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E

malas.
ra véspera de Natal quando chegaram em Nova Iorque.
Mal Tuomas abriu a porta do apartamento e a menina
disparou para dentro, fazendo-o rir enquanto carregava as

Fuyu correu direto para cozinha, de onde vinha aquele cheiro


açucarado de fritura doce e se abraçou nas pernas de Erick com
saudade, e muita curiosidade, é claro.
— Devagar pequena... cuidado para não se queimar — disse Erick
sorrindo para a menina.
— Viu Tuo!! Eu falei que ele ia estar esperando a gente! Eu falei!
— É você disse, várias vezes! — Ele riu, se aproximando do
marido e dando um beijo leve nele. — Achei que estaria de plantão
nesse Natal.
— Me liberaram para passar o Natal com vocês, mas se houver
alguma emergência, eles ligam e eu saio correndo. Vocês sabem
como é... Como foi a viagem?
— Foi muito legal!! — exclamou a menina colocando os cabelos
branquinhos atrás da orelha — Demos um presente enorme pra
Natsu, e ela não tentou fazer o bolo, isso é muito bom.
— Preciso concordar com ela. — Riu o moreno lavando as mãos
— A Natsu cozinha realmente mal. Quer ajuda?
— Não precisa, estou só terminando essas rabanadas. O resto é só
esquentar depois.
— Raba... nadas? — A menina perguntou com curiosidade. —
Vou ter que abanar alguém com meu rabo?
O casal explodiu em uma risada gostosa com a inocência dela.
— Não... — Erick explicou ainda rindo. — Rabanadas são um
doce que costumamos fazer no Natal no ocidente, com pão, leite,
ovos, açúcar e canela.
— Na Inglaterra chamamos de Eggy Bread, e na França de Pain
Perdu — continuou Tuo, mostrando algumas das que estavam
prontas para ela.
— É meio feia né? — Arqueou uma sobrancelha olhando a
aparência do doce. — Mas cheira bem... posso comer?
— Ela veio farejando o cheiro desde o elevador!
— Ainda estão muito quentes, porque não ajuda o Tuo a colocar
os últimos enfeites na árvore?
— Ahhh!! Já posso abrir os presentes??? — Fuyu saiu correndo da
cozinha para abraçar as caixas decoradas já debaixo da árvore,
deixando o casal a sós por um breve momento.
— Ela está elétrica hoje... — comentou o loiro.
— Você não tem ideia, nem dormiu direito no avião. Ela está
muito ansiosa.
— Bem, quando ela dormir deve apagar direto.
— “Quando” é que é o problema. — Tuomas disse rindo,
recebendo um beijo de Erick que completou.
— É melhor ir atrás dela ou não vai sobrar um presente para abrir
depois...
F oi até fácil convencer Fuyu a abrir os presentes mais tarde,
mas não sem que ela barganhasse abrir pelo menos um.
Depois de terminarem de enfeitar a árvore e Tuomas a
levantar para colocar a estrela no topo, escolheu um pacote grande,
mas fino e correu para o sofá para abrir.
Este tinha vindo de longe, não tão de longe quanto os que trouxera
de sua familia no Japão, mas de Shay, uma “tia” a quem tinha se
apegado bastante.
A pequena oriental albina abriu o embrulho com o cuidado que
um monstro gigante tem ao atacar Tóquio em seriados, mas logo
viu o desenho colorido na capa do livro que havia ganhado, e um
cartão.
“Para uma pequena aventureira se inspirar em suas aventuras”
Ficou quieta por alguns instantes, olhando cada detalhe do livro
ilustrado. Alice no País das Maravilhas. Já tinha ouvido falar,
embora nunca tivesse reparado que a protagonista era uma
menininha que nem ela.
— Tuo... lê pra mim?? — Pediu com aquele olhar praticamente
impossível de recusar.
— Quer ler agora o presente? — Por mais cansado que o inglês
estivesse, quase nunca recusava um pedido dela.
— É!! A menina parece comigo!! Mas o cabelo é amarelo!
— Acho que você me lembra mais o coelhinho... — falou Erick
chegando com um prato de sobremesa com algumas rabanadas e
entregou para ela.
— Coelhinho? Que nem o da Páscoa? — Ela perguntou pegando
uma das rabanadas e cheirando bem antes de morder um pedaço,
achando bom e quase engolindo todo o resto de uma vez.
— Bem, não é o da Páscoa, mas tem um coelho. — O americano
sorriu e olhou Tuomas. — Eu leio pra ela, vai descansar um pouco
amor. Você está exausto.
E ele estava mesmo, afinal não tinha mais a mesma energia que
Fuyu para aguentar a longa viagem e chegar como se nada tivesse
ocorrido. Deu um beijo leve em Erick e um na testa de Fuyu,
depois seguiu para o quarto onde dormiria um pouco antes da
festa deles para o Natal.
Erick sentou-se ao lado dela no sofá e se ajeitou melhor, abrindo
o livro grande na primeira página, onde havia uma ilustração de
Alice, seguindo um coelhinho branco.
— Ahhh esse é o coelho! O que ele está dizendo??
— Calma, logo vamos chegar no que o coelho disse, vamos do
início tudo bem? — Ele sorriu vendo Fuyu se ajeitar melhor e
começou a contar a história:
“Alice estava começando a ficar muito cansada de estar sentada ao
lado de sua irmã e não ter nada para fazer: uma vez ou duas ela
dava uma olhadinha no livro que a irmã lia, mas não havia figuras
ou diálogos nele e ‘para que serve um livro’, pensou Alice, ‘sem
figuras nem diálogos?’.”1
E assim começou a aventura de Fuyu pelo País das Maravilhas,
acompanhando Alice atrás do Coelho Branco pelas imagens que
via e o que Erick contava: entre lagartas, gatos e chapeleiros, pelo
buraco do coelho até o Reino de Copas, ela parecia que nem
piscava, até se ver hipnotizada por uma ilustração no livro.
Um buraco. Não, uma toca. Será? Estava chamando por ela?
Chamando... chamando... chamando.
Colocou a mãozinha branca no buraco no livro e então tudo ficou
escuro.

1
Trecho inicial de Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll
S entiu o bumbum doer quando caiu sentada deixando escapar
um sonoro “ai”. Levantou-se espanando a terra do vestido
que usava, quando reparou no cheiro diferente.
Se abaixou e cheirou o chão e não acreditou. Arriscou lamber o
chão e viu que era verdade! Não era terra, era chocolate.
— Ei, você sempre lambe os outros assim? — Fuyu levou um
susto, levantando-se e procurando de onde vinha a voz. — Estou
aqui embaixo!
— AHHH O CHÃO FALA! — gritou surpresa.
— É claro que falo. Sou um chão de chocolate, mas não sou mudo.
E que espécie de açúcar é você?
— Eu não sou açúcar, sou Fuyu!
— Hm, açúcar Fuyu, não conheço... — disse o chão.
— Eu não sou açúcar, sou raposa. Menina-raposa.
— O que é uma raposa? Marca nova de açúcar?
— Eu já falei que não sou açúcar!!! — Fuyu já estava começando
a perder a paciência com aquele chão, mas tentou se acalmar e
respirou fundo antes de continuar. — Onde estou?
— Oras, você está aqui!
— Mas onde é aqui?
— Aqui é aqui, onde mais poderia ser?
— Quer saber, vou descobrir por mim mesma! — Aquilo já estava
começando a ficar confuso demais para a cabecinha dela, que se
pôs a andar para um dos lados.
— Mas se nem sabe onde é aqui, como sabe para onde está indo?
— perguntou o Chãocolate.
— Eu não sei, eu só vou. Está me seguindo?
— Bem, você está pisando em mim, é difícil não saber para onde
vai...
Porém, antes que tudo ficasse ainda mais confuso, uma Rabanada
do tamanho dela passou correndo e gritando.
— Torrãozinho de Açúcar não fique ai parada!!! Estamos sendo
atacados!!!
— Eu já disse que não sou açúcar!! E como assim atacados?? —
perguntou Fuyu sem entender mais nada. Especialmente como
uma rabanada tinha braços pernas e cabeça.
— É novata Joe, nem admite que é algum tipo de açúcar!!
— Não temos tempo para parar... vem torrãozinho — disse Joe,
a rabanada, enquanto a puxava pelo bracinho e continuou a correr.
— Você também Chãocolate! É melhor se esconder!!!
Fuyu não estava entendendo mais nada. Em um momento estava
conversando com o chão (que por sinal era feito de chocolate), e
agora estava correndo. Para onde, não sabia, guiada por uma
rabanada gigante (muito cheirosa por sinal, o que estava
certamente a deixando com fome).
— Ô moço rabanada... para onde estamos indo?
— Vamos entrar no País das Rabanadas! A Guarda Real deve nos
proteger do ataque...
— Mas que ataque é esse? Quem está atacando?
— Nossa, você não é daqui mesmo, não é? Sempre que chega a
época de Natal, somos brutalmente atacados pelo Hell Raisin 2e
seus lacaios.
— Hell... Raisin??
— Acredite você não quer ver a Passa! — Joe respondeu com
tanto medo que Fuyu sentia o braço dele tremer.
Fuyu achou melhor não perguntar mais, e logo avistou os enormes
portões da cidade, feitos de pretzels gigantes muito açucarados,
que a encantaram no primeiro momento, especialmente quando
pararam na frente dele.
2
“Raisin” é “passa” em inglês, o nome é uma piada com Hellraiser
— WOW!!! Nunca vi pretzels tão grandes!!
— Quem vem lá? De onde vem? — indagou um quebra nozes,
armado com uma bengala doce, do outro lado do portão.
— Rabanada Joe, General Nuts3! E esse torrãozinho que achei no
caminho...
— De onde vens Torrãozinho de Açúcar? — perguntou com a
boca cheia, quebrando a casca de uma noz que comeu em seguida.
— Qual sua marca? Nossos cozinheiros são muito seletivos com
marcas... — o General falou do outro lado da porta, e Fuyu pôde
perceber um certo tique na sua boca abrindo e fechando, mesmo
sem estar quebrando nozes.
— Eu já disse que não sou um torrão de açúcar!! Eu sou Fuyu!
Sou raposa, não sou doce...
— NÃO É DOCE? ISOLEM A ÁREA TEMOS UM
ADOÇANTE AQUI!!! SEM PÂNICO, SEM PÂNICO
GENTE, APENAS ISOLEM!
Enquanto vários outros soldadinhos cercavam Fuyu, o General
parecia estar literalmente degringolando e entrando em pânico
sozinho.
A menina se viu presa ao lado de Joe com diversas bengalas doces
apontadas para si. Enquanto a levavam para outro lugar, ela só
conseguia pensar na melhor forma de conseguir engolir todos
aqueles doces e fugir dali, mas fugiria para onde?
— Para onde estão nos levando? — perguntou para Joe que estava
encolhido do lado dela pensando na furada em que tinha se
metido.
— Apenas doces são permitidos aqui, como o General agora
cismou que você é adoçante, e devem achar que fui infectado com
aspartame, xilitol, ou... ou... arghh STEVIA.

3
“Nuts” significa “noz”, mas também é usado como expressão para chamar alguém de louco. Exemplo:
“Are you nuts?” / “Você enlouqueceu?”
— Eu achei o general meio louco... e eu não sou adoçante
nenhum... sou menina, não comida!
— Bem, nesse caso menos mal, acho que vão fazer testes e nos
liberar então...
Foram levados até o Castelo de Gengibre, e de lá aos calabouços,
onde ficava a área de desinfecção. Ao lado da ‘cela deles’ havia um
panetone chorando, e outro do outro lado da grade falava com ele,
e era arrastado para longe pelos guardas.
— Não se preocupe irmão!!! Eles irão te desinfectar e vamos poder
voltar a brincar!!
— Irmão!!! Não me deixa aqui sozinho!!!! Buáaaa...
Quando afastaram os dois, ficou apenas o som do choro, e antes
que Fuyu resolvesse perguntar.
— Aqueles são os Príncipes Gêmeos: Panetone e Chocotone. Não
são idênticos, mas só dá para ver a diferença por dentro. —
Começou a explicar, falando baixo para que Panetone não os
ouvisse. — Ontem Hell Raisin atacou os dois enquanto
brincavam do lado de fora dos portões e infectou o príncipe
Panetone com o mal...
— O mal? — A menina chegou a tombar a cabeça um pouco para
o lado olhando o Panetone ao lado chorando, mas que parecia
perfeitamente normal.
— É... o coitadinho voltou cheio de... cheio de...
— Cheio de que?
— DE PASSAS! Meu Deus, que horrível, estamos todos
morrendo de pena do coitadinho!
Enquanto Joe ainda parecia estar tendo uma crise nervosa, Fuyu se
abaixou perto das grades cheirando.
Canela. Com toda certeza tinha canela. Uma casquinha de
chocolate e o que era o outro cheiro? Sem que ninguém percebesse
quebrou uma pontinha da grade e comeu.
NHAM!
— É PÃO DE MEL! O pão de mel mais delicioso que eu já comi!!
— O que?? O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO? — Joe ficou
desesperado enquanto via a menina comer as grades todas que os
prendiam e ainda lamber os dedos.
— Soltei a gente ué... tenho que voltar pra casa antes da ceia de
Natal!
— Eu sou jovem demais para ser executado por fugir!!!
— Tá... então fica aí se não quer vir comigo.
Fuyu se levantou e foi andando na direção em que os guardas
levaram o Príncipe Chocotone.
No fundo ela sabia que não demoraria muito para que guardas
fossem atrás dela, mas também sabia que não iria adiantar nada
ficar esperando para provar que não era um adoçante.
Ouviu os sons dos soldadinhos correndo por um corredor e se
escondeu, esperando que não fosse vista, porém, estavam correndo
na direção oposta. Será que o tal Hell Raisin já estava atacando?
Andou mais um pouco até ouvir um choro e foi na direção para
olhar, ainda escondida é claro, e se deparou com o Príncipe
Chocotone chorando, sendo amparado pela maior rabanada que
já havia visto na vida, usando uma coroa, e um donut de chocolate
com muito granulado com outra.
— Acalme-se filho... — dizia a Rainha Rabanada. — Nossos
médicos vão cuidar do seu irmão e remover todas aquelas passas
horríveis.
— Maldito Hell Raisin!! — exclamou o Rei Donut. — Esse
desgraçado quer colocar passas em tudo o que a gente ama?
— A cada Natal ele está pior... começou com as passas no arroz,
mas agora tem passas em todo lugar... — suspirou a Rainha.
Fuyu achou melhor tentar encontrar uma forma se sair, mas
quando pensou em se mover alguém a agarrou.
— A-HÁ! ADOÇANTE!!! ESPIONANDO A FAMI... — A
boca do General começou a se mover sem controle por alguns
segundos antes dele continuar a falar — ...LIA REAL?
O som alto atraiu a atenção dos três e o Rei Donut corajosamente
se pôs a frente para defender.
— Quem vem lá?
— General N-N-Nu-t-t-t-t-t-s majestade. — Terminou de falar
segurando Fuyu com uma mão e a boca com a outra — Encontrei
esta espiã adoçante! Deve ser uma lacaia daquela Passa Infernal!
— Eu já falei que não sou adoçante! E nem açúcar, e nem doce
nenhum! Eu sou uma menina! Me chamo Fuyu.
— Uma menina? — O choque da familia real foi notável. O Rei
se aproximou curioso e a rodeou. — Como um humano veio parar
aqui?
— Eu acho que cai em um buraco... e todo mundo fica me
chamando de açúcar, e esse maluco fica me chamando de adoçante!
Só porque eu sou toda branquinha não significa que sou isso! Sou
albina, e só.
— Ma... Maluco???? — O General estava se desmontando de
irritação, quando a Rainha fez sinal para dispensá-lo, entretanto,
teve que ser levado em várias peças por outros guardas.
— Tem séculos desde que uma criança visitou nosso reino... será
um sinal? Talvez ela possa nos ajudar a por um fim no terror que
o Hell Raisin e suas passas está causando!
— Eu só vejo todo mundo falar, mas não entendo como esse tal
Hell Raisin apavora tanto vocês... ele não é um só? — Fuyu
perguntou inocente, afinal quantos doces naquele país tinham
medo desse vilão?
— Nosso reino vive em função do Natal e de agradar as famílias
do seu mundo. — disse o Rei. — Desde a menor das rabanadas
até o último cookie com copo de leite, nossa missão é garantir que
o Natal de todos os humanos seja doce e feliz. — comentou o
Rei.
— Hell Raisin um dia foi uma uva doce e gentil... — A Rainha
explicou. — Mas como no Natal doces atraem mais os humanos,
ele foi ficando de lado até murchar e se tornar uma uva passa cheia
de rancor.
— Eu soube que quando encontraram o cacho dele passado na
geladeira o jogaram fora. E quando voltou, jurou se vingar de
todos aqueles doces que os humanos tanto gostam. Ele nos ataca
colocando passas em nossas receitas, espalhando o terror entre
todos nós. Tudo isso porque muitos humanos odeiam passas! Me
diga menina... você gosta de passas?
Fuyu fez uma careta só de pensar em comer passas. O que já foi
resposta mais do que suficiente para provar o ponto.
— A questão, Fuyu, é que não conseguimos lutar contra as passas
do Hell Raisin e a cada dia que passa, ele está mais perto de atacar
nossas receitas. — comentou a Rainha com pesar. — Basta ver o
que fez com meu filho Panetone...
— Acho que eu posso ajudar! Eu não sou um doce, e nem comida,
ele não pode me infectar! — disse Fuyu os olhando.
O País das Rabanadas nunca esteve tão confiante.
Após um pronunciamento da Familia Real, Fuyu já
era vista por todas as guloseimas como uma heroína.
Recebeu uma bengala doce, um chapéu de quebra
nozes (que ela tinha quase certeza que era do General louco, que
agora jazia na enfermaria tentando ser remontado), e munida com
toda sua coragem, aguardava seu oponente do lado de fora dos
portões.
Ela não tinha achado exatamente uma boa ideia o Rei enviar uma
carta com pedido de duelo diretamente para o temido vilão, mas
ele estava uma rosquinha tão feliz que ela não foi capaz de impedir
o feito.
Os portões de Pretzel atrás da menina estavam abarrotados dos
expectadores mais corajosos que não queriam perder nem um
segundo do embate épico prestes a ocorrer.
O Chãocolate aos seus pés tremeu.
Podia sentir em seus pezinhos a proximidade de Hell Raisin,
acompanhado de seu exército.
Não demorou muito, o chão a sua frente estava tomado por
passas. Passas até onde a vista podia alcançar. Provavelmente mais
passas do que já havia visto em toda sua não tão curta vida. E
passas montadas em.... grãos de arroz?
“Ah não!” pensou ao ver os grãozinhos de arroz tristes servindo
de montaria. Mas ainda não tinha visto o Arqui-Inimigo das
Rabanadas.
Na multidão de pontinhos pretos, uma montanha de passas
começou a se formar à sua frente, tomando toda a sua altura e
crescendo mais um pouco.
Chegou a engolir em seco e segurou mais firme a bengala doce em
suas mãos pequeninas, com medo do demônio de passas se
formando a sua frente.
— Vocês ousam desafiar o grande Hell Raisin???? — A voz fez as
guloseimas expectadoras tremerem, mas Fuyu arqueou uma
sobrancelha.
— Que voz fininha... quem disse isso? — Olhou em volta,
procurando de onde vinha. Uma passa começou a pular em cima
da torre de passas que se formou, chamando a atenção dela.
— OLHE PARA MIM QUANDO EU FALAR COM VOCÊ!!
— A tal da passa infernal estava fora de controle.
— Pera, é só isso? O tal Hell Raisin é só uma passinha? —
Quando terminou de falar várias passas se jogaram contra ela.
As guloseimas se encolhiam de medo para que as passas não as
acertassem, porém Fuyu as espanou para longe de seu vestido, o
que causou um burburinho entre o povo.
— Você acha que pode nos espanar? Passas,
ATACAAAAARRR!!!
Era a hora da verdade. Aquele povo merecia se ver livre daquela
ameaça, embora naquele momento ela achasse que era a ameaça
mais ridícula do mundo.
Aquele povo merecia um sacrifício.
Enquanto via uma enxurrada de passas tentar subir por suas
pernas, Fuyu levou a mão até o topo da torre de passas.
Hell Raisin pôde ver quase em câmera lenta a pequena mãozinha
se aproximar por cima dele e se fechar, agarrando um punhado de
passas, que botou na boca e mastigou com uma careta.
Fez-se o silêncio. Era possível ouvir os munch munch munch das
passas sendo engolidas. Por alguns instantes o tempo parou.
Em uma explosão sonora, o povo do País das Rabanadas
comemorava a derrota de seu maior inimigo, enquanto passas
corriam desesperadas para bater em retirada e fugirem da heroína,
que pegava mais e mais punhados e colocava na boca até não
aguentar mais o gosto das passas que tanto detestava.
D eu uma tossida forte querendo tirar o gosto de dentro da
própria boca, e acordou caindo do sofá.
Demorou alguns segundos até perceber que estava na sala
de casa, agarrada no tapete felpudo da sala.
“Que sonho mais estranho...” pensou. Ainda sentia o gosto das
passas na boca e fez uma careta feia.
— Está tudo bem Fuyu? — Erick a olhava da bancada da cozinha
americana do apartamento, estranhando ela ter caído dormindo.
— Você dormiu enquanto eu lia, e te deixei descansar.
— Estou sim, só tô com um gosto ruim na boca — disse ainda
fazendo caretas. — Espero nunca mais ter que salvar o País das
Rabanadas...
— País das Rabanadas? — Tuomas riu de leve entrando na sala.
— Por que você não vai se aprontar para a ceia e depois nos conta
essa sua aventura?
— Tá! — A menina falou pegando uma rabanada no prato para
comer e tirar o gosto ruim da boca, mas olhar a travessa cheia delas
lhe deu uma ideia.
Fuyu correu até o quarto e pegou vários brinquedos e correu com
eles para a mesinha da sala onde estavam as sobremesas.
Espalhou diversos pequenos bonecos cabeçudos de diversos heróis
nos espaços entre eles.
— O que você está fazendo Fuyu? — Erick estava curioso com a
nova decoração.
— Iniciativa Rabanada!
— Iniciativa Rabanada? — os dois adultos se entreolharam sem
entender nada.
— É, a partir de agora nenhuma passa, vilão ou ladrãozinho de
comida vai atacar esses doces! Estão bem protegidos! — Olhou os
brinquedos e bateu continência para eles. — Conto com vocês
para proteger o País das Rabanadas!
Ela então correu para poder se arrumar para a ceia, e os dois
acabaram rindo.
— Acho que ela tem uma implicância com passas... — constatou
Erick.
— E quem não tem? — Tuomas riu, olhando o marido que estava
com uma caixinha de passas. Erick colocou algumas na boca e
sorriu, culpado. — Por favor me diz que não tem passas no arroz...
E ste conto é um meu presente de Natal para todos vocês, meus
antigos e novos leitores.
Para quem já conheceu Fuyu seja no conto “Raposinha da Páscoa
o que trazes para mim” (em breve na Amazon) ou pela pequena
participação dela em meu livro Inimigos Mortais, sabe que é uma menina
kitsune (como um lobisomem, mas se transforma em raposa), albina,
adotada para sua proteção pelo casal Tuomas e Erick, e atualmente mora
com eles em Nova Iorque.
Gosto muito do desafio que é para mim, escritora de fantasia urbana, dark
fantasy e terror, poder brincar com a forma lúdica de escrever sob o olhar
de uma criança inocente.
Espero que tenham gostado desse conto e rido como eu ria escrevendo.
A ideia se formou porque já tem alguns anos, eu e vários amigos temos
invadido o instagram e o facebook com a #IniciativaRabanada, onde a
cada ano, a proteção das rabanadas é feita por meio de figures,
bonequinhos, e na maioria das vezes Funko Pops.
Deixo aqui o convite não apenas para conhecer nossa Iniciativa, como para
fazer parte dela, basta usar a hashtag em suas postagens!
Desejo a todos vocês um Feliz Natal e um Ano Novo maravilhoso! Nos
veremos novamente em breve!

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