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Universidade Federal de São João del-Rei – UFSJ

Departamento de Ciências Sociais, Políticas e Jurídicas –


DECIS
Curso: História
Professor: João Paulo Rodrigues

PRIMEIRO TRABALHO ESCRITO – ENSAIO SOBRE


POPULISMO.

São João Del-Rei


Universidade Federal de São João del-Rei
2014

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Wellington Aparecido Lopes de Lima

Trabalho realizado para a obtenção de nota na disciplina de


América IV, do curso de História.

São João del-Rei


2014

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Introdução

É interessante se debater sobre o populismo e a participação popular que se tem dentro do


movimento. Contudo, alguns aspectos acabam por serem deixados de lado, ou mesmo relegados a
um pensamento genérico, onde é englobado a outros quesitos, sem que se dê espaço para aparecer
os seus pormenores.
A ideologia populista esteve presente em vários governos mundiais, contudo sua presença
na América Latina é muito marcante, onde quase todos os países tiveram governos populistas no
comando da nação em algum momento de sua história. É comum, como dito anteriormente, se
generalizar alguns pontos, e englobar todos em um único pensamento, como ocorre com a
aceitação do modelo politico pelas classes trabalhadoras, por exemplo; mas nem todas as classes
se mostram submissas ao sistema, e uma delas é a classe docente, seja ela ligada ao ensino
superior ou não.
A educação sempre é usada como meio de se difundir um ideal e/ou ideia de pensamento
ideológico, isso ocorreu no Brasil com Getúlio Vargas, na Alemanha de Hitler, na Itália de
Mussolini, e na Argentina de Perón.
Esse uso politico da educação, sempre é feito de uma forma que engessa a prática do
professor, deixando pra ele apenas dois caminhos, o caminho oferecido pelo governo ou rebelar-
se contra o sistema, correndo o risco de sofre retalhações do governo, ou de seus colegas de
profissão, que são favoráveis ao regime.
É seguindo essa perspectiva, da educação como meio de articulação de um regime
politico, de uma ideologia politica, que esse texto seguirá, trabalhando essa perspectiva dentro da
sociedade argentina do período peronista, remetendo sempre que possível a outras áreas da
sociedade e a outras localidades da América Latina, que por ventura tenham semelhanças com o
assunto tratado.

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Os professores durante o Peronismo.

O peronismo segundo o texto de Daniel James é a opção majoritária entre os trabalhadores


durante o período do governo de Frondizi:
Os resultados mais visíveis do período da Resistência foram a confirmação do peronismo enquanto
opção majoritária entre os trabalhadores argentinos e sua presença dominante no movimento sindical.
(JAMES, 1985: 9)
Uma escolha majoritária não quer dizer unânime, contudo é interessante notar que durante
o governo de Frondizi, a oposição ao peronismo não se apresenta de forma relevante, o que não
se pode dizer do período anterior a 1958, onde se iniciou o governo Frondizi. A oposição ao
peronismo era tão mais clara, que chegou a tomar o poder em 1955 com a Revolução
Libertadora, que instaurou um governo militar, que durou até 1958.
Uma das classes que merecem destaques, pela atuação dual entre peronismo e
antiperonismo é a classe dos professores, como já mencionado a educação é uma grande chave de
difusão da ideologia politica de um local, e durante o governo de Juan Perón não foi diferente.
Em seu artigo Flávia Fiorucci, lida com a questão dos professores e sua participação no governo
peronista, indagando se eles podem ser tachados de antiperonistas ou não.
Uma característica que se pode destacar em alguns governos populistas, é a atenção dada ao
ensino, seja ele básico ou superior. Perón ao assumir o governo argentino, inicia mudanças de
grande valor e importância no sistema de ensino, mudando leis e instituições, como fica claro a
seguir:
La llegada del peronismo al gobierno en 1946 implicó cambios concretos en la dinámica del régimen
educativo estatal porque supuso la reforma de organismos y leyes de larga data y, un incremento
significativo en el número de alumnos y escuelas. (FIORUCCI, 2012: 141)
Assim como é feito por Perón na Argentina, onde ele modifica leis, cria escolas e o
ministério, Vargas fez no Brasil entre a década de 1930 e 1940, curioso também é a aproximação
do regime com o ala católica, estipulando a inclusão da aula de religião no currículo. É nítido nos
dois casos citados a tomada de poder por parte do regime e sua ideologia, seja pela aproximação
com a igreja, agregando um grande número de apoiadores do governo, ou modificando leis e
criando instituições, que por sua vez focam seus esforços na educação.
Saindo um pouco das semelhanças, entre os governos, Perón faz na Argentina uma
mudança drástica, onde percebendo a necessidade da população, cria uma infinidade de novas

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escolas, desde o ensino primário até o superior. Sendo que em seu primeiro governo, onde as
mudanças foram maiores:
[...]se inauguraron según la estadística oficial 1069 escuelas; 1064 secciones de jardines de infantes;
6071 nuevas secciones de grado8. También se fundó la escuela domiciliaria y la escuela de policlínicos
para los niños imposibilitados por razones físicas de concurrir a los establecimientos escolares.
(FIORUCCI, 2012: 142)
Foi também durante seu primeiro governo que Fiorucci aponta o aspecto que é principal
neste ensaio, a atuação “politica” dos professores. Todo e qualquer cidadão, dentro de um regime
democrático tem direito de expressar sua opinião, mas se tratando da classe docente esse direito
se torna às vezes conflitivo, e é o que nos fica aparente no caso do peronismo, mas não só, no
Brasil de Vargas também ocorre esse tipo de problema, ou em qualquer outro regime/país que se
utilize da educação para propagar sua ideologia, pois com o mal uso do sistema educacional,
onde se focou apenas em difundir a ideologia do governo acaba por transformar o “[…]sistema
educativo oficial en un ‘engranaje de una maquinaria de propaganda’” (FIORUCCI, 2012: 153).
Quando Perón utiliza do sistema educacional argentino como seu veículo de propaganda
partidáriaI, ele força alguns professores à irem contra a sua visão particular de politica,
obrigando-os a doutrinarem os jovens. É a partir desse momento que os professores
antiperonistas iniciam sua campanha contra o regime de Perón, pois é inadmissível para o
docente ser forçado a doutrinar seus alunos com uma ideologia que eles não aceitam. Contudo,
Perón deixa claro, quando instaura o Peronismo como doutrina oficial, que os professores teriam
que se submeter ao seu pensamento, e que eles eram o ponto chave para a difusão da ideologia
pelo país.
É mostrado por Fiorucci, que esses docentes que não aceitavam a imposição do governo até
tentavam expressar seu pensamento nas escolas, mas acabavam sendo reprimidos por
companheiros de profissão favoráveis ao governo, ou pelo próprio governo que lhes afastava do
cargo, como ocorreu nas universidades, por exemplo. O texto de Flavia Fiorucci trabalha, em
grande parte dele, as denúncias feitas contra professores antiperonistas, mas também mostra que
tais denúncias, por mais que envolvessem o governo e dissessem que o denunciado era contra o
peronismo, eram também influenciadas por questões pessoais.

I É valido lembra nesse momento, que Juan Domingos Perón, não foi o primeiro presidente da Argentina a se
utilizar da educação para fazer politica, pois antes dele outros presidentes haviam feito esse uso. Contudo, os
presidentes anteriores a ele usam a educação para promover o nacionalismo e exaltar símbolos nacionais, sem
uma autopromoção como Juan Perón faz, ao estipular o Peronismo como doutrina nacional.

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As escolas, eram um grande campo de batalha ideológica, onde nem sempre o que estava
em jogo realmente é a ideologia, tanto que é citado um caso onde a professora é denunciada pelo
marido de sua diretora, pois ela havia se desentendido com sua mulher, e acusado-a de ter um
relacionamento afetivo com outra senhora.
Visto esta situação, é fácil perceber a falta de coletividade dos docentes dentro das escolas,
e a divisão ideológica dos mesmos quanto ao doutrinamento feito pelo governo, chegando ao
ponto de um inspetor do governo, que averigua uma denúncia, dizer o “[...] único sector que no
participaban del complot antiperonista era –de acuerdo al reporte enviado al Consejo– el de las
mucamas, las cuales, por su identidad política peronista eran maltratadas.”(FIORUCCI, 2012:
146). O trecho citado, também nos dá uma outra perspectiva sobre a luta
peronismo/antiperonismo nas escolas, mostrando que não só os antiperonistas eram vítimas de
perseguição, pois quando os mesmos se encontravam em cargos de poder, faziam valer de sua
referência, rechaçando quem era contra, como o caso das serventes da escola, que tinha
preferência clara pelo peronismo.
Os docentes acabam por ser uma classe dividida que não expressa grande impacto, ao que
parece, na oposição ou apoio ao governo, já que está divisão faz com que os lados se anulem e
não seja tão necessário que o governo intervenha.

Conclusão

Ao decorrer do texto, foi apontado alguns aspectos da classe docente Argentina, de maneira
breve, para que se possa ter uma ideia básica da importância da mesma. Como já foi mencionado,
a oposição ao regime de Juan Perón, foi intensa durante o seu governo, principalmente a partir do
início do segundo mandato, e a intensificação dessa oposição se deu devido a imposição da
doutrina peronista. Está forma de autopromoção e doutrinamento da população ficou a cargo das
instituições de ensino, o que acabou por ocasionar esse racha na classe, entre os antiperonistas,
contrários ao doutrinamento e os peronistas, apoiadores do governo.
A classe docente opositora, ou mesmo a ala que apoiava o governo, são quase nunca
retratadas, e sempre são englobadas em um contexto generalizante, onde suas individualidades
são esquecidas, e aglutinadas com pensamentos envoltos em um senso comum.

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A questão do peronismo ou do antiperonismo sempre privilegia as classes operarias,
oriundas das grandes fábricas, que junto com seus sindicatos se faziam ouvir, relegando pouco ou
nenhum prestígio aos docentes.
Com o pouco que encontrei sobre o assunto, pude observar que os professores do governo
Perón foram demasiadamente necessários para consolidação de sua politica populista; tais
governos sempre tem proximidade com classes ditas subalternas, o operariado, onde se
fortalecem e constroem uma massa de apoio a sua ideologia, contudo sempre demandam grande
atenção ao ensino, pois é de lá que eles conseguiram o maior apoio, um apoio futuro, vindo dos
jovens. Mas para isso eles precisam ultrapassar barreiras complicadíssimas, porque lidam com a
classe intelectual, que não será facilmente englobada aos seus apoiadores das fábricas, porque
essa classe não é beneficiada com as medidas que são tomadas, como diminuição da carga de
horaria de trabalho, ou algum tipo de seguro, pois eles são em sua maioria funcionários do
governo, que contam quase sempre com leis diferenciadas.
E por estarem próximos desse governo, fica mais fácil perceber as suas intenções, mesmo
que escondidas por trás de mudanças de leis, que visam organizar a função ou pro discurso que
dizem que as mudanças aplicadas pelo governo são para aliviar o “[…]injustificado divorcio y la
anarquía existentes entre las ramas de la enseñanza”.(FIORUCCI, 2012: 142).
Os professores como formadores de opinião, tem um dos papéis mais centrais dentro de
qualquer governo que queira se estabelecer no poder, seja ele o modelo que for, mas a atenção
voltada para tal classe é quase nula, nos estudos posteriores. Os estudos sobre a atuação politica
dos professores em regimes como o Peronismo ou o Varguismo ainda são escassas, muito vem
surgindo mas ainda é pouco comparado com o que se tem de estudos voltados para a ação de
sindicatos ligados a indústria ou movimentos militares, que acabam tomando o poder, como
ocorre na Argentina em 1955.
Se homens como Juan Perón e Getúlio Vargas demandaram tanta atenção para o ensino é de
se saber que ele tem um caráter central na formulação dos seus governos, mas as dificuldades
impostas pelos mesmos e as obrigatoriedades que surgem durante o governo, acaba por dificultar
o relacionamento do governo, com o seu cabo eleitoral mais incisivo, a educação. Não assumindo
lado na briga entre governo e oposição, posso dizer que é pela mão dos professores que governos
se consolidam ou acabam em falência, sem o professor para disseminar a ideologia do mais alto
escalão de poder, o regime entrará em declínio.

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As medidas tomadas pelos governos acima citados; mesmo que com o propósito implícito e
posteriormente escancarado de doutrinação, pelo menos no caso Argentino; de remodelar as leis
educacionais e de espalhar a educação pelo território nacional, por meio de novas escolas não
podem ser julgadas como inadequadas e apenas partidárias, pois trazem benefícios até hoje. Mas
foi o seu engessamento ideológico que ocasiona a antipatia dos professores, onde lhes tira a
liberdade de ensino, e deixa de lado um dos fatores mais importante para a educação, que é o
ensinar e não doutrinar.
Sendo assim, a atuação dos professores na Argentina, mesmo que pouco estudada, é de
grande importância também para o fim do regime peronista, junto com os demais movimentos
que culminaram com o golpe de 1955, e a chegada dos militares ao poder argentino.

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Bibliografia
 JAMES, Daniel, “Ideologia populista e resistência de classe: o peronismo e a classe
operária”, Revista Brasileira de História, 5 (10), mar.-ago. 1985: 5-27.
 FIORUCCI, Flavia. 2012. "EL CAMPO ESCOLAR BAJO EL PERONISMO 1946-
1955". Revista Historia de la Educación Latinoamericana, 14, jan.-jun. 2012:139-154.
 SCHWARTZMAN, S.; BOMENY, H.; COSTA, V. M. Tempos de Capanema. São Paulo,
Paz e Terra, 1984.

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