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MATRICIAL NO
SUS CAMPINAS
CAMPINAS
2015
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CRISTIANE PEREIRA DE CASTRO
MATRICIAL NO
SUS CAMPINAS
CAMPINAS
2015
ii
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca da Faculdade de Ciências
Médicas Maristella Soares dos
Santos - CRB 8/8402
iii
BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE TESE
MEMBROS:
iv
DEDICATÓRIA
Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons;
BERTHOLD BRECHT
vii
RESUMO
Esta pesquisa pretende investigar o modo como a concepção teórica Paideia e sua
aplicação metodológica –Apoio Matricial– vêm sendo incorporadas pelas instituições
públicas de saúde em Campinas (SP) e analisar repercussões desse referencial sobre o
cuidado em saúde. Trata-se de uma pesquisa de métodos mistos, realizada mediante a
estratégia explanatória sequencial (CRESWELL, 2009). As estratégias utilizadas foram:
A) Análise histórico-estrutural do campo, com estudo de documentos oficiais e inquérito
quantitativo exploratório realizado mediante a aplicação de questionários a 232
profissionais que utilizam o Apoio Matricial de Campinas (de um total de 277); B)
Observação participante do trabalho da equipe do NASF do Distrito Sudoeste e; C)
Grupos focais com os profissionais da Atenção Primária apoiados pela equipe NASF. Os
dados produzidos foram analisados mediante a estratégia de Triangulação de dados
(MINAYO, 2005). Identificaram-se alguns resultados principais: 1) o estudo de revisão
integrativa de publicações evidenciou que o Apoio Matricial é uma proposta inovadora,
em geral, tendo impacto na transformação do modelo assistencial. Entretanto, para atingir
seus objetivos tem sido necessário a superação de alguns impasses ligados diretamente à
estratégia de implementação e à superação de problemas estruturais do SUS; 2) percebeu-
se que o Apoio Matricial ocorre de modo bastante heterogêneo em Campinas, mas que,
após vinte anos de sua implantação, logrou-se importante grau de consolidação, podendo
ser considerado um elemento incorporado à cultura institucional, sustentado, em grande
medida, pelos profissionais e não necessariamente pela gestão municipal; 3) a
metodologia do Apoio Matricial é a base para a atuação da equipe NASF junto às equipes
de saúde da família, essa metodologia contribuiu para a legitimidade, instituição de um
vínculo afetivo e o desenvolvimento de uma relação interprofissional interativa. Em
alguma medida, o Apoio Matricial vem se configurando como uma práxis dinâmica,
capaz de lidar com a estruturação prévia e também com a improvisação frente ao
situacional, não se congelando em uma ação estável com objetivos definidos somente a
priori.
viii
ABSTRACT
This research aims to investigate how the theoretical conception Paideia and its
methodological application -Support Matricial- have been incorporated by the public
health institutions in Campinas (SP) and analyze the impact of this standard on health
care. It is a mixed methods research, carried out by the sequential explanatory strategy
(CRESWELL, 2009). The strategies used were: A) historical and structural analysis of
the field, with study of official documents and exploratory quantitative survey carried out
through the use of questionnaires to 232 professionals who use the Matrix Support of
Campinas (out of 277); B) Participant observation of the work of NASF team Southwest
District and; C) Focus groups with professionals in the primary health care supported by
NASF team. The data produced were analyzed by triangulation strategy data (MINAYO,
2005). Some key findings emerged: 1) the study of integrative publications review
showed that the Matrix Support is an innovative proposal in general, and impact on the
transformation of the care model. However, to achieve the objectives it has been
necessary to overcome some impasses connected directly to the implementation strategy
and to overcoming the structural problems of the SUS; 2) it was realized that the Matrix
Support is quite heterogeneously in Campinas, but that after twenty years of its
implementation, managed an important degree of consolidation and can be considered an
embedded element of institutional culture, sustained largely by professionals and not
necessarily by the municipal management; 3) The methodology of the Matrix Support is
the basis for the work of the NASF team together to family health teams, this
methodology contributed to the legitimacy , establishing a bonding and the development
of an interactive inter- relationship. To some extent, the Matrix Support is shaping up as
a dynamic practice, able to cope with the prior structure and also with the front
improvisation to situational, not freezing in a stable action with defined objectives only a
priori.
KEYWORDS: Health Policy; Family Health Support Centers; Matrix support; Primary
health care.
ix
LISTA DE QUADROS
PÁG.
Quadro 01- Relação das publicações que compuseram o estudo de acordo com
código, título, ano de publicação e autores......................................................................45
Quadro 02 - Relação das pesquisas empíricas segundo sujeitos investigados
na pesquisa e código dos estudos....................................................................................49
Quadro 03- Relação das categorias temáticas, com seus respectivos
estudos codificados, e a porcentagem dos estudos presentes em cada categoria............50
x
LISTA DE FIGURAS
PÁG.
xi
LISTA DE TABELAS
PÁG.
Tabela1 - Local de trabalho dos profissionais que atuam com apoio matricial,
Campinas, 2013 e 2014.....................................................................................................77
Tabela 2 - Principais formas de acionar o apoio segundo os profissionais,
Campinas, 2013 e 2014......................................................................................................86
Tabela 3 - Composição por categoria profissional, carga horária total e carga
horária destinada às atividades do NASF, Campinas, 2013 e 2014.................................104
xii
SUMÁRIO
PÁG.
APRESENTAÇÃO.........................................................................................................15
2-OBJETIVOS ................................................................................................................25
3- MÉTODO ...................................................................................................................26
4 – RESULTADOS .........................................................................................................32
5-CONCLUSÃO.....................................................................................................120
xiii
6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................127
7-APÊNDICES.............................................................................................................131
xiv
APRESENTAÇÃO
Esta pesquisa investigou uma experiência que foi desenhada e produzida por
vários atores cuja trajetória conformou a história do SUS Campinas. A concepção e
realização desta pesquisa conectou os profissionais apoiadores matriciais e de saúde da
família; com pesquisadores que compõem o Coletivo de Estudos e Apoio Paidéia, que a
cada discussão apontaram novas formas de aprender pesquisando e pesquisar
aprendendo; e, por fim, pelo meu desejo de refletir sobre as práticas em saúde, sobre o
trabalho que realizo no cotidiano e que há onze anos vem construindo minha atuação e
postura ética enquanto profissional do Sistema Único de Saúde.
Desde o final da minha graduação em Enfermagem pelo Departamento de
Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas/UNICAMP sempre optei por ocupar dois
lugares institucionais: o da prática profissional, atuando como trabalhadora e gestora, e o
da universidade, como aluna de pós-graduação, para refletir sobre e conseguir articular
teoria e prática.
Atuar no SUS sempre foi minha escolha e posso afirmar que me encanta, cada dia
mais, sua potência como política social pública, universal, democrática, voltada para
produzir uma saúde melhor para a sociedade. Além disso, também foi me ficando clara a
importância de utilizar o espaço universitário, não apenas para aprimoramento da minha
formação, mas também para vivenciar teorias que tivessem possibilidade de impactar no
fortalecimento das práticas mais solidárias e do cuidado geral em saúde.
Partindo dessas escolhas, encontrei no Departamento de Saúde Coletiva a
proposta que se alinhava aos meus desejos e na área de Política, Planejamento e Gestão
um caminho para conseguir articular saberes e práticas alinhadas às necessidades de
saúde da população.
Elementos vivos da minha prática, como o trabalho em equipe, a articulação da
rede assistencial, integralidade do cuidado e a instituição de maior democracia nas
relações institucionais me aproximaram da concepção teórica Paidéia desenvolvida por
Campos (2000). Porém, foi em 2009, quando assumi a coordenação da Central de
Regulação do município de Sumaré, e pude ocupar um lugar institucional privilegiado no
que se refere à articulação dos diferentes níveis assistenciais, que me interessei pelo
Apoio Matricial.
O Apoio Matricial se tornou um objeto de investimento e interesse, uma estratégia
que possibilitava instituir mudanças concretas no modelo assistencial vigente do
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município. Consegui, então, formular meus primeiros questionamentos no que se refere à
articulação de saberes interprofissionais entre as equipes e a necessidade de construir uma
relação mais democrática e dialógica entre as diferentes profissões.
A gestão municipal, nesse período, estava aberta às possibilidades de mudança e
foi possível tornar o Apoio Matricial uma diretriz. Assim, por três anos, pude vivenciar
um modo de fazer e de implementar o Apoio Matricial através da aproximação entre os
especialistas que atuavam no Ambulatório de Especialidades e profissionais da rede
básica, criando canais de comunicação mais democráticos entre eles, como espaços para
discussão de casos, definição de equipes de saúde da família que seriam referência para
os profissionais especialistas matriciadores, atualizações temáticas, construção de alguns
projetos terapêuticos compartilhados entre os diferentes serviços, pactuação de protocolos
de risco para acesso as especialidades médicas, entre outros. Tais iniciativas impactaram
diretamente nas filas de acesso para as consultas especializadas e possibilitaram a
construção de uma rede assistencial que atuava de forma mais articulada e com maior
grau de responsabilidade sanitária.
Entretanto, mesmo com essas experimentações do Apoio Matricial extremamente
ricas e singulares, com o passar do tempo, as ações de matriciamento foram se
enfraquecendo, a gestão deixou de adotar o Apoio Matricial como diretriz e os
profissionais desanimaram, relatando que não se sentiam formados para tal atividade.
Inquietava-me também perceber que a incorporação do matriciamento no discurso dos
profissionais não necessariamente refletia em mudanças na prática profissional cotidiana.
Seria o Apoio Matricial um jargão vazio? Como deveria ser feita sua implantação efetiva?
Como sustentar essa prática com o passar do tempo?
Assim, ainda tendo o Apoio Matricial como objeto de investimento, voltei minha
curiosidade para o município de Campinas. Esse município é considerado o precursor da
implementação desta estratégia para o trabalho interprofissional, e tem um protagonismo
histórico na experimentação de novas formas de produzir o cuidado. Pareceu-me uma
contribuição relevante "trazer luz" sobre essa história.
Optei então por ouvir mais da história desse município; compreender como foi se
constituindo a proposta do apoio matricial na trajetória do SUS Campinas; observar como
de fato estava ocorrendo o Apoio Matricial (passados vários anos da sua formulação),
como os profissionais sustentavam o matriciamento a despeito do baixo investimento da
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gestão, ao longo dos últimos dez anos, nessa metodologia e, por fim, também ampliar as
reflexões sobre a potência concreta desta estratégia sobre o cuidado prestado aos usuários.
Construí então o projeto que se fez nesta pesquisa, a qual integra um projeto maior
intitulado “Investigação sobre cogestão, apoio institucional e apoio matricial no SUS",
que recebe apoio financeiro do convênio Programa de Pesquisa para o SUS, da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq) e da Secretaria Estadual de Saúde de
São Paulo. É desenvolvido pelo Coletivo de Estudos e Apoio Paidéia, sob coordenação
do Professor Doutor Gastão Wagner de Sousa Campos.
- 18 -
INTRODUÇÃO GERAL
1.1 - Apoio Matricial
Esta pesquisa nasce como um subprojeto de uma pesquisa intitulada “Investigação
sobre cogestão, apoio institucional e apoio matricial no SUS”, coordenada pelo Professor
Doutor Gastão Wagner de Sousa Campos.
Segundo Onocko Campos (2005), os objetos de pesquisa da Área de Planejamento,
Política e Gestão (linha de pesquisa onde a presente investigação está inserida) são
complexos dizem respeito às modalidades de práxis sob vários ângulos. Há sempre um
grande número de variáveis a serem consideradas e, na maioria das vezes, essas numerosas
variáveis não são passiveis de medições apuradas no formato quantitativo e, menos ainda,
em sua forma consagrada: a estatística.
O objeto desta investigação é a estratégia de Apoio Matricial que foi formulada
dentro da linha de pesquisa voltada para o estudo das organizações e do trabalho em saúde
denominada de “Política, modelo de atenção e de gestão: investigação teórica e
metodológica”, apoiada pelo CNPq (1996-2001).
O Apoio Matricial é uma metodologia que sugere um funcionamento para o
trabalho em rede, valorizando uma concepção ampliada do processo saúde doença, a
interdisciplinaridade, o dialogo e a interação entre profissionais que trabalham em equipes
ou em redes e sistemas de saúde. (CAMPOS, 1999; FIGUEIREDO & ONOCKO
CAMPOS, 2009).
O objetivo dessa metodologia é assegurar retaguarda especializada a equipes e
profissionais encarregados da atenção a problemas de saúde de maneira personalizada e
interativa, utilizando os conceitos de núcleo e campo de saberes e práticas em saúde.
Assim, um profissional especialista com determinado núcleo apoia especialistas com
outro núcleo de formação, objetivando a ampliação da eficácia e efetividade de sua
atuação.
Desta forma, o Apoio Matricial pretende construir um modo de operar o trabalho
a partir de diretrizes nem sempre fáceis de compatibilização. Em primeiro lugar, busca
levar a lógica da cogestão e do apoio para as relações interprofissionais, substituindo as
tradicionais modalidades de relação burocrática e com grande desequilíbrio de poder.
Na saúde, tenta criticar e reconstruir a tal da “interconsulta” e dos “sistemas de referência
e contrarreferência”. Em segundo lugar, reconhecendo a complexidade dos processos
sociais, sanitários ou pedagógicos, busca pensar modos de se lidar com estes processos
- 19 -
segundo o referencial da interdisciplinaridade e da interprofissionalidade. Procura,
portanto, a constituição de equipes multiprofissionais para o enfretamento de problemas
sem, contudo, perder-se o padrão de responsabilização e compromisso com a produção
de saúde. Trata-se de uma proposta de mudança do arranjo organizacional e das
responsabilidades profissionais e gerenciais, de modo a facilitar a cogestão em locais
onde é necessário um trabalho em equipe.
De acordo com algumas pesquisas (ONOCKO CAMPOS et al, 2011;
FIGUEIREDO & ONOCKO CAMPOS, 2009; MIELKE & OLCHOWSHI, 2010), o
Apoio Matricial tem sido efetivo para definir fluxos conforme a necessidade e
singularidades dos casos, qualificar a capacidade resolutiva das equipes, promover
assistência conjunta e compartilhada, ampliar o poder resolutivo da atenção básica,
coresponsabilizando com outros setores/instituições as estratégias de cuidado e alterando
a lógica de referência e contrarreferência.
O Apoio Matricial objetiva manter coresponsabilidade pelo projeto terapêutico
mesmo quando há encaminhamento dos casos para outros serviços. Na Atenção Básica,
o Apoio Matricial pretende assegurar que a Equipe de Referência continue como
coresponsável, assumindo a função de coordenação do caso, mesmo quando o paciente é
acompanhado em outra instâncias no sistema.
A lógica do Apoio Matricial sugere a construção compartilhada de protocolos e de
diretrizes clínicas e sanitárias, definindo os casos que podem ser acompanhados na
Atenção Básica (com apoio do profissional especialista) e os casos que deverão ser
atendidos no nível especializado, diminuindo-se os encaminhamentos desnecessários e,
consequentemente, as filas de espera.
A composição de uma rede matricial de apoio às Equipes de Referência na Atenção
Básica busca disparar uma série de mudanças na atenção em saúde, no sentido da
coresponsabilização, da ampliação da clínica e da interdisciplinaridade: a) evitar a
fragmentação da atenção, a medicalização e outros danos e iatrogenias provocados pelo
“consumo” excessivo de tratamentos, procedimentos e exames; b) proporcionar
coeficientes terapêuticos de acordo com as vulnerabilidades e potencialidades de cada
usuário, promovendo com isso maior equidade e ampliando o acesso às demandas de
maior gravidade; c) construir dispositivos de atenção em resposta às diferentes
necessidades dos usuários e do território, e estimular a articulação entre os profissionais
na elaboração de ofertas para cada situação singular; d) romper com a produção de
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excessivos encaminhamentos às especialidades e produzir coresponsabilização, de modo
que o encaminhamento preserve o vínculo e possa ser feito com outra lógica: a do diálogo
entre os serviços e os profissionais (FIGUEIREDO & ONOCKO CAMPOS, 2009).
A metodologia de Apoio Matricial foi desenvolvida levando em consideração
observações sistemáticas sobre as relações interprofissionais e referencial teórico sobre
trabalho em equipe e em rede. Os primeiros estudos e elaborações teóricas ocorreram no
SUS de Campinas/SP; primeiro, em equipes de saúde mental inseridas na atenção
primária e, posteriormente, em outras equipes de Hospitais, Centros de Referência para
AIDS, Reabilitação Física, durante a década de noventa (DOMITTI, 2006; CAMPINAS,
2001; CAMPINAS, 2003).
O município de Campinas, desde 1989, criou equipes de saúde mental na atenção
básica, objetivando reforçar a capacidade de resolver problemas de saúde e ainda
construir um novo modelo de cuidado em saúde mental. Posteriormente, a partir de
constituição da rede de reabilitação psicossocial, o apoio matricial passou a também ser
utilizado como metodologia para ordenar a relação dos serviços especializados em saúde
mental (CAPS) com as unidades de atenção básica (BRAGA-CAMPOS, 2000). E por se
tratar de uma metodologia para ordenar relações interprofissionais dentro de um mesmo
serviço ou na rede de saúde, possível de ser utilizado em várias áreas de saber
especializado, depois de um tempo se expandiu para outras áreas como a reabilitação
física, traumatologia, dermatologia e outros serviços especializados.
Com o passar do tempo, a implantação do apoio matricial se expandiu para outros
municípios dos pais (Belo Horizonte/MG, Quixadá/CE, Sobral/CE, Recife/PE,
Aracaju/SE, Rio de Janeiro/RJ).
No ano de 2003, alguns programas do Ministério da Saúde, Humaniza-SUS
(BRASIL, 2004a; 2004b), Saúde Mental (BRASIL, 2003) e Atenção Básica (BRASIL,
2003) também incorporaram essa perspectiva. Contudo, foi em 2008, após um longo
período de debate, que o Ministério da Saúde publicou uma nova política denominada de
Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), criados pela Portaria nº 154, de 24 de
Janeiro de 2008. Essa política prevê recursos financeiros destinados especificamente para
a contratação de profissionais de apoio para as equipes de Saúde da Família e que
utilizariam metodologia de trabalho baseada na metodologia do Apoio Matricial.
A relevância desse estudo deve-se ao fato de que o Apoio Matricial, apesar de ser
uma proposta nova, demonstra evidências de estar em expansão no cenário nacional, em
- 21 -
especial a partir da criação do NASF, e, ainda, por trazer um componente inovador para
transformação do modelo assistencial ao sugerir transformações no desenho da rede do
Sistema Único de Saúde (SUS), já que borra a fronteira entre atenção básica e serviços
especializados.
A escolha do município de Campinas, como local de desenvolvimento dessa
pesquisa, justifica-se pela complexidade de seu sistema de saúde, que atualmente conta
com uma extensa rede de serviços, instâncias de gestão e controle social, e pelo seu
pioneirismo na implantação do SUS, sobretudo na constituição da Atenção Básica,
iniciada durante a década de 1970. Além disso, o município é considerado historicamente
como precursor da metodologia de Apoio Matricial, que com o passar dos anos se
expandiu, sendo utilizada em políticas e práticas de saúde em todo Brasil.
- 22 -
possibilidade de ação das pessoas sobre relações interpessoais, seja na política, na gestão
e nas práticas sanitárias.
O método procura analisar a dinâmica do desejo e do interesse próprio,
estimulando, ao mesmo tempo, que se considere o desejo e interesse dos outros em uma
dinâmica histórica e social. O Método Paideia é um esforço para sistematizar modos de
intervir de forma deliberada nessa dinâmica, reconhecendo que o controle sobre este
processo será sempre parcial, já que há inúmeros fatores produzindo efeitos sobre pessoas
e instituições.
Sendo assim, a Práxis Paideia é,
"[...] tanto uma proposta de sociabilidade democrática quanto, ao mesmo tempo,
uma metodologia para a formação de pessoas, objetivando a ampliação de sua capacidade
de analisar e de intervir sobre as relações sociais" (CAMPOS, CUNHA & FIGUEIREDO,
2013, p 15).
Tal concepção aplica-se à política, gestão, pedagogia, saúde coletiva e clínica. As
estratégias metodológicas Paideia buscam compreender e interferir em afetos, no
conhecimento e em relações de poder. A política trata de modos para operar com o poder;
a pedagogia, com o conhecimento; as terapias da subjetividade, com o afeto. Estes
campos disciplinares, contudo, separam essas três dimensões, quando na realidade elas
atuam de forma conjugada, simultâneas.
A constituição de sujeitos, das necessidades sociais e das instituições é um produto
de relações de poder, do uso de conhecimentos e de modos de circulação de afetos. A
metodologia Paideia objetiva ampliar a capacidade de as pessoas lidarem com o poder,
com circulação de afetos e com o saber; ao mesmo tempo em que estão fazendo coisas,
trabalhando, cumprindo tarefas, aprendendo ou sendo cuidadas por equipes de saúde.
Essa concepção preconiza a reforma das organizações de saúde com base na
cogestão, ou seja, o estabelecimento deliberado de relações dialógicas, com
compartilhamento de conhecimentos e de poder.
Reconhece-se pela concepção Paideia, a existência de dois grandes campos de
conhecimento e de trabalho em saúde: o clínico e o de saúde coletiva. Ainda que tenham
elementos de contiguidade e sobreposição - o campo comum-, apresentam espaço
específico que os distingue - núcleo próprio (CAMPOS, 2000). Faz-se então necessário
um esforço teórico e prático para a articulação da função clínica e da função de saúde
coletiva, buscando meios para integrar a atuação desses dois campos, sempre que
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necessário. A depender do problema de saúde predominará a função clínica, em outros, a
função de saúde coletiva.
O Apoio é uma aplicação metodológica da concepção Paideia. Pode ser utilizado
na gestão de organizações sob a forma do Apoio Institucional e pode ser utilizado na
gestão da clínica como forma de operar nas relações interprofissionais e em projetos
coletivos ou grupais de educação em saúde, comunitários ou de saúde pública através do
Apoio Matricial (objeto desse estudo). O Apoio Paideia também tem sido utilizado como
estratégia metodológica para Pesquisas do tipo Intervenção (FURLAN, 2008;
MASSUDA, 2010; CASTRO, 2011; CESAR, 2011); e como recurso pedagógico para a
formação em saúde (FURLAN; AMARAL, 2008; CUNHA, 2009; FIGUEIREDO, 2012;
FURLAN, 2012).
Nesses diferentes âmbitos, parte-se da constatação da diferença constitutiva e
essencial entre os distintos atores sociais (gestor, trabalhador e usuários), tanto do ponto
de vista de papel social quanto de poder, com vistas a desenvolver relações baseadas no
diálogo e no estabelecimento de contratos entre os envolvidos, de modo a permitir que a
abordagem das questões relativas à clínica e à gestão em saúde possa ser construída
democraticamente considerando os diferentes saberes e interesses.
- 24 -
OBJETIVOS
Esta pesquisa se insere no campo da saúde coletiva e busca compreender a
experiência do SUS Campinas (SP) analisando as práticas de saúde desenvolvidas
segundo a perspectiva do Apoio Matricial.
Assim, tem como pergunta de partida: O Apoio Matricial, quando utilizado na
Atenção Básica, contribui para democratização das relações interprofissionais e para o
aumento da capacidade de resolver problemas de saúde? No intuito de responder à
questão acima, a pesquisa apresenta os seguintes objetivos:
- 25 -
MÉTODO
Considera-se importante destacar que alguns dos resultados obtidos por meio
deste estudo foram transformados em artigos (três artigos já submetidos) e desta forma
como partem de aspectos metodológicos que neste momento serão descritos haverá
repetição de conteúdo em alguns capítulos subsequentes.
- 26 -
3.2 - Estratégias para a construção do material empírico.
As estratégias utilizadas no trabalho de campo desta pesquisa podem ser
agrupadas em três tipos de instrumentos para a produção de informação: A) Análise
histórico-estrutural do campo, com estudo de documentos oficiais e inquérito
quantitativo exploratório (questionários).; B) Observação participante; C) Grupos focais.
- 27 -
compreensão do objetivo da pergunta e capacidade das perguntas para atender aos
objetivos propostos pela pesquisa.
A forma de aplicação dos questionários utilizada foi a de autopreenchimento, na
presença da pesquisadora envolvida neste estudo, para que os respondentes que tivessem
algum tipo de dúvida sobre o questionário pudessem pedir esclarecimentos. O momento
de preenchimento foi pactuado com os profissionais, dentro de sua disponibilidade, via
contato telefônico ou digital. Os questionários foram aplicados no período de Abril de
2013 a Novembro de 2014.
B) Observação participante.
Para esta etapa da pesquisa foi escolhido a equipe do NASF do Distrito Sudoeste
(Campinas) como objeto de investigação por dois motivos. O primeiro relacionado ao
fato de que o Ministério da Saúde incorporou elementos da concepção Paidéia e de sua
aplicação metodológica –Apoio Matricial– a partir de 2008 (BRASIL, 2008). Em
segundo lugar, porque durante a aplicação dos questionários identificou-se que no
município de Campinas há apenas uma única equipe NASF e merece uma análise
aprofundada.
Desta forma, foram utilizados como critérios de inclusão: a concordância do
profissional em participar da pesquisa; profissionais que atuassem no NASF e nas equipes
de saúde da família apoiadas pela equipe NASF, e que estivessem atuando no SUS
Campinas há pelo menos um ano. Foi utilizado como critério de exclusão a recusa do
profissional em participar da pesquisa.
As observações foram realizadas com o objetivo de levantar informações sobre as
práticas cotidianas dos profissionais que atuam no NASF e seu papel de apoiador
matricial junto as equipes de saúde da família.
Considera-se que na observação participante há uma inevitável interferência do
pesquisador no contexto de observação. Conforme aponta Minayo (2007), o observador
“fica em relação direta com seus interlocutores no espaço social da pesquisa, na medida
do possível, participando da vida social deles, no seu cenário cultural, mas com a
finalidade de colher dados e compreender o contexto da pesquisa. Por isso, o observador
faz parte do contexto sob sua observação e, sem dúvida, modifica esse contexto, pois
interfere nele, assim como é modificado pessoalmente” (p. 70).
- 28 -
Para o registro das observações foi utilizado o diário de campo e nele foram
anotados a descrição do local e dos sujeitos participantes, as atividades realizadas,
informações prestadas por outras pessoas informalmente, enunciados verbais que
constituem citações dos atores sociais em estudo e as impressões do pesquisador.
Esta etapa de observação ocorreu entre outubro de 2013 e fevereiro de 2014, essa
etnografia foi realizada em diferentes dias da semana e períodos que contemplavam o
horário de funcionamento do serviço. Levou-se em consideração o critério de saturação,
obtendo-se um total de 55 horas de observação.
C) Grupos focais.
Segundo Morgan (1997), os grupos focais são uma técnica de pesquisa que capta
o discurso por meio das interações grupais ao se discutir um tópico especial sugerido pelo
pesquisador. No caso da presente pesquisa, o objetivo da realização do grupo focal foi
averiguar a percepção dos profissionais de saúde da família sobre o Apoio Matricial que
recebem do NASF.
É importante destacar que o roteiro do grupo focal (Apêndice B) foi construído
exclusivamente para essa pesquisa, dando-se destaque a três eixos: 1) percepções sobre
as práticas de Apoio Matricial; 2) efeitos do Apoio Matricial sobre o trabalho da equipe
de Saúde da Família; 3) potencialidades e fragilidades do Apoio Matricial.
Foram realizados quatro grupos focais, um para cada uma das equipes apoiadas
pelo NASF, no período de março á junho de 2014. Todos os grupos contaram com a
presença dos profissionais que compõem as equipes de saúde da família, de um
moderador externo, responsável por coordenar o grupo, e de um relator para auxiliar, e
que se responsabilizou por anotar o início das falas dos participantes, as conversas
paralelas e os comentários complementares.
Ressalte-se que a coordenação dos grupos focais foi realizada por membros do
Coletivo de Estudos e Apoio Paidéia que não estavam inseridos diretamente neste estudo.
Todos os grupos focais foram áudio-gravados e, a partir dos dados primários
obtidos com a transcrição, foram construídas narrativas (Apêndices C,D,E,F), tal como
sugerido por Ricœur (1997).
Cada síntese elaborada com base nos grupos focais foi devolvida ao próprio grupo
para que ele criticasse a narrativa elaborada pelos pesquisadores. Esses espaços de crítica
foram denominados de momento reflexivo. Destaque-se que, nesse momento, o material
- 29 -
apresentado pelo pesquisador poderia ser complementado ou modificado, e os
profissionais puderam confirmar posições, rever argumentos, discutir diferenças entre
aquilo que disseram e o modo pelo qual foram interpretados e compreendidos, podendo
se reposicionar diante do próprio discurso e da tradição discursiva que os sustentava
(ONOCKO CAMPOS, 2005).
- 31 -
RESULTADOS
4.1 Sobre o SUS Campinas e a trajetória do Apoio Matricial
Campinas possui 1.154.617 (IBGE, 2015) habitantes e é considerada, em termos
populacionais, a terceira maior cidade do estado de São Paulo, apresentando IDH/2010
de 0,805 (15º SP, igual à capital São Paulo). É conhecida nacionalmente como polo
científico e tecnológico, contando com duas grandes universidades (Universidade
Estadual de Campinas/Unicamp e a Pontifícia Universidade Católica de
Campinas/PUCCAMP), além de diversas instituições de fomento de tecnologia de ponta
(CAMPINAS, 2006).
Dados de 2011 (IBGE, 2015), referente ao perfil populacional, apontam índice de
envelhecimento de 62,23%, sendo de 12,62% a participação da população com 60 anos e
mais de idade, enquanto a população com menos de 15 anos de idade é de 20,28%. A
Razão de Sexos é de 92,92%.
Em relação ao PIB, dados de 2008 indicam R$ 27.788.98 (per capita), valor
superior à média do estado, sendo o rendimento médio do campineiro, considerando o
total de vínculos empregatícios, de R$ 2.026,20 em 2009 (SEADE, 2015).
A escolha do município de Campinas, como local de desenvolvimento dessa
pesquisa, justifica-se pela complexidade de seu sistema de saúde, que atualmente conta
com uma extensa rede de serviços, instâncias de gestão e controle social, e pelo seu
pioneirismo na implantação do SUS, sobretudo na constituição da Atenção Básica,
iniciada na década de 1970. Além disso, o município é considerado historicamente como
precursor da metodologia de Apoio Matricial que com o passar dos anos se expandiu,
sendo utilizada em políticas e práticas de saúde em todo Brasil.
Vale ressaltar ainda que tal escolha também ocorreu devido a proximidade física
da Universidade e também a trajetória do Grupo de Pesquisa Apoio Paidéia (coordenado
pelo orientador desse estudo da qual a pesquisadora faz parte) em realizar diversas
experiências de formação junto aos profissionais da rede municipal de saúde nos últimos
dez anos.
A cidade é gestora plena de seu sistema de saúde, modalidade de gestão em que
todas as decisões quanto ao gerenciamento de recursos e serviços, próprios, conveniados
e contratados, se dão no âmbito do município.
Já na década de 1970, período que antecede a criação do SUS, existia uma
articulação de movimentos populares que trouxe reflexos na estruturação da assistência à
- 32 -
saúde da população em Campinas. Nesta época, de acordo com L´Abbate (1990), houve
um processo de explosão urbana e crescimento do número de favelas na periferia do
município que mobilizou a gestão municipal, na figura do secretário de saúde Sebastião
de Moraes, a ampliar a rede dos postos de saúde na perspectiva do modelo de Medicina
Comunitária e participação popular. Os movimentos promovidos pelos Departamentos de
Medicina Preventiva e Social das maiores universidades do município, Unicamp e
PUCCAMP, compunham este contexto na medida em que constituíram projetos pilotos
de implantação de modelos alternativos de atenção à saúde no movimento sanitário.
Ao final da década de 1970, este programa de Medicina Comunitária se manteve
sob forma de um plano que permitiu caracterizar a política de saúde do município através
da democratização da atenção médica, da extensão da cobertura, com instalação de redes
básicas de atenção à saúde, que previam a hierarquização dos níveis de atenção da
medicina integral e a participação comunitária (NASCIMENTO, 2007).
Na década de 1980, com vistas à municipalização dos serviços de saúde, a
Prefeitura Municipal assinou em 1987, o convênio Sistema Unificado e Descentralizado
de Saúde (SUDS). Segundo Nascimento (2007), a gestão da SMS, iniciada em 1989,
adotou como prioridade a ampliação da rede de serviços, a reforma da gestão e do modelo
de prestação de serviços de saúde. Neste período, iniciou-se o processo de
municipalização dos serviços da Secretaria de Estado e do Instituto Nacional de
Assistência Medica (INANPS) do Ministério da Previdência, foi constituído um dos
primeiros Conselhos Municipais de Saúde do país e dobrou o número de Centros de Saúde
e equipes de saúde mental. Além do Conselho Municipal, foram progressivamente sendo
criados Conselhos Locais de Saúde, com participação de usuários, profissionais e
gestores, em quase todos os serviços do SUS (L´ABBATE, 1990).
Destaca-se que já havia uma tradição de participação popular em saúde no
município. Organizaram-se, neste período movimentos de saúde em vários bairros e
sindicatos. Assim, fica clara a luta dos movimentos sociais na história do SUS Campinas
e claro que isso trouxe diversos conflitos os quais, em grande medida, permearam o
processo de constituição do SUS local.
Nos anos 1990, foi estimulada, dentro da rede municipal, uma discussão sobre os
modos para alterar-se o paradigma clínico e sanitário na prática. Reforçava-se a
importância de reformulação da clínica em todas as instâncias do sistema, chamando-se
- 33 -
atenção para os aspectos subjetivos, sociais e de educação em saúde, habitualmente
descuidados na clínica tradicional (DOMITTI, 2006).
Assim, durante a década de 90, neste contexto de mudanças, que teve origem a
formulação do conceito de Apoio Matricial, iniciado a partir de reflexões sobre as
relações interprofissionais entre equipes de saúde mental, inseridas na atenção primária,
o município de Campinas criou equipes de saúde mental na Atenção Básica, objetivando
reforçar a sua capacidade de resolver problemas de saúde e ainda construir um novo
modelo de cuidado em saúde mental. Posteriormente, com a constituição da rede de
reabilitação psicossocial, o Apoio Matricial passou a também ser utilizado como
metodologia para a relação dos serviços especializados em saúde mental (CAPS) com as
unidades de Atenção Básica (BRAGA - CAMPOS, 2000).
A partir de 2001, a Secretaria Municipal de Saúde incorporou o referencial Paideia
na organização e gestão de diversas instâncias do SUS Campinas (CAMPINAS, 2003).
Com esse projeto as discussões que já haviam sido iniciadas foram reavivadas, iniciando
uma reformulação do modelo de atenção na atenção primária que passou a ser organizada
em lógica semelhante à Estratégia de Saúde da Família incorporando à rede básica novos
profissionais: o médico generalista e o agente comunitário de saúde. Vale ressaltar, que o
município adotou um modelo ampliado em relação ao modelo sugerido pelo Ministério
da Saúde, dialogando com a dinâmica de funcionamento já instalada no município e
incorporando princípios, arranjos e dispositivos que compõem o conjunto de conceitos
desenvolvido por Campos em sua tese de Apoio Paideia: Clínica Ampliada, Cogestão,
Equipes de Referência, Apoio Matricial, Colegiados Gestores e Apoio Institucional
(CAMPOS, 1999).
Os profissionais das Unidades Básicas foram organizados em Equipes de
Referência, similares às equipes da Saúde da Família na adscrição de clientela e na
definição do trabalho a partir das necessidades de seu território de abrangência, porém,
contando com outros profissionais além do médico generalista, da enfermagem e dos
agentes comunitários de saúde (foram incorporados à equipe o pediatra, o ginecologista
e o dentista). Este desenho tornou ainda mais complexa a configuração da rede básica de
Campinas em relação aos demais municípios e aumentou a expectativa sobre a capacidade
resolutiva da Atenção Básica.
Entretanto, a implantação do Projeto Paidéia não se efetivou de maneira simples
e houve neste período diversos conflitos envolvendo a resistência dos profissionais que
- 34 -
eram contra esse projeto e desejavam manter o modelo de atenção Programático segundo
ciclos de vida. Além disso, havia também uma desconfiança da população em relação a
essa nova proposta e a votação do Projeto Paidéia no Conselho Municipal de Saúde foi
muito debatida, vencendo por pequena diferença no número de votos.
Assim, devido a essas questões instalou-se uma ambiguidade no modo de
organizar o SUS Campinas, pois, uma parte dos centros de saúde adotou o modelo Paidéia
incorporando como menor unidade de gestão a equipe de referência interdisciplinar e
outros permanecem valorizando ações programáticas. Vale ressaltar, que essas
ambiguidades mantêm-se até hoje e traz aspectos positivos e negativos no modo de
organizar a atenção a saúde em âmbito local.
No período entre 2001 e 2004, Campinas ficou conhecida como um dos
municípios que mais investia em saúde no Brasil e passou a contar com 135 equipes de
saúde da família. Os centros de saúde passaram a desenvolver atividades com grupos de
pacientes, levando em conta não só a doença. Os Núcleos de Saúde Coletiva passaram a
investir em problemas relacionados às pessoas, grupos, instituições e ao meio ambiente.
Nesse momento, há um esforço concentrado nas ações de formação de pessoal,
valorização e criação de novos espaços coletivos com objetivo de instituir maior
democracia institucional.
Segundo estimativa da Secretaria Municipal da Saúde (CAMPINAS, 2003), até
meados de 2002, aproximadamente 2.630 profissionais haviam participado de algum
curso de capacitação, demonstrando a importância que a gestão em questão atribuía à
necessidade de conciliar mudanças estruturais com investimentos de formação dos
profissionais. No entanto, esse processo parece ter sido interrompido, pois no
levantamento bibliográfico realizado nos arquivos da Secretaria Municipal de Saúde de
Campinas, o único processo formativo voltado para a capacitação de profissionais para
atuarem na lógica do Apoio que consta nos registros oficiais é este desenvolvido entre
2001 e 2004, dado reforçado pelo discurso dos profissionais recolhido em outros estudos
(FERNANDES, 2014; OLIVEIRA, 2014).
Após esta capacitação que ocorreu durante o Programa Paideia (2001-2004),
houve apenas algumas iniciativas pontuais de formação voltadas para a difusão da
Práxis Paideia. Atualmente, essas ações de formação para o Apoio, na Secretaria
Municipal de Saúde, são desenvolvidas mediante o investimento das Universidades,
especialmente do Departamento de Saúde Coletiva da UNICAMP, sob o formato de
- 35 -
pesquisas-intervenção (CASTRO, 2011; CESAR, 2011; FURLAN, 2012; FIGUEIREDO,
2012).
Conforme já apontado, o município de Campinas apresenta uma tradição na
implantação da metodologia do Apoio Matricial, sendo historicamente importante e
majoritário na área de saúde mental.
A partir de 2004, o Apoio Matricial se expandiu para outras áreas de saber
especializado, concebendo o matriciamento como diálogo entre equipes de especialistas,
dos serviços secundários (Ambulatório e Centros de Referência) e das Unidades Básicas
de Saúde.
Contudo, apesar da experiência do município ter inspirado o Ministério da Saúde
a criar o Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF) por meio da Portaria GM n°154
(BRASIL, 2008), é somente em 2008 que Campinas inicia as discussões sobre a
implantação do NASF. Entretanto, por diversas questões relativas à dificuldade de
contratação de novos profissionais, essa discussão permaneceu estagnada até meados de
2010, quando foi retomada.
Com o avançar das reflexões sobre o tema, em abril de 2011, foram constituídas
as três primeiras equipes de NASF municipal nos Distritos de Saúde Sudoeste, Norte e
Sul. Nesse período definiu-se que as atribuições do NASF seriam:
• Arranjo de apoio do saber especializado para a clínica generalista que ocorre na
Atenção Primária;
• Oportunidade de se colocar em prática o trabalho multiprofissional (entre
especialista e equipes de saúde da família), que passa por capacitação e atividades
educativas, a fim de construir novos saberes;
• Dispositivo para construção da clínica ampliada e superação do modelo
hegemônico com ações centradas no médico.
Definiu-se também que o processo de trabalho das equipes deve estar em
conformidade com as diretrizes do Apoio Matricial (CAMPOS, 1999) e sua atuação deve
ter os seguintes eixos principais: discussão de caso, atendimento compartilhado,
promoção e atualização de temas relevantes para a Atenção Primária e elaboração de
Projetos Terapêuticos compartilhados.
A equipe NASF montada pelo distrito Sul logo no início teve problemas relativos
à saída de profissionais e, como não houve reposição, não conseguiu de fato iniciar suas
atividades junto às unidades de saúde. No que se refere à equipe do Distrito Norte sua
- 36 -
atuação ocorreu até fevereiro de 2013 quando as duas últimas profissionais do NASF se
desligaram sendo alocadas em outros serviços. Assim, atualmente, apenas a equipe NASF
do Distrito Sudoeste continua implantada no município e desenvolvendo suas atividades
junto a quatro equipes de saúde da família.
Vale ressaltar que durante os últimos dez anos a gestão municipal não tem adotado
a estratégia de Apoio Matricial como diretriz de governo. E, apesar dessas dificuldades
institucionais, diversos profissionais ainda têm sua identidade profissional pautada nesta
metodologia de trabalho e apostam no Apoio como facilitador da instituição de
mecanismos de cogestão de trabalho interprofissional.
Houve também uma clara retirada de investimentos na Atenção Básica, sem
proposição de estratégias ou diretrizes diferentes ou mesmo opostas às que foram
implantadas durante o Programa Paideia. Segundo dados da Secretaria Municipal de
Saúde em 2001, o município contava com 167 equipes de saúde da família e em 2012
eram 91 para atender uma população maior. O número de agentes comunitários de saúde
caiu quase pela metade: de 564 em janeiro de 2006 diminuiu para 288 em janeiro de 2012
(CAMPINAS, 2015).
Já a partir de 2010, a gestão municipal, na área da saúde, manteve a ausência de
investimentos na Atenção Básica e passou a assumir um posicionamento de oposição e
enfrentamento às propostas de Apoio, de Cogestão e da Clínica Ampliada e
Compartilhada que haviam sido construídas. Muitos dos dispositivos criados passaram a
ser desconstruídos e foram implementadas medidas que buscavam impedir que os
profissionais se dedicassem a essas atividades, como, por exemplo, a cobrança constante
por produtividade e a falta de autonomia concedida aos profissionais para organizarem
suas agendas.
Destaca-se que para o SUS Campinas, os impactos negativos referem-se não
apenas ao desinvestimento na política de pessoal, na expansão e qualificação da rede, mas
numa precarização das condições de trabalho no município, outrora referência de
vanguarda na Saúde para o país. Constantemente se vivencia uma crise de
desabastecimento de insumos, medicamentos, fechamento de serviços, demissão de mais
de mil funcionários que eram contratados por meio de convênio com o parceiro histórico
na gestão da saúde mental e da saúde, o Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira, sem a
devida reposição. Devido a essa série de problemas estruturais e organizacionais fica claro
que Projeto político institucional para o SUS Campinas tem se distanciado cada vez mais
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das diretrizes universais e democráticas historicamente construídas e tal fato tem
desestimulado os profissionais que em geral ocupam-se de resolver urgências e oferecer
um pacote cada vez menor de ofertas assistenciais à população.
No período de desenvolvimento dessa pesquisa, observou-se que SUS Campinas
vivencia algumas movimentações. A primeira se refere à efetivação de mudanças no
modelo de gestão da Saúde no município com a escolha de apostar na parceria
públicoprivada como principal meio de expansão da rede assistencial, visto que em 09 de
março de 2015, foi aprovado, na Câmara de Vereadores, apesar da resistência dos
profissionais e movimentos sociais, o Projeto Lei n°10/15 (CAMPINAS, 2015) que
dispõe sobre a qualificação de entidades como Organizações Sociais, regulamentando sua
a entrada mediante contratos de gestão para assumir a gestão ligada à saúde, meio
ambiente, cultura, esporte e assistência social.
A segunda diz respeito à ampliação de 94 equipes de saúde da família, viabilizada
pela adesão do município ao Programa Mais Médicos, do Ministério da Saúde. Fato que
praticamente dobrou a capacidade de atendimento da Atenção Básica em regiões
vulneráveis do município (CAMPINAS, 2015).
Já a terceira, se refere ampliação das equipes de NASF no município. Esse tema
surgiu como uma das propostas da segunda Oficina de Atenção Básica de Campinas,
organizada pelo Conselho Municipal de Saúde, que ocorreu em dezembro de 2014. Essa
Oficina foi produto de um processo coletivo e participativo que envolveu os conselhos
locais e distritais, com a propósito de envolver as demandas dos territórios, construindo
reflexões pertinentes aos usuários, profissionais e gestores dos Centros de Saúde de
Campinas.
Assim o documento final apontou a necessidade de constituição de novas equipes
de NASF no município, visando dar suporte às equipes de saúde da família e que se
configurem não apenas em adequação dos profissionais que desempenham Apoio
Matricial hoje no município, buscando apenas conseguir recursos e, sim uma composição
singular que valorize as necessidades do território e das equipes (CAMPINAS, 2014).
Em janeiro deste ano, a Secretaria Municipal de Saúde através de um grupo gestor
iniciou o debate visando à ampliação das equipes NASF com a inclusão das demandas
ligadas à Oficina e este tema retornou para a agenda de todos os distritos de saúde.
O debate sobre o tema tem acontecido sistematicamente, porém ainda tem sofrido
algumas críticas e resistência, que inviabilizam prever qual será a nova configuração do
- 38 -
NASF no município. Existe claramente uma disputa entre duas propostas: uma utilizando
os recursos humanos já existentes que possibilitará a captação de recursos junto ao
Ministério da Saúde, mas com pouco investimento em novas contratações e; outra que
busca analisar os recursos existentes, tendo com eixo principal, a possível expansão do
número de profissionais contratados, tendo em vista as necessidades do território e das
equipes de Atenção Básica.
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ARTIGO 1
AUTORES:
Cristiane Pereira de Castro
Gastão Wagner de Sousa Campos
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RESUMO
Este artigo buscou realizar uma revisão integrativa da produção nacional sobre a
metodologia de Apoio Matricial, abrangendo tanto estudos empíricos sobre a efetividade
quanto artigos de revisão teórico metodológicos sobre o Apoio Matricial. Foram
utilizados artigos indexados na base PubMed, na NLM e na BVS, no período de 1999 a
2013, em português, inglês e espanhol. Foram incluídos 28 artigos, cuja análise permitiu
a identificação de três categorias: 1) Artigos de fundação e consolidação do conceito de
Apoio Matricial; 2) Artigos de revisão sobre o Apoio Matricial; 3) Artigos decorrentes
de pesquisas empíricas envolvendo o conceito de Apoio Matricial. As publicações
evidenciaram que o Apoio Matricial traz uma proposta inovadora e importante para
transformação do modelo assistencial. Entretanto, para atingir seus objetivos é necessário
a superação de alguns impasses, vários interligados diretamente à implementação de suas
diretrizes e outros à superação de problemas estruturais do SUS.
Palavras-chaves: Revisão Integrativa, Apoio Matricial, Atenção Primária.
Abstract
This paper sought to carry out na integrative review of the national production on Matrix
Support methodology, whilst encompassing empirical studies on effectiveness and
theoretical-methodological review papers on Matrix Support. The used material is
comprised of papers that are indexed in the PubMed database, the NLM and the BVS
(Virtual Library of Health), between 1999 and 2013, in Portuguese, English and
Spanish.We included 28 articles, and its analysis allowed the identification of three
categories: 1) foundation goods and consolidation of the concept of matrix support; 2)
Review articles on the matrix support; 3) Items arising from empirical research involving
the concept of matrix support. The publications showed that the matrix support brings an
innovative proposal and powerful to transform the health care model. However, to
achieve their goals is necessary to overcome some impasses, several interconnected
directly with the implementation of their directives and to overcoming structural
problems of the National Health Sistema (SUS).
- 41 -
Introdução
O Apoio Matricial é uma metodologia para organizar o trabalho interprofissional,
tanto em equipes quanto em redes de atenção à saúde (CAMPOS,1999).
Utiliza, além dos conceitos de trabalho compartilhado e de cogestão, o referencial
da interdisciplinaridade, visão ampliada do processo saúde-doença-cuidado, em suas
dimensões sociais, sanitárias e pedagógicas e objetivas a construção de
corresponsabilidade no cuidado em saúde entre equipes multiprofissionais e profissionais
apoiadores especialistas. (CAMPOS et al., 2013)
A formulação da metodologia de Apoio Matricial se baseou na tradição teórica
dos sistemas de saúde nacionais, públicos e hierarquizados que propuseram um novo
modelo de gestão em saúde, com mecanismos de referência e contrarreferência,
interconsultas, protocolos e centros de regulação (ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA
DE SAÚDE, 1964).
O Apoio Matricial alterou essas metodologias de trabalho, como a interconsulta e
os sistemas de referência e contrarreferência, mediante mecanismos de personalização,
diálogo, decisão compartilhada, responsabilização e compromisso entre as equipes e os
profissionais apoiadores especialistas. Além do cuidado compartilhado, verificou-se que
essa metodologia funciona, ao mesmo tempo, como uma forma de educação permamente,
uma vez que os profissionais com distintas formações ampliam a comunicação entre eles
ao conduzir casos de forma compartilhada.
Estas alterações foram realizadas também levando em consideração reflexões e
observações sistemáticas sobre as relações interprofissionais; primeiro em equipes de
saúde mental inseridas na atenção primária e, posteriormente, em outras equipes de
Hospitais, Centros de Referência para AIDS, Reabilitação Física da rede pública de
Campinas/SP durante a década de noventa (DOMITTI, 2006; CAMPINAS, 2001).
O município de Campinas, desde 1989, criou equipes de saúde mental na atenção
básica, objetivando reforçar a sua capacidade de resolver problemas de saúde e ainda
construir um novo modelo de cuidado em saúde mental. Posteriormente, a partir de
constituição da rede de reabilitação psicossocial o Apoio Matricial passou também a ser
utilizado como metodologia para a relação dos serviços especializados em saúde mental
(CAPS) com as unidades de atenção básica (BRAGA-CAMPOS, 2000). E por se tratar
de uma metodologia para ordenar relações interprofissionais dentro de um mesmo serviço
ou na rede de saúde, possível de ser utilizado em várias áreas de saber especializado,
- 42 -
depois de um tempo se expandiu para outras áreas como a reabilitação física,
traumatologia, dermatologia e outros serviços especializados.
Em 2008, após um longo período de debate, o Ministério da Saúde publicou uma
nova política denominada de Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), criados pela
Portaria nº 154, de 24 de Janeiro de 2008. Essa política prevê recursos financeiros
destinados especificamente para a contratação de profissionais de apoio às equipes de
Saúde da Família e que utilizariam metodologia de trabalho baseada no arranjo estrutural
Apoio Matricial. Atualmente, o NASF é regulamentado pela Portaria n°2.488, de 21 de
outubro de 2011e existem 3.125 NASFs implantados em diversos municípios do país
(BRASIL, 2015).
Foi realizada uma revisão bibliográfica relacionando o Apoio Matricial com a
produção internacional sobre trabalho interprofissional em saúde sob a denominação de
Cuidado Compartilhado e Trabalho Colaborativo (OLIVEIRA; CAMPOS, 2015).
Neste estudo os autores identificaram que a proposta de estabelecer troca de
conhecimento e atendimento compartilhado entre os diferentes profissionais das equipes
de Atenção Básica e especialistas, vem sendo utilizada de forma sistemática no cenário
internacional, prioritariamente no tratamento de doenças crônicas como no tratamento da
diabetes e na saúde mental, nos seguintes países: Reino Unido (STARFIELD, 2003),
Irlanda (SMITH et al., 2007), Austrália (KELLY et al., 2011), Canadá (VINGILIS et al.,
2007) e Espanha (GARCÍA-TALAVERA ESPÍN et al., 2012). Em Portugal, apesar de
ainda estar em estágio inicial, foi possível identificar iniciativas de cuidado compartilhado
entre profissionais da psicologia e da nutrição que já começaram a desenvolver uma
prática pautada pela relação dialógica e colaborativa com as equipes multidisciplinares
da Atenção Primária (PISCO, 2011; TRINDADE; TEIXEIRA, 2010).
Desta forma, partindo dos achados de Oliveira e Campos (2015), esse estudo
buscou realizar uma revisão integrativa da produção nacional sobre a metodologia de
Apoio Matricial, abrangendo tanto estudos empíricos sobre a efetividade quanto, artigos
de revisão teórico-metodológica sobre o Apoio Matricial.
A revisão que este artigo apresenta compõe uma pesquisa de doutorado do
Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da
UNICAMP.
- 43 -
Metodologia
Este estudo foi realizado por meio de uma Revisão Integrativa (COOPER,1982),
que é um método utilizado para agrupar os resultados de pesquisas primárias, sobre o
mesmo assunto, com o objetivo de sintetizar e analisar dados para construir uma avaliação
sobre o estado da arte da metodologia do Apoio Matricial no Brasil.
A questão norteadora desta revisão foi: Quais as contribuições e impasses da
aplicação do Apoio Matricial em saúde no Brasil como articulador das relações
interprofissionais entre Atenção Primária à Saúde e serviços especializados?
Conforme recomendações, foram definidos os critérios de inclusão e exclusão
adotados para a seleção dos estudos. Assim sendo, foram incluídos artigos na íntegra,
publicados em português, inglês e espanhol, que tratassem do tema da pesquisa,
contivessem as palavras-chave (atenção primária e Apoio Matricial) e fossem publicados
nos últimos 14 anos (1999 a 2013). Os critérios de exclusão foram: artigos incompletos e
apenas resumos, trabalhos não disponíveis online e que não traziam abordagem sobre a
temática do estudo.
A coleta de dados ocorreu de novembro de 2013 a junho de 2014. Foram acessados
artigos publicados desde 1999, ano da formulação da concepção de Apoio Matricial por
Gastão Wagner Campos, até 2013, indexados na base PubMed, no serviço da Biblioteca
Nacional de Medicina Americana e na Biblioteca Virtual em Saúde, que dá acesso às
bases de dados: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde, Medical
Literature Analysis and Retrieval System Online e Índice Bibliográfico Espanhol em
Ciências da Saúde.
Os autores elaboraram um instrumento específico para essa revisão com o objetivo
de organizar e sumarizar as informações de maneira concisa, formando um banco de
dados de fácil acesso e manejo. A identificação do estudo, definição dos sujeitos, os
objetivos, a metodologia empregada e os principais resultados encontrados são algumas
das informações exigidas pelo instrumento.
A análise e a síntese dos dados extraídos dos artigos foram realizadas de forma
descritiva, possibilitando observar e classificar os estudos, com o intuito de reunir o
conhecimento produzido sobre o tema explorado na revisão.
Esta revisão não apresentou necessidade de aprovação pelo Comitê de Ética em
Pesquisa, uma vez que manipula dados de livre acesso, não se tratando, portanto, de
- 44 -
documentos que requeiram sigilo. As demais questões éticas foram preservadas, na
medida em que todos os autores consultados foram devidamente referenciados no texto.
Resultados
Utilizando-se os passos metodológicos descritos, foram identificadas 225
publicações, das quais 49 foram excluídas por repetição; 20 tinham textos incompletos
ou não disponíveis e; 128 foram rejeitadas após a primeira análise de leitura do título e
resumo por não incluírem atenção primária e Apoio Matricial.
Em síntese, a amostra final desta revisão foi constituída por 28 artigos, sendo que
o quadro 01 representa as especificações de cada um dos artigos.
Quadro 01: Relação das publicações que compuseram o estudo de acordo com código,
título, ano de publicação e autores.
Código Título Ano Revista Autores
A2 Apoio Matricial e equipe de referência: uma 2007 Cadernos de Saúde Campos e Domitti
metodologia para gestão do trabalho Pública
interdisciplinar em saúde
A7 Saúde Mental na atenção básica à saúde de 2009 Ciência & Saúde Figueiredo e Onocko Campos
Campinas, SP: uma rede ou um Coletiva
emaranhado?
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A10 Apoio Matricial e Atenção Primária em 2011 Saúde e Sociedade Cunha e Campos
Saúde
A11 Estratégia de saúde da família, Núcleo de 2011 Revista de Terapia Lancman e Barros
Apoio à Saúde da Família e terapia Ocupacional da
ocupacional: problematizando as interfaces Universidade de
São Paulo
A12 Apoio Matricial em Saúde do Trabalhador: 2012 Ciência & Saúde Santos e Lacaz
tecendo redes na Atenção Básica do SUS, o Coletiva
caso de Amparo/ SP
A13 Práticas que integram a saúde mental à 2012 Ciência & Saúde Silveira
saúde pública: o Apoio Matricial e a Coletiva
interconsulta
A15 Cuidado ao paciente com Doença Renal 2012 Ciência & Saúde Pena et al.
Crônica no nível primário: pensando a Coletiva
integralidade e o matriciamento
A17 Apoio Matricial como dispositivo do 2012 Ciência & Saúde Pinto et al.
cuidado em saúde mental na atenção Coletiva
primária: olhares múltiplos e dispositivos
para resolubilidade
A18 Apoio Matricial em Saúde Mental: alcances 2012 Saúde e Sociedade Morais e Tanaka
e limites na atenção básica
A22 Apoio Matricial em Saúde Mental: 2013 Revista de pesquisa: Azevedo; Gondim e Silva
percepção de profissionais no território cuidado é
fundamental
A23 Saúde Mental e Atenção Básica à Saúde: 2013 Unopar Cientifica Bachetti
Criação de uma Rede de Apoio Matricial Ciências Biológicas
e da Saúde
A24 Apoio Matricial em saúde mental na atenção 2013 Interface: Bonfim et al.
primária à saúde: uma análise da produção Comunicação,
científica e documental Saúde e Educação
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A25 Apoio Matricial em saúde mental: 2013 Revista Minozzo e Costa
fortalecendo a saúde da família latinoamericana de
na clínica da crise psicopatologia
fundamental
A26 Apoio Matricial em saúde mental entre 2013 Psico-USF Minozzo e Costa
CAPS e Saúde da Família: trilhando
caminhos possíveis
A27 Apoio Matricial como ferramenta de 2013 Cadernos Saúde Machado e Camatta
articulação entre a saúde mental e a Coletiva
atenção primária à saúde
A28 Núcleo de Apoio á saúde da família: 2013 Corpus et Scientia Pasquim e Arruda
revisão narrativa sobre o Apoio Matricial
na atenção básica
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TANAKA, 2012; SOUZA et al., 2012; FREIRE; FREIRE; PICHELLI, 2013; AZEVEDO
et al., 2013; MINOZZO; COSTA, 2013a), gestores (BEZERRA; DIMENSTEIN, 2008;
DIMENSTEIN et al., 2009a; FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2009; SILVEIRA,
2012; BACHETTI, 2013), usuários e familiares SANTOS; LACAZ, 2012; JORGE et al.,
2012; ONOCKO CAMPOS et al., 2012; PINTO et al., 2012; QUINDERÉ et al., 2013)
sobre aplicabilidade da metodologia.
Percebemos também nos artigos analisados a prevalência de investigações sobre
o Apoio Matricial ligadas à sua aplicação metodológica na rede de saúde mental e sua
articulação com a Atenção Primária (BEZERRA; DIMENSTEIN, 2008; FIGUEIREDO;
ONOCKO CAMPOS, 2009; SILVEIRA, 2012; JORGE et al., 2012; ONOCKO
CAMPOS et al., 2012; PINTO et al., 2012; MORAIS; TANAKA, 2012; QUINDERÉ et
al., 2013; FREIRE;PICHELLI, 2013; AZEVEDO et al., 2013; BACHETTI, 2013;
MINOZZO; COSTA, 2013a) e uma frequência menor de artigos (07 estudos) que
investiga Apoio Matricial em outros serviços especializados e ainda nos Núcleos de
Apoio a Saúde da Família (ARONA, 2009; DIMENSTEIN et al., 2009b; ROSA et al.,
2011; LANCMAN; BARROS, 2011; SANTOS; LACAZ, 2012; PENA et al., 2012;
SOUZA et al., 2012).
Outro ponto que vale ressaltar na análise dos artigos é o fato de que a formulação
do conceito de apoio não gerou polêmica teórica, conceitual ou metodológica,
observando-se apenas 04 artigos sobre o referencial teórico e metodológico do Apoio
Matricial (CAMPOS, 1999; CAMPOS;DOMITTI, 2007; FIGUEIREDO; ONOCKO
CAMPOS, 2008; CUNHA;CAMPOS,2011). Percebe-se nos demais artigos um esforço
para crítica da metodologia com base nos experimentos e investigações sem, entretanto,
haver ruptura com seu referencial epistemológico central.
Destaca-se que a maioria dos artigos que compuseram essa revisão são pesquisas
empíricas que investigam o método de Apoio Matricial (BEZERRA; DIMENSTEIN,
2008; ARONA, 2009; DIMENSTEIN et al., 2009a; FIGUEIREDO; ONOCKO
CAMPOS, 2009; DIMENSTEIN et al., 2009b; ROSA et al., 2011; LANCMAN;
BARROS, 2011; SANTOS; LACAZ, 2012; SILVEIRA, 2012; JORGE et al.,2012; Pena
et al., 2012; ONOCKO CAMPOS, et al., 2012; PINTO et al., 2012; MORAIS;TANAKA,
2012; SOUZA et al., 2012; QUINDERÉ et al., 2013; FREIRE; PICHELLI, 2013;
AZEVEDO, et al., 2013; BACHETTI, 2013; MINOZZO; COSTA,
- 48 -
2013a; MINOZZO; COSTA, 2013b). Esses estudos utilizaram variadas composições
metodológicas, ainda que todos houvessem se valido de representação ou narrativas
construídas por atores sociais envolvidos com o processo de Apoio Matricial.
No que se refere aos sujeitos da pesquisa encontramos o descrito no Quadro 02.
Quadro 02: Relação das pesquisas empíricas segundo sujeitos investigados na pesquisa e
código dos estudos
Código Sujeitos das pesquisas
A12, A14, A16, A17, A20 Profissionais da atenção primária, serviços especializados, usuários e
gestores
- 49 -
também que o impacto deste modelo de relação interprofissional somente poderá ser
compreendido valorizando-se os usuários.
Discussão
A análise do conjunto de artigos permitiu a construção de três categorias
temáticas, percebidas com base no objetivo deste estudo. O critério de categorização
obedeceu à temática principal abordada; logo, as fontes que apresentaram o mesmo
contexto ou ideia foram agrupadas segundo as três categorias.
As categoriais levantadas após análise foram organizadas em três temáticas: 1)
Artigos de fundação e consolidação do conceito de Apoio Matricial; 2) Artigos de revisão
sobre o Apoio Matricial; 3) Artigos decorrentes de pesquisas empíricas envolvendo o
conceito de Apoio Matricial. O quadro 03 apresenta como foi organizada essa
categorização e seus respectivos artigos.
Quadro 03- Relação das categorias temáticas, com seus respectivos estudos codificados,
e a porcentagem dos estudos presentes em cada categoria.
Categorias Código dos artigos Porcentagem %
Artigos decorrentes de pesquisas A3, A5, A6,A7, A8, A9, A11, A12, A13, A14, 75%
empíricas envolvendo o conceito A15, A16, A17, A18, A19, A20, A21, A22,
de Apoio Matricial A23, A25, A26
- 50 -
Nesta proposta o autor aponta reformas estruturais voltadas para a constituição de
equipes e departamentos multiprofissionais, as Unidades de Produção e Equipes de
Referência, em substituição à organização tradicional com base em categorias
profissionais. É proposta uma rotação dos organogramas em saúde, de modo que os
antigos departamentos especializados (verticais) passam a ser horizontais, oferecendo
apoio especializado às equipes interdisciplinares (CAMPOS, 1999).
O artigo (CAMPOS, 1999) aponta que as Equipes de Referência devem funcionar
com a adscrição de clientela, garantindo-se um sistema de referência e valorizando o
vínculo entre profissionais e usuários. A relação terapêutica, horizontal no tempo,
passaria então a ser a linha reguladora do processo de trabalho. Sua principal função seria
elaborar e aplicar o projeto terapêutico singular, acionando outros profissionais e equipes
especializadas, quando necessário.
Já o apoio especializado matricial objetiva alterar a tradicional noção de referência
e contrarreferência vigente nos sistemas de saúde, instituindo uma relação
interprofissional dialógica e democrática, pautada por desenhos de projetos terapêuticos,
em que as responsabilidades da equipe matricial e de referência não são diluídas, mas
sim, compartilhadas e claramente definidas (CAMPOS, 1999).
O autor aponta que a instituição desses conceitos e sua incorporação na prática
cotidiana não ocorreriam rapidamente, dependendo de modificações organizativas e da
criação de processos facilitadores para reconstrução da cultura institucional e para
formação de outra subjetividade profissional (CAMPOS, 1999).
No segundo artigo (CAMPOS; DOMITTI, 2007) são retomados os conceitos de
equipe de referência e Apoio Matricial apresentando-os de duas maneiras: eles seriam
arranjos organizacionais e também uma metodologia para a gestão do trabalho em saúde,
destacando a contribuição desses conceitos para ampliação das possibilidades de realizar-
se clínica ampliada e integração dialógica entre distintas especialidades e profissões.
Definem que o apoiador matricial é um especialista que tem um núcleo de
conhecimento e um perfil distinto daquele dos profissionais de referência, mas que pode
agregar recursos de saber e mesmo contribuir com intervenções que aumentem a
capacidade de resolver problemas de saúde da equipe primariamente responsável pelo
caso. Desta forma, o Apoio Matricial busca personalizar os sistemas de referência e
contrarreferência, ao estimular e facilitar o contato direto entre referência encarregada do
caso e especialista de apoio (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
- 51 -
Apresentam duas maneiras para o estabelecimento de contato entre referências e
apoiadores. O primeiro seria mediante combinação de encontros periódicos e regulares -
a cada semana, quinzena ou mais espaçados- em que se discutiriam casos clínicos
selecionados pela equipe de saúde, elaboração de projetos terapêuticos, pactuação de
linhas de intervenção e também diálogo sobre temas clínicos, de saúde coletiva ou de
gestão do sistema. Já o segundo seria para dar suporte aos casos imprevistos e urgentes
que não podem esperar a reunião regular, utilizando meios diretos de comunicação,
sempre se levando em consideração a pactuação de diretrizes de risco e de acesso aos
especialistas apoiadores (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
O método de Apoio Matricial é composto por dois conceitos operadores
(CAMPOS; DOMITTI, 2007). O termo matricial indica uma mudança radical de posição
do especialista em relação ao profissional que demanda seu apoio. Busca romper com o
princípio da hierarquização em que se prevê uma diferença de autoridade entre quem
encaminha o caso e quem o recebe, resultando em uma transferência de responsabilidade
e a instituição de uma relação vertical. O emprego do termo “matricial” busca trazer uma
lógica mais próxima a ideia de matriz, sugerindo que profissionais de referência e
especialistas mantenham uma relação horizontal, e não apenas vertical como recomenda
a tradição dos sistemas de saúde. Já o termo “apoio” sugere uma metodologia para ordenar
essa relação entre referência e especialista não mais com base na autoridade, mas com
base em conceitos dialógicos. O termo foi retirado do método Paidéia (CAMPOS, 2000),
que cria a figura do apoiador institucional e sugere que tanto na gestão do trabalho em
equipe quanto na clínica, na saúde pública ou nos processos pedagógicos a relação entre
sujeitos com saberes, valores e papeis distintos pode ocorrer de maneira mais dialógica.
No caso, o apoiador procura construir de maneira compartilhada com outros
interlocutores projetos de intervenção, valendo-se tanto de ofertas originárias de seu
núcleo de conhecimentos, de sua experiência e visão de mundo, quanto incorporando
demandas trazidas pelo outro também em função de seu conhecimento, desejo, interesses
e visão de mundo.
O artigo também apresenta diversos obstáculos e impasses a essa nova
metodologia de trabalho: os estruturais, que estão contidos na própria maneira como as
organizações de saúde vem se estruturando e que impedem a implantação de equipe
interdisciplinar e sistemas de cogestão; obstáculos decorrentes do excesso de demanda e
da carência de recursos, que estão ligados a implantação parcial do SUS; obstáculo
- 52 -
político e de comunicação, ligados a tradição das organizações de saúde de funcionarem
com concentração de poder em certos profissionais e ausência de espaços coletivos para
exercitar a gestão colegiada; obstáculo subjetivo e cultural, ligado ao fato de que a
subjetividade dominante nas instituições contemporâneas é pautada pela concorrência
exacerbada que induz posturas cristalizadas e um alto grau de desconfiança em relação
ao outro; obstáculo ético, se o método de trabalho com base em equipe de referência e
Apoio Matricial busca definir de maneira precisa a responsabilidade sanitária, ao mesmo
tempo, complica-se o tema da privacidade e do segredo sobre a história do paciente, da
família ou de grupos comunitários; obstáculo epistemológico, pressupõe a necessidade de
algum grau de adesão dos profissionais a incluir um novo paradigma que pense o processo
saúde, doença e intervenção de modo mais complexo e dinâmico e não filiados a nenhuma
racionalidade exclusiva (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
No terceiro artigo (FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2008) as autoras
apontam como essencial a utilização do Apoio Matricial por dois motivos. A integração
do CAPS aos serviços da rede básica é um ponto crucial para continuidade da Reforma
Psiquiátrica e construção de ações pactuadas entre os serviços com base na
territorialidade. Em segundo, apontam que as questões subjetivas transpassam quaisquer
problemas de saúde e devem ser abordadas em toda relação terapêutica. Assim, no Apoio
Matricial da Saúde Mental, conhecimentos e ações, historicamente reconhecidos como
inerentes a prática "psi", são ofertados aos profissionais de saúde de uma equipe, de modo
a auxiliá-los a ampliar sua clínica e escuta, a acolher o sofrimento psíquico e a lidar com
a subjetividade dos usuários, ou seja, a saúde mental passa a compor a rede matricial de
apoio à atenção básica e a outros programas.
A potência do Apoio Matricial em Saúde Mental está em desfazer a delimitação
entre as diferentes disciplinas e tecnologias, através das discussões de caso e da regulação
de fluxo, evitar práticas que levam a "psiquiatrização” e a "medicalização" do sofrimento
humano (FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2008) .
Por fim, reconhecem que a mudança da lógica de trabalho proposta pelo Apoio
Matricial não é fácil de ser assumida pelas equipes e não ocorre automaticamente. Desta
forma, é de extrema importância a instituição de espaços coletivos destinados a reflexão
e análise crítica sobre o próprio trabalho, que possam ser continentes aos problemas de
relação entre a equipe, aos preconceitos em relação à loucura, a dificuldade de entrar em
- 53 -
contato com o sofrimento do outro e à sobrecarga trazida pela lida diária com a pobreza
e violência (FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2008).
O quarto artigo (CUNHA; CAMPOS, 2011) apresenta uma reflexão teórica sobre
a utilização do método de Apoio Matricial no NASF (BRASIL, 2008).
Com base nesta metodologia o Ministério da Saúde previu a inclusão na atenção
básica de vários profissionais antes alocados somente em serviços especializados. Suas
principais atividades na realização do Apoio Matricial são: atendimento compartilhado,
para uma intervenção interdisciplinar, com troca de saberes, capacitação e
responsabilidades mútuas, gerando experiência para ambos os profissionais envolvidos;
intervenções específicas do profissional NASF com os usuários e/ou famílias, com
discussão e negociação a priori com os profissionais da equipe de Saúde da Família
responsáveis pelo caso; ações comuns nos territórios de sua responsabilidade
desenvolvidas de forma articulada com as equipes de Saúde da Família (BRASIL, 2009).
Os autores advertem que problemas estruturais, como a escassez de serviços
especializados podem induzir à utilização do NASF de forma equivocada, de maneira
substitutiva, visto que é comum observar-se situações em que os profissionais NASF são
vistos como "tapa buraco" na ausência de um centro de referência especializado. Além
disso, na medida em que outros serviços especializados ainda não praticam o Apoio
Matricial, o trabalho das equipes NASF ainda é maior, tanto pelo aprendizado mútuo
quanto pelo isolamento que a atenção primária experimenta na relação com a rede
assistencial (CUNHA; CAMPOS, 2011).
- 55 -
Os resultados dessa revisão mostram apenas impasses. O primeiro é a preocupação
dos profissionais da saúde com a baixa cobertura devido à escassez de profissionais e com
a utilização das equipes de Apoio Matricial para cobrir a demanda real de outros níveis
de atenção. Em segundo, apontam que NASF enfrenta obstáculos decorrentes de ser um
programa recém-criado, mas enfrenta também antigos obstáculos da Saúde Pública como
precarização do trabalho e desrespeito de direitos. Em terceiro, destacam que o Apoio
Matricial oferecido sem estrutura suficiente, capacidade técnica, recursos humanos e
apoio pedagógico, pode se transformar em apenas "mais trabalho", mesmo que as metas
sejam atingidas. Por fim, ressaltam que tais impasses são essencialmente de ordem
política e sua superação depende da valorização dos profissionais da saúde e da retomada
dos princípios da Reforma Sanitária (PASQUIM;ARRUDA, 2013) .
- 57 -
O Apoio Matricial visa o compartilhamento de saberes através da instituição de
uma relação interdisciplinar, contudo se percebe ainda situações em que as ações de
matriciamento são centradas em apenas algumas categorias profissionais (médicos,
enfermeiros e psicólogos) e isso acaba fortalecendo a prevalência de um único saber em
detrimento do leque ampliado de saberes que compõem as equipes de saúde (JORGE et
al.,2012; ONOCKO CAMPOS, et al., 2012; SOUZA et al., 2012; QUINDERÉ et al.,
2013).
Um impasse na implantação do Apoio Matricial está ligado diretamente à
superação dos problemas estruturais e organizacionais que, infelizmente, ainda fazem
parte do cotidiano do SUS. Assim questões como a sobrecarga de trabalho, dificuldade
de compatibilizar as agendas, número de profissionais incompatível com a demanda tanto
na atenção primária quanto na especializada, alta rotatividade dos profissionais,
infraestrutura inadequada dos serviços, condições de trabalho inadequadas e serviços
superlotados (BEZERRA; DIMENSTEIN, 2008; ARONA, 2009; DIMENSTEIN et al.,
2009a; FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2009; LANCMAN; BARROS, 2011;
SANTOS; LACAZ, 2012; ONOCKO CAMPOS, et al., 2012); assim como a ausência de
uma rede de serviços especializada concreta (compatível com a demanda) e articulada
com a rede básica, inexistência de uma rede de atenção primária eficaz e insuficientes
serviços especializados (PENA et al., 2012; PINTO et al., 2012; BACHETTI, 2013), se
configuram em questões-chaves que precisam ser superadas para implementação de um
modelo de atenção pautado nas necessidades de saúde do usuário e que qualifique a
assistência prestada.
A formação acadêmica das profissões de saúde que valoriza o atendimento
isolado de cada profissional e pouco articulado aos princípios do SUS deve
necessariamente ser repensada porque ela não inclui as diretrizes do Apoio Matricial, é
insuficiente para os profissionais atuarem como apoiadores e não ressalta a importância
da democratização das relações interprofissionais através da instituição de espaços de
cogestão (BEZERRA; DIMENSTEIN, 2008; ARONA, 2009; FIGUEIREDO; ONOCKO
CAMPOS, 2009; ROSA et al., 2011; FREIRE; PICHELLI, 2013;
AZEVEDO, et al., 2013).
Além de se repensar a formação acadêmica é também imprescindível conectar a
política de formação em serviço com as diretrizes do Apoio Matricial. Alguns estudos
apontam que essa prática não vem sendo adotada (DIMENSTEIN et al., 2009a;
- 58 -
FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS, 2009; AZEVEDO, et al., 2013), dificultando
mudanças no processo de trabalho e possibilitando no cenário das práticas a coexistência
da fragmentação do cuidado e da corresponsabilização.
O apoio da gestão local facilita a implantação do Apoio Matricial, contudo até o
momento isso ainda não se configura em uma realidade e essa ausência de apoio do gestor
para incorporação da lógica do matriciamento tem se configurado em mais um impasse.
São apontados que a implantação dessa metodologia para o trabalho em saúde depende
de vontade política, contudo a organização do modelo assistencial muda a cada eleição e
em algumas situações o Apoio Matricial é imposto pela gestão e fica cada vez mais nítido
o descompasso de tempos da gestão e ritmo de transformação das praticas cotidianas
(BEZERRA; DIMENSTEIN, 2008; FIGUEIREDO; ONOCKO CAMPOS,
2009; JORGE et al.,2012; AZEVEDO, et al., 2013).
Considerações Finais
O presente estudo apresenta algumas limitações. Dentre estas, podemos destacar
a própria abrangência dos indicies de literatura científica. Embora, alguns artigos possam
não ter sido identificados em nossa revisão, foram utilizados bancos de dados
reconhecidos pela comunidade acadêmica.
Os resultados dessa revisão mostram que o Apoio Matricial traz uma proposta
inovadora e potente para transformação do modelo assistencial, se configurando em um
importante eixo articulador para produzir mudanças nas relações interprofissionais.
Entretanto, para atingir seus objetivos é necessário à superação de alguns impasses, vários
interligados diretamente com a implementação de suas diretrizes e outros com a
superação de problemas estruturais do SUS.
- 60 -
Observou-se a necessidade de novos estudos que possibilitem pensar em
estratégias de avaliação do Apoio Matricial no SUS para além das representações de
gestores e profissionais. Estudos que considerem resultados e tenham a participação dos
usuários e sua opinião acerca do Apoio Matricial são essenciais.
O Apoio Matricial estimula um novo desenho da rede do SUS, já que, em alguma
medida, borra a fronteira entre atenção básica e serviços especializados. Este projeto fere
interesses corporativos e redefine a microfísica do poder nas instituições de saúde. O
Apoio Matricial demanda novas estratégias de gestão e de novas formas de estruturação
das redes em saúde. Esta radicalidade tem despertado adesão entusiástica e resistências
entre os profissionais de saúde. As dificuldades relatadas são decorrentes menos da
efetividade do Apoio Matricial, do que da insuficiência de recursos, da predominância da
gestão autoritária e do modelo biomédico no SUS.
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ARTIGO 2
Matrix Support in the Public Health System of the city of Campinas: an analysis of
the consolidation of an interprofessional practice within the health network
AUTORES:
Cristiane Pereira de Castro
Mônica Martins de Oliveira
Gastão Wagner de Sousa Campos
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Resumo
Campinas (SP). Para isso, foi realizado estudo exploratório descritivo, com aplicação de
questionário a 232 profissionais que realizam Apoio Matricial à Atenção Básica. Para
matricial; Práxis do apoio. O estudo apontou que a metodologia do Apoio para o trabalho
apoiadas para cada equipe de Apoio Matricial foram identificados como as principais
fragilidades no processo de trabalho. Por sua vez, emergiram como pontos fortes a
Abstract
The goal of this study was to characterize the personnel and the interprofessional Matrix
Support work process developed at the Public Primary Care of Campinas (SP). In order
applied to 232 professionals who perform Matrix Support in the Primary Care. The data
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was compiled into four groups for analysis: Personnel identification; Work binding to the
Public Health System of Campinas; Work organization of the matrix supporter; Support
praxis. The study showed that the Support methodology to interprofessional work has
consolidated successfully in the city, despite the rectrict investment. It was possible to
teams for each Matrix Support team. These factors were identified as the main fragilities
in the work process. In turn, the variety of tools in use, the possibility of shared
construction of labor guidelines and the flexibility in the composition of Support teams
were seen as key strengths. The found fragilities and strengths can offer subsidies for
Introdução
Nas últimas décadas, o Apoio Matricial vem sendo definido como uma
sistemas de saúde1,2,3,4.
formulada no início da década de 1990 e passou a ser implementada por iniciativa dos
profissionais da rede SUS Campinas (SP), iniciando na área da Saúde Mental e Atenção
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com apoio teórico do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de
Entre 2001 e 2004 essa estratégia foi adotada como política da Secretaria
A despeito do bom andamento de tais ações ao longo de mais de uma década, foi
possível observar que a partir de 2005 até o momento de realização desta pesquisa, várias
urgência9,10.
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Além de Campinas, observou-se, também no decorrer da década de noventa, a
Atenção Básica13. Apesar disso, é somente com a criação do NASF14 que o Ministério da
Matricial. Desta forma, este artigo tem como intuito compartilhar com a comunidade
prática dos profissionais, mesmo não sendo uma diretriz da gestão municipal ao longo
dos últimos dez anos. Com base nessa finalidade, investigou-se o Apoio Matricial
dos profissionais e das organizações que utilizam a estratégia do Apoio Matricial no seu
referência apoiadas.
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Método
pesquisa foi apresentado aos gestores dos Distritos de Saúde e aos coordenadores de
realizavam Apoio Matricial como atividade regular. Para constituição de nossa população
identificados foram indicando outros colegas que também realizavam Apoio Matricial.
do estudo todos os profissionais que, apesar de indicados pelos gestores, declararam não
O questionário utilizado neste estudo foi composto por três tipos de questões:
abertas, fechadas e mistas. Tal material foi elaborado pela equipe de pesquisadores, a qual
Apoio Matricial de Campinas (os cinco primeiros indicados pelos gestores distritais).
Ressalta-se, que para este artigo foram analisadas somente as questões fechadas.
Assim, a análise dos dados obtidos iniciou-se com a tabulação das respostas, seguida da
análise descritiva dos resultados, realizada a partir do estudo das frequências absolutas e
Excel, pacote Office 2000. Os dados reunidos foram sumarizados em tabelas e originaram
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análise:
Categoria 01: Identificação dos profissionais, a partir das seguintes variáveis: sexo,
idade, categoria profissional, local de trabalho, área de atuação dos profissionais de apoio;
Categoria 04: Práxis do apoio, com inclusão das seguintes informações: formas de
acionar o Apoio Matricial e critérios para discussão de caso com apoiador, ferramentas
que são utilizadas nas ações de Apoio Matricial, avaliação das ações de Apoio Matricial
e supervisão.
Aspectos éticos
sigilo.
Resultados e Discussão
profissionais que atuam com Apoio Matricial, contendo as categorias identificação dos
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profissionais e vinculação de trabalho ao SUS Campinas e; II) prática de Apoio Matricial,
práxis do apoio.
Idade e sexo
feminino, indicando que, no SUS Campinas, o trabalho em saúde e, neste caso, o de Apoio
que corresponde a 101 profissionais (43%), está concentrada na faixa etária entre 26 e
faixa etária. Este dado indica que vem ocorrendo transmissão entre as “gerações” de
que profissionais jovens e mais experientes estão trabalhando juntos, o que poderá
não tendo havido cursos de formação nos últimos dez anos. Parte da capacidade de
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Figura 1. Distribuição da população de estudo (n=232) por faixas etárias,
Categoria Profissional
qual, desde 1989, criou equipes de saúde mental na atenção primária, objetivando reforçar
a sua capacidade de cuidado dos problemas de saúde mental menos graves e construir um
trabalho das equipes de saúde mental inseridas na atenção primária contribuíram para a
Matricial.
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A existência da categoria médica entre as mais frequentes no desenvolvimento de
ações de Apoio Matricial é uma surpresa, ainda que represente uma parcela bastante
sugere uma aproximação dessa categoria com uma proposta de trabalho democrática e
interativa, diferente do trabalho médico tradicional. Por outro lado, mostra também que
apesar dos esforços iniciais, entre 2000 e 2004, de implantação da política de saúde no
profissional médico nas discussões sobre Apoio Matricial por dois motivos: sobrecarga
Apoio Matricial, descrito na tabela 01, percebe-se uma variedade de serviços de saúde,
indicando que, apesar da história do Apoio em Campinas ter se iniciado por meio de
profissionais da saúde mental na Atenção Básica, essa estratégia para o trabalho, com o
Referência na Atenção Básica por meio do Apoio Matricial, mais variada tem sido a troca
além dos de saúde mental. Entretanto, também traz para as equipes de Atenção Básica o
interlocuções.
Tabela1. Local de trabalho dos profissionais que atuam com apoio matricial,
CAPS infantil 17 07
Centro de Convivência 08 03
Atenção Básica 81 35
Laboratório Municipal 04 02
NASF 06 03
Policlínicas 11 04
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Ainda no que diz respeito aos serviços a partir dos quais se desenvolve o Apoio,
interessa destacar que a maior parte dos profissionais que realiza Apoio Matricial não o
efetiva a partir de NASF. Isto se deve ao fato de que a gestão do SUS de Campinas optou
por não apostar na implementação de uma rede de NASF. Esta decisão foi influenciada
pela resistência dos próprios profissionais ao novo modelo de NASF, uma vez que já
reabilitação física, nutrição, entre outros. Vale ressaltar que essas formas diversificadas
metodologia de trabalho. Assim, quando o NASF foi criado, em 2008 pelo Ministério da
Saúde14, já havia diversas equipes, a partir de distintos serviços, que realizavam Apoio
de Convivência) também fica evidente, ao considerar que 156 profissionais (67%) que
protagonismo diferenciado, identificado por outros estudos, dos profissionais dessa área
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Instituição empregadora
128 profissionais (55%). Os restantes (4%) são contratados pela Associação Paulista para
Saúde, responsável pela gestão, desde junho de 2008, pelo Complexo Hospitalar Prefeito
Edivaldo Orsi.
para o trabalho, a presença desse complexo hospitalar, enquanto maior empregador dos
direta do Estado em serviços de saúde, tal como ocorre na cidade de São Paulo25.
Vínculos de trabalho
A questão do duplo vínculo também foi investigada. Com isso, foi possível constatar
que, embora não seja a maioria, 100 profissionais (43%) exercem outra atividade
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Segundo Heimann et al.26, existe tensão entre o projeto da Reforma Sanitária e o
desta nova forma de gestão no SUS, a relação que se desenha entre o público e o privado
elegeram o SUS como local prioritário para desenvolver seu trabalho. Alguns dos fatores
que podem justificar essa escolha são: remuneração compatível, presença de um plano
efetivo de cargos e carreiras e rede assistencial robusta, contando com serviços em todos
profissionais que optam por manter um duplo vínculo. Os motivos dessa escolha são
que não há processos de seleção específicos para o Apoio Matricial e que este tema não
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Foi apontado por 193 profissionais (83%) que o processo seletivo incluía questões
sobre saúde pública/saúde coletiva, mas apenas 74 deles (32%) afirmaram que o processo
apresentação do contrato de trabalho, visto que 117 profissionais (51%) não foram
informados que o cargo incluía tais ações, o que sugere que somente após estarem
alocados em seus locais de trabalho e desenvolvendo suas atividades é que o tema Apoio
surgiu. Esse descompasso pode trazer uma série de prejuízos, tais como, não adesão a
Também se mostra incoerente o fato de que no processo de contratação não foi exigida
experiência prévia com Apoio Matricial ou Saúde Coletiva. Na presente pesquisa, 178
profissionais (77%) mencionaram que não houve tal exigência. Com vistas a tais
acadêmica das profissões de saúde é pouco articulada aos princípios do SUS, sendo
24,27.
atividades de apoio
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De acordo com 153 profissionais (66%), a principal forma de ingresso nas atividades
de Apoio Matricial ocorre por meio de alguma forma de acordo realizado dentro da
própria equipe onde trabalham e não de um processo efetuado pelos gestores, a priori.
implantação adequada do Apoio Matricial. Isto pode explicar o porquê, mesmo com a
que trabalham no município ainda conseguem manter uma prática dialógica voltada para
No que se refere à análise das horas dedicadas ao Apoio Matricial e suas atividades
em relação ao total de horas para que se foi contratado, observou-se um dado preocupante:
Apesar disso, 118 (51%) profissionais dedicam ao Apoio somente um período de até 4
total.
Uma das hipóteses para explicar esse fato é que, como o Apoio Matricial não
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Apoio à Atenção Básica. Consequentemente, pode haver a eventual interrupção das
atividades de Apoio Matricial, já que essas não estão garantidas enquanto atribuições
Outra hipótese seria a de que este dado indicaria uma concepção restrita dos
deveriam constar como atividades ligadas ao Apoio. Portanto, entende-se que, neste
É importante investigar mais profundamente essa informação, porque ela traz uma
se o contato direto com os usuários. Mesmo garantindo que o Apoio Matricial não se
apoiadas
Sobre a composição quantitativa das equipes de Apoio Matricial, fica evidente a sua
natureza diversificada, sendo que 145 profissionais (62%) relataram que atuam em
contrapartida, esta estratégia de organização com equipe menores e por áreas de atuação
populacional das equipes de apoiadores, bem como dos serviços que contarão com o
por cada profissional não segue um padrão único (figura 2) e demonstra a uma
A maioria dos profissionais (69%) referiu que apoia menos de nove equipes de
referência o que está alinhado com o discurso oficial do Ministério da Saúde em sua
Saúde (sendo que cada distrito tem no mínimo 10 e no máximo 30 unidades de atenção
Esses dados merecem atenção, pois segundo Hirdes31 há princípios profissionais como a
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Figura 02. Quantidade de equipes de referência apoiadas segundo os profissionais
apoiador
discutiriam casos clínicos selecionados pela equipe de saúde; e a segunda seria o suporte
aos casos imprevistos e urgentes que não podem esperar a reunião regular2.
seguem os passos descritos acima, uma vez que 79 profissionais (34%) referiram que a
agenda do apoio é construída mediante pacto entre Equipe de Apoio Matricial e Equipe
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equipes apoiadas. Observa-se também que a construção da agenda é influenciada por
2013 e 2014
Formas de acionar o apoio N° Percentual
profissionais
%
Equipes de Referência
44 19
Solicitação eventual de Apoio pela Equipe de
Referência
15 06
Agenda definida pelo gestor e solicitação de apoio
eventual pela Equipe de Referência
79 34
Agenda pactuada entre Apoio Matricial e
Apoio
07 03
Definida pela gestão e pactuada entre Apoio
Todas as anteriores 26 11
Outros 02 01
Não respondeu 04 02
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Além das formas de acionar o Apoio Matricial, é igualmente importante considerar
critérios para seleção dos casos que demandam discussão com Apoio Matricial. Destes
profissionais acreditam que foram construídos pelos apoiadores somente, 12 alegam que
foi a gestão independentemente que construiu os critérios e apenas 6 não souberam dizer
A inexistência de critérios para seleção dos casos de Apoio Matricial indica que os
problemas e casos a serem apoiados são definidos no momento da discussão dos mesmos
por meio de contratos gerados entre os próprios profissionais. Contudo, este padrão de
rede de apoiadores.
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Figura 3. Distribuição dos respondentes (n=232) sobre as ferramentas utilizadas no
nas respostas. Importante lembrar que, quanto maior a diversidade de ofertas dos
Apoiadores, mais resolutivas tendem a ser as ações junto à Atenção Básica, ajudando a
Entretanto, é curioso notar que a assistência direta aos usuários foi marcada como
ferramenta de apoio, mas não foi considerada enquanto tal no momento da computação
dos profissionais sobre as horas que dedicam ao Apoio, o que reforça a necessidade de
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profissionais utilizam as várias ferramentas. Seria, entretanto, recomendável investigar
de que modo essas ferramentas são utilizadas: se mantêm o caráter dialógico e a lógica
Campinas. Também se identificou que 179 profissionais (77%) não recebem supervisão
Esta ausência precisa ser superada, de modo a possibilitar a análise sobre o Apoio
hegemônicas3.
Matricial.
Além disso, tais espaços poderiam se configurar enquanto arranjos potentes para
garantir a formação de apoiadores. Pois, formação não significa apontar modelos políticos
- 89 -
supervisão, que permite a participação de analistas externos, é possível refletir sobre a
Considerações Finais
metodologia de trabalho. Nesse sentido, mais do que avaliar as práticas de Apoio, teve
como objetivo caracterizar o modo como elas têm sido desenvolvidas atualmente.
Mediante esse empenho, foi possível compreender que o Apoio Matricial ocorre
de modo bastante heterogêneo no município, mas que, após vinte anos de sua implantação
adotado como diretriz de governo para a organização do trabalho em saúde, seja sob a
forma de equipes temáticas ou sob a modalidade NASF , durante os últimos dez anos,
merece destaque.
autodeclararam como apoiadores. Tal afirmação identifica uma aposta, quase unilateral,
A partir da experiência relatada neste artigo torna-se possível listar alguns pontos
municípios. Podem ser considerados como pontos fortes para a construção das ações de
formato do NASF e possam ser organizadas como equipes temáticas compatíveis com as
ações desenvolvidas.
reformulação. Sua plasticidade torna-se fundamental para que o Apoio possa efetivar a
superação desses desafios, sem comprometer sua essência e sem deixar de atender às
da Atenção Básica.
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Por fim, este estudo demonstrou a necessidade de novas investigações, de caráter
direta aos usuários com corresponsabilização pelos casos e pelo território e também
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- 95 -
ARTIGO 3
Family Health Support Centers and interprofessional work: the experience of the
city of Campinas (SP).
AUTORES:
Cristiane Pereira de Castro
Daniele Sacardo Nigro
Gastão Wagner de Sousa Campos
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Resumo
Campinas (SP) é considerado o local onde a metodologia de Apoio foi gerada e possui
uma trajetória histórica na prática de Apoio Matricial, entretanto a implantação de NASF
não foi priorizada no município, sendo identificada apenas uma equipe instituída segundo
esse arranjo. Desta forma, são os fatores ou condicionantes da inexpressiva presença do
NASF em Campinas (SP), assim como a análise de suas práticas em Apoio Matricial que
serão objeto de atenção neste artigo. Trata-se de um estudo no qual devido às
características do objeto em análise, optou-se pelo emprego do estudo de caso único (Yin,
2001). A análise dos dados obtidos teve como referencial a triangulação de dados
(Minayo, 2005) e emergiram dois grandes eixos analíticos: I) A história feita, com
enfoque sobre um determinado contexto e tempo do município de Campinas (SP) e; II)
A história se fazendo, o qual remete à compreensão de como pensavam e atuavam os
sujeitos que faziam aquela história. Conclui-se que a metodologia do Apoio Matricial é a
base para a atuação da equipe NASF junto às equipes apoiadas. A adoção dessa
metodologia contribuiu para a legitimidade, instituição de um vínculo afetivo e o
desenvolvimento de uma relação interprofissional interativa. Contudo, se faz relevante
seguir investigando em que medida o Apoio Matricial se configura como uma práxis
dinâmica, capaz de lidar com a necessidade de estruturação prévia e improvisação frente
ao situacional, não se congelando em uma ação estável que se reconhece enquanto um
meio e um final, definidos a priori.
Palavras-chaves: Saúde Pública - Apoio Matricial - Atenção Primária à Saúde.
Abstract
Campinas (SP ) is considered the place where the methodology of support was generated
and has a historical background in the practice of Matrix Support, however, the
implementation of NASF was not prioritized in the city, being only identified an
established staff under this arrangement. In this way, are the factors or conditions of
deadpan presence of NASF in Campinas (SP), as well as analysis of their practices in
Support Matrix to be the object of attention in this in this article. It is a study in which,
due to the characteristics of the object under consideration, we opted for the use of single
case study (Yin, 2001). The analysis of the obtained data was to reference the data
- 97 -
triangulation (Minayo, 2005) and emerged two great analytical axes: I) The story made,
focusing on a particular context and time in the city of Campinas (SP); II) The story
making, which leads to the understanding of how thought and acted the guys who made
this story. It is concluded that the methodology of the Matrix Support is the basis for the
work of the NASF team together wings supported teams. The adoption of this
methodology contributed to the legitimacy, establishing a bonding and the development
of an interactive inter-relationship. However, it is relevant to follow investigating to what
extent matrix support is configured as a dynamic practice, capable of dealing with the
need for prior structure and improvisation opposite situational not freezing in a stable
action is recognized as a medium and final defined a priori.
Keywords: Public Health - Matrix Support - Primary Health Care
Introdução
- 98 -
Atualmente, o NASF é regulamentado pela Portaria n°2.488, de 21 de outubro de
2011 e sua implantação tem ocorrido de maneira exponencial: em 2009 eram 952 equipes
de NASF e passaram para 3.221 equipes em 2015 (Brasil, 2015). O vertiginoso processo
de institucionalização da metodologia de Apoio Matricial por meio dos NASF evidencia
a penetração de sua metodologia no SUS, o que justifica a necessidade de realização de
estudos que analisem sua efetividade.
Se, por um lado, a criação e o processo de implantação dos NASF expressam as
potências produtivas de lógicas institucionais constitutivas dos movimentos instituintes,
como analisado por Lourau (1975); Lapassade, (1975), já que a transformação de um
arranjo organizativo numa política sanitária revela o importante papel histórico de se criar
e instituir marcos regulatórios, diretrizes e normas no âmbito do SUS. Normativas essas
capazes “estabelecer hábitos ou padrões, [os quais] vigoram para regular as atividades
sociais”, como os são as práticas interprofissionais no campo da saúde. Por outro lado, na
perspectiva dessa corrente, o próprio processo de institucionalização conduz a um
afastamento de sua energia pulsional geradora e a uma “inexorável captura”, que tende a
congelar-se, esclerosar-se e a adotar relações repetitivas e burocratizadas (Baremblitt,
2002). Dessa reunião e imbricamento entre o instituído e o instituinte resulta um circuito
entre esses dois termos, em que as irrupções instituintes são transformadas em portarias,
contratos e demais aparatos legais e institucionais visando a implantação de novas
práticas que sustentam uma política pública, como pode ser considerado o caso do NASF.
No âmbito das políticas públicas, não é novidade o reconhecimento de que há um
conflito entre o que se enuncia e o que se faz. Há uma importante distância entre as
políticas, os programas, os modelos de atenção e de gestão idealizados e as práticas
concretas de produção de cuidado à saúde realizadas por profissionais e usuários, no
cotidiano do SUS (Luz, 2004; Cecílio e col., 2012). A esse respeito, Mattos e Baptista,
(2011, p.63) propõem no campo de análises de políticas que “é preciso romper com uma
visão normativa e descritiva das políticas e trazer o que há de vida na sua construção”,
valorizando o que é a produção cotidiana das políticas, ressaltando as diferenças, os
conflitos e paradoxos que coexistem nesse processo.
Pesquisa recente, realizada no município de Campinas (SP) (Oliveira, 2014),
encontrou contradições relativas à implementação do Apoio Matricial como política
pública. Embora seja considerado o local onde a metodologia de Apoio foi gerada e
possua uma trajetória histórica na prática de matriciamento, em especial na área de saúde
- 99 -
mental, e mais recentemente se expandindo para outros núcleos de saberes,
presentemente, existe na cidade apenas uma equipe de NASF. A implantação de NASF
não foi priorizada no município e, portanto, não seguiu a tendência expansionista
identificada nas distintas regiões brasileiras. São os fatores ou condicionantes da
inexpressiva presença do NASF em Campinas (SP), assim como a análise de suas práticas
em Apoio Matricial que serão objeto de atenção nesse artigo, examinadas a partir dos
achados de uma investigação de doutorado aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP, sob parecer de número 438.490.
Diante da relevância do NASF no cenário nacional, propõe-se analisar a dinâmica
e entrelaçamentos do processo de institucionalização do único NASF em Campinas (SP),
buscando abordá-lo como a união e a tensão de uma política pública feita e se fazendo,
para melhor compreender o alcance e os resultados da metodologia do Apoio Matricial.
Tal compreensão não se restringe apenas a esse município em particular, mas pretende
alcançar outros locais nos quais essa experiência vem se instituindo, pois “é na prática
política cotidiana das instituições e das relações sociais que podemos reconhecer
elementos do nosso modo de constituir as políticas de Estado” (Mattos; Baptista, 2011,
p.65).
Metodologia
O estudo está inserido no campo das pesquisas qualitativas (Minayo, 2010) e devido
às características do objeto em análise, optou-se pelo emprego do estudo de caso único
(Yin, 2001). Investigamos o percurso histórico e a dinâmica do NASF em Campinas (SP),
tomando-o como um analisador da maior importância para a compreensão dos processos
de institucionalização de uma política pública e das práticas de Apoio Matricial vigentes.
Analisador, também porque faz a instituição NASF falar, mostrar suas contradições, seus
limites e possibilidades (Lapassade, 1979; Lourau, 1975).
Segundo Yin (2001), nos estudos de caso trata-se de “expandir e generalizar teorias e
não enumerar frequências” (Ibidem, p. 30), isto é, de uma “generalização analítica” e não
de uma “generalização estatística”. Em geral, os estudos de caso representam a estratégia
preferida quando se colocam questões do tipo “como” e “por que”; quando o pesquisador
tem pouco controle sobre os acontecimentos e; quando o foco se encontra em questões
contemporâneas inseridas em algum contexto da vida real, procurando-se compreender
fenômenos sociais complexos. O estudo de caso do único NASF em Campinas se
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fundamenta por “ser um caso decisivo”, “ser um caso raro ou extremo”, e “ser revelador”
devido ao modo singular pelo qual se institui e organiza suas práticas.
Os dados foram produzidos em contexto real do trabalho e das reuniões da equipe do
NASF, pois é uma prerrogativa do método que o pesquisador se insira no mundo do
objeto. Para seleção dos sujeitos da pesquisa foram utilizados como critérios de inclusão:
a concordância do profissional em participar da pesquisa; profissionais que atuassem no
NASF e nas equipes de saúde da família apoiadas pela equipe NASF e; que estivessem
atuando no SUS Campinas há pelo menos um ano. Foi utilizada como critério de exclusão
a recusa do profissional em participar da pesquisa.
As técnicas utilizadas para a produção de dados foram: a observação participante e;
os grupos focais. Para cada heurística foram elaborados roteiros para orientar o trabalho
em campo.
As observações foram realizadas com o objetivo de levantar informações sobre as
práticas cotidianas dos profissionais que atuam no NASF e seu papel de apoiador
matricial junto às equipes de saúde da família. Para o registro das observações foi
utilizado o diário de campo e nele foram anotados a descrição do local e dos sujeitos
participantes, as atividades realizadas, informações prestadas por outras pessoas
informalmente, enunciados verbais que constituem citações dos atores sociais em estudo
e as impressões do pesquisador. Essa etapa de observação ocorreu entre outubro de 2013
e fevereiro de 2014, essa etnografia foi realizada em diferentes dias da semana e períodos
que contemplavam o horário de funcionamento do serviço. Levou-se em consideração o
critério de saturação, obtendo-se um total de 55 horas de observação. No que se refere
aos grupos focais, seu objetivo foi averiguar a percepção dos profissionais de saúde da
família sobre o Apoio Matricial que recebem do NASF. O roteiro do grupo focal foi
construído exclusivamente para essa pesquisa, dando-se destaque a três eixos: 1)
percepções sobre as práticas de Apoio Matricial; 2) efeitos do Apoio Matricial sobre o
trabalho da equipe de Saúde da Família; 3) potencialidades e fragilidades do Apoio
Matricial. Foram realizados quatro grupos focais (GFA, GFB, GFC,GFD), um para cada
uma das equipes de saúde da família apoiadas pelo NASF, no período de março a junho
de 2014. Todos os grupos focais foram áudio-gravados e, a partir dos dados primários
obtidos com a transcrição, foram construídas narrativas, tal como sugerido por Ricœur
(1997).
- 101 -
Cada síntese elaborada com base nos grupos focais foi devolvida ao próprio grupo
para que ele criticasse a narrativa elaborada pelos pesquisadores. Esses espaços de crítica
foram denominados de momentos reflexivos. Destaque-se que, nesses momentos, o
material apresentado pelo pesquisador poderia ser complementado ou modificado, e os
profissionais puderam confirmar posições, rever argumentos, discutir diferenças entre
aquilo que disseram e o modo pelo qual foram interpretados e compreendidos, podendo
se reposicionar diante do próprio discurso e da tradição discursiva que os sustentava
(Onocko, 2005).
A análise do material empírico resultou no procedimento da triangulação dos dados,
conforme proposto por Minayo (2005). A partir da leitura realizada do diário de campo e
das narrativas, foi constituída uma linha para a interpretação dos dados e emergiram dois
grandes eixos analíticos: I) A história feita, com enfoque sobre um determinado contexto
e tempo do município de Campinas (SP) e; II). A história se fazendo, o qual remete à
compreensão de como pensavam e atuavam os sujeitos que faziam aquela história.
Partimos do reconhecimento de que os processos de institucionalização de políticas e
práticas requerem a participação dos sujeitos, e que importa compreender os sentidos e
atribuições diversas de cada participante para identificar a potência instituinte presente
nos discursos e nas práticas. A ampla gama de questões que emergiu nesse eixo levou-
nos a desdobrá-lo em três categorias empíricas:
a) A metodologia de trabalho do NASF e seus efeitos; b) Lugar de (In)visibilidade e
(im)potência; c) Lugar de protagonismo e intercâmbios.
Resultados e Discussão
I) A história feita - o processo de implantação do NASF em Campinas (SP) e seus
desdobramentos.
Nesse eixo procuramos reunir fatos e eventos históricos de um determinado contexto
(Campinas - SP) em um determinado tempo, ressaltando as descontinuidades e rupturas,
os acasos e contingências que possibilitaram determinada escolha de caminho que
culminou na inauguração e institucionalização do NASF. Reconhecemos que não há uma
evolução nos acontecimentos, mas um processo vivo em constante construção, que
eventualmente sofre rupturas e que em outros momentos é apenas uma opção incremental
de mudanças que poderiam ou não ocorrer (Mattos; Baptista, 2011). Daí a importância
- 102 -
de destacarmos marcos ou eventos relevantes da historicidade do processo de
institucionalização do NASF.
Em 2008, o município de Campinas (SP) iniciou as discussões sobre a implantação
do NASF. Entretanto, por diversas questões, algumas relativas à dificuldade de
contratação de novos profissionais e outras ao receio de que a estruturação rígida do
projeto NASF liquidasse com a experiência menos normatizada de Apoio Matricial por
pequenas equipes praticada na cidade desde o início dos anos noventa do século XX
(Braga Campos, 2000), essa discussão permaneceu estagnada até meados de 2010,
quando foi retomada.
Com o avançar das reflexões sobre o tema, em 2011, foram constituídas as três
primeiras equipes de NASF, localizadas nos Distritos de Saúde Sudoeste, Norte e Sul. A
equipe montada pelo distrito Sul, logo no início, teve problemas relativos à saída de
profissionais e, como não houve reposição, não conseguiu de fato iniciar suas atividades
junto às equipes de saúde da família. No que se refere à equipe do Distrito Norte, sua
atuação ocorreu até fevereiro de 2013, quando as duas últimas profissionais do NASF se
desligaram sendo alocadas em outros serviços. Assim, atualmente, apenas a equipe do
Distrito Sudoeste continua funcionando no município e desenvolvendo suas atividades
junto a quatro equipes de saúde da família alocadas em um Centro de Saúde.
Uma destas equipes de saúde da família relatou o “privilégio” de contar com o apoio do
NASF:
[...] o município começou com três equipes de NASF e foi diminuindo sendo que agora só
tem uma equipe que é essa que está atuando no nosso Centro de Saúde. Aqui no Centro de
Saúde nos sentimos privilegiados, mas não é justo os demais Centros de Saúde não
poderem contar com o trabalho do NASF (GFB).
A equipe NASF do Distrito Sudoeste foi criada, aproximadamente em abril de 2011,
com recursos humanos já existentes, não havendo novas contratações. As indicações para
a constituição do NASF levaram em consideração o perfil individual, experiência do
profissional e também o interesse de cada um em atuar no grupo. A primeira equipe foi
constituída por uma fisioterapeuta, uma terapeuta ocupacional, uma nutricionista e uma
psiquiatra.
Com o passar do tempo, a equipe NASF adquiriu novos profissionais, que vieram em
reposição de demissões, mas a lógica de composição da equipe nunca levou em
consideração a recomendação proposta pelo Ministério da Saúde em suas publicações
- 103 -
sobre o NASF (Brasil, 2009; Brasil, 2014) e esse fato foi apontado em um dos grupos
focais:
[...] segundo as legislações a inserção do NASF deve ser uma demanda combinada entre a
equipe de saúde da família e gestão local, levando-se em consideração as questões que
envolvem o território. Aqui não ocorreu desta forma, o NASF foi montado a partir da
reorganização do apoio do Distrito e disponibilidade dos profissionais envolvidos, e não
de uma demanda da unidade (GFA).
Como apenas uma equipe de NASF era insuficiente para dar retaguarda para todas as
equipes de saúde da família que atuavam no território, foi realizada uma discussão no
Colegiado de Coordenadores de Unidades de Atenção Básica sobre o tema e pactuado os
seguintes critérios para a escolha das unidades básicas a serem apoiadas pelo NASF:
existência de reuniões da equipe de referência; comprometimento do coordenador local
com a proposta NASF e; envolvimento da unidade no projeto de gestão da clínica. Foram,
então, escolhidas três unidades básicas num total de dez equipes de saúde da família que
receberiam o suporte do NASF.
No primeiro trimestre de 2012, com a saída de duas profissionais da equipe NASF,
sem reposição, foi reduzida a quantidade de equipes apoiadas e o NASF passou a atuar
apenas em duas unidades básicas.
No final de 2012, houve incompatibilidade de projetos entre o NASF e as equipes de
uma das unidades básicas. Esse descompasso não foi superado e o NASF interrompeu
suas atividades no local. Assim, o NASF manteve apoio apenas a uma unidade básica,
composta por quatro equipes de saúde da família.
No período da observação participante, a composição da equipe NASF foi apresentada
na tabela abaixo:
Tabela 1. Composição por categoria profissional, carga horária total e carga horária
destinada às atividades do NASF, Campinas, 2013 e 2014.
Categoria Quantidade Carga horária Carga horária
Profissional total (semanal) NASF (semanal)
- 104 -
Psiquiatra 1 12h 12h
Vale ressaltar que alguns profissionais não têm dedicação exclusiva às atividades do
NASF e assumem outras ações ligadas à atuação como referência da Área Técnica no
Distrito Sudoeste (farmacêutica e assistente social) ou ações ligadas a assistência direta
em um Centro de Saúde específico (psicóloga).
Analisando essa trajetória, observa-se que a gestão municipal não definiu como
diretriz prioritária a implementação do NASF e tampouco optou por uma construção
compartilhada do projeto NASF a partir das necessidades do território e articulado às
atividades das equipes de saúde da família, restringindo o debate apenas aos
coordenadores das unidades. Um dos grupos focais explicitou esse descompasso, o qual
resultou em uma série de desencontros no que se refere ao início do trabalho da equipe
NASF quanto à metodologia de trabalho do apoio matricial às equipes de saúde da
família:
[...] um dia o NASF chegou do nada e simplesmente na reunião de equipe do Centro de
Saúde os profissionais NASF foram apresentados. Essa chegada foi bem complicada, pois
os próprios profissionais do NASF não tinham clareza do modo que deveriam funcionar,
quais instrumentos de trabalho iriam utilizar. Isso trouxe insegurança, dúvidas e nossa
equipe explicitou esse descontentamento (GFA).
Entretanto, apesar dessas dificuldades iniciais, a atuação do NASF foi, aos poucos,
sendo construída e resignificada, se instituindo uma prática interprofissional
compartilhada, como evidencia a narrativa a seguir:
[...] com o tempo compreendemos que essa questão foi superada e atualmente existe entre
nós uma relação interprofissional muito aberta [...] foi através da participação deles nas
reuniões de equipe que juntos construímos nosso contrato de trabalho, juntos criamos
sentido para o Apoio Matricial e estamos o tempo todo repactuando nosso trabalho, ou
seja, modelamos o trabalho entre o NASF e nós (GFB).
- 106 -
Essa ausência de apoio e/ou supervisão para os profissionais NASF se configurava em
um impasse, pois por meio da criação de espaços permanentes de análise e reflexão sobre
o Apoio Matricial é que se constroem possibilidades de realimentação de sua
potencialidade de transformar as práticas hegemônicas (Figeiredo e Onocko Campos,
2009). Além disso, a formação para o apoio depende da sistematização de reflexões sobre
o cotidiano de trabalho junto às equipes e usuários, reforçando a necessidade do espaço
de supervisão externa para refletir sobre a prática, as angústias, tensões e demais temas
emergentes no cotidiano (Dimestein e col., 2009).
Uma questão importante refere-se à centralidade do vínculo e da responsabilização
construída com /entre as equipes. A relação do NASF com as equipes de saúde da família
ocorria através de profissionais de referência, sendo que para cada equipe havia uma
dupla de profissionais de referência no NASF. Contudo, sempre que necessário, eram
acionados outros profissionais, que não eram referência direta para aquela equipe, para
desenvolver atividades de apoio mediante demanda. Essa questão foi destacada por uma
equipe de saúde da família no grupo focal:
[...] o NASF se organiza em duplas para participar das reuniões da equipe e depois eles
têm uma reunião entre eles para discutirem as questões levantadas. Então, mesmo não
tendo toda a equipe do NASF na nossa reunião sempre é possível acionar o apoio pelos
profissionais de referencia no NASF da equipe. Podemos acionar uma consulta individual;
a ida numa visita domiciliar conosco; qualquer atividade que seja necessária (GFD).
- 107 -
As reuniões da equipe de saúde da família era o principal espaço de comunicação e
para acionar o suporte do NASF, sendo que a maioria dos pactos ocorria durante esse
encontro, mediante discussão de casos. Entretanto, também ocorria acesso à equipe
NASF fora das reuniões para suporte aos casos imprevistos e urgentes conforme
preconizado por Campos e Domitti (2007). Essa facilidade de acesso à equipe NASF foi
apontada pelas equipes de saúde da família:
[...] existem espaços específicos, algumas agendas próprias para discutir questões que
envolvem o Apoio Matricial e, na maior parte do tempo, respeitamos essa organização.
Contudo, quando há um caso que não pode esperar acionamos os profissionais NASF fora
da agenda sistemática, discutimos no corredor, por telefone, pelo whatsApp e juntos
definimos qual será a conduta para o caso com muita tranquilidade (GFB).
[...] um ponto importante na relação com o NASF é o fato de a equipe estar sempre
disponível para acolher as nossas demandas (mesmo fora das agendas pactuadas) e pensar
numa forma de dar resposta, de se organizar para as coisas acontecerem de fato (GFC).
Observou-se também que os casos trazidos para discussão com o NASF eram
escolhidos espontaneamente por cada equipe de saúde da família e não havia
(formalmente instituído) nenhum protocolo ou lista de critérios para os casos que
deveriam ser compartilhados.
Percebeu-se que casos de vulnerabilidade social e subjetiva eram os prioritários,
portanto atendendo ao princípio da equidade, mas também refletindo a dificuldade dos
profissionais de saúde da família de lidarem com essa dimensão. A dinâmica da
autogestão do NASF repercutia nas equipes apoiadas. Exemplos disso foram os critérios
acordados no momento da discussão de caso, gerados em contratos conforme a
necessidade singular de cada caso.
A ausência de critérios para priorizar casos a serem compartilhados era visto de
maneira positiva pela maioria das equipes de saúde da família, com exceção de uma
equipe:
[...] enquanto equipe não sabemos quando podemos contar com o NASF, em que reuniões
o NASF estará presente, em que situações específicas o NASF poderá intervir junto com a
equipe. O trabalho do NASF acaba ocorrendo de forma não sistematizada, sendo tudo
resolvido na hora da discussão de caso e isso dificulta sabermos o momento de acionar o
NASF e em quais situações (GFA).
Durante as observações percebeu-se que nas equipes de saúde da família, nas quais já
existia uma tradição de organizar os processos de trabalho com base na cogestão de
saberes, poderes e afetos, as atividades desenvolvidas junto com a equipe NASF
- 108 -
aconteceram conforme acordos realizados, de maneira interativa, valorizando o "fazer
com" e não o "fazer pelo outro". Já nas equipes em que o processo de trabalho era
organizado com características tradicionais, com poder centrado nas categorias médica
ou enfermagem, o profissional NASF assumia uma postura mais ativa e propositiva, que
valorizava atividades em conjunto, mesmo quando isso não fosse uma demanda direta da
equipe de saúde da família.
Outra questão importante observada se refere à realização de devolutivas da maioria
dos casos acompanhados pela equipe NASF às equipes de saúde família. As devolutivas
geralmente ocorriam nas reuniões de equipe, de modo verbal, e não existia um registro
específico que facilitasse o monitoramento dos casos que estavam sendo acompanhados
pelo profissional NASF e os casos que eram devolvidos para as equipes de saúde da
família. A narrativa a seguir explicita a dinâmica da atuação interprofissional e
interinstitucional em redes de cuidado à saúde, promovidas pelo NASF:
[...] compreendemos que os casos são compartilhados com o NASF e em nenhum momento
deixam de ser da nossa responsabilidade [...] no limite, quando um caso fica sob
atendimento individual de um profissional do NASF sempre temos as devolutivas dos casos,
ou seja, eles ficam um tempo emprestados para o NASF e depois retornam para o cuidado
da equipe (GFD).
- 109 -
Essa possibilidade de organização das práticas interprofissionais e em consequência
do Apoio Matricial “duro” aponta para a forma como a valorização do saber técnico,
pontual, inflexível nas agendas produz algo muito próximo aos processos instituídos que,
por sua natureza, vão perdendo, pouco a pouco, o vigor e a potência de criação e invenção
próprios da dimensão instituinte.
- 110 -
Uma equipe de saúde da família também destacou, nos grupos focais, o distanciamento
dos gestores no que se refere à articulação dos processos de trabalho entre equipes
apoiadas e equipe NASF:
[...] o descompasso entre o que o NASF tem a oferecer e o que a equipe do Centro de Saúde
precisa ou espera é algo grave. Acreditamos que isso pode ser resolvido com a presença
de uma gestão ativa, que ajude tanto o NASF quanto a equipe do serviço a construir esse
modelo de apoio de matricial (GFA).
Diversos estudos apontam que o apoio do gestor local facilita a implantação do Apoio
Matricial, contudo, até o momento, isso ainda não se configurou como uma realidade no
município e esse apoio frágil por parte da gestão, para incorporação da lógica do Apoio
Matricial, tem se configurado em um impasse. Destaca-se que a implantação dessa
metodologia para o trabalho em saúde depende de vontade política, entretanto está
ficando cada vez mais nítido o descompasso de tempos da gestão e ritmo de
transformação das praticas cotidianas (Bezerra e Dimenstein, 2008; Jorge e col., 2012;
Onocko Campos e col., 2012).
Contudo, identificou-se nesta observação que o frágil apoio da gestão gera ruídos e
desconfortos, mas não traz paralisia para a continuidade das ações de apoio pela equipe
NASF. O que se percebeu foi o desenvolvimento de estratégias para escapar de amarras
burocráticas administrativas, mantendo distanciamento das demandas que interferem
negativamente no desenvolvimento de ações, pois a manutenção da autonomia dos
profissionais na construção de seus processos de trabalho é a possibilidade de
conseguirem se articular e responder às demandas solicitadas pelas equipes de saúde da
família.
Chama atenção a dificuldade de conciliar o horário dos profissionais NASF com o dos
profissionais da equipe de saúde da família, criando obstáculos, em algumas situações,
para o desenvolvimento do trabalho conjunto. Percebeu-se a existência de interesse e
desejo de ambas as equipes em conseguir realizar atividades compartilhadas, porém esse
processo é sempre difícil conforme apontado abaixo:
- 111 -
Existe no SUS Campinas uma quantidade insuficiente de serviços de retaguarda
especializada e devido a isso observou-se algumas situações em que a equipe NASF tem
assumido o papel de outros níveis de atenção. Não foi pouco frequente observar
atendimentos individuais de casos que, devido a sua complexidade, necessitavam estar
em um Centro de Referência Especializado. Neste sentido, Cunha e Campos (2011)
afirmam que a falta de serviços de saúde especializados pode conduzir a um
funcionamento equivocado do NASF, que assume um papel de substituir os serviços que
faltam na rede assistencial, na tentativa de responder a demanda da população. Essas
situações são pontos constantes de preocupação e são apontadas por duas equipes de
saúde da família:
[...] uma questão importante é a ausência quase total de alguns profissionais na rede do
município como: nutricionista, psicólogo, psiquiatra, entre outros. Observamos também
uma quantidade insuficiente de serviços de referência especializados para dar conta da
demanda dos casos que exigem uma atuação específica. Compreendemos que o NASF não
deve ser utilizado como tapa buraco e o correto é que o SUS Campinas fortaleça sua rede
assistencial para que ela seja de fato completa e resolutiva (GFC).
[...] NASF não tem um cardápio de ofertas claro, que nos ajude a compreender a função
dos profissionais e automaticamente facilitar os fluxos de Apoio Matricial entre eles e a
nossa equipe. Em algumas situações não sabemos como eles podem nos ajudar, no que
podemos pedir ajuda, o que é possível de ser compartilhado (GFA).
Através da observação foi possível identificar que isso ocorre por dois motivos: o
primeiro devido ao fato do NASF priorizar a organização da agenda individual do seu
profissional e, segundo, porque não existe um espaço formal coletivo definido para tornar
- 112 -
de conhecimento público essas atividades e isso ocorria de maneira informal, restringindo
a informação.
Outra problemática observada foi a ausência de um momento específico, após a
finalização das atividades compartilhadas, para refletir sobre os efeitos dessas atividades.
Os registros são realizados em separado pela equipe NASF e equipe de saúde da família.
Nas poucas vezes em que as equipes de saúde da família e NASF tentaram de alguma
maneira resgatar questões ligadas às atividades compartilhadas, isso não ocorria de forma
periódica e diversos aprendizados que poderiam qualificar a execução de novas ações
acabaram se perdendo.
[...] o NASF traz muito suporte para questão educativa tanto para os usuários através dos
grupos e para a equipe através da discussão de alguns temas específicos (GFA).
[...] uma coisa importante realizada pelos fisioterapeutas do NASF foi a organização da
fila da unidade por critérios de risco. Eles avaliaram todos os usuários que estavam na fila
e organizaram um fluxo para casos que deveriam ir para a referência municipal, casos que
seriam acompanhados por eles na unidade, casos que ficariam sob responsabilidade da
equipe (GFC).
[...] a participação do NASF nos grupos é muito interessante, em especial no antigo grupo
de hipertensos e diabéticos, que estava parado. Com a inserção do NASF ele ganhou vida
- 113 -
novamente, pois eles ajudam na elaboração das propostas para o grupo, na organização
das atividades e agora com a farmacêutica estamos também entregando a medicação no
grupo(GFD).
Na nossa visão o NASF apoia nas nossas necessidades, sejam necessidades internas dentro
da unidade ou externas acionando outros serviços da rede. Desenvolvem uma rede
multidisciplinar sempre buscando nos ajudar na resolução dos casos e complementar o
nosso trabalho. O trabalho do NASF sempre faz diferença, sempre aprendemos, sempre
agrega uma visão nova (GFD).
Considerações Finais
Esse estudo verificou que a metodologia do Apoio é a base para a atuação da equipe
NASF junto às equipes apoiadas. A adoção dessa metodologia contribuiu para a
legitimidade, instituição de um vínculo afetivo e o desenvolvimento de uma relação
interprofissional interativa. Em alguns momentos, a equipe NASF se confundia com a
equipe de saúde da família e se pensava como sendo uma equipe ampliada; entretanto,
em outros momentos, a equipe NASF se distanciava e assumia um papel típico dos
especialistas, ao privilegiar os núcleos de saberes específicos, às vezes, perdendo de vista
a importância de se evitar a hierarquização, o especialismo e a fragmentação do cuidado.
Cabe, portanto, seguir investigando em que medida o Apoio Matricial se configura
como uma práxis dinâmica, capaz de lidar com a necessidade de estruturação prévia e
improvisação frente ao situacional, não se congelando em uma ação estável que
reconhece-se enquanto um meio e um final definidos a priori. Trata-se em uma estratégia
que a cada dia, a cada novo processo vivenciado, a cada nova prática instituída mantém
viva a possibilidade de recriação? Que compreende a singularidade dos contextos
institucionais e das práticas em saúde enquanto campos em constante estado de
metamorfose?
- 115 -
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CONCLUSÃO
Esta pesquisa procurou compreender como a concepção teórica Paideia e sua
aplicação metodológica –Apoio Matricial– vêm sendo utilizadas pelas instituições
públicas de saúde em Campinas (SP) e analisar repercussões deste referencial sobre a
produção do cuidado em saúde.
Retomando a pergunta inicial da pesquisa, afinal o Apoio Matricial se configura
em uma estratégia efetiva para democratização das relações interprofissionais, trazendo
contribuições inovadoras que impactam na qualidade de atenção à saúde ou se resume
apenas a um "novo nome" que reflete as práticas hegemônicas de produção de saúde?
A partir da análise dos dados coletados, ficou claro que o Apoio Matricial estimula
a possibilidade de centrar a organização do cuidado em saúde na relação pessoa a pessoa,
em lugar de profissionais, quando muito, preocupados apenas com procedimentos ou
doenças. Quando utilizada, a metodologia do Apoio Matricial produz um clima de
democracia nas relações interprofissionais, produzindo tensões entre o trabalho coletivo
e o individual. Observou-se ainda que o Apoio Matricial estimula ações coordenadas
entre diferentes profissionais, especialidades e equipes, contribuindo para a instituição de
cuidado singular e favorecendo o aprendizado coletivo.
Além disso, o Apoio Matricial vem se constituindo em uma forma concreta para
a construção efetiva de rede assistencial, pois possibilita a atuação mais integrada entre
serviços e profissionais que passam a dividir responsabilidades pelo cuidado do usuário.
Do ponto de vista gerencial, temos no Apoio Matricial uma nova maneira de
garantir contratos de trabalho que visem à construção de autonomia, troca de experiências
e instituição de corresponsabilidade.
A experiência vivenciada no SUS Campinas aponta que o Apoio Matricial e sua
sobrevivência se devem ao fato desta estratégia para organização do trabalho ter sido
incorporada como um elemento da cultura institucional, que a despeito de não ser adotada
como diretriz pela gestão municipal, nos últimos dez anos, foi alimentada diretamente
pelo protagonismo dos profissionais.
Uma parte importante dos profissionais reconheceu na estratégia de Apoio
Matricial um instrumento de resistência, de democratização, autonomia, criatividade e
reinvenção das maneiras de produzir saúde. Profissionais com convicção de que o
- 120 -
Apoio Matricial contribuía para potencializar a integralidade do cuidado, a resolutividade
da Atenção Básica e apostaram em fazer diferente promovendo mudanças apesar do baixo
investimento dos gestores.
Segundo os resultados obtidos, foi possível identificar obstáculos que
prejudicam a relação dialógica, o trabalho interprofissional e a cogestão, pressupostas
pelo Apoio Matricial. Alguns desses obstáculos já haviam sido apontados por Campos e
Domitti (2007), porém, também foi possível identificar novos obstáculos com o
desenvolvimento da pesquisa.
Há obstáculos estruturais que estão na forma de organização de alguns serviços
de saúde, que mantém a lógica corporativa, hierárquica, burocrática e centrada em
procedimentos, coexistindo com as diretrizes do Apoio Matricial. Essa disputa entre os
modelos assistenciais, ora com características próximas do modelo hegemônico e ora
próximas dos princípios da cogestão, dilui a responsabilidade sanitária sob os casos
acompanhados, promovendo um grau de fragmentação do cuidado e dificultando a
integração entre as distintas especialidades e profissões. Em decorrência disso, durante a
observação ficou evidente a necessidade de constante diálogo e de reuniões para repactuar
as maneiras possíveis de se trabalhar em equipe. Tais obstáculos precisam ser
identificados e dentro do possível enfraquecidos para que seja possível trabalhar-se com
foco nas necessidades de saúde do território e da população.
A implantação do SUS ainda é parcial e talvez também por isto se encontrou-
se outro obstáculo decorrente do excesso de demanda e da carência de recursos. Equipes
de saúde da família e de serviços especializados incompletas e subdimensionadas; oferta
de serviços de média e; alta complexidade incompatíveis com a demanda. Agravava esse
quadro de carência as formas de contratação diversas: via administração direta ou outras
formas de parceria público-privadas. Em geral, encontrou-se grande número de equipes
de saúde da família apoiadas por uma única equipe/profissional especialista. Verificou-
se que o Apoio Matricial se configura em uma estratégia relevante para racionalizar o
acesso e o uso de recursos especializados quando cria a possibilidade para que um único
especialista integre seu trabalho com um número adequado de equipes de saúde da família
e sejam realizadas atividades conjuntas (consultas compartilhadas, grupos, visitas
domiciliares), discussões de caso e outras atividades coletivas. Para isso é preciso que
haja uma rede assistencial dimensionada adequadamente, tanto em oferta quanto em
recursos profissionais. É preciso estar atento a esse obstáculo para que o Apoio Matricial
- 121 -
não se torne um arranjo substitutivo à rede assistencial ou se torne um arranjo
"superlotado", sendo referência para um grande número de equipes de saúde da família
(dificultando a criação de vínculo entre os profissionais).
Também se identificou obstáculos ligados à infraestrutura dos serviços de
saúde e ausência de transporte sanitário. Infelizmente, as unidades de saúde de Campinas
(SP) apresentam pequena quantidade de consultórios e espaços para atividades coletivas
(como grupos), o que dificulta a atuação compartilhada das equipes de Apoio Matricial e
equipes de saúde da família. Mesmo organizando escalas para revezar os consultórios,
não foi incomum, (em especial durante a observação), perceber o quanto o espaço físico
apresenta infraestrutura incompatível para desenvolver todas as ações propostas. Em
vários momentos foi necessário buscar espaços físicos no território (como salão da igreja,
ONGS, entre outros), mesmo assim, algumas atividades acabaram sendo prejudicadas ou
canceladas. No que se refere ao transporte sanitário não existe uma organização que
priorize a execução das atividades de Apoio Matricial. A regra para possibilitar o
deslocamento das equipes matriciais junto aos serviços da Atenção Básica, para
possibilitar uma visita domiciliar conjunta ou reuniões necessárias para pactuar o Projeto
Terapêutico compartilhado em outros serviços assistenciais como Hospital ou
Ambulatório de Especialidades, tem sido uma responsabilidade exclusiva dos
profissionais que utilizam seus próprios veículos para garantir o desenvolvimento das
ações pactuadas.
A invisibilidade do Apoio Matricial por parte dos gestores do SUS Campinas
também se desenhou como um obstáculo. Apesar de o município ser o precursor das
experimentações que originaram esta estratégia de organização do trabalho
interprofissional há vários anos não é tomada enquanto política. Essa escolha da gestão
em não trazer o Apoio Matricial enquanto projeto político e institucional resulta em
ausência de supervisão/ suporte para os profissionais que atuam com esta estratégia. Há
ainda tempo restrito na agenda para planejar e realizar ações compartilhadas, em virtude
de cobrança por produtividade, valorizando-se atividades individuais, com
enfraquecimento dos espaços de cogestão e não liberação da agenda de alguns
profissionais, em especial os médicos, para realizar discussões ligadas ao Apoio
Matricial. Além disso, as ações de apoio competem com outras atividades assistenciais,
dificultando conciliar as agendas dos diferentes profissionais. Já foi apontado neste
estudo que o apoio dos gestores facilita a implantação do Apoio Matricial, assim o desafio
- 122 -
se configura em criar estratégias que possibilitem ampliar a visibilidade das ações de
Apoio Matricial e seu impacto tanto nas questões assistenciais quanto na otimização de
recursos financeiros.
O último obstáculo reconhecido se refere a formação dos profissionais da
saúde. Na maioria das faculdades, não se investe na formação de profissionais para
trabalhar em equipe. Sabe-se que os profissionais de saúde precisam uns dos outros, no
entanto, a formação da maior parte deles se dá de maneira isolada, valorizando práticas
que se pautam na lógica e no interesse das categorias e setores (Castro, Campos, 2011).
Desta forma, o paradigma hegemônico que restringe o entendimento de saúde a ausência
de doença, que mantém a concentração de poder na categoria médica e valoriza o núcleo
profissional e não a equipe, ainda é frequente e comum na organização dos processos de
trabalho em saúde no município e dificulta a implantação das diretrizes do Apoio
Matricial. Claro que repensar apenas a formação para os profissionais não é a solução
mágica para garantir que todos atuem como apoiadores matriciais e sejam atores
instituintes de práticas emancipatórias, entretanto, pode facilitar a consolidação de
mudanças nas práticas de saúde.
Todos os obstáculos identificados merecem atenção, análise e não há soluções
simples ou prontas. Contudo, no desenvolvimento desta pesquisa também foi possível
identificar, pela história do Apoio Matricial em Campinas, com a aplicação dos
questionários, com a observação participante e com os grupos focais alguns caminhos
que foram adotados visando a superação, ainda que parcial, desses impasses. O primeiro
caminho apontado se refere ao fato do Apoio Matricial no município ser compreendido
como um elemento da cultura institucional, sendo uma estratégia para organização do
trabalho interprofissional, uma diretriz sobre como desenvolver ações compartilhadas e
não como um arranjo estrutural, já que não existem cargos de apoiadores matriciais.
Assim a estratégia de Apoio Matricial, como já descrito, se configura em uma aposta dos
profissionais de saúde sendo fruto da base e não uma imposição dos gestores.
Alguns dos elementos identificados que podem explicar a propagação do Apoio
Matricial e sua sustentação são: a trajetória histórica com grande participação na
Atenção Primária e ativa atuação dos movimentos sociais na criação do SUS Campinas;
o protagonismo dos profissionais, em especial da Saúde Mental, nas primeiras
experimentações de Apoio Matricial; a presença de um número expressivo de
profissionais que autodeclaram atuar como apoiadores matriciais em diversos serviços
- 123 -
que compõem a rede assistencial; a expansão do Apoio Matricial para outras áreas
temáticas como a reabilitação, abordagem de DST, assistência domiciliar, entre outras; a
incorporação do NASF as iniciativas já consolidadas de Apoio Matricial; a presença de
Hospitais, mesmo que de maneira discreta, dentre os serviços que contam com
profissionais que atuam com o Apoio Matricial; transmissão de conhecimentos e da
expertise para o Apoio Matricial, mesmo quando não houve cursos de formação nos
últimos dez anos por meio da convivência de diferentes "gerações" de profissionais.
A construção de vínculo como um tema central quando se trata do Apoio Matricial
também merece destaque.
“Vínculo é um vocábulo de origem latina, é algo que ata ou liga pessoas, indica
interdependência, relações com linhas de duplo sentido, compromissos dos profissionais
com os pacientes e vice-versa. Assim na prática do Apoio a constituição de vínculo depende
de movimentos tanto do Apoiador quando da equipe. Do lado da equipe, somente
constituir-se-á vínculo quando ela acreditar que o Apoiador poderá contribuir, de algum
modo, para qualificar seu processo de trabalho. O vínculo começa quando dois
movimentos se encontram: uns demandando ajuda, outros se encarregando destes pedidos
de socorro”(CAMPOS, 2000, p.53).
- 125 -
A função Apoio, estejam os profissionais encarregados do o cuidado direto ao
usuário ou atuando na gestão, implica escolher ativamente; repensar o significado e o
modo como se organiza o trabalho em saúde, sobre como afetamos a outros e como somos
também afetados. Fazer apoio significa escolher viver em um constante movimento de
aprender e desaprender, avançar e recuar. Ou seja, significa escolher entrar em um
processo de mudança interativo e singular. E, neste sentido, importa menos saber se a
mudança foi eficaz ou nociva, pois o que realmente torna o processo relevante é o fato de
poder assumir uma ação política capaz de transformar modelos assistenciais, discursos e
modos de agir co-construindo novas práticas para enfrentar os desafios do SUS.
A institucionalização do Apoio Matricial por meio de políticas ministeriais e
aporte financeiro, como o NASF, representaram um avanço na consolidação de
dispositivos de gestão que fortalecem a relação horizontal de direitos e poderes entre as
equipes, operando um modo de produzir mudanças nas práticas concretas do cotidiano
do SUS.
Contudo, é preciso atenção para que o Apoio Matricial (seja via NASF ou
outras formas de organização em equipes temáticas) não caia na armadilha de ser
realizado de forma reducionista e inflexível, perdendo tanto sua capacidade de criação e
reinvenção de novas formas de cuidar quanto também de construção de um processo de
trabalho pautado nas necessidades das equipes de saúde da família e usuários.
Assim, reforça-se a importância de reconhecer que o Apoio é uma Práxis (CAMPOS,
2011) e não apenas uma ferramenta ou tecnologia. É um método dialético, composto por
uma ampla gama de conceitos que podem ser combinados de várias maneiras conforme
a necessidade identificada no caso ou na equipe.
Vale ressaltar, que não se pretende com essa pesquisa esgotar a temática do
Apoio Matricial, mas sim lançar luz sobre como tem sido a incorporação desta estratégia
no SUS Campinas, reunindo elementos capazes de caracterizar essa prática de atenção à
saúde, os obstáculos enfrentados e alguns caminhos adotados no esforço de produzir
novas formas de cuidado.
Desta forma, outros trabalhos que problematizem as questões levantadas,
porém não aprofundadas nesta pesquisa, são de extrema relevância para a construção do
conhecimento voltado ao campo do trabalho e de práticas interprofissionais no Sistema
Único de Saúde, e para que o Apoio Matricial se fortaleça enquanto ação política, postura
ética e emancipatória pautado na radicalidade democrática e defesa da Vida.
- 126 -
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 154, de 24 de janeiro de 2008. Dispõe sobre a criação
dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família. Diário Oficial da União 2008; 25 jan.
- 127 -
Campos GWS, Domitti AC. Apoio Matricial e Equipe de Referência: uma metodologia
para gestão do trabalho interdisciplinar em saúde. Cadernos de Saúde Pública, Rio de
Janeiro, v.23, n.2, p. 399–407, fev.2007.
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em saúde. (Mestrado em Saúde Coletiva) - Faculdade de Ciências Médicas, Campinas,
2011.
Domitti, ACP. Um possível diálogo com a teoria a partir das práticas de Apoio
Especializado Matricial na Atenção Básica de Saúde. [Tese em Saúde Coletiva].
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Apoiadores do SUS Campinas (Mestrado Profissional em Saúde Coletiva: Políticas e
Gestão em Saúde) - Faculdade de Ciências Médicas, Campinas, 2014.
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Campinas, SP: uma rede ou um emaranhado? Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro,
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Paidéia e formação. (Tese em Saúde Coletiva) - Faculdade de Ciências Médicas,
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e da formação profissional. (Tese em Saúde Coletiva) - Faculdade de Ciências Médicas,
Campinas, 2012.
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- 129 -
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(Mestrado em Saúde Coletiva) - Faculdade de Ciências Médicas, Campinas, 2014.
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Saúde Coletiva. In: Barros, Cecatti, Turato (orgs.). Pesquisa Qualitativa em Saúde:
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Yin, R.K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Tradução: Daniel Grassi. 2. ed. Porto
Alegre: Bookman, 2001
- 130 -
APÊNDICES
APÊNDICE A
Data de preenchimento:___________________________________________________________
Município: ____________________________________________________________________
IDENTIFICAÇÃO
Nome: ________________________________________________________________________
- 131 -
FORMAÇÃO
1) Graduação
Curso:_________________________________________________________________
Instituição de ensino:____________________________________________________
Ano de conclusão:___________________
Caráter da instituição: ( ) público ( ) privado ( ) outro: Qual? ______________
7) A seleção para seu cargo atual incluía questões sobre Saúde Pública/ Saúde Coletiva? (
) Sim ( ) Não ( ) Não Sei
8) A seleção para seu cargo atual incluía questões sobre Apoio Matricial? ( ) Sim ( )
Não ( ) Não Sei
9) Foi informado que as atividades de Apoio Matricial estavam entre as funções a serem
exercidas no seu cargo atual? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não Sei
11) a) Teve alguma experiência profissional na área da saúde anterior ao cargo atual?
( ) Sim ( ) Não
b) Se SIM, destaque até três que considere mais significativas:
1. ____________________________________________________________
2.____________________________________________________________
3. ____________________________________________________________
12) Exerce alguma outra atividade profissional no momento, além de seu cargo atual?
( ) Sim ( )Não Qual(is)?:_____________________________________________
- 133 -
APOIO MATRICIAL
13) Há quanto tempo desenvolve atividades de Apoio Matricial?(em meses)_____________
14) Do total de horas para o qual você foi contratado, quantas horas você dedica às atividades
de Apoio Matricial? _____________(horas apoio)
17) a) Você conhece algum documento oficial (da Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria
Estadual de Saúde e/ou do Ministério da Saúde) que oriente as tarefas do Apoio
Matricial? ( ) Sim ( ) Não
b) Se SIM, como você o avalia:
( )Pouco adequado ( )Adequado ( )Muito adequado
18) a) Você recebeu alguma formação da Secretaria Municipal de Saúde para desenvolver o
trabalho de Apoio Matricial? ( ) Sim ( ) Não b) Se SIM, como você a avalia:
( )Pouco adequada ( )Adequada ( )Muito adequada
19) Você oferece atividades de Apoio Matricial para quantas Equipes de Referência
atualmente?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
20) Com que frequência você desenvolve atividades de Apoio Matricial junto às Equipes
Apoiadas:
- 134 -
( ) Semanal ( ) Quinzenal ( ) Mensal ( )outra frequência/qual? _______________
21) Qual é a composição da sua equipe de Apoio Matricial? (Cite as categorias profissionais
e a quantidade de componentes de cada categoria profissional que vão com você realizar
Apoio Matricial às Equipes Apoiadas)
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
22) Quais são as formas das equipes apoiadas acionarem o seu suporte enquanto Apoiador
Matricial?
Pode escolher mais de uma alternativa.
( ) Outros. Quais:____________________________________________
23) a) Há critérios definidos para a escolha dos casos que necessitam do Apoiador Matricial?
( ) Sim ( ) Não
b) Se SIM, quem construiu esses critérios? ( ) O Apoiador Matricial de forma
independente
( ) O Apoiador Matricial junto à Equipe Apoiada
( ) O Apoiador Matricial junto à Gestão
( ) A Equipe Apoiada
( ) A Gestão
( ) Não sei informar
24) Assinale os instrumentos/ferramentas que utiliza nas suas atividades de Apoio Matricial.
Pode assinalar mais de uma alternativa:
( ) Discussão de casos
( ) Construção de Projeto Terapêutico Singular com a Equipe Apoiada
( ) Intervenções conjuntas com profissionais apoiados (grupos, visitas domiciliares,
consultas, etc)
- 135 -
( ) Assistência direta a usuários indicados pela Equipe Apoiada
( ) Atividades de formação para as Equipes (atualização temática, discussão de
protocolos)
( ) Tele Apoio (telefone, e-mail, Skype)
( ) Projetos de saúde intersetoriais no território
( ) Outros. Quais?______________________________________________________
25) a)Você recebe alguma forma contínua de supervisão ou apoio para desenvolver as
atividades de Apoio Matricial? ( ) Sim ( ) Não b) Se SIM, como você avalia:
( )Pouco adequada ( )Adequada ( )Muito adequada
26) Para o desenvolvimento das suas atividades como Apoiador Matricial, como você avalia
a importância dos seguintes processos de formação:
POUCO IMPORTANTE MUITO
IMPORTANTE NÃO SE APLICA
IMPORTANTE
Graduação
Pós-Graduação
Educação permanente
Supervisão ou apoio às
atividades de Apoio Matricial
Outra atividade/qual(is)
27) Existe algum processo de avaliação que envolva suas atividades desenvolvidas de
Apoio Matricial? (formal/informal, sistemático, periódico, de processo, entre outros)
( ) Sim ( ) Não
- 136 -
28) Cite até três resultados positivos do seu trabalho de Apoio
Matricial_______________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
30) Cite até três medidas que você acredita que favoreceriam o seu trabalho do Apoio
Matricial:
_____________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
- 137 -
APÊNDICE B
Pergunta disparadora:
Como tem sido a experiência de vivenciar o apoio matricial desenvolvido pelo NASF no
Centro de Saúde?
Eixos
• Segundo a experiência de vocês o que é apoio matricial? Qual sua finalidade no processo
de trabalho de em saúde?
• Vocês reconhecem os profissionais que compõem o NASF (nome, formação)?
• Contem um pouco das atividades que o NASF desenvolve junto as equipes do Centro
Saúde?
Repercussões do apoio matricial sobre o trabalho da equipe de Saúde da Família
• Na visão de vocês o apoio matricial desenvolvido pelo NASF está servindo para alguma
coisa? Se sim cite exemplos.
• Que situações do cotidiano de trabalho vocês solicitam o apoio do NASF?
• Como é a relação do NASF junto as equipes apoiadas? Houve elaboração de contrato
entre NASF e equipes apoiadas?
• Existem critérios para acionar o apoio do NASF? Se sim contem como eles foram
construídos.
• Como o NASF dá retorno para a equipe dos casos compartilhados? É sistematicamente
realizado retorno das atividades compartilhadas? Potencialidades e fragilidades do apoio
matricial
• Quais outros pontos envolvendo o apoio matricial desenvolvido pelo NASF junto as
equipes do Centro de Saúde vocês gostariam de acrescentar?
- 138 -
APÊNDICE C
Narrativa Equipe Saúde da Família 1
Compreendemos que a equipe do NASF veio para somar, enriquecer nossa equipe
porque é composta por profissionais específicos que não temos nas equipes básicas das
unidades. Tem psiquiatra, assistente social, fisioterapeuta, farmacêutica que nos ajudam
a conduzir alguns os casos, estão sempre discutindo conosco os casos com maior
vulnerabilidade.
Para alguns de nós a participação do NASF nos grupos é muito interessante, em
especial no antigo grupo de hipertensos e diabéticos, que estava parado. Com a inserção
do NASF ele ganhou vida novamente pois eles ajudam na elaboração das propostas para
o grupo, na organização das atividades e agora com a farmacêutica estamos também
entregando a medicação no grupo. O grupo foi reorganizado, temos convite, datas fixas
e contamos com a parceria do médico que indica o grupo nas consultas.
Para outros de nós, a impressão atualmente é que eles estão sempre junto conosco e
gostamos muito de fazer visitas domiciliares compartilhadas com esses profissionais
porque sempre aprendemos coisas novas.
Outra coisa que sempre incluímos o NASF é na discussão dos Projetos
Terapêuticos, sempre acionamos para nos ajudar no caso e eles fazem visita domiciliar,
acionam outros serviços como o Conselho do Idoso e assim por diante.
Para nós, é bem tranquilo acionar o NASF pois temos canal aberto com os
profissionais que compõem a equipe seja para casos mais ou menos urgentes. O NASF
está disponível para nos ajudar seja quando nos encontramos no corredor, por telefone ou
na reunião de equipe.
Identificamos várias atuações do NASF na equipe como nas visitas domiciliares,
grupos, projetos terapêuticos, organização de algumas filas por critério de risco
(ex:fisioterapia), matriciamento da saúde mental com a psiquiatra e em alguns casos eles
também fazem atendimento individual.
Vale ressaltar, que atualmente nossa relação com a equipe do NASF melhorou
bastante. No começo quando eles chegaram foi bem difícil porque não sabíamos a função
deles, o que eles iam fazer aqui, foi um começo bem confuso. Porém, com o passar do
tempo fomos nos ajustando e o trabalho compartilhado começou a aparecer. Na nossa
visão o NASF apoia nas nossas necessidades, sejam necessidades internas dentro da
unidade ou externas acionando outros serviços da rede. Desenvolvem
- -
139
uma rede multidisciplinar sempre buscando nos ajudar na resolução dos casos e
complementar o nosso trabalho. O trabalho do NASF sempre faz diferença, sempre
aprendemos, sempre agrega uma visão nova.
Para alguns de nós, o NASF já faz parte da equipe do Centro de Saúde. Eles tem
autonomia nas suas ações, organizam atividades conosco ou sozinhos, convocam
usuários, então compreendemos que eles já são da casa.
Entendemos que o NASF está o tempo todo compartilhando casos conosco, ou seja,
o caso é da equipe mas eles discutem o caso, ficam atendendo sozinhos um tempo e depois
fazem a devolutiva para equipe.
Nosso canal oficial de comunicação com o NASF é a reunião de equipe. Eles
participam com uma certa frequência e discutimos juntos como vai ser a inserção do
NASF nos casos necessários. Compreendemos que os critérios para escolher os casos que
o NASF podem ajudar são sempre construídos com eles, não temos nada definido
anteriormente.Consideramos que desta forma fica mais adequado e na discussão com eles
visualizamos a forma que eles podem ajudar, então é bom não ter esses critérios fechados
e podermos acionar para casos mais ou menos complexos, casos novos, casos antigos,
isso vai acontecendo naturalmente.
Entendemos que nossa relação com o NASF não é formal e definida através de
protocolos. Pelo contrario ela é dinâmica, livre, as coisas vão acontecendo no dia a dia e
na medida que vamos conversando, trocando ideias e tirando duvidas.
Observamos que a equipe do NASF se organiza em duplas para participar das
reuniões da equipe e depois eles tem uma reunião entre eles para discutirem as questões
levantadas. Então, mesmo não tendo toda a equipe do NASF na nossa reunião sempre é
possível acionar o apoio pelos profissionais de referencia no NASF da equipe. Podemos
acionar uma consulta individual, a ida numa visita domiciliar conosco, qualquer atividade
que seja necessária.
Para alguns de nós, o NASF é uma ferramenta extra, é algo diferencial para
qualificar a atenção básica mas diretamente não afetou nosso modo de trabalhar. Claro
que antes deles resolvíamos os casos do nosso jeito, com eles agora fica mais tranquilo
porque eles conduzem o casos junto conosco, dividem tarefas sobre o caso, vão atrás de
algumas questões especificas.
- 140 -
Para outros de nós, o NASF consegue sempre agilizar a resolução dos casos, pois
eles têm acesso aos serviços da rede, o caso caminha mais rápido, eles conseguem
dissolver " os nós" da rede assistencial.
Compreendemos que os casos são compartilhados com o NASF e em nenhum
momento deixam de ser da nossa responsabilidade. Então não encaminhamos para o
NASF e sim pactuamos atividades conjuntas como visitas domiciliares, grupos, entre
outras. Assim conseguimos qualificar a assistência prestada, não perdemos o caso de vista
e sempre aprendemos nas atividades compartilhadas. No limite, quando um caso fica sob
atendimento individual de um profissional do NASF sempre temos as devolutivas dos
casos, ou seja, eles ficam um tempo emprestados para o NASF e depois retornam para o
cuidado da equipe.
No limite, quando um caso fica sob atendimento individual de um profissional do
NASF sempre temos as devolutivas dos casos, ou seja, eles ficam um tempo emprestados
para o NASF e depois retornam para o cuidado da equipe.
Para alguns de nós, a atividade de apoio realizada pelo NASF é essencial mas seria
melhor que eles tivessem agenda individual no sistema como todos os outros
profissionais. Entendemos que perderíamos o apoio mas ganharíamos atendimento de
fisioterapia, farmacêutica, assistente social e isso também iria qualificar o atendimento
prestado na unidade.
Alguns de nós identifica que o NASF traz sempre ideias novas, eles sempre acionam
a nossa criatividade para pensar nossas ações conjuntas. Outros de nós, entende que eles
não trazem coisas novas, o NASF ajuda a equipe no que ela já sabe fazer, dá uma mão,
está próximo e disponível.
Vale ressaltar, que o NASF desenvolvia mensalmente uma atividade de educação
permanente com participação de quase todos agentes de saúde da unidade para identificar
a nossa demanda. No começo a atividade foi ótima, trouxe motivação, mas com o tempo
foi ficando cansativa e sem sentido para alguns. Na verdade uma parte do grupo queria
uma reunião mais pontual, tipo capacitação sobre algum tema relevante como vacinação.
Por fim, decidimos que essa atividade, deveria ser reformulada e reavaliada para fazer
sentido para todos os agentes de saúde.
Finalizando, observamos que mesmo o NASF sendo o mesmo para todo o centro
de saúde as equipes não se relacionam com essa equipe da mesma maneira, pois cada
uma tem sua singularidade. Então existem atividades que desenvolvemos com o NASF e
- 141 -
outras equipes não fazem, a forma de demandar ou acionar o NASF funciona diferente
em cada equipe e não existe atividades padrões ou critérios delimitados na relação do
NASF com as equipes.
- 142 -
APÊNDICE D
Narrativa Equipe Saúde da Família 2
A experiência de trabalho desenvolvido pela equipe NASF junto a nossa equipe tem
sido composta de alguns desencontros. O NASF já existe há três anos, mas acreditamos
que, em especial no primeiro ano, existiam muitas dúvidas sobre qual era o trabalho deles
e que trabalho essa equipe ia desenvolver no Centro Saúde.
Para alguns de nós esse desencontro se deve a forma de organização do SUS
Campinas que não tem um projeto político institucional claro e com isso fica difícil saber
porque o NASF foi criado. Indo além, um dia o NASF chegou, do nada e simplesmente
na reunião de equipe do Centro de Saúde os profissionais NASF foram apresentados. Essa
chegada foi bem complicada pois os próprios profissionais do NASF não tinham clareza
do modo que deveriam funcionar, quais instrumentos de trabalho iriam utilizar. Isso
trouxe insegurança, dúvidas e nossa equipe explicitou esse descontentamento.
Um exemplo de como essa chegada da NASF foi complicada na nossa equipe é
lembrar que no momento da chegada estávamos reorganizando a forma de realizar o
agendamento através do Grupo de Marcação de Consulta com o objetivo de melhorar o
acesso dos usuários. Esse projeto era muito importante para equipe, havia investimento
de todos os profissionais pois se configurou em uma mudança radical no processo de
trabalho e durante um ano o NASF não participou nenhuma vez dessa atividade pois não
tinha compatibilidade entre as agendas.
Para alguns de nós esse descompasso entre o que o NASF tem a oferecer e o que a
equipe do Centro de Saúde precisa ou espera é algo grave. Acreditamos que isso pode ser
resolvido com a presença de uma gestão ativa, que ajude tanto o NASF quanto a equipe
do serviço a construir esse modelo de apoio de matricial.
Reconhecemos que com o passar do tempo as coisas foram melhorando, o NASF
conseguiu se integrar pois participava das nossas reuniões de equipe compartilhando
alguns casos e também participava do Grupo Marcação de Consultas realizando
atividades educativas e isso foi muito positivo para nós. Entretanto, a atividade educativa
por vários motivos não continuou.
Para alguns de nós, as vezes parece que ter o NASF não faz diferença nenhuma, o
NASF estar ou não resulta na mesma coisa. Uma parte de nós tem dificuldade de
identificar as atividades onde o NASF está inserido e outra parte consegue identificar as
- 143 -
atividades educativas e algumas consultas conjuntas como compondo o apoio
desenvolvido pelo NASF.
Para nós está claro quem são os profissionais que compõem o NASF, apesar de não
termos clareza o que é o apoio que eles devem fazer para equipe.
Para alguns de nós, alguns profissionais do NASF acabam atuando como "tapa
buraco" na falta da equipe completa no serviço em especial no caso da equipe de saúde
mental, que atualmente não existe mais no centro de saúde visto que tanto o psiquiatra, a
terapeuta ocupacional e a psicóloga se desligaram do serviço. A psiquiatra do NASF se
tornou a única referência para nós e assumiu o acompanhamento dos casos mais graves
em parceria com o médico da equipe.
Compreendemos que essa função de "tapa buraco" não faz parte das atividades de
apoio matricial que devem ser desenvolvidas pelo NASF, mas com o excesso de demanda
e carência de profissionais na rede SUS Campinas essa organização do trabalho acaba
acontecendo.
Para outros de nós, o NASF não assume um papel de "tapa buraco" porque tem
apenas uma psiquiatra no NASF e não tem psicólogo e terapeuta ocupacional. Indo além,
a organização da agenda da psiquiatra do NASF é organizada junto com a equipe, a
equipe sabe os casos que estão sendo acompanhados e existe um horário especifico uma
vez por mês para discussão de casos entre a psiquiatra do NASF e as equipes do Centro
de Saúde. Essa forma de inserção matricial de verdade é muito positiva e compreendemos
que não precisa se chamar NASF para conseguir desenvolver essa relação
interprofissional diferenciada com os profissionais da equipe.
O NASF, na opinião de alguns, enquanto equipe não consegue realizar um
matriciamento de verdade pois não sabemos quando podemos contar com o NASF, em
que reuniões o NASF estará presente, em que situações específicas o NASF poderá
intervir junto com a equipe. O trabalho do NASF acaba ocorrendo de forma não
sistematizada, sendo tudo resolvido na hora da discussão de caso e isso dificulta sabermos
o momento de acionar o NASF e em quais situações.
Vale lembrar que ao longo dos anos de inserção do NASF na equipe houve alguns
períodos que havia pactuações mais claras, como por exemplo: eles participavam
quinzenalmente das nossas reuniões de equipe as segundas feiras. Isso perdurou por um
tempo mas agora com a epidemia de dengue tudo bagunçou novamente.
- 144 -
Para alguns de nós o NASF não tem um cardápio de ofertas claro, que nos ajude a
compreender a função dos profissionais e automaticamente facilitar os fluxos de Apoio
Matricial entre eles e a nossa equipe. Em algumas situações não sabemos como eles
podem nos ajudar, o que podemos pedir ajuda, o que é possível de ser compartilhado.
Para nós, o trabalho do NASF não pode ser apenas discutindo casos na reunião de
equipe, precisamos ter um fluxo claro e pactuado que possibilite dar uma resposta para o
usuário no momento da consulta, ou seja, algo mais pratico e que leve menos tempo para
darmos uma resposta para o usuário.
Um fato interessante é que segundo as legislações a inserção do NASF deve ser
uma demanda combinada entre a equipe de saúde família e gestão local, levando-se em
consideração as questões que envolvem o território. Aqui em Campinas não ocorreu desta
forma, o NASF foi montado a partir da reorganização do apoio do Distrito e
disponibilidade dos profissionais envolvidos, e não de uma demanda da unidade. Para
nós, o fisioterapeuta do NASF ajudava muito, podíamos sempre contar com ele, ele estava
nas nossas reuniões, fazia grupos com os usuários, também atendia alguns casos e tinha
uma agenda compartilhada com a equipe. Ele fez uma atividade muito importante de
organizar a fila de fisioterapia por critérios de risco, ele avaliou os casos, direcionou e
alguns casos ficaram aqui na unidade mesmo e outros foram realmente encaminhados
para referência externa.
Outra coisa importante que dificulta a organização do processo de trabalho do
NASF e do apoio matricial em si é a rotatividade dos profissionais. O tempo todo, os
profissionais entram e saem, perdemos o fisioterapeuta do NASF e a psicóloga da equipe
nos últimos tempos. Ficamos um tempo sem reposição e isso atrapalha muito o trabalho
desenvolvido pois temos que recomeçar a cada saída e nova entrada de profissionais.
No que se refere as devolutivas dos casos acompanhados pelo NASF, acreditamos
que não é necessário fazer devolutiva de todos os casos -100% - pois alguns casos o
próprio usuário traz a resposta em consulta. Mas alguns casos considerados mais
delicados tornam-se muito relevante ter devolutiva para não perdermos o que de fato está
acontecendo com o usuário e isso era feito pelo NASF na reunião de equipe. Para outros
de nós, o prontuário por si só já é a devolutiva pois está descrito tudo o que aconteceu
com ele e como foi sua alta da equipe NASF.
Para nós, o modelo ideal de apoio matricial desenvolvido pelo NASF junto as
equipes deve conter alguns pontos básicos. Deve-se deixar claro com qual frequência a
- 145 -
equipe do NASF estará na reunião de equipe para discutir casos (agenda fixa pelo menos
quinzenalmente como já funcionou antes). Outro ponto é o cardápio de ofertas de cada
profissional, quais casos podemos acionar e de que maneira. Por fim é essencial eles
terem conhecimento de qual é a real demanda da equipe, estar próximo para pensar e
organizar um jeito de funcionar que faça sentido para nós e para o NASF.
Compreendemos que o NASF traz muito suporte para questão educativa tanto para os
usuários através dos grupos e para a equipe através da discussão de alguns temas
específicos. Sempre aprendemos com os profissionais do NASF a cada caso que
compartilhamos.
Para alguns de nós, uma questão importante é que também nos distanciamos da
equipe do NASF. Não perguntamos diretamente para eles como nos ajudar. Isso é algo
que devemos refletir pois é importante estarmos a par das coisas que estão acontecendo
na unidade e mudarmos nosso hábito para facilitar nossa articulação com o NASF.
Para outros de nós, a discussão dos casos com o NASF ocorrer apenas no corredor
e depender quase exclusivamente da iniciativa individual dos profissionais não é a forma
ideal. Compreendemos que isso faz parte das atribuições do gestor local e apoiador de
distrito que tem como função ajudar nesta articulação das equipes. Mas para nós a
presença gestão é algo virtual, eles nunca estão presentes na unidade.
O NASF realiza um pouco do papel que esperamos do apoiador institucional, ou
seja, o NASF problematiza com a equipe questões para discutir com a gestão local, faz
intermediação dessas questões e consegue ampliar a visão pois não são profissionais da
equipe do Centro de Saúde. Atualmente o apoiador institucional em Campinas faz apoio
ao gestor e não para equipe, é um apoio distante e sem sentido para a maioria de nós
Com essa pesquisa percebemos que na pratica não existe um espaço para refletirmos
e pensarmos juntos em como melhorar nosso trabalho, o que um pode ajudar o outro,
como nos organizamos de uma maneira mais resolutiva.
Por fim, destacamos que o NASF é essencial e não dá para abrir mão desta equipe.
O que realmente precisamos é melhorar a inserção desses profissionais, seu fluxo e rever
a composição da equipe. Se possível de acordo com nossa visão e demanda seria
importante acrescentar no NASF uma nutricionista e um pedagogo.
- 146 -
APÊNDICE E
Narrativa Equipe Saúde da Família 3
Na nossa opinião a experiência de trabalho desenvolvido pela equipe NASF tem
sido muito positiva e proveitosa pois tem proporcionado um intenso aprendizado para
todos nós. Em especial, para alguns de nós, a realização das visitas domiciliares
compartilhadas com os profissionais do NASF é o melhor exemplo desse aprendizado
pelos seguintes motivos: a possibilidade de fazermos visitas juntos contando com a
presença de profissionais da equipe e NASF, o cuidado dos profissionais do NASF em
sempre darem retorno para os usuários, a presença do NASF amplia o envolvimento da
família, quando vamos juntos sempre aprendemos mais sobre situações especificas que
envolvem dificuldade de locomoção por exemplo, aprendemos a dar orientações sobre
situações de saúde que antes não conhecíamos como uso correto de medicamentos, entre
outros.
A presença dos profissionais do NASF junto as equipes do Centro de Saúde é feita
por referencia e mesmo podendo acionar qualquer um deles tem sempre uma dupla que
fica mais próxima da nossa equipe e participa sistematicamente das nossas reuniões. Para
alguns de nós essa proximidade traz um sentimento que a equipe não está sozinha, que
existe de fato uma equipe ampliada pois além de contribuírem na discussão de casos e
sua condução, eles também dividem responsabilidades com relação ao caso. Desta
forma, para nós o trabalho do NASF proporciona um apoio matricial vivo que não se
restringe a troca de saberes nucleares entre os profissionais (fisioterapeuta matriciando o
enfermeiro, assistente social matriciando os agentes comunitários) com capacitações
temáticas e sim uma responsabilidade compartilhada que inclui divisão de tarefas e
continuidade na assistência prestada aos usuários.
Essa experiência de apoio que estamos vivenciando é diferente das outras
experiências de Apoio Matricial que conhecemos. Geralmente, o profissional que realiza
o Apoio Matricial é acionado para ajudar com um tema e faz algumas atividades pontuais
compartilhadas, depois simplesmente vai embora. Neste modelo o apoiador vem, diz
como deve ser conduzido o caso e pronto. Ele não sabe e também não leva em
consideração as dificuldades da equipe. Quando surgem duvidas temos dificuldade de
acionar novamente o apoiador, ou seja, para nós é um Apoio Matricial duro.
Então apostamos e faz mais sentido para nós o apoio matricial vivo desenvolvido
pelo NASF que está presente no cotidiano da equipe, que participa nas reuniões toda
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semana, que faz devolutiva dos casos compartilhados, que de certa forma realiza o
matriciamento dia a dia, podemos dizer que fazem conosco um acompanhamento
longitudinal.
Na nossa experiência com o NASF identificamos que o inicio da implantação da
equipe no Centro de Saúde foi confuso e muito difícil pois não compreendíamos qual era
o trabalho do NASF e achamos que eles também não entendiam. Existia uma barreira
entre o NASF e equipes apoiadas no que se referia ao tema do atendimento individual. O
tempo todo o NASF deixava claro que não ia fazer agenda individual, que seu trabalho
não era atender apenas seu núcleo de conhecimento, que era fazer discussão de caso e
trazer as devolutivas após discussão coletiva com os demais profissionais do NASF.
Observamos que tinha um grande medo por parte do NASF da equipe apoiada solicitar
exclusivamente atendimentos individuais e o NASF acabar virando um mini Ambulatório
de Especialidades.
Entretanto, com o tempo compreendemos que essa questão foi superada e
atualmente existe entre nós uma relação interprofissional muito aberta e podemos dizer
que eles desenvolvem uma relação horizontal com a equipe. Foi através da participação
deles nas reuniões de equipe que juntos construímos nosso contrato de trabalho, juntos
criamos sentido para o Apoio Matricial e estamos o tempo todo repactuando nosso
trabalho, ou seja, modelamos o trabalho entre o NASF e nós.
Na nossa compreensão, não há critérios definidos de quando devemos acionar o
apoio matricial do NASF pois isso acontece naturalmente entre nós a partir do momento
que identificamos uma demanda. Eles desenvolvem atividades de grupo, atendimentos
compartilhados, visitas domiciliares e também alguns atendimentos individuais. Essa
agenda não é como de um ambulatório mas é uma agenda compartilhada pois depois do
atendimento individual trocamos nossos olhares.
Reconhecemos que existem espaços específicos, algumas agendas próprias para
discutir questões que envolvem o Apoio Matricial e na maior parte do tempo
respeitamos essa organização. Contudo, quando há um caso que não pode esperar
acionamos os profissionais NASF fora da agenda sistemática, discutimos no corredor,
por telefone, pelo whatssap e juntos definimos qual será a conduta para o caso com muita
tranquilidade.
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Existe consenso na equipe sobre a composição da equipe NASF, todos nós
conhecemos cada um deles por nome e sabemos dizer as atividades que desenvolvem em
parceria com a equipe.
Para alguns de nós, o NASF deveria ser ampliado e deveriam ser incluídos outros
profissionais como nutricionista, fonoaudiólogo, educador físico e mais um
fisioterapeuta.
No que se refere ao olhar do usuário, percebemos que eles não sabem diferenciar o
que é o NASF. No olhar deles todos são profissionais do Centro de Saúde e na fala deles
identificamos "... agora tem psiquiatra no posto", " ...eu soube que agora tem um
fisioterapeuta no posto". Para eles todos são médicos da unidade e estão trabalhando para
toda a população.
Na nossa opinião ainda temos algumas questões que devem ser melhoradas como a
estrutura física da unidade, ou seja, não tem sala para os profissionais NASF atenderem,
não tem sala especifica para eles na unidade. Quando eles fazem uma agenda individual
é uma grande dificuldade conseguir sala e tem que ficar organizando sempre um
revezamento de consultórios.
Outro ponto que temos dificuldade é realizar os atendimentos conjuntos pois as
agendas dos profissionais da equipe e do NASF dificilmente coincidem. Ainda assim,
apesar da dificuldade conseguimos juntos buscar uma solução que não traga reflexos para
os usuários ou aumento no tempo de espera pelos atendimentos.
Para alguns de nós, um ponto importante é os profissionais do NASF nos ajudarem
a pensar questões que envolvem o processo de trabalho, como organização da agenda da
equipe. Eles até já fazem isso mas consideramos importante que isso acontecesse mais
vezes, eles nos ajudarem não apenas nas questões assistenciais, mas também atuarem na
organização do processo de trabalho.
Alguns de nós gostaria de destacar a questão do NASF enquanto política pública e
o contexto da SMS de Campinas. O município começou com 3 equipes de NASF e foi
diminuindo sendo que agora só tem uma equipe que é essa que está atuando no nosso
Centro de Saúde. Aqui no Centro de Saúde nos sentimos privilegiados mas, não é justo
os demais Centro de Saúde não poderem contar com o trabalho do NASF. Na SMS de
Campinas atualmente observamos que a atenção básica não se configura em uma
prioridade e muito menos o NASF que surge com a proposta de fortalecer a atenção
básica. Hoje seria necessário criar mais ou menos 60 equipes NASF para dar cobertura
- 149 -
para todas as unidades. Sentimos muito medo que o NASF acabe, pois é muito mais fácil
para SMS acabar com uma equipe NASF do que criar várias novas. É importante lutarmos
não só pelo NASF, mas também para instituição de uma atenção básica qualificada neste
município.
Para outros de nós, o momento político da SMS de Campinas é muito difícil e fica
complicado acreditar em qualquer tipo de ampliação da rede SUS no que se refere a
contratação de profissionais. Nos últimos tempos, presenciamos muitas perdas de
profissionais do centro de saúde sendo a ultima á saída dos profissionais que integravam
a equipe de saúde mental da nossa unidade, ou seja, a impressão que fica é que a equipe
escorregou das nossas mãos. Não temos mais grandes ilusões e a rotatividade é uma
realidade no município, ou seja, entendemos que várias pessoas vão passar por aqui,
deixar seu conhecimento e ir embora.
- 150 -
APÊNDICE F
Narrativa Equipe Saúde da Família 4
A equipe do NASF já está no Centro de Saúde há aproximadamente 3 anos mas,
observamos que foi neste último ano que começamos de fato a trabalharmos juntos. No
começo tudo foi muito confuso, não sabíamos muito como usar o NASF, como acionar o
apoio desta equipe, não sabíamos como demandar, não conhecíamos o trabalho deles e
eles não conheciam o nosso.
Para alguns de nós uma questão que dificulta o desenvolvimento do trabalho da
equipe com o NASF é a rotatividade dos profissionais, é comum ocorrer várias entradas
e saídas de profissionais e já foram montadas diversas composições. A única profissional
do NASF que está desde o começo é a fisioterapeuta os outros foram trocando e podemos
afirmar que foi neste último ano que a equipe estabilizou. Então foi de um ano para cá
que conseguimos uma interação significativa com o NASF, passamos não apenas a
discutir o caso mas também dividir tarefas, responsabilidades, conseguimos mais acesso
a equipe, passamos a fazer agendas compartilhadas e nosso trabalho com eles tem
caminhado melhor.
Para alguns de nós a presença da psiquiatra no NASF é muito importante porque
não temos este profissional no Centro de Saúde e é com ela que contamos para discutir
os casos de saúde mental. Ela tem uma agenda fixa mensal de matriciamento com as
equipes e nós levamos os casos e discutimos. Em algumas situações ela atende, em outras
o caso fica com a equipe, mas o que realmente faz a diferença é a certeza que podemos
contar com ela para cuidar dos casos graves.
Para outros de nós, tem sido importante a realização de visitas domiciliares
compartilhadas com o NASF (fisioterapeuta, farmacêutica, assistente social). São visitas
programadas que podemos fazer juntos ou não, mas sempre há uma devolutiva de como
o caso está caminhando, nunca perdemos o caso de vista e sempre aprendemos mais
fazendo juntos e não sozinhos. É uma atividade que tem sido muito bacana e tem sido
fácil identificar o papel do apoio do NASF nestas situações.
Outra coisa importante realizada pelos fisioterapeutas do NASF foi a organização
da fila da unidade por critérios de risco. Eles avaliaram todos os usuários que estavam na
fila e organizaram um fluxo para casos que deveriam ir para a referência municipal, casos
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que seriam acompanhados por eles na unidade, casos que ficariam sob responsabilidade
da equipe.
Até o momento lembramos de dois casos específicos que o NASF participou
conosco na elaboração e condução do Projeto Terapêutico singular. Um caso já se
resolveu e o outro ainda está em andamento.
Entendemos que o NASF traz para equipe um suporte seja na saúde mental, na
reabilitação física, na situação social. Compartilhamos com eles vários casos que são
complexos, que não sabemos como encaminhar, como dar andamento para resolver a
situação do usuário. De fato atualmente o NASF nos proporciona muito apoio e ainda
estamos aprendendo a lidar com isso.
Podemos dizer que conseguimos acessar os profissionais do NASF com facilidade,
porém reconhecemos que a reunião de equipe é nosso canal oficial de comunicação com
eles porque praticamente semanalmente uma ou duas profissionais do NASF estão
presentes. Assim, durante a reunião e junto com o NASF nós discutimos os casos e
decidimos como conduzi-los, ou seja, não existe uma lista de critérios para escolha dos
casos que serão compartilhados com o NASF.
Para alguns de nós, um ponto importante na relação com o NASF é o fato que a
equipe está sempre disponível para acolher a nossas demandas (mesmo fora das agendas
pactuadas) e pensar numa forma de dar resposta, de se organizar para as coisas
acontecerem de fato. Trocamos ideia de diversas questões, conseguimos colocar em
pratica nossos projetos juntos mesmo que alguns não deem certo, eles são flexíveis na
forma de trabalhar conosco e podemos afirmar que temos uma parceria concreta. Um
fato que percebemos é que mesmo a equipe NASF sendo única para todo o Centro de
Saúde, as atividades desenvolvidas junto com as equipes não são as mesmas. Com
algumas equipes eles fazem grupos, oficinas, outras atividades que não acontecem
diretamente com a equipe verde. Consideramos que essas diferenças são normais, pois
cada equipe tem a sua singularidade e organiza seu processo de trabalho de forma
diferente de acordo com o perfil da sua população adscrita.
Para alguns de nós esse trabalho de apoio feito pelo NASF, essa proposta de fazer
junto com a equipe as atividades é algo positivo porque todos ficam sabendo o que está
acontecendo com o usuário, como o caso está evoluindo, acontece sempre uma interação
entre os profissionais. Para outros de nós, esse fazer junto traz um aprendizado, amplia
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nosso olhar sobre as situações e claro fortalece a importância de sempre trabalhar em
equipe.
Para outros de nós, o trabalho feito pelo NASF no acompanhamento dos casos é
importante mas, a equipe antes do NASF já dava conta de alguns desses casos, sempre
conseguia pensar numa forma de resolver a situação e claro levava mais tempo. Com a
inserção da equipe do NASF aumentou a agilidade na resolutividade dos casos.
Para nós, hoje a inserção da equipe do NASF é essencial porque proporcionam
acesso a outras ofertas que a equipe sozinha não dá conta de resolver como atendimento
de fisioterapia, atendimento com o psiquiatra, farmacêutica e assistente social.
Para alguns de nós, o suporte dado pelo NASF é diferente dos oferecidos por outros
serviços e/ou especialidades, pois é feito de forma interativa e participativa. Por exemplo,
antes do NASF quando encaminhávamos para o psiquiatra da PUC o caso ficava apenas
no papel, na cartinha, não sabíamos exatamente o tinha acontecido na condução do caso.
Outra atividade importante do NASF que gostaríamos de destacar é uma atividade
de educação permanente que o NASF organizou apenas com os agentes de saúde da
unidade durante um ano. O encontro era mensal e foi muito positivo porque discutimos
vários temas relacionados ao nosso processo de trabalho mas, depois chegou num
momento que se esgotou. Fizemos uma avaliação com o NASF desse espaço e decidimos
suspender a atividade por um tempo e remodelar o espaço para ser algo mais pontual,
parecido com capacitação temática, e não algo continuo e obrigatório todo mês.
Para a alguns de nós, é essencial repensar a composição da equipe do NASF e
aumentar a equipe incluindo uma nutricionista como tinha antes programa. Temos aqui
na unidade um grupo de reeducação alimentar e entendemos que essa profissional seria
muito importante para qualificarmos essa atividade.
Para outros de nós, uma questão importante é a ausência quase total de alguns
profissionais na rede do município como nutricionista, psicólogo, psiquiatra, entre outros.
Observamos também uma quantidade insuficiente de serviços de referência
especializados para dar conta da demanda dos casos que exigem uma atuação especifica.
Compreendemos que o NASF não deve ser utilizado como tapa buraco e o correto é que
o SUS Campinas fortaleça sua rede assistencial para que ela seja de fato completa e
resolutiva.
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APÊNDICE G
Mapa Temático do Apoio Matricial
ANÁLISE DE CONTEXTO
MÉTODO E SUJEITOS
- Espaços coletivos (o apoiador utiliza as reuniões de equipe, de conselho local, entre outros); - Temas:
território;
- Protocolos (protocolo de acesso, protocolo clinico, utilização, conhecimento, referência para o trabalho
do apoiador, relação com a prática);
- Processo de constituição do contrato. A-) entre apoiador e equipe apoiada B-) entre gestor e apoio
(apresentação da proposta de trabalho);
- Como se inicia o contrato com a equipe apoiada (necessidade da gestão, demanda reprimida, entre
outros); Como foi pactuado o contrato com a equipe? Como organiza sua agenda (listar uma semana típica).
Como foram decididas quais especialidades desenvolveriam atividades de Apoio Matricial do seu serviço?
- Mapear atores envolvidos no apoio matricial (quem são, quais formações, critérios de seleção dos
apoiadores);
- Como se inicia o contrato com a equipe apoiada ( necessidade da gestão, demanda reprimida,
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entre outros);
- Produção de subjetividade (afetos como objeto de análise do apoiador, afetos nas diferentes dimensões –
em relação ao conhecimento, as pessoas, as instituições; a questão dos afetos é tema para discussão da equipe);
- Coordenação clínica (relação apoio e função coordenação clinica do ponto de vista do apoiador e da
equipe de referencia);
- Lugar intermediário do apoiador (relação com as politicas e seus limites, lugar institucional do apoiador
e seus conflitos).
OBJETIVOS
- Agenciamento de redes;
- Resolutividade;
CAPACIDADE DE ANÁLISE
- Interditos e ocultos;
- Demandas;
- Conflitos e contradições;
- Resistências;
- Tipo de Escuta;
CAPACIDADE DE INTERVENÇÃO
- Coeficiente de autonomia;
RESULTADOS CLÍNICOS
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APÊNDICE H
- 156 -
- Investigar o modo de implantação e de funcionamento das equipes que utilizam a
estratégia do apoio matricial, analisando relações interprofissionais e repercussões sobre
qualidade da atenção;
- Averiguar a percepção que os profissionais de saúde da família têm sobre o apoio
matricial;
- Gerar subsídios para o aprimoramento dos processos de trabalho e formação que envolve
Assinador por:
(coordenador)
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APÊNDICE I
___________________________________ __________________________________
Assinatura do sujeito Assinatura da pesquisadora
A sua participação em qualquer tipo de pesquisa é voluntária. Em caso de dúvida entre em contato com o Comitê de
Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp: Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126 – Caixa
Postal 6111 – CEP: 13083-887 – Campinas/ SP – Fone: (19) 3521 8936 – E-mail: cep@fcm.unicamp.br
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