Você está na página 1de 17

Capítulo

4 Nutracêuticos e
substâncias ergogênicas
Antonio de Queiroz Neto
Flora Helena de Freitas D’Angelis
Luiz Claudio Di Stasi

Introdução extrato, aminoá­cido, substância dietária para uso como


suplemento na dieta para aumentar o consumo total ali-
O termo nutracêutico foi criado em 1989 nos Esta- mentar ou, ainda, para conter concentrado, metabólito,
dos Unidos pela Fundation for Innovation in Medicine, constituinte, extrato ou combinação de alguns dos pro-
combinando duas palavras: nutriente e farmacêutico. O dutos considerados ingredientes. Assim sendo, os suple-
conceito desse termo inicialmente implicaria em um pro- mentos dietários, em seu conceito, envolvem ingredien-
duto que tivesse características tanto de um alimento tes e funções diferentes daquelas dos nutracêuticos.
como de um fármaco, ou seja, um alimento que também De forma generalizada, os nutracêuticos são atual-
fosse um medicamento. O termo tem causado um gran- mente reconhecidos como suplementos dietários que for-
de dilema tanto na prática médica humana como na ve- necem de forma concentrada um agente presumidamente­
terinária, visto que, para ser definido como um fármaco, bioativo a um alimento, presente na matriz não alimen-
são necessárias eficácia e segurança de uso completamen- tar e usado para beneficiar a saúde, em dosagens que
te determinadas, ao passo que um alimento requer um ­excedem aquelas obtidas de um alimento normal. Tal
número bem menor de exigências para ser usado e co- ­conceituação deve ser diferenciada da dos alimentos fun-
mercializado. Dessa forma, muitos nutracêuticos são co­ cionais, que incluem alimentos integrais, fortificados, en-
mercializados como alimentos e escapam das normas re- riquecidos ou melhorados, com efeitos potencialmente
gulatórias para aprovação de medicamentos, inclusive no benéficos à saúde quando consumidos regularmente como
Brasil. Dessa forma, o uso e a prescrição desses produ- parte de uma dieta variada em níveis efetivos. É impor-
tos, apesar de, na prática, serem considerados seguros, tante salientar que os alimentos funcionais e os nutracêu-
devem ser feitos com conhecimento, especialmente em ticos estão, na prática, fundindo-se como um único tipo
relação à sua interação com fármacos. de produto disponibilizado para a melhoria da saúde e
Embora haja várias tentativas de definir um nutra- qualidade de vida dos animais.
cêutico, a mais pertinente e adequada é a apresentada Esses agentes nutracêuticos, assim como os su­
pela North American Veterinary Nutraceutical Council, plementos dietários e os alimentos funcionais, podem
que o define como “substâncias (não fármacos) produzi- proporcionar melhorias em tratamento e prevenção de
das em uma forma purificada ou de extratos e adminis- doenças de várias espécies animais e um aumento no de-
tradas de forma oral para prover aos organismos os agen- sempenho atlético, especialmente na espécie equina. Nes-
tes necessários para a estrutura e a função normal, vi­sando se último caso, o seu uso pode se confundir com o uso
melhorar a saúde e o bem-estar dos animais” (EMBRA- de outros produtos, como é o caso dos ergogênicos far-
PA, 2002). Tal definição é relativamente ampla, de modo macológicos, já que se deseja melhor desempenho atlé-
que o termo nutracêutico inclui uma série de substâncias tico, aspecto que possui outras características em medi-
de origem ve­getal, assim como enzimas, e outras que po- cina veterinária e tornam tais produtos distintos dos
deriam ser classificadas como suplementos dietários, o nutracêuticos.
termo mais utilizado atualmente. No entanto, é impor- Atualmente, há um grande número de produtos nu-
tante reconhecer que suplemento dietário é definido como tracêuticos disponíveis no mercado nas mais variadas
um produto que contém vitamina, mineral, planta ou seu formas farmacêuticas que podem ser usados em medici-
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 41

na veterinária, principalmente na prevenção de inúme- cias que afetam a atividade estrogênica. São, portanto, de-
ras doenças comuns, como doenças cardiovasculares, os- finidos como compostos estrogênicos encontrados em
teoartrites, problemas periodontais e câncer (Kurzer e plantas e referem-se a substâncias que exercem efeitos es-
Xu, 1997; Da Dzanis, 1999). trogênicos. No entanto, em um sentido mais amplo ado-
Considerando que existem poucas pesquisas sobre tado neste capítulo, referem-se aos agentes químicos que
os efeitos benéficos dessas substâncias em medicina ve- apresentam efeitos sugestivos de estrogenicidade. Nesse
terinária, a maioria dos dados existentes refere-se a pes- sentido, os fitoestrógenos são substâncias que podem se
quisas com nutracêuticos utilizados na espécie humana ligar aos receptores estrogênicos e produzir efeitos pró-es-
(Kurzer e Xu, 1997; Da Dzanis, 1999). Por outro lado, a trogênicos ou antiestrogênicos nos tecidos-alvo, podendo
grande disponibilidade de nutracêuticos para uso em hu- promover a indução específica de genes responsivos a es-
manos torna o preço dos produtos mais atrativo para uso trógenos e estimular receptores estrogênicos específicos
em animais, quando comparado aos custos daqueles es- de células tumorais. A forma como o tecido do organismo
pecíficos para medicina veterinária. O médico veteriná- será afetado dependerá, em parte, da quantidade de estró-
rio, no entanto, deve reconhecer que esses produtos, em genos produzidos pelo organismo vivo e do grau de satu-
muitos países, requerem correta prescrição por um pro- ração dos respectivos receptores. Assim sendo, se os níveis
fissional, de modo que o uso por conta própria em ani- de estrógeno do animal são baixos, os receptores de estró-
mais não deve ser uma prática comum, apesar de os pro- genos disponíveis serão ocupados pelos fitoestrógenos,
dutos estarem disponíveis e serem de fácil acesso. promovendo um efeito pró-estrogênico, como ocorre nos
Neste capítulo, serão discutidos, na primeira parte, casos de menopausa (Kurzer e Xu, 1997). Por outro lado,
os principais nutracêuticos disponíveis; na segunda, se- se os níveis de estrógenos dos animais são altos, os fitoes-
rão detalhados alguns produtos usados para o melhor de- trógenos podem competir pela ligação com os receptores,
sempenho atlético dos animais. promovendo diminuição da atividade estrogênica, pois
seus efeitos sobre os tecidos-alvo são bem menores que os
Nutracêuticos causados por estrógenos endógenos como o estradiol.
Inúmeras espécies vegetais possuem estrógenos (es-
Nesta parte, serão apresentados os principais nutra- tradiol, estrona e estriol) em pequenas quantidades, como
cêuticos usados em medicina humana e veterinária, os feijão (Phaseolus vulgaris), sementes de romã (Punica gra-
quais podem ser encontrados nas mais diferentes formu- natum) e maçã (Malus spp), alcaçuz (Glycyrrhiza glabra)
lações farmacêuticas. Os nutracêuticos aqui descritos fo- e arroz (Oryza sativa), enquanto centenas de espécies ve-
ram classificados de acordo com a sua origem e seus prin- getais possuem estrógenos não esteroidais, em muitos ca-
cipais usos. sos denominadas apenas compostos fenólicos, entre os
quais se destacam as principais classes de compostos de
Fitoestrógenos origem vegetal descritas a seguir (Kurzer e Xu, 1997;
Murkies et al., 1998).
O termo fitoestrógeno é formado pelas palavras fito,
referindo-se especificamente à sua origem, como produ- Classificação
tos presentes em uma série de espécies vegetais, e estró- Os fitoestrógenos conhecidos e disponibilizados atual­
geno, referindo-se, nesse caso, à habilidade de tais pro- mente são classificados em quatro diferentes classes de
dutos afetarem a atividade estrogênica nos organismos produtos: isoflavonas, coumestanos, lignanas e o equol
vivos superiores (Murkies et al., 1998). (Murkies et al., 1998). Todos esses compostos são subs-
Os fitoestrógenos podem atuar como estrógenos fra- tâncias difenólicas com similaridades estruturais com os
cos ou fornecer precursores para a produção de substân- estrógenos naturais e sintéticos (Figura 1).

Estradiol Estrona Estriol

Figura 1.  Principais estrógenos do organismo.


42 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

Isoflavonas estudados desse grupo como ativos nutracêuticos. Suas


Isoflavonas são compostos fenólicos da classe dos fla- fontes principais são várias espécies de alfafa (Medicago
vonoides com ampla distribuição e ocorrência em legu- spp), trevo-azedo (Melilotus spp) e outras plantas forra-
mes, principalmente na soja (Glycine max). As principais geiras, que possuem de 0,7 a 5,6 mg/g de peso seco. Ou-
utilizadas são genisteína, daidzeína, gliciteína e seus res- tras espécies forrageiras, assim como sementes de várias
pectivos glicosídeos, genistina, daidzina e glicitina, além leguminosas, possuem coumestanos em quantidades me-
de formononetina e biochanina A (Figura 2). nores, que variam de 15 a 80 μg/g de peso seco.
Soja e alimentos contendo esses grãos são as princi-
pais fontes desses fitoestrógenos, estimando-se a presen- Lignanas
ça de 0,2 a 1,6 mg de isoflavona por grama de peso seco. Assim como outros fitoestrógenos, lignanas, ou lac-
Além da soja e de seus derivados, várias outras plantas tonas do ácido resorcílico, são substâncias encontradas
como ervilha (Pisum sativum), arroz (Oregza sativa), alho em uma série de espécies vegetais que necessitam de con-
(Allium sativum), batata (Ipomoea spp), romã (Punica versão decorrente da ação de bactérias presentes no tra-
granatum), maçã (Malus spp) e café (Coffea arábica) são to gastrointestinal dos animais para poderem exercer suas
fontes de fitoestrógenos, mas em quantidades muito in- atividades estrogênicas. As principais lignanas de origem
feriores às da soja. vegetal são matairesinol e secoisolariciresinol, as quais
são convertidas nas respectivas lignanas ativas: entero-
Coumestanos lactona e enterodiol (Figura 4).
Dezenas de coumestanos já foram isolados de dife- As principais fontes das lignanas são os óleos de di-
rentes espécies vegetais, no entanto, coumestrol e 4-me- versas sementes, especialmente o óleo de linhaça (Linum
thoxy-coumestrol (Figura 3) são os fitoestrógenos mais usitatissimum), que possui cerca de 0,8 mg de secoisola-
riciresinol por grama de peso seco. Além do óleo de li-
nhaça, as espécies vegetais com maior produção de lig-
nanas são: soja (Glycine max, com 20,5 mg/100 g), algumas
algas marinhas (0,9 mg/100 g), legumes (0,6 mg/100 g),
cereais (0,3 a 0,5 mg/100 g) e frutas (0,08 mg/100 g).

Equol
Este composto (Figura 5) é uma substância estrogê-
nica resultante da metabolização bacteriana da daidzeí-
na que, após ser formada, exercerá seus efeitos estrogê-
nicos no organismo do animal.

Metabolismo
Isoflavonas e lignanas apresentam um padrão simi-
lar de metabolismo tanto nos animais como em huma-
nos, enquanto o metabolismo dos coumestanos ainda
não foi bem caracterizado. Como comentado, tanto iso-
flavonas como lignanas são metabolizadas pelas bacté-
rias do trato gastrointestinal, gerando metabólitos ativos,
Figura 2.  Principais fitoestrógenos conhecidos. como enterolactona, enterodiol e equol.
A absorção desses compostos, facilitada pela hidró-
lise das moléculas de açúcares pelas bactérias do intesti-
no, requer uma série de reações de desconjugação e con-
jugação. Após absorção, isoflavonas e lignanas são
conjugadas a ácido glicurônicos e sulfatos por reações
microssomais hepáticas. Os metabólitos dessas reações
serão posteriormente excretados sobretudo pela urina,
mas também uma parte da excreção ocorre pela cir­culação
êntero-hepática. Nesses casos, os metabólitos formados
podem ser novamente desconjugados pelas bactérias do
intestino e podem ser reabsorvidos pelo organismo. Uma
4-metoxi-coumestrol excelente descrição dos processos metabólicos desses
compostos pode ser obtida na revisão realizada por Kur-
Figura 3.  Principais coumestanos disponíveis. zer e Xu (1997).
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 43

OCH3

Secoisolariciresinol Matairesinol

OH

Enterodiol Enterolactona

Figura 4.  Principais lignanas e suas relações biossintéticas.

Doenças cardiovasculares
Há estudos que apoiam o uso de fitoestrógenos na
redução da incidência de doenças cardiovasculares prin-
cipalmente em humanos (Murkies et al., 1998), mas tam-
bém há estudos experimentais realizados em diferentes
espécies animais. Embora seja possível que os efeitos pro-
tetores da soja estejam associados à presença de outros
constituintes químicos da planta, como saponinas, ácido
fítico e fibras, um recente estudo realizado em macacos
Figura 5.  Estrutura química do equol, metabólito da daidzeína. mostra que a suplementação com derivados da soja pro-
duz efeito hipocolesterolêmico caracterizado por uma re-
dução de 30 a 40% dos níveis da lipoproteína de baixa
densidade (colesterol LDL) e aumento de 50 e 20% nos
Usos terapêuticos níveis de lipoproteína de alta densidade (colesterol HDL),
Os fitoestrógenos, por suas características de simila- respectivamente em fêmeas e machos. Fitoestrógenos po-
ridade química com os estrógenos endógenos e sua ca- dem, portanto, produzir efeitos cardioprotetores por meio
pacidade de ocupar os mesmos receptores, exercendo de seus efeitos diretos sobre os níveis de lipídios do or-
tanto efeitos agonistas como antagonistas, apresentam ganismo. Esses dados corroboram a hipótese de que es-
uma série de usos terapêuticos eficazes tanto em medi- sas substâncias vegetais podem agir como agonistas es-
cina humana como em veterinária, visto que o metabo- trogênicos, produzindo efeitos sobre as lipoproteínas de
lismo e a disposição desses compostos seguem rotas si- forma similar àquela produzida pelos estrógenos.
milares em humanos e animais. É importante salientar que o efeito da soja sobre o
Os seus principais usos são discutidos a seguir, des- metabolismo dos lipídios requer a presença de suas pro-
tacando-se aqueles potenciais em medicina veterinária. teínas no produto administrado aos animais; pois isofla-
Em humanos, um dos principais usos está relacionado ao vonas, quando administradas isoladamente, não possuem
controle da pré e da pós-menopausa (Kurzer e Xu, 1997). efeitos significativos sobre os níveis de tais lipídios.
44 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

O mecanismo de ação hipocolesterolêmica dos fitoes­ respeito dos efeitos protetores dos compostos encontra-
trógenos ainda não está bem elucidado e parece ser mul- dos na soja em relação ao câncer são bem recentes; no
tifatorial, envolvendo sobretudo os receptores para o co- entanto, resultados significativos foram encontrados em
lesterol LDL, além de efeitos antioxidantes, inibição da experimentos com animais de laboratório que ingeriram
agregação plaquetária e aumento da elasticidade arterial uma dieta com soja ou seus derivados. A ingestão dela,
ou vasodilatação. aliada ao tratamento médico, promoveu 100% de prote-
ção contra o surgimento de tumores de mama em ratas
Osteoporose submetidas a agentes carcinogênicos.
Alguns dados mostram que os fitoestrógenos pos- De fato, há inúmeras evidências que apoiam a hipó-
suem papel no metabolismo ósseo e estão relacionados tese de uma adequada dieta rica em isoflavonas e ligna-
à osteoporose, a qual é associada a uma série de fatores, nas reduzir os riscos de câncer. Tem sido postulada uma
como idade, deficiência hormonal e dieta (Murkies et al., série de mecanismos para explicar esses efeitos proteto-
1998). Em experimentos com animais, isoflavonas en- res dos fitoestrógenos, como inibição da produção de fos-
contradas na soja atuaram na prevenção da osteoporose, fato de inositol, molécula-chave sinalizadora do proces-
auxiliando na deposição de cálcio na matriz óssea, inibi- so de diferenciação celular; inibição da autofosforilação
ram a reabsorção óssea e promoveram um balanço de do receptor do fator de crescimento epidermal; bloqueio
cálcio adequado, prevenindo perda óssea e osteoporose. da proliferação de células endoteliais; inibição da tirosi-
Isoflavonas da soja têm sido reportadas como subs- na-quinase, responsável pela produção de fatores de cres-
tâncias preventivas da perda óssea associada à deficiên- cimento envolvidos na proliferação de células tumorais,
cia de hormônios ovarianos. Foi verificado que daidzina, e inibição de DNA-polimerase, responsável pela replica-
quando administrada na forma oral, imediatamente após ção do DNA. Vários desses mecanismos são atribuídos a
a remoção cirúrgica dos ovários, retarda a perda do osso genisteínas, e alguns deles explicam os efeitos dos cou-
femoral em uma relação linear dose-resposta. A genisti- mestanos.
na tem demonstrado efeito similar ao da daidzina, sen- Outros mecanismos podem estar envolvidos no efei-
do ambas tão eficazes quanto a estrona. Ainda não está to produzido pelos fitoestrógenos, mas ainda são neces-
claro se tais efeitos protetores são decorrentes da compo- sários estudos mais detalhados. É importante, no entan-
sição de aminoácido e constituintes não proteicos da soja to, relembrar que esses efeitos normalmente são obtidos
ou de uma combinação desses componentes. em altas concentrações de fitoestrógenos e alguns desses
Em razão de os estrógenos reduzirem o risco de os- compostos em baixas concentrações estimulam a proli-
teoporose em mulheres na menopausa, postula-se que os feração celular in vitro, aspecto que deve ser considera-
efeitos estrogênicos dos fitoestrógenos previnem rea­ do, sobretudo, com o uso da formononetina.
bsorção óssea e promovem aumento da densidade óssea. O uso desses compostos em humanos tem sido prio-
O coumestrol inibe a reabsorção óssea e estimula simul- ritariamente nos cânceres de mama e próstata, mas não
taneamente a mineralização dos ossos em estudos in vi- se descartam os efeitos sobre outros tipos de tumores que
tro. Estudos mostram que iproflavona, uma isoflavona afetam tanto humanos como animais.
sintética que gera a daidzeína como metabólito, apresen-
ta significativo efeito na prevenção de perda óssea em Fitoesteróis
animais e humanos com osteoporose, agindo provavel-
mente sobre a secreção de calcitonina, um hormônio su- Os fitoesteróis, como campesterol, estigmasterol, co-
pressor da reabsorção óssea. A inconsistência em inúme- lesterol e pregnenolona, são componentes lipídicos das
ras variáveis quanto à presença ou não de minerais nas plantas e possuem estrutura molecular muito semelhan-
diferentes formulações de soja estudadas limitam, de cer- te à do colesterol. Os compostos são facilmente removi-
ta forma, a obtenção de conclusões sobre os efeitos de fi- dos da dieta durante o processamento dos alimentos; por-
toestrógenos sobre a mineralização dos ossos. No entan- tanto, em muitos casos, há deficiência deles na dieta
to, os dados científicos disponíveis sustentam o papel alimentar.
desses produtos na prevenção da osteoporose. Diversas combinações de esteróis melhoram os sin-
tomas da hipertrofia prostática benigna, auxiliam no tra-
Neoplasias tamento de distúrbios autoimunes (Bouic, 2001) e dimi-
Isoflavonas são apontadas como os principais com- nuem os níveis de colesterol quando ingeridos em
postos presentes na soja capazes de inibir e prevenir o alimentos, além de melhorar sintomas de diabetes tipos
aparecimento de várias neoplasias (Murkies et al., 1998). I e II.
Apesar das evidências sobre os benefícios da soja na pre- Outra função terapêutica é a sua excelente ação an-
venção e no controle do câncer, a comunidade científica ti-inflamatória e antipirética. Atuam também como imu-
ainda não conseguiu estabelecer de modo claro os meca- nomoduladores (Bouic, 2001). Como tais, esses fitonu-
nismos fisiológicos de sua ação preventiva. Os estudos a trientes têm a propriedade exclusiva de estimular a ação
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 45

do sistema imune, atuando contra viroses, bacterioses e ças cardiovasculares. Dados demonstram claramente que
contra doenças autoimunes, como artrite reumatoide e a suplementação dietária com esses produtos presentes
esclerose múltipla. no óleo de peixe foi essencial na prevenção de arritmias
A maioria das plantas contém esteróis, principalmen- em cães, primatas e ratos, efeitos protetores atribuídos à
te frutas, verduras, castanhas e sementes. presença de DHA, EPA e ALA. É importante constar que
o DHA é também um importante inibidor competitivo
Ácidos graxos poli-insaturados das ciclo-oxigenases, enzimas responsáveis pela conver-
são do ácido aracdônico em prostaglandinas, especial-
Os ácidos graxos poli-insaturados (PUFA) n-6 e n-3, mente da série 2, aspecto que também explica os exce-
também conhecidos como ω-6 e ω-3, denominação que lentes efeitos protetores desses produtos em doenças
indica o local da primeira dupla ligação a partir da me- cardiovasculares. Além disso, reduzem pelo mesmo me-
tila terminal da molécula, são produtos essenciais para a canismo a produção de tromboxanos, o que auxilia na
formação dos fosfolipídios da membrana celular. Por agi- obtenção de efeitos antitrombóticos.
rem sobre uma série de enzimas, são importantes para a
manutenção da estrutura da pele e para a textura de pe- Antioxidantes
los, além de estarem envolvidos na manutenção da saú-
de dos animais, especialmente em relação aos sistemas Em níveis moleculares ou celulares, os antioxidantes
cardiovascular e nervoso central, às articulações e aos servem para desativar os radicais livres, também deno-
olhos. Sendo assim, eles são essenciais para bom cresci- minados espécies reativas de oxigênio (ERO). Tais espé-
mento e desenvolvimento normal, podendo ter papel im- cies reativas são formadas e degradadas por todos os or-
portante em prevenção e tratamento de doença corona- ganismos vivos. Em concentrações normais, elas possuem
riana, hipertensão, artrite, doenças autoimunes e importantes funções reguladoras nos organismos envol-
inflamatórias. Os dois principais ácidos graxos poli-in- vidos na integridade de várias biomoléculas como pro-
saturados essenciais para os organismos são o ácido li- teínas, lipídios e DNA. No entanto, em concentrações ex-
noleico (PUFA n-6) e o ácido α-linolênico (PUFA n-3). cessivas, os radicais livres geram um estado denominado
Apesar de os mamíferos terem capacidade de sinte- estresse oxidativo que pode causar uma série de prejuí-
tizar ácidos graxos saturados, os ácidos graxos poli-insa- zos por seu envolvimento com as biomoléculas referidas.
turados essenciais precisam ser obtidos da dieta, sendo As espécies reativas de oxigênio incluem várias mo-
que suas principais fontes são sementes, castanha, óleos léculas altamente reativas que reagem prontamente com
vegetais e óleo de diversas espécies de peixes. Os ácidos as biomoléculas, iniciando uma cadeia de reações que
graxos poli-insaturados obtidos a partir da dieta são pre- apenas é quebrada quando um novo radical livre reage
cursores diretos nos organismos dos mamíferos de áci- com o radical livre disponível eliminando o elétron des-
dos graxos poli-insaturados de cadeia longa essenciais pareado. Os radicais livres são qualquer espécie química
para a manutenção do bom funcionamento de inúmeros capaz de existir independentemente, que contenha um
tecidos dos organismos. ou mais elétrons não pareados ocupando orbitais atômi-
No organismo, o ácido linoleico (AL) é convertido cos ou moleculares. Em geral, essas espécies são instá-
em ácido aracdônico (AA), enquanto o ácido α-linolênico veis, têm uma meia-vida muito curta (de minutos a na-
(ALA) se converte em ácidos eicosapentanoico (EPA) e nossegundos) e reagem rapidamente com diversos
docosahexanoico (DHA). Os ácidos aracdônico (AA) e compostos e alvos celulares (Abdalla, 1993).
docosahexanoico (DHA) são sintetizados no fígado a par- Nos organismos, as principais espécies reativas de
tir da desnaturação de PUFA da dieta. Mesmo conside- oxigênio ou radicais livres são o ânion superóxido (O2-),
rando que alguns animais possuem a capacidade de sin- formado a partir do oxigênio molecular por adição de
tetizar ácido aracdônico em quantidades suficientes para um elétron; o peróxido de hidrogênio (H2O2), que, ape-
o bom funcionamento dos tecidos, em outros, como os sar de não ser um radical livre, apresenta a capacidade
gatos, a produção tanto de ácido aracdônico como de áci- de penetrar em membranas celulares e participar como
do α-linolênico é insuficiente, e a suplementação dietária intermediário da síntese de outros radicais livres, como
com esses produtos é necessária para animais desse gru- o ácido hipocloroso e o radical hidroxila; o radical hidro-
po. Nesses animais, assim como em outros mamíferos, a xila (OH), formado a partir do peróxido de hidrogênio;
suplementação da dieta com esses produtos deve ser le- e o óxido nítrico (NO), mais conhecido por reagir pron-
vada em consideração pelo médico veterinário; pois, in- tamente com outros radicais livres gerando moléculas
dependentemente de seu valor terapêutico, os produtos menos reativas e funcionando como um captador de ra-
promovem melhor desenvolvimento e crescimento dos dicais livres. O óxido nítrico e o ânion superóxido, quan-
animais e auxiliam na manutenção da qualidade de vida. do reagem entre si, geram peroxidonitrito (OONO-), que
Estudos recentes mostram que o uso principal des- é altamente tóxico e, quando reage com monóxido de
ses produtos em veterinária é para o tratamento de doen­ carbono, gera perocarboxilato nitroso (ONOOCO2) ou
46 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

se protona gerando ácido peroxinitroso (ONOOH), pre- róxido redutase (SOR) e tioredoxinas peroxidases (TRX).
cursores de radicais hidroxilas. Tais componentes do or- A SOD catalisa a dismutação do ânion superóxido, re-
ganismo são essenciais para o bom funcionamento das movendo esse radical pela combinação com prótons para
células e formação de biomoléculas, mas um desequilí- formar peróxido de hidrogênio e oxigênio molecular.
brio de seus níveis pode gerar inúmeros problemas, sen- Existem três classes de superóxido dismutases: Fe-
do a gênese de um grande número de distúrbios nos or- -SOD, CuZn-SOD e Mn-SOD. As SOD, contendo cobre
ganismos dos animais, visto a toxicidade do oxigênio e zinco (CuZn-SOD), e a SOD, contendo manganês (Mn-
decorrer da formação dessas espécies reativas que podem -SOD), encontram-se no citosol de eucariotos, e a SOD,
interagir e lesar diversas biomoléculas e estruturas celu- contendo ferro (Fe-SOD), existe apenas em procariotos.
lares (Boothe, 2004). A glutationa peroxidase (GPx), enzima contendo se-
Os radicais livres podem causar danos tanto às mem- lênio, catalisa a redução de hidroperóxidos orgânicos e
branas celulares como a outras estruturas das células e ao inorgânicos (H2O2) usando a glutationa reduzida (GSH)
material genético dentro delas; como consequência final, como substrato para formar glutationa oxidada (GSSG)
haverá morte celular, visto que as espécies reativas de oxi- e água (ou alcoóis). A molécula de GPx é um tetrâmero,
gênio, por sua alta reatividade, são agentes potencialmen- contendo um átomo de selênio por subunidade. Cerca
te mutagênicos ou carcinogênicos. As causas de prejuízo de 2/3 de sua atividade encontram-se no citoplasma e 1/3
oxidativo promovidas pelos radicais livres decorrem de está nas mitocôndrias. Já são conhecidas quatro diferen-
inúmeros fatores, sendo os mais importantes: promoção tes enzimas desse grupo (GPx 1, GPx 2, GPx 3 e GPx 4).
da alteração na estrutura do DNA via clivagem e a oxi- A catalase é uma enzima que contém ferro e conver-
dação de purinas e promoção da ligação cruzada de ba- te peróxido de hidrogênio em água e oxigênio molecu-
ses com consequente dano ao DNA; nos lipídios, lipope- lar. Essa enzima está localizada em peroxissomos de fí-
roxidação, já que os ácidos graxos, por suas múltiplas gado e rins e microperoxissomos de outras células. É uma
duplas ligações, são excelentes alvos para o ataque dos hemeproteína contendo quatro grupos heme que possui
radicais livres e, consequentemente, geram placas aeroes­ especificidade para o peróxido de hidrogênio, não atuando­
cleróticas, causam inúmeros distúrbios no organismo e, sobre peróxidos orgânicos. Pelo fato de estar comparti-
nas proteínas, reagem com vários aminoácidos gerando mentalizada nos peroxissomos e ter baixa afinidade pelo
proteínas não funcionais contendo enxofre e selênio. peróxido de hidrogênio em comparação com a GPx, a
O uso de agentes que atuam inibindo os efeitos oxi- catalase seria mais importante em condições nas quais
dativos dessas espécies reativas de oxigênio é importan- ocorra formação de altas concentrações de peróxido de
te na manutenção da homeostase do organismo (Abdalla, hidrogênio. Essa enzima ocorre em alta atividade no fí-
1993). Tais produtos são denominados antioxidantes e gado e nos eritrócitos e em baixa atividade no cérebro.
podem ser oferecidos na dieta dos animais como agen- A superóxido redutase (SOR), descoberta em 2000,
tes nutracêuticos ou por meio de diferentes produtos com contém ferro em sua molécula, o qual é responsável pela
atividade inibidora da oxidação. Os antioxidantes, por- eliminação de ânion superóxido, mas não há ainda evi-
tanto, podem ser definidos como compostos ou substân- dências de sua importância para mamíferos.
cias químicas que inibem a oxidação, ou qualquer subs- As tioredoxinas peroxidases (TRX), recentemente
tância que, quando presente em baixa concentração descobertas, agem diretamente reduzindo peróxido de
comparada ao substrato oxidável, diminui ou inibe a oxi- hidrogênio e hidroperóxidos alquilados para formar água.
dação daquele substrato.
Nos organismos dos animais, existe um sistema de Fatores antioxidantes intracelulares não enzimáticos
defesa antioxidante primário que constitui uma primei- Os fluidos celulares, como plasma sanguíneo, fluido
ra linha de defesa formada por substâncias que impedem cefalorraquidiano, fluido sinovial e plasma seminal, con-
a geração de espécies reativas ou sequestram-na de for- têm baixas atividades de catalase, superóxido dismutase,
ma a impedir sua interação com alvos celulares, ou seja, glutationa peroxidase e glutationa reduzida. As proteínas
o sistema bloqueia a etapa de iniciação da cadeia radica- plasmáticas que têm sítios de ligação a metais, sobretu-
lar. O sistema de defesa secundário é formado por com- do com ferro e cobre, podem ser consideradas antioxi-
postos que atuam bloqueando a etapa de propagação da dantes nesses compartimentos. Entre essas proteínas, des-
cadeia radical sequestrando radicais intermediários (Boo- tacam-se a transferrina e a ceruloplasmina.
the, 2004; Leman e Lockwood, 2007). A transferrina plasmática tem apenas 20 a 30% de
seus sítios de ligação ocupados pelo ferro (III), indican-
Fatores antioxidantes intracelulares enzimáticos do que, em condições normais, é comum a presença de
As espécies reativas de oxigênio produzidas no me- ferro (III) livre no plasma. O ferro ligado à transferrina
tabolismo celular são mantidas em baixas concentrações ou à lactoferrina (secretada pelas células fagocíticas) não
intracelulares pela ação das enzimas superóxido dismu- catalisa a formação de radical hidroxila e não promove
tase (SOD), glutationa peroxidase (GPx), catalase, supe- peroxidação lipídica. A ceruloplasmina, além de atuar
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 47

como ligante de íons cobre, também é importante em re- em diferentes vias metabólicas (glutationa peroxidase,
lação a alguns aspectos do metabolismo do ferro. Essa glioxilase, prostaglandina endoperóxido isomerase) e par-
proteína contendo cobre, sintetizada pelo fígado, catali- ticipa de diversos processos de detoxificação (conjuga-
sa a oxidação do complexo ferroso ao estado férrico sem, ção com xenobióticos pela glutationa-S-transferase e re-
no entanto, liberar radicais de oxigênio para o meio ex- moção de peróxidos via glutationa peroxidase).
terno. A ceruloplasmina reage estequiometricamente com A melatonina é uma indolamina, formada na glân-
o radical superóxido e o peróxido de hidrogênio (EM- dula pineal, nos olhos e, possivelmente, em outros teci-
BRAPA, 2002; Boothe, 2004). dos, que modula funções dos sistemas endócrino e cir-
Outra proteína plasmática, a albumina, remove o cadiano. Essas ações da melatonina são mediadas por
radi­cal superóxido e possui sítios de ligação para o íon receptores localizados nas membranas de células do cé-
cobre, inibindo a peroxidação lipídica dependente de co- rebro (núcleo supraquiasmático e hipófise) e de tecidos
bre e a formação de radical hidroxila. A albumina tam- não neurais. A melatonina possui a capacidade de seques-
bém atua como sequestrador de ácido hipocloroso libe- trar radicais hidroxila. É lipofílica e altamente difusível,
rado pela mieoloperoxidase de fagócitos, impedindo que estando distribuída tanto nos fluidos extracelulares como
esse agente altamente oxidante destrua alvos como a α-1- no interior das células, torna-se um importante compo-
antitripsina. A albumina é importante para o transporte nente do sistema de defesa antioxidante.
de ácidos graxos livres na circulação sanguínea. Tem-se As metalotioneínas são proteínas de baixo peso mo-
sugerido que a bilirrubina ligada à albumina seria im- lecular encontradas no citoplasma e no núcleo celular, prin-
portante para evitar a oxidação desses ácidos graxos du- cipalmente em fígado, rins e intestino. Essas proteínas são
rante a exposição da proteína a agentes iniciadores de pe- ricas em cisteína e têm a capacidade de ligar íons metáli-
roxidação lipídica (EMBRAPA, 2002; Boothe, 2004). cos com zinco, cobre, cádmio e mercúrio pela associação
Os uratos são produtos finais do metabolismo das desses íons com os grupos tiol da cisteína. As funções da
purinas. Atuam como antioxidante e têm alta capacida- metalotioneína incluem armazenamento de metais pesa-
de de sequestrar radical hidroxila, radicais peroxila, oxi- dos em uma forma não tóxica, regulação do metabolismo
gênio singlete, ozônio e ácido hipocloroso, tendo ainda celular de cobre e zinco e absorção intestinal desses me-
a capacidade de quelar cobre e ferro. Assim, como o as- tais. Sua ação antioxidante deve-se à quelação de íons co-
corbato e a glutationa, os uratos formam radicais livres bre, à liberação de zinco (que poderia inibir a peroxidação
menos reativos ao reagir com o radical hidroxila. lipídica) e ao alto conteúdo de grupos tiol que poderiam
Outro grupo dentro dessa classe são os antioxidantes interagir com oxigênio singlete, superóxido e radical hi-
hidrossolúveis de baixo peso molecular. O ácido ascórbi- droxila. A indução de metalotioneína em animais diminui
co (vitamina C) é necessário in vivo como cofator de en- a toxicidade do antineoplásico adriamicina e aumenta a
zimas, como prolina e lisina hidroxilase, envolvidas na resistência aos efeitos da radiação ionizante.
biossíntese do colágeno e dopamina-β-hidroxilase, que
converte dopamina em noradrenalina, estando envolvi- Outros antioxidantes dietários
do na síntese de carnitina, catecolaminas e neurotrans- Uma série enorme de compostos presentes, especial-
missores. Em razão de seu baixo potencial redutor, o as- mente nas espécies vegetais, apresenta importantes ­efeitos
corbato reage como um antioxidante com a maior parte antioxidantes e pode ser usada na dieta de forma preven-
dos radicais oxidantes formados nos sistemas biológicos. tiva para um grande número de doenças, como câncer,
A ação antioxidante do ascorbato é importante para re- processos inflamatórios de múltiplas origens e cardiovas-
generar os radicais tocoferoxil e α-tocoferol, preservando culares. Os principais agentes antioxidantes que podem
a capacidade antioxidante deste último nas membranas ser usados como nutracêuticos no controle e na preven-
biológicas. O ascorbato reage com os radicais superóxido ção de doenças são apresentados a seguir.
e hidroxila, gerando radical ascorbil; interage também O α-tocoferol (vitamina E) tem sido considerado o
com o oxigênio singlete, reduz radical tiol (S) e combina- mais importante antioxidante biológico, tendo uma fun-
-se com o ácido hipocloroso (potente oxidante gerado pela ção relevante na proteção das membranas celulares. Pelo
mieloperoxidase de leucócitos nos focos inflamatórios). fato de ser lipossolúvel, o α-tocoferol tende a se acumu-
O ascorbato é um antioxidante hidrossolúvel importante lar no interior das membranas para onde é transportado
dos fluidos extracelulares (plasma sanguíneo, fluido in- pelas lipoproteínas, principalmente pela lipoproteína de
tersticial do pulmão) e de estruturas com baixa atividade baixa densidade (LDL). O α-tocoferol suprime e reage
de SOD, como o cristalino do globo ocular. com o oxigênio singlete, sequestra radicais superóxido e
A glutationa (GSH) é um tripeptídio formado por re- hidroxila, podendo bloquear a iniciação da peroxidação
síduos de glicina, cisteína e ácido glutâmico. A GSH é um lipídica. Sua principal ação antioxidante nas membranas
sequestrador de radicais hidroxilas e oxigênio singlete. biológicas decorre da interrupção da fase de propagação
Deficiências na síntese de GSH nas células animais acar- da lipoperoxidação, doando um átomo de hidrogênio
retam hemólise. A glutationa é cofator de várias enzimas para os radicais peroxil e alcoxil, derivados da oxidação
48 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

dos ácidos graxos, interrompendo, assim, a cadeia radi- mados durante a peroxidação lipídica. Ao contrário da
calar da peroxidação lipídica. A deficiência do α-tocoferol vitamina E, o β-caroteno não altera a produção de radi-
por períodos curtos na dieta de humanos adultos não cal superóxido por células fagocíticas. O efeito antican-
promove sinais agudos da doença, provavelmente pela cerígeno dos carotenoides tem sido constatado em diver-
ação de outros mecanismos de proteção antioxidantes ou sos sistemas in vitro e em modelos experimentais animais
pela regeneração do α-tocoferol das membranas pelo áci- in vivo.
do ascórbico. A vitamina E é um constituinte importan- Os sulfetos orgânicos estimulam as enzimas de deto-
te da membrana do músculo cardíaco e tem mostrado xificação de carcinogênicos e são encontrados em alimen-
efeitos benéficos na lesão oxidativa cardíaca induzida de tos como alho e cebola. As catequinas e os flavanoides
forma experimental. Não têm sido observados efeitos de- são antioxidantes que parecem agir diretamente nas cé-
correntes da ingestão de altas doses de vitamina E por lulas cancerígenas e importantes agentes no tratamento
via oral, possivelmente porque as grandes quantidades de hepatites agudas e crônicas pela diminuição da bilir-
são eliminadas pelas fezes. Experimentos in vitro demons- rubina. Flavonoides e catequinas, juntamente com cuma-
traram que concentrações muito altas ou muito baixas rinas, estão presentes em uma grande variedade de espé-
dessa vitamina diminuem a capacidade dos leucócitos de cies vegetais e têm sido considerados potentes agentes
destruir bactérias por inibição da produção de radical su- antioxidantes úteis na prevenção e no tratamento das mais
peróxido durante o processo oxidativo das células fago- diferentes doenças nas quais o papel do óxido nítrico e
cíticas. O efeito apregoado para a vitamina E em animais outros radicais livres são grandes, como no câncer, nos
atletas seria o de evitar lesões musculares por processos processos inflamatórios e em doenças autoimunes. O áci-
oxidativos indesejáveis após contrações musculares ex- do fítico se liga a metais e diminui a absorção do ferro.
cêntricas de alta intensidade, e é uma terapia comum ou Os limonoides induzem a produção de enzimas antioxi-
profilaxia para miopatias por esforço em equinos (Da dantes protetoras e são encontrados em frutas cítricas.
Dzanis, 1999; Leman e Lockwood, 2007). As fibras dos alimentos vegetais aumentam a veloci-
Os tocotrienóis diferem dos tocoferóis por apresen- dade do fluxo fecal através do cólon, diluem compostos
tarem uma cadeia lateral poli-insaturada. Eles estão pre- carcinogênicos e impedem a formação de tumores. O pa-
sentes em diversos cereais e óleos vegetais. Atuam como pel das fibras dos alimentos na prevenção de doenças é
antioxidante e inibem a síntese do colesterol. enorme e, atualmente, muito utilizado, inclusive em ve-
O ubiquinol 10, forma reduzida da coenzima Q-10, terinária. No entanto, o uso desses produtos está mais re-
é um antioxidante importante para a proteção das partí- lacionado à sua capacidade de atuar como agente probi-
culas de lipoproteína de baixa densidade (LDL). A suple- ótico, e não como nutracêutico. Os isotiocianatos induzem
mentação com coenzima Q-10 pode reduzir a neuro­ a síntese de enzimas antioxidantes protetoras (Murkies
toxicidade desenvolvida por excessiva peroxidação de et al., 1998).
lipídios e radicais livres na doença de Parkinson. Muitos compostos provenientes da soja (alguns já
Os carotenoides são pigmentos presentes nos tecidos descritos) agem como antioxidantes. Diversos estudos
fotossintéticos de vegetais adquiridos pelo organismo por realizados em humanos e animais confirmam que a soja
meio da dieta, principalmente pela ingestão de frutas e possui componentes com potenciais de reduzir risco de
legumes. O β-caroteno converte-se em vitamina A (reti- doenças cardiovasculares por diminuir os níveis de co-
nol), processo catalisado pela enzima 15’15’-dioxigena- lesterol no sangue, inibir a oxidação de LDL e atenuar
se nas células intestinais e hepáticas. Os carotenoides mais agregação e peroxidação de plaquetas. Os principais com-
hidrofóbicos (α-caroteno, β-caroteno e licopeno) são ponentes antioxidantes provenientes da soja são tocotrie-
transportados no plasma pelas lipoproteínas (LDL, VLDL nóis, ácidos fenólicos, flavanoides, esteróis, ácido fítico e
e HDL), ao passo que os carotenoides mais polares (lu- avenantramida (AVEN), componentes distintos daque-
teína e zeaxantina) são transportados por outras proteí- les discutidos e que atuam como fitoestrógenos. Este úl-
nas. Os carotenoides transportados pelas lipoproteínas timo aumenta a capacidade antioxidante em tecidos bio-
concentram-se em tecidos como fígado, glândulas su- lógicos, reduzindo constantemente o estado de formação
prarrenais e testículos. Os carotenoides polares concen- das espécies reativas de oxigênio e os danos oxidativos
tram-se mais na retina, onde teriam como função suprimir­ teciduais.­Em ratos submetidos à suplementação aguda
espécies reativas de oxigênio geradas pela luz protegen- com avenantramida em exercícios extremos em esteira
do as células fotorreceptoras da retina. Os carotenoides rolante por 22,5 m/min a 10% de inclinação por uma
atuam como supressores de oxigênio singlete e como se- hora, demonstrou-se que o exercício aumenta a produ-
questradores de radicais livres. Sua atividade antioxidan- ção de ERO no fígado e nos músculos vasto lateral e só-
te é relevante sobretudo nas baixas tensões de oxigênio leo, enquanto AVEN atenua a formação de ERO induzi-
observadas em condições fisiológicas. O β-caroteno pro- da pelo exercício e a peroxidação de lipídios, por meio
tege membranas celulares e LDL contra modificações oxi- da influência na atividade dos sistemas enzimáticos de
dativas, reagindo diretamente com radicais peroxil for- SOD e GPx 2.
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 49

O selênio é um antioxidante cofator da glutationa pe- Coenzima Q10


roxidase. Seu principal efeito benéfico é prover proteção
antioxidante contra radicais livres durante intenso trei- A coenzima Q10 ocorre naturalmente como uma
namento físico, auxiliando no aumento da capacidade benzoquinina lipossolúvel que pode ser sintetizada pe-
aeróbia muscular durante o transporte de oxigênio e em las células, e é encontrada tanto em animais como em hu-
casos de prevenção e tratamento de doenças cardíacas, manos em altas concentrações, sobretudo em animais jo-
osteoartrite, câncer e envelhecimento celular. A dose re- vens; portanto, é necessária sua suplementação em animais
comendada para suplementação é 55 a 70 μg/kg, e doses mais velhos. Existe uma série de enzimas cuja atividade
maiores do que 100 μg/Kg/dia acarretam náuseas, vômi- depende da presença em quantidades normais dessa coen­
tos, dor abdominal e fadiga. zima, entre as quais se destacam succinato desidrogena-
O ginseng (Panax quinquefolium L.) é um dos mais se, coenzima Q10 redutase, succinato citocromo C redu-
populares suplementos nutricionais usado para melho- tase e nicotinamida de adenina dinu­cleotídeo citocromo
rar o desempenho físico em seres humanos. Existem qua- C redutase, as quais estão envolvidas na produção de ATP,
tro fontes de ginseng (chinesa/coreana, japonesa, norte- de vital importância para a produção de energia pelas cé-
-americana e siberiana) que variam consideravelmente lulas eucarióticas.
no custo e na potência de seus compostos. Estudos recen- Além de sua importante atividade antioxidante, essa
tes indicam que o ginseng possui importantes proprieda- coenzima está imbricada na resposta imune dos animais
des antioxidantes e grande variedade de efeitos farmaco- no ataque de patógenos, especialmente bactérias e vírus.
lógicos pela diversidade em sua composição estrutural. Vários estudos demonstram, ainda, que a coenzima Q10
O fitopanaxadiol, um grupo de ginsenosídeo contendo tem um importante efeito protetor contra isquemia de
dois pares de glicose na posição C-3, exibe potente pro- miocárdio, sendo um produto importante na prevenção
priedade antioxidante. Tratamento com extrato de gin- do infarto do miocárdio, protegendo animais, especial-
seng e suplementação com ginseng na dieta têm demons- mente cães, da necrose causada por infarto por prevenir
trado efeito protetor contra danos oxidativos in vitro e in a depleção de ATP nas células cardíacas. Aliado a esse
vivo, oxidação da LDL, perda da memória, disfunção is- uso, em veterinária, essa coenzima também tem sido es-
quêmica de neurônios e lesão de reperfusão cardíaca. tudada como agente anti-hipertensivo, especialmente em
Poucas investigações são encontradas na literatura cães. Outros usos veterinários da coenzima Q10 são na
científica acerca do efeito do ginseng contra envelheci- prevenção e no tratamento de doenças periodontais em
mento e problemas de saúde associados à idade, embora animais com desempenho físico comprometido e com
os ginsenosídeos possuam habilidades de combater ra- disfunções imunes, sendo particularmente útil em ani-
dicais livres e quelar íons metálicos. Diferentes frações mais velhos, nos quais seus níveis estão reduzidos.
de fitopanaxadiol parecem exercer funções antioxidan-
tes por diferentes mecanismos. Por exemplo, uma das Substâncias ergogênicas
frações (Rb1) contendo quatro glicoses interage direta-
mente com radicais hidroxilas, protegendo neurônios da Um ergogênico normalmente se refere a uma subs-
isquemia; já outra fração (Rb2, contendo três glicoses) tância utilizada que produz e intensifica o trabalho e me-
parece estimular a ligação de proteínas nucleares a sequên­ lhora o desempenho. O propósito da maioria dos ergo-
cias de genes regulatórios da CuZnSOD. Recentemente, gênicos é aumentar o desempenho pela intensificação da
outras frações foram relacionadas à modulação de iso- potência física (produção de energia), força mental (con-
formas de proteína quinase C e à diferenciação de gra- trole de energia) ou do limite mecânico (eficiência ener-
nulócitos. gética); e, dessa forma, prevenir ou retardar o início da
Experimentos realizados em ratos demonstraram que fadiga.
o efeito do ginseng para reduzir a geração de espécies rea­ As substâncias ergogênicas podem ser classificadas
tivas de oxigênio pode ser explicado por sua habilidade em três categorias: nutricionais, fisiológicas e estimulan-
em modular o sistema de defesa antioxidante endógeno tes farmacológicos. [Nesta parte do capítulo, será dada
nos tecidos desses animais. Ratos que recebem suplemen- ênfase apenas aos auxílios ergogênicos nutricionais, es-
tos de ginseng em doses elevadas geralmente mostram al- timulantes e fisiológicos, utilizados como nutracêuticos
tos níveis de atividade de SOD e GPx. Quanto aos efeitos na veterinária para melhoria do desempenho e na pre-
adversos da utilização do ginseng, altas doses dessa subs- venção e controle de doenças. Alguns desses ergogêni-
tância na alimentação resultaram em um aumento signi- cos já foram abordados em tópicos anteriores.]
ficativo na redução do peso corporal, talvez devido à per-
da de gordura ou proteína. Resultados de diversos Ergogênicos nutricionais
trabalhos publicados na atualidade sugerem que algumas
das frações ou dos metabólitos do ginseng servem como Os ergogênicos nutricionais servem, principalmen-
pró-drogas, fato que merece cautela e novas investigações. te, para aumentar a oferta de energia para o músculo e a
50 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

taxa de produção de energia no músculo. Os nutrientes cas nem evidências empíricas para sugerir que a associa-
estão envolvidos com os processos geradores de energia ção de sulfato de condroitina e sulfato de glicosamina
por meio de três funções básicas: alguns são utilizados traga benefícios maiores que quando essas substâncias
como fontes de energia, outros regulam os processos atra- são usadas separadamente. Mesmo assim, essa associa-
vés dos quais a energia é produzida no corpo, e outros ção é realizada com frequência.
promovem crescimento e desenvolvimento do tecido cor- A glicosamina é a unidade estrutural básica dos pro-
poral fornecendo energia. teoglicanos presentes nas cartilagens articulares. A su-
Atualmente, existe uma grande variedade de suple- posta teoria do uso do sulfato de glicosamina é que esti-
mentos nutricionais comercializados utilizados para me- mularia a síntese de proteoglicanos, inibiria a degradação
lhorar o desempenho atlético, e muitos nutracêuticos ti- deles e aumentaria a produção do ácido hialurônico. En-
dos como ergogênicos também são utilizados no auxílio tretanto, não existem evidências diretas de como ocorre-
ao tratamento e à prevenção de doenças. A administra- ria tal reparação ou proteção in vivo, ou como seu uso
ção de ergogênicos nutricionais não é considerada dop­ modificaria a funcionalidade e a estrutura da cartilagem
ing pelo Comitê Olímpico Internacional (COI). articular.
O campo de pesquisa acerca da suplementação nu- Vários estudos demonstram que, independentemen-
tricional e seus benefícios ergogênicos é complexo, cons- te de alguma mudança estrutural ou bioquímica na car-
tantemente modificado e pouco explorado. O número de tilagem, a suplementação oral com sulfato de glicosami-
estudos com métodos padronizados e rigorosos os quais na resultou em melhoria substancial da funcionalidade
firmam conclusões coerentes e corretas é pequeno. Por articular em pacientes com osteoartrite. O sulfato de con-
outro lado, a intensidade da propaganda de muitos su- droitina é um grupo heterogêneo de glicosaminoglica-
plementos nutricionais é grande e, muitas vezes, exage- nos encontrado naturalmente em quantidades diminu-
rada nos dados que apoiaram seu uso. tas nas cartilagens articulares e em estruturas associadas.
Pode-se enquadrar nessa categoria os suplementos O mecanismo de ação proposto para esse composto foi
oriundos de carboidratos, lipídios, ácidos graxos; proteí­ demonstrado in vitro. O sulfato de condroitina estimula
nas e aminoácidos de cadeia ramificada, triptofano; vi- os condrócitos a substituir ou reparar danos em proteo-
taminas antioxidantes (vitaminas C e E), polivitamíni- glicanos nas articulações. Um estudo desenvolvido com
cos, selênio, sais minerais; alguns fitoesteróis, ginseng, o sulfato de condroitina demonstrou diminuição dos sin-
β-hidroxi-β-metilbutirato (HMB); produtos antioxidan- tomas da osteoartrite em pacientes submetidos à sua su-
tes originários da soja, sulfato de condroitina e glicosa- plementação oral. Evidências da biodisponibilidade do
mina; e a gelatina. sulfato de condroitina após suplementação oral são con-
A seguir, vários ergogênicos nutricionais descritos traditórias e ambíguas. A grande massa molecular e a alta
com mais detalhes. carga de densidade dessa substância limitam sua absor-
ção gastrointestinal. Desse modo, qualquer benefício pro-
Piruvato posto resultaria do aumento da disponibilidade de mo-
O piruvato é um metabólito proveniente do metabo- nossacarídeos criados durante a digestão e a absorção.
lismo dos carboidratos e tem demonstrado melhorar a Investigações têm demonstrado diminuição da atua­
capacidade aeróbia em treinamento de resistência. Esse ção de drogas anti-inflamatórias não esteroidais para alí-
metabólito tem sido estudado em associação com a dii- vio da dor em pacientes com o uso do sulfato de condroi-
droxiacetona, pois, juntos, alteram a taxa metabólica du- tina por via oral. Entretanto, pesquisas clínicas com o
rante o repouso, a composição corporal e a concentração sulfato de condroitina têm utilizado administração in-
de lipídios no plasma, além de aumentarem a reserva de tra-articular e intramuscular. Tal como para o sulfato de
glicogênio muscular, embora somente em sujeitos não glicosamina, não há evidência de que o curso natural da
treinados. O efeito sobre o desempenho não tem sido in- osteoartrite é alterado ou que a intervenção cirúrgica seja
vestigado, e os efeitos colaterais são desconhecidos, ape- abolida em razão do uso do sulfato de condroitina, em-
sar de um estudo desenvolvido em ratos ter sugerido que bora esta possa ser postergada em veterinária. Com fre-
a suplementação com piruvato por si só pode diminuir quência usam-se ambos, o sulfato de glicosamina e o sul-
o desempenho em razão da aceleração do metabolismo fato de condroitina intra-articularmente para o tra­tamento
dos carboidratos. de doenças degenerativas articulares em animais idosos.
A suplementação com sulfato de condroitina e gli-
Condroitina e glicosamina cosamina é recomendada em altíssimas doses, compara-
Sulfato de condroitina e sulfato de glicosamina são da com sua ocorrência natural. Grosseiramente, a dose
frequentemente recomendados como suplementos nu- utilizada para o sulfato de glicosamina é de 1.500 mg/dia,
tricionais. O risco médico para o uso oral desses suple- e para o sulfato de condroitina, em torno de 1.200 mg/
mentos parece ser baixo, entretanto evidências de seus dia. Ambas as substâncias são utilizadas em associação
benefícios são inconclusivas. Não há experiências clíni- com o metilsulfonilmetano, embora não exista nenhuma
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 51

evidência de seu benefício na formação de colágeno, no nhum estudo controlado apoia tal evidência. A deficiên-
tratamento ou na prevenção de osteoartrite ou analgesia. cia de zinco leva à diminuição da resistência imune e re-
Em razão do possível benefício do uso de sulfato de tardo na cicatrização de feridas.
glicosamina e sulfato de condroitina em pacientes com O magnésio apresenta, como suposto benefício, au-
osteoartrite, jovens atletas usam uma ou ambas as subs- mento da força física por meio do aumento da massa mus-
tâncias como maneira de prevenir dores articulares e fu- cular, bem como aumento associado ao poder aeróbio e
turo desenvolvimento de artrites, embora não existam resistência. O mecanismo de ação envolve a contribuição
dados de pesquisa que comprovem tal efeito benéfico. de mais de trezentas reações enzimáticas, possivelmente
destacando-se o aumento do metabolismo de carboidra-
Colágeno to e ácidos graxos (Lukasi, 1995). A suplementação com
A gelatina hidrolisada, obtida pelo cozimento do ex- magnésio pode ser recomendada para atletas com restri-
trato de colágeno, é uma mistura de muitos aminoácidos ção calórica para controle de peso. Seu consumo exces-
não essenciais ricos em glicina e prolina. O colágeno tem sivo leva a alterações gastrointestinais, náuseas, vômitos
sido utilizado, primariamente, como suplemento para e diarreias, além de interferir na absorção de cálcio.
prevenir doenças articulares suprindo o organismo de O cálcio está presente em derivados e subprodutos
substrato necessário para a síntese de colágeno natural e, do leite, diversos vegetais, legumes e, muitas vezes, em
secundariamente, como um substrato fornecedor de ou- sucos de laranja artificialmente fortificados, estando dis-
tros nutrientes naturais, como condroitina, glicosamina, ponível sob a forma de carbonato e gluconato de cálcio.
vitamina C e cálcio. No entanto, até o presente momen- Somente cerca de 1% do cálcio corporal total está envol-
to, não existe dado clínico comprovado que recomende vido em funções metabólicas como a contração muscu-
o uso de colágeno da gelatina como um suplemento nu- lar. Seu reputado efeito benéfico está relacionado ao au-
tricional primário para os atletas ou a população em ge- mento de ATP como fonte de energia, diminuição da
ral. A suplementação com colágeno de gelatina como um produção de ácido lático, aumento do transporte de oxi-
meio para aumentar fornecimento e efetividade de ou- gênio e aumento da glicogenólise, porém nenhum des-
tras vitaminas ou suplementos dietéticos permanece, por- ses benefícios parece ser significante. O cálcio interfere
tanto, suspeita. na absorção de ferro e zinco, e pode resultar no desen-
volvimento de cálculo renal em doses elevadas.
Minerais O ferro é um micronutriente essencial presente na
O cobre é um componente necessário à hemoglobi- forma heme (na carne) e não heme (nos vegetais). Seu
na e a vários sistemas citocromos e contribui para o uso alegado efeito benéfico está relacionado ao aumento da
efetivo do ferro. Presente em quantidade pequena na for- capacidade aeróbia e da resistência por meio da diminui-
ma livre e ativa, a maior parte do cobre está ligada a ami- ção da oxidação da glicose, da produção de ácido lático
noácidos, peptídeos e proteínas. Esse mineral apresenta e do quociente respiratório, efeitos não relacionados ao
como efeito benéfico principal a proteção antioxidante, aumento dos eritrócitos. Trata-se de um componente crí-
particularmente a ação antioxidante regulada pela supe- tico de hemoglobina, mioglobina e enzimas oxidativas
róxido dismutase. Por ser um componente mineral na- mitocondriais, contribuindo para aumentar o forneci-
tural encontrado na maioria dos alimentos, nenhum es- mento de oxigênio e postergar o início de fadiga. Sua de-
tudo demonstrou um efeito ergogênico específico de sua ficiência leva à anemia, causando fadiga, intolerância ao
suplementação em quantidades superiores à ingestão na- frio e depressão. Não há necessidade de suplementação
tural dietética. Ao contrário, a suplementação excessiva desse mineral em atletas com estoques de hemoglobina
pode causar problemas gastrointestinais, náuseas, vômi- normal que não estejam envolvidos em treinamento ou
tos, diarreia e hemólise intravascular (Lukaski, 1995). provas de desempenho em locais de altitudes elevadas.
O zinco é um micronutriente essencial para a sínte- Em geral, alimentos contendo ferro apresentam melhor
se e a regulação de membranas, proteínas e enzimas, en- capacidade de absorção que a suplementação artificial.
volvido nas funções de mais de cem enzimas orgânicas. O cromo é um dos suplementos nutracêuticos com
Durante o exercício extenuante, há aumento de mais de maior publicidade na imprensa leiga, principalmente por
50% na excreção desse elemento, o que leva muitos atle- potencializar a atividade metabólica da insulina e ser
tas a acreditarem no efeito ergogênico de sua suplemen- ­considerado uma alternativa segura e não esteroidal de
tação. A suplementação supõe aumento no poder de con- ­hormônio anabólico que resulta em aumento da massa
tração muscular, poder de explosão e resistência em ­corporal livre de gordura. A absorção de cromo é relati-
eventos de enduro, porém não há evidência do efeito er- vamente baixa, entre 0,5 e 4%, embora tal fato não con-
gogênico em estudos controlados e específicos. O papel tribua com a deficiência e a excreção desse mineral au-
essencial do zinco na função da desidrogenase lática po- mentar com o exercício. Sua deficiência está associada
deria, teoricamente, beneficiar o desempenho anaeróbio com tolerância à glicose prejudicada, aumento do reque-
pela melhora na remoção do ácido lático, no entanto ne- rimento de glicose e aumento dos níveis de insulina e li-
52 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

pídios, resultando em sintomas clínicos de fadiga, au- vegetais. O ácido linoleico conjugado tem merecido re-
mento do consumo de carboidratos, ganho de peso e levante interesse por exercer seu efeito na composição
diabete melito tipo 2. O cromo é encontrado em vários corporal, especificamente reduzindo a massa de gordu-
tipos de alimentos e interfere no metabolismo do ferro e ra corporal e levando a um aumento na massa corporal.
na absorção do zinco. Seu uso em preparações contendo Outros benefícios reportados estão relacionados a efei-
adrenalina pode acarretar hipertensão, derrames e mor- tos anticarcinogênico, antiaterogênico, antidiabetogêni-
te. O uso do cromo é recomendado em atletas com die- co e modulador da resposta imunológica. Entretanto, o
ta pobre e em casos de consumo excessivo de alimentos mecanismo de ação pelo qual o ácido linoleico conjuga-
contendo carboidratos ou em aumento da excreção uri- do exerce seu efeito permanece ainda desconhecido.
nária em razão de exercícios intensos.
O complexo B e outros multivitamínicos suposta- Ergogênicos fisiológicos
mente produzem efeitos benéficos por aumentar poder
físico e energia a partir de adenosina trifosfato (ATP), São substâncias destinadas a intensificar os proces-
ácido lático e uso de substrato de oxigênio. Tiamina e sos fisiológicos naturais que geram a potência física. Não
possivelmente outras vitaminas do complexo B parecem são classificadas como drogas, e sim como nutracêuticos.
comportar-se como ansiolíticos quando utilizadas em es- Pode-se enquadrar nessa categoria os suplementos die-
portes de tiro (arma de fogo) e arco. Seu mecanismo de téticos, como carnitina, dimetilglicina, coenzima Q10,
ação reside no fato de atuarem como coenzimas essen- creatina, colina, hormônio de crescimento, alguns fitoes­
ciais em processos metabólicos e enzimáticos, incluindo trógenos e inosina. Alguns desses ergogênicos já foram
produção de hemácias, proteínas musculares e neuro- abordados em tópicos anteriores. A seguir, vários ergo-
transmissores. Vitaminas do complexo B podem ser tó- gênicos nutricionais descritos com mais detalhes.
xicas em doses excessivas. Seu uso é recomendado a atle-
tas com restrição calórica em esportes com controle de Carnitina
peso, dietas vegetarianas ou a quem consome uma dieta A carnitina palmitiltransferase (L-trimetil-3-hidro-
excessiva com altas quantidades de carboidratos. xil-aminobutanoato) é uma enzima necessária ao trans-
O β-hidroxi-β-metilbutirato (HMB) é um metabóli- porte de ácidos graxos dentro da mitocôndria para a oxi-
to da leucina, um aminoácido essencial de cadeia rami- dação, sendo um componente essencial do metabolismo
ficada. Esse composto age na regulação do metabolismo de lipídios. A carnitina acetiltransferase parece ter um
de proteínas e, teoricamente, leva à diminuição do cata- papel importante na regulação mitocondrial da relação
bolismo. É produzido em pequena quantidade pelo or- entre a coenzima A livre e a acetil-CoA, influenciando o
ganismo, sendo encontrado sobretudo em peixes, frutas fluxo de glicose (Powers e Howley, 1997).
cítricas e leite materno. Possui a ação de aumentar a mas- Em cavalos de corrida, a suplementação com carni-
sa muscular, levando ao aumento da resistência e sendo tina por 58 dias não foi capaz de aumentar o conteúdo de
amplamente utilizado para melhorar a aparência física carnitina muscular, embora a concentração plasmática
estética em fisioculturistas. O principal mecanismo de tenha aumentado significativamente (Foster et al., 1988).
ação é a inibição do catabolismo durante exercícios, pos- Em cavalos, a carnitina precisa ser sintetizada, pois os ali-
sivelmente por meio de algum efeito enzimático. mentos oriundos de fontes vegetais apresentam quanti-
Os aminoácidos de cadeia ramificada (ACR), como dades muito pequenas dessa substância (Lawrance, 1994;
leucina, isoleucina e valina, são utilizados por atletas com Foster et al., 1988). A capacidade dos cavalos em sinteti-
o intuito de aumentar resistência mental e força física por zar carnitina é pouco conhecida, mas deve ser alta pois
diminuição da fadiga por meio da inibição competitiva existem altas concentrações de carnitina no músculo,
do transporte de triptofano da dieta através da barreira maiores do que em outras espécies, incluindo carnívoros.
hematoencefálica. Dietas contendo triptofano aumentam Estudo recente em ratos demonstrou que a suple-
o nível de serotonina, associado com fadiga em várias re- mentação com carnitina aumenta a oxidação de ácidos
giões cerebrais. Vários estudos têm demonstrado que an- graxos no músculo esquelético por um mecanismo que
tagonistas da serotonina levam ao aumento do tempo inclui o aumento do conteúdo de carnitina na mitocôn-
para indução da fadiga. Dessa forma, sugere-se que a su- dria muscular e o aumento do conteúdo total de acil-car-
plementação com ACR pode competir com o transporte nitina. O efeito da suplementação foi maior em ratos trei-
ativo do triptofano, diminuindo os níveis de serotonina nados que receberam suplementação por três semanas.
cerebral. A suplementação com ACR é indicada para me- Em cães, a carnitina demonstrou demora no desen-
lhorar o desempenho em eventos de resistência aeróbia. volvimento da fadiga muscular (Leman e Lockwood, 2007).
O ácido linoleico conjugado, termo usado para o isô-
mero conjugado do ácido linoleico, é encontrado em ali- Dimetilglicina (DMG)
mentos de origem animal, como produtos derivados do Derivado do aminoácido glicina, essa é uma subs-
leite; carnes de peixe, porco, frango; gema de ovo e ­óleos tância intermediária normal no metabolismo de colina.
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 53

Tem sido proposto que essa substância pode aumentar Resultados de estudos em humanos têm demonstra-
os estoques de creatina nos músculos. Resultados de pes- do que a ingestão de carboidrato e o exercício submáxi-
quisas realizadas em seres humanos, recebendo oralmen- mo durante suplementação com creatina são fatores que
te a DMG, demonstraram a substância agir como esti- aumentam a entrada e o acúmulo da creatina no múscu-
mulante do sistema imune. lo. Alguns estudos indicam o potencial da suplementa-
A DMG é um dos nutracêuticos mais pesquisados ção oral com creatina para promover a entrada de glico-
em equinos (Leman e Lockwood, 2007; Lawrance, 1994), se no músculo. A ingestão de carboidrato com a creatina
porém os resultados sobre sua utilização ainda são con- resulta em grande acúmulo de glicogênio muscular, maior
troversos. Estudos em cavalos da raça puro sangue inglês que quando o carboidrato é ingerido sozinho na dieta.
(PSI) e quarto de milha revelaram uma redução no lac- O mecanismo envolvido no efeito benéfico da suple-
tato sanguíneo, enquanto em outro estudo com PSI não mentação com creatina no acúmulo de glicogênio mus-
foi demonstrado benefício algum. A DMG é reportada cular é desconhecido até o presente momento. A suple-
por prevenir o acúmulo de ácido lático, aumentando a mentação crônica com creatina poderia ser benéfica
utilização de oxigênio. durante treinamentos e competições, auxiliando na pre-
Pesquisas nos anos 1970 e 1980 revelaram que a DMG venção da fadiga muscular, considerando-se o esgota-
poderia positivamente influenciar a resposta imune em mento dos estoques de glicogênio intramuscular ser re-
animais de laboratório e em humanos. A DMG aumen- portado com frequência como causa de exaustão. Com
tou a resposta imune do organismo, tanto pela elevação as reservas de glicogênio, a creatina fosfato representa a
na produção de anticorpos como pela elevação de linfó- fonte primária de energia disponível para exercícios de
citos, aumentou o desempenho físico e mental em atle- curta duração predominantemente anaeróbios. Demons-
tas e, em pessoas idosas e melhorou a função cardiovas- trou-se que o aumento das concentrações de creatina re-
cular em pacientes clínicos. sultou em uma aceleração da nova síntese de creatina fos-
As principais fontes dietéticas de grupos metila ati- fato entre as sessões de exercício. Essa observação sugere
vos para o homem se encontram nas formas de colina, que o aumento dos estoques musculares de creatina deve
creatina ou metionina (Powers e Howley, 1997). Quan- elevar a resistência à fadiga ou a capacidade mecânica do
do esses doadores de grupos metila falham em suprir su- músculo.
ficientemente as necessidades orgânicas, o papel meta- O estudo da suplementação com creatina em atletas
bólico da DMG adquire importância fundamental como humanos tem sido direcionado para pesquisas envolven-
provedor de grupos para metilações. Essas reações in- do o tratamento de doenças neuromusculares. Recentes
cluem metilação de proteínas, ácidos nucleicos e aminas estudos demonstram que a suplementação oral com crea­
biogênicas, além de detoxicação de substâncias estranhas. tina é uma estratégia eficaz para o tratamento de vários
A DMG age como um doador metila indireto e funcio- tipos de doenças mitocondriais e neurodegenerativas em
na como uma bomba de metionina eficiente converten- animais. Poucos trabalhos podem ser encontrados na li-
do o excesso de moléculas de homocisteína e metionina. teratura sobre os efeitos da administração prolongada de
Esse processo mantém as células do organismo em alto creatina. Os existentes fornecem informações importan-
estado potencial de transmetilação e reduz a concentra- tes, porém fragmentadas e não conclusivas quanto aos
ção de homocisteína no sangue. benefícios de seu uso nessas condições. Um experimen-
A DMG tem sido utilizada há anos por veterinários to trabalhado com mulheres sedentárias concluiu que o
e treinadores de cavalos com o intuito de otimizar a re- aumento de creatina fosfato muscular induzido pela in-
sistência. gestão de altas doses de creatina pode ser mantido pela
ingestão, por longos períodos, de baixas doses de creati-
Creatina na. Os mesmos autores concluem, ainda, que a ingestão
A creatina é um composto encontrado naturalmen- oral de creatina aumenta marcadamente o efeito do con-
te em abundância no músculo estriado esquelético e de- dicionamento de baixa intensidade sobre a massa mus-
sempenha um papel central na disponibilidade de ener- cular, a força muscular máxima e o desempenho em exer-
gia do músculo. Quando ela é fosforilada pela enzima cício intermitente de alta intensidade.
creatina cinase em creatina fosfato, doa o ortofosfato inor- Ainda com o objetivo de levantar dúvidas quanto
gânico necessário para refosforilar ADP em ATP, libe- aos benefícios do uso prolongado de creatina, pode-se
rando energia e mantendo, dessa forma, a contração mus- citar o trabalho de Kreider et al. Embora tenham obser-
cular. Sabe-se que a creatina fosfato constitui a principal vado efeitos ergogênicos, os autores apontam a necessi-
fonte de fósforo metabolicamente ativa capaz de auxiliar dade de estudos que melhor investiguem o papel da crea­
a regulação ácido-base e, por isso, o exercício causaria tina na distribuição de proteínas, na cinética da creatina
uma redução nos estoques dessa substância. A nova sín- sérica, no fluxo de enzimas musculares e hepáticas, no
tese, de creatina fosfato a creatina e ortofosfato inorgâ- metabolismo de lipídios e colesterol e na retenção de lí-
nico, contribui para o tamponamento de íons H+. quido no corpo; os efeitos da suplementação com crea-
54 Farmacologia Veterinária  • seção IX tópicos gerais

tina sobre quantidade e intensidade de treinamento e so- nos EUA, considerava a DHEA um medicamento indi-
bre o desempenho em vários tipos de esportes; e a cado para perda de peso e exigia receita médica para ven-
segu­rança médica da suplementação por longos perío- dê-lo. Em 1994, foi feita uma nova classificação, a DHEA
dos com creatina. foi considerada um suplemento alimentar, e sua venda
De acordo com estudos na espécie humana, a crea- sem prescrição médica foi liberada. Recentemente, en-
tina monoidratada administrada oralmente é absorvida tretanto, foi novamente proibida a comercialização livre
com rapidez pelo intestino e carreada para a musculatu- do produto, exigindo-se o receituário médico.
ra esquelética. Sabe-se que existe diferença no mecanis- Em 1995, foi publicado um estudo no qual se de-
mo de absorção da creatina entre as espécies; em cava- monstrava que pacientes com níveis de DHEA elevados
los, essa substância talvez seja pobremente absorvida. por suplementação apresentaram aumento da massa ma-
Pesquisas sobre o efeito da administração de 50 mg/kg gra (músculos), diminuição da massa gordurosa nos ho-
de creatina por sonda nasoesofágica em equinos relatam mens e discreto aumento nas mulheres, aumento da for-
uma concentração plasmática menor que 100 μmol/l após ça muscular nos dois sexos e melhora do sistema de
4 a 6 horas, enquanto para o homem a mesma quantida- defesa imune do organismo. Os estudos mostraram que
de resultou em uma elevação superior a 1.000 μmol/l após o uso diário de 50 mg de DHEA aumentava muito a sen-
o mesmo intervalo de tempo. Nenhuma influência foi sação de bem-estar nos pacientes.
observada na concentração de creatina no plasma ou no O mecanismo de ação da DHEA é por meio da su-
transporte de creatina no músculo de equinos após in- posta conversão da testosterona em estrógeno. Isso leva
gestão diária de 50 g de creatina monoidratada por sete ao aumento dos níveis do fator de crescimento 1 depen-
dias em associação com exercício intenso (Schuback et dente de insulina, a qual está associada com a secreção
al., 2000), concordando com estudos prévios de suple- do hormônio de crescimento humano. O aumento da ati-
mentação com crea­tina em cavalos (D’Angelis et al., 2005; vidade anabólica leva ao aumento da massa muscular,
Ferraz et al., 2006). embora haja poucos estudos explicando como a DHEA
afeta o metabolismo da testosterona e a atividade anabó-
Hormônio de crescimento (GH) lica de jovens atletas.
O efeito da suplementação com GH na capacidade Recentemente, a DHEA tem sido pesquisada com re-
de restabelecimento a exercício e resistência muscular é lação a seu potencial de diminuir a incidência de várias
incerto e com diferentes resultados. O mecanismo res- doenças crônicas, incluindo obesidade e neoplasias, com
ponsável pela elevação de GH por estímulo do exercício resultados ambíguos. Muitas investigações têm utilizado
é controverso e requer novas investigações. a DHEA na dose de 50 a 100 mg/dia, porém foi observa-
A interação do exercício físico com o eixo HG/IGF- do o emprego de doses acima de 1.600 mg/dia.
1 (insulin-like growth factor 1) é de particular relevância:
o eixo é estimulado em resposta ao exercício e pode au- Ergogênicos estimulantes
xiliar nas mudanças adaptativas corporais ao treinamen-
to; o recente reconhecimento da síndrome clínica de de- São substâncias que atuam como estimulantes do sis-
ficiência de GH está associado ao prejuízo na capacidade tema nervoso central e intensificam a potência física por
de desempenho ao exercício; há abuso na suplementa- meio de alterações promovidas nos processos metabóli-
ção com GH por atletas competidores por acreditarem cos, levando ao sucesso no esporte.
que a droga melhore consideravelmente seu desempe- A comissão médica do Comitê Olímpico Internacio-
nho atlético. O mecanismo de ação dessa droga em exer- nal (COI) considera que o doping viola a ética do espor-
cícios de alta intensidade e resistência necessita ser mais te quando a ciência médica intensifica, artificialmente,
esclarecido. os processos fisiológicos naturais que geram a potência
O GH leva ao aumento da resistência e no tônus mus- física. Podem-se enquadrar nessa categoria os suplemen-
cular, aumenta o metabolismo das gorduras e auxilia na tos ergogênicos farmacológicos, como metilxantinas, e
perda de peso em atletas. alguns estimulantes, como anfetaminas, cocaína e efedri-
na − não sendo os três últimos utilizados com tal finali-
Dehidro-Epi-Androsterona (DHEA) dade por seus efeitos indesejáveis sobre o sistema nervo-
Também denominada dehidro-iso-androsterona, tra- so central.
ta-se de um esteroide natural produzido na glândula su-
prarrenal, nas gônadas e no vegetal Dioscorea villosa. Sua Metilxantinas
estrutura é precursora dos hormônios testosterona e es- Aproximadamente 80% da população mundial con-
tradiol. É o hormônio esteroide mais abundante na cor- some cafeína, em grande parte vinda da ingestão do café
rente sanguínea dos seres humanos. extraído da fruta da Coffea arabica. Entretanto, chá pre-
Há alguns anos, o Food and Drug Administration parado com folhas de Thea sinensis, chocolate (Theobro-
(FDA), órgão fiscalizador de alimentos e medicamentos ma cocoa) e bebidas à base de cola, as quais contêm ca-
4 nutracêuticos e substâncias ergogênicas 55

feína em sua fórmula, também contribuem para esse Vitamina C


número. Cafeína (1,3,7-trimetilxantina), teobromina O benefício comprovado da vitamina C em atletas é
(3,7-dimetilxantina) e teofilina (1,3-dimetilxantina) com- a melhora do condicionamento físico e do poder aeró-
põem o grupo das xantinas, as quais possuem significa- bio, resultando em diminuição da fadiga e aumento da
tiva ação farmacológica. Essas, aparentemente, potencia- resistência em programas de enduro. No entanto, a prin-
lizam os efeitos da adrenalina, pela inibição da enzima cipal razão da administração da vitamina C como antio-
fosfodiesterase. Com isso, há uma elevação dos níveis de xidante em atletas é o benefício resultante do aumento
AMP cíclico na membrana pós-sináptica. Em razão des- da resistência imunológica. Um dos principais mecanis-
sa atuação, as metilxantinas exercem função farmacoló- mos de ação desse antioxidante é a síntese de adrenalina
gica em vários sistemas: sistema nervoso central (SNC), com consequentes aumento de glicose, mobilização de
sistema cardiovascular, musculatura esquelética lisa e sis- ácidos graxos livres e aumento da absorção de ferro. Ou-
tema renal, neste último causando diurese (Graham, tra recomendação principal para o uso da vitamina C em
1978). atletas é a redução do risco de infecções respiratórias su-
No SNC, as metilxantinas, especialmente a cafeína, periores após sessões de intenso treinamento máximo ae-
agem como potentes estimulantes. Altas doses de cafeí­ róbico ou competições de enduro (Powers e Howley, 1997).
na produzem estimulação do SNC, resultando em ner- Efeitos adversos da suplementação abusiva com vi-
vosismo, ansiedade, insônia e convulsões, sintomas ca- tamina C são a competição pela biodisponibilidade do
racterísticos da síndrome do pânico. Metilxantinas cobre e o risco de urolitíases pela acidificação da urina.
também podem reverter, rapidamente, a narcose obtida
com morfina, por via intravenosa, sobretudo a aminofi- bibliografia
lina (teofilina etilenamida), comprovando o antagonis-
mo específico com os opioides. Por outro lado, foi obser- 1. Abdalla DSP. Antioxidantes. Conceitos básicos e perspectivas terapêu-
ticas. ARS CVRANDI − A revista da clínica médica 1993;141:4.
vado que a cafeína potencializa os efeitos excitatórios do 2. Boothe DM. Balancing fact and fiction of novel ingredients: definitions,
fentanil em equinos. Em altas concentrações, a cafeína regulations and evaluations. The Vet Clin North Am. Small Anim Pract
produz taquicardia. Seus efeitos na circulação periférica 2004;34:7-38.
têm ação secundária por meio do reflexo autonômico afe- 3. Bouic PJ. The role of phytosterols and phytosterolins in immune mo-
dulation: a review of the past 10 years. Current Opinion in Clinic Nu-
rente do SNC e do aumento na concentração de noradre- trition and Metabolic Care 2001;4:471-5.
nalina, culminando em um aumento na resistência vas- 4. Bucci LR. Selected herbals and human exercise performance. Am J Clin
cular. Já sobre a musculatura lisa, a teofilina se sobressai Nutr 2000;72:624S-36S.
5. Da Dzanis. Nutraceuticals in veterinary medicine. Aust Vet J
das demais xantinas, sendo utilizada como broncodila-
1999;77(4):238-9.
tador em casos de asma. 6. D’Angelis FHF, Ferraz GC, Boleli IC, Lacerda-Neto JC, Queiroz-Neto
Em experimentos em pôneis com doença pulmonar A. Aerobic training but not creatine supplementation alters the gluteus
obstrutiva crônica, o uso de teofilina e cafeína causou di- medius muscle. J Anim Sci 2005;83:579-85.
7. EMBRAPA. Encontro Franco Brasileiro de Biociência e Biotecnologia:
minuição da resistência pulmonar e aumento na compla- Alimentos funcionais e nutracêuticos. In: Cabral J, Reis L. Brasília, do-
cência, melhorando a capacitância respiratória dos ani- cumentos. 2002;85:1-15.
mais. A cafeína tem sua aplicabilidade terapêutica, 8. Ferraz GC, Teixeira Neto AR, D’Angelis FHF, Lacerda-Neto JC, Quei-
principalmente em alterações pulmonares. Contudo, em roz-Neto A. Longterm creatine supplementation improves the eraobic
capacity of horses. Ciência Rural 2006;36:514-9.
razão de sua capacidade excitatória, seu uso se tornou, 9. Foster CVL, Harris RC, Snow DH. The effect of oral L-carnitine sup-
nos últimos anos, uma poderosa arma utilizada a fim de plementation on the muscle and plasma concentrations in the thorou-
aumentar a capacidade física e mental em humanos e ani- ghbred horse. Comp Biochem Physol 1998;91:827-35.
mais. 10. Grahan DM. Caffeine – Its identity, dietary sources, intake and biolo-
gical effects. Nutr Rev 1978;36:97-102.
11. Kurzer MS, Xu X. Dietary phytoestrogens. Annu Rev Nutr 1997;17:353-
Ginseng 81.
Supostos benefícios do ginseng (Panax ginseng) re- 12. Lawrance L. Nutrition and athletic horse. In: Hodgson D, Rose R. The
lacionados ao desempenho físico em humanos são au- athletic horse. Philadelphia: W.B. Saunders; 1994. p.205-30.
13. Leman A, Lockwood B. Nutraceuticals in veterinary medicine. Pharm
mento da resistência e retardo no aparecimento da exaus- J 2007;278:51-5.
tão em exercícios extremos em razão de vários fatores, 14. Lukaski HC. Micronutrients (magnesium, zinc, and copper): Are mi-
como possível efeito antiestresse, aumento da síntese de neral supplements needed for athletes? Int J Sport Nutr 1995;5:S74-S83.
15. Murkies AL, Wilcox G, Davis S. Phytoestrogens. J Clin Endocrinol Me-
glicogênio muscular após exercício, diminuição da pro-
tab 1998;83(2):297-303.
dução de ácido lático, disponibilidade de glicogênio e 16. Powers S, Howley E. Fisiologia do exercício. Teoria e aplicação ao con-
mobilização de ácidos graxos livres, além de aumento da dicionamento e ao desempenho. São Paulo: Manole; 1997.
resposta ao cortisol (Bucci, 2000). Entretanto, todos es- 17. Schuback K, Essén-Gustavsson B, Ersson GB. Effect of creatine supple-
mentation on muscle metabolic response to a maximal treadmill exer-
ses fatores precisam ser melhor investigados. cise test in Standardbred horses. Equine Vet J 2000;32:533-40.

Você também pode gostar