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Dimensionamento de Alvenarias Estruturais

Paulo B. Lourenço

Relatório 99-DEC/E-7

Data: Dezembro 1999


Nº de páginas: 76

Palavras-chave: alvenaria estrutural, dimensionamento, projecto, Eurocódigo 6

Departamento de Universidade
Engenharia Civil do Minho

Azurém, 4800-058 Guimarães - Tel. 253 510 200 - Fax 253 510 217 - E-mail secG@eng.uminho.pt
ÍNDICE

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................1.1
1.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ALVENARIA RESISTENTE...............................................1.1
1.2. A ALVENARIA RESISTENTE E OS TERRAMOTOS .....................................................1.10
1.3. A ALVENARIA RESISTENTE NO SÉCULO XX .........................................................1.15
1.4. A SITUAÇÃO EM PORTUGAL ..................................................................................1.19
1.5. REFERÊNCIAS ........................................................................................................1.21

2 A CONSTRUÇÃO EM ALVENARIA RESISTENTE .............................................2.1


2.1. PRODUTOS PARA ALVENARIA ..................................................................................2.1
2.2. TIPOLOGIAS DAS PAREDES RESISTENTES.................................................................2.4
2.3. CONCEPÇÃO ESTRUTURAL ......................................................................................2.8
2.3.1. Selecção do Tipo de Paredes Resistentes.......................................................2.8
2.3.2. Características Tipológicas ............................................................................2.9
2.4. CLASSIFICAÇÃO TOPOLÓGICA ...............................................................................2.10
2.4.1. Forma e Dimensões ......................................................................................2.11
2.4.2. Organização da Malha Estrutural.................................................................2.12
2.4.3. Exemplos de Aplicação................................................................................2.15
2.5. ASPECTOS TECNOLÓGICOS E CONSTRUTIVOS ........................................................2.20
2.6. REFERÊNCIAS ........................................................................................................2.21

3 DIMENSIONAMENTO DE ESTRUTURAS DE ALVENARIA ............................3.1


3.1. INTRODUÇÃO ...........................................................................................................3.1
3.1.1. Documentos Normativos de Referência.........................................................3.2
3.2. BASES DE PROJECTO................................................................................................3.3
3.2.1. Segurança e Acções........................................................................................3.3
3.2.2. Propriedades dos Materiais ............................................................................3.3
3.2.3. Estabilidade e Robustez .................................................................................3.4
3.3. MATERIAIS ..............................................................................................................3.5
3.3.1. Unidades para Alvenaria ................................................................................3.5
3.3.2. Argamassa ......................................................................................................3.6
3.3.3. Betão de Enchimento .....................................................................................3.7
3.3.4. Armaduras ......................................................................................................3.7
3.4. PROPRIEDADES MECÂNICAS (ALVENARIA SIMPLES) ...............................................3.8
3.4.1. Geral ...............................................................................................................3.8
3.4.2. Resistência característica à compressão.........................................................3.8
3.4.3. Resistência Característica ao Corte................................................................3.9
3.4.4. Resistência Característica à Flexão..............................................................3.10
3.4.5. Características de Deformação da Alvenaria ...............................................3.10
3.5. PROPRIEDADES MECÂNICAS (ALVENARIA ARMADA, PRÉ-ESFORÇADA E
CONFINADA)..........................................................................................................3.11
3.6. EXEMPLOS DE DIMENSIONAMENTO .......................................................................3.12

i
3.6.1. Edifício de Habitação com Quatro Pisos (Sem Acções Horizontais) ..........3.12
3.6.2. Parede Sujeita a Acções Combinadas (Esforço Normal e de Corte)............3.23
3.6.3. Muro de Suporte em Alvenaria Armada com Pilares Embebidos ...............3.25
3.7. ASPECTOS RELATIVOS AO EUROCÓDIGO 8 ............................................................3.27
3.7.1. Definições de Alvenaria Confinada e Alvenaria Armada............................3.27
3.7.2. Materiais e Aparelhos ..................................................................................3.27
3.7.3. Coeficientes de Comportamento ..................................................................3.27
3.7.4. Análise Estrutural.........................................................................................3.27
3.7.5. Critérios de Dimensionamento e Regras de Construção..............................3.28
3.7.6. Verificação de Segurança.............................................................................3.29
3.7.7. “Edifícios Simples de Alvenaria” ................................................................3.29

A GLOSSÁRIO ...............................................................................................................A.1
A.1. ALVENARIA ............................................................................................................A.1
A.2. RESISTÊNCIA DA ALVENARIA .................................................................................A.1
A.3. UNIDADES DE ALVENARIA ......................................................................................A.2
A.4. ARGAMASSA ..........................................................................................................A.2
A.5. BETÃO DE ENCHIMENTO .........................................................................................A.3
A.6. ARMADURAS ..........................................................................................................A.3
A.7. COMPONENTES AUXILIARES ...................................................................................A.3
A.8. JUNTAS DE ARGAMASSA .........................................................................................A.3
A.9. TIPOS DE PAREDES ..................................................................................................A.3
A.10. DIVERSOS ...........................................................................................................A.4

ii
Capítulo 1

1 INTRODUÇÃO

1.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ALVENARIA RESISTENTE


Os arqueólogos distinguem três fases principais na evolução cultural da humanidade,
conhecidas respectivamente como Idade da Pedra, do Bronze e do Ferro, de acordo com a
utilização destes materiais para ferramentas e armas.
Da mesma forma também o Homem atravessou fases relativas aos seus meios de
subsistência. Inicialmente, no estado selvagem, o Homem viveu uma vida nómada de
caçador-recolector em que pequenos grupos se deslocavam pelo território, conhecido ou
desconhecido, em busca de alimentos: caçando animais de pequeno e médio porte, recolhendo
frutos silvestres, raízes e insectos e pescando junto aos rios e mares. No estado bárbaro, por
volta do final da Idade da Pedra, ocorre uma alteração significativa no modo de vida social: a
sedentarização. Primeiro na Anatólia e Mesopotâmia (Próximo Oriente), depois no Egipto e
Mar Egeu. As causas que deram origem a tal processo ainda permanecem desconhecidas. Não
se sabe se foi o abandono do estilo de vida de predador em benefício do sistema baseado na
produção agrícola e criação de animais que levou à fixação, ou se foi a vida sedentária que
levou os homens a conservarem junto de si os animais e produtos agrícolas. O certo é que os
homens num determinado momento da história começaram a construir locais de residência
habitual. A verdadeira civilização só foi conseguida quando o desenvolvimento social e
económico atingiu um nível suficiente para permitir a construção de cidades e vilas, em que
uma parte da população se ocupava do comércio, indústria e actividades profissionais. É por
volta dos anos 9000 a 7000 a.C., com a primeira civilização, que a história da arquitectura se
inicia e, simultaneamente, a alvenaria surge como uma técnica de construção.
O homem primitivo desde logo sentiu a necessidade de se proteger das intempéries e
dos animais selvagens. As primeiras protecções que procurou foram as grutas naturais ou
escavadas, nos locais onde existiam afloramentos rochosos, e depois as construções,
utilizando os materiais que a natureza oferecia, tais como, troncos de árvore, galhos cobertos
com peles de animais, palha e barro. Algumas destas construções cristalizaram em habitações
em pedra, adobe ou madeira, pelo que a evolução do Homem está relacionada com a história
da arquitectura1, e com a história dos materiais de construção2.
As primeiras habitações permanentes em alvenaria de pedra não-argamassada foram
encontradas no lago Hullen em Israel e datam de 9000 a 8000 a.C.. Outros vestígios,
descobertos nas escavações de Aïn Mallaha na Anatólia e em Tell Mureybet na Síria -
Palestina, revelaram casas de estrutura circular com diâmetros entre os 6 m e os 10 m, semi-
enterradas com uma profundidade de cerca de 0.70 m. Ao longo das paredes existiam buracos
para troncos, o que faz supor que inicialmente a estrutura superior seria em madeira sendo
posteriormente substituída por muros de pedra ligada por argamassa. A cobertura era formada
por camadas de barro sobre uma armação. Um bom exemplo deste género de arquitectura é
dado pela cidade de Khiroitikia em Chipre, constituída por casas em forma de colmeia,
construídas com paredes de alvenaria de pedra e telhados de adobe em forma de cúpula, ver
Figura 1.1. Algumas têm um andar realizado com troncos de madeira sustentados por paredes
e por pilares de pedra3.
1.2 Capítulo 1 Introdução

Figura 1.1 – Reconstituição de Khirotikia: aldeia neolítica na ilha de Chipre.

Entretanto ocorre a mudança da estrutura circular para uma estrutura rectangular


(7700-7600 a.C.), esta forma permite ampliações e reflecte já um certo desenvolvimento
demográfico. Uma das cidades conhecidas é Çatal-Hüyük na Anatólia e que remonta a 6500
a.C., as suas casas de tijolo formam um bloco compacto, como se favos de uma colmeia se
tratasse e onde a circulação não se faz por ruas mas pelas coberturas em terraço, ver Figura
1.2.

Figura 1.2 – Reconstituição esquemática das casas em terraço de Çatal Hüyük (c. 6000 a.C.).

Jericó, que é referida na Bíblia como a cidade que foi destruída pelo som das
trombetas de Josué, é o exemplo de como um povoado se transformou numa das mais
importantes cidades da época. Inicialmente as casas eram circulares e ovaladas, construídas
com adobes plano-convexos e as coberturas eram tectos em cúpula. Mais tarde a planta das
casas passou a ser rectangular tendo as habitações mais que um andar, estas eram
caracterizadas primeiro pelo reboco das paredes feitas com blocos de barro agora de forma
alongada e secos ao sol, e também pelo chão perfeitamente polido. A área habitada era
circundada por uma muralha notável4 com tramos que atingiam cerca de 3.5 m de altura por
2 m de espessura e com torres circulares, sendo conhecida uma torre cuja altura conservada
até aos nossos dias é de 9 m, ver Figura 1.3.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.3

Figura 1.3 – Muralhas e torre de Jericó na Jordânia (c. 7000 a.C.).

Outros legados de alvenaria de pedra sobreviveram até aos dias de hoje como
testemunhos das culturas antigas e medievais como por exemplo, a arquitectura Egípcia com

(a)

(b) (c)
Figura 1.4 – O processo adaptativo da construção das pirâmides no antigo Egipto: (a) a
Pirâmide de Zoser (c. 2675 a.C.) em Saqqara construída em degraus em volta de
um maciço plano formado por blocos assentes na horizontal em alvanaria; (b) a
Pirâmide de Snefuru (c. 2600 a.C.) em Dahshur foi iniciada com uma inclinação
de 52º e, posteriormente, continuada a um ângulo mais conservativo de 43.5º. É
constituída por blocos assentes com uma pequena inclinação na direcção da face
exterior; (c) o projecto da Pirâmide de Sahura (c. 2500 a.C.) foi adoptado em
todas as restantes pirâmides do Reino Antigo (incluindo a mais alta Pirâmide de
Cheops com 160 m).
1.4 Capítulo 1 Introdução

as suas pirâmides faraónicas (c. 2800-2000 a.C.), a arquitectura Romana e Romanesca com os
seus templos, palácios, arcos, colunas, igrejas, pontes e aquedutos (c. 0-1200 d.C.), a
arquitectura Gótica com as suas magníficas catedrais (c. 1200-1660 d.C.) e muitos outros, ver
Figura 1.4-Figura 1.7. É no período Gótico que se atinge o esplendor na arte de talhar a pedra.
As catedrais góticas consistem num esqueleto de colunas, contrafortes, paredes, arcos e
abóbadas. As paredes limitam a estrutura mas não a suportam, sendo geralmente constituídas
por vitrais de grande dimensão.

(a) (b)

(c)
Figura 1.5 – O estilo maciço romano: (a) Domus Flavia, Roma, Itália (terminada em 92 d.C.)
ilustra as paredes maciças e as pequenas aberturas associadas com um
conhecimento estrutural e uma experiência incipientes; (b) Igreja em Gensac-la-
Pallue, França (século XII), demonstra que o estilo maciço sobreviveu até muito
tarde; (c) o aqueduto Pont du Gard, França (14 d.C.), tem 290 m de
comprimento e 50 m de altura, demostra no entanto o engenho romano na
construção de pontes.

Nos dias de hoje, a pedra tem outras funções na indústria da construção dado que a
extracção, transporte e colocação deste material tão pesado e caro se tornaram proibitivas. É
possível utilizar materiais mais adequados e económicos para aplicações estruturais e a pedra
é geralmente apenas um material de revestimento.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.5

Figura 1.6 – Secção transversal de uma catedral gótica, Amiens, França (1220-1288). A carga
das abóbadas da nave possui uma componente vertical devida ao seu peso
próprio e uma componente horizontal devida à forma de arco da abóbada. Esta
componentes são transmitidas à fundação por um sistema de colunas e
contrafortes maciços carregados com pináculos.

Figura 1.7 – Diagrama de construção da abóbada da Capela Henrique VII na Abadia de


Westminster, Londres, Reino Unido (c. 1510). A complexidade e arrojo do
sistema estrutural é claramente visível.

Para além da utilização da pedra, também outros materiais foram utilizados na


alvenaria ao longo dos tempos. Foram as áreas mais populosas dos tempos antigos que
testemunharam o aparecimento dos tijolos de barro seco ao sol (adobe). A necessidade de
materiais de construção combinada com a abundância de argila†5, o clima quente e seco
necessário para secar o tijolo e a falta de madeira e pedra para construção conduziram ao
desenvolvimento do tijolo de barro. Os tijolos podiam ser facilmente moldados, eram mais
leves do que a pedra e formavam uma parede durável e resistente ao fogo. No Egipto desde os
tempos anteriores às Dinastias (5000 a.C.) até à ocupação romana (50 d.C.) o material mais


Argila e solos lateríticos adequados para a utilização como materiais de construção constituem 74% da crusta
terrestre
1.6 Capítulo 1 Introdução

utilizado na construção de habitações era o tijolo seco ao sol, geralmente de lama do Nilo. A
lama do Nilo pura retrai 30% no processo de secagem mas a adição de palha e areia à pasta
prevenia a formação de fendas. A forma de produção de tijolos está documentada numa
pintura do túmulo de Rekhmara (c. 1500 a.C.), ver Figura 1.8. A maior parte destes edifícios
em adobe foram destruídos mas os que chegaram até aos nossos dias comprovam o domínio
das técnicas de construção, tais como os armazéns anexos ao templo funerário de Ramsés II
(c. 1260 a.C.) cujas abóbadas vencem um vão de 4 m, prova de uma perícia que só mais tarde
os Romanos alcançariam.

Figura 1.8 – Produção de tijolos no Egipto, tal como representada numa pintura do túmulo de
Rekhmara em Thebes (c. 1500 a.C.).

A prática de cozer os tijolos iniciou-se, provavelmente, com a observação que os


tijolos próximos do fogo para cozinhar ou que os tijolos deixados após o incêndio de uma
cobertura de colmo pareciam mais resistentes e duráveis. Para cozer tijolos era necessário
providenciar uma quantidade de combustível adequada, pelo que a utilização dos tijolos secos
ao sol continuou popular por vários milénios no Próximo Oriente. Um exemplo primitivo da
produção em massa de tijolos cozidos é um forno vertical encontrado em Khafaje, Iraque, que
data do terceiro milénio a.C.. A primeira referência documentada sobre tijolos cozidos é
provavelmente um papiro da 19ª Dinastia do Egipto (c. 1300 a.C.)6 mas a referência mais
famosa está no Antigo Testamento, Génesis XI-3: “Façamos tijolos e queimemo-los bem. E
foi-lhes o tijolo por pedra e o betume por cal. (...) Edifiquemos uma cidade e uma torre, cujo
cume toque os céus”. E construíram provavelmente o primeiro arranha-céus da história, uma
vez que se estima que a Torre de Babel tivesse uma altura de 90 m. A cidade da Babilónia
(1900-600 a.C.), situada ao longo das margens do rio Eufrates, sobre o qual existia uma ponte
de tijolo com 115 m de comprimento, era um exemplo de grandiosidade e técnica. A muralha
também de tijolo era balizada por duas torres. Crê-se que esta torre, realizada em tijolo, seja
um zigurate composto por sete terraços sobrepostos em escada e coroados por um templo
revestido com tijolos vidrados policromados ornamentados com animais e outras formas
coloridas em relevo, ver Figura 1.9. Uma vez que não existiam pedreiras nesta região que
permitissem a realização de painéis esculpidos, como era usual entre os Assírios, o tijolo
vidrado era usado na decoração dos edifícios, demonstrando o domínio perfeito da técnica de
cozer tijolos.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.7

(a) (b)
Figura 1.9 – Babilónia: (a) representação esquemática da cidade-estado (c. 1900 a.C.) e
(b) Porta de Istar (c. 575 a.C.)

No entanto, foi apenas durante o império Romano (500 a.C. a 300 a.D.) que a
produção de tijolos se generalizou a toda a civilização. Este facto deveu-se, não só, à
variedade e facilidade de obter a matéria prima, mas também, à vontade de marcar o domínio
e de homogeneizar a arquitectura, a indústria de construção, a sociedade e a economia. Os
edifícios Romanos, devido ao clima desta região, eram construídos essencialmente com
tijolos secos ao sol assentes sobre juntas de barro. As faces exteriores eram rebocadas para
melhorar o aspecto e também para dar uma melhor protecção contra a chuva. Os tijolos
cozidos eram por vezes usados para melhorar a resistência nas ombreiras das portas. Só
durante o domínio do imperador Augusto é que o uso do tijolo cozido de tornou significativo.
Em muitos edifícios Romanos foram construídas paredes segundo uma nova técnica que era
uma espécie de betão, uma amálgama de argamassa, saibro, cascalho e desperdícios de tijolos
e telhas. O seu aspecto exterior era melhorado revestindo estas paredes com tijolos, placas de
mármore, calcário ou estuque.
No norte da Europa, já durante a era medieval, as construções eram quase todas
dominadas pelo tijolo devido à escassez de pedra nestas regiões. Também em Inglaterra,
durante os séculos XIV e XV, a alvenaria de tijolo teve um certo incremento que foi
provocado sobretudo pelo aumento dos preços da madeira. A produção de tijolos aumentou,
passando a existir uma diversidade de cores disponíveis que iam do bege ao cinzento,
passando por vários tons de vermelho.
No início do século XIX, quando se pretendia construir um edifício, começava-se por
preparar a pasta de argila para fabricar os tijolos que seriam necessários. Mais tarde esta
produção pontual passou a ser de maior escala, produzindo-se grandes quantidades de tijolos.
Com efeito, a Revolução Industrial7 e a revolução nos transportes que a acompanhou,
permitiu o desenvolvimento da mecanização na produção dos materiais de construção e das
redes de comércio, o que tornou as matérias primas e os produtos finais disponíveis. Os
avanços tecnológicos melhoraram as ferramentas e métodos usados na fabricação dos
materiais de construção, mas as mudanças pouco mais foram do que a transferência da mão de
1.8 Capítulo 1 Introdução

obra tradicional para a produção mecanizada e um pequeno aumento na qualidade e


uniformização dos produtos, ver Figura 1.10.

Figura 1.10 – Produção manual de tijolos, início do século XIX.

Em meados do século XIX, os fabricantes de tijolos desenvolveram métodos


mecânicos para preparar a argila e moldar os tijolos. Uma nova máquina foi introduzida em
1835 e mais tarde viria a ser melhorada, esta extrudia a argila dura através de uma biela
contínua obtendo-se duas das dimensões do tijolo, ver Figura 1.11.

Figura 1.11 – Mesa de corte de tijolos. Séc. XIX.

No ano de 1846, em Vancouver, Canadá, a Hudson´s Bay Company estabeleceu uma


indústria onde a produção de tijolos era mais sofisticada e organizada. A pasta de argila era
introduzida num moinho com um eixo central com lâminas, as quais rodavam com a ajuda de
um cavalo e permitiam obter uma pasta com a consistência desejada. Cada molde,
inicialmente de madeira e depois de ferro e aço, contendo seis tijolos era enchido e levado
para a zona de secagem onde eram retirados os moldes, ficando os tijolos a secar ao ar. Para
que as faces dos tijolos ficassem amaciadas, batia-se nestas com uma tábua de madeira. Após
um dia ou dois ao sol os tijolos eram virados para assim secarem melhor e ficavam prontos
Paulo B. Lourenço Introdução 1.9

para serem levados para o forno onde iriam cozer durante dez a catorze dias. Um forno típico
poderia conter entre 20000 a 50000 tijolos, o que correspondia de 4 a 10 dias de trabalho de
um moldador e o suficiente para construir uma pequena casa com dois pisos. A localização
destas indústrias era determinada pela presença de jazidas de argila próximas, e de modo a
que ficassem perto das cidades ou de meios de transporte relativamente económicos.
Já no final do século, o processo de pressão a seco que foi encorajado e, devido ao
desenvolvimento das máquinas a vapor, vulgarizou-se, ver Figura 1.12. Este processo
consistia em forçar o pó da argila quase seco para os moldes sob forte pressão, os moldes
eram depositados sobre uma mesa e depois transportados directamente para o forno. Assim
evitava-se a secagem prévia ao sol, obtendo-se tijolos com faces mais regulares e arestas bem
definidas, sendo possível prensar o material uma segunda vez para o melhor compactar, caso
fosse necessário.

Figura 1.12 – Máquina de tijolos “Imperial” (Séc XIX). Preparada para produzir 100 tijolo
por minuto.

Com os avanços no processo de tratar a argila e moldar os tijolos, veio também o


desenvolvimento dos métodos de cozedura. Com efeito, Hoffman na Alemanha, em 1858
projectou o primeiro forno contínuo. Este era constituído por um anel circular com diversas
câmaras que se encontravam ligadas a uma chaminé central através de tubos, ver Figura 1.13.
O calor era controlado no nível superior do forno.
1.10 Capítulo 1 Introdução

Figura 1.13 – Forno Hoffman.

O formato dos tijolos, desde a pré-história até ao século XIX, manteve-se quase
sempre constante, paralelepipédico e maciço. No entanto, em 1813 um inglês, Benford
Deacon, patenteou um tijolo furado para conduzir o ar quente através de chaminés desde as
cozinhas até aos sótãos. As aberturas eram feitas manualmente nos tijolos ainda verdes. Esta
invenção não teve grande sucesso na Inglaterra, mas quando mais tarde tijolos semelhantes
foram vistos em França por Prince Metternich, este recolheu algumas amostras enviou-as para
serem ensaiadas no Instituto Politécnico Imperial de Viena. Depois de terem sido realizados
vários testes para determinação da sua resistência, foram testados em construção.
Grande parte dos tijolos furados, na primeira metade do século XIX, tinham a
desvantagem de resultarem de uma produção manual. A razão para se utilizarem estes tijolos,
mais leves, prendia-se com a diminuição do peso em arcos e cúpulas. As formas dos tijolos
partiram da forma rectangular inicial. Em 1843, foi patenteado o primeiro processo mecânico
de furar os tijolos. Só dois anos depois Robert Beart aperfeiçoou o sistema, tornado assim
possível produzir de um modo eficiente e económico tijolos furados. Deste modo, tijolos com
furos circulares ao longo da sua maior dimensão, começaram a ser usados na construção de
edifícios. Um francês, Henri Jules Borie, em 1848 obteve a patente de uma máquina
semelhante à de Beart, a qual foi exibida na Grande Exposição em 1851 e com ela recebeu
diversas medalhas.
A primeira ameaça ao domínio da alvenaria como solução estrutural ocorreu em
meados do século XIX, quando se iniciou a produção de vigas e pilares em ferro fundido. No
final deste século as técnicas de construção de edifícios altos já tinham eliminado a
necessidade de paredes de grande espessura nos pisos inferiores. No entanto, o colapso da
alvenaria como material estrutural iniciou-se no princípio do século XX, com a introdução de
regulamentos na Alemanha, França e Reino Unido para estruturas de betão armado. Este
material é durável, resistente, moldável e económico pelo que a utilização da alvenaria como
material estrutural foi fortemente abalada nos países mais desenvolvidos.

1.2. A ALVENARIA RESISTENTE E OS TERRAMOTOS


“As paredes grandes e pesadas, realizadas perpendicularmente e com boas fundações,
retornam ao seu lugar, sempre... e recebem menos danos sendo bem ligadas”8. Estas
observações preliminares de Pirro Ligorio no século XVI demonstram a preocupação da
segurança relativamente à acção dos sismos. Nomeadamente, é proposto um esquema ideal
Paulo B. Lourenço Introdução 1.11

para a construção anti-sísmica, ver Figura 1.14, em que se salienta a necessidade do


travamento entre elementos estruturais e do papel primordial nos arcos e abóbadas para
assegurar um comportamento dúctil da estrutura resistente.

Figura 1.14 – Alçado e planta da casa anti-sísmica proposta por Pirro Ligorio no manuscrito
“Remédios contra os terramotos para a segurança dos edifícios”, século XVI.

Os efeitos dos sismos sobre as estruturas, como sabemos hoje, dependem de inúmeros
factores e, frequentemente, são de interpretação difícil. Os danos podem ser atribuídos não
apenas à intensidade e as características dinâmicas do sismo mas também à localização do
edifício e às condições geológicas do local, a articulação estrutural e não-estrutural da
construção, à sua morfologia, ao tipo de fundações, aos materiais de construção, ao estado de
manutenção da construção, ao respeito pela regulamentação sísmica, etc.. As características
principais que garantiram a sobrevivência às acções sísmicas de inúmeras construções em
alvenaria até aos dias de hoje foram:
• A regularidade da forma e construção da estrutura, com a capacidade de resistir à
acção sísmica;
• O emprego adequado de materiais de construção, aptos a fornecer a resistência
necessária para resistir a acção sísmica.
Alguns exemplos da estabilidade de estruturas antigas em alvenaria com uma distribuição de
massa equilibrada e regularidade estrutural estão ilustrados na Figura 1.15. Um dos edifícios
mais antigos em alvenaria de tijolo sobreviventes, graças a uma configuração particularmente
regular, numa zona de intensa actividade sísmica, está ilustrado na Figura 1.16.
1.12 Capítulo 1 Introdução

(a) (b) (c) (d)


Figura 1.15 – Exemplos de estruturas com distribuição de massa e rigidez que permitiu a sua
sobrevivência até aos dias de hoje: (a) templo de Khons em Karnak (1198 a.C.),
(b) Panteão, Roma (120-124), (c) Igreja de São Lourenço, Milão (séc. V) e
(d) Igreja de Hripsime, Whagarshapat (1630-1638). Escalas de representação
diferentes.

Figura 1.16 – Pagode do tempo de Sung Yueh (Hunan, China), construído em 523 d.C..

Infelizmente, inúmeras estruturas não cumpriram as exigências descritas. Em Portugal,


em 1755, o tristemente célebre terramoto de Lisboa ilustrou os efeitos de um sismo de
intensidade elevada, ver Figura 1.17, e resultou numa forma de construção dúctil e “armada”
com elementos de madeira: a Gaiola Pombalina, ver Figura 1.18.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.13

(a)

(b) (c)
Figura 1.17 – Imagens da cidade de Lisboa após o terramoto de 1755: (a) o largo do Patriarcal
e o incêndio, (b) Basílica de Santa Maria e (c) Igreja de São Paulo.

(a) (b)
Figura 1.18 – Aspectos da Gaiola Pombalina: (a) perspectiva do extradorso das abóbadas do
rés-do-chão e das paredes do 1º andar e (b) aspecto de uma parede após
descasque do reboco.

Outras soluções para a melhoria da resposta à acção dos sismos das estruturas de
alvenaria foram propostas: tirantes e varões nas juntas (em ferro), ligadores, tijolos anti-
sísmicos com sistemas de cavilha, etc.. No entanto, a frequência, normalmente, reduzida da
1.14 Capítulo 1 Introdução

ocorrência de sismos num mesmo local, os conhecimentos técnico-científicos limitados, as


condicionantes económicos dos proprietários e a ausência de regulamentação conduziram à
repetição dos efeitos devastadores dos terramotos. No início do século três terramotos de
grande intensidade, ver Figura 1.19, contribuíram fortemente para a opinião empírica e
indiscriminada de que as alvenarias não resistem aos sismos, tendo as estruturas resistentes
sido substituídas por estruturas de aço e betão armado (materiais que possuem uma resistência
à tracção elevada).

(a) (b)

(c) (d)
Figura 1.19 – Imagens simbólicas de três grandes terramotos do início do século XIX: (a) São
Francisco (1906), (b, c) Messina (1908) e (d) Tóquio (1923).

A experiência dos últimos anos nos países mais desenvolvidos (Loma Prieta, EUA,
1989, Kobe, Japão, 1995, etc.) demonstra que estruturas recentes, construídas em diferentes
materiais (alvenaria, aço, betão armado, etc.) de acordo com a regulamentação em vigor,
podem sofrer danos importantes ou colapso devido a diferentes causas. A engenharia de
estruturas, a engenharia sísmica, a experiência adquirida com estas ocorrências bem como o
projecto, concepção, realização e fiscalização apropriados conduzirão num futuro próximo a
estruturas com a segurança e economia adequadas.
No entanto, a experiência tem demonstrado que, globalmente, a alvenaria não-armada
tem uma performance de fraca qualidade, quando sujeita a acções sísmicas. Deste modo a sua
utilização apenas deve ser considerada para edifícios de pequeno porte. Pelo contrário, a
alvenaria confinada e a alvenaria armada tem demonstrado um excelente comportamento em
relação às acções sísmicas9,10. Nos casos relatados nestas referências, as estruturas antigas
Paulo B. Lourenço Introdução 1.15

reforçadas de acordo com as disposições anto-sísmicas tiveram um comportamento muito


satisfatório.

1.3. A ALVENARIA RESISTENTE NO SÉCULO XX


De forma a tornar a alvenaria resistente competitiva nos países desenvolvidos, ela
deverá ser encarada não apenas como um material estrutural mas como uma solução
construtiva que contempla os aspectos estruturais, estéticos, acústicos, térmicos, de resistência
ao fogo e de impermeabilidade. A consideração simultânea dos aspectos estruturais,
construtivos e estéticos deveria conduzir a uma interacção dono-de-obra, arquitecto e
engenheiro. Infelizmente, o envolvimento destas três entidades nem sempre é fácil de
conseguir. Nesta secção serão apresentados alguns exemplos das possibilidades
arquitectónicas da alvenaria no século XX.
No Norte de Portugal, a cantaria de granito é muito tradicional e continua a ser
realizada com relativa pouca expressão. Conforme referido na Secção 1.1, a pedra natural é
um material de construção caro e pouco adequado aos dias de hoje, pelo que não será
considerada nesta secção. Infelizmente, as aplicações de qualquer outra alvenaria estrutural
em todo o país são praticamente inexistentes, ao contrário da mostra a seguir apresentada.
Em oposição ao verificado em Portugal, noutros países desenvolvidos a utilização da
alvenaria estrutural nos últimos decénios não sofreu um declínio tão grande e prolongado no
tempo. Depois dos altos e baixos da primeira metade do século, a partir da Segunda Grande
Guerra, a alvenaria estrutural soube adaptar-se às novas exigências tecnológicas e estéticas da
arquitectura contemporânea, mantendo uma posição no mercado. De uma forma simplista,
pode considerar-se que, no norte da Europa, as paredes compostas de tijolo à vista (solução
provavelmente determinada pela durabilidade do material) evoluíram para a parede dupla
resistente, enquanto que, no sul da Europa, as paredes de pedra evoluíram para paredes
rebocadas (provavelmente para melhor reflectirem a luz solar).

(a) (b)
Figura 1.20 – Representação esquemática da transição da alvenaria: (a) norte da Europa e (b)
sul da Europa.

Por outro lado, é de salientar que o uso de alvenaria resistente se desenvolveu também
em regiões onde tradicionalmente não era utilizada, ver Figura 1.21, enquanto que a utilização
de alvenaria armada surge com interesse crescente em países expostos a riscos sísmicos, ver
Figura 1.22. Em alguns países da Europa Ocidental foi ainda desenvolvido um sistema de
blocos de grandes dimensões com cerca de 1.0 m de comprimento, de forma a racionalizar a
construção, ver Figura 1.23.
1.16 Capítulo 1 Introdução

Planta do piso 1

Planta do piso 2

Figura 1.21 – A Suíça é um dos países em que a utilização da alvenaria cerâmica se


desenvolveu particularmente nos últimos decénios, ainda que o seu território
seja escasso em terrenos argilosos. A estrutura duplex com três pisos
representada foi realizada com blocos cerâmicos.

(a) (b)
Figura 1.22 – Nos Estados Unidos a utilização de paredes de alvenaria armada preenchida
com betão é corrente para edifícios de diferentes portes: (a,b) edifício de
habitação com quatro pisos, em construção com alvenaria armada de blocos de
betão e lajes pré-fabricadas, (c) hotel com doze pisos, realizado em alvenaria
armada com parede dupla em tijolos cerâmicos e (d) complexo com 28 pisos, em
construção com alvenaria armada da última geração (cont.).
Paulo B. Lourenço Introdução 1.17

(c) (d)
Figura 1.21 – Nos Estados Unidos a utilização de paredes de alvenaria armada preenchidas
com betão é corrente para edifícios de diferentes portes: (a,b) edifício de
habitação com quatro pisos, em construção com alvenaria armada de blocos de
betão e lajes pré-fabricadas, (c) hotel com doze pisos, realizado em alvenaria
armada com parede dupla em tijolos cerâmicos e (d) complexo com 28 pisos, em
construção com alvenaria armada da última geração.

Figura 1.23 – Desenvolvimento recente de maxi-blocos (com cerca de 1.0 m de comprimento)


em alguns países da Europa Ocidental para racionalizar a construção.

Um último aspecto a considerar na experiência estrangeira e com implicações notáveis


a nível de projecto e arquitectura é a possibilidade de utilizar alvenarias resistentes em
edifícios com estrutura mista, ver Figura 1.24. Em muitos países, a utilização da alvenaria é
limitado a apenas algumas partes do edifício, em geral, paredes de fachada, paredes de
contraventamento e núcleos internos rígidos, associados a outros sistemas construtivos,
tipicamente, estruturas reticuladas em betão armado ou aço, noutras partes da estrutura.
1.18 Capítulo 1 Introdução

Evidentemente, que esta possibilidade está dependente da existência de regulamentação


adequada, o que não representa a realidade da maior parte dos países, onde as normas sobre
estruturas em alvenaria são inexistentes ou muito recentes.

(a) (b)
Figura 1.24 – Exemplos de estruturas mistas com recurso a alvenaria resistente em França:
(a) complexo residencial (1986) com fachada em alvenaria velada por uma
cortina em betão armado que cria alguma ambiguidade de volume e
(b) complexo residencial (1987) com estrutura resistente em alvenaria cerâmica,
intercalada com caixas de escadas em estrutura reticulada de betão armado.

As técnicas construtivas em alvenaria são diferentes de um país para outro e recorrem


à utilização de materiais de natureza diferente, ainda que, com a excepção de situações
particulares, a troca de experiências e a transferência de tecnologia e conhecimento à escala
internacional mostrem alguma tendência para tornar os mercados mais homogéneos e
indiferenciados. No entanto, as tradições regionais, as dificuldades de certificação de alguns
produtos específicos, os custos de transporte, a transferência da tecnologia de produção e a
formação dos operários contribuem fortemente para dificultar esta tarefa de homogeneização.
O material mais utilizado nas paredes de alvenaria, em países desenvolvidos, é, geralmente, o
tijolo cerâmico, mas a utilização de blocos de betão também ocorre com frequência (seja em
blocos furados ou em blocos de betão celular). Em alguns países (Alemanha, Bélgica, Países
Baixos, Rússia), a utilização de blocos sílico-calcáreos é também corrente. Como facilmente
se comprova, a homogeneização não é tarefa fácil uma vez que se adoptam materiais
diferentes para as unidades de alvenaria. No limite, e para o mesmo tipo de material, a falta de
uniformização pode também ser considerável. Por exemplo, para o material mais utilizado –
as unidades de alvenaria cerâmicas – existem inúmeras configurações, ver Figura 1.25.

(a) (b) (c) (d)


Figura 1.25 – Representação esquemática de alguns tipos de unidades de alvenaria cerâmicas:
(a) tijolo maciço, (b,c) tijolos perfurados e (c) tijolo vazado.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.19

O tijolo maciço é a unidade de alvenaria cerâmica tradicional e, geralmente, apresenta


dimensões reduzidas. Os tijolos perfurados podem ser semelhantes aos tijolos maciços, com
uma percentagem de furação pequena (15-20%) para tornar o material mais leve e económico,
ou ser de maior dimensão e possuir um elevado número de furos de reduzida dimensão,
normalmente verticais. Finalmente, os tijolos vazados possuem, em geral, uma elevada
furação (normalmente horizontal) e são de dimensão elevada. A Figura 1.26 ilustra o
panorama europeu e a falta de harmonização referida, a todos os níveis.

Tijolo maciço
Tijolo perforado
Tijolo vazado

vazado

perforado

maciço

(a) 3
(b)
m / habitante

(c)
Figura 1.26 – Panorama Europeu da indústria de unidades de alvenaria cerâmicas: (a) mapa
de utilização, (b) percentagens nos diferentes países e (c) produção em 1992.

1.4. A SITUAÇÃO EM PORTUGAL


Actualmente o tipo de construção mais utilizada em Portugal são as estruturas
reticuladas de betão, e muito raramente de aço, preenchidas com paredes de alvenaria não
1.20 Capítulo 1 Introdução

resistente. No entanto, o número de edifícios nacionais em alvenaria é ainda muito


significativo, devido às construções antigas. Os dados obtidos a partir do III Recenseamento
Geral da Habitação, realizado em 1991 (CENSOS 91), pelo Instituto Nacional de Estatística11,
mostram os materiais utilizados na construção de edifícios em função do número de
pavimentos dos mesmos, ver Tabela 1.1.

Tabela 1.1 – Número de edifícios existentes em Portugal para os diferentes materiais de


construção, de acordo com o número de pavimentos
Principais Materiais Nº EDIFÍCIOS, EM FUNÇÃO DO Nº DE PAVIMENTOS
Usados na Construção Total Com 1 Com 2 . . . Com 5 Com 6 Com 7 ou mais %
Elem. Resistentes 2861502 1530513 1115155 21918 8822 15279 100
Betão Armado 916035 400656 384764 16095 6756 13106 32
Paredes resistentes s/
945762 571411 323644 4149 1589 1539 33
serem de betão armado
Pedra 881830 464626 386051 1369 421 562 30
Madeira 31800 20147 10355 73 46 12 1
Outros 86075 73673 10341 232 40 60 3
Paredes exteriores 2861502 1530513 1115155 21918 8822 15279 100
Alvenaria de tijolo 1428650 745328 544588 66711 6338 10941 50
Alven. blocos de betão 662216 321891 288238 31115 1870 3713 23
Pedra não aparelhada 588120 322248 246955 14305 393 415 20
Madeira 23383 16508 6258 401 18 25 0.8

Estima-se, para a realidade Portuguesa, que os trabalhos de alvenaria, incluindo os


respectivos rebocos, correspondam a cerca de 13 a 17 % do valor total da construção12. De
acordo com os valores revelados pelo INE13 para o ano de 1995, o volume anual de
construção de edifícios foi de 848 milhões de contos, do qual, correspondem às alvenarias
110 a 144 milhões de contos. Este valor só é ultrapassado pelas estruturas de betão. Ainda de
acordo com o mesmo estudo, no ano de 1995 foram gastos 7.5 milhões de contos na compra
de tijolos de barro vermelho, este valor representa um decréscimo de 0.4 % em relação ao ano
de 1994.
Paulo B. Lourenço Introdução 1.21

1.5. REFERÊNCIAS

1
Musgrove, J., Fletcher, B. (1987) – Sir Baninster Fletcher’s: A History of Architecture.
Butterworths, London, Reino Unido.
2
Davey, N. (1961) – A history of building materials. Phoenix House, London, Reino Unido.
3
Février, P.-A. (1985) – História do Mundo, Vol. 1. Verbo.
4
Perello, E.R., Port, J.R. (1973) – História Universal, Vol. 1. Alfa.
5
Dethier, J. (1982) – Down to Earth: Mud architecture, an old idea, a new future. Thames
and Hudson, London, Reino Unido.
6
Spencer, A.J. (1979) – Brick architecture in ancient Egypt. Aris & Philiphs, Warminster,
Reino Unido.
7
Elliot, C.D. (1992) – Technics and architecture: The development of materials and systems
of buildings. MIT Press, Cambridge, Massachusetts, Estados Unidos.
8
Ligorio, P. (sec. XVI) – Remédios contra terramotos para a segurança de edifícios, referido
em Latina, C. (1994) – Paredes resistentes em alvenaria: Tecnologia, Projecto,
Arquitectura (em italiano). Laterconsult, Roma, Itália.
9
The Masonry Society (1994) – Performance of masonry structures in the Northridge,
California, earthquake of January 17, 1994, EUA.
10
Oliveira, C.S., Lucas, A.R.A., Guedes, J.H.C. (1992), Dez anos após o sismo dos Açores
de 1 de Janeiro de 1980, SRHOP Açores e LNEC, Lisboa.
11
Instituto Nacional de Estatística (1991) – III Recensemento geral da habitação: CENSOS
91, Lisboa.
12
Bezelga, A.A. (1984) – Edifícios de habitação: Caracterização e estimação técnica-
económica, UTL-INCM, Lisboa.
13
Instituto Nacional de Estatística (1995) – Estatística da construção e obras públicas,
Lisboa.
Capítulo 2

2 A CONSTRUÇÃO EM ALVENARIA RESISTENTE

2.1. PRODUTOS PARA ALVENARIA


A inexistência de regulamentos e normas para alvenaria que disciplinem o
dimensionamento da alvenaria resistente para fins estruturais, à parte de outras motivações
tecnológicas e decisões arquitectónicas, constituiu de facto, até à poucos anos atrás, a razão
principal para limitar a sua utilização.
Os únicos critérios de dimensionamento aplicáveis até aqui eram de natureza
empírico-intuita e tinham origem na experiência adquirida ao longo do tempo, com base em
metodologias de cálculo aproximadas, num formato completamente desactualizado, e
fortemente penalizadoras do ponto de vista económico.
A consequência mais negativa da inexistência de regulamentos e normas era a
generalização que o projectista era forçado a fazer em face da multiplicidade das tipologias de
alvenaria resistente existentes, baseadas em materiais e aparelhos muito distintos. Esta
situação encontra-se agora profundamente alterada na generalidade dos países, com a entrada
em vigor de normas que regulamentam o projecto e a realização de edifícios em alvenaria
resistente. Em particular, as características tecnológicas e físico-mecânicas da alvenaria e dos
seus elementos construtivos foram oportunamente regulamentados a nível europeu, através do
Eurocódigo 6 – Projecto de Estruturas de Alvenaria – e o Eurocódigo 8 – Disposições para
Projecto de Estruturas Sismo-resistentes. Salienta-se que estes regulamentos apenas
consideram estruturas novas, permanecendo não regulamentados os aspectos relativos à
consolidação, reparação e reforço em zonas sísmicas (este aspecto é evidentemente da maior
importância para estruturas antigas em alvenaria, que representam parte substancial do
património edificado).
As novidades substanciais introduzidas pelos regulamentos e normas recentes são a
precisão das características tipológicas e a tecnologia dos elementos e dos materiais a utilizar
para a realização de uma alvenaria resistente, nomeadamente no que respeita à definição dos
requisitos mínimos de resistência e os critérios para a sua determinação, seja teórica ou
experimental. Os materiais permitidos para a realização de uma alvenaria resistente incluem
um leque vasto de alternativas. Uma primeira distinção deveria ser efectuada entre as
unidades de alvenaria naturais (essencialmente pedra) e artificiais (resultantes de uma
produção industrial específica). As unidades de alvenaria naturais podem ser de forma regular
ou irregular.
O Eurocódigo 6 estabelece uma base genérica para o projecto de edifícios e de obras
de construção em alvenaria simples, armada, pré-esforçada e confinada, executada com as
seguintes unidades de alvenaria de forma regular, assentes com argamassa de areia natural ou
britada, ou de inertes leves:
• unidades cerâmicas, incluindo unidades de cerâmica leve;
• unidades sílico-calcáreas;
• unidades de betão de inertes correntes ou leves;
• unidades de betão celular autoclavado;
2.2 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

• unidades de pedra artificial;


• unidades de pedra natural com forma regular.
As unidades de alvenaria artificiais podem ser dotadas de furos, seja na direcção
paralela ao plano de assentamento (furação horizontal), seja na direcção normal ao plano de
assentamento (furação vertical). Outras características significativas são o volume de furos ou
percentagem de furação, o volume de qualquer furo, a área de qualquer furo e a largura
equivalente (entendida como a espessura dos septos interiores e exteriores, medida
horizontalmente através da unidade de alvenaria e perpendicularmente à face da parede de
alvenaria resistente). Estas características dão lugar à classificação das unidades de alvenaria
de acordo com a Tabela 2.1. Na Figura 2.1 estão ilustrados exemplos de unidades de alvenaria
de diferentes grupos.

Tabela 2.1 – Requisitos para a classificação de unidades de alvenaria


Grupos de unidades de alvenaria
1 2a 2b 3
> 25-45 para > 45-55 para
unidades unidades de
Volume de cerâmicas argila
furos (% do
≤ 25 ≤ 70
volume total) > 25-50 para > 50-60 para
(ver nota 1) unidades de betão unidades de betão
de inertes de inertes
(ver nota 2)
≤ 12.5 para ≤ 12.5 para
Volume de unidades unidades
qualquer furo cerâmicas cerâmicas Limitado pela
(% do volume ≤ 12.5 área
≤ 25 para ≤ 25 para (ver abaixo)
total)
unidades de betão unidades de betão
de inertes de inertes
≤ 2800 mm2
excepto para
Área de Limitada pelo Limitada pelo Limitada pelo unidades de um
qualquer furo volume volume volume só furo, quando
(ver acima) (ver acima) (ver acima) este seja
≤ 18 000 mm2
Largura
equivalente
(% da largura ≥ 37.5 ≥ 30 ≥ 20 Sem exigências
total)
(ver nota 3)
Notas :
1. Os furos podem ser furos verticais através da unidade de alvenaria ou depressões ou rebaixos.
2. Se existir experiência nacional baseada em ensaios que confirme que a segurança da alvenaria
não é reduzida para limites inaceitáveis quando esta tem um proporção maior de furos, os limites
de 55% para as unidades cerâmicas e de 60% para as unidades de betão de inertes podem ser
aumentados para as unidades de alvenaria que são utilizadas no país com essa experiência
nacional.
3. A largura equivalente é a espessura dos septos interiores e exteriores, medida horizontalmente
através da unidade de alvenaria e perpendicularmente à face da parede de alvenaria resistente.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.3

Ligadores metálicos

Junta
longitudinal
contínua

(a) (b)

(c)
Figura 2.1 – Exemplos de aparelhos com unidades de alvenaria de (a) Grupo 1, (b) Grupo 2a e
Grupo 2b e (c) Grupo 3.

2.2. TIPOLOGIAS DAS PAREDES RESISTENTES


As paredes de um edifício devem ser consideradas parte integrante do sistema
estrutural ainda que contribuam de forma secundária para a sua estabilidade. No entanto, para
fins estruturais, uma parede apenas é considerada resistente quando é especificamente
destinada a suportar acções, permanentes ou variáveis, que actuem sobre o edifício. Uma
parede resistente deve resistir sempre a acções verticais, mas pode também ser dimensionada
para resistir a acções horizontais, quer actuem no seu próprio plano, quer actuem normais a
esse plano. Os elementos que constituem a parede devem ser capazes de garantir uma resposta
adequada aquelas acções em todos os pontos do edifício, sem prejuízo dos aspectos
arquitectónicos ou outros requisitos de natureza não-estrutural (isolamento térmico, acústico,
etc.).
2.4 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

A parede resistente de alvenaria é um componente estrutural contínuo vertical,


rectilíneo ou curvilíneo, constituído pela solidarização, por meio de um ligante (argamassa),
de um conjunto de elementos resistentes (unidades de alvenaria) e que podem integrar
elementos de reforço de outra natureza (varões metálicos, ligadores ou outros).
As unidades de alvenaria devem ser ligadas umas às outras por argamassa, adoptando
uma prática comprovada pela experiência e sobrepostas de forma desencontrada de modo a
que a parede funcione como um elemento estrutural único. De acordo com o Eurocódigo 6,
para garantir uma aderência adequada, as unidades de alvenaria devem sobrepor-se de uma
largura não inferior a 0.4 vezes a altura da unidade ou a 40 mm, tal como se ilustra na
Figura 2.2. Nos cantos de alvenaria ou nas ligações entre paredes perpendiculares, a
sobreposição das unidades de alvenaria não deve ser inferior à espessura das unidades.

Sobreposição ≥ 0.4 Um ou 40 mm

Figura 2.2 – Sobreposição das unidades de alvenaria.

As paredes de alvenaria podem ser diferentes em função das suas exigências


funcionais, dos requisitos estruturais, da posição assumida no interior da malha estrutural ou
do tipo de aparelho.
Em relação às exigências funcionais (ou aos fins a que se destinam) é possível
distinguir entre: paredes mestras (paredes principais), paredes de contraventamento (paredes
secundárias), paredes de contenção (muros de suporte), paredes em consola (muros),
parapeitos, etc., ver Figura 2.3.

1 Parede mestra
2 Parede de contraventamento
3 Sapata de fundação
4 Parede de contenção
5 Parede em consola
6 Parapeito

Figura 2.3 – Tipologia das paredes em função dos fins a que se destinam.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.5

Relativamente ao papel estrutural das paredes, as paredes são classificadas como


paredes resistentes, quando são dimensionadas para resistir essencialmente a acções verticais,
e paredes de contraventamento, quando são dimensionadas para resistir a acções horizontais
no seu próprio plano.
Relativamente à sua posição na malha estrutural do edifício, as paredes resistentes
podem ser exteriores, interiores, longitudinais, transversais ou celulares (bidireccionais).
A classificação introduzida no Eurocódigo 6 inclui o tipo de aparelho e outras
características, resultando nas tipologias ilustradas da Figura 2.4 à Figura 2.9.

Juntas
longitudinais

Figura 2.4 – Exemplos de secções transversais de paredes simples: (a) sem juntas
longitudinais e (b) com juntas longitudinais.

Figura 2.5 – Exemplos de secções transversais de paredes duplas.

Junta longitudinal
contínua

Figura 2.6 – Exemplo de secção transversal de uma parede composta.

Unidade de alvenaria Unidade de alvenaria


de face à vista de tardoz

Figura 2.7 – Exemplo de secção transversal de uma parede de face à vista.


2.6 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

Figura 2.8 – Exemplos de secções transversais de paredes com juntas descontínuas.

Estrutura da suporte

Parede-cortina

Figura 2.9 – Exemplo de secção transversal de uma parede-cortina.

Finalmente, importa distinguir entre alvenaria simples e alvenaria armada, ver


Figura 2.10. Recentemente também a alvenaria armada pré-esforçada tem conhecido algum
sucesso.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.7

Betão de Armadura assente


Argamassa ou betão
enchimento na argamassa
de enchimento

(a) Parede armada com blocos furados (b) Parede com armadura nas juntas verticais
e de assentamento
Betão de
enchimento Argamassa ou betão
de enchimento

(c) Parede com pilares embebidos (d) Parede com pilares embebidos resultantes
da forma de assentamento

Betão de Armadura assente


enchimento na argamassa

Betão de
enchimento

(e) Parede dupla preenchida (f) Unidade de alvenaria tipo (g) Armadura colocada nas juntas de
com betão viga assentamento de unidades de
alvenaria com entalhe
Armadura assente
na argamassa

(h) Unidades de alvenaria com armadura nas juntas de assentamento

Figura 2.10 – Exemplos de colocação de armaduras na alvenaria.

2.3. CONCEPÇÃO ESTRUTURAL


O processo de projectar um edifício em alvenaria estrutural apresenta algumas
particularidades em função dos aspectos tecnológicos e estruturais. A ligação entre estes
aspectos e o projecto é válida para qualquer técnica ou material construtivo mas, nos últimos
2.8 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

decénios, parece ter vingado uma cultura de projecto baseada na independência entre a
definição arquitectónica e a escolha de uma solução estrutural.
Na realidade, o mito da versatilidade e da liberdade de espaço oferecida por uma
estrutura reticulada consolidou uma prática em virtude da qual é praticamente possível
completar um projecto de arquitectura sem colocar o problema de como será resolvida a
estrutura do edifício. Esta prática parece resultar de uma radicalização cultural e académica
das faculdades de arquitectura, em que os aspectos tecnológicos e construtivos são
considerados de diminuta importância relativamente aos aspectos estéticos ou de forma. A
sectorização acentuada das actividades projectistas e fases de projecto impostas (ou aceites)
pelo mercado profissional confinaram a competência dos projectistas a papéis cada vez mais
especializados, com uma (inter)comunicação cada vez mais reduzida. A consequência mais
negativa desta racionalização do processo surge na elaboração dos projectos de execução e,
essencialmente, na fase de construção em que, na maior parte dos casos, é necessário proceder
à elaboração de alterações e variantes durante a realização da obra, cujo êxito final se traduz
geralmente num aumento de custos ou reviravoltas incongruentes do projecto original.
A elaboração adequada de um projecto deveria implicar o conhecimento, desde a fase
de concepção do edifício, das limitações impostas por qualquer técnica construtiva ou solução
estrutural. Apenas esta abordagem permite conseguir o objectivo duplo de utilizar de forma
óptima as características específicas de cada material e, simultaneamente, moldar a estrutura à
arquitectura do edifício. Isto é particularmente necessário em estruturas de alvenaria
resistente, para os quais a definição de um esquema estrutural representa um elemento
informativo essencial à composição arquitectónica desde a fase inicial de projecto.
A decisão de utilizar uma solução estrutural em alvenaria resistente deverá sempre ser
tomada à partida (com o início do projecto de arquitectura). Excepto em casos particulares, a
opção por uma estrutura em alvenaria resistente após a configuração geral do edifício ou o
projecto de arquitectura estarem definidos conduz quase sempre a modificações e alterações
na distribuição dos espaços, tanto mais sensíveis quanto a arquitectura tenha sido concebida
independentemente da definição de qualquer solução estrutural.
A nível de estudo prévio a definição, pode limitar-se unicamente a uma opção
genérica por alvenaria resistente como sistema estrutural. No entanto, e se possível, é
oportuno indicar a título indicativo a tipologia da alvenaria, as unidades que a constituem
(naturais ou artificiais, tijolo cerâmico ou blocos, etc.) e o eventual aparelho. Esta antecipação
pode ser particularmente oportuna uma vez que a escolha de diferentes tipos de alvenaria irá
resultar em larguras diferentes para as paredes. No entanto, a sua omissão não é
particularmente grave uma vez que a realização do projecto de execução com base num tipo
específico de alvenaria não conduz, em geral, a alterações substanciais.

2.3.1. SELECÇÃO DO TIPO DE PAREDES RESISTENTES


Contrariamente ao que se poderia pensar, a escolha da tipologia das paredes
resistentes depende apenas parcialmente de considerações de natureza estrutural. Os
principais factores que influenciam esta escolha ao nível de estudo prévio são:
• as exigências geométricas mínimas na espessura de alvenaria, para os diferentes
tipos de elementos resistentes adoptados;
• as diversas exigências de configuração para alvenaria simples, alvenaria confinada
e alvenaria armada, nas zonas sísmicas;
• a limitação do número de pisos máximos para os diversos tipos de alvenaria
resistente, nas zonas sísmicas;
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.9

• a utilização de métodos de dimensionamento simples, que impõem limitações na


configuração, por oposição a métodos de cálculo tradicionais, tipicamente mais
complexos;
• as características tipológicas do edifício que constituem dados de projecto:
utilização prevista, número de pisos, modularidade, complexidade da distribuição
de cargas, etc.
Outros factores essenciais, de natureza estrutural, são, obviamente, o esquema
resistente adoptado e a organização da malha estrutural, considerados normalmente apenas a
nível de projecto-base ou projecto de execução.
Adicionalmente, existem outros factores, de natureza não-estrutural, que podem
condicionar a escolha da tipologia da alvenaria: custo da construção, estética (em paredes
com face à vista), exigências funcionais de térmica, acústica e impermeabilidade, exigências
de segurança e durabilidade, recurso a elementos construtivos especiais para arcos, cúpulas,
etc..

2.3.2. CARACTERÍSTICAS TIPOLÓGICAS


A principal característica tipológica de um edifício em alvenaria resistente é a
presença de elementos verticais contínuos, geralmente rectilíneos, constituídos por septos de
alvenaria destinados a resistir às acções que actuam sobre o edifício, ligados em cada piso a
um sistema de elementos horizontais que transmitem acções verticais e distribuem as acções
horizontais. Desta forma, um edifício em alvenaria resistente deve ser concebido como
formando um sistema integrado e tridimensional de elementos resistentes: a regra-base que
governa a génesis da sua configuração é a associação coerente de um sistema de volumes de
forma (essencialmente) cúbica. Tendo em conta a flexibilidade de projecto, à primeira vista,
este aspecto pode parecer muito limitativo mas isso não é correcto, uma vez que um volume
não ocorre de forma isolada. Na prática, apenas é necessário, desde a fase inicial de projecto,
basear prioritariamente as fronteiras (estruturais e arquitectónicas) numa grelha dimensional
que será utilizada para articular os elementos estruturais em planta e alçado. Desta forma, a
diferença essencial principal entre uma estrutura reticulada e o edifício em alvenaria resistente
é a criação de módulos estruturais que constituem uma primeira hipótese de integração de
divisões adicionais do espaço, delimitadas por margens contínuas que representam o
posicionamento dos elementos estruturais verticais. Estes módulos estruturais podem
apresentar vantagens significativas de dimensionamento, nomeadamente no que respeita a
espessuras e comportamento direccional das lajes.
Salienta-se que uma regra de projecto geral consiste em evitar pretender obter uma
definição completa das divisões do edifício para definir posteriormente quais as fronteiras
(paredes resistentes) que delimitam os vários módulos estruturais. Em vez disso, é necessário
prever uma fase intermédia de organização e compartimentação do espaço após a
individualização preliminar dos módulos estruturais.
A dimensão dos módulos estruturais depende de vários factores, nomeadamente, do
vão que se prevê possível e económico para as lajes e das dimensões máximas que se
pretendem para as divisões do espaço. Na experiência histórica da alvenaria resistente, a
distribuição em planta dos elementos estruturais coincidia com a fronteira das divisões (ou
seja com todas as paredes). Presentemente, uma solução deste género apenas é admissível em
casos específicos de divisões particularmente grandes, como salas, garagens, depósitos, etc.),
enquanto que, normalmente, os módulos estruturais que se definem apresentam em geral uma
compartimentação interna, realizada com um sistema de paredes divisórios não-resistentes.
O próprio conceito de tridimensionalidade não deve ser interpretado de forma redutora
e não deve fazer esquecer que um módulo estrutural pode também assumir uma forma não
2.10 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

paralelipipédica. Com a ressalva da continuidade vertical das paredes de alvenaria, a


configuração dos módulos estruturais em planta pode também assumir forma diferentes da
forma quadrada ou rectangular, ver Figura 2.11.

Figura 2.11 – Torre-escada da recolha de autocarros de Norbiton, Londres, Reino Unido


(1984).

2.4. CLASSIFICAÇÃO TOPOLÓGICA


A complexidade da morfologia de um edifício depende de uma série de factores que
podem ser associados na noção de configuração do edifício, entendida como:
• forma, dimensão e articulação do edifício;
• natureza, dimensão e posição dos elementos estruturais;
• natureza, dimensão e posição dos elementos não-estruturais.
Ao contrário do que se poderia pensar não existe uma relação biunívoca entre
configuração do edifício e sistema estrutural, ainda que subsistam aspectos específicos que
levam a privilegiar a utilização de determinados sistemas estruturais para uma dada
configuração do edifício.
A configuração do edifício tem origem em inúmeros factores como, por exemplo, a
utilização prevista do edifício, a área de terreno disponível, o volume de construção e número
de pisos permitidos, a morfologia do terreno, a natureza do terreno, a relação com o
património edificado existente, as acções que actuam sobre o edifício, etc..
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.11

2.4.1. FORMA E DIMENSÕES


De um ponto de vista geométrico, a morfologia de um edifício em alvenaria resistente
pode ser classificada com respeito à sua forma e às suas dimensões. Não é legítimo pensar que
uma configuração que é aplicável a um edifício de pequenas dimensões é válida para um
edifício de grandes dimensões, seja em planta, seja em alçado. Uma forma possível de
classificação da configuração dos edifícios é a seguinte†, ver :
• planta e alçado simples;
• planta complexa e alçado simples;
• planta simples e alçado complexo;
• planta e alçado complexos.

Planta simples Planta complexa


Plano
horizontal

Plano vertical Planta simples Planta complexa

Alçado simples Alçado complexo


Alçado simples

Alçado

Figura 2.12 – Morfologia simples e complexa.

Dois requisitos principais de configuração que deve observar um edifício em alvenaria


são o da regularidade e o da continuidade física das paredes resistentes. O princípio da
continuidade é particularmente restritivo no que respeita ao desenvolvimento em altura,
enquanto que não coloca restrições significativas ao desenvolvimento em planta. No entanto,
as morfologias complexas são possíveis, desde que seja cumprido o princípio da continuidade
vertical das paredes resistentes. Os volumes dos edifícios salientes podem representam um
caso à parte, uma vez que a excentricidade das cargas deverá ser limitada.
No que respeita às dimensões absolutas do edifício não existem indicações precisas.
Um critério de controlo consiste na verificação das relações entre a dimensão mínima e a
dimensão máxima, em planta, e entre a dimensão mínima em planta e a altura do edifício, ver
Figura 2.13.


Para este efeito, entende-se como simples uma superfície convexa e como complexa uma superfície concava.
2.12 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

A A 1

B 5
H
B
A

B A A 1

A 1 H 2
A ≥
B 5
B

B
A1
B A
H
A 1 A2

B 5 A1 1
A1 B1 B2 A1 ≥
A B1 1
≥ H 2
A 5
A2 A1 1

B1 B2 B 5

Figura 2.13 – Condicionantes geométricas aconselhadas para edifícios em alvenaria


resistente.

2.4.2. ORGANIZAÇÃO DA MALHA ESTRUTURAL


A definição dos módulos estruturais, com base nos quais irá ser realizada a
compartimentação da edifício, representa uma fase do projecto particularmente importante,
em que se criam as fronteiras geométricas e físicas que determinam a morfologia complexa. A
organização da malha estrutural pode ser analisada em detalhe considerando distintamente a
articulação em planta e alçado.
A forma e as dimensões em planta de um módulo estrutural elementar são
determinadas essencialmente pelo modo de flexão dominante das lajes, o número e a
dimensão das divisões que deverá conter, bem como o vão económico das lajes a adoptar. Os
modos de flexão dominante das lajes são essencialmente dois: unidireccional e bidireccional.
O primeiro caso é preferencialmente adequada a lajes rectangulares mas pode também ser
utilizado para lajes quadradas, ver Figura 2.14. A utilização de lajes unidireccionais conduz,
geralmente, a um sistema em que as paredes resistentes e as paredes de contraventamento
estão individualizadas. As primeiras resistem às acções verticais e as segundas servem para
evitar a instabilidade do edifício (e eventualmente para resistir a acções horizontais). A
utilização de lajes bidireccionais implica que todas as paredes assumem, simultaneamente,
funções resistentes e de contraventamento.
A orientação das lajes conduz a esquemas principais de articulação da malha estrutural
tipificados na Figura 2.15. Do ponto de vista estritamente formal não existem inconvenientes
significativos em tratar os diferentes módulos que constituem uma estrutura de forma
praticamente independente, nomeadamente no que respeita à orientação das lajes e espessura
das mesmas, conduzindo a uma máxima economia dos materiais. Em muitos casos, os
módulos estruturais não possuirão forma regular sendo possível, com algum engenho,
procurar essa mesma economia, ver Figura 2.16 como exemplo.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.13

A associação de módulos estruturais conduzirá à planta geral do edifício, função dos


limites e condicionantes arquitectónicos. A Figura 2.17 ilustra exemplos destas associações.

Muro de contraventamento
Figura 2.14 – Modo de flexão dominante em lajes, em função da relação entre as dimensões
em planta do módulo estrutural.

(a) (c)

(b) (d)
Figura 2.15 – Esquemas principais de articulação da malha estrutural: (a) malha longitudinal,
(b) malha transversal, (c) malha bidireccional com células abertas e (d) malha
bidireccional com células fechadas.

(a)

(b)

(c)

Divisória
2.14 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

Figura 2.16 – Optimização da altura das lajes para módulos estruturais abertos: (a) solução
óptima com desnível evidente da laje, (b) solução real com desperdício de
material e (c) solução óptima com divisória colocada sob o degrau.

(a) (b)

(c) (d)
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.15

Figura 2.17 – Variações de topologia em planta com módulos estruturais de: (a) paredes
resistentes longitudinais, (b) paredes resistentes transversais, (c) células abertas
e (d) células fechadas.
Finalmente, é oportuno sublinhar que a adopção de esquemas estruturais com paredes
resistentes apenas numa direcção, apenas pode ser privilegiada em edifícios baixos (um ou
dois pisos, no máximo). No caso de edifícios com um número mais elevado de pisos, qualquer
que seja a dimensão permitida para a malha estrutural, é preferível que a orientação das lajes
seja alternada de um piso para o outro, ver Figura 2.18. Desta forma, todas as paredes do
módulo estrutural assumem, na sua continuidade vertical, alternativamente o papel de paredes
resistentes e paredes de contraventamento. Esta alternância de papéis de um piso para outro
possui ainda a vantagem da carga vertical se repartir da mesma forma por todas as paredes,
permitindo a utilização de lajes com orientação unidireccional.

(a) (b)
Figura 2.18 – Orientação alternada das lajes num edifício com vários pisos: (a) piso n e
(b) piso n - 1 e n +1.

2.4.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÃO


Na secção anterior discutiu-se a relação entre alvenaria estrutural e a configuração do
edifício. Para o dimensionamento dos módulos estruturais, em teoria não existem limitações
significativas para os vãos das lajes que possam ser utilizadas para edifícios residenciais.
Neste sentido, uma situação limite pode ser representada por uma malha constituída por um
único módulo estrutural, a planta “liberta”, apenas com paredes exteriores resistentes, ver
Figura 2.19a. Esta configuração, que possui a vantagem da máxima flexibilidade interna para
divisões, é limitada geralmente pela altura e/ou custo das lajes necessárias para vencer
grandes vãos e conduz à concentração das acções verticais sobre uma quantidade limitada de
paredes, em termos de número e de área, resultando em paredes de elevada espessura.
Para edifícios de habitação, recorrendo a soluções habituais para as lajes, o seu vão
máximo está limitado a cerca de 7.0-7.5 m por razões de peso, deformação e economia, uma
dimensão que permite uma margem ampla de flexibilidade em planta. Para configurações em
planta que apresentem dimensões complexas superiores a 7.0 m dever-se-á prever uma
articulação da malha estrutural em diversos módulos, recorrendo a paredes resistentes
intermédias, ver Figura 2.19b. Uma planta articulada em diversos módulos estruturais permite
uma distribuição apropriadas das acções verticais por um número maior de paredes, com
vantagem para o dimensionamento e a verificação da segurança estrutural. Na definição dos
vãos das lajes é preferível (ainda que nem sempre possível) manter alguma consistência
dimensional, evitando utilizar vãos muito diferentes que resultem em lajes com espessuras
muito diferentes de um módulo para outro.
2.16 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

Piso térreo

Paredes resistentes
Piso térreo Paredes de contraventamento
(a) (b)
Figura 2.19 – Exemplos de compartimentação interna de um módulo estrutural: (a) habitação
de dois pisos com planta articulada num único módulo estrutural e (b) edifício
em banda com três módulos estruturais e possíveis variações em planta.

A definição dos módulos numa fase preliminar do projecto pode ser adoptada para o
controlo das dimensões das paredes em planta e alçado, de forma a retirar o máximo proveito
da modularidade de construção em alvenaria, evitando ao máximo os cortes das unidades
elementares, ver Figura 2.20. Isto é particularmente essencialmente no caso de paredes de
face à vista.
De seguida, apresentam-se as plantas estruturais de alguns edifícios realizados em
Itália, ver Figura 2.21, e Reino Unido, ver Figura 2.22, com estrutura em alvenaria resistente.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.17

Figura 2.20 – Critério de coordenação dimensional numa parede com face à vista.
2.18 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

Figura 2.21 – Exemplos de projectos italianos em alvenaria estrutural.


Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.19

Figura 2.22 – Exemplos da malha estrutural de projectos ingleses em alvenaria estrutural.


2.20 Capítulo 2 Construção em Alvenaria Resistente

Ref sísmicas1,2. anto-sísmicas tiveram um comportamento muito satisfatório.

2.5. ASPECTOS TECNOLÓGICOS E CONSTRUTIVOS


Na secção 2.4, discutiram-se os aspectos de concepção deverá ser encarada não apenas
como um material estrutural mas como uma solução construtiva que contempla os aspectos
estruturais, estéticos, acústicos, térmicos, de resistência ao fogo e de impermeabilidade. A
consideração simultânea dos aspectos estruturais, construtivos e estéticos deveria conduzir a
uma interacção dono-de-obra, arquitecto e engenheiro. Infelizmente, o envolvimento destas
três entidades nem sempre é fácil de conseguir. Nesta secção serão apresentados alguns
exemplos das possibilidades arquitectónicas da alvenaria no século XX.
Paulo B. Lourenço Construção em Alvenaria Resistente 2.21

2.6. REFERÊNCIAS

1
The Masonry Society (1994) – Performance of masonry structures in the Northridge,
California, earthquake of January 17, 1994, EUA.
2
Oliveira, C.S., Lucas, A.R.A., Guedes, J.H.C. (1992), Dez anos após o sismo dos Açores
de 1 de Janeiro de 1980, SRHOP Açores e LNEC, Lisboa.
Capítulo 3

3 DIMENSIONAMENTO DE ESTRUTURAS DE ALVENARIA

3.1. INTRODUÇÃO
A Comissão das Comunidades Europeias (CCE) iniciou o trabalho de elaborar um
conjunto de regras técnicas harmonizadas para o projecto de edifícios e obras de construção
que serviriam inicialmente como alternativa para as regras em vigor nos diferentes Estados
Membros e que posteriormente as substituiriam. Estas regras técnicas tornaram-se conhecidas
como os “Eurocódigos Estruturais”.
Está a ser desenvolvido trabalho nos seguintes Eurocódigos Estruturais, cada um dos
quais contendo um certo número de partes:
EN 1991 Eurocódigo 1 : Bases de Projecto e Acções em Estruturas.
EN 1992 Eurocódigo 2 : Projecto de Estruturas de Betão.
EN 1993 Eurocódigo 3 : Projecto de Estruturas de Aço.
EN 1994 Eurocódigo 4 : Projecto de Estruturas Mistas de Aço-Betão.
EN 1995 Eurocódigo 5 : Projecto de Estruturas de Madeira.
EN 1996 Eurocódigo 6 : Projecto de Estruturas de Alvenaria.
EN 1997 Eurocódigo 7 : Projecto Geotécnico.
EN 1998 Eurocódigo 8 : Disposições para Projecto de Estruturas Sismo-
resistentes.
EN 1999 Eurocódigo 9 : Projecto de Estruturas de Alumínio.
A ENV 1996-1-1, Projecto de Estruturas de Alvenaria, compreende os seguintes
Capítulos:
Capítulo 1 - Generalidades.
Capítulo 2 - Bases de projecto.
Capítulo 3 - Materiais.
Capítulo 4 - Dimensionamento da alvenaria.
Capítulo 5 - Disposições construtivas.
Capítulo 6 - Execução.
As outras partes previstas (o documento encontra-se apresentemente em fase de
revisão) incluem:
Parte 1-2 : Projecto de estruturas sujeitas à acção do fogo.
Parte 1-3 : Regras pormenorizadas para acções laterais.
Parte 1-X : Secções de forma complexa em estruturas de alvenaria.
Parte 2 : Projecto, selecção de materiais e execução de alvenaria.
Parte 3 : Regras simplificadas e regras simples para estruturas de alvenaria.
Parte 4 : Construções menos exigentes em termos de fiabilidade e durabilidade.
3.2 Capítulo 3 Dimensionamento

3.1.1. DOCUMENTOS NORMATIVOS DE REFERÊNCIA


A aplicação do Eurocódigo 6 deve ter em consideração os documentos normativos que
se indicam a seguir.

3.1.1.1. UNIDADES PARA ALVENARIA


pr EN 771-1: 199x – Especificação para unidades de alvenaria cerâmicas
pr EN 771-2: 199x – Especificação para unidades de alvenaria silico-calcáreas
pr EN 771-3: 199x – Especificação para unidades de alvenaria de betão de inertes
pr EN 771-4: 199x – Especificação para unidades de alvenaria de betão celular
autoclavado
pr EN 771-5: 199x – Especificação para unidades de alvenaria de pedra artificial
pr EN 771-6: 199x – Especificação para unidades de alvenaria de pedra natural
pr EN 772-1: 199x – Método para ensaio de unidades de alvenaria: Determinação
da resistência à compressão

3.1.1.2. ARGAMASSA PARA ALVENARIA

pr EN 988-2: 199x – Especificação para argamassa para alvenaria


pr EN 1015-11: 199x – Método para ensaio de argamassa: Determinação da
resistência à compressão e à flexão de argamassa endurecida

3.1.1.3. BETÃO
NP ENV 206 – Betão. Comportamento, produção, colocação e critérios de
conformidade

3.1.1.4. AÇOS PARA ARMADURAS ORDINÁRIAS

Documentos de Classificação do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC)

3.1.1.5. AÇOS PARA PRÉ-ESFORÇO

Documentos de Classificação do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC)

3.1.1.6. ALVENARIA
pr EN 1052-1: 199x – Método para ensaios de alvenaria: Determinação da
resistência à compressão
pr EN 1052-2: 199x – Método para ensaios de alvenaria: Determinação da
resistência à flexão
pr EN 1052-3: 199x – Método para ensaios de alvenaria: Determinação da
resistência inicial ao corte
pr EN 1052-4: 199x – Método para ensaios de alvenaria: Determinação da
resistência ao corte incluindo barreira de estanquidade
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.3

3.2. BASES DE PROJECTO

3.2.1. SEGURANÇA E ACÇÕES


Até à aprovação do Eurocódigo 1 como norma europeia, para efeitos de segurança e
acções, recomenda-se a utilização do Regulamento de Segurança e Acções (RSA) nacional.
De acordo com as disposições do Eurocódigo 1 e, tal como permitido pelo RSA, sugere-se a
com substituição do coeficiente de majoração das acções permanentes γG = 1.5 por γM = 1.35.

3.2.2. PROPRIEDADES DOS MATERIAIS


Os valores característicos da resistência dos materiais são definidos,
preferencialmente, como valores que têm a probabilidade de ser igualados ou ultrapassados
em 95% dos casos. O valor característico definido no Eurocódigo 6 é o valor definido
habitulamente, correspondendo ao quantil dos 5% da distribuição de resistências. Salienta-se
que este valor pode ser obtido a partir de resultados de ensaios específicos, a partir da
avaliação de resultados de ensaios existentes ou de outros valores especificados. No entanto, a
resistência característica pode também ser definida com um valor representativo quando não
existem dados sufucientes para obter o valor característico numa base estatística rigorosa.
A utilização dos factores parciais de segurança γM permite transformar os valores
característicos em valores de cálculo.
Para a resistência da alvenaria, o factor parcial de segurança γM depende da categoria
de controle de fabrico das unidades para alvenaria e da categoria de execução da alvenaria.
O Eurocódigo 6 considera três categorias de execução (A,B e C). O DNA português considera
apenas uma categoria de execução, a que correspondem os factores de segurança parciais
indicados na Tabela 3.1, para as resistências da alvenaria (compressão, flexão, corte), para a
amarração e resistências (compressão e tracção) dos ligadores e para a aderência e
resistências (tracção e compressão) dos varões da armadura. Salienta-se que, de acordo com o
Eurocódigo 1, a acção dos sismos é classificada como acção de acidente.

Tabela 3.1 – Coeficiente de minoração da resistência dos materiais γM


γM Estados limites Estabilidade sob
últimos acções de acidente
Alvenaria e betão de enchimento 2.5 1.5
Amarração e resistência dos ligadores 2.5 1.5
Aderência dos varões das armaduras 2.5 1.5
Aços das armaduras 1.15 1.0

Nota: O DNA exige que, nos fornecimentos de unidades de alvenaria, estas deverão ser
acompanhadas por uma declaração do fabricante com a indicação da respectiva classe
de resistência, suportada por resultados de ensaios recentes.

3.2.3. ESTABILIDADE E ROBUSTEZ


O Eurocódigo 6 exige que a estrutura seja estável e robusta para as condições de
utilização normal e, adicionalmente, seja concebida de tal forma que não seja danificada por
ocorrências como explosões, choques ou efeitos de erros humanos, de forma
desproporcionada à causa.
3.4 Capítulo 3 Dimensionamento

O projectista responsável pela estabilidade global da estrutura deverá assegurar que o


dimensionamento e a pormenorização de todos os elementos e componentes da construção
são compatíveis com a concepção original, e que a sua responsabilidade não é diluída em
consequência do dimensionamento e pormenorização ser efectuado por mais que um
engenheiro.
Os requesitos de estabilidade e robustez deverão conduzir a uma estrutura
convenientemente contraventada em função do seu desenvolvimento em planta e altura, e em
função da interacção dos elementos de alvenaria com os outros elementos estruturais. O
possível efeito de imperfeições na construção deverá ser tido em conta, admitindo o valor de
1 /(100 htot ) radianos para a inclinação da estrutura em relação à vertical, onde htot é a altura
total da estrutura em metros. O efeito desta inclinação pode ser simulado convenientemente
através de um sistema de forças horizontais Hi, aplicadas em cada laje, dado por

0.01N i
Hi = . (3.1)
htot

Nesta equação Ni representa o valor de combinação das acções verticais características


correspondentes ao nível da laje em causa onde está aplicada Hi (i.e. Ni não pretende ser o
somatório de todas as acções verticais que actuam acima da laje em análise).
Ainda que o Eurocódigo 6 não indique se o efeito das imperfeições de construção
deve ser considerado em conjunto com outras acções horizontais, recomenda-se que o
projectista considere que estas acções não actuam simultaneamente na estrutura e que as
imperfeições da construção sejam ignoradas, se os seus efeitos forem menos desfavoráveis
que os efeitos das outras acções horizontais, por exemplo vento ou sismo. Salienta-se que
estas exigências se aplicam apenas à estabilidade e robustez da estrutura como um todo.
Imperfeições geométricas em elementos individuais são consideradas de forma independente
nas cláusulas respectivas.

3.3. MATERIAIS

3.3.1. UNIDADES PARA ALVENARIA

3.3.1.1. TIPOS DE UNIDADES


Todas as unidades para alvenaria devem ser fabricadas de acordo com a parte
aplicável da EN 771, ver Secção 3.1.1.1. Adicionalmente, as unidades para alvenaria estão
agrupadas de acordo com os vazios ou a furação. De uma forma geral, unidades com uma
percentagem de furação não superior a 25% são classificadas como unidades do Grupo 1.
Unidades com uma percentagem de furação entre 25 e 70% são classificadas como unidades
dos Grupos 2a, 2b ou 3. O DNA exige que a percentagem de furação não exceda os 60% e os
septos exteriores possuam uma espessura mínima de 10 mm. O tijolo cerâmico vazado
corrente em Portugal não cumpre, em geral, as condições para ser classificado como
pertencendo ao Grupo 3, pelo que a sua utilização como alvenaria resistente não é permitida.
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.5

3.3.1.2. RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO

Devido à grande quantidade de tipos e tamanhos diferentes das unidades para


alvenaria existentes na Europa, e às diferentes formas de ensaio, a resistência à compressão
ensaiada tem de ser normalizada para tomar em consideração a forma das unidades e as
condicionantes de ensaio. A resistência normalizada à compressão das unidades para
alvenaria fb, utilizada para a determinação da resistência característica da alvenaria, representa
a resistência à compressão de um cubo de 100 mm de aresta do material da unidade em
condições de seco ao ar. Em geral, a resistência normalizada à compressão de qualquer
unidade para alvenaria pode ser obtida a partir da expressão

f b = m c × (valor declarado de resistência à compressão pelo fabricante) × δ , (3.2)

em que mc é o factor de ajuste em função da humidade e δ é o factor de forma. As unidades


para alvenaria poderão ser ensaiadas em condições de seco ao ar ou em condições saturadas.
O fabricante deverá fornecer sempre os resultados obtidos directamente nos ensaios,
indicando as condições em que se realizou o mesmo. No caso da resistência ser obtida em
condições saturadas, o factor de conversão para condições de seco ao ar pode admitir-se
mc = 1.2. No caso dos ensaios serem realizados em condições de seco ao ar, tal como definido
na parte aplicável da EN 771, então o factor de conversão não é necessário (i.e. mc = 1.0).
Em geral, as unidades para alvenarias serão ensaiadas inteiras mas, em alguns casos,
poderá ser necessário proceder ao corte ou à extracção de cubos da unidade inicial. A Tabela
3.2 apresenta o factor de forma δ que deve ser utilizado para afectar a resistência à
compressão da unidade ensaiada. Por exemplo para tijolos com 300 × 200 × 70 mm3 deve
adoptar-se o valor de

70 − 50
δ = 1.45 − (1.45 − 1.35) = 1.41 (3.3)
100 − 50

Tabela 3.2 – Valores do coeficiente de forma δ


Altura da unidade Menor dimensão horizontal da unidade de alvenaria (mm)
de alvenaria (mm) 50 100 150 200 ≥ 250
50 0.85 0.75 0.70 - -
65 0.95 0.85 0.75 0.70 0.65
100 1.15 1.00 0.90 0.80 0.75
150 1.30 1.20 1.10 1.00 0,95
200 1.45 1.35 1.25 1.15 1,10
250 ou maior 1.55 1.45 1.35 1.25 1.15
Nota : Pode-se efectuar uma interpolação linear.

Em relação à especificação de projecto, caso o projectista não conheça ou não


necessite de especificar a forma, tipo ou Grupo da unidades para alvenaria, deverá
recomendar-se apenas a resistência normalizada. No caso do projectista necessitar de
especificar a forma da unidade (por exemplo para definir o aparelho da alvenaria) ou o tipo da
unidade (por razões estéticas ou arquitectónicas), então deverá especificar-se também a
resistência à compressão das unidades medida directamente ou a resistência normalizada à
compressão associada à forma, tamanho e material das unidades.
3.6 Capítulo 3 Dimensionamento

Tal como referido no Capítulo 2, o Eurocódigo 6 é aplicável apenas a unidades de


pedra artificial e pedra natural com forma regular. Por razões estéticas ou arquitectónicas, a
alvenaria de pedra é muitas vezes construída com unidades que possuem geometria diferente.
Em princípio, todas estas unidades deveriam possuir a mesma resistência normalizada à
compressão. No entanto, devido ao método de cálculo (com factores de conversão tabelados),
poderão obter-se pequenas variações nas resistências normalizadas à compressão. Para acções
verticais, o dimensionamento será conservativo se se admitir que a parede é construída
inteiramente com as unidades de alvenaria que conduzem ao valor mínimo da resistência
normalizada à compressão. Na prática, recomenda-se a utilização de cubos de aresta não
inferior a 100 mm para obter o valor da resistência normalizada à compressão.

3.3.2. ARGAMASSA
O cimento e a cal hidráulica a utilizar na argamassa deverão cumprir os requisitos do
Regulamento de Betões e Ligantes Hidráulicas, até aprovação das normas europeias
respectivas.
A argamassa pode ser especificada através da resistência ou das proporções dos
constituintes. Quando a argamassa for especificada através da resistência, a resistência à
compressão em MPa deve seguir a letra M. Por exemplo M4 representa uma argamassa com
4 MPa de resistência à compressão. A Tabela 3.3 apresenta uma lista de resistências para
proporções correntes dos constituintes da argamassa. As argamassas pronta e pré-doseada
devem observar a EN 998-2.

Tabela 3.3 – Relação entre traços correntes de argamassa e a classe de resistência


Proporções dos constituintes Resistência à Classe do
cimento:cal:areia cimento:areia cimento:areia compressão Eurocódigo 6
com plastificante (MPa)
1: ¼:3 -- -- 12 M12
1:½:4½ 1:2½ a 3½ 1:3 a 4 6 M6
1:1:6 1:4 a 5 1:5 a 6 4 M4
1:2:9 1:5½ a 6½ 1:7 a 8 2 M2

Em geral, a argamassa deverá ser de classe M2 ou superior para alvenaria simples, de


classe M4 ou superior para alvenaria com armadura nas juntas e de classe M6 ou superior
para alvenaria com armadura vertical ou alvenaria pré-esforçada. A argamassa leve e a
argamassa-cola devem ser de classe M5 ou superior.
Disposições relativas à durabilidade das argamassas serão contempladas na ENV
1996-2.

3.3.3. BETÃO DE ENCHIMENTO


O betão utilizado para enchimento deve ser betão corrente com inertes naturais, da
forma definida na EN 206, e deve ser classificado de acordo com a resistência característica à
compressão aos 28 dias. As composições dos betões podem ser calculadas ou prescritas.
Ainda que o Eurocódigo 6 permita que o betão de enchimento possa ser de classe
C12/15, o DNA Português estabelece o mínimo de resistência carcterística à compressão de
20 MPa em provetes cúbicos (i.e. C16/20) por razões de durabilidade.
A dimensão máxima dos inertes deve ser limitada a 20 mm, excepto nos casos em que
a menor dimensão dos vazios a preencher com betão seja inferior a 100 mm ou nos casos em
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.7

que seja exigido um recobrimento das armaduras inferior a 25 mm, casos em que a dimensão
máxima dos inertes não deverá excer os 10 mm.
O Eurocódigo 6 exige que a trabalhabilidade do betão seja tal que assegure que todos
os vazios sejam totalmente preenchidos. Normalmente, isto significa uma classe de
abaixamento S3, de acordo com a EN 206. Caso sejam utilizadas betões com uma
trabalhabilidade muito elevada, deverá tomar-se em consideração a possibilidade de
fendilhação do betão devido à retracção.

3.3.4. ARMADURAS
O aço ao carbono utilizado na alvenaria deverá estar de acordo com os Documentos de
Classificação do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC). O aço inoxidável
austenítico deverá cumprir os requisitos da EN 10088. É possível utilizar varões lisos ou
nervurados. As armaduras utilizadas nas juntas de assentamento, devem observar a EN 845-3.
O módulo de elasticidade das armaduras pode ser considerado igual a 200 GPa.
As armaduras deverão possuir a durabilidade adequada a classe de exposição
aplicável. O aço inoxidável austenítico cumpre os requisitos de durabilidade do Eurocódigo 6
mas o aço ao carbono poderá exigir protecção adicional, sob a forma de galvanização, pó de
epóxido fundido ou largura de recobrimento especificado.

3.4. PROPRIEDADES MECÂNICAS (ALVENARIA SIMPLES)

3.4.1. GERAL
O Eurocódigo 6 identifica quatro propriedades mecânicas da alvenaria que são
utilizadas no dimensionamento:
• Resistência à compressão fk
• Resistência ao corte fv
• Resistência à flexão fx
• Relação tensões-extensões σ-ε
Ainda que seja possível desenvolver resistência à tracção directa na alvenaria, esta
resistência deverá ser ignorada para efeitos de projecto.

3.4.2. RESISTÊNCIA CARACTERÍSTICA À COMPRESSÃO


A resistência característica à compressão da alvenaria simples:
• pode ser obtida a partir de ensaios de acordo com a EN 1052-1;
• pode ser estabelecida a partir de uma análise de resultados de ensaios
baseados na relação entre a resistência característica à compressão da
alvenarias simples e a resistência à compressão das unidades de
alvenaria e da argamassa (por exemplo normas de outros países);
• pode ser estabelecida pelas fórmulas indicadas no Eurocódigo 6.
Na prática, recomenda-se a utilização das fórmulas indicadas no Eurocódigo 6.
No caso de alvenaria simples realizada com argamassa convencional e com todas as
juntas preenchidas, a resistência característica à compressão pode ser calculada através da
expressão

0.65 0.25
fk = K fb fm , (3.4)
3.8 Capítulo 3 Dimensionamento

desde que não se considere fm superior a 20 MPa nem a 2fb, consoante o que for menor, e em
que fb é a resistência normalizada à compressão das unidades, fm é a resistência da argamassa
e K é uma constante fornecida na Tabela 3.4.

Tabela 3.4 – Valores da constante K a utilizar no cálculo de fk com argamassa convencional


Tipo de aparelho Grupo 1 Grupo 2a Grupo 2b Grupo 3
Não existem juntas longitudinais de
argamassa através da totalidade ou de parte 0.60 0.55 0.50 0.40
do comprimento da parede (ver Figura 3.1)
Existem juntas longitudinais de argamassa
através da totalidade ou de parte do 0.50 0.45 0.40 0.40
comprimento da parede (ver Figura 3.1)

(a)

(b)
Figura 3.1 – Aparelhos típicos da alvenaria: (a) parede sem juntas longitudinais e (b) paredes
com juntas longitudinais.

Existem outras fórmulas para outros tipos de argamassa (argamassa-cola, argamassa-


leve e juntas de assentamento descontínuas) que não são reproduzidas neste texto, ver o
Eurocódigo 6 para esse efeito.

3.4.3. RESISTÊNCIA CARACTERÍSTICA AO CORTE


A resistência característica à compressão da alvenaria simples:
• pode ser obtida a partir de ensaios de acordo com a EN 1052-3;
• pode ser estabelecida a partir de uma análise de resultados de ensaios
baseados na relação entre a resistência característica ao corte e a
resistência característica inicial ao corte da alvenaria (por exemplo
normas de outros países);
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.9

• pode ser estabelecida pelas fórmulas indicadas no Eurocódigo 6.


Na prática, recomenda-se a utilização das fórmulas indicasa no Eurocódigo 6.
No caso de alvenaria simples realizada com argamassa convencional e com todas as
juntas preenchidas, a resistência característica ao corte pode ser calculada através da
expressão

 f vk 0 + 0.4σ d

f vk = min  0.65 f b , (3.5)
o valor máximo da Tabela 3.5

em que fvk0 é a resistência ao corte sob compressão nula, σd é o valor de cálculo da tensão
normal ao plano de corte e fb é a resistência normalizada à compressão das unidades para
alvenaria na direcção perpendicular às juntas de assentamento. A Tabela 3.5 apresenta os
valores da resistência ao corte sob compressão nula fvk0 e os valores limites para a resistência
ao corte fvk.

Tabela 3.5 – Valores de fvk0 e valores limites de fvk para argamassa convencional
Unidade de alvenaria Argamassa fvk0 (MPa) Valor limite fvk (MPa)
Unidades cerâmicas do M10 a M20 0.3 1.7
Grupo 1 M2.5 a M9 0.2 1.5
M1 a M2 0.1 1.2
Unidade de alvenaria do M10 a M20 0.2 1.7
Grupo 1, com excepção das M2.5 a M9 0.15 1.5
cerâmicas e de pedra M1 a M2 0.1 1.2
natural
Unidades de pedra natural M2.5 a M9 0.15 1.0
do Grupo 1 M1 a M2 0.1 1.0
Unidades cerâmicas do M10 a M20 0.3 O menor valor 1.4
Grupo 2a M2.5 a M9 0.2 entre a resistência 1.2
M1 a M2 0.1 longitudinal 1.0
Outras unidades do M10 a M20 0.2 à compressão e 1.4
Grupo 2a e unidades do M2.5 a M9 0.15 (ver a nota 1,2
Grupo 2b M1 a M2 0.1 abaixo) 1.0
Unidades cerâmicas do M10 a M20 0.3 Nenhum valor limite
Grupo 3 M2.5 a M9 0.2 excepto os fornecidos pela
M1 a M2 0.1 outras expressões
Nota: Para unidades de alvenaria dos Grupos 2a e 2b, a resistência longitudinal à
compressão das unidades toma o valor da resistência medida, com δ não superior a
1.0. Nos casos em que se preveja uma resistência longitudinal à compressão superior
a 0.15 fb, dada a distribuição da furação, não são necessários quaisquer ensaios.

Existem outras fórmulas no caso de juntas verticais não preenchidas e juntas de


assentamento descontínuas que não são reproduzidas neste texto, ver o Eurocódigo 6 para
esse efeito.
3.10 Capítulo 3 Dimensionamento

3.4.4. RESISTÊNCIA CARACTERÍSTICA À FLEXÃO


Normalmente, a resistência característica à flexão não é condicionante para as
aplicações nacionais pelo que não será tratada neste texto.

3.4.5. CARACTERÍSTICAS DE DEFORMAÇÃO DA ALVENARIA

3.4.5.1. RELAÇÃO TENSÕES-EXTENSÕES

Para efeitos de dimensionamento, pode admitir-se que o diagrama da relação tensões-


extensões da alvenaria é da forma parábola-rectângulo, tal como representado na Figura 3.2.

σ Diagrama idealizado

fk

Diagrama de cálculo
fk
fd =
γM

0.002 0.0035 ε
Figura 3.2 – Relação tensões-extensões para o cálculo de alvenaria em flexão e compressão.

3.4.5.2. MÓDULO DE ELASTICIDADE, E

O módulo de elasticidade E da alvenaria pode ser obtido a partir de ensaios, de acordo


com a EN 1052-1, sendo o mesmo calculado para um valor de um terço da carga máxima. No
caso de não existirem resultados de ensaios disponíveis, o módulo de elasticidade E pode ser
admitido igual a 1000fk no caso de estados limites últimos e 600fk no caso de estados limites
de utilização.

3.4.5.3. MÓDULO DE DISTORSÃO, G

Na ausência de resultados de ensaios, o módulo de distorsão G pode ser tomado igual


a 0.4E.

3.4.5.4. FLUÊNCIA

O Eurocódigo 6 indica valores de 0 a 2.0 para o coeficiente de fluência a utilizar em


projecto, em função do tipo de unidade para alvenaria utilizado.

3.4.5.5. RETRACÇÃO / DILATAÇÃO PROVOCADA PELA VARIAÇÃO NO TEOR DE HUMIDADE

Na ausência de resultados de ensaios, o Eurocódigo 6 indica valores para a retracção /


dilatação, em função do tipo de unidade para alvenaria utilizado.
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.11

3.5. PROPRIEDADES MECÂNICAS (ALVENARIA ARMADA, PRÉ-ESFORÇADA E


CONFINADA)
Para além das características mecânicas necessárias para o dimensionamento de de
alvenaria simples, no caso de alvenaria armada, pré-esforçadae confinada é ainda necessário
considerar as seguintes propriedades mecânicas:
• Resistência à compressão do betão de enchimento fc
• Resistência ao corte do betão de enchimento fcv
• Tensão de cedência à tracção e compressão do
aço para armaduras fy
• Tensão de cedência à tracção do aço de pré-esforço fp
• Tensão de rotura da aderência fbo

3.6. EXEMPLOS DE DIMENSIONAMENTO

3.6.1. EDIFÍCIO DE HABITAÇÃO COM QUATRO PISOS (SEM ACÇÕES HORIZONTAIS)

3.6.1.1. DEFINIÇÃO DA GEOMETRIA (PLANTAS E ALÇADO)


O edifício em análise possui quatro pisos (r/c+3). A estrutura do edifício é em
alvenaria resistente, com lintéis em betão armado nas zonas necessárias, e a cobertura, com
duas águas, é tradicional em madeira. As plantas e alçado do edifício estão representadas, da
Figura 3.3 à Figura 3.6.

Figura 3.3 – Planta do Piso 0 (arquitectura).


3.12 Capítulo 3 Dimensionamento

Figura 3.4 – Planta do Piso 1 e 2 (arquitectura).

Figura 3.5 – Planta do Piso 3 (arquitectura).


Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.13

Figura 3.6 – Alçado da parede de empena direita (Parede A).

3.6.1.2. DEFINIÇÃO DOS MATERIAIS

• A laje é realizada com painéis alveolados em betão pré-esforçado do tipo Maprel PM


120C, com 0.12 m de espessura;
• As paredes duplas são em bloco de betão de 0.15 m + 0.15 m (Grupo 2a) com
resistência à compressão de 20 kN/m2 e argamassa corrente com traço de
cimento:areia 1:4 (M4);
• As paredes divisórias resistentes são em tijolo cerâmico de 0.20 m (Grupo 1) com
resistência à compressão de 30 kN/m2 e argamassa corrente com traço de
cimento:areia 1:4 (M4);
• As paredes divisórias não resistentes são em tijolo cerâmico de 0.10 m.

3.6.1.3. DEFINIÇÃO DAS ACÇÕES


Acções Permanentes
• Telhado 1.0 kN/m2
• Laje + revestimentos 2.5 kN/m2
• Paredes duplas 5.0 kN/m2 (plano da parede)
• Paredes divisórias resistentes 3.5 kN/m2 (plano da parede)
3.14 Capítulo 3 Dimensionamento

• Paredes divisórias não-resistentes 0.5 kN/m2 (admitida uniformemente


distribuída na laje)

Acções Variáveis
• Telhado 1.0 kN/m2
• Laje 2.0 kN/m2

3.6.1.4. DIMENSIONAMENTO DE PAREDES SUJEITAS A ACÇÕES VERTICAIS (SISTEMATIZAÇÃO)

O dimensionamento de paredes de alvenaria sujeitas a acções verticais reveste-se de


alguma complexidade face aos efeitos de segunda ordem. A quantificação destes efeitos
obriga ao cálculo da espessura efectiva da parede, altura efectiva da parede e a diversas
verificações, tendo em vista a definição de um coeficiente de redução da resistência em
função da esbelteza e da excentricidade de carregamento. A Tabela 3.6 sistematiza, de forma
condensada, este dimensionamento.

Tabela 3.6 – Sistematização do dimensionamento de paredes de alvenaria


sujeitas a acções verticais (Eurocódigo 6)
Etapa Tarefa
Cálculo da espessura efectiva (Cláusula 4.4.5)
Para paredes duplas convenientemente ligadas, a espessura efectiva tef é igual a
1
t ef = 3 t13 + t 23 ,
em que t1 e t2 representa a espessura de cada um dos panos da parede dupla
Cálculo da altura efectiva (Cláusula 4.4.4.3)
A hef é a altura efectiva é igual a
hef = ρ n h ,
2 em que h é o pé-direito do piso e ρn é um factor de redução, em que n = 2, 3 ou 4
dependendo do número de apoios dos bordos ou contraventamentos da parede:
Verificação do comprimento máximo (Cláusula 4.4.4.3(3))
Verificação das paredes de travamento – espessura efectiva e comprimento
(Cláusula 4.4.4.2)
Verificação da esbelteza (Cláusula 4.4.6)
O limite máximo para a esbelteza hef / tef é dado por
hef / tef < 27 (de acordo com o EC6)
3
hef / tef < 20 (de acordo com o DNA do EC6)
O Eurocódigo 8 impõe limites mais reduzidos para a esbeltez, no caso de zonas
sísmicas.
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.15

Resistência de cálculo da parede (Cláusula 4.4.2)


A resistência de cálculo de uma parede NRd é igual a
Φ i ,m t f k
N Rd =
γM

4 em que Φi,m é o coeficiente de redução da capacidade, Φi ou Φm, conforme o caso,


função dos efeitos de esbelteza e de excentricidade do carregamento, fk é a resistência
característica à compressão da alvenaria, γM é o coeficiente parcial de segurança do
material e t é a espessura efectiva da parede, tendo em conta a profundidade do
ressalto provocado pelo acabamento das juntas sempre que este for superior a 5 mm.
O cálculo do coeficiente de redução da esbelteza e da excentricidade está descrito nas
Cláusulas 4.4.3 e 4.4.7

3.6.1.5. VERIFICAÇÃO DE SEGURANÇA DA PAREDE C (PAREDE DUPLA COM 0.35 M DE

ESPESSURA)

• Quantificação da acção permanente NGk ao nível do piso 0


3.225 m
P.P. Lajes e Revestimentos = 2.5 kN.m 2 × × 3 pisos = 12.1 kN/m
2
3.225 m
Paredes Divisórias = 0.5 kN.m 2 × × 3 pisos = 2.4 kN/m
2
5.0 kN.m 2 × 2.50 m
P.P. Parede = × 4 pés - direitos = 25.0 KN/m
2
NGk total = 39.5 kN/m

• Quantificação da acção variável NQk ao nível do piso 0


3.225 m
Sobrecarga de Utilização = 2.0 kN.m 2 × × 3 pisos = 9.7 kN/m
2
NQk total = 9.7 kN/m

• Acção de cálculo
Atendendo a que apenas existe uma acção variável, o valor do esforço normal de
cálculo na parede é igual a
N Sd = 1.35 N Gk + 1.5 N Qk = 1.35 × 39.5 + 1.5 × 9.7 = 67.9 kN/m
(admitindo o coeficiente de majoração γG = 1.35).

• Cálculo da espessura efectiva


Da Cláusula 4.4.5, a altura efectiva tef é igual a
t ef = 3 0.15 3 + 0.15 3 = 0.189 m .

• Cálculo da altura efectiva


A altura efectiva da parede hef é dada por
hef = ρ n h
3.16 Capítulo 3 Dimensionamento

(ver Cláusula 4.4.4.3) em que ρn é um factor de redução que depende das ligações dos bordos
da parede. Neste caso, a parede parece possuir quatro bordos ligados ao exterior: a laje
superior e inferior (ou fundação), e as paredes de contraventamento, normais ao plano da
parede em análise. A real eficácia do contraventamento depende da distância entre paredes de
contraventamento e da rigidez de cada parede de contraventamento, sendo necessário
proceder às seguintes verificações:
a) Verificação da adequabilidade das paredes de contraventamento (Cláusula 4.4.4.2)
Existem três paredes de contraventamento: a parede exterior na fachada de entrada, a
parede divisória interna e a parede exterior na fachada do pátio. A parede mais
desfavorável é a parede divisória, para a qual se terá de verificar uma espessura t mínima
superior ou igual a
 0.085 m (EC6) / 0.10 m (DNA)
t = 0.10 m ≥ min  = 0.10 m 9
0.3t ef = 0.3 × 0.189 = 0.057 m
e um comprimento mínimo da parede l superior ou igual a
l = 2.8 m ≥ 1 5 × pé - direito = 1 5 × 2.50 = 0.50 m 9
∴ As três paredes são adequadas como paredes de contraventamento.
b) Verificação do afastamento entre paredes de contraventamento (Cláusula 4.4.4.3(3))
No caso do afastamento máximo L entre paredes de contravemento ser superior a 30t, a
parede deve ser considerada como restringida apenas no topo e na base.
No caso em análise
L = 4.725 m ≤ 30 × 0.189 = 5.67 m 9
∴ A parede pode ser considerada como restringida nos quatro bordos. Salienta-se a
importância da parede divisória interna. Se esta não existisse, ou na eventualidade
de vir a a ser eliminada no futuro, a parede em estudo deveria ser considerada com
restringida apenas no topo e na base.

Desta forma, de acordo com a Cláusula 4.4.4.3, o factor de redução da altura da parede
é igual a
1 1
ρ4 = 2
ρ = 2
× 0.75 = 0.65 .
ρ h  0.75 × 2.50 
1+  2  1+  
 l   4.725 
Pelo que a altura efectiva hef da Parede C é igual a
hef = 0.65 × 2.50 = 1.62 m .
Salienta-se que o Anexo B permite obter os valores do factor de redução ρ de forma
gráfica.

• Verificação da esbelteza
A Cláusula 4.4.6 define o valor máximo da esbelteza, hef / tef, de uma parede como 27
(EC6) e 20 (DNA). Neste caso obtém-se
hef 1.62
= = 8.6 < 20 9
t ef 0.189
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.17

• Cálculo da capacidade resistente


A capacidade resistente de uma parede NRd é obtida a partir da expressão (Cláusula
4.4.2)

Φ i,m t f k
N Rd = (para cada pano),
γM

em que Φi,m é o coeficiente de redução da capacidade, Φi (no quinto intermédio) ou Φm (nas


extremidades) conforme o caso, função dos efeitos de esbelteza e de excentricidade do
carregamento. Desta forma, é necessário verificar se a secção crítica ocorre nas extremidades
ou no quinto intermédio.
a) Secção de topo
O cálculo do momento no topo da parede pode ser efectuado de forma aproximada
isolando o nó que se pretende analisar. Esta metodolgia vem expressamente referida no
Eurocódigo 6, Anexo C, e, para a Parede C resulta no esquema simplificado da Figura 3.7.

2.50 m
pl 2
M0 =
12 2.50 m

3.40 m
Figura 3.7 – Esquema simplificado de cálculo do momento de topo na Parede C.

A relação de rigidez r entre a laje e a parede resulta em


EI  30.5 × (1.0 × 0.12 3 ) 12) 
   
 l  laje  3.40  = 2.10
r= = ,
EI  5.45 × (1.0 × 0.15 ) 12) 
3
   
 l  parede  2.50 
em que se admitiu que o módulo de elasticidade do betão é 30 GPa e que o módulo de
elasticidade da alvenaria é dado por
E parede = 1000 f k = 1000 × 5.45 = 5450 GPa
e
f k = K f b0.65 f m0.25 = 0.55 × 20 0.65 × 4 0.65 = 5.45 MPa .
O momento no topo da parede M1 vale
p Sd l 2 7.05 × 3.40 2
M1 = × cd = × 0.24 = 1.66 kN.m/m ,
12 12
3.18 Capítulo 3 Dimensionamento

em que
p Sd = 1.35Gq + 1.5Qk = 1.35 × (2.5 + 0.5) + 1.5 × 2.0 = 7.05 kN/m 2
e
 EI 
 
 l  parede 1
cd = ∝ = 0.24 .
 EI  1 + 1 + 2.10
∑  l 

Atendendo a que a ligação entre laje e parede não é totalmente monolítica, o Anexo C
permite reduzir o valor obtido para o momento no topo da parede, multiplicando-o pelo
coeficiente (1 – k/4), igual a
 EI 
∑  
l  lajes 2.1
k= = = 1.05 ,
 EI  1+1
∑  l 
paredes

desde que a tensão de cálculo vertical que actua sobre o nó seja superior a 0.25 MPa:
N Sd 67.9
σ Sd = = = 0.45 MPa > 0.25 MPa 9
t 0.15
Desta forma, o momento no topo da parede M1 final é igual a
M 1( red ) = M 1 × (1 − k / 4) = 1.66 × (1 − 1.05 / 4) = 1.22 kN.m/m .
A excentricidade na secção de topo ei vale
Mi
ei = + e hi + e a ,
Ni
em que ehi é a excentricidade, caso exista, no topo ou na base da parede resultante das
accções horizontais e ea é a excentricidade acidental (hef / 450), o que resulta em
Mi 1.22 1.62
ei = + e hi + e a = +0+ = 0.022 m ≥ 0.05t = 0.0075 m 9
Ni 67.9 450
Finalmente, obtém-se o valor do coeficiente de redução da capacidade Φi,
ei 0.022
Φi =1 − 2 =1− 2× = 0.71
t 0.15

b) Secção intermédia
O momento na secção de base M2 vale

M 2 = − M 1 / 2 = −0.83 kN.m/m ,

pelo que o momento máximo MM no quinto intermédio da parede vale

M M = 0.6M 1 + 0.4M 2 = 0.6 × 1.66 − 0.4 × 0.83 = 0.66 kN.m/m .


Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.19

A excentricidade na secção intermédia em vale


M  hef
e mk = e m + e k =  m + e hm + e a  + 0.002φ ∞ t.e m ,
 Nm  t ef
em que em é a excentricidade instantânea, ek é a excentricidade de fluência, ehm é a
excentricidade, caso exista, a meia altura da parede resultante das acções horizontais, ea é a
excentricidade acidental (hef / 450) e φ∞ é o coeficiente de fluência. A excentricidade de
fluência ek pode ser considerada igual a zero para todas as paredes executadas com
unidades cerâmicas e de pedra natural, e para paredes cuja esbelteza não ultrapasse 15,
executadas com outro material. Neste caso, a parede será executada com blocos de betão
mas verifica-se que a esbelteza hef / tef é de apenas 8.6, pelo que a excentricidade de
fluência pode ser admitido igual a zero.
Admitindo que o valor do esforço axial da parede se mantém constante, obtém-se
 0.66 1.62 
e mk =  +0+  + 0 = 0.013 m ≥ 0.05t = 0.0075 m 9
 67.9 450 
Do ábaco da Figura 3.8 (emk / t = 0.013 / 0.15 = 0.087), é possível obter o valor do
coeficiente de redução da capacidade Φm,
Φ m = 0.78 .

1.0 emk / t
= 0.05
0.9
= 0.1
0.8
0.7 = 0.15

0.6 = 0.2
= 0.25
Φ m 0.5

0.4 = 0.3
= 0.33
0.3
0.2
0.1

0.0
0 5 10 15 20 25 30
hef / tef
Figura 3.8 – Ábaco mostrando os valores de Fm para diferentes excentricidades em função da
esbelteza.

c) Cálculo da resistência
A resistência da parede é governada pelo menor coeficiente de redução Φi,m pelo que,
neste caso, a secção de topo é condicionante e a capacidade resistente é igual a
Φ i,m t f k 0.71 × 0.15 × 5.45
N Rd = = = 232 kN/m
γM 2.5

• Verificação de segurança
3.20 Capítulo 3 Dimensionamento

A Parede C cumpre os requisitos de segurança com uma margem elevada,


N Rd = 232 kN/m > N Sd = 67.9 kN/m .

3.6.1.6. VERIFICAÇÃO DE SEGURANÇA DO APOIO INTERMÉDIO NA VIGA AO PISO 3 (CARGA


CONCENTRADA)

A Figura 3.9 apresenta o pormenor da zona de apoio da viga intermédia ao Piso 3.


Este apoio é o mais desfavorável na estrutura, uma vez que a carga é máxima e a espessura da
parede é apenas 0.20 m.

Figura 3.9 – Pormenor da vigas e da zona de apoio, incluindo a distribuição da carga.

• Quantificação da acção permanente PGk


8.80 m 7 m
Telhado = 1.0 kN.m 2 × × = 15.4 kN
2 2
7.0 m
Parede Exterior = 5.0 kN.m 2 × 2.5 m × = 43.8 kN
2
7.0 m
P.P. Viga = 0.3 m × 0.40 m × × 25 kN.m 3 = 10.5 KN
2
7m
P.P. Laje + Revestimentos = 2.5 kN.m 2 × 0.85 m × = 7.4 KN
2
7m
Paredes Divisórias = 0.5 kN.m 2 × 0.85 m × = 1.5 KN
2
PGk total = 78.6 kN
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.21

• Quantificação da acção variável PQk


8.80 m 7 m
Sobrecarga do Telhado = 1.0 kN.m 2 × × = 15.4 kN
2 2
7m
Sobrecarga da Laje = 2.0 kN.m 2 × 0.85 m × = 6.0 kN
2
PQk total = 21.4 kN/m

• Acção de cálculo
Atendendo a que apenas existe uma acção variável, o valor da reacção de cálculo no
apoio da viga é igual a
PSd = 1.35 PGk + 1.5 PQk = 1.35 × 78.6 + 1.5 × 21.4 = 138.2 kN .

• Verificação da tensão local


Para paredes construídas com unidades de alvenaria do Grupo 1 e sujeitas a cargas
concentradas, deve-se verificar que, localmente sob o apoio de uma carga concentrada, o
valor de cálculo da tensão de compressão não ultrapassa o valor dado pela seguinte expressão
fk A
[(1 + 0.15 x)(1.5 − 1.1 b )] ,
γM Aef
com o limite inferior igual a fk / γM e superior igual a 1.25 fk / γM, se x = 0, e 1.5 fk / γM, se
x = 1, com o valor limite superior interpolado linearmente entre os dois valores se 0 < x < 1,
em que x = 2a1 / H (nunca superior a 1.0), a1 é a distância da extremidade da parede ao bordo
mais próximo sob a qual se exerce directamente a carga, H é a altura da parede até ao nível
da carga, Ab é a área sob a qual se exerce directamente a carga, ainda que não superior a
0.45Aef , Aef é a área efectiva da parede Lef.t, Lef é o comprimento efectivo determinado a meia
altura da parede e t é a espessura da parede, tendo em conta a profundidade de ressaltos nas
juntas superior a 0.005 m, ver Figura 3.10.

Carga

Alçados
Carga

Ab (Área carregada)
Máximo t/4

Planta Corte
Figura 3.10 – Paredes sujeitas a cargas concentradas.
3.22 Capítulo 3 Dimensionamento

No caso em análise, temos que verificar se


138.2 f A
σ Sd = = 2.3 MPa ≤ k [(1 + 0.15 x)(1.5 − 1.1 b )] .
0.20 × 0.30 γM Aef
Sabendo que
a1 = 0 (logo x = 0)
f k = K . f b0.65 f m0.25 = 0.60 × 30 0.65 × 4 0.25 = 7.74 MPa
Aef = 0.20 × 0.79 = 0.158 m 2

Ab = 0.20 × 0.30 = 0.06 m 2 ≥ 0.45 × Aef = 0.071 m 2 ,


a expressão anterior resulta em
7.74 0.071
σ Sd = 2.3 MPa ≤ [(1 + 0.15 × 0)(1.5 − 1.1 × )] = 3.11 MPa 9
2.5 0.158
Importa ainda comprovar que o valor adoptado para a verificação da tensão local é
inferior a 1.25 fk / γM = 1.25 × 7.74 / 2.5 = 3.87 MPa, o que se demonstra ser verdadeiro.
Salienta-se ainda que é necessário efectuar a verificação da tensão de compressão a
meia altura da parede, procedendo a contabilização do efeito conjunto da carga concentrada e
de cargas distribuídas que possam actuar sobre a parede. No caso em estudo, a única acção
distribuída parece ser o peso próprio da própria parede, de valor não significativo, pelo que se
dispensa esta verificação, habitualmente necessária.

3.6.2. PAREDE SUJEITA A ACÇÕES COMBINADAS (ESFORÇO NORMAL E DE CORTE)


Pretende-se verificar a segurança da parede apresentada na Figura 3.11 e sujeita às
acções indicadas. A parede é construída com unidades cerâmicas do Grupo 1 (fb = 20 MPa) e
uma argamassa M4.

Gk = 70 kN

Qk = 30 kN
Ek = 8 kN

Gk = 70 kN 3.10 m

Qk = 30 kN
Ek = 4 kN

t = 0.20 m 3.10 m

2.20 m

Figura 3.11 – Geometria e carregamento da parede.


Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.23

Atendendo a que na secção anterior foi apresentado um exemplo de verificação de


segurança de uma parede submetida a acções verticais, neste exemplo apenas se considera a
combinação com a Acção Base Sismo (Ek).
Neste caso, os esforços majorados, ao nível da secção de base, são dados por
N Sd = N Gk + ψ 2 N Qk = 2 × (70 + 0.2 × 30) = 154 kN
V Sd = 1.5V Ek = 1.5 × (8 + 4) = 18 kN
M Sd = 1.5M Ek = 1.5 × (8 × 6.20 + 4 × 3.10) = 93 kN.m ,
em que se admitiu o coeficiente ψ2 igual a 0.2.
A tensão normal de cálculo σd vale
N Sd 154
σd = = = 0.35 MPa
Abase 2.20 × 0.20
e a resistência ao corte é dada por
f vk = f vk 0 + 0.4σ d = 0.2 + 0.4 × 0.35 = 0.34 MPa .
A resistência ao corte tem de ser inferior a um valor limite máximo igual a
 1.5 MPa
f vk ≤ min  9
0.065 f b = 0.065 × 20 = 1.3 MPa
Admitindo uma distribuição triangular de tensões normais na secção de base, ver
Figura 3.12, o valor da largura de contacto lc é igual a
l  l M 
 = 3 × 
2.20 93 
l c = 3 ×  − e  = 3 ×  − Sd −  = 1.46 m ,
2   2 N Sd   2 154 
uma vez que a excentricidade e (0.60 m) é superior a l / 6 (0.37 m), e a tensão máxima de
contacto σSd, max é igual a
2 N Sd 2 × 152
σ Sd , max = = = 1.04 MPa .
t.l c 0.20 × 1.46

MSd

NSd
VSd

σSd, max

lc
l

Figura 3.12 – Distribuição de tensões normais na base.

A verificação de segurança consiste em verificar se o esforço de corte resistente VRd é


superior ao esforço de corte de cálculo VSd,
3.24 Capítulo 3 Dimensionamento

f vk .t.l c 0.34 × 0.20 × 1.46


V Rd = = = 39.7 kN ≥ VSd = 18 kN 9
γm 2.5

e se resistência à compressão da alvenaria é superior a uma tensão normal de referência, seja


σSd,¾ = ¾.σSd, max,
f k K . f b0.65 . f m0.25 0.60 × 20 0.65 × 4 0.25
= = = 2.37 MPa
γm γm 2.5
≥ 9

¾σ Sd , mac = ¾ × 1.04 = 0.78 MPa

3.6.3. MURO DE SUPORTE EM ALVENARIA ARMADA COM PILARES EMBEBIDOS


Pretende-se verificar a segurança de um muro de suporte com 4.0 m de altura e sujeito
às acções na secção de base indicadas na Figura 3.13a. O muro é construído, em alvenaria
armada com a largura de duas unidades cerâmicas com 0.20 m de espessura e com pilares
embebidos de 0.10 × 0.20 m2, afastados cada 0.90 m, ver Figura 3.13b,c. As unidades
cerâmicas pertencem ao Grupo 1 (fb = 36 MPa) e a argamassa é do tipo M6. O aço é do tipo
A400 (S400).

0.10 m

0.90 m
4.0 m

MSd = 86 kN.m/m

VSd = 54 kN/m 0.40 m

(a) (b) (c)


Figura 3.13 – Muro de suporte: (a) esforços na secção de base, (b) corte transversal e (c) corte
longitudinal.

De acordo com a Cláusula 4.7.1.3, importa verificar o vão máximo de elementos


sujeitos à flexão. Para paredes em consola em alvenaria armada, a relação limite entre o vão L
e a altura útil d é 18. Admitindo que a altura útil d é igual a
d = 0.40 − 0.05 = 0.35 m ,
resulta na relação L / d igual a
L 4.0
= = 11.4 < 18 9
d 0.35
Para efeitos de resistência à flexão, a parede pode ser considerada como uma viga em
T, Cláusula 4.7.1.5, cujos banzo possui uma espessura tf
t f = 0.5d = 0.5 × 0.35 = 0.175 m
e uma largura bef dada pela seguinte expressão
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.25

 a largura real do banzo = 0.90



bef = min a largura das nervuras + 12t ef = 0.20 + 12 × 0.175 = 2.30 =0.90 m .
 um terço da altura da parede = 1/3 × L = 1/3 × 4.0 = 1.33

A área de armadura de flexão necessária por nervura As,nerv pode ser calculada de
forma exacta recorrendo a tabelas. Uma estimativa aproximada da área As,nerv pode ser obtida
recorrendo a
M Sd , nerv .γ s (0.9 × 86) × 1.15
As , nerv ≥ = = 7.06 cm 2 → 3φ 20 (9.42 cm 2 ) .
z. f yk (0.9 × 0.35) × 400
Se estes varões forem colocados no centro do pilar, a distância entre varões e o recobrimento
dos varões cumprem os valores recomendados no EC2 e REBAP, uma vez que as exigências
de durabilidade para as estruturas de alvenaria armada ainda não se encontram estabelecidas
no Eurocódigo 6.
A Cláusula 4.7.1.6(7) impõe limites para o momento máximo resistente MRd tendo em
consideração o esmagamento da alvenaria comprimida. Atendendo a que a resistência à
compressão da alvenaria fk é
f k = K . f b0.65 . f m0.25 = 0.60 × 36 0.65 × 6 0.25 = 9.64 MPa ,
o momento máximo resistente da nervura MRd,nerv é dado por
fk 9.64
M Rd , nerv ≤ bef t f (d − 0.5t f ) = × 0.90 × 0.175 × (0.35 − 0.5 × 0.175)
γm 2.5 9
= 159.4 kN.m/nerv
O esforço de corte actuante por nervura é 0.9 × 54 = 48.6 kN/m. De acordo com a
Cláusula 4.7.2.2, o esforço de corte resistente da alvenaria pode ser ser obtido por
f vk b d 0.2 × 0.90 × 0.35
V Rd = = = 25.2 kN/nerv 2
γm 2.5
o que parece conduzir à necessidade de armadura de esforço transverso. Na opinião do autor,
esta conclusão não é adequada e o valor adoptado para fvk é excessivamente restritivo. A
própria cláusula aplicável indica que, “caso seja necessário, pode-se considerar o efeito
benéfico da armadura longitudinal para aumentar o valor característico da resistência ao corte,
fvk”. Salienta-se ainda que o valor da resistência ao corte da alvenaria utilizado resulta do
colapso da aderência entre a argamassa e a unidade de alvenaria, o que implica que as fendas
de corte ocorram horizontais (manifestamente impossível). A conjugação destes dois factores
recomendam a utilização de uma resistência ao corte acrescida, que de acordo com a
BS5628:Part 2, toma o valor
f vk = (0.35 + 17.5 ρ ) × (2.5 − 0.25a / d ) ,
em que ρ é a percentagem de armadura longitudinal e a é relação entre o momento flector e o
esforço transverso de cálculo, o que resulta em
9.42 86
f vk = (0.35 + 17.5 × ) × (2.5 − 0.25 × / 0.35) = 0.54 MPa .
0.90 × 0.38 54
Desta forma o esforço de corte resistente por nervura vale
3.26 Capítulo 3 Dimensionamento

f vk b d 0.54 × 0.90 × 0.35


V Rd = = = 68.0 kN/nerv > V Sd = 48.6 kN/nerv 9
γm 2.5
pelo que não é necessária armadura de esforço transverso.
Fica ao cuidado do leitor, o cálculo da dispensa de armadura e a pormenorização da
mesma.

3.7. ASPECTOS RELATIVOS AO EUROCÓDIGO 8

3.7.1. DEFINIÇÕES DE ALVENARIA CONFINADA E ALVENARIA ARMADA


O EC8 define alvenaria confinada como alvenaria construída rigidamente entre vigas e
pilares estruturais nos quatro lados (sem a intenção de se conportarem como uma estrutura
porticada) e a alvenaria armada como alvenaria em que varões ou rede, habitualmente de aço,
são embebidos na argassama ou betão de enchimento de forma a que os materiais contribuam
de forma solidária para a resistência.

3.7.2. MATERIAIS E APARELHOS


Todos os materiais deverão cumprir condições específicas, ver Cláusula 6.2,
salientando-se os seguintes aspectos:
• A percentagem de furação máxima é de 50%
• Os septos exteriores e os septos horizontais deverão possuir uma espessura
mínima de 15 mm
• Os septos verticais deverão ser contínuos ao longo da unidade
• A resistência das unidades para alvenaria deverá ser superior ou igual a
2.5 MPa, na direcção vertical, e a 2.0 MPa, na direcção horizontal
• A resistência da argamassa deverá ser superior ou igual a M5, para alvenaria
simples e confinada, e a M10, para alvenaria armada

3.7.3. COEFICIENTES DE COMPORTAMENTO


Os coeficientes de comportamento valem 1.5, para alvenaria simples, 2.0, para
alvenaria confinada, e 2.5 para alvenaria armada.

3.7.4. ANÁLISE ESTRUTURAL


Para efeitos de distribuição das acções horizontais, é possível considerar as lajes como
diaframas rígidos apenas no caso de lajes em betão armado, desde que as aberturas não
afectem significativamente a rigidez global da laje no plano. Nesse caso, é possível efectuar
uma redistribuição do corte basal em cada parede, com uma redução até 30% e um aumento
até 50%
Salienta-se que, no caso de diafragmas flexíveis (por exemplo, em madeira), as forças
horizontais se distribuem proporcionalmente à área de carregamento efectivo (ou massa). A
Figura 3.14 ilustra um exemplo para o cálculo da distribuição de acções horizonatais,
admitindo o diafragma como rígido ou flexível.
Paulo B. Lourenço Dimensionamento 3.27

Parede B
Parede A

Parede C
3.0 m 5.0 m

Figura 3.14 – Exemplo para o cálculo da distribuição de acçoões horizontais.

3.7.5. CRITÉRIOS DE DIMENSIONAMENTO E REGRAS DE CONSTRUÇÃO


As exigências gerais para estruturas em alvenaria incluem:
• A ligação entre lajes e paredes deverá ser efectuada por ligadores metálicos ou
vigas de bordadura em b.a.;
• A laje deverá ser capaz de transmitir as forças sísmicas horizontais às paredes;
• É necessário dispor de paredes de contraventamento em duas direcções
ortogonais. Estas paredes deverão cumprir os seguintes requesitos:

Tipo de parede t hef / t h/l


Alvenaria simples, com unidades naturais ≥ 0.40 m ≤9 ≤2
Alvenaria simples, com unidades artificiais, ≥ 0.30 m ≤ 12 ≤2
em zonas sísmicas com ag >0.10g
Alvenaria simples, com unidades artificiais, ≥ 0.24 m ≤ 15 ≤2
em zonas sísmicas com ag <0.10g
Alvenaria confinada ≥ 0.24 m ≤ 15 ≤3
Alvenaria armada ≥ 0.24 m ≤ 15 n.a.

As exigências adicionais para alvenaria simples incluem:


• Em zonas sísmicas com ag ≥ 0.30g o uso de alvenaria simples não é permitido
em paredes de contraventamento resistentes ao sismo, para edifícios com mais
de dois pisos;
• Tirantes horizontais com vigas-cinta ou armaduras deverão ser colocados no
plano da parede, ao nível de cada piso e nunca mais espaçados do que 4 m,
com uma área de armadura não inferior a 2 cm2.

As exigências adicionais para alvenaria confinada incluem:


• A betonagem dos elementos de confinamento deverá ser realizada após a
execução da parede;
• A secção mínima dos elementos de confinamento é 0.15 × 0.15 m2;
3.28 Capítulo 3 Dimensionamento

• Elementos verticais em cada intersecção de paredes, em ambos os lados de


qualquer abertura com mais de 1.5 m2 e, no máximo a cada 5 m;
• Elementos horizontais ao nível de todos os pisos e, no máximo, a cada 5 m;
• A armadura por elemento deverá ser superior a 2.4 cm2, devendo ser utilizados
estribos;
• A emenda de varões deverá ser superior a 60 diâmetros.

3.7.6. VERIFICAÇÃO DE SEGURANÇA


Para efeitos de verificação de segurança aos estados limites últimos, podem-se admitir
os seguintes valores para os coeficientes de segurança parcial dos materiais:
• Coeficiente de segurança para a alvenaria é γM = 1.5;
• Coeficiente de segurança para o aço é γS = 1.0.

3.7.7. “EDIFÍCIOS SIMPLES DE ALVENARIA”


Ficam dispensados de verificação de segurança à acção dos sismos os edifícios que
cumpram os requisitos acima descritos e os requisitos a seguir indicados:
• O número de pisos é inferior aos da tabela seguinte:
Aceleração < 0.20g ≥ 0.20g ≥ 0.30g
Alvenaria simples 3 2 1
Alvenaria confinada 4 3 2
Alvenaria armada 5 4 3
• A planta é aproximadamente regular, com uma relação entre lados não menor
que 0.25, com saliências ou reentrâncias da forma rectangular não superior a
15% do lado paralelo à direcção da descontinuidade, e menor que 2 m;
• As paredes de contraventamento tem uma disposição aproximadamente
simétrica, com um mínimo de duas paredes paralelas em duas direcções
ortogonais com um comprimento superior a 30% do comprimento do edifício
da direcção considerada. A distância entre estas paredes deverá ser superior a
75% da largura do edifício na direcção ortogonal. A percentagem das cargas
verticais a suportar pelas paredes de contraventamento deverá ser superior a
75% da carga total;
• A diferença de massa e de secção horizontal das paredes entre pisos
consecutivos não excede 20%;
• A secção transversal horizontal das paredes de contraventamento, em cada
direcção ortogonal, não é inferior à percentagem da área total de lajes acima do
nível em análise, indicada na tabela seguinte:
Aceleração < 0.20g ≥ 0.20g ≥ 0.30g
Alvenaria simples 3 5 6
Alvenaria confinada 2 4 5
Alvenaria armada 2 4 5
• Para edifícios em alvenaria simples, as paredes numa direcção deverão estar
ligadas a paredes na direcção ortogonal, com um espaçamento máximo de 7 m.
Anexo A

A GLOSSÁRIO

(DE ACORDO COM O EUROCÓDIGO 6)

A.1. ALVENARIA
Alvenaria : Conjunto de unidades de alvenaria dispostas de forma definida e ligadas por uma
argamassa.
Alvenaria armada : Alvenaria em que são incorporados varões ou redes, normalmente em
aço, na argamassa ou betão, de forma a formar um conjunto resistente solidário.
Alvenaria pré-esforçada : Alvenaria em que foi intencionalmente introduzido um estado de
compressão através de armaduras traccionadas.
Alvenaria confinada : Alvenaria solidarizada a elementos de betão armado ou de alvenaria
armada, nos quatro lados, não concebidos para funcionar como pórtico.
Aparelho da alvenaria : Disposição das unidades na alvenaria, de um modo regular, de
forma a conseguir um comportamento solidário.

A.2. RESISTÊNCIA DA ALVENARIA


Resistência característica da alvenaria : Valor característico mínimo da resistência
referente ao quantilho de 5% das resistências medidas da alvenaria.
Resistência à compressão da alvenaria : Resistência à compressão da alvenaria não
considerando os efeitos das restrições de apoio, esbelteza ou excentricidade das
cargas.
Resistência ao corte da alvenaria : Resistência da alvenaria sujeita a forças de corte.
Resistência à flexão da alvenaria : Resistência lateral da alvenaria à flexão simples.
Tensão de rotura da aderência : Força de rotura da aderência, por unidade de área da
armadura, no betão ou na argamassa, quando sujeita a forças de tracção ou de
compressão.

A.3. UNIDADES DE ALVENARIA


Unidade de alvenaria : Elemento produzido para ser usado na construção de alvenaria.
Unidades de alvenaria dos grupos 1, 2a, 2b e 3 : Designação dos grupos de unidades de
alvenaria, de acordo com a percentagem, dimensões e orientação das perfurações ou
furos nas unidades, quando assentes.
Face de assentamento : Face superior ou inferior da unidade de alvenaria quando
correctamente assente.
Depressão : Cavidade formada no fabrico, em uma ou ambas as faces de assentamento de
uma unidade de alvenaria.
Furo : Vazio formado no fabrico, podendo ou não atravessar completamente uma unidade de
alvenaria.
A.2 Anexo A Glossário

Rebaixo : Vazio formado no fabrico de uma unidade de alvenaria para possibilitar um melhor
manuseamento com uma ou as duas mãos ou por máquina.
Septo interior : Material sólido entre os furos, numa unidade de alvenaria.
Septo exterior : Material periférico entre um furo e uma face exterior de uma unidade de
alvenaria.
Área bruta : Área total da secção transversal da unidade de alvenaria sem deduzir as áreas
relativas a furos, vazios ou reentrâncias.
Resistência à compressão das unidades de alvenaria : Tensão de rotura média de um
número especificado de unidades de alvenaria.
Resistência normalizada à compressão das unidades de alvenaria : Resistência à
compressão de uma unidade de alvenaria modificada para condições de seco ao ar e
para uma unidade equivalente com 100 mm de largura por 100 mm de altura.
Resistência característica à compressão das unidades de alvenaria : Resistência à
compressão correspondente ao quantilho de 5% da resistência à compressão de um
número especificado de unidades de alvenaria.

A.4. ARGAMASSA
Argamassa : Mistura de ligantes inorgânicos, inertes e água, por vezes com aditivos e
adjuvantes.
Argamassa convencional : Argamassa usada em juntas com uma espessura superior a 3 mm,
utilizando apenas inertes correntes.
Argamassa-cola : Argamassa utilizada em juntas com uma espessura entre 1 e 3 mm.
Argamassa leve : Argamassa com massa volúmica aparente seca inferior a 1500 kg/m3.
Argamassa calculada : Argamassa calculada e produzida para satisfazer determinadas
propriedades.
Argamassa prescrita : Argamassa produzida em determinadas proporções, cujas
propriedades são previstas a partir das proporções dos constituintes.
Argamassa-pronta : Argamassa preparada em fábrica e fornecida à obra.
Argamassa pré-doseada : Argamassa em que os constituintes são preparados em fábrica e
são fornecidos e misturados na obra nas proporções e condições indicadas pelo
fabricante.
Argamassa feita em obra : Argamassa em que os constituintes primários são preparados e
misturados na obra.
Resistência à compressão da argamassa : Tensão de rotura média de um número
especificado de provetes de argamassa, após 28 dias de cura.

A.5. BETÃO DE ENCHIMENTO


Betão de enchimento : Betão com consistência e dimensão dos inertes adequadas para
preencher cavidades ou pequenos espaços na alvenaria.

A.6. ARMADURAS
Armaduras de aço : Armaduras de aço para uso na alvenaria.
Armaduras para juntas de assentamento : Armaduras de aço que são prefabricadas para
colocação nas juntas de assentamento.
Paulo B. Lourenço Glossário A.3

Armaduras para pré-esforço : Fios, varões ou cordões para pré-esforço, utilizados na


alvenaria.

A.7. COMPONENTES AUXILIARES


Barreira de estanquidade : Membrana, fiada de unidades de alvenaria ou outro material para
evitar a passagem de água.
Ligador de parede : Dispositivo para fazer a ligação entre panos de alvenaria de uma parede
dupla, ou entre um pano de alvenaria e um elemento estrutural colocado no tardoz.
Ligador de topo : Dispositivo para efectuar a ligação de elementos de alvenaria a outros
elementos adjacentes, tais como pavimentos e tectos.

A.8. JUNTAS DE ARGAMASSA


Junta de assentamento : Camada de argamassa entre as faces de assentamento das unidades
de alvenaria.
Junta transversal : Junta de argamassa perpendicular à junta de assentamento e à face da
parede.
Junta longitudinal : Junta vertical de argamassa na espessura da parede e paralela à face
desta.
Junta delgada : Junta de argamassa-cola, tendo no máximo 3 mm de espessura.
Junta de dilatação : Junta que permite movimentos no plano da parede.
Acabamento da junta : Processo de acabamento de uma junta de argamassa à medida que
prossegue a execução da alvenaria.
Refechamento da junta : Processo de enchimento e acabamento por raspagem de uma junta
de argamassa.

A.9. TIPOS DE PAREDES


Parede resistente : Parede com área em planta superior a 0,04 m2, ou uma unidade de
alvenaria completa com área em planta superior a 0,04 m2 se for dos Grupos 2a, 2b ou
3, essencialmente dimensionada para suportar uma determinada carga para além do
seu peso próprio.
Parede simples : Parede de pano único ou sem juntas verticais contínuas no seu plano.
Parede dupla : Parede constituída por dois panos de parede paralelos, ligados entre si por
ligadores de parede ou armaduras para juntas de assentamento, com um ou ambos os
panos a suportar a carga vertical. O espaço entre os dois panos pode ser deixado vazio
ou preenchido parcial ou totalmente por materiais de isolamento térmico.
Parede composta : Parede constituída por dois panos de parede paralelos, com a junta
longitudinal entre eles (não excedendo os 25 mm) completamente preenchida com
argamassa, e firmemente amarrados entre si por ligadores, de forma a resistirem em
conjunto às acções actuantes.
Parede dupla preenchida com betão : Parede constituída por dois panos de parede
paralelos, espaçados no mínimo de 50 mm, firmemente amarrados entre si por
ligadores ou por armaduras para juntas de assentamento e com o espaço entre eles
preenchido por betão de forma que resulte num comportamento conjunto sob as
acções actuantes.
A.4 Anexo A Glossário

Parede de face à vista : Parede na qual as unidades de alvenaria da face à vista estão ligadas
às de tardoz de forma que resulte num comportamento conjunto sob as acções
actuantes.
Parede com juntas descontínuas : Parede na qual as unidades de alvenaria são assentes
sobre duas faixas de argamassa, ao longo das arestas exteriores das faces de
assentamento.
Parede-cortina : Parede utilizada como fachada à vista mas desligada da estrutura ou não
contribuindo para a resistência da parede interior ou estrutura de suporte.
Parede de contraventamento : Parede para resistir a forças no seu plano.
Parede de travamento : Parede colocada perpendicularmente a uma outra para lhe conferir
resistência a forças transversais ou para evitar a encurvadura dessa parede.
Parede não resistente : Parede não considerada para resistir às acções, de tal forma que a sua
remoção não altera a capacidade resistente da estrutura.

A.10. DIVERSOS
Roços : Canais formados na alvenaria.
Cavidade : Indentação formada na face de uma parede.
Calda : Mistura de cimento, areia e água com fluidez adequada ao preenchimento de
pequenos vazios ou espaços na alvenaria.

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