Você está na página 1de 3

A ALMA PARA SANTO TOMÁS DE AQUINO

Postado por José Francisco de Assis Dias em 30 de agosto de 2012


Autora:

Prof. Dra. Lorella Congiunti – Pontifícia Universidade Urbaniana – Cidade do Vaticano –


Roma – Itália.

Traduzido para o português: Prof. Dr. José Francisco de Assis Dias

Santo Tomás de Aquino (1225 -1274)

A pessoa humana é uma realidade muito complexa: física e espiritual. Às vezes, se pensa o homem
em termos dualistas, como se fosse composto de duas substâncias separadas, o corpo e a alma,
caindo-se frequentemente em concepções reducionistas, ou de tipo materialista; considerando que no
homem tudo é reduzível a elementos físicos ou então espiritualistas, pensando ao homem como se
fosse um puro espírito. Ao invés, a pessoa humana é fortemente unitária; é uma única substância
psicofísica, dotada de uma complexa vida vegetativa, sensitiva e racional.

Para compreender bem a profunda unidade da alma e do corpo; e ao mesmo tempo para garantir
tanto a dignidade do corpo quanto a espiritualidade da alma, é fundamental fazer referência à
reflexão de Tomás de Aquino.

Tomás sabe dar razão profunda do ser humano, explicando-o em toda a sua complexa riqueza. Ele se
vale da filosofia aristotélica, mas a enriquece de uma reflexão mais profunda, tornada mais forte pela
luz da Fé.

Tomás retoma de Aristóteles a concepção da alma como forma do corpo. Toda substância corpórea
vem explicada, na perspectiva de Aristóteles, nos termos de uma composição unitária de dois
princípios, um de atualidade, que confere identidade, e um de potencialidade, que possibilita de
mudança. Ele chamou o princípio de atualidade “morphe”, ou seja, forma substancial, e o princípio
de mudança, “yle”, ou seja, matéria.
Todas as substâncias corpóreas têm uma identidade estável mesmo mudando; têm uma
individualidade i-repetível e, ao mesmo tempo, pertencem a uma espécie, em virtude de tal
composição. Sem a forma substancial, a matéria seria pura possibilidade, ao invés, a forma dá ato à
matéria, realiza-a como corpo.

O ato em sentido filosófico é uma perfeição atuada e adquirida estavelmente. Na substância, o ato
primeiro é exatamente a forma substancial, o ato que dá identidade a toda a substância; nos viventes
o ato primeiro da substância corpórea é a alma.

A forma substancial não pode ser identificada com um princípio material de informação (como o
DNA, por exemplo) mas é aquele princípio que explica todas as possíveis informações que rendem a
matéria uma coisa e não outra.

Pois bem, tal composição “ilê-mórfica” que distingue todos os corpos, há nos viventes uma
relevância especial. De fato nos viventes, a forma substancial, ou seja, o princípio unificador e
atuante, é sempre um princípio de vida, ou seja, uma alma. Os corpos viventes são animados, ou
seja, têm uma forma substancial capaz dos atos típicos da vida: dos atos mais simples próprios de
todos os viventes (como gerar, nutrir-se, crescer), aos atos mais complexos próprios dos animais
(como sentir, ter instintos) até aos riquíssimos atos próprios somente do animal racional, ou seja, do
homem (pensar e livremente querer).

Seguindo a impostação de Aristóteles, Tomás afirma que a alma vegetativa é a forma substancial dos
vegetais e atua as funções vegetativas (nutrição, acrescimento, reprodução), a alma sensitiva é a
forma substancial dos animais e atua as funções vegetativas e aquelas sensitivas (reprodução
sexuada, conhecimento sensitivo, instinto).

A alma racional é a forma substancial dos seres humanos e atua as funções vegetativas, aquelas
sensitivas e aquelas racionais (conhecimento racional e intelectual; livre vontade, espiritualidade,
etc.).

Ocorre sublinhar, junto com Tomás de Aquino, que toda substância individual há uma só forma
substancial, porque seria contraditório um indivíduo com mais formas substanciais: pertenceria
contemporaneamente a mais espécies e não teria nenhuma individualidade, mas seria “composto”;
seria contemporaneamente si mesmo e outra coisa.

Em virtude de uma e única forma substancial, pode-se sustentar que quando um homem é reduzido à
vida vegetativa é ainda um homem vivente e não é um vegetal, porque nos seres humanos as funções
vegetativas são atuadas pela única alma racional.

Na natureza encontramos somente substâncias ilemórficas, isto é, compostas de matéria e forma,


mas não se exclui que existam substâncias sem matéria, como os Anjos (aos quais Tomás dedica
belíssimas reflexões).

Entre as substâncias ilemórficas, isto é, compostas de matéria e forma, a pessoa humana possui um
valor peculiar, não é imersa na matéria como as outras coisas, a sua vida não é exclusivamente
material e não termina como todas as coisas materiais.

Já Aristóteles havia hipotizado a separabilidade da alma racional, mas Tomás pensa mais a fundo a
questão, conseguindo a explciar, com um verdadeiro golpe de gênio, a peculiaridade do ser humano
que é ser psíquico-físico e espiritual.

De fato, ele afirma que a alma é a forma substancial do corpo, mas é também substância, isto é, há
uma capacidade de subsistir, não depende do corpo para ser.
Isto se pode argumentar, partindo da experiência interna dos atos próprios de uma alma racional, isto
é, nós podemos nos render contas da possibilidade de por atos em si imateriais, como pensar e tudo
aquilo que dele resulta.

Escreve Tomás de Aquino:

É necessário que a alma intelectiva aja por conta própria, havendo uma operação própria sem a
ajuda de um órgão corpóreo. E porque cada um age enquanto em ato, ocorre que a alma intelectiva
tenha o ser por si não dependente do corpo.
Da imaterialidade da alma, da sua espiritualidade, do seu poder pôr atos que não implicam
necessariamente um órgão corpóreo, comprendemos a possibilidade que a alma humana subsista
também depois da morte do corpo, enquanto o seu ser não depende do corpo. Esta é a particularidade
da alma humana em relação a todas as outras forma substanciais: a alma humana é forma
substancial.

A imortalidade da alma vem, neste modo, explicada com argumentações racionais; a esta verdade
atingida racionalmente se acrescenta a Fé na Ressurreição da carne, verdade inatingível pela razão
pura: em modo misterioso a unidade da pessoa será recomposta; escreve Tomás:

a alma não permanecerá sempre dividida do corpo. Ela é imortal e por isto um dia deverá religar-se
ao seu corpo. Isto não é outra coisa que a ressurreição.

Você também pode gostar