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Capı́tulo 6

Leis de Kirchhoff

6.1 Definições 1. dois nós: B e F

Em alguns casos, um circuito não pode ser resolvido 2. três ramos: BAEF, BDF e BCGF
através de associações em série e paralelo. Nessas
3. três malhas: ABDFEA, BCGFDB e ABCGFEA
situações geralmente são necessárias outras leis, além
da lei de Ohm, para sua resolução. Estas leis adicio-
nais são as leis de Kirchhoff, as quais propiciam uma 6.2 Primeira Lei de Kirchhoff
maneira geral e sistemática de análise de circuitos. Elas
são duas, a saber: Uma boa introdução à Primeira Lei de Kirchhoff já foi
vista no circuito paralelo. Num dado nó entrava a cor-
• Primeira lei de Kirchhoff ou lei das Correntes rente total do circuito e do mesmo nó partiam as corren-
tes parciais para cada resistor. Como no nó não há possi-
• Segunda lei de Kirchhoff ou lei das Tensões
bilidade de armazenamento de cargas ou vazamento das
Para o uso destas leis são necessárias algumas mesmas, tem-se que a quantidade de cargas que chegam
definições: ao nó é exatamente igual à quantidade de cargas que
saem do nó.
• Nó: é um ponto do circuito onde se conectam no Desta constatação surge o enunciado da primeira lei
mı́nimo três elementos. É um ponto onde várias de Kirchhoff:
correntes se juntam ou se dividem.
“A SOMA ALG ÉBRICA DAS CORRENTES EM UM N Ó
• Ramo ou braço: é um trecho de um circuito com- É SEMPRE IGUAL A ZERO .”
preendido entre dois nós consecutivos. Todos os
elementos pertencentes ao ramo são percorridos
pela mesma corrente elétrica. n

• Malha: é um trecho de circuito que forma uma ∑ Ii = 0 (6.1)


i=0
trajetória eletricamente fechada.
Por convenção, consideram-se as correntes que en-
tram em um nó como positivas e as que saem como ne-
gativas.
Considere o circuito da figura 6.2.
Ao se aplicar a lei de Kirchhoff das correntes aos nós
B e F, obtém-se:

Nó B: I1 + I2 − I3 = 0
Nó F: −I1 − I2 + I3 = 0

Observa-se que as equações dos nós B e F são na re-


alidade as mesmas, ou seja, a aplicação da lei das cor-
rentes de Kirchhoff ao nó F não aumenta a informação
sobre o circuito. Assim, o número de equações inde-
pendentes que se pode obter com a aplicação da lei das
correntes de Kirchhoff em um circuito elétrico é igual
Figura 6.1: Circuito elétrico com dois nós ao número de nós menos um.
Se equação do nó B, isolarmos de um lado da igual-
Na figura 6.1, por exemplo, identifica-se: dade as correntes que chegam no nó (nesse caso I1 e I2 ) e

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um potencial mais elevado. Nas quedas de tensão as car-


gas se dirigem para um potencial mais baixo havendo o
consumo da energia das cargas convertendo-a para uma
forma de energia não-elétrica, por exemplo, calor, luz
etc. Assim, ao percorrer uma malha fechada, percebe-
se que toda a energia entregue às cargas num trecho do
circuito elétrico é dissipada num outro trecho.
A tensão, por definição, está associada à energia ce-
dida às cargas ou retirada das mesmas durante o seu mo-
vimento. Daı́ é obtido o enunciado da Segunda Lei de
Kirchhoff:

“A SOMA ALG ÉBRICA DAS TENS ÕES (f.e.m.s e


quedas de tensão) AO LONGO DE UMA MALHA
EL ÉTRICA É IGUAL A ZERO .”
Figura 6.2:

n
do outro lado as correntes que saem do mesmo nó (nesse
caso apenas a I3 ), temos:
∑ Vi = 0 (6.2)
i=0
I1 + I2 = I3
Observando o resultado da equação podemos concluir Para a aplicação da lei de Kirchhoff das tensões, faz-
que a soma das correntes que entram no nó é igual a se necessário adotar alguns procedimentos que são des-
soma das correntes que saem dele. Essa é uma outra critos a seguir:
forma de se interpretar a primeira lei de Kirchhoff.
1. Atribuir sentidos arbitrários para as correntes em
todos os ramos;
6.3 Segunda Lei de Kirchhoff 2. Polarizar as fontes de f.e.m. com positivo sempre
na placa maior da fonte, conforme a figura 6.4;
A lei de Kirchhoff das tensões é aplicada nas malhas.
Ela já foi usada no estudo dos circuitos de resistores em
série, onde a soma das quedas de tensão nos resistores é
igual à f.e.m. da fonte.
Se no circuito existe mais de uma fonte de f.e.m.
deve-se determinar a resultante das mesmas, ou seja, Figura 6.4:
somá-las considerando os seus sentidos relativos.

3. Polarizar as quedas de tensão nos resistores usando


a convenção de elemento passivo e sentido conven-
cional de corrente elétrica. Isto equivale a colocar a
polaridade positiva da queda de tensão no resistor
no terminal por onde a corrente entra no mesmo,
conforme a figura 6.5;

Figura 6.3:

Et = VAB +VBC +VCD


Figura 6.5:
Como a tensão em um resistor pode ser calculada
pela lei de Ohm, temos:
4. Montar a equação percorrendo a malha e somando
E1 − E2 = R1 · I + R2 · I + R3 · I algebricamente as tensões. O sinal da tensão cor-
responde ao sinal da polaridade pela qual se in-
+E2 − E1 + R1 · I + R2 · I + R3 · I = 0 gressa no componente, independentemente do sen-
tido da corrente elétrica.
Entenda-se que, na fonte de f.e.m., uma forma de De acordo com o circuito apresentado na figura 6.6,
energia não-elétrica é convertida para elétrica cedendo ao se aplicar a lei das tensões de Kirchhoff às malhas
energia para as cargas, ou seja, colocando as cargas em ABDFEA e BCGFDB, no sentido horário, obtém-se:

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3. Polarizar as fontes de tensão;


Malha ABDFEA: R1 · I1 + E2 − R2 · I2 + R4 · I1 + E1 = 0
Malha BCGFDB: −E1 + R3 · I3 + E4 + R2 · I2 − E2 = 0 4. Polarizar as quedas de tensão nos resistores de
acordo com o sentido adotado para a corrente;

5. Havendo nós, aplicar a 1a Lei de Kirchhoff,


obtendo-se Ne1 equações (Ne1 = n − 1);

6. Se o número de equações ainda não for suficiente


para resolver o circuito, aplicar a 2a Lei de Kir-
chhoff, onde o número de equações é dado por
Ne2 = (r − n + 1);

7. Escolher um ponto de partida e adotar um sentido


de percurso para analisar a(s) malha(s).

Exemplo 6.1 : Calcule o sentido e o módulo da corrente


elétrica no circuito da figura 6.7.

Figura 6.6:

No circuito da figura 6.6, existe ainda mais uma ma-


lha (a malha externa ABCGFEA). Nesta malha poderia
ser aplicada também a lei das tensões de Kirchhoff. En-
tretanto, como no caso da lei das correntes, a equação re-
sultante seria dependente das duas já obtidas. Portanto,
esta equação seria inútil. Figura 6.7:
Supondo-se que, no circuito da figura 6.6, fossem
conhecidos os valores de todas as f.e.m.s das fon- Resolução:
tes de tensão e todas as resistências, restariam como
incógnitas as três correntes. Para resolver um sis- 1. Escolhe-se um sentido para a corrente elétrica no
tema de equações lineares com três incógnitas são ne- circuito. Por exemplo, o sentido indicado na figura
cessárias três equações. Uma equação já foi obtida com 10.5.
a aplicação da lei da correntes de Kirchhoff. Portanto,
são necessárias mais duas, que podem ser obtidas pela 2. Polarizam-se as quedas de tensão nos resistores
aplicação da lei das tensões de Kirchhoff. (polaridade positiva no terminal por onde a cor-
Em sı́ntese, pode-se concluir que, em um circuito rente entra) e as f.e.m.s das fontes (o terminal
elétrico com r ramos e n nós, tem-se r correntes, uma maior é o positivo).
em cada ramo. A lei das correntes de Kirchhoff fornece 3. Percorre-se a malha, somando algebricamente as
Ne1 = n − 1 equações e, portanto, a lei das tensões de tensões (o sinal da tensão corresponde ao sinal
Kirchhoff deve fornecer Ne2 = r − n + 1 equações para da polaridade da tensão encontrada na entrada do
que o problema possa ser resolvido. componente).
Por exemplo, no circuito da figura 6.6, tem-se r = 3,
n = 2. Se r = 3, o número de correntes é 3. O número Estas etapas estão mostradas na figura 6.8 e na
de equações fornecidas pela lei das correntes é Ne1 = equação abaixo.
2 − 1 = 1 e o número de equações fornecidas pela lei
das tensões é Ne2 = 3 − 1 = 2, conforme discutido ante-
riormente.
A seguir, apresenta-se um resumo para aplicação da
LKC e LKT.

Resumo para aplicação das Leis de Kir-


chhoff
Figura 6.8:
1. Identificar os nós, ramos e malhas do circuito
elétrico;
1I + 4, 7I + 3, 3I + 15 − 6 = 0
2. Atribuir para cada ramo do circuito um sentido 9I = −9
para a corrente elétrica; I = −1A

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O sinal negativo que aparece para o valor da corrente I das correntes. Então, simplificando-se as equações
significa que o sentido escolhido para ela está invertido. e colocando-as na forma de um sistema, obtém-se:
Neste exemplo, o sentido correto da corrente elétrica I é

 I1 +I2 −I3 = 0
para baixo na figura 6.8 e não para cima como foi arbi- 4I1 = 24
trado no inı́cio da resolução. 
−4I1 +6I2 =0

Exemplo 6.2 : No circuito da figura 6.9, calcule os valo- 6. Existem vários métodos para se resolver um sis-
res das correntes I1 , I2 e I3 a partir dos valores das f.e.m.s tema de equações. Nesse caso foi usado o método
e das resistências elétricas usando as leis de Kirchhoff. da substituição:
Da segunda equação obtém-se:
24
I1 = = 6A
4
Substituindo-se o valor de I1 na terceira equação
obtém-se:
−4 · 6 + 6I2 = 0; Logo:
24
I2 = = 4A
6
Então, substituindo-se os valores de I1 e I2 na pri-
Figura 6.9: meira equação obtém-se:
6 + 4 − I3 = 0; Logo:
Resolução: I3 = 10A
1. O circuito possui 2 nós, 3 ramos e 3 malhas.

2. Os sentidos de corrente e polaridades foram arbi-


6.4 Técnica da Análise de Malhas
trados conforme 6.10. Partindo das Leis de Kirchhoff, várias técnicas foram
desenvolvidas com o objetivo de facilitar a resolução
de circuitos elétricos. Uma das mais conhecidas é a
Técnica de Análise de Malhas que será estudada nesta
seção.
Consideremos então o circuito da figura 6.11, em que
foi atribuı́da uma corrente em cada ramo.

Figura 6.10:

3. Aplicando-se a lei de Kirchhoff das correntes tem-


se apenas uma equação obtida em relação aos nós,
pois nos dois nós a equação será a mesma: Figura 6.11: Circuito para análise de malhas
I1 + I2 − I3 = 0
Pela aplicação da Lei de Kirchhoff das correntes
4. Aplicando-se a lei de Kirchhoff das tensões, tem-se temos:
duas equações obtidas pelas malhas:
Malha ACDA: Começando pelo nó A, percorrendo I1 − I2 − I3 = 0
a malha no sentido horário e chegando novamente
ao no A tem-se: Isolando-se I3:
+4I1 + 12 − 36 = 0
I3 = I1 − I2
Malha ABCA: Começando pelo nó A, percorrendo
a malha no sentido horário e chegando novamente Logo, podemos indicar as correntes no circuito
ao no A tem-se: desprezando a existência de I3 , pois esta pode ser
+3, 3I2 + 2, 7I2 − 4I1 = 0 escrita como I1 − I2 . Então as correntes no circuito
ficam como na figura 6.12.
5. Fica-se então com três equações e três incógnitas, Consideremos agora, o mesmo circuito com uma li-
o que nos permite encontrar o valor de cada uma geira modificação, utilizaremos correntes de malha.

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O método da soma é um dos mais simples para se


resolver sistemas com duas equações, porém só é
possı́vel sua utilização quando as equações são dispos-
tas de forma que, ao subtrair ou somar os polinômios
das equações, todas as incógnitas, exceto uma, se
anulam.
Muitas vezes é necessário multiplicar uma das
equações por algum valor de modo que essa situação
Figura 6.12: Circuito sem a corrente I3
ocorra. Esse é o caso do sistema de equações deste
exemplo. Então devemos multiplicar a segunda equação
Definimos correntes de malha como a corrente que por 3, ficando com:
flui apenas no perı́metro de uma malha. A corrente de 
9IA −3IB = 42
malha é indicada por uma seta curva que quase fecha em
−9IA +21IB = 30
si mesma sem cortar nenhum ramo.
Por conveniência, as correntes de malha são colo-
cadas sempre no sentido horário e, a lei de Kirchhoff Então, somando-se as duas equações do sistema,
das tensões, também é aplicada nesse mesmo sentido. tem-se:
Utilizando-se essa técnica, não é necessário a aplicação
da lei de Kirchhoff das correntes, o que simplifica a 18IB = 74
resolução do circuito.
Portanto, as correntes de malha são indicadas no cir- Logo: IB = 4A
cuito analisado conforme a figura 6.13.
Substituindo-se o valor de IB na primeira equação
temos:

9IA − 3(4) = 42

Então: IA = 6A

A corrente de malha IA corresponde à corrente I1


do circuito da figura 6.11. Enquanto a corrente IB
Figura 6.13: Circuito com correntes de malha corresponde à corrente I2 . Porém para obtermos a
corrente I3 (que passa no ramos central) é necessário
Conforme foi comentado anteriormente, para resolver subtrair as duas correntes, ou seja:
o circuito e encontrar o valor das correntes, basta aplicar
a lei de Kircchoff das tensões às malhas da figura 6.13. I3 = IA − IB = 6 − 4 = 2A
Como no ramos central passam duas correntes de
malha, o valor real da corrente que circula nesse ramo Como o valor de IA é maior do que IB , então o
é a diferença entre as correntes de malha. Então as sentido correto da corrente I3 é o próprio sentido de IA .
equações das malhas fica assim:

Malha A: −42 + 6IA + 3(IA − IB ) = 0 6.5 Execı́cios


Simplificando-se a equação resulta em: 1. Determine os valores das correntes desconhecidas
no circuito da figura 6.14.
9IA − 3IB = 42
2. Determine os valores das tensões desconhecidas no
Malha B: −10 + 3(IB − IA ) + 4IB = 0 circuito da figura 6.15

Após simplificação fica-se com: 3. Calcule o valor da corrente I no circuito da fi-


gura 6.16
−3IA + 7IB = 10
4. Calcule o valor da resistência do resistor R3 no cir-
cuito da figura 6.17.
Então, para encontrar o valor das correntes, deve-
se resolver o seguinte sistema de equações: 5. Sabendo que a corrente através do resistor R3 no
 circuito da figura 6.18 vale 4A, calcule os valores e
9IA −3IB = 42
os sentidos corretos das outras correntes e o valor
−3IA +7IB = 10
do resistor R3 .

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Figura 6.14: Figura 6.18:

6. Calcule os valores das correntes I2 e I3 e do resis-


tor R2 , no circuito da figura 6.19, sabendo que a
intensidade da corrente I1 vale 0, 2A.

Figura 6.19:
Figura 6.15:
7. Calcule o valor e o sentido correto das correntes
nos ramos no circuito da figura 6.20.

Figura 6.16:

Figura 6.20:

8. Calcule os valores das correntes I1 e I2 no circuito


da figura 6.21.
9. No circuito da figura 6.22, calcule o valor da cor-
rente I.
10. No circuito da figura 6.23, calcule os valores da
tensão VS e da resistência R.
11. Determine a potência dissipada em R1 e R2 do cir-
Figura 6.17:
cuito da figura 6.24.

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12. Qual deve ser o valor do resistor R para que a cor-


rente no ramo AB da figura 6.25 seja nula?

Figura 6.21:

Figura 6.25:

Respostas dos exercı́cios numéricos


1. I1 = 1A; I2 = 18A; I3 = 9A
2. V1 = 11V ; V2 = 2V ; V3 = −1V
Figura 6.22:
3. I = 0, 3A

4. R3 = 1Ω
5. I1 = 4A; I2 = 0; R3 = 1, 5Ω
6. I2 = 0, 8A; I3 = 0, 6A; R2 = 2, 5Ω
7. I1 = 6A; I2 = 4A; I3 = 10A

8. I1 = 9A; I2 = 1, 5A
9. I = 3A para cima
10. Vs = 14V ; R = 4Ω

11. P1 = 20mW ; P2 = 22, 5mW


Figura 6.23:
12. R = 26kΩ

Figura 6.24:

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