-exposição dos
indivíduos ao risco.
Aqui se pode analisar outro argumento crítico à doutrina da eficácia
indireta: se os direitos fundamentais vinculam diretamente o Poder Judiciário e
os magistrados obrigam-se a aplicá-los em suas sentenças, não haveria uma
eficácia direta sobre as partes (os particulares em litígio)? A fórmula
constitucional alemã da vinculação dos poderes aos direitos fundamentais, no
caso específico, do Judiciário, refere-se primordialmente aos “direitos
fundamentais processuais”. Dito de outro modo, o magistrado deve observar o
contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, assegurando às partes
tais prerrogativas também previstas no art. 5o, CF/1988, que são também direitos
fundamentais. Some-se a isso o fato de que a relação (processual) entre as partes
é pública, pois submetida ao regime da jurisdição, contemplado também na
Constituição, sob a forma do acesso à função jurisdicional do Estado. O julgador
não transfere aos particulares sua vinculação imediata à observância de tais
direitos.
Ao decidir um caso entre particulares, o juiz observou a relação jurídica e
depois buscou na legislação pertinente (o Código Civil, v.g.) qual o comando
cuja observância importaria em uma ação ou uma abstenção do sujeito. A
apreciação primária da lei é uma mesura à segurança, à certeza e à
previsibilidade do Direito. Seu afastamento só pode ocorrer em hipóteses muito
estritas, todas já desenvolvidas ao longo da tese, como o juízo de
compatibilidade constitucional. Quando há, porém, a abertura para normas de
perfil diferente, como as continentes de cláusulas gerais, é possível que os
direitos fundamentais se irradiem (na linguagem do caso Lüth) e transfiram para
o direito ordinário os conteúdos que o constituinte, de modo extremamente
aberto, elegeu em sua “ordem objetiva de valores”. Desconsiderar esse processo
equivale a quitar todos os custos argumentativos e de fundamentação aos
magistrados e converter a autonomia privada e a autodeterminação das partes em
uma determinação por terceiros (os juízes).1164
§66. AS CLÁUSULAS GERAIS: FUNÇÃO, SUFICIÊNCIA E COMBINAÇÃO
COM NORMAS OBJETIVAS
Três críticas podem ser formuladas ao modelo de eficácia indireta dos
direitos fundamentais nas relações privadas. Todas elas recaem sobre o papel das
cláusulas gerais como “chave” para o Direito Privado: (i) qual a diferença entre
a cláusula geral localizada no Código Civil e o princípio constitucional, que é,
muita vez, homônimo da cláusula geral (v.g., função social)? (ii) o nível de
“perigosa abstração” dessa cláusula geral não equivaleria ao mesmo nível dos
princípios constitucionais?; (iii) a irradiação não pode ocorrer por meio de outras
normas de Direito Privado?
Quantos aos itens (i) e (ii), é realmente possível que haja uma mera troca
de discricionariedades: o princípio constitucional substituído pela cláusula geral.
Essa crítica põe em causa a seriedade da doutrina da eficácia indireta.1165 Ela,
contudo, é refutável por duas ordens de argumentos.
Partindo-se da primeira refutação, tem-se que a cláusula geral de Direito
Privado não subtrai o conhecimento da lide ao juiz ordinário. Mantêm-se o
conflito na esfera cognitiva da justiça infraconstitucional. O magistrado, em
primeira linha, deverá ater-se ao Direito Civil e utilizar-se do arsenal teórico
peculiar a esta disciplina. As cláusulas gerais privatísticas têm por si,
especialmente a boa-fé objetiva, uma centenária produção bibliográfica que lhe
empresta um grau de concretude incomparável até mesmo com institutos e
figuras contidos em normas jurídicas de caráter objetivo. Essa vinculação ao juiz
ordinário, ao menos em tese, retarda o juízo formulado com fundamento
preponderantemente constitucional, que seria esperável quando o recurso fosse
(eventualmente) examinado pelo STF.
A segunda refutação está no fato de que a cláusula geral é um meio de
civilização do direito fundamental. Esse papel é único e só acomodável ao
modelo da eficácia indireta. Os casos envolvendo a propriedade, o contrato ou a
família, quando apreciados pelo juiz ordinário, serão decididos com uma leitura
também civil. Nesse ponto, há uma conexão com a terceira crítica e convém
retomar este argumento no próximo tópico.
A crítica (iii) tem procedência e é nesse aspecto que se diferenciam o
modelo forte e um modelo alternativo de eficácia indireta, que se poderia
denominar de modelo fraco.
Não há justificativa para se limitar as “portas” ou “chaves” do direito
fundamental para o Direito Civil apenas às cláusulas gerais. Eventualmente uma
norma objetiva, de caráter fechado, pode servir a tal finalidade. O modelo fraco
admite essa ampliação dos portais de entrada porque o problema não é o
continente que permite a passagem do conteúdo constitucional, mas a função de
contaminação desse conteúdo para o Direito Civil. Na maior parte dos casos, o
direito fundamental não pode ser irradiado sem algum tipo de conformação à
peculiaridade do sistema de Direito Privado. Nesse sentido, é coerente aceitar
essa dupla porta de entrada, sem que isso fragilize a autonomia do Direito Civil.
§67. O BARATEAMENTO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E A
BANALIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A vulgarização dos princípios constitucionais e, por consequência dos
direitos fundamentais, é matéria que começa a ganhar as atenções da doutrina
brasileira.1166 A eficácia direta termina por servir como justificativa
metodológica – que é inexistente, diga-se – para a invocação desses elementos
próprios do Direito Constitucional no Direito Civil. As consequências são de
variada ordem:
(a) Abandono dos métodos hermenêuticos adequados e recurso imediato
à ponderação. Desconsideram-se a interpretação e seus métodos na formulação
que a dogmática do Direito Civil levou quase 200 anos para desenvolver e que
terminou por ser apropriada pelas demais áreas do Direito. O texto normativo
primário é abandonado. As raízes históricas e a visão lógico-sistêmica da lei ou
do código são desconsideradas. Elementos importantes para a construção de
soluções técnico-jurídicas, como as fontes romanísticas, o estudo dos trabalhos
preparatórios e dos anteprojetos de lei, são tidos como dispensáveis no processo
hermenêutico peculiar ao Direito Civil.
Independentemente dos prejuízos metódicos ao Direito Civil, que são
estimáveis e elevados, cai-se no puro e simples julgamento decisionista, em
nome de uma ponderação cujos critérios não ficam claros e nem ao menos os
órgãos que a utilizaram conhecem seus meios operativos.1167 A síntese desse
problema, oferecida por Joachim Rückert, de tão expressiva que é, merece uma
transcrição mais longa:

“Rigidez normativa deve produzir certeza do direito. Certeza do direito sempre


foi desejo do cidadão. Queremos saber como devemos nos orientar, quais são as
punições e os ganhos. Rigidez normativa deve produzir confiança no direito.
Rigidez normativa deve ser geral e tratar todos de maneira igual. Ao fim e ao
cabo, trata-se de justiça na Terra. Ao contrário do que ocorre com a ponderação:
ela ajuda no caso concreto. Ela se aproxima da equidade. Ela fez uma carreira
surpreendente: de meio decisório da filosofia, da moral, da ética e da política a
auxílio do jurista, de auxílio a solução para todos os problemas, de exceção a
bala de prata metodológica da nossa prática jurídica. Essa dupla transformação
funcional do não jurídico para o jurídico e, depois, dentro do próprio jurídico
merece toda a nossa atenção, tanto atual como histórica, na teoria e na prática do
direito”.1168 Esta tese não se ocupa diretamente dos problemas metodológicos da
ponderação, como já esclarecido (vide § 46). Esse é um debate próprio da teoria
dos direitos fundamentais, embora a deformação conceitual da ponderação tenha
íntimas relações com o Direito Civil do período nacional-socialista.1169 O
essencial está em se reconhecer que o abandono dos métodos hermenêuticos
clássicos só serve para aumentar o subjetivismo decisório e a incerteza jurídica
decorrente de julgamentos que se apresentam como ponderacionistas, mas, em
verdade, são um acúmulo de expressões vazias de sentido e plenas de retórica.

(b) Da constitucionalização à trivialização. A eficácia direta conduz, ao


menos na forma como terminou por assumir em algumas formulações
doutrinárias e jurisprudenciais, a uma trivialização de princípios e de direitos
fundamentais. Em nome da constitucionalização do Direito Civil chega-se
rapidamente a uma banalização dos direitos fundamentais.
O exemplo mais evidente dessa trivialização está na dignidade da pessoa
humana.1170 O recurso imediato à dignidade humana nos tribunais aproxima-se
do nível do absurdo. Por mais respeitáveis que sejam as razões envolvidas
apresenta-se como um abuso de linguagem a invocação da dignidade humana
para fundamentar decisões como as que: (i) concedem isenção tributária (ICMS
e IPVA) a motorista portador de deficiência visual;1171 (ii) reconhecem dano
moral em favor de passageiro impedido de voar por conta de overbooking;1172
(iii) condenam danceteria a pagar indenização por danos morais pela expulsão de
frequentador que se vestia inadequadamente para os padrões do recinto.1173
A plurivocidade da dignidade humana associa-se ao problema de se utilizar
esse conceito como um trunfo argumentativo: quem se pode colocar
contrariamente à dignidade humana?
Manifesta-se uma sensível confusão entre os postulados da doutrina da
eficácia direta e o recurso imediato à dignidade humana.
§68. DIREITO CIVIL: SOLUÇÕES INTRASSISTEMÁTICAS E INFLUÊNCIA NO
SISTEMA DE DIREITO PÚBLICO
Na Segunda Parte da tese, em diversas ocasiões, pôs-se ênfase na
capacidade do Direito Civil de se adaptar e amoldar às interferências externas do
Direito Constitucional e da Constituição. Não foram poucos os institutos, as
categorias e as figuras jurídicas civilísticos que (i) deslizaram para o texto
constitucional, por meio da elevação; (ii) foram reformados para se atualizar em
face de uma nova Constituição; (iii) receberam o influxo transformador dos
princípios constitucionais e do catálogo de direitos fundamentais, de modo
particular em constituições dirigentes, como a CF/1988 se apresentou em sua
versão inicial.
Essas diferentes acepções de constitucionalização, em particular, a
decorrente da transformação-irradiação, podem se manifestar tanto nos moldes
da teoria da eficácia direta quanto da eficácia indireta, além, é claro, do modelo
de três níveis de Robert Alexy. O modelo da eficácia indireta, contudo, é o que
melhor consegue preservar a autonomia metodológica e epistemológica do
Direito Civil. Ao interpor barreiras à incidência imediata dos direitos
fundamentais, o modelo de Dürig – com as atenuações aqui formuladas - obriga
o sistema de Direito Privado a elaborar soluções próprias para os problemas
internos. Ter permanentemente à disposição o arsenal normativo da Constituição
é algo que, a longo prazo, atrai o civilista para a zona de conforto dos termos
dúcteis, da indeterminação conceitual e da abertura de conteúdo dos princípios.
Essa bengala metodológico-principiológica acostuma mal e vicia o Direito Civil,
que cada vez mais se radica no status de uma disciplina que oferece soluções de
segunda mão. O Direito Civil, dessa forma, torna-se dispensável, expletivo ou
irrelevante. À semelhança dos versos de Manuel Bandeira, os civilistas deixarão
de desenvolver sua própria linguagem e o que passarão a fazer “é macaquear a
sintaxe lusíada”, ou melhor, “a sintaxe constitucional”.
A capacidade para o desenvolvimento de soluções intrassistemáticas é uma
prova histórica da vitalidade do Direito Civil. Os danos morais prestam-se à
perfeição a esse propósito exemplificativo. Vernon Valentine Palmer é autor de
um dos mais amplos estudos sobre a origem e o desenvolvimento dos danos
morais em França. Segundo Palmer, “poucos países na Europa, e certamente
nenhum de maneira tão precoce, atribuiu uma tal função à noção de dano moral,
tanto em matéria de responsabilidade delitual quanto em matéria de
responsabilidade contratual”. Isso está bem. Mas o ponto nuclear de sua pesquisa
está nesta oração: “Convém, igualmente, salientar que esse desenvolvimento
jurisprudencial é singular por sua evolução. Ele se deu por efeito de uma
interpretação introspectiva do Code Civil, sem se recorrer à elaboração de novas
leis especiais, muito menos à intermediação de princípios jurídicos superiores,
como aqueles contidos na Constituição”.1174 A “interpretação introspectiva” não
significa uma interpretação exclusivamente exegética (embora nada haja de mal
em se interpretar desse modo um texto normativo) e sim intrassistemática. Esse
caráter é reforçado por outra afirmação de Palmer: “Crê-se, no entanto, que a
jurisprudência do Antigo Regime serviu de modelo e teve um papel precursor
nos desenvolvimentos desse conceito ao longo do século XIX”. Mais que isso,
antes mesmo do Code Civil de 1804, “o uso da palavra ‘dano’ [‘dommage’ ]
nunca excluiu os danos imateriais e, por conseguinte, a esta única expressão
cabia uma dupla função, o que não é sem importância à futura interpretação do
Code Civil, na qual a palavra mesma é utilizada sem qualquer adjetivação”. A
tanto que Palmer indaga: “Não seria natural pensar, portanto, que ela se poderia
revestir de um sentido tão lato quanto aquele decorrente da jurisprudência do
Antigo Regime [l’ancienne jurisprudence]?”.1175
Um dos conceitos mais importantes da Responsabilidade Civil
contemporânea, particularmente no Brasil, encontrou em França “o primeiro
regime liberal, que atualmente ainda é, se não me engano, o mais liberal” de
entre os três tipos de regimes sobre o dano moral.1176 Esse êxito dogmático se
deveu a uma curiosa combinação de (i) elementos inovadores do Direito Civil do
Antigo Regime, que ainda tratava dos danos morais em um cenário de
indistinção com o Direito Penal (considerado parte do Direito Privado durante
muito tempo na Idade Moderna); (ii) tratamento legislativo no Código Civil, que
se aproveitou da experiência de l’ancienne jurisprudence; (iii) independência de
“novas leis especiais” e da “intermediação de princípios jurídicos superiores,
como aqueles contidos na Constituição”.1177
Sem princípios jurídicos superiores, especialmente os constitucionais, foi
possível ao Direito Civil criar e desenvolver um dos elementos nucleares do
direito delitual de nossos dias. O mais notável é que o dano moral é uma das
espécies de dano mais associadas à constitucionalização do Direito Civil, ao
menos neste país. As soluções intrassistemáticas fazem parte da história da
privatística. Um Direito que deve oferecer permanentemente respostas a
problemas que surgem todos os dias, graças à força criadora da autonomia
privada, não pode dispensar sua capacidade de criar e de renovar institutos,
categorias e figuras jurídicas.
Como resultado dessa “indústria de institutos jurídicos”, o Direito Civil
tem sido uma fonte contínua de soluções para o sistema de Direito Público. Na
Primeira Parte da tese, ofereceu-se uma miríade de exemplos dessa influência
privatística no sistema, como a interpretação conforme (aplicação da doutrina da
conversão substancial) e as teorias interna-externa (decorrentes dos estudos
sobre o abuso do direito e a função social da propriedade).1178 Salientar tais
influências externas não significa atribuir foros de superioridade de uma
disciplina. Cuida-se apenas de desconstruir a ideia de que não é possível existir
interferências recíprocas entre o Direito Civil e o Direito Constitucional e suas
respectivas espécies normativas.1179
§69. UNIDADE DA ORDEM JURÍDICA E FUNDAMENTAÇÃO DO DIREITO
CIVIL: A AUTONOMIA PRIVADA
O modelo da eficácia indireta apresenta vantagens operacionais e
metodológicas em um campo sensível para o Direito Civil contemporâneo: o
problema da unidade da ordem jurídica e a busca por um fundamento para essa
área do Direito Privado.
Como exposto na Primeira Parte, um dos mais vigorosos ataques ao
estatuto epistemológico do Direito Civil contemporâneo está na defesa da
flexibilização ou da eliminação da “grande dicotomia”. Na Segunda Parte,
descreveu-se o modelo de constitucionalização do Direito, formulado por Louis
Favoreu, cujos efeitos se revelam pela unificação da ordem jurídica e sua
recondução a princípios comuns. É o que Nipperdey tentou desenvolver
colocando a Constituição como nova Parte Geral da ordem jurídica.
Unificação e unidade da ordem jurídica são conceitos diversos, mas que
gravitam sob um regime de implicação-polaridade. Uma ordem jurídica
unificada pressupõe o apagamento das linhas divisórias entre o Direito Público e
o Direito Privado. A unidade da ordem jurídica pressupõe a recondução a
fundamentos epistemológicos, normativos e axiológicos comuns.
Quanto à unificação da ordem jurídica, o modelo da eficácia indireta tem a
vantagem de não se comprometer com essa tese. A autonomia do Direito
Privado é sempre ressaltada por Dürig, pelo TCF, nas decisões que resultam da
eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre particulares, e pela doutrina
contemporânea. No que se refere à unidade da ordem jurídica, ela se baseia em
um pressuposto equívoco, que é o da origem estatal do Direito, como já refutado
nos capítulos anteriores. O Direito Civil, como parte do Direito Privado, mesmo
que tenha suas normas produzidas pelo legislador, não deixa de integrar um
sistema jurídico autônomo e que possui princípios, metodologia e valores
próprios, ainda que não se possa (e seja esperável) haver pontos de
interpenetração e irradiação dos direitos fundamentais.1180 São precisamente
essas portas de entrada dos direitos fundamentais que permitem a
constitucionaliza-ção-transformação do Direito Civil. Esse processo de
constitucionalização, todavia, não pode representar a perda de identidade, de
ethos e de páthos do Direito Civil.
O primado positivista kelseniano, se aplicado às relações entre o Direito
Civil e o Direito Constitucional, implicaria admitir que toda a ordem jurídica é
fundada na Constituição. Recupera-se a famosa frase de Ernst Forsthoff: a
Constituição não pode ser o “ovo do mundo jurídico”, a fonte da qual “tudo
procede”.1181 Essa é uma falha metodológica grave da doutrina da eficácia direta
e que não compromete a doutrina da eficácia indireta. A ordem jurídica é cada
vez mais aceita como plural. A criação do Direito não passa necessariamente
pelo Estado e não precisa se amoldar às instituições jurídicas ou políticas a ele
vinculadas ou dele derivadas. Tal assertiva não desmerece o papel e o valor da
Constituição, que atua, quase sempre em última linha, como vigilante
controladora dos excessos, dos abusos e das ilicitudes praticados pelo Estado e
pelos particulares.
O conceito de “ordem objetiva de valores”, que vincula e subordina todo o
sistema jurídico (público ou privado) não tem e não pode ter pretensões
omnicompreensivas. Texto normativo algum possui a característica da
omnicompreensão dos fenômenos, dos fatos e das situações jurídicas. Sempre
haverá espaços de nomogênese autônoma e independente dos confinamentos do
Direito Público e da Constituição. É claro que a “ordem objetiva de valores”,
considerando-se os que admitem a validez de tal conceito, pode ser convocada
para servir de parâmetro a esses atos fundados na liberdade do sistema de Direito
Privado. Pode-se até duvidar de que, em todo e qualquer conflito, sempre haverá
a manifestação da supremacia axiológica do texto constitucional sobre o direito
ordinário ou sobre as relações baseadas na autonomia privada. A única certeza é
que a Constituição é uma norma hierarquicamente suprema e exigirá a
conformação do direito ordinário e, eventualmente, da autonomia privada a seus
comandos.
A vinculação da autonomia privada aos direitos fundamentais não pode
implicar o sacrifício do caráter autônomo do Direito Civil no quadro do sistema
jurídico. O alargamento do âmbito de incidência dos direitos fundamentais aos
particulares, para além da perda de liberdades individuais, conduziria a uma
ruptura com a lógica, a autonomia de princípios e a estrutura das relações
jurídico-privatísticas, além de grande desprestígio ao legislador democrático.1182
§70. PRESERVAÇÃO DO ESPAÇO NORMATIVO DA LEI
A intermediação legislativa é parte essencial do modelo forte de eficácia
indireta: sem a presença da lei e, de modo específico, das cláusulas gerais, não
seria possível a irradiação. É compreensível tal articulação de postulados, na
medida em que as cláusulas gerais atuam com enorme ductilidade na passagem
dos direitos fundamentais para o Direito Civil. Essa caraterística fez com que a
formulação original da doutrina da eficácia indireta não se preocupasse muito
com a omissão legislativa.
Sobre a suficiência da lei ordinária é preciso destacar dois tópicos.
(a) Preservação dos espaços legais e mudança da natureza da legislação
na contemporaneidade. Não é possível idealizar o papel do legislador na
sociedade contemporânea: grupos de pressão, burocratas (assessores legislativos,
membros da procuraturas dos entes federativos), cientistas, advogados, lobistas,
grandes grupos econômicos e até parlamentares podem ser identificados com a
figura do legislador.1183
Assim, ao se defender a preservação dos espaços legislativos ante a invasão
dos direitos fundamentais e a “colonização” do Direito Privado pelo Direito
Constitucional, ma-nifesta-se um cuidado muito específico: impedir a
transferência do papel de determinação das opções democráticas sobre valores,
ao menos em níveis excessivos, do legislador para o juiz.1184 A lei, mesmo com
todas as limitações ao exercício da democracia nos parlamentos, é ainda a
melhor forma de se impedir que a discricionariedade judicial substitua o poder
de autodeterminação individual e, mais particularmente, a autonomia privada.1185
De tal sorte que ao juiz não é admitido ignorar prima facie o comando legal e
passar diretamente para o âmbito dos direitos fundamentais.1186 Essa relação
entre direitos fundamentais e legislação dá-se em uma via de mão dupla: o
legislador tem de ser fiel ao texto constitucional. Não é suficiente haver uma
mediação legislativa. Ela deve ocorrer com base em uma lei conforme à
Constituição.1187
(b) Possibilidade de eficácia direta excepcional. A CF/1988 possui
diversos direitos fundamentais que se apresentariam imediatamente vinculantes
aos particulares, sem necessidade ou com exigências mínimas de intervenção
legislativa. Em geral, exemplifican-se tais hipóteses com os direitos sociais, ao
estilo das férias, da gratificação natalina, do descanso semanal remunerado, da
remuneração diferenciada aos trabalhadores do turno da noite e da licença-
maternidade.1188 É também mencionado o caso dos direitos de reunião (art. 5o,
inciso XVI, CF/1988) e de associação (art. 5o, inciso XVII, CF/1988) como
expressivos de uma eventual eficácia direta,1189 ou mesmo o direito fundamental
de resposta proporcional à ofensa (art. 5o, V, CF/1988).1190
Diante desses exemplos é possível adotar três atitudes: (a) extrair desses
direitos fundamentais a comprovação de que a eficácia direta é admitida no
Direito brasileiro e generalizá-la para todo o sistema; (b) negar a eficácia direta,
ainda que face a esses casos, porquanto mesmo em relação aos “direitos que
possuem um significado direto, por assim dizer, para as relações privadas,
constata-se na prática que eles não conseguem efetivar-se plenamente,
independentemente de uma adequada mediação legislativa”. Ademais, “o fato de
existirem direitos que se aplicam, por sua própria natureza, às relações privadas,
não significa que essa aplicação sempre irá ocorrer ou que será obrigatória”;1191
(c) conceder a existência de uma eficácia direta residual e excepcional em face
de direitos que, por sua conformação, terminaram por produzir efeitos como se
normas de direito ordinário fossem. Essa residualidade não é um privilégio do
Direito brasileiro. Ainda que não seja uma matéria pacífica, parte da dogmática
alemã contemporânea admite um caso especial de eficácia direta entre os
particulares no art. 9o, apartado 3, LF/1949, que declara serem nulos os acordos
limitadores do exercício da liberdade de associação (vide 45.4.5). Entende-se
que é uma exceção confirmadora da regra da eficácia indireta entre os
particulares.1192
A opção (c) traduz uma fissura no modelo da eficácia indireta. A partir
desse caso é permitido conceber uma hipótese: o desenvolvimento de um
modelo menos rígido de eficácia indireta, reservando-se para o modelo
tradicional o qualificativo de forte. É sobre essa distinção que se cuidará no § 74.
Antes disso, veja-se a questão dos “poderes sociais” ou “poderes privados”.
§71. A QUESTÃO DOS PODERES SOCIAIS OU PODERES PRIVADOS
Um tópico recorrente no debate sobre o modelo de eficácia dos direitos
fundamentais é o dos poderes sociais ou poderes privados, que corresponderiam
a grandes conglomerados industriais e comerciais; grupos de telecomunicações e
de radiodifusão; instituições financeiras; organizações criminosas e, mais
recentemente, os gigantes da Internet.1193 O argumento central quanto a esses
poderes sociais ou privados está em sua equiparação ao Estado no que se refere
ao potencial de lesão, restrição ou intervenção no âmbito dos direitos
fundamentais de particulares. Todos esses entes, grupos ou organizações
integram-se no universo dos entes (personificados ou não) privados. A
assimetria de poder (político, social ou econômico) é notória. Chega-se a fazer
aproximações entre o crescimento desses poderes, à margem do Estado, a um
processo de “refeudalização”.1194
Em relação a esse tópico, acredita-se que sua maior dificuldade já foi
resolvida: a estrutura clássica dos direitos fundamentais não teria meios de fazer
frente aos atos praticados por esses detentores dos poderes privados ou sociais,
exceto se recorresse a expedientes como a state action norte-americana ou se
fossem desenvolvidos os postulados das novas teorias de Teubner quanto ao
poder em rede e ao poder transnacional. Como é pressuposto desta tese a adoção
da eficácia indireta, o óbice está removido: particulares podem invocar direitos
em face de particulares, de modo recíproco, desde que o façam mediatamente.
Um poderoso conglomerado ou uma empresa multinacional de telecomunicações
são entes privados e podem-se relacionar com particulares, eventualmente
infringindo seus direitos fundamentais. A proteção aos últimos é igualmente
reconhecida no marco da eficácia indireta, sem necessidade de maiores
contorcionismos intelectuais.
Na doutrina alemã, especialmente em Canaris, há mesmo reservas sobre a
existência de acordo semântico em relação à terminologia dos “poderes sociais”,
com fortes críticas a sua utilização em obras defensoras da eficácia direta. Essas
objeções parecem adequadas. A figura dos poderes sociais ou privados só tem
valor retórico no marco da doutrina da eficácia indireta, dado que, se houver
violação a direitos fundamentais por parte dos grupos poderosos socialmente, os
mesmos mecanismos de proteção vinculam as partes envolvidas na relação
jurídica.
Claus-Wilhelm Canaris assinala que essa doutrina se desenvolveu com o
objetivo de justificar a eficácia direta. Ela, contudo, não tem como alterar
substancialmente a ordem da questão: o exercício do poder social não conduz ao
fracasso da autonomia privada e da liberdade contratual. O poder social é
simples parte de um contexto geral de proteção aos direitos fundamentais.1195 É
idêntica a restrição teórica de Konrad Hesse, em ordem a que, em face do
exercício do “poder econômico ou social” devem intervir os órgãos judiciários
para coibir os excessos.1196
§72. O FATOR DE CORREÇÃO INTERNO E O MODELO FRACO DE EFICÁCIA
INDIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Uma discussão central da Teoria Geral do Direito após a Segunda Guerra
Mundial e que até hoje conserva seu interesse foi inaugurada com a fórmula de
Radbruch, que possui este enunciado: (i) o direito positivo tem precedência na
aplicação aos fatos, mesmo se seu conteúdo for injusto e não for benéfico às
pessoas; (ii) a justiça prevalecerá sobre o conteúdo normativo do direito positivo
se este se revelar extremamente injusto, a ponto de revelar uma norma injusta,
continente de um direito injusto.1197 Essa fórmula põe em destaque o problema
da relação entre Direito e Moral. Robert Alexy contribuiu significativamente
para esse debate ao desenvolver o conceito de uma pretensão de correção do
Direito. Como um postulado não positivista, Alexy procurou resolver o controle
do Direito por meio de um fator externo (o critério de justiça). Sua proposta
baseia-se em uma tentativa de se afastar dos antigos postulados do
jusnaturalismo.
Em outro trabalho, o autor desta tese desenvolveu o conceito de “fator de
correção do Direito”, que não se confunde com a “pretensão de correção” de
Alexy.1198 É necessário esclarecer em que consiste esse “fator de correção” e
qual sua utilidade para o modelo aqui proposto. Para esse fim é importante
estabelecer algumas premissas:
(a) O sistema de Direito Privado controla a validez dos negócios jurídicos e
de todos os institutos e figuras jurídicas submetidos a seus limites normativos,
por meio de técnicas comuns a todos os ramos da ordem jurídica.
(b) Os mecanismos de controle podem ser denominados de “fatores de
correção”.
(c) Todas as hipóteses de desconformidade ao Direito são qualificáveis
como espécies de “fatores de correção” do Direito. Nelas se enquadram
categorias que variam, de acordo com o direito positivo, entre ineficácia
(categoria geral para o Direito alemão), invalidade (categoria central para o
Direito brasileiro) e suas variações.
(d) Embora autônomo, o sistema de Direito Privado, por força do princípio
da constitucionalidade, submete-se aos mecanismos comuns de controle de
validade, que recaem não somente sobre normas jurídicas produzidas pelo
Estado, mas também sobre atos ou atividades que se vinculem ao sistema de
Direito Privado.
(e) Um contrato pode apresentar desconformidade em relação a portarias,
decretos, leis e à própria Constituição. Essas normas funcionam como fatores de
correção internos. Os critérios de controle jurídico do contrato respondem a uma
estrutura lógi-co-formal deduzida internamente no sistema jurídico.
(f) O fator de correção no Direito Privado exterioriza-se primariamente
pelas normas e pelos princípios desse sistema. A utilização de fatores de
correção extrassistemáticos (rectius, recolhidos fora do sistema de Direito
Privado) é possível e, em muitos casos, indispensável.
(g) A utilização dos fatores de correção internos não privatísticos (ditos
extrassistemáticos) pode-se dar pelas formas tradicionais de recurso à
Constituição e a seus princípios para fins de controle de validez de normas e
atos. Nessa hipótese, é necessária, em geral, a filtragem dos conteúdos
constitucionais quando estes se irradiam para o Direito Privado. A eficácia
indireta dos direitos fundamentais é uma das formas de se organizar essa
irradiação e permitir que a correção não implique a perda de autonomia do
Direito Privado.
(h) Quando necessário, diante da colisão de direitos fundamentais, que se
refletem em um conflito entre particulares, é possível o emprego de técnicas
próprias do Direito Constitucional para a interpretação do direito ou mesmo para
a solução de conflitos. Esse recurso à Constituição, como derradeiro fator de
correção interno, dar-se-á como ultima ratio.
(i) Excepcionar-se-á a utilização mediata dos direitos fundamentais apenas
em duas hipóteses, que se afastam do modelo tradicional de eficácia indireta:
(aa) diante da existência excepcional de direitos fundamentais cujo perfil
normativo foi delineado como concretizador de posições jurídicas, o que tornou
desnecessária ou expletiva a intermediação do direito ordinário privado. Essa
tipologia de direitos fundamentais é excepcional e sua existência não permite
generalizações.
(bb) em face da omissão legislativa e mesmo após o recurso às cláusulas
gerais, tais procedimentos não se mostraram suficientes para a realização dos
direitos fundamentais. Aplica-se então a proibição de insuficiência,
desenvolvida por Canaris para sua teoria dos deveres de proteção, e que já foi
utilizada pelo TCF.1199
Esse modelo tem a vantagem de reconhecer a autonomia do Direito
Privado e de evitar o principal problema advindo do recurso imediato aos
direitos fundamentais, ao menos na forma como se tem procedido no Brasil, que
é sua utilização como “cavalos de Troia” para permitir o emprego de fatores de
correção externos. Tais fatores ganham a forma envolvente de um direito
fundamental, mas seu conteúdo é preenchido antidemocraticamente por meio de
pautas solipsistas de intérpretes que, em muitos casos, não prestam contas de
suas decisões e que ignoram que todos os critérios necessários à tomada de
decisão devem ser selecionados dentro de marcos objetivamente comprováveis,
sob pena de uma perda irreversível da determinabilidade do Direito e de sua
capacidade de vincular condutas.1200
O modelo aqui descrito conjuga a maior parte dos postulados da doutrina
da eficácia indireta, salvo o contido no item (i), subitens (aa) e (bb), quanto à
existência excepcional de direitos fundamentais imediatamente vinculantes e à
necessidade de, em casos extremos, suprir-se a omissão legislativa.

1134 Tratasedo “caso da antena parabólica”, decidido em 9 de fevereiro de 1994, pelo Primeiro Senado
do TCF, que admitiu a reclamação constitucional proposta por um cidadão turco. O locatário resi dia
na Alemanha há alguns anos e habitava, como inquilino, um apartamento com a esposa, sete filhos e
uma filha em Essen. Ele desejava captar os sinais da televisão da Turquia e a locadora, uma sociedade
empresária de construção civil, negoulhe o pedido de instalação de antena parabólica. As instâncias
ordinárias negaram o pedido do locatário. Um dos fundamentos recaiu no direito do locador de
definir a destinação do uso do bem alugado, uma regra corriqueira em contratos dessa natureza,
inclusive no Direito brasileiro. Somese a isso, como afirmou o juízo de primeiro grau, o direito de
propriedade da empresa locadora haveria de ser respeitado e não restringido, porque o locatário
teria a seu dispor outros meios de informação, que satisfizessem seu interesse de manter os laços
culturais com a Turquia. O TCF, ao cassar as decisões ordinárias, deu preva lência ao direito
fundamental à liberdade de informação (art. 5º, apartado 1, item 1, segunda parte, LF/1949). O
tribunal constitucional afirmou que a LF/1949 não distingue entre informação nacional ou
estrangeira e que no suporte fático desse direito fundamental estaria compreendido o acesso à
informação com o emprego dos meios técnicos necessários à sua viabilização (BVerfGE 90, 27).
1135 Tratase do caso do cidadão alemão Friedhelm Adolf, um aposentado, que era locatário de um
imóvel em Düsseldorf havia anos. O senhorio resolveu o contrato de locação sem avisoprévio e
tentou despejar o locatário. O aposentado perdeu em primeiro e segundo graus de jurisdição e
aguardava se decisão do BGH. A causa terminou, porém, sem solução porque Adolf faleceu em
dezembro de 2017.
1136 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 36.
1137 “Não haverá retorno; nem mesmo isso seria desejável, porque com ele se negaria um êxito sig-
nificativo do Estado de Direito. O necessário não é uma modificação do Direito Constitucional
vigente, senão um desenvolvimento que leve mais em conta as particularidades da realização dos
direitos fundamentais nas relações jurídicoprivadas e que se mostre ele idôneo para se evitar em boa
medida os inconvenientes e os perigos expostos” (HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p.
26).
1138 SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do Direito...p. 5761 e 126127; DUQUE, Marcelo Schenk.

Direito privado e Constituição...p. 138141.


1139 SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do Direito...p. 57.
1140 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição...p. 140.
1141 TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional...p. 316361; SILVA, José Afonso da.
Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Malheiros, 1998. esp. p.
8186 (a primeira edição é de 1967 e a segunda de 1982).
1142 SUNDFELD, Carlos Ari. Mandado de injunção. Revista de Direito Público, v. 23, nº 94, p. 146151,

abr./jun. 1990; MODESTO, Paulo Eduardo Garrido. Inconstitucionalidade por omissão: categoria
jurídica e ação constitucional específica. Revista de Direito Público, v. 24, nº 97, p. 216227, jan./ mar.
1991.
1143 “Evidentemente há uma contradição do legislador constituinte, quando fala da aplicabilidade ime-
diata dos preceitos constitucionais. A própria Constituição referese ao mandado de injunção na falta
de norma regulamentadora, cabendo também aludir aos casos de inconstitucionalidade por
omissão. O próprio texto constitucional está cheio de uma remissão à legislação infraconstitucio nal
no art. 5º, como se vê dos incisos VIII, XV, XVIII, XXIV, XXVI, XXVII, XXVIII, XXIX, XLVI, LX” (PINTO
FERREIRA, Luiz. A concepção dos direitos individuais e as ilusões constitucionais. Revista de Direito
Constitucional e Internacional, v. 1, p. 274281, out.dez. 1992. item 5).
1144 PINTO FERREIRA, Luiz. A concepção dos direitos individuais e as ilusões constitucionais...cit. item 7.
1145 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 37. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros,

2014. p. 182.
1146 STF.MI 670, rel. Min. Maurício Corrêa, rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j.
25/10/2007, DJe206 31102008, RTJ 2071/11; STF. MI 708, rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j.
25/10/2007, DJe206 31102008, RTJ 2072/471.
1147 Para uma adequada distinção entre eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais: SILVA,
Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia...p. 210211.
1148 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais e a Constituição portuguesa de 1976...p. 244.
1149 “Não obstante a clareza de sua literalidade, o art. 18º, nº 1, da Constituição Portuguesa não con tém
em si a resposta sobre ‘como’ ocorre a vinculação dos particulares, (...). Apesar de existir
posicionamentos minoritários, conforme verificado, podese concluir que há um posicionamento
majoritário abarcando a tese da eficácia mediata, a teor da expressiva doutrina mencionada”
(OLIVEIRA JUNIOR, Francisco Dias de; PEARCE, Gabrielle Apoliano Gomes Albuquerque. A expe riência
portuguesa e o problema da eficácia dos direitos fundamentais entre os particulares na doutrina e na
jurisprudência...p. 154156).
1150 “No clássico filme ‘O poderoso chefão’ (ou ‘O padrinho’, em Portugal), de Francis Ford Coppola, o

jovem (e futuro mafioso) Vito Corleone é um excelente empregado de uma pequena loja no bairro
italiano. O dono é visitado pelo mafioso local, que exige um emprego para seu sobrinho. Apesar das
objeções, o dono do estabelecimento cede às pressões e comunica constrangido a Vito Corleone, pai
de família e dependente daquele salário para sobreviver, a perda de seu em prego. Em outra cena, o
empregador corre e alcança Vito para lhe entregar uma caixa com alimen tos, uma espécie de
indenização, recusada dignamente por ele. Assim, começa sua trajetória na vida do crime. É
lamentável e censurável. Mas, sem mafiosos e esses elementos melodramáticos, todos os dias
pessoas são demitidas e contratadas por critérios extremamente subjetivos e por razões que nunca
seriam captáveis pelos princípios ou pelos parâmetros do Direito Constitucional, por exemplo. Seria o
caso de exigir a aplicação do dever de fundamentar as decisões, presente na Constituição, para tais
fatos da vida privada? Evidentemente que não. Prevalece, no mundo real, a ‘cláusula Vito Corleone’,
para se usar de uma metáfora cinematográfica (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto
epistemológico...p. 64).
1151 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais... p.
125.
1152 HESSE,Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 3738. Em sentido aproximado: THOMALE, Chris.
Cuius regnum eius iudicium: emancipando o discurso jurídico privado em face dos direitos humanos.
Tradução de Patrícia Cândido Alves Ferreira. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 13, p. 391418,
out./dez. 2017. esp. p. 409417.
1153 MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria geral do Direito Civil...p. 73.
1154 MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria geral do Direito Civil...p. 7576.
1155 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte. Staatsrecht II...cit. p. 4546; DI FABIO, Udo. Artikel 2,
Abs.1. In. MAUNZ, Theodor; DÜRIG, Günter. Grundgesetz Kommentar. 85. ed. München: Beck, 2019. v.
1. p. 119120 (quanto à distinção e à superposição entre direitos fundamentais e normas de Direito
Civil).
1156 Fazse uso aqui de uma linguagem do constitucionalismo clássico, que identifica no parlamentar um

mandatário ou procurador da vontade popular. A aproximação com a linguagem civilística do


contrato de mandato não é sem causa. O legislador é mandatado do povo para decidir em seu nome,
mas não se pode desviar dos comandos do mandante, que lhe foram transmitidos nas eleições e que
podem ser revogados ou renovados periodicamente.
1157 HESSE, Konrad. Bedeutung der Grundrechte. In. BENDA, Ernst; MAIHOFER, Werner; VOGEL, Hans-
Jochen. Handbuch des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland...cit. nota marginal 57.
1158 BVerfGE 66, 116, j. 25.1.1984.
1159 BVerfGE 66, 116, j. 25.1.1984.
1160 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 28.
1161 Art. 183, inciso XII, CC/1916.
1162 Art. 178, § 1º, CC/1916.
1163 ZANETTI,
Cristiano de Sousa. Direito Contratual contemporâneo: A liberdade contratual e sua frag-
mentação. São Paulo: Método, 2008. p. 277278.
1164 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte. Staatsrecht II...cit. p. 4647; HERDEGEN, Matthias.
Artikel 1, Abs.3. In. MAUNZ, Theodor; DÜRIG, Günter. Grundgesetz Kommentar...cit. nota marginal 65.
1165 No sentido de que as cláusulas gerais são o ponto fraco da teoria da eficácia indireta: BILBAO

UBILLOS, Juan María. La eficacia de los derechos fundamentales frente a particulares... cit. p. 318.
1166 RODRIGUES JR., Otavio Luiz; RODAS, Sergio. Entrevista com Reinhard Zimmermann e Jan Peter
Schmidt. Tradução do inglês por Mark Walker. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 5. cit;
RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico...p. 6164; LEAL, Fernando. Seis obje ções ao
Direito Civil constitucional. Direitos Fundamentais e Justiça...cit. p. 134; VILLELA, João Baptista.
Variações impopulares sobre a dignidade da pessoa humana. Superior Tribunal de Justiça:
Doutrina...cit. p. 562; JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio. O direito ontem e hoje: crítica ao
neopositivismo constitucional e à insuficiência dos direitos humanos...cit.; ÁVILA, Humberto.
“Neoconstitucionalismo”: entre a “ciência do direito” e o “direito da ciência”...cit.
1167 SCHLINK, Bernhard. Freiheit durch Eingriffsabwehr. Rekonstruktion der klassischen
Grundrechtsfunktion...p. 461462; HWANG, ShuPerng. Verfassungsgerichtliche Abwägung:
Gefährdung der gesetzgeberischen Spielräume? Zugleich eine Kritik der Alexyschen formellen
Prinzipien. Archiv des öffentlichen Rechts - AöR, v. 133, p. 606628, 2008. (Com fortes críticas à
possibilidade de êxito de um “trabalho de racionalização” da ponderação, esp. p. 618 e ss.)
1168 RÜCKERT, Joachim. Ponderação – a carreira jurídica de um conceito estranho ao direito ou: rigidez
normativa e ponderação em transformação funcional. Tradução de Thiago Reis. Revista Direito GV, v.
14, nº 1, p. 240267, janabr 2018. p. 242.
1169 “No direito privado, ela [a ponderação] limitavase a ‘ponderação de interesses’ segundo critérios

valorativos predefinidos em lei. Somente no período nacionalsocialista é que esses limites foram
extrapolados – para nunca mais serem retraçados claramente” (RÜCKERT, Joachim. Ponderação – a
carreira jurídica de um conceito estranho ao direito ou: rigidez normativa e ponderação em
transformação funcional...p. 249). Para um apanhado em língua portuguesa das critíticas à pon-
deração: BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Juízo de ponderação na jurisdição constitucional. São Paulo:
Saraiva, 2009. p. 57107.
1170 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemológico...p. 59 ss; LEAL, Fernando. Seis objeções ao
Direito Civil constitucional. Direitos Fundamentais e Justiça...cit. p. 140145; VILLELA, João Baptista.
Variações impopulares sobre a dignidade da pessoa humana. Superior Tribunal de Justiça:
Doutrina...cit. p. 562; TOLEDO, Cláudia Mansani Queda de. Breves reflexões sobre as eficá cias direta e
indireta dos direitos fundamentais: Entre a dignidade humana na CF/88 e a dignidade do Direito
Privado...cit., loc. cit.
1171 TJAC, RT 902/250.
1172 “Temse ainda o enfoque dado pela Constituição Federal de 1988, ao prevê o dever de reparação do
dano moral, em que destaca, no seu art. 1º, III, ao mencionar sobre a consagração à dignidade
humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático de Direito. E, assim, o dano moral
adquiriu nova feição e maior dimensão, uma vez que a dignidade humana é a base de todos os
valores morais, traduzse na essência de todos os direitos personalíssimos. O direito à honra, ao nome,
à imagem, à intimidade, à privacidade ou a qualquer outro direito da personalidade, todos
englobados no direito à dignidade” (TJRO, RT 837/345).
1173 TJRN. Ap. 2014.0193621 1ª Câmara Cível j. 24/11/2016 v. u. julgado por des. Jarbas Bezerra DJe

8/12/2016.
1174 PALMER, Vernon Valentine. Danos morais: o despertar francês no século XIX. Tradução e notas de
Otavio Luiz Rodrigues Jr. e Thalles R. Alciati Vallim. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 9, ano 3,
p. 225241, out./dez. 2016. p. 241.
1175 PALMER, Vernon Valentine. Danos morais: o despertar francês no século XIX...p. 231.
1176 PALMER, Vernon Valentine. Danos morais: o despertar francês no século XIX...p. 226.
1177 PALMER, Vernon Valentine. Danos morais: o despertar francês no século XIX...p. 241.
1178 “Tais
teorias não são, contudo, criação da dogmática dos direitos fundamentais, e são conhe cidas
no âmbito do Direito Civil há muito tempo, tendo suscitado intensos debates sobretudo na França,
entre Planiol e Ripert, de um lado, e Josserand, de outro” (SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos
fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia...p. 127).
1179 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 39.
1180 “O Direito Privado tem sua História, sua metodologia, seus princípios e suas funções no que se po-
deria chamar de ‘divisão do trabalhoʼ entre as diversas províncias jurídicas. Não é adequado fazer o
transplante desses elementos do Direito Público para o Direito Privado. O estatuto epistemoló gico
do Direito Privado não se coaduna com essa transposição, porque desnecessária e imprópria. Na raiz
de todos os problemas acima descritos, está essa distorção, que, a cada dia, com o silêncio de muitos
civilistas, faz com que o Direito Privado assuma culpas históricas que não lhe pertencem e adote
métodos e princípios que não se coadunam com seus fins” (RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto
epistemológico...p. 64).
1181 FORSTHOFF, Ernst. Der Staat der Industriegesellschaft...p. 143144.
1182 MICHAEL, Lothar; MORLOK, Martin. Grundrechte...cit. p. 243244 (sobre a inconveniência da efi cácia
direta nas relações entre os particulares em prejuízo da autonomia privada); HERDEGEN, Matthias.
Artikel 1, Abs.3. In. MAUNZ, Theodor; DÜRIG, Günter. Grundgesetz Kommentar...cit. nota marginal 59;
KHOL, Andreas. The protection of human rights in relationships between pri vate individuals: The
Austrian situation. In. AA.VV. René Cassin...cit. p. 195213 (com afirmação textual nas p. 212213);
FUCHS, MarieChristine. O efeito irradiante dos direitos fundamentais e a autonomia do Direito
Privado: a “decisão Lüth” e suas consequências...cit. p. 228 e ss.; “Só um Estado paternalista se
empenharia em proteger amplamente os cidadãos contra si próprios” (ZIPPELIUS, Reinhold. Teoria
Geral do Estado. Ciência Política. Tradução de António Francisco de Sousa e António Franco. São
Paulo: Saraiva, 2016. p. 502); PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte. Staatsrecht II...cit. p. 46-
47; DI FABIO, Udo. Artikel 2, Abs.1. In. MAUNZ, Theodor; DÜRIG, Günter. Grundgesetz Kommentar...v. 1.
p. 115117.
1183 De um modo geral, sobre a mudança no papel, no conceito e nas tarefas do legislador: BALDUS,
Christian; THEISEN, Frank; VOGEL, Friederike. „Gesetzgeber“ und Rechtsanwendung – Entstehung und
Auslegungsfähigkeit von Normen. Tübingen: Mohr Siebeck, 2013, esp. os textos de Christian Meyer-
Seitz intitulado Von der Arbeit am Gesetz (p. 2942) e de Frank Theise, com o título Die Entstehung von
Gesetzen. Einsichten aus Sicht der Ministerialverwaltung eines Bundeslandes (p. 4362).
1184 Nesse sentido: “Os princípios da Constituição penetram em todos os setores da ordem jurídica.
Refratamse sobre toda a vida jurídica, e portanto também sobre as situações civis. Mas isso não tem
nada que ver com a criação de um novo ramo do Direito. No domínio das relações civis a fonte
imediata é a civil, não a constitucional. Essa fonte deve ser interpretada dentro do quadro e das
orientações constitucionais, como toda a regra jurídica. Mas isso não equivale a admitir o que Otavio
Luiz Rodrigues Jr., num artigo notável, chama a tentativa de colonização do Direito Civil no marco da
constitucionalização. A epígrafe adotada não pode ser entendi da como afirmando o acoplamento a
cada ramo do Direito de um duplo constitucional. Este jogo de espelhos, de autogeração infinita de
novos ramos de Direito, não teria sentido, porque o que está em causa é simplesmente o
entendimento das regras vigentes. Por isso, não tem nem pode ter qualquer tradução em disciplinas
acadêmicas ou no ensino do Direito em geral” (ASCENSÃO, José de Oliveira. Panorama e perspectivas
do Direito Civil na União Europeia. In. AA.VV. Jornada de Direito Civil 5:2011. Brasília: Conselho da
Justiça Federal, 2012. p. 32); DIAS TOFFOLI, José Antonio. Centralidade do Direito Civil na obra de
Antonio Junqueira de Azevedo. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 13, p. 3357, out./dez. 2017.
p. 4345 (aludindo ao termo “colonização”).
1185 É esse um entendimento do TCF: BVerfGE 47, 46.
1186 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte...p. 492.
1187 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht...p. 28.
1188 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em torno
da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais...cit.; DUQUE, Marcelo Schenk. Direito
Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais...p. 190191.
1189 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais... p.

191.
1190 LEONARDO, Rodrigo Xavier. Associações sem fins econômicos...p. 115116.
1191 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito Privado e Constituição: Drittwirkung dos direitos fundamentais... p.
191.
1192 MICHAEL, Lothar; MORLOK, Martin. Grundrechte...cit. p. 243244.
1193 BILBAO UBILLOS, Juan María. La eficacia de los derechos fundamentales frente a particula res...p.
241243; DUQUE, Marcelo Schenk. Direitos fundamentais e direito privado...p. 115; SOMBRA, Thiago Luís
Santos. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas...p. 4954; STEINMETZ, Wilson. A
vinculação dos particulares a direitos fundamentais...p. 8891; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos
fundamentais e direito privado: algumas considerações em torno da vincula ção dos particulares aos
direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A Constituição concretizada: Construindo
pontes com o público e o privado...p. 128133.
1194 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em tor no
da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In. SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). A
Constituição concretizada: Construindo pontes com o público e o privado...p. 133.
1195 CANARIS, ClausWilhelm. Grundrechte und Privatrecht. Archiv für die civilistische Praxis -AcP. v. 184,
fascículo 3, p. 202246, 1984. p. 206207 (referindose à problemática do „sozialen Macht“)
1196 HESSE,Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland...p. 160, nota
marginal 357.
1197 RODRIGUES JR., Otavio Luiz. A fórmula de Radbruch e o risco do subjetivismo. Consultor Jurídico, 11

de julho de 2012. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2012jul11/direitocomparado formula-


radbruchriscosubjetivismo#_ftn1_1350. Acesso em 542017.
1198 Estaabordagem foi originalmente proposta em: RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Estatuto epistemoló-
gico do Direito Civil contemporâneo...p. 48 ss.
1199 BVerfGE 88, 203.
1200 BYDLINSKI, Franz. Juristische Methodenlehre und Rechtsbegriff...cit. p. 128 e 520.
CONCLUSÃO

SUMÁRIO. § 73. A vertigem das listas e “uma certa enciclopé dia chinesa”.
§ 74. “Distinção sistemática”, constitucionaliza ção e modelo fraco de
eficácia indireta
§73. A VERTIGEM DAS LISTAS E “UMA CERTA ENCICLOPÉDIA CHINESA”
Um dos textos mais famosos de Michel Foucault é de Jorge Luis Borges.
Essa afirmação parece ser duplamente contraditória. Primeiro por encerrar uma
tese dogmática de Direito Civil. Segundo por dizer que o escrito de alguém, que
lhe conferiu popularidade, pertence a outra pessoa. A primeira contradição será
esclarecida depois. Inicie-se pela segunda, que é mais singela. Michel Foucault
abre seu livro As palavras e as coisas com a seguinte frase: “Este livro nasceu de
um texto de Borges”. E prossegue explicando que o escritor argentino conseguiu
provocar-lhe o riso que, “com sua leitura perturba todas as familiaridades do
pensamento – do nosso: daquele que tem nossa idade e nossa geografia –,
abalando todas as superfícies ordenadas e todos os planos que tornam sensata
para nós a profusão dos seres”.1201
O texto de Jorge Luis Borges refere-se “a certa enciclopédia chinesa” que
recebeu o pomposo e paradoxal título de “Empório celestial de conhecimentos
benévolos”, em cujas “remotas páginas está escrito que os animais se dividem”
em “(a) pertencentes ao Imperador; (b) embalsamados; (c) amestrados; (d)
leitões; (e) sereias; (f) fabulosos; (g) cães vira-latas; (h) os que estão incluídos
nesta classificação; (i) os que se agitam feito loucos; (j) inumeráveis; (k)
desenhados com um pincel finíssimo de pelo de camelo; (l) et cetera; (m) os que
acabaram de quebrar o vaso; (n) os que de longe parecem moscas”.1202
Tanto quanto a Foucault, a estranha taxinomia da “enciclopédia chinesa”
fascina e perturba o autor desta tese. Os animais pertencentes ao imperador
abrem a classificação, distinguidos que foram por pertencerem ao soberano, ao
detentor do poder estatal. O critério do sujeito colocaria esses animais em uma
classe distinta. Surgiria uma dúvida: leitões e animais amestrados perderiam sua
autonomia por serem pertencentes ao imperador ou constinuaram singularmente
em suas respectivas classes? As sereias e os animais fabulosos, embora
colocados em classes distintas, poderiam ser reconduzidos a uma categoria
comum, a das ficções. Provavelmente, questões de ordem didática definiram que
sereias e animais fabulosos, posto que ambos fictícios, recaíssem em classes
autônomas. Os embalsamados estão mortos, o que é óbvio. Então, porque os
manter na lista? Excluindo-se da resposta o amor pela taxidermia, é de se supor
que o enciclopedista quisesse enfatizar a classificação histórica e a importância
de estudar conceitos de tempo esquecidos.
Os “animais desenhados com um pincel finíssimo de pelo de camelo”
assumem a forma imaginada pelo desenhista. Os animais “que de longe parecem
moscas” são perigosos. De perto, são maiores e mais complexos do que se
supõe. Os cães vira-latas são livres, ao tempo em que poucos se importam com
eles.
Contraditório ou mesmo paradoxal é lidar com os animais das classes (h) e
(l). Sim, os animais et cetera e os que “estão incluídos nesta classificação”
podem arruinar o “Empório celestial de conhecimentos benévolos”. Os animais
et cetera são os que se acham excluídos desta classificação. Como bom latinista,
o sábio chinês saberia que et cetera significa “e outras coisas mais”. Logo, é
evidente que esses animais estão fora da lista. Mas, ao serem nela incluídos,
estão simultaneamente incluídos e excluídos. Desafio para qualquer lógico são
os “animais incluídos nesta classificação”. Se eles formam um conjunto
autônomo, que, por definição, compreende todos os conjuntos, cria-se um
paradoxo lógico: a classe é maior do que ela mesma, o que é um absurdo lógico-
formal.
Toda essa explicação para uma enciclopédia que talvez nunca tenha
existido, salvo na mente de um escritor atemporal como Borges, deve-se ao fato
de que as classificações possuem uma lógica que não pode ser ignorada. Não é
possível que o Direito Civil, como parte central do Direito Privado, tenha ou não
tenha autonomia, em simultâneo. Esse é o discurso que prosperou nas últimas
décadas (quando não se alude radicalmente ao fim da “distinção sistemática”).
§74. “DISTINÇÃO SISTEMÁTICA”, CONSTITUCIONALIZAÇÃO E MODELO
FRACO DE EFICÁCIA INDIRETA
A autonomia epistemológica do Direito Civil depende da “distinção
sistemática”, terminologia tão bem desenvolvida por Bydlinski. Não por vaidade
acadêmica, apego ao século XIX e a seus valores, ou preservação de espaços de
conhecimento e de técnica, mas porque o fundamento do Direito Civil é a
autonomia privada1203 e sua independência relativa da Constituição permite
(como sempre permitiu) o desenvolvimento de uma metódica própria, com
princípios autônomos e com finalidades diferenciadas. Os problemas que o
Direito Civil enfrenta e resolve são estruturalmente diversos daqueles do Direito
Público, ainda que haja algumas aproximações eventuais.
As dificuldades de se estudar os três objetos desta tese – “distinção
sistemática”, constitucionalização e eficácia dos direitos fundamentais - podem
ser metaforicamente espelhadas na enciclopédia chinesa. Os objetos apresentam-
se como partes integrantes de um “empório celestial dos conhecimentos
benévolos”. Conceitos fluídos, argumentos cambiantes e a crescente moralização
do Direito impedem o repasse crítico do que são e para que servem os elementos
teóricos a eles associados. A função do Direito, que é a de resolver conflitos, é
esvaziada por força da hipercomplexidade de soluções que não precisariam
mobilizar a Constituição e os direitos fundamentais. Misturamse casos fáceis e
casos difíceis em uma mesma tábua, que demanda cada vez mais o recurso ao
texto constitucional, ainda que não se saiba ao certo (ou não haja consenso
sobre) o que seja a Constituição. Os “animais embalsamados” ladeiam “os que
se agitam feito loucos”. O texto normativo não vincula, dado que se pode
convocar também o contexto. Se o texto não é vinculante, os acordos podem ser
reinterpretados a todo momento, desde que se troque de intérprete e, com isso,
de sentido. O que eram “cães vira-latas” repentinamente podem ser aceitos como
“leitões”, a depender da orientação do conteúdo normativo a certos fins
escolhidos por membros de um grupo detentor da chave semântica.
Problemas de ordem ontológica, resultantes da apropriação pelo Direito de
características intrínsecas à Moral, e problemas epistêmicos, caracterizados pela
transformação do ato de interpretar em uma nova fonte do Direito, unem-se em
torno de uma “nova Parte Geral do ordenamento jurídico”, que é nominalmente
a Constituição. Dá-se, porém, que não se pode mais guardar referência ao texto
constitucional, pois ele é reelaborado a cada instante por uma “microconstituinte
permanente” (não mais radicada apenas no STF). Em nome de uma
constitucionalização total, o Código Civil perde suas funções jurídico-
normativas. Nasce um novo "mito da caverna”, que impele os seres humanos à
busca pela iluminação constitucional, à custa da perda de confiabilidade das
prognoses. Em sendo assim, o próprio texto constitucional é superável
internamente pelo recurso à meia dúzia de princípios (ou a um único, o da
dignidade humana), como se os “animais pertencentes ao Imperador” fossem
suficientes para completar a enciclopédia, ainda que existam “os desenhados
com um pincel finíssimo de pêlo de camelo”.
As soluções oferecidas na Primeira Parte e na Segunda Parte da tese
procuram reduzir os níveis de incerteza semântica, ontológica e epistêmica em
torno de elementos centrais para o Direito Civil contemporâneo. O diálogo com
a Filosofia do Direito e a Teoria do Direito, que sempre andaram ao lado do
Direito Civil, é indispensável, ainda que muitos dos referenciais em uso no
Brasil estejam datados dos anos 1970-1980 e diversas das pautas de investigação
nesses setores remontem aos anos 1960, confundindo-se com pesquisas do
movimento dos Critical Legal Studies, nos Estados Unidos.
A opção feita nesta tese por se afirmar a existência da “distinção
sistemática”, um conceito negado pelo positivismo kelseniano, e de restringir
conceitualmente a constitucionalização a um seleto grupo de hipóteses, foi um
passo decisivo para se chegar à Terceira Parte. Restaurada a “grande dicotomia”
e contido o conceito de constitucionalização, dedicou-se ao exame da mais
sensível expressão desta última para o Direito Civil: a eficácia dos direitos
fundamentais em relação aos particulares.
A conservação da autonomia epistemológica, como realçado ao longo da
tese, passa também pelo confinamento conceitual da constitucionalização do
Direito Civil. Ela não pode assumir as proporções e o apetite de um Moloch. A
constitucionalização por elevação, por reforma legislativa e por irradiação
explicam adequadamente esse processo, que é internacional e inevitável, mas
sem sofrer com os problemas metódicos decorrentes de uma
sobreconstitucionalização.
A metódica do Direito Civil brasileiro, até para que passe por uma fase de
renovação interna, precisa encontrar um modelo adequado para estabelecer
pontes com os direitos fundamentais, os principais fatores de irradiação dos
valores constitucionais no sistema privatístico. De entre os dois principais
modelos, da eficácia direta e da eficácia indireta, o segundo é o mais adequado.
A mitigação de certos elementos do modelo da eficácia indireta, em sua
formulação tradicional, aqui dita forte, implica a elaboração de um modelo fraco
de eficácia indireta. Esse modelo fraco contemporiza a hipótese excepcional de
eficácia direta de certos direitos fundamentais e admite a possibilidade eventual
de insuficiência de proteção por omissão legislativa. No geral, contudo, o
modelo fraco submete-se aos postulados originais de teoria de Dürig, aplicada
pelo TCF. O modelo fraco também promove a incorporação do conceito
operacional “fator de correção”, que é importante para a identificação dos
“cavalos de Troia” axiológicos.
Não se tem a ilusão de que a adoção de um modelo fraco de eficácia
indireta possa solucionar todos os problemas operacionais da
constitucionalização. O controlador das portas de entrada dos direitos
fundamentais para o direito ordinário é um elemento essencial para mitigar a
“colonização” (ou a “inundação”) deste último por aqueles. Ainda que o
controlador falhe – e é muito provável que isso ocorra – os diques de contenção
exteriorizam-se em uma dogmática forte, capaz de emitir respostas coerentes e
de criticar os excessos de uma sobreconstitucionalização. A boa-fé objetiva ou
os bons costumes podem ser tão apropriáveis por uma pauta funcionalizante do
Direito quanto a dignidade humana ou a igualdade. Os elementos morais, que
dividem as pessoas, ao se integrarem em fórmulas jurídicas, podem tanto
ductilizar o Direito quanto nele introduzir “cavalos de troia”, cujo efeito é tão
somente o de esmurrar a mesa, como disse Alf Ross, ao mencionar o uso do
valor “justiça” em uma discussão jurídica.
É preciso recordar da metáfora do cimento fresco da calçada reformada.
Ima-gine-se uma sociedade com uma dogmática forte e com controles mais
rígidos às portas de entrada dos fatores de correção externos ao sistema interno.
Nessa sociedade, reforma-se uma calçada e substitui-se a cobertura de cimento
por outra. Os operários colocam uma placa sobre o cimento fresco: é proibido
pisar na calçada. Passados alguns dias, o cimento está seco e a placa não foi
retirada. A regra de proibição permanece vigente, mesmo tendo desaparecido sua
finalidade. A incidência da boa-fé objetiva permitiria ductilizar essa regra e,
mesmo com a placa, as pessoas voltariam a utilizar a calçada. Esse exemplo em
uma sociedade com uma dogmática fraca e sem controles rígidos aos portais do
sistema interno teria outra conclusão: a calçada seria reformada e os operários
colocariam uma nova camada de cimento fresco, com uma placa proibindo pisar
naquele espaço. Nessa sociedade, em poucos instantes após a saída dos
operários, haveria pegadas, corações e nomes desenhados e outros signos na
calçada. Provavelmente, a placa com a regra de proibição seria colocada de
cabeça para baixo. Aplicar a boa-fé nesse caso só aumentaria o nível de
desrespeito à regra de proibição. Flexibilizar-se-ia o que já é flexível, com
enorme perda para o sistema jurídico.
Diante desse quadro, o modelo fraco da eficácia indireta é a resposta mais
adequada às características da sociedade brasileira. Essa escolha em nada se
relaciona à origem alemã da eficácia indireta, muito menos a uma submissão
cultural à Alemanha. Esse argumento é contraditório e puramente retórico, dado
que, como já exposto na tese, ambas as teorias são alemãs e isso não as
desqualificam. O modelo fraco da eficácia indireta é superior e adaptável à
realidade e às necessidades brasileiras pelos inúmeros fundamentos apresentados
nesta tese. Tais qualidades não são partilhadas com modelos sincréticos (vide
54.4), cujas bases são alteráveis na medida em que se formulam críticas
(“camaleões jurídicos”) ou ao sabor de circunstâncias políticas. Ainda conforme
esta tese, não há problemas em se defender o modelo da eficácia direta (forte ou
fraco), como fazem muitos autores sérios no Brasil. O ponto crítico está na
incoerência metodológica e na criação de modelos ad hoc, sem qualquer
possibilidade de se investigar a genealogia das ideias e a coerência de seus
postulados centrais. Os efeitos desse processo já se fazem sentir. A perda de
referenciais metodológicos adequados cobra seu salário por meio do aumento da
irracionalidade decisória, da impossibilidade de prognoses e do desequilíbrio
entre os poderes democráticos.
O Direito Civil contemporâneo segue a trajetória iniciada pelos fundadores
da metodologia que até hoje serve de base para toda a ordem jurídica. Atualizá-
lo para enfrentar os desafios da hipercomplexidade, da fragmentariedade e das
desigualdades sociais é um passo decisivo para que continue a iluminar a
Ciência do Direito.

1201 FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas. Tradução de Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins
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2. ALEMANHA
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ÍNDICE DE JURISPRUDÊNCIA CITADA

1. JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA
1.1. Supremo Tribunal Federal (STF)
STF. RE 2675-DF, rel. Min. Costa Manso, j. 05/01/1938.
STF. RE 4001, rel. Min. Waldemar Falcão, j. 21/10/1941, Coletânea de
Acórdãos no 134, p. 9.
STF. RE 24065, rel. Min. Luiz Gallotti, Primeira Turma, j. 24/06/1954, DJ 05-
08-1954, p. 9393.
STF. RE 24190, rel. Min. Antonio Villas Boas, Segunda Turma, j. 08/11/1957,
DJ 12/12/1957.
STF. AI 25132, rel. Min. Ribeiro da Costa, Segunda Turma, j. 25/07/1961, DJ
17-08-1961, p. 2006.
STF. RE 109691, rel. Min. Francisco Rezek, Segunda Turma, j. 18/08/1987, DJ
25/09/1987.
STF. ADIn 2, Pleno, rel. Min. Paulo Brossard, j. 06/02/1992, DJU 21/11/1997.
STF. RE 153771, rel. Min. Carlos Velloso, rel. para o acórdão Min. Moreira
Alves, Tribunal Pleno, j. 20/11/1996, DJ 05/09/1997.
STF. ADI 2076, rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, j. 15/08/2002, DJ
08/08/2003.
STF. HC 82424, rel. Min. Moreira Alves, rel. para o acórdão Min. Maurício
Corrêa, Tribunal Pleno, j. 17/09/2003, DJ 19/03/2004.
STF. RE 201819, rel. Min. Ellen Gracie, rel. para o acórdão Min. Gilmar
Mendes, Segunda Turma, j. 11/10/2005, DJ 27/10/2006.
STF. ADPF 33, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 07/12/2005, DJ de 27/10/2006.
STF. RE 565714, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 30/04/2008, DJ de 08/08/2008.
STF. RE 387271, rel. Min. Marco Aurélio, j. 08/08/2007, DJ de 1º/02/2008.
STF. MI 670, rel. Min. Maurício Corrêa, rel. para o acórdão Min. Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, j. 25/10/2007, DJe-206 31-10-2008, RTJ 207-1/11.
STF. MI 708, rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 25/10/2007, DJe-206
31-10-2008, RTJ 207-2/471.
STF. ADPF 130, rel. Min. Carlos Britto, Tribunal Pleno, j. 30/04/2009, DJe-208
06/11/2009.
STF. RMS 26212, rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, j.
03/05/2011, DJe 18/05/2011.
STF. ADPF 132, rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, j. 05/05/2011, DJe-198
14/10/2011.
STF. RE 363889, rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, j. 02/06/2011, DJe-238
16/12/2011.
STF, RE 878694, rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. 10/05/2017, DJe-
021 06/02/2018.
STF. Rcl 11243, rel. Min. Gilmar Mendes, rel. para o acórdão Min. Luiz Fux,
Tribunal Pleno, j. 08/06/2011, DJe-191 05/10/2011.
STF. ADPF 156, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 18/08/2011, DJ de 28/10/2011.
STF. ADI 4815, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, j. 10-6-2015, DJe-018
01/02/2016.
1.2. Superior Tribunal de Justiça (STJ)
STJ. REsp 76.362/MT, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j.
11/12/1995, DJ 01/04/1996.
STJ. REsp 113.710/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j.
25/02/1997, DJ 31/03/1997.
STJ. HC 12.547/DF, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j.
01/06/2000, DJ 12/02/2001.
STJ. REsp 272.739/MG, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, j.
01/03/2001, DJ 02/04/2001.
STJ. REsp 472.594/SP, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, rel. p/
Acórdão Min Aldir Passarinho Junior, Segunda Seção, j. 12/02/2003, DJ
04/08/2003.
STJ. REsp 502.739/PE, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 21/10/2003, DJ
17/11/2003.
STJ. REsp 541.867/BA, Segunda Seção, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, rel.
p/ acórdão Min. Barros Monteiro, j. 10/11/2004, DJ 16/05/2005.
STJ. REsp 502.995⁄RN, rel. Min. Fernando Gonçalves, Quarta Turma, j.
26/04/2005, DJ 16/05/2005.
STJ. REsp 911.802/RS, rel. Min. José Delgado, Primeira Seção, j. 24/10/2007,
DJe 01/09/2008.
STJ. EDcl AgRg no Ag 886.162/PR, rel. Min. José Delgado, rel. para o acórdão
Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 18/12/2007, DJe 04/09/2008.
STJ. REsp 976.648/PE, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 04/11/2008, DJe
01/12/2008.
STJ. REsp 944.325/RS, rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j.
04/11/2008, DJe 21/11/2008.
STJ. AgRg no Ag 1045273/RS, rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, j.
18/11/2008, DJe 15/12/2008.
STJ. REsp 1.026.981/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j.
04/02/2010, DJe 23/02/2010.
STJ. REsp 1111743/DF, rel. Min. Nancy Andrighi, rel. para o acórdão Min. Luiz
Fux, Corte Especial, j. 25/02/2010, DJe 21/06/2010.
STJ. AgRg no REsp 1056333/RJ, rel. Min. Denise Arruda, rel. para o acórdão
Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j. 25/05/2010, DJe 18/06/2010.
STJ. REsp 302.906/SP, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j.
26/08/2010, DJe 01/12/2010.
STJ. REsp 1210340/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j.
26/10/2010, DJe 10/11/2010.
STJ. REsp 877965/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j.
22/11/2011, DJe 01/02/2012.
STJ. REsp 962.980/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j.
13/03/2012, DJe 15/05/2012.
STJ. EDcl no REsp 633.713/RS, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira
Turma, j. 11/02/2014.
STJ. AgRg no REsp 1.453.745 MG, 1a Turma, Min. Napoleão Nunes Maia
Filho, j. 19/03/2015, DJe 17/04/2015.
STJ. REsp 1255179/RJ, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j.
25/08/2015, DJe 18/11/2015.
STJ. REsp 1535727/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 10/05/2016,
DJe 20/06/2016.
STJ. REsp 1581505/SC, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j.
18/08/2016, DJe 28/09/2016.
STJ. REsp 1622555/MG, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 22/02/2017,
DJe 16/03/2017.
STJ. REsp 1431370/SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j.
15/08/2017, DJe 22/08/2017.
STJ. HC 439.973/MG, rel. Min. Luis Felipe Salomão, rel. para o acórdão Min.
Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 16/8/2018, DJe 04/09/2018.
1.3. Tribunal Superior do Trabalho (TST)
TST. RR 371-94.2012.5.18.0008, Primeira Turma, Min. Walmir Oliveira da
Costa, j. 12/08/2015.
1.4. Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)
TJSP. Arguição de Inconstitucionalidade 0056828-94.2015.8.26.0000, rel. Des.
Tristão Ribeiro, j. 17/08/2016.
1.5. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN)
TJRN. Ap 2014.019362-1 - Primeira Câmara Cível - j. 24/11/2016 - v. u., rel.
des. Jarbas Bezerra - DJe 8/12/2016.
1.6. Tribunal de Justiça do Acre (TJAC)
TJAC, RT 902/250.
1.7. Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO)
TJRO, RT 837/345.
2. JURISPRUDÊNCIA ESTRANGEIRA
2.1. Jurisprudência da Alemanha
2.1.1. Tribunal Constitucional Federal (TCF ou BVerfG)
BVerfGE 7,198 (Caso Lüth).
BVerFGE 69, 315.
BVerfGE 80, 137.
1BvR 909/08, publicado em NJW-RR 2010, 156.
1BvR 699/06, publicado em NJW 2011, 1201.
BVerfG, 11.04.2018 - 1 BvR 3080/09.
BVerfGE 61, 358.
BVerfGE 79, 256.
BVerfGE 90, 263.
BVerfGE 85, 80.
BVerfGE 90, 27.
2.1.2. Tribunal Federal (BGH)
BGH, j. 20/03/2002, XII ZR 176/00 (Jena), NJW 2002.
BGH, j. 12/11/1997, IX ZR 274/96 (Hamm), NJW 1998, 894.
BGH, j. 25/11/2009, XII ZR 92/06 (OLG Koblenz), NJW 2010, 998.
2.1.3. Tribunal Federal do Trabalho (BAG)
BAGE 1, 185, publicado em NJW 1955, p. 606-608.
BAGE 4, 274, publicado em DÖV 1958, 780.
BAGE 47, 363, publicado em NJW 1986, 85.
2.1.4. Tribunal do Reich (RG)
RGZ 78/239.
2.2. Jurisprudência dos Estados Unidos da América
2.2.1. Suprema Corte
New York Times Co. v. Sullivan 376 U.S. 254 (1964). Obergefell v. Hodges,
14-556, U.S. 23 (2015).
2.2.2. Corte de Nova York
230 N.Y. 239, Jacob & Youngs, Inc. v. Kent.
2.3. Jurisprudência do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte
2.3.1. King’s Bench (ou Queen’s Bench)
Kingston v. Preston, 2 Doug. 689 [K.B. 1773].
126 Eng. Rep. 160(a), Boone v. Eyre [K.B. 1777]. Hochster v. De La Tour
(1853) 2 E&B 678.
2.4. Jurisprudência do Canadá
2.4.1. Suprema Corte
RWDSU v. Dolphii Delivery Ltd., [1986] 2 S.C.R. 573.
2.5. Jurisprudência da África do Sul
2.5.1. Suprema Corte
Caso Du Plessis v. De Klerk, 1996 (3) SA 850, 914-15.
2.6. Jurisprudência do Peru
2.6.1. Tribunal Constitucional
Exp. Nº 067-93-AA/TC; caso Pacheco Chávez.
Exp. 713-2000-AA/TC, de 2000; caso Calderón Díaz.
Exp. 101-2000-AA/TC, de 2001; caso Noriega Gárate.
Exp. 902-2000AA/TC, de 2001; caso Cárdenas Torres.
Exp. 1401-2001-AA/TC, de 2002; caso Quispe Huamán.
Exp. 1612-2003-AA/TC, de 2003.
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