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O Livro de

Morienus

Essa é a história de como o Príncipe Khalid ibn Yazid ibn


Mu’awiyya chegou à ciência da riqueza espiritual entregue a
Morienus, o velho monge, por Estéfano de Alexandria, como está
escrito no livro de Ghalib, o fiador do Califa Yazid ibn Mu’awiyya,
de quem foi servo fiel, confiado com todas as posses de seu mestre,
e à época, é dito, se tornou de igual modo servo fiel de Khalid, filho
de Yazid.
Ghalib conta como Khalid ibn Yazid procurou Morienus, o
Grego, que viveu recluso nas montanhas de Jerusalém. Um dia,
Khalid viajou para um local chamado Dirmanam. Ele era assíduo
em sua busca pela Grande Obra, investigando continuamente todo
aquele que ele imaginasse estar a par dessa Operação, e nesta
ocasião um certo homem veio até ele, desejando lhe falar. Sabendo
disto, Khalid permitiu que o homem se aproximasse. Ele saudou
Khalid, que retornou seu cumprimento.

O camarada disse a Khalid:


- Eu moro nas montanhas de Jerusalém e vim ao Senhor, ó
Rei, com boas notícias. Nunca ninguém antes de mim deu a
qualquer rei tal motivo para alegrar-se.

- E que notícias são essas? – Perguntou Khalid.

Ele respondeu:
- Eu tenho ouvido muitos dizendo que és tu que busca
continuamente pela Operação a qual os Filósofos chamam de
Grande Obra. Eu trarei a ti o conhecimento através de um certo
romano bizantino, que vive recluso nas montanhas de Jerusalém,
mas cujo lar eu conheço bem. Ele envia grandes quantidades de
ouro a Jerusalém todo ano.

Khalid lhe disse:


- Se eu concluir que você disse a verdade, recompensarei com
o que você pedir. Mas se você mentir, deverá esperar o pior.

- Bem, – disse o camarada – que assim seja.

Então Khalid se alegrou bastante e ordenou que o homem


fosse recompensado com presentes, roupas e muito mais, assim
como prometido. E o rei me ordenou junto a outros servos para
segui-lo. E assim foi. Após bastante tempo indo de um lugar para
outro, na esperança de encontrar o recluso, finalmente
conseguimos. Ele era de estatura alta e, embora fosse velho e
magro, de semblante tão nobre que era uma maravilha a se
contemplar. Nos alegramos ao encontra-lo e conversar gentilmente
com ele, finalmente convencendo com palavras doces a ceder, e o
trouxemos de volta conosco ao nosso país, apresentando-o ao Rei
Khalid. Nunca antes vimos o rei tão satisfeito com algo. Enfim ele
se dirigiu a mim e perguntou o que nos havia motivado a ir e vir e
eu lhe contei a história do início ao fim.
Então o rei olhou o homem que havíamos trazido e desejou
saber por qual nome era chamado. O senhor respondeu:
- Eu me chamo Morienus, o grego.

E Khalid perguntou:
- Há quanto tempo você vive recluso nas montanhas?
Ele respondeu:
- Eu comecei o meu retiro quatro anos após a morte do Rei
Herakleios. (645 d.C.)

Então o rei convidou Morienus para se sentar e se levantou


ele mesmo para lhe dar um assento a seu lado, muito satisfeito com
sua reserva, modéstia e elegância.
O Rei lhe disse:
- Ó, Morienus, embora você seja recluso, não seria melhor
que você vivesse em convivência com os outros que sozinho nas
montanhas?
- Talvez, ó rei. – ele disse – Mas as virtudes que eu busco
estão em Deus e em Suas mãos, que farão como ele desejar. E
enquanto eu conceder isso, como você tem dito, a vida será mais
fácil para mim que nas montanhas, pois apenas que semeia deve
colher, e deverá colher aquilo que semeou. Agora eu acredito que
eu recebi alguma virtude por mim próprio. Um homem não pode
obter repouso exceto pelo trabalho do espírito.

- Isso é verdade – disse o Rei – se ditas do coração de quem


crê em Deus. Ó, Morienus, eu sou grato que você permaneça em
sua fé. Desejei vê-lo e então envia-lo.

Morienus disse a ele:


- Você não deve se maravilhar de alguém como eu, um mero
filho da raça de Adão. Na melhor das hipóteses, eu poderia ser
atraente de algum modo, exceto que o passar do tempo me
transformou. Há muitos como eu entre os homens. E por fim é a
morte cruel, cuja punição não há pior, mesmo uma punição mais
severa aguarda o espírito após a morte. Mas o Criador Todo
Poderoso é nosso auxílio.

O rei respondeu:
- Assim Deus pode confundir o homem, que é mais
desprezado a medida em que envelhece.

Então, o rei me ordenou a conduzir Morienus a uma habitação


próxima ao palácio real e buscar um dos sábios cristãos que
pudessem conversar com ele e confortá-lo com doces palavras, e
deixar seu coração em paz. Assim eu fiz e o rei tornou um hábito
visitar Morienus duas vezes por dia, sentando com ele e falando
com ele, sem lhe perguntar nada a respeito de seu Magistério. O rei
frequentemente passou um bom tempo e Morienus confiou
grandemente nele. Khalid perguntou diversas vezes a respeito dos
costumes tanto reais quanto comuns dos gregos e de seus tempos e
histórias. Sem prejuízo de nenhuma resposta, Morienus recontou
as maravilhas de seus feitos e discursou sabiamente em sua ciência,
todos assuntos que o rei nunca havia ouvido falar nem nunca havia
ninguém conseguido um lugar firme na afeição do rei quanto
Morienus conseguiu.
Até que Khalid se dirigiu a ele:
- Ó, Morienus, saiba que venho buscado há bastante tempo
pelo Magistério Superior, mas não encontrei quem me
aconselhasse nesse assunto. Portanto eu sinceramente peço que
você prepare para mim uma porção do seu Magistério. Você terá
de mim, então, o que quer que você me peça e eu verei que você
retorne a sua própria terra, se Deus quiser. Nem você precisa de
agora em diante ter qualquer medo de mim.

Morienus lhe respondeu:


- Ó Rei, que Deus lhe dê riqueza. Agora eu entendo que você
veio até mim apenas por uma grande necessidade. Mas eu desprezo
o tipo de segurança que você acrescentou, a saber que eu não
deveria teme-lo, na medida em que eu não tenho necessidade de
temer ninguém, salvo o próprio Deus. Você se aproximou de mim
como um igual em espírito, e agora eu vejo por sua afeição,
excelência e discriminação que alguém como eu não tenho razão
para guardar de você nada do que você busca, pois você é um
homem de boas intenções tanto quanto ações e demais virtudes.
Pois bem, você chegou a sua iniciação e instrução de modo simples
e com a maior facilidade. Que Deus seja louvado!

Após isso, Rei Khalid sorriu e disse:


- A grosseria da pressa ilude qualquer homem, a menos que
seja regido pela paciência. Eu sou da casa de Mu’awiyya e lá não
há força salvo a que reside no Deus mais alto.
- Ó rei, - disse Morienus – Que Deus lhe dê riqueza. Agora
cuida de examinar essa Operação e você a conhecerá e a
compreenderá bem. Examine-a cuidadosamente do início ao fim e
você saberá tudo quanto lhe pertença, com fé em Deus. Ninguém
será capaz de realizar ou concluir isto que você tanto vem
buscando através de qualquer conhecimento, exceto pela afeição e
gentil humildade, um perfeito e verdadeiro amor. Pois isto é algo
que Deus concede à guarda segura de seus servos eleitos até o
momento em que ele possa preparar alguém a quem possa ser
entregue os seus segredos. Assim é apenas a dádiva de Deus, que
escolhe entre seus servos humildes e obedientes aqueles a quem
revela-los.
- Certamente sabemos que nada pode ser feito sem o auxílio
e orientação de Deus, o mais alto e eterno. – disse Khalid.

Então o Rei Khalid me disse:


- Ó, Ghalib, rápido, sente-se e escreva o que temos dito.

Então Morienus prosseguiu:


- Deus Todo-poderoso em Seu poder criou servos incapazes
que nem desfazem o que ele fez nem adiantar o que ele retém, nem
sequer podem saber nada exceto o que Ele lhes concede. Nem são
capazes sequer de possuir nada exceto pela força que o mesmo
Deus lhe confere, nem governam seu próprio espírito exceto na
medida e pelo tempo em que Ele lhes determina. E dentre esses
servos, Ele escolhe alguns poucos pelo conhecimento que Ele
estabeleceu que resgata aquele que o domina da miséria desse
mundo e garante que se torne rico, pelo Querer Divino. Enquanto
aqueles assim escolhidos costumavam entregar esse conhecimento
a seus próprios herdeiros, ele foi perdido e seus mestres dele
desprovidos quando ninguém poderia encontrar quem mais o
conhecesse. Mas dos livros que descreveram o assunto
corretamente lá restou um pouco vindo dos profetas antigos, que
vieram antes de nós. Eles deixaram seu conhecimento como um
legado a seus sucessores, a quem Deus escolheu para se tornar
Adeptos de acordo com os métodos que tem sido explicado sincera
e francamente por seus predecessores. Os antigos, contudo, não se
dirigiam aos assuntos pertencentes a essa ciência usando seus
verdadeiros nomes, falando ao invés, como bem sabemos, em
linguagem velada, de modo a confundir os tolos em suas más
intenções. Isso eles fizeram formulando sua convicção e
provérbios em parábolas, assim apenas aqueles de grande
sabedoria seria capazes de desvendar seu verdadeiro significado.
Desde os antigos que ocultavam esse conhecimento, aqueles que
queriam aprender deveriam compreender suas máximas. Nem
poderiam desistir disso, mas deveriam fixar sua fé em Deus e
persistir até o fim em que Ele lhes traria a esse conhecimento,
graduando seu estado, e dando-lhes acesso direto e infalível aos
métodos dessa ciência.

O Rei Khalid disse então:


- Agora bem dito e ensinado, ó Morienus, não considero esses
preceitos estranhos, vindo de um professor de tal sabedoria e
experiência igual à sua, que deseja que eu possa aprender essa
ciência. Portanto explique-me claramente aquilo que eu lhe pedir,
poupando-me de trabalho inútil sobre essa matéria da qual eu
busco em você. Diga-me se esta Operação é realizada apenas com
um único princípio ou por diversos.
Morienus falou:
- Tudo é certificado por muitos e eu declaro que o que você
busca e muitas outras matérias, de acordo com testemunho de
autoridades. Quando você tiver examinado esses aforismos e lhes
dedicado bastante estudo, você descobrirá que o que as
autoridades ensinaram em seus livros é verdade. Agora,
respondendo à sua pergunta de se essa Operação tem uma raiz ou
diversas, saiba que tem apenas uma raiz, uma matéria e uma
substância da qual e somente com a qual é realizada, nada lhe é
adicionado ou subtraído. Quando alguns dos discípulos de
Herakleios lhe perguntou o que você me perguntou, ele lhes disse
como uma única raiz se desdobra em muitas coisas que retornam
novamente a Um, se tiverem ar. Ostanes declarou que os quatro
elementos, calor, umidade, frio e secura, são basicamente um e que
alguns desses são compostos de outros, bem como são a raiz da
qual os outros são compostos. As verdadeiras raízes são a água e
o fogo e desses são compostos o ar e a terra. Ostanes também disse
a Maria que é o nosso Mercúrio que tem domínio sobre nossa
terra, sendo claro e puro, enquanto a terra é feita da água mais
grosseira. Hermes disse que a terra é a mãe dos elementos, que
dela nascem e a ela retornam. Moisés, também, disse que todas as
coisas vêm da terra e a ela retornam. Como Hermes disse, assim
como todas as coisas vêm de uma única coisa, também a Grande
Obra é realizada de uma coisa e uma substância. Mesmo assim o
homem contém os quatro elementos unidos em seu corpo, embora
Deus os tenha criado diversificadamente secos ou separados,
juntos e reunidos ou espalhados. Mas cada operação funciona de
modo diferente, tendo sua cor específica e aplicação apropriada.
É por conta disse que essa matéria deve ser compreendida. Os
filósofos tem dado muitas confirmações.

O Rei Khalid então respondeu:


- Como pode ser que a Grande Obra tenha apenas uma raiz
e substância? Muitas autoridades se referem à sua raiz por um
grande número de diferentes nomes.
Morienus disse:
- Seus nomes podem variar, mas já disse que é apenas uma.
Nesse ponto citareis as autoridades que confirmarão o que tenho
dito.
- Diga-me tudo a respeito da maestria dessa Operação. –
disse o Rei Khalid.

Morienus disse:
- Herakleios disse que alguns de seus discípulos que a tâmara
vem da palmeira, bem como a palmeira é produzida daquela
mesma tâmara e de sua raiz cresce o caule pelo qual ela se
multiplica. Nesse ponto, Hermes disse: “Considere como o
vermelho é completamente feito por graus de vermelhidão.
Considere também o vermelho como um todo e o amarelo, em
graus de amarelice e o amarelo como um todo. De igual maneira
com as outras cores.” Assim como o caule emerge de um grão,
também muitos ramos surgem da árvore e a árvore de sua semente.
Um certo observador que renunciou inteiramente o mundo também
disse coisas como as que temos dito, a saber, que o homem vem do
esperma, assim como de um simples grãos centenas de outros
surgem, dos quais imensas árvores crescem. Assim também a
mulher foi feita de um homem, mas então de ambos nascem muitas
crianças, cada uma com diferentes cores e aparências. Novamente
diz o observador: “Imagine o alfaiate costurando seu tecido, com
o qual fez uma roupa ou adereço, usando apenas o tecido. A gola,
as mangas e a camisa são todas do tecido, costurados com um fio
também feito do tecido, nada mais sendo exigido. Assim também
consiste a Grande Obra em si, não exigindo nada mais, o próprio
Segredo dos Filósofos. Eles a chamaram em todos os lugares por
diversos nomes, ocultando-a assim de todos exceto os sábios, que
demonstraram e glorificaram essa Operação. Mas os tolos a
desprezaram e não se deram conta, ignorando do que ela é. Os
sábios usaram muitos termos nos livros, como sendo “esperma”,
que, quando convertido, se torna sangue, e então se consolida com
a carne como sendo
, concealing it thus from all but the wise, who set forth and greatly extol this
operation. But fools despise it and hold it of no account, ignorant of what it
is. The wise used many terms in the books, one being "sperm", which, when
converted, becomes blood, and then is consolidated with the flesh as though
part of it. Thus the process of generation proceeds by a succession of forms,
until man is made. Another simile is that of the palm, on account of the color
and natures of its fruits before they ripen. Others are such as the tree of bad
seed, or wheat, or milk, or many other names. Though all have but one root,
there is an operation that alters each one, giving many new colors and
natures, hence many names. Akaifrem said truly that it is only the multitude
of terms which causes the masters of this operation to err. But one who
knows that these terms are only like the many colors seen at conjunction will
not stray from the true path of this operation".

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