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Texto de Apoio 10

O Personagem Satanás em Jó

Convém que façamos aqui uma reflexão sobre esse personagem


presente nos dois primeiros capítulos de Jó.
Satanás (Satã em hebraico) tem uma origem nos tribunais que se
reuniam nas portas das aldeias. A palavra significa “promotor”, ou seja, aquele membro do
tribunal encarregado de acusar o réu. Posteriormente passou a significar adversário, acusador,
inimigo. É nesse sentido que ele aparece diante de Deus par acusar Jó e fazer-lhe mal. Sua
figura é semelhante à de um promotor público ou à de um procurador na corte de Deus.
Desde as origens de Israel até o exílio babilônico, a teologia israelita não era dualista,
isto é, que atribuía o bem a Deus e o mal ao demônio. Para Israel, tudo vinha de Deus, tanto o
bem quanto o mal. A doutrina da retribuição o confirma, como nós vimos. Podemos perceber
isso em muitos textos bíblicos, como em Is 45,7 e Am 3,6! Também em 1Sm 16, 14-23; 2Sm
24, 15-16; 1Rs 22,22, entre outros...
Aos poucos, porém, Israel vai incorporando em sua teologia crenças de outros povos.
É o caso do dualismo persa, para quem os males vinham dos demônios e as coisas boas
procediam das divindades.
O dualismo entrou em Israel e também em todo o Antigo Oriente de cultura semita a
partir da dominação persa, quando foi amplamente difundida a crença dos persas em
demônios. A cultura grega e todas as culturas indoeuropéias sempre foram dualistas. Na
Pérsia, havia uma demonologia bem desenvolvida. Segundo essa crença, todos os
maleféticios, desde males psíquicos e mentais até as doenças, as tentações e as desgraças,
eram atribuídas a demônios. Era uma infinidade de demônios ou espíritos maus. Acreditava-
se, inclusive, que havia um chefe desse exército demoníaco. Este chefe era uma figura
suprema do mal como a divindade suprema persa, Ahura Mazda, era a figura suprema do
bem.
Um exemplo que deixa bem claro que a crença em demônio em Israel foi introduzida
tardiamente é o relato a respeito do recenseamento feito por rei Davi. 2Sm 24,1, um texto
mais antigo, diz que foi YHWH quem mandou que o rei fizesse o censo. Quando a mesma
história foi escrita novamente na OHC, durante o século 4 a.C., o censo, considerado pelo
povo um mal que visava à tributação. Foi atribuído a uma ordem de Satanás (1Cr 21,1). Desse
modo, YHWH foi substituído por Satanás no texto. Em outras palavras, o mal começa a ser
atribuído a Satanás.
Adotar essas categorias dualistas ajudava Israel resolver contradições contidas em sua
maneira de conceber e formular a fé. Como compreender que Deus pudesse ser, ao mesmo
tempo, o princípio do bem e do mal? Ficava mais fácil imaginar que responsabilidade pelo
mal era de outro princípio, “adversário” de Deus, embora, no final das contas, submetido a
seu poder e a seus propósitos de salvação.

BIBLIOGRAFIA:

 Uma Introdução à Bíblia: Exílio Babilônico e Dominação Persa, Ildo Bohn Gass, Paulus,
págs 171-172

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