Você está na página 1de 16

QUESTÕES DIREITO PENAL PARTE GERAL

CURSO COMPLETO

1. Em que consiste a teoria da ação significativa (limite de 30 linhas)?

ESPELHO:

Seguindo os pensamentos de Wittgenstein (filosofia da linguagem) e Habermas (teoria


da ação comunicativa), Vives Antón formulou o conceito significativo de ação
(“identificando-a com o 'sentido de um substrato normativo'”, que apresenta uma
nova interpretação conceitual e aponta na direção de um novo paradigma para o
conceito de conduta penalmente relevante. Conforme leciona Cezar Roberto
Bitencourt, “essa concepção tem a pretensão de traçar uma nova perspectiva dos
conceitos e significados básicos do Direito Penal. Essa proposta de sistema penal
repousa nos princípios do liberalismo político e tem como pilares dois conceitos
essenciais: ação e norma3 , unidos em sua construção pela ideia fundamental de
'liberdade de ação' [“a liberdade de ação à qual refere Vives é simplesmente aquela
que permite identificar a ação como obra pessoal e não do acaso”. O conceito
significativo de ação, na ótica de seus ardorosos defensores como Vives Antón,
Zugaldía Espinar e Paulo César Busato, identifica-se melhor com um moderno Direito
Penal, respondendo aos anseios de uma nova dogmática e respeitando os direitos e
garantias fundamentais do ser humano. […] Na verdade, parece-nos que está surgindo
uma nova e promissora teoria da ação que, certamente, revolucionará toda a teoria
geral do delito, a exemplo do que ocorreu, a seu tempo, com o finalismo de Welzel”.
Vives Antón questiona o entendimento da ação no direito penal como consequência
da concepção cartesiana. Segundo esse pensar, a ação era entendida como um fato
composto de um aspecto físico (movimento corporal) e de uma aspecto mental (a
vontade). Em razão da contribuição da mente era possível distinguir ontologicamente
os fatos humanos dos fatos naturais e dos fatos dos animais. “No entanto, a evolução
da filosofia da ação admite o abandono de concepções ontológicas e uma mudança na
concepção da ação. Renuncia-se a um conceito ontológico, como algo que ocorre, que
as pessoas fazem e que constitui o substrato do valorado pelas normas. Por
conseguinte, para que se possa avaliar se existe ação não é necessário o socorro de
parâmetros psicofísicos, mediante o recurso da experiência.” A ação deve ser
entendida de forma diferente, não como “o que as pessoas fazem”, mas como o
significado do que fazem, isto é, como um sentido. Todas as ações não são meros
acontecimentos, mas têm um sentido (significado), e, por isso, não basta descrevê-las,
é necessário entendê-las, ou seja, interpretá-las. Diante dos fatos, que podem explicar-
se segundo as leis físicas, químicas, biológicas ou matemáticas, as ações humanas hão
de ser interpretadas segundo as regras ou normas. No ponto, ilustrativa é a explicação
de BUSATO: “As ações não sendo meros acontecimentos, exigem interpretação. Vale
dizer, não basta mais que as ações sejam meramente descritas, senão que é necessário
que elas sejam interpretadas e compreendidas. Enquanto os meros fatos da vida
podem ser explicados por regras imutáveis como as leis da física, da química ou da
biologia – conquanto ainda nessas ciências o componente da indeterminação já foi
identificado –, as ações humanas têm a característica diferenciadora de que somente
podem ser identificadas, classificadas e interpretadas conforme regras ou normas. Por
exemplo, não se pode afirmar que um tapa no rosto seja uma lesão corporal, uma
injúria, um comportamento rude ou até mesmo um ato reflexo sem uma análise das
circunstâncias em que ocorre, para verificação de como deve ser interpretado e
compreendido referido tapa, até mesmo para a definição de se pode mesmo ser
considerado um tapa. […] Assim, as ações são configuradas de acordo com seu
significado social, pelo contexto em que se produzem.” De acordo com estes
pressupostos, não existe um conceito universal e ontológico de ação. Não há um
modelo matemático, nem uma fórmula lógica que nos permita oferecer um conceito
de ação humana válido para todas as diferentes espécies de ações que o ser humano
pode realizar. E mais que isso, conforme BITENCOURT, “as ações não existem antes das
normas (regras) que as definem. Fala-se da ação de furtar porque existe antes uma
norma que define essa ação. Sintetizando, a ação, cada ação, possui um significado
determinado, certas práticas sociais (regras ou normas) que identificam um
comportamento humano perante outros.” Dessa forma, o primeiro aspecto a
considerar é a identificação com algum tipo de ação (representativo de uma pretensão
de relevância), que determina por sua vez a aparência de ação. “Esse é o ponto de
partida para definir se podemos dizer que existe uma ação; e, em segundo lugar,
decidir se estamos diante de uma ação daquelas definidas na norma correspondente
(subtrair, lesionar, ofender etc.), o que somente poderá ser levado a cabo em função
do contexto em que elas se desenvolvem, isto é, com base em uma valoração da ação
global, integrada pelos aspectos causais, finais, e pelo contexto intersubjetivo em que
aquela se desenvolve, outorgando-lhe um específico sentido social e jurídico. Ao tipo
de ação pertencem todos os pressupostos da ação que cumpram uma função
definidora da espécie de ação de que se trate.” Noutro giro, BITENCOURT assevera que
“o conceito de ação vinha sofrendo nos anos setenta do século XX um questionamento
constante12. Não se atribui, no último quarto desse século, à conduta um papel
fundamental na teoria do delito, nem se lhe exige o desempenho de várias funções
conceituais, tampouco se pretende construir um conceito geral anterior (pré-jurídico)
e imutável de conduta (como, por exemplo, os conceitos clássicos de ação: causal, final
e social de ação). Todos esses esforços hoje não são considerados válidos. Parte-se,
portanto, da consideração de que a conduta é uma condição decisiva, mas não nos
interessam as condutas em geral, nem discutir se houve ou não uma conduta, mas nos
importa tão somente se a conduta in concreto que examinamos foi realizada com as
características exigidas na lei penal. Em outros termos, é estéril a discussão sobre um
conceito geral de ação válido para todas as possíveis formas de ação humana, porque,
em realidade, interessa-nos somente se o réu agiu (atuou) na forma descrita na lei
penal.” Por tudo isso, atualmente o conceito de ação resume-se na ideia de conduta
típica, isto é, não há um conceito geral de ação, mas tantos conceitos de ação como
espécies de condutas relevantes (típicas) para o Direito Penal, segundo as diversas
características com as que são descritas normativamente. Isso quer dizer que “não
existem ações prévias às normas, de modo que se possa dizer que exista a ação de
matar, se previamente não existir uma norma que defina matar como conduta
relevante para o Direito Penal. Assim, não existe a ação do 'xeque-mate' se antes não
houver as regras do jogo do xadrez; não existe a ação de impedimento (na linguagem
futebolística), sem que antes exista uma norma regulamentar que defina o que é
impedimento. Concluindo, primeiro são as normas (regras) que definem o que
entendemos socialmente por esta ou aquela ação. A partir daí, segundo essas regras,
podemos identificar que matar constitui um homicídio, que subtrair coisa alheia móvel
tipifica o crime de furto ou que determinados comportamentos significam ou possuem
um sentido jurídico, social e cultural que chamamos crime de homicídio, de corrupção,
de prevaricação etc., ou, na linguagem desportiva, atacar o rei inimigo sem deixar-lhe
saída é 'xequemate' ou posicionar-se adiante dos zagueiros adversários, antes do
lançamento, é impedimento. Resumindo, somente se pode perguntar se houve ação
humana relevante para o Direito Penal quando se puder relacioná-la a determinado
tipo penal (homicídio, furto, corrupção). Somente se houver a reunião dos elementos
exigidos pela norma penal tipificadora teremos o significado jurídico do que
denominamos crime de homicídio, roubo, estelionato etc. Assim, pois, a concepção
significativa da ação, que constitui um dos pressupostos fundamentais desta
orientação, sustenta que os fatos humanos somente podem ser compreendidos por
meio das normas, ou seja, o seu significado existe somente em virtude das normas, e
não é prévio a elas; por isso mesmo é que se fala em tipo de ação, em vez de falar
simplesmente em ação ou omissão ou até mesmo em ação típica.”

Extraído do espelho da última prova do Ministério Público do Estado de Goiás.

Exemplo: Crimes Cibernéticos. Tais condutas só passaram a ter significado após sua
tipificação.

2. De acordo com a Teoria do Domínio do Fato de Hans Welzel, quem pode ser
considerado autor do crime? E quem pode ser considerado partícipe (limite de
30 linhas):

ESPELHO:
Autor é quem controla finalisticamente o fato, quem decide sua forma de execução,
início e cessação. Partícipe é quem, embora colabore dolosamente, não exerce
domínio sobre a ação. Podemos afirmar que autor é que executa o núcleo do tipo
(autor propriamente dito), quem planeja a empreitada criminosa (autor intelectual) e
quem se vale de não culpável para executar o tipo (autor mediato).

Fonte: Manual de Direito Penal – parte geral – Rogério Sanches Cunha

3. A participação em empreitada criminosa consiste em conduta acessória,


através da qual o partícipe induz, instiga ou auxilia o autor. A punição da
conduta acessória é objeto de divergência entre quatro teorias. Discorra sobre
tais teorias, indicando a que prevalece na doutrina brasileira (limite de 30
linhas).

ESPELHO:

T. da Acessoriedade Mínima: para que a participação seja punida é preciso que o autor
tenha praticado um fato típico.

T. da Acessoriedade Limitada (ou média): para que a participação seja punida é preciso
que o autor tenha praticado um fato típico e ilícito. É a que prevalece na doutrina
brasileira.

T. da Acessoriedade Máxima: para que a participação seja punida é preciso que o autor
tenha praticado um fato típico, ilícito e culpável.

T. da Hiperacessoriedade: para que a participação seja punida é preciso que o autor


tenha praticado um fato típico, ilícito, culpável e punível.

Fonte: Manual de Direito Penal – parte geral – Rogério Sanches Cunha.

4. Discorra sobre as penas proibidas no Brasil (limite de 30 linhas).


ESPELHO:

Artigo 5º, inciso XLVII, da CF:

Não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX

Exceções: fuzilamento, em caso de guerra declarada, nas hipóteses previstas no Código


Penal Militar; Abate de aeronave considerada hostil ou suspeita (artigo 303, §2º, da Lei
7.565/86); e encerramento das atividades de pessoa jurídica (artigo 24 da Lei de
Crimes Ambientais).

b) de caráter perpétuo;

Artigo 75 do Código Penal: tempo de cumprimento de pena privativa de liberdade não


pode ser superior a 30 anos.

c) de trabalhos forçados;

É a pena violadora da dignidade humana.

d) de banimento;

Expulsão do nacional do nosso território.

e) cruéis;

Violadoras da dignidade da pessoa humana. A proibição se dirige ao Estado no


momento da criação, aplicação e execução das penas. A situação dos presídios no
Brasil viola tal mandamento constitucional.

5. Discorra a respeito das teorias sobre a punibilidade da tentativa, explicando,


inclusive, qual a acolhida pelo Código Penal Brasileiro. (máximo de 30 linhas)
Resposta:
a) Teoria subjetiva, voluntarística ou monista:
Ocupa-se exclusivamente da vontade criminosa, que pode se revelar
tanto na fase dos atos preparatórios como também durante a execução.
O sujeito é punido por sua intenção, pois o que importa é o desvalor da
ação, sendo irrelevante o desvalor do resultado.
b) Teoria sintomática:
Idealizada pela Escola Positiva de Ferri, Lombroso e Garofalo, sustenta a
punição em razão da periculosidade subjetiva, isto é, do perigo revelado
pelo agente. Possibilita a punição de atos preparatórios, pois a mera
manifestação de periculosidade já pode ser enquadrada como tentativa,
em consonância com a finalidade preventiva da pena.
c) Teoria objetiva, realística ou dualista:
A tentativa é punida em face do perigo proporcionado ao bem jurídico
tutelado pela lei penal. Sopesam-se o desvalor da ação e o desvalor do
resultado: a tentativa deve receber punição inferior à do crime
consumado, pois o bem jurídico não foi atingido integralmente.
d) Teoria da impressão ou objetivo-subjetiva (Zaffaroni):
Representa um limite à teoria subjetiva, evitando o alcance
desordenado dos atos preparatórios. A punibilidade da tentativa só é
admissível quando a atuação da vontade ilícita do agente seja adequada
para comover a confiança na vigência do ordenamento normativo e o
sentimento de segurança jurídica dos que tenham conhecimento da
conduta criminosa.

OBS: A punibilidade da tentativa é disciplinada no art. 14, parágrafo único


acolhendo o Código Penal, como regra, a teoria objetiva, realística ou dualista, ao
determinar que a pena da tentativa deve ser correspondente à pena do crime
consumado, diminuída de 1 a 2/3. Como o desvalor do resultado é menor quando
comparado ao do crime consumado, deve suportar uma punição mais branda.
Excepcionalmente, é aceita a teoria subjetiva, voluntária ou monista, consagrada na
expressão “salvo disposição em contrário”. Há casos em que o crime consumado e o
crime tentado comportam igual punição: são os delitos de atentado ou de
empreendimento. Exemplo: evasão mediante violência contra a pessoa (art. 352, CP),
em que o preso ou indivíduo submetido à medida de segurança detentiva, usando de
violência contra a pessoa, recebe igual punição quando se evade ou tenta evadir-se do
estabelecimento em que se encontrado privado de sua liberdade. (Cleber Masson,
Direito Penal Esquematizado – parte geral – v.1, Editora Método, 10ª Edição, 2016).

6. Quais as características do Direito Penal do Inimigo? Relacione-o ao Direito


Penal de 3ª Velocidade. (máximo de 30 linhas).

Resposta: O Direito Penal do Inimigo cinge-se à ideia de que o indivíduo que,


reiteradamente, decide não observar as regras vigentes em uma sociedade não pode
ser tratado como cidadão, pois, em verdade, não é um cidadão, mas sim, um inimigo
da sociedade. São características do direito penal do inimigo:

a) Tipificação de atos preparatórios. Ex.: delito de associação criminosa. Atos que


seriam preparatórios passam a ser considerados delitos autônomos.

b) Crimes de mera conduta e de perigo abstrato. Ex.: posse irregular de arma de


fogo de uso permitido (artigo 12 da Lei 10.826/03). Ainda que não tenha havido
a exposição do bem jurídico incolumidade pública a risco, considera-se que
houve crime. STF reputa constitucional.

c) Recrudescimento da execução penal. Ex.: crimes hediondos – progressão de


regime após cumprimento de 2/5 ou 3/5 da pena.

d) Restrição de direitos e garantias processuais. Aqui, tem-se o direito penal de 3ª


velocidade de Jesus Maria Silva Sanchez. A possibilidade de aplicação de penas
privativas de liberdade, a despeito de relativizações de direitos e garantias
processuais, é o que caracteriza o direito penal de 3ª velocidade. Essa também
é uma característica do Direito Penal do Inimigo.

7. Discorra sobre as concausas absolutamente independentes e as concausas


relativamente independentes. (máximo de 30 linhas)

Resposta:

Nas concausas absolutamente independentes, a causa efetiva do resultado não se


origina, direta ou indiretamente, do comportamento concorrente. Veja, que a
causa absolutamente independente não tem qualquer relação com a outra causa.
A causa absolutamente independente pode ser preexistente.

Exemplo: Maria decide matar o marido. Para tanto, decide fazer uma sopa e
colocar veneno. O marido toma a sopa. No momento em que o marido está
assistindo televisão, o veneno começa a fazer efeito quando entra um indivíduo na
residência e atira no marido de Maria. O bandido vai embora. Posteriormente,
constata-se que o marido de Maria morreu em razão do veneno, e não em razão
dos disparos. Também pode ser concomitante. Exemplo: O bandido entra na casa e
efetua um disparo contra João, marido de Maria. No mesmo instante, cai um lustre
na cabeça de João. E por fim, superveniente. Exemplo: Maria decide matar o
marido. Para tanto, decide fazer uma sopa e colocar veneno. O marido toma a
sopa. No momento em que o marido está assistindo televisão, e antes de o veneno
começar a fazer efeito, entra um indivíduo na residência e mata o marido de Maria.
O marido vem a óbito por motivo dos disparos, e não pelo motivo do veneno.
Maria responderá por tentativa de homicídio, eis que, quando ela ministrou o
veneno, o objeto material (marido) tinha vida, não havendo que se falar em crime
impossível. Veja, ela não conseguiu matar o marido por circunstâncias alheias à sua
vontade.

A conclusão é de que, no caso de concausas absolutamente independentes, não


importa a espécie, o comportamento paralelo será punível como se fosse tentado.
Mas o outro que efetivamente causar o resultado, responderá pelo resultado, salvo
no caso do lustre, que não haverá crime.

As concausas também poderão ser relativamente independentes, hipótese em que


haverá uma conjugação de causas que irão levar ao resultado final. As concausas,
nesta situação, se fossem analisadas individualmente consideradas, não levariam
ao resultado final. Todavia, se conjugarmos as duas causas, será plenamente
possível o resultado.

As concausas relativamente independentes poderão ser preexistentes. A causa


efetiva é anterior à causa concorrente. João é portador de hemofilia. José deseja
matar João e, por saber que ele é hemofílico, dá uma facada na vítima.
Posteriormente, é constatado que João não teria sido morto por conta da facada,
que foi no braço, porém, em razão da hemofilia, a vítima morreu. Neste caso, José
responderá por homicídio consumado. Na concomitante, a causa efetiva ocorre
simultaneamente à outra causa. Neste caso, João, com intenção de matar José,
efetua um disparo contra a vítima. No entanto, João não atinge José, mas, por ter
90 anos, morre de infarto com o susto causado pela atitude do agente. João
responderá pelo homicídio consumado.

No caso de causa superveniente relativamente independente, a causa efetiva do


resultado ocorre após a causa concorrente.

O exemplo clássico é aquele em que João efetua um disparo contra José, porém
este é socorrido com vida e levado por uma ambulância para o hospital. No trajeto
para o hospital, a ambulância colide com um ônibus, levando a vítima à morte.

O art. 13, §1º, do CP adotou a Teoria da Causalidade Adequada (condição


qualificada ou condição individualizadora), considerando como causa a pessoa ou
circunstância que, além de praticar um antecedente indispensável, leva a produção
de um resultado dentro daquilo que é esperado. Ou seja, realiza uma atividade
adequada à concretização do resultado. Quem agir para matar, não quer matar por
um acidente do veículo que conduz a vítima para o hospital. Isto não está dentro
do desdobramento esperado, dentro daquilo que é possível ocorrer.

Portanto, nesse caso, responderá por tentativa de homicídio. Por outro lado,
quando o fato superveniente está dentro do desdobramento normal da causa
realizada pelo agente, o sujeito vai responder pelo crime consumado. Por exemplo,
no caso em que João dispara contra José e, ao chegar no hospital, recebe
tratamento médico, o qual se mostrou insuficiente em razão de um erro médico.

8. Carlos avista Marcos, seu desafeto, caminhando na rua de madrugada. Marcos


coloca a mão no bolso do paletó e Carlos imagina que Marcos sacará uma arma
de fogo. Por isso, Carlos promove dois disparos contra Marcos, o qual vem a
óbito como decorrência da conduta. Qual instituto de direito penal a hipótese
apresenta? O que é culpa imprópria? Diferencie a teoria limitada da
culpabilidade da teoria extremada da culpabilidade. (máximo de 30 linhas)

Resposta:

A hipótese apresenta o instituto da legítima defesa putativa. Nessa circunstância, o


agente supõe erroneamente a existência de uma situação fática que, se estivesse
presente, seria uma descriminante para a sua conduta.

No caso em tela, Carlos errou ao supor que Marcos sacaria uma arma de fogo e
imaginou, de maneira equivocada, que, ao perpetrar os disparos, estava abarcado
pela excludente de ilicitude da legítima defesa, o que não se dava de fato. Culpa
imprópria, por sua vez, é aquela na qual o agente, por erro fruto de negligência,
imprudência ou imperícia, fantasia situação de fato, supondo estar acobertado por
causa excludente da ilicitude (caso de descriminante putativa) e, em razão disso,
provoca intencionalmente o resultado ilícito e evitável.

Observe-se que, ao contrário do que ocorre com a culpa propriamente dita, na


culpa imprópria, há real intenção do agente na produção do resultado.
A finalidade voltada à produção de um resultado específico é verificável, o que é
típico de uma conduta dolosa. Ocorre que, por razões de política criminal, o
legislador preferiu tratar essa situação específica a título de culpa, como expresso
na segunda parte do artigo 20, § 1º, do CP: “É isento de pena quem, por erro
plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se
existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de
culpa e o fato é punível como crime culposo.” (destacou-se)

A primeira parte trata justamente do instituto da legítima defesa putativa. Já a


segunda parte ressalta que, havendo previsão da figura culposa, o agente deve ser
punido desta forma se, por negligência, imprudência ou imperíricia, imaginar
erroneamente situação de fato que, se existisse, justificaria sua conduta.

Veja que o agente atua com dolo, dolo esse composto de seus dois elementos.
Com efeito, na concepção finalista, o dolo constitui-se dos seguintes elementos: i)
consciência da conduta, resultado e nexo causal (elemento cognitivo ou
intelectivo); 2) vontade de praticar a conduta e produzir o resultado (elemento
volitivo).

Mas, no caso da culpa imprópria, o legislador, trata a conduta do agente como se


fosse uma conduta culposa, o que justica a nomenclatura em questão. A relação
entre a última pergunta e os anteriores está no fato de que a diferença entre tais
teorias da culpabilidade está justamente no tratamento dispensado às
discriminantes putativas e as consequências que daí advêm.

Para a teoria extremada (ou normativa pura, ou estrita) da culpabilidade, todos os


casos de erro quanto às descriminantes putativas são vistos como erros de
proibição. Para a teoria limitada da culpabilidade, deve-se fazer uma distinção. Se o
erro recair sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, não se
poderia falar em erro de proibição, pois não se está a tratar de uma consideração
equivocada acerca da norma, mas de uma percepção errada sobre uma
circunstância de fato.
Nesse cenário, nasce o conceito de erro de tipo permissivo. Por outro lado, se o
erro disser respeito à existência ou aos limites de uma causa de justificação, ele
será tratado como um erro de proibição, pois, nesses casos, diz respeito
efetivamente à norma penal. Entende-se, de modo preponderante na doutrina,
que o Código Penal brasileiro adotou a teoria limitada da culpabilidade no artigo
20, § 1º, do CP, ao permitir a punição a título de culpa, caso ela esteja prevista no
tipo penal incriminador e o erro resultante de negligência, imprudência ou
imperícia recair sobre uma circunstância de fato.

9. O fato típico é uma ação ou omissão humana que se adequa a um modelo


descrito em uma norma penal incriminadora. Há uma subsunção de um fato a
uma norma penal incriminadora. São elementos do fato típico: a) Conduta; b)
Resultado; c) Nexo causal e d) tipicidade. Dentre as formas de conduta, há a
dolosa, que é praticada quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de
produzi-lo. Com relação ao dolo, indique e justifique a teoria adotada para o
dolo direto e dolo eventual. Em seu texto, aborde as seguintes teorias,
procurando realizar a distinção entre elas: a) teoria da vontade; b) teoria da
representação; c) teoria do assentimento; d) teoria da probabilidade; e) teoria
da evitabilidade. (máximo 40 linhas)

Resposta:

Teoria da vontade: Para a teoria da vontade, dolo é a vontade consciente de


praticar a infração penal. Para essa teoria, o dolo pressupõe a consciência
(elemento intelectivo), mas esta não basta, sendo imprescindível a vontade do
agente em produzir o resultado (elemento volitivo). É classificada como uma teoria
volitiva. É a teoria adotada pelo Código Penal para o dolo direto.

Teoria da representação (teoria da possibilidade): Segundo a teoria da


representação, ou da possibilidade, o dolo está presente sempre que o agente tem
a previsão do resultado como possível, e ainda assim continua a sua conduta.
Basta, portanto, a presença do elemento intelectual (consciência) para sua
caracterização. Para essa teoria, a culpa é sempre inconsciente, porque, sendo
reconhecida a certeza, possibilidade ou probabilidade do resultado, haveria dolo,
não sendo necessário analisar se o agente assumiu ou não sua produção do
resultado. É, pois, uma teoria intelectiva. É a teoria adotada para a culpa
consciente.

Teoria do assentimento (teoria do consentimento ou teoria aprovação): Na teoria


da aprovação, o agente tem a previsão do resultado como possível e ainda assim
prossegue na sua conduta, assumindo o risco de produzir o resultado. Ou seja, o
dolo exige que o agente consinta em causar o resultado, além de o considerar
como possível. Para aplicação dessa teoria, Frank sugeriu a fórmula hipotética
seguinte: diante da realização do tipo objetivo, o agente pensa: “seja assim ou de
outro modo, ocorra este ou outro resultado, em todo caso eu atuo”. É uma teoria
volitiva. É a teoria adotada para o dolo indireto, denominado de dolo eventual.

Teoria da probabilidade (teoria da cognição): De acordo com esta teoria, distingue-


se o dolo eventual segundo a probabilidade da realização do resultado
representado pelo agente. Esta teoria traz dificuldades em conhecer o real
elemento volitivo do agente. Haverá dolo eventual quando o agente prevê como
provável o resultado, e não apenas como possível, admitindo, ou não, o resultado.
Caso a produção do resultado seja pouco provável, haverá culpa consciente. Ex.: A
atira a longa distância em B, com o intuito de testar a eficácia do tiro da arma. Se
A, no momento da ação, tiver consciência acerca da possibilidade concreta do
resultadomorte de B, e, ainda assim, disparar e ocorrer o evento, significa que o
consentiu, realizando o tipo como dolo eventual.

Teoria da evitabilidade (teoria da objetivação da vontade de evitação do


resultado): Segundo Juarez Cirino, a teoria da não-comprovada vontade de
evitação do resultado (teoria da objetivação da vontade de evitação do resultado),
desenvolvida por Armin Kaufmann em bases finalistas, coloca o dolo eventual e a
imprudência consciente na dependência da ativação de contrafatores para evitar o
resultado representado como possível: imprudência consciente se o autor ativa
contrafatores, dolo eventual se não ativa contrafatores para evitação do resultado.
Ou seja, a teoria da evitabilidade, cognitiva, pressupõe a representação do
resultado como possível, o que bastará para a caracterização do dolo eventual.
Contudo, se o agente busca evitar o resultado através da ativação de
contrafatores, agindo concretamente, existirá culpa consciente.

10. Disserte sobre a coculpabilidade e a coculpabilidade às avessas, indicando as


consequências jurídico-penais do acolhimento no sistema penal brasileiro. (máximo 30
linhas)

Resposta:

A teoria da coculpabilidade estabelece que o Estado tem parcela de responsabilidade nos


fatos realizados por criminosos que não tiveram acesso à escola, saúde, à oportunidade e
terem trilhado o caminho do crime.

Para esta teoria, o Estado deve também ser responsabilizado pelos agentes estarem
cometendo delitos por conta da desigualdade social. O CP não adota expressamente esta
teoria da coculpabilidade, mas é possível aplicá-la por meio do art. 66 do CP, que diz a
pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou
posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.

Se a coculpabilidade significa um menor grau de reprovabilidade do comportamento


daquele sujeito que não teve oportunidade, a coculpabilidade às avessas vai significar uma
maior reprovabilidade do comportamento do sujeito que teve todas as oportunidades. E,
portanto, a coculpabilidade às avessas adota uma postura crítica quanto à seletividade do
direito penal.

Ela vai dizer que o direito penal do jeito que está resta equivocado, pois há abrandamento
no tocante aos delitos praticados por pessoas com alto poder econômico social. Exemplo
de abrandamento é o pagamento do crédito tributário que extingue a punibilidade. Outra
crítica que ela faz é no sentido de que o sistema é feito de maneira a se mostrar mais
gravoso para as pessoas com menores condições.

Basta olhar para a Lei de Contravenções Penais e compreender que vadiagem e


mendicância são atos cometidos por aqueles que são marginalizados e não possuem
condições de prover o seu próprio sustento. A partir daí, começam a ser tipificadas
condutas de pessoas que não tiveram acesso ao ensino, saúde e educação de qualidade.

Por isso, há uma coculpabilidade às avessas ao indivíduo que, a par de todas as


oportunidades, decidiu ingressar no mundo do crime. Esta reprovabilidade da
coculpabilidade às avessas não possui previsão legal. Além disso, não é possível sua
aplicação, eis que não se admite a analogia in malam partem no Direito Penal.

Todavia, o magistrado, quando da dosimetria da pena, poderá considerar um maior grau


de reprovabilidade na conduta do agente, nas condições do art. 59, devendo haver algo
específico para que a pena seja fixada acima do mínimo legal. Mas, em nenhum momento,
poderá considerar a coculpabilidade às avessas como agravante.

Você também pode gostar