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1ª VARA DE FAMÍLIA REGIONAL DA ILHA DO

GOVERNADOR DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO


DE JANEIRO

Processo nº 2008.207.001640-1

Ação de Modificação de Guarda

S E N T E N Ç A

Trata-se de ação de modificação de guarda onde o pai


pretende a guarda do filho adolescente com 14 anos de
idade, pois este último deseja de forma clara morar consigo.
Que o menor declara gostar de estudar com o pai, viajar e
etc.

Instrumentando a inicial vieram os documentos de fls 06/10.

Regularmente citada (fl. 24v) a Ré apresentou sua peça de


defesa as fls.25/29.

Com a contestação vieram os documentos de fls.31/41.

Réplica as fls.44/46.

Estudo social encontra-se as fls.54/57.

Manifestação das partes sobre o estudo social (fls.60/62 e


64/65).

Estudo psicológico as fls.70/71.

Manifestação da Ré sobre o estudo psicológico (fls.73/75).


No Juizado Informal de Conciliação não foi possível o acordo
(fl.80).

Designada mediação, a mesma restou infrutífera (fl.89).

Audiência Preliminar (fl.95).

Audiência de Instrução e julgamento (fls.101/104), com a


oitiva do adolescente.

Promoção do ministério Público opinando pela procedência


do pedido (fl.101/102).

É o relatório. Fundamento.

Cuida-se de ação de modificação de clausula onde o


Autor/pai objetiva a guarda do seu filho/adolescente de 14
anos de idade, sob argumento de que o menor manifesta a
vontade de ficar em sua companhia.

De outra banda, a contestante aduz que o Autor não cuida


bem do filho; que seu filho ainda é adolescente, que, por
isso, está em período de constante mudança; que o convívio
com o genitor não pode ser avaliado apenas nos momentos
de visitação.

Essas são as razões das partes, de forma sucinta.

O pedido merece parcial êxito.

Com efeito, este juízo no curso do processo tentou por


várias vezes conciliar as partes, inclusive com designação
de mediação que restou infrutífera (fl. 89). Sob esse
empuxo, as partes foram informadas sobre o significado da
guarda compartilhada e a sua importância, tendo em vista a
idade do filho que já conta com 14 anos. Tudo inútil.
Afigura-se acentuar que, o presente processo é o terceiro (3)
que tem por objeto a guarda do filho, visto que os outros dois
estão estampados por cópia as fls.09/10 e 37/38.

Aflora do estudo social e psicológico adunado aos autos


(fls.54/57 e 70/71) que, apesar de tudo, o menor adolescente
nutre amor e carinho pelos pais, o que é salutar e bastante
benéfico para o seu desenvolvimento.

A bem dizer, este é o terceiro processo em que o “objeto” da


disputa é o filho. Contudo, as partes (genitores) esqueceram
que o filho cresceu (adolescente de 14 anos) e agora possui
vontade própria e que de maneira nenhuma essa situação
de conflito pode continuar. Ora, o conflito é dos pais e não
do filho que deseja ser amado por ambos. O interesse do
menor-adolescente deve prevalecer sobre o dos pais. Não
pode o adolescente ficar a mercê de demandas, o que é
deveras prejudicial ao seu desenvolvimento.

Dessa forma, após ouvir o menor em audiência (fls.


103/104), tenho a convicção que a única solução é a guarda
compartilhada, verdadeira CARTA DE ALFORRIA do filho,
hoje adolescente, de 14 anos de idade. O artigo 1.584, $ 2º
do Código Civil, alterado pela Lei nº 11.698/08, assim
permite ao Juiz aplicar a guarda compartilhada.

Explico: na hipótese focada, a guarda compartilhada evita


inexoravelmente que os genitores usem o filho – hoje já
adolescente – como objeto de disputa (o que vem
acontecendo ao longo do tempo – 3º processo), visto que
certamente passarão a respeitá-lo como indivíduo e não
coisa, de modo afastá-lo do meio do fogo cruzado de seus
pais e como corolário de sentimentos de angústia
desnecessários (ver depoimento do menor – fls.103/104).

Aqui, a guarda única ou exclusiva do adolescente de 14


anos, aquela conferida a um só dos genitores, passou a ser
insuficiente para atender as necessidades e interesses do
filho. A guarda compartilhada baseia-se na residência fixa
para o menor, partilham-se os direitos e deveres entre os
pais. Conclui-se que um dos pais pode manter a guarda
material ou física do filho, porém, ambos possuem os
mesmos direitos e deveres para com o menor, o que evita
disputas. Desse modo, se o adolescente num futuro próximo
desejar voltar a residir com a mãe, nesse caso, evita-se
nova demanda e o inevitável abalo psicológico do maior e
único interessado, qual seja: o adolescente.

Na realidade, pode-se observar, notadamente no


depoimento pessoal do menor que o maior interesse seu
está na possibilidade de conviver o máximo possível com
ambos os genitores e estes infelizmente estão atrapalhando
a sua lídima vontade. Essa convivência incluiu a visitação
livre sem limite temporal, o que é deveras recomendável
para o menor.

Pois bem: as vantagens da guarda compartilhada estão


presentes na demanda, basicamente em função da idade do
adolescente (14 anos), de uma melhora de sua auto-estima,
melhora no rendimento escolar, diminuição do sentimento de
tristeza e frustração, já que permite o seu acesso sem
dificuldade a ambos os pais e de uma convivência igualitária.

Cabe ter presente que, nada obstante o pai e a mãe,


respectivamente Autor e Ré terem desfeito os laços, é
importante que o filho adolescente não perca o vinculo com
os pais, sendo certo que a guarda compartilhada irá permitir
esse maior convívio, conquanto a vontade do menor em
permanecer certo tempo com o pai e outro período com a
mãe será respeitada, de molde prevalecer o seu melhor
interesse.

Parágrafo dedicado ao menor/adolescente NATAN IGOR


ZONTA. Preciso sublinhar que, com a guarda compartilhada
você NATAN deixará de ser objeto de disputas judiciais (total
de três) e de ser freqüentador assíduo do fórum, conquanto
no seu depoimento pessoal foi dito que em decorrência só
do presente processo “...já esteve no fórum três vezes;”
(fl.s103/104), sendo que pela quarta vez foi na Audiência de
Instrução e Julgamento. Você NATAN no seu curto tempo de
vida já freqüentou o fórum bem mais que qualquer outro
adulto. Agora chega, não é mesmo. Sublinho que, de objeto
de disputa, você deve passar a ser merecedor de atenção,
carinho, admiração e respeito. Com a guarda
compartilhada seus pais necessariamente deixarão de
disputá-lo na justiça para lutar pelo seu amor em casa
como deve ser. A sua opinião e vontade de agora em
diante deverá ser considerada pelos seus pais. NATAN,
se os seus pais não se falam entre si, isso é problema deles
e não seu. Daqui para frente, pelo menos, seus pais
terão que ouví-lo e conversar com você não como objeto
de disputa, porém, como um ser humano em formação.
NATAN, os pais muitas vezes erram por excesso de zelo e
amor. Tente compreender seus pais. Você me passou uma
ótima impressão na audiência, pois demonstrou ser um
adolescente, calmo, sincero, equilibrado e acima de tudo
seguro do que quer. Continue assim. Você é, a bem da
verdade, um exemplo para seus pais que infelizmente
esqueceram que um dia tiveram a sua idade. Confesso que,
você me surpreendeu com sua grande maturidade. Tenho a
absoluta certeza que você será um adulto muito melhor que
seus pais como, também, possuo a convicção que meus
filhos serão melhores do que eu. A guarda compartilhada
permitirá a você um maior trânsito a casa do seu pai e de
sua mãe e não haverá limitação de tempo de visita, pois a
sua idade e maturidade assim permitem. Você NATAN,
também, terá a dupla cobrança, visto que haverá co-
participação de ambos na sua criação, educação e
orientação. Nunca deixe de ouvir seus pais, mas faça-se
ouvir também. A guarda compartilhada permitirá isso. Em
vez de ações de guarda, de modificações ou revisões e
frequência ao fórum, haverá de ter respeito a sua condição
de ser humano em formação e aos princípios voltados à
proteção da pessoa humana. Assim, a guarda compartilhada
no seu caso redimensiona a confirmação desses valores que
foram esquecidos pelas partes. NATAN, para finalizar esse
parágrafo quero deixar consignado que até o fim do ano
letivo você deverá permanecer fisicamente com sua mãe, a
fim de não atrapalhar seus estudos já que o seu colégio está
localizado na Ilha do Governador. A partir do ano que vem a
guarda passará a ser compartilhada e você escolherá com
quem irá morar, sempre lembrando que a visitação será
livre. Seja feliz. Estou enviando uma cópia dessa sentença
para você.

Feitas essas considerações convém acentuar que o filho


precisa igualmente do pai e da mãe. É necessário que um
permita o direito de existência do outro na vida de seu filho.
A separação conjugal não pode alimentar a ruptura parental,
pois o adolescente de 14 anos de idade precisa de ambos
para ter um bom desenvolvimento cognitivo, psíquico e
emocional. No caso em tela, a guarda conjunta é o único
caminho possível para assegurar ao filho/adolescente a
presença contínua de ambos os genitores, mesmo que os
pais não compreendam a importância dessa convivência.

Isto posto, ante a fundamentação acima, JULGO


PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução
de mérito (art.269, inciso I do CPC), a fim de deferir a
GUARDA COMPARTILHADA do filho/adolescente aos pais,
ressaltando que a visitação deverá ser exercida livremente
ao outro que não deter a guarda física ou material do menor.
Ressalto que, até o final do ano letivo (2009), a guarda física
do menor permanecerá com a Ré/mãe, no sentido que os
estudos não sofram solução de continuidade, haja vista que
o menor está estudando no colégio localizado na Ilha do
Governador. Após este período o menor/adolescente terá a
faculdade de escolher com quem irá morar, conforme desejo
seu externado no curso do processo. As custas serão
divididas e os honorários advocatícios compensados, tendo
em vista a sucumbência recíproca, ficando suspensa a
cobrança em favor da Ré (art.12, da lei nº 1.060/50).
Encaminhem-se cópias da sentença as partes, bem
como ao menor Natan Igor Zonta, através do correio.
Dê-se ciência ao Ministério Público. Com o trânsito em
julgado expeça-se o termo de guarda compartilhada. Em
seguida, dê-se baixa na distribuição e arquive-se.

P. R. I-se.

Rio de Janeiro, 24 de setembro de 2009.

ANTONIO DA ROCHA LOURENÇO NETO


JUIZ DE DIREITO

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