Você está na página 1de 21

TEXTO LITERÁRIO E IMPROVISAÇÃO *

de Anatoli Vassiliev

* Aula dada em Bruxelas, durante a primeira edição


de Ecole dês Maîtres (21 de setembro de 1990).
* Tradução para o português: Papoula Bicalho e Matilde Biadi

Entre agosto e o início de setembro deste ano dei um seminário em Berlim.


É a segunda vez que dirijo um seminário desse tipo lá; ano passado
trabalhamos durante duas semanas sobre Dostoiévski. O grupo de atores
participantes me pediu para voltar. Resultou disso um ciclo bienal: duas sessões de
trabalho de quinze dias. No início, tive alguma dificuldade de contato com os atores e
diretores que participavam. Porque se tratava de pessoas já adultas... e porque se
tratava de Dostoiévski. Depois o trabalho se desbloqueou e no final obtive resultados
tão surpreendentes que até hoje continuam a me voltar à memória. Essa minha
experiência de teatro numa língua estrangeira, desconhecida, não materna, me dá a
segurança e a força necessárias para contar como conduzo os ensaios.
Em seus últimos anos de vida, Stanislávski utilizava amplamente o método das
ações físicas e uma prática de ensaios que ele chamava de e t j u d. Um método e
uma prática que Constantin Sergeevich ensinou a seus atores durante o trabalho com
Almas Mortas e Tartufo e que, nos anos cinquenta, quando o repertório teatral se
tornou incrivelmente esquálido e dirigido exclusivamente para a propaganda,
adquiriram um enorme significado artístico. Notei a existência do seguinte paradoxo:
quando ao teatro é impedido o uso da liberdade da palavra, da liberdade de escolher
seu repertorio, ele “se aprofunda”, começa a se ocupar da teoria, da pesquisa dos
meios, do “como fazer”.
Os alunos de Stanislávski souberam conservar e desenvolver a experiência de
seu mestre. O método adquiriu também um novo nome (que lhe foi dado por M.O.
Knebel): método da análise ativa, ou seja, método da análise da peça por meio da
ação, ou seja, leitura da peça por meio do etjud.
Raramente o ator é natural quando interpreta o texto literário. É como se o
teatro e o público combinassem previamente sobre a existência de um texto que não
deve obrigatoriamente ser vivo. Obrigatoriamente deve ser um bom texto, bem escrito
pelo autor e executado com dignidade pelo artista. Mas não é obrigatório que a
representação feita seja viva!
O objetivo da prática do etjud é aquele de liberar o ator (do texto e do público),
de tornar o teatro vivo, de tornar a ação imediata.
O texto age paradoxalmente: “acorrenta” o teatro. Retira do teatro sua
verdadeira natureza: funcionar como meio imediato da comunicação entre os homens.
Este tipo de efeito, em russo, é definido: “teatro narrativo”, ou seja, teatro que conta
uma história. É considerado um teatro que parece com uma leitura do texto em voz
alta. Ou, ainda, pode ser definido “teatro falado”, como aquele da rádio. Ou então,
“teatro literário”. Em suma, o texto tem uma função terrível: a de matar o drama.
Apesar de dizerem que ele próprio é o drama! Um paradoxo. Para resolver este
problema, em seus últimos anos de vida, Stanislávski criou um instrumento para
comunicar com a peça: o etjud. O etjud é adotado no período de estudo e de
aprendizagem do papel e é quando, durante os ensaios, o texto e o comportamento,
isto é, as ações psicofísicas indicadas na peça, adquirem a função de material para a
improvisação do ator.
Vou expor agora q u a t r o v a r i a n t e s desse mesmo método: a variante
clássica, uma primeira mudança, uma modificação ulterior, e depois a maneira com
que eu o adoto, tendo-o transformado em improvisação. Pois então: começo com o
etjud e termino com a cognição de improvisação.
É chamado etjud uma leitura do texto, desenvolvida em termos de prática
dramática, que se vale da ação cênica transversal1 como instrumento primário. Juntei
o adjetivo “cênica” porque gostaria que se levasse em conta a globalidade que atribuo
ao termo “ação transversal”; isto é, uma ação que tem três aspectos (ação física, ação
psíquica e ação verbal) e que, ao mesmo tempo, se realiza sempre e
contemporaneamente sobre dois níveis: exterior e interior, ou seja, um de superfície e
outro profundo.
P r i m e i r a v a r i a n t e. Um grupo de atores se reúne para trabalhar numa
peça. Escolhem uma cena e, então, a analisam, a leem. A análise é o prelúdio das
relações que se instaurarão entre diretor e atores, de um lado e a peça, do outro.
Durante a análise são individuados os pontos pelos quais o ator deverá passar durante
o etjud. Esses pontos dizem respeito tanto ao texto quanto ao comportamento do
homem, que não são diferenciados. Isso quer dizer que, apesar do fato que o
comportamento e o texto se encontrem em níveis diferentes (mais profundo, o primeiro
e mais na superfície, o segundo), durante a primeira etapa do trabalho com o etjud
tudo é simplificado: o ator, de maneira absolutamente livre e arbitrária, como quiser,
pode expor sua idéia da cena e do papel: poderá dizer, na ordem que quiser, como

1
Sobre o conceito de ação transversal, cfr. nota 39 ao capítulo Tenho quarenta anos, mas meu aspecto é
juvenil.
será, sobre o que tratará, etc. Assim pode fazer também seu partner e os outros
atores, dois, três ou mais, quantos forem, livremente. Durante essa primeira fase do
trabalho, o papel do diretor se limita a corrigir o que é dito. A análise não deve ser
longa. Pode durar quinze minutos ou uma hora. Depende da preparação do ator. Mas
não deve durar muito. Não deve acabar com todo mundo se acomodando nas
cadeiras, fazendo desaparecer o desejo de se movimentar.
A fase sucessiva e indispensável é ir para a cena. Os atores vão para a cena e,
em plena improvisação, livremente, portanto em etjud, fazem aquilo que tinham
concordado em fazer.
Primeiro ponto. Os atores têm a obrigação de fazer em cena aquilo que tinham
concordado em fazer durante a análise. É uma condição imprescindível do acordo.
Agora vamos falar da cena em si e por si, ou seja, daquilo em que os atores e o
diretor devem prestar atenção. Falamos então do processo. Gostaria que prestassem
atenção a esta palavra: p r o c e s s o.
O teatro da tradição russa se baseia sobre duas palavras: pereživanie e
sopereživanie2. Observo que, na realidade, todo o teatro do mundo se apoia como
uma estrutura de viga mestra sobre essas duas “palavras”. Isso significa que no teatro
os atores devem viver uma história em cena; e que os espectadores, na plateia,
devem viver a história junto àqueles que estão em cena. Então quando o diretor se
encontra com os atores, fala primeiro de pereživanie, e na raiz dessa palavra existe
uma outra: p r o c e s s o.
E então. A verdadeira tarefa do etjud, aquilo que efetivamente desenvolve,
mesmo que imperceptivelmente, é fornecer ao ator um processo de jogo que permite
tornar seu jogo cênico natural, consequente, gradativo, que se manifesta hic et nunc;
de transportar seu jogo cênico do tempo passado (que é um tempo do tipo narrativo)
para o tempo presente.
No sistema lógico comum, ternário, a cena é formada por um início, um ápice e
um final.
Na análise, o início da cena é considerado o ponto de partida do etjud. Dele
falamos e o delineamos, o estruturamos como tal.
Depois os atores dizem: agora vou me comportar assim. E quando me
comportar dessa maneira, haverá e s s e a c o n t e c i m e n t o; e isso é o que
chamaremos de ápice.

2
Sobre a palavra pereživanie, cfr. nota 37 ao capítulo Faz muito tempo que queria remexer, destruir e
esquecer tudo o que sei fazer. A palavra sopereživanie acrescenta ao substantivo pereživanie o sufixo so
que significa “com”. O so-pereživanie é a parte que captura o espectador no teatro de pereživanie. Por
isso, se o ator em cena vive, sente, experimenta emoções, padece de sentimentos (pereživaet), o
espectador vibra em simpatia com ele, por isso com-vive, sente junto com o ator, experimenta suas
emoções, com-padece de seus sentimentos (so-pereživaet).
A praxe do etjud, aquela autêntica, consiste em abraçar todo o percurso
dramático, do início ao ápice e do ápice ao fim. E eis que todo esse percurso – do
início, ao ápice, ao fim – é objeto de um acordo entre atores e diretor.
Partida. Acontecimento de partida da cena.
Ápice. Acontecimento principal da cena.
Final, ou fim: ou seja, o território que vai do ápice ao início da cena seguinte.
Comportamento, ou seja, ação.
Percurso transversal, ação transversal.
Cada diretor sabe como é perigoso, na praxe teatral, utilizar sempre as
mesmas palavras, uma terminologia estereotipada; por isso é necessário inventar
sempre novas palavras, capazes de recuperar o sentido velho, stanislavskiano, dos
conceitos que queremos expressar.
O ator tem a obrigação de conceder a mais completa confiança à própria
organicidade. Nesse método não existem erros. Não podemos dizer: “errei”. O ator
não deve pensar que cometeu um erro. Deve confiar plenamente na própria
organicidade, na própria natureza e no final dizer: “fiz o que minha natureza me
ditava”. Mas isso deve vir junto à condição de ter d e s e j a d o executar aquilo que,
junto com os outros, tinha concordado em fazer. Disse: “farei isso”. Depois começou a
fazê-lo. No fim do etjud deve poder afirmar: “minha natureza fez assim”.
Nesse ponto analisamos, ajustamos os fragmentos nos quais subdividimos a
ação e corrigimos o final. Como regra, corrigimos o final sempre. Porque depois da
zona do ápice, geralmente cometemos erros! Assim, um etjud após o outro, lemos
toda a peça do início ao fim. No espaço de vinte ensaios, a peça está inteira, como se
diz em russo, “lida com as pernas”. O mínimo de discursos à mesa e o máximo de
“discursos” em cena. Apenas a ação em cena, a análise seguinte, a correção, um novo
etjud e assim por diante.
Em uma adoção correta desse método, o etjud não pode ser transformado em
um exercício, isto é, em algo que deve ser executado com precisão absoluta. Deve
sempre existir uma relação livre e muito viva com os próprios erros. Em duas ou três
tentativas é necessário obter o máximo de realização das intenções; depois disso, é
indispensável ir além, prosseguir na leitura.
Tudo aquilo que aconteceu de positivo durante esse processo de leitura da
peça se acumula na consciência do ator e assim se formam sua primeira impressão da
peça, de seu tema, do próprio papel, da pessoa que somos chamados a interpretar.
Esse é o método de leitura da peça usando etjudy na sua variante clássica, analítica.
O renascimento do teatro soviético no início dos anos sessenta era, em grande
parte, baseado nesse método. Método que permite ao ator voltar aos próprios
começos, à própria fraqueza, à própria infância, à própria incapacidade, que lhe
permite jogar fora tudo aquilo que apreendeu até hoje sobre a cena. É aquele tipo de
procedimento que dá a possibilidade de tocar o quanto existe de humano, de se dirigir
diretamente à alma, ao coração e às emoções.
O método dos etjud sempre encontrou uma forte resistência. Muitas vezes foi
também objeto de chacota. Parece-me uma reação natural. Acontece porque o teatro
profissional está sempre na defensiva. Porque para um profissional é muito
embaraçoso encontrar-se em uma situação em que é novamente como uma criança,
como alguém que não sabe nada.
Agora quero falar quais modificações são possíveis ao método dos etjud e
como nasce a improvisação.
Contei como, durante a análise, concordamos com todas as etapas do
comportamento do ator em cena; isto é: sobre o início, ou seja, sobre o acontecimento
de partida, sobre como o ator deve se mover do início ao ápice, sobre como deve
atravessar o acontecimento principal e sobre como deve concluir o etujd: os atores
devem cumprir este percurso tendo como base as tarefas que se dão e os atos que
realizam.
S e g u n d a e n o v a v a r i a n t e. Não nomeamos mais o fim. Quer dizer
que indicamos apenas a zona do ápice, deixando a saída do ápice ao livre arbítrio do
ator. Isto significa que essa última parte, aquela que vem após o acontecimento
principal, já não pertence mais nem ao autor, nem ao diretor, mas somente ao ator. A
partir desse momento, podemos falar da livre criação do ator no processo da atuação.
Nessa variante, o ponto de partida é objeto de um acordo meticuloso, pois devemos
indicar muito claramente os primeiros passos dos atores, as primeiras direções que
devem tomar, e ter as ideias claras também sobre como essas direções levam ao
acontecimento. Mas não dizemos nada sobre aquilo que vem depois. Isso quer dizer
que durante o drama inteiro, a fase conclusiva de cada cena permanece
desconhecida.
Mas é exatamente nos “episódios conclusivos” das cenas que estão contidos
todos os sentimentos e os pensamentos do autor. E todos os pensamentos do diretor.
E todos os pensamentos do ator. E os seus sentimentos.
Essa é a nova variante da pesquisa livre da energia nos episódios que seguem
o ápice dramático.
Nos primeiros anos do meu trabalho, frequentei muito esse método. E deu
bons resultados. Mas a primeira etapa do trabalho permanece sempre uma etapa
gerida pela racionalidade, a etapa que Stanislávski definia <<investigação com o
intelecto>> – ressalto isso para tornar mais precisa a continuação dessa intervenção.
O comportamento e a ação durante o acontecimento de partida (e até o ápice!) são
determinados pelo acordo feito antes de ir para a cena. É a ratio que sempre responde
às perguntas: “O que faço nesse ponto? O que acontece aqui?”
Nos últimos anos na URSS, a autoridade de Michael Chekhov cresceu
exageradamente. É provável que isso tenha acontecido devido ao fato de que
finalmente foram publicados seus livros. Maria Knebel, minha professora de direção,
na juventude foi aluna de Chekhov e, uma vez pedagoga, transmitia aos alunos, em
segredo, sua metodologia3. Andrei Popov, a primeira autoridade teatral que reconheci
como tal, possuía uma cópia do livro de Michael Chekhov, Para o ator, em língua
russa4. Ele me emprestou e eu o datilografei inteiro; conservava-o como uma relíquia.
Apesar disso, é preciso dizer: o teatro soviético nunca conheceu bem Michael
Chekhov.
Ainda uma observação: acredito que o teatro, após os anos sessenta, tenha se
desenvolvido na direção da liberdade das sensações pessoais. Isso quer dizer que
pouco a pouco os princípios da “racionalidade” e contenção que supervisionavam a
organização da ação dramática cederam lugar a princípios que tinham como
denominador comum o descontrole.
Stanislávski inventou a fórmula: “do consciente ao subconsciente”. Uma
fórmula de molde materialista, natural para o país dos soviéticos, para sua filosofia.
Qualquer outro caminho só poderia ser considerado danoso.
A ciência teatral de Michael Chekhov, em vez disso, se dirigia diretamente ao
subconsciente, ao metafísico e, portanto foi rejeitada. No entanto, o teatro, evoluindo,
foi obrigado a se colocar a questão: “É assim mesmo? Funciona realmente essa
fórmula de Stanislávski „do consciente ao subconsciente‟?”
T e r c e i r a v a r i a n t e. É uma extensão da prática iniciada na segunda
variante. Não respondemos mais à pergunta: “O que faço nesse ponto?”. É o próprio
ator que tem que encontrar a saída do acontecimento de partida. Essa variante torna o
trabalho de ensaio extremamente difícil. O acontecimento de partida deve ser definido
e construído de maneira tal que o ator perceba um impulso exato e concreto para a
ação, e que não tenha que responder à inesperada pergunta: “Diga-me, o que eu faço
nesse ponto?”. Poderia parecer uma pergunta tipicamente russa, mas, em vez disso,
basta abrir Esta noite improvisamos, de Pirandello. Neste drama, o diretor Hinkfuss
propõe aos atores ensaiar a peça com o método da improvisação. A Atriz caricata está

3
As autoridades acadêmicas do mundo teatral soviético tinham banido o ensino de Michael Chekhov dos
institutos de formação, desde os anos vinte. O porquê é explicado por Vassiliev nas linhas que seguem.
4
Trata-se do livro de Michael Chekhov, To the actor que, editado pela primeira vez em 1953, nos Estados
Unidos, foi publicado na Rússia apenas em l985; até aquela data, circulavam entre os leitores somente
traduções clandestinas datilografadas.
muito insatisfeita com o fato de que, como ela diz, “o campo de ação esteja limitado
por posições já definidas de antemão” e obviamente coloca para Hinkfuss a pergunta:
O senhor quer... que eu ensaie? Mas...desculpe-me, o que devo fazer?
Vemos, então, que é também uma pergunta italiana. Não apenas russa. A isso
Hinkfuss lhe responde:
- Agora improvisaremos.
- Ótimo! De fato improvisamos. Entramos em cena e agora improvisamos, tanto
eu, quanto o senhor.
Hinkfuss desconversa e evita responder a essa pérfida pergunta: “O que faço
nesse ponto?”.
E então, antes de tudo, é necessário entrar em acordo com muita precisão
sobre o acontecimento de partida. E isso de modo tal que os atores possam descobrir,
sozinhos, o que devem fazer depois do acontecimento de partida. Ou seja: eliminamos
a indicação imperativa do que fazer no início, do mesmo modo que eliminamos aquela
no final, na segunda variante; a terceira variante traz em si a liberdade da segunda e
agrega uma nova.
Mencionei antes Michael Chekhov, para ter a oportunidade de falar da
imaginação. O ator envereda no mundo das próprias fantasias. Mergulha na escuta da
vida das imagens5 e encontra a energia para a ação. O início existe, falta definir o
ponto que deverá atrair para si a imaginação. É necessário formular o escopo.
Disposição interior6 / ação: eis uma alternativa.
E agora vamos falar dessa palavra: e s c o p o. É uma palavra que divide o
teatro em duas direções contrapostas: um teatro que se move para um escopo, e um
teatro que não se move para um escopo; papéis que se movem para um escopo e
papéis que não se movem para um escopo. Trata-se de situações filosóficas
diferentes. E de diversas maneiras de ser da ação dramática.
Se decidimos tomar como base do tecido dramático a psicologia, a vida da
psique, a ação psicológica, podemos talvez sustentar que não deve existir
pereživanie? É claro que não. Aliás, devo dizer que, em absoluto, não conseguiria
imaginar a existência de qualquer peça ou qualquer papel sem a energia do
pereživanie.
Mas é verdade que existem diversas direções no drama. Por exemplo: o drama
pode ter um momento de partida muito forte. Neste caso, o personagem p e r c e b e
que o momento de partida é como se o empurrasse pelas costas, e ele é obrigado a

5
Sobre o conceito de “imagem” (imagem artística, imagem do personagem) cfr. Michael Chekhov, Para o
ator, cit. e o capítulo O escravo de Menone.
6
Sobre o conceito de samocuvstvie (“disposição interior”), cfr. nota 38 ao capítulo Tenho quarenta anos,
mas meu aspecto é juvenil.
realizar suas premissas. Os dramas de Shakespeare. Existem outras situações;
aquelas em que os atores em cena não podem realizar o drama senão movendo-se,
por meio de seu i n t e l e c t o, para o escopo. Assim é para as comédias de Molière.
Trata-se de duas tendências diferentes.
O acontecimento principal. Na teoria do jogo cênico equivale ao escopo. O
escopo pode ser tanto aquilo para o que nos movemos, ou seja, aquilo que nos atrai,
quanto aquilo de que nos afastamos (de que partimos), ou seja, tudo aquilo que nos
repele. A função do escopo se diferencia conforme nos encontramos trabalhando em
uma estrutura lúdica ou em uma estrutura psicológica. Nas estruturas psicológicas, o
escopo pode ser encontrado tanto na frente quanto atrás; isto é: a ação almeja o
escopo (o escopo está na frente) e, no segundo caso, a ação é como se “fosse
empurrada” pelo escopo (o escopo está atrás). Nas estruturas lúdicas, ao contrário, o
escopo está sempre na frente e as figuras, interagindo entre si, se dirigem para o
escopo desejando realizá-lo e realizar-se nele.
Ora, o teatro psicológico e o drama russo unem essas duas tendências
alternativas. Por isso, é tão difícil falar de escopo no drama russo. De fato, porém, se
falamos de escopo, significa que estamos tratando de estruturas de teatro lúdico.
Significa que, interpretando em cena nossos papéis, nos movemos para o escopo. E
isso significa que revivemos7 nossos papéis (o pereživanie se encontra “embaixo”) e
nos movemos para o escopo da peça e do papel com o i n t e l e c t o (e este trabalho
é “acima”). Nasce assim a ideia de que os papéis são duplicados. E sobre isso,
substancialmente, se fundamenta a concepção base da vibração vital.
Portanto, vivemos o papel, sofremos o papel8. E isso pode ocorrer por causa de
um acontecimento de partida forte. De um momento inicial, que é como dar um
“empurrão” ao papel. Esta é a parte psicológica – o “embaixo”. No “acima”, ao
contrário, jogamos com o papel. Graças ao intelecto, o papel se move
conscientemente para o escopo. O efeito de tudo isso é que um homem, uma pessoa,
um ator, encontrando-se em uma posição dupla, se move ao longo do tecido
dramático em direção ao acontecimento principal. E em direção ao final. E neste
espaço criado entre a pessoa e o personagem, acontece a vibração. Não podemos
ainda falar de improvisação, mas já podemos falar de vibração. Surge uma situação
natural e viva para o homem que interpreta. Ele deixa de ser o executor de uma
vontade alheia: seja essa a vontade do autor, do diretor, até a sua própria. Sua
natureza, encontrando-se nessa condição dúplice, inicia a vibrar e a jogar sem ele.

7
O verbo russo que aqui é traduzido com “reviver” é pereživat’, aquele do qual vem o substantivo
pereživanie.
8
Trata-se novamente do verbo pereživat’, que aqui é traduzido por “padecer”.
E, fantasiando o papel, imaginando-o, o ator convida o personagem que está
em algum lugar, em algum mundo dos personagens, fora do ator, a se encontrar com
ele.
Obviamente, A.P. Tchekhov é uma síntese. O que é dramático, o que deve ser
9
sofrido , é interpretado embaixo. A energia dos personagens, seus sentimentos, seus
humores, provocados ali embaixo, se unem para formar uma única atmosfera. Aqui
surge o conceito de atmosfera. E aquele de ensemble. Se os atores não estão ligados
energeticamente um com o outro, não se cria nem a situação necessária para que
uma atmosfera nasça. E as palavras não se libertam. Porque se embaixo é “ligado”,
acima é livre. Mas não pode existir uma liberdade absoluta, isso não existe. Deve
existir algo absolutamente exato. Então ou é ligado acima – e então a psique oscila –,
ou é ligado embaixo – e então a palavra se liberta.
Em Tchekhov as palavras libertadas se unem, “acima”, em variações de jogos
intelectuais, destacando-se do fundo das não repetíveis atmosferas de suas comédias:
“Porque se veste sempre de preto?” – “É o luto pela minha vida. Sou infeliz” – “Por
quê? (...) Não entendo”. (A gaivota).
Assim temos, mais uma vez, uma conexão livre. A personagem e a pessoa nas
estruturas lúdicas estão em relação de duplicidade uma com a outra. A personagem é,
como mostrado, colocada diante da pessoa. Nas estruturas psicológicas, a pessoa e a
personagem são quase a mesma coisa. A personagem é colocada na pessoa, age
sobre a pessoa, a desdobra; e é por isso que falamos de condição desdobrada do
homem e de catástrofes psicológicas.
Duplo e desdobrado.
Desenvolvendo o etjud como tal, ocupando-me apenas da peça, ou seja,
exclusivamente do texto literário, eu terminava, porém, sempre insatisfeito com os
resultados obtidos; continuava procurando a liberdade, liberdade na expressão do
ator. Perseguindo esse objetivo, cheguei ao amadorismo pleno. Parece-me que deixei
de ser profissional, quer dizer, deixei de montar ações profissionais em cena. Não me
interessam mais. Deixou de me interessar o teatro psicológico, enquadrado na
“moldura visiva”. Onde o meio mais importante da expressão é dado pelo quadro
visual e pela existência do corpo do ator no espaço. E, em vez disso, começaram a me
interessar as ações mais elementares dos atores, dos partners, na cena, no palco.
Começou a me interessar não a paisagem externa, mas aquela interna. Nos últimos
anos, não fiz mais nada a não ser me ocupar disso: da paisagem interior. Mas quando
olho para aquilo que faço com distanciamento e, obviamente, acabo por me perguntar:

9
É traduzido pela expressão “o que deve ser sofrido” a palavra pereživatel’noe.
“Mas o que está fazendo?”, me parece se tratar de autênticas criancices, de puro
amadorismo. Apesar disso, visto que já são vários anos que trabalho nisso, quero
então falar, contar para vocês qual é o trabalho.
E então: q u a r t a v a r i a n t e. Não falo mais com os atores da ação, nem
uma palavra. Falo apenas da composição. Os atores comigo não interpretam mais
papéis; percorrem uma composição. Eles concebem o papel do personagem apenas
como parte do desenho compositivo geral. São obrigados a sentir todas as partes da
composição, mesmo que ela não seja composta apenas de duas ou três partes, mas
sim de oito, dez, doze; eles têm que sentir todas, independentemente de quantas
sejam. São indicados o momento de partida e o escopo; isso é indispensável. Depois
disso, o ator é convidado a agir. Ou seja, a encontrar uma saída sozinho. Encontrada
a saída do acontecimento de partida, o ator é completamente livre para se comportar
como quiser. Nada o deve constranger: nem as exigências do encenador do
espetáculo, nem a obrigação de respeitar o autor; deve compor sozinho o texto da
ação: inventar as palavras e inventar as ações. No momento, e gozando deste
momento. Tudo isso no interior de um fragmento compositivo. Mas somente até
quando chega (análise!) ao limite deste fragmento compositivo e precisa ligar esse
fragmento compositivo a um outro. Essa ligação eu chamo de n ó. O intérprete tem a
obrigação de atravessar esse nó de maneira absolutamente exata. Em suma:
enquanto se encontra no âmbito lúdico, aquele no interior de um fragmento, o ator
pode agir como lhe agradar, livremente. Concluindo o fragmento, não tem mais direito
à liberdade alguma. É obrigado a “se acorrentar” e, por força de um ato racional e –
acima de tudo – desejado, a executar as condições obrigatórias: isto é, a passar de
uma parte da composição à parte seguinte, atravessar o nó diante do qual veio a se
encontrar. Entramos em acordo sobre os nós com muita precisão. E se ligam como se
fossem nós de marinheiros. A consequência desses nós é o desenvolvimento da ação
dramática, o desenvolvimento da concepção base do papel, do sentimento que a
atravessa e assim por diante. No momento em que o ator, graças a seu ato de
vontade, atravessa o nó, se enche de novos sentimentos; sentimentos que, até aquele
momento, desconhecia. No início do percurso, quando o ator procura entender o que
deveria interpretar, os sentimentos assim são escassos. E aqueles que experimenta,
os experimenta apenas graças à imaginação. Apesar disso, o ator consegue iniciar o
jogo. Além disso, se move livremente, improvisando. Fazendo assim, atravessa os
episódios indicados no texto literário. E eis que chega ao final do fragmento. Com a
vontade, passa de um fragmento a outro. No momento da passagem, surgem nele
sentimentos e nos sentimentos se verifica uma mudança qualitativa; depois disso, o
ator pode jogar livremente e naturalmente no fragmento seguinte da composição. O
ator adquire de novo a liberdade. Liberdade seja em relação à ação, seja em relação
ao texto, ao diretor, etc. E isso se repete muitas vezes. Exatamente tantas vezes
quantas são as partes compositivas que formam a composição do drama inteiro, ou da
cena dramática inteira.

Conte concretamente como acontece; por exemplo, como subdividem o texto


em fragmentos?

Bem, vou contar a base geral, como se faz em geral e, depois, contarei como
eu faço. Na teoria, existe um determinado conceito que decidi chamar de ápice. Mas a
fórmula exata é: acontecimento principal. É algo de muito concreto. Começamos a
falar do drama exatamente a partir do acontecimento principal.
Geralmente, o aluno diretor e ator são instruídos a raciocinar em termos
teatrais, utilizando esse conceito. O acontecimento principal é a zona do drama onde
se resolve o conflito da peça. É a zona onde o pensamento se concentra e vive uma
mudança.
Cada drama, normalmente, fala de um sistema de pontos de vista fornecidos
ao personagem, da crise que esse seu sistema atravessa e das conclusões que ele
tira dessa crise. Na zona do acontecimento principal, todas as emoções entram em
contato entre si, os pensamentos se tornam mais encorpados e tudo deve ser
resolvido em um segundo. E esse segundo, que no drama se prolonga por um
determinado espaço de tempo, é o segundo que determina o tema do espetáculo.
Dou um exemplo. Anos atrás trabalhei numa peça de Viktor Slavkin A filha
adulta de um jovem. Eu gostava da peça. Mas era previsto que um outro diretor a
encenasse. Vocês podem então imaginar a situação em que me encontrei quando, de
repente, confiaram-na a mim, dizendo que dentro de uma semana eu deveria começar
os ensaios e fui obrigado a “descobrir” na peça aquilo que até pouco antes não tinha
alguma intenção de procurar. Na época, vivia em um hotel, num quarto bastante
pequeno. Estava deitado em um sofazinho. Podia tocar a parede estendendo a mão.
Apoiava o texto de um lado, depois o pegava de novo e novamente o jogava num
canto, e não conseguia nada.
A história contada é simples, mas, apesar disso, cheia de significado para nós.
Um grupo de jovens, ou melhor, uma geração inteira de jovens, durante a época de
Josef Stalin, nos anos cinquenta, foi perseguida porque amava e escutava jazz. Para
um ocidental é inacreditável, mas é assim: aqueles jovens foram excluídos da
sociedade pelo fato de escutarem jazz. Depois os tempos mudaram, mas muitos não
superaram essa crise. O herói da peça, na juventude, nos anos cinquenta, era um
desses apaixonados pelo jazz e tocava numa banda amadora. Mas na época em que
se passa a peça, ele tem quarenta anos e se chama Bems. O nome, “Bems”, se
parece muito com “jazz”! É um sobrenome: Bems!
Não espera mais nada da vida. Mas ainda sobrevive nele o entusiasmo, a
energia de um tempo; enfim, é um homem agressivo, mas que de fato não tem mais
nenhum desejo. E então Bems encontra um conhecido a quem o destino sorriu, que
fez carreira e se tornou homem do governo. Entre eles aconteceu um caso de
mulheres, muito tempo antes, quando eram jovens. Um fato que Bems tinha intuído;
sim, tinha percebido que sua mulher, uma noite, tinha transado com esse cara.
Depois, porém, durante muito tempo não pensou mais nesse episódio. Mas eis que,
anos depois, durante uma noitada em que os velhos conhecidos se reencontram,
aquela história de tanto tempo atrás volta à tona e acontece uma briga. Após a briga, a
esposa de Bems, a sua mulher, sai com esse homem e volta novamente na manhã
seguinte, assim como tinha feito muitos anos antes. Na peça, não é contado se
transaram ou não naquela noite. Lendo a peça, parei nesse episódio. O que havia de
particular?
Havia algo; mas não no momento em que ela volta, mas sim logo após, no
momento em que os dois homens e a mulher estão na cozinha e falam entre si.
Imaginei esse Bems, que não reage absolutamente a mais nada, porque já está
subjugado pelos fatos e deve reconhecer essa realidade, essa vida. E concordar com
o fato que agora, diante de seus olhos, na cozinha, está se desenrolando justamente
essa conversa. Lembro claramente como imaginava seus olhos, seu silêncio. E isso
para mim significava que Bems estava iniciando uma nova vida. Uma vida de
silenciosa, tranquila aceitação. Concretamente, é aqui o acontecimento principal da
peça. Expressado em uma pausa, apenas uma pausa, e nada mais.
O momento vivido por Bems era da maior importância! Porque toda pessoa de
quarenta anos na URSS tinha que responder à pergunta sobre o que devia fazer;
continuar protestando, ser dissidente, ficar na cadeia, ou reconhecer o fato da
existência de uma ordem daquele tipo como fato objetivo da vida. Eu o reconheci
como um fato histórico e isso me fortaleceu imensamente, do ponto de vista humano.
Eu o reconheci como um fato da vida e isso me fortaleceu como artista. Do meu
espetáculo desapareceu a agressividade – e consegui desenvolver uma determinada
concepção da arte, em vez de uma determinada concepção da vida social.
Conto tudo isso porque quero sublinhar que no território do “acontecimento
principal” está contido todo o sentido da vida do drama, do herói e do artista.
Ainda um exemplo. Do romance de Fiódor Dostoiévski, O idiota. Tem um
diálogo entre Míchkin e Rogójin. Míchkin se encontra com Rogójin “naquela sua
mesma casa”. Míchkin diz a Rogójin que não é seu inimigo, que gosta dele, e que
portanto Rogójin deve confiar nele. Que ele nunca desejou Nastássia Filíppovna, que
nunca a amou, e que apenas teve piedade dela. Que é contra o casamento de
Nastássia Filíppovna e Rogójin. Que quer convencê-la a ir para o exterior. “Mas se
entre vocês as coisas se acertaram, não tenho objeção alguma”, assim começa o
terceiro capítulo10. Rogójin deixa que Míchkin fique com ele: “senta aqui comigo”. Um
minuto depois lhe diz: “não podemos fazer uma comparação entre nós dois...”. Míchkin
exclama: “Por que você disse que somos diferentes?”. Rogójin diz: “Não é uma coisa
que inventei, aqui decidiram sem nos consultar”. Rogójin começa a contar a história de
seus pesadelos, pesadelos dos quais não consegue encontrar o caminho para a
saída. Míchkin escuta toda sua história com Nastássia Filíppovna e se prepara para
sair. Nesse ponto, Dostoiévski termina o capítulo.
Depois disso, escreve o capítulo seguinte, o quarto. Porque no terceiro não
encontrou resposta. E precisa de uma resposta para a questão: “em quê, aqui, as
pessoas são diferentes?”. Os dois passam diante de um quadro no qual está pintado
Jesus. Começa uma discussão sobre a fé. Rogójin diz que nele “mesmo ela, a fé, está
desaparecendo”. Míchkin se despede, sai, mas volta: “E por falar em fé...”.
E conta para ele quatro parábolas!
Se não descobrirmos o que existe nessas quatro parábolas, se não
entendermos em que consistem, o diálogo precedente não pode dar certo. Porque na
zona colocada após a última parábola existe a ênfase psicológica e emocional
principal.
Míchkin fala do sentido da fé ortodoxa, e de como ele a percebe. Começa o
ápice (o acontecimento principal dos dois capítulos). Rogójin tira seu crucifixo e pede a
Míchkin para trocar com o dele11. “Vou usar, tiro o meu e te dou. Use-o”. Em uma das
parábolas, Míchkin lhe contara que o crucifixo que usava no pescoço tinha ganhado de
um soldado bêbado que o passara para trás. Esse vendedor-de-cristo tinha lhe
vendido seu crucifixo de estanho como se fosse de p r a t a. No dia anterior, em um
hotel provinciano, Míchkin ouviu o caso de um homicídio. Alguém tinha matado outro

10
Vassiliev fala do terceiro capítulo da segunda parte.
11
Segue o diálogo de que fala Vassiliev, tirado de O idiota de Dostoiévski, Milano, Garzanti, 1973 (2ª ed.
1990), p. 261.
“„Bem, o que devo dizer!... Adeus, até logo! Que Deus não te abandone!‟. Virou e começou a descer as
escadas. „Lev Nikoláevitch!‟, gritou lá do alto Parfion quando o príncipe alcançou o primeiro patamar. „O
crucifixo que você comprou do soldado, você está com ele?‟. „Sim, estou usando‟. E o príncipe parou de
novo. „Deixa eu ver‟. Que estranho! Pensou um momento, subiu as escadas e mostrou o crucifixo sem
tirar do pescoço. „Me dê‟, disse Rogójin. „Por quê? Talvez você...‟. O príncipe não queria se separar
daquele crucifixo. „Vou usar, tirarei o meu e você o usará‟. „Quer que troquemos os crucifixos? Tudo bem,
Parfion, se é assim, estou feliz. Nos tornamos irmãos!‟”
alguém por causa de um relógio de p r a t a. Parece que o homicida tirara o crucifixo
do homem que havia matado por causa do relógio. “Me dá de volta!” – e Regojin cede
seu crucifixo e põe no pescoço o crucifixo do assassino.
Quando na Alemanha ensaiava esta cena, pedi a um ator que tinha
apresentado esta cena, junto com seus companheiros: “Por que não foi além com o
texto desse episódio?”. Ele me perguntou: “O que tem além?”. E eu para ele: “Bem,
depois vão até a mãe de Rogójin e Rogójin pede: „Mãe, abençoe-o‟”. Pausa. “É uma
espécie de cena folclórica” responde. Essa resposta nos faz entender que os atores
não estão aptos a fazer esse capítulo de O idiota, porque pularam o território principal,
aquele em que o personagem Parfion Rogójin aceita sua cruz: ser assassino.
E então, Rogójin pega Míchkin, vai até a mãe e diz: “Mãe, abençoe-o”. E a mãe
deficiente o abençoa fazendo nele o sinal da cruz. Se não entendemos isso, se não o
sentimos, não é possível manter em pé a estrutura dos dois capítulos. A estrutura não
aguentará e não saberemos como subdividir a cena.
Perguntaram-me: “Como vocês fazem as subdivisões?”. Subdivido conforme
entendo o acontecimento principal da cena e da peça. Não podemos subdividir ao
acaso! É claro que tenho a minha experiência. Mas quando vejo que tenho dificuldade,
que paro, volto à minha escola e me pergunto: “onde está o acontecimento principal?”
E enquanto não descobrir, não consigo ir em frente.

Como juntar texto literário, interpretação e estrutura?

No início é necessário ver através do texto. Ou seja, ver a estrutura que está
atrás do texto. Ver como se organiza no texto o movimento das intenções dos
personagens, como mudam, como aparecem os momentos energeticamente mais
encorpados, como se move a negação e assim por diante. Para fazer isso, é
indispensável “furar” o texto, ver através dele. Com uma condição, é claro. Que tudo
aquilo que é dividido e subdividido seja determinado de maneira exata. Não é
importante que o ator saiba ou não o texto de cor, não é também importante se lembra
o texto todo ou apenas uma parte. O importante é que tenha a memória de toda a
composição do texto, do início ao fim.
A segunda etapa consiste na análise do próprio texto. E quando falo de análise
do texto, falo de algo que não tem relação com a estrutura, com a estrutura da ação.
Porque a estrutura do texto, muitas vezes, é exatamente o contrário da estrutura da
ação. É preciso saber isso, compreender.
A maioria dos nossos erros consiste no fato de que muitas vezes nós
confundimos as energias com as palavras. Acontece que as palavras perturbam as
energias e as energias perturbam as palavras. Umas bloqueiam as outras.
Acontece-me até com atores experientes dizer: “senhores, agora estamos
falando de palavras. Não é a estrutura. A estrutura da ação permanece aquela que já
delineamos”.
O texto é analisado naquela mesma composição que vale para a ação.
Avançamos indicando os temas sobre os quais improvisar. Formulando a lei que
caracteriza a improvisação para o todo o texto e para cada fragmento compositivo. Por
exemplo: aqui (e devemos mostrar o ponto concreto) vocês improvisam em torno
dessa palavra, ou desse grupo de palavras, ou em torno desse conceito, aqui sobre
esse outro, etc. Repito, é obrigatório lembrar de cor os nós. Ou seja, lembrar
exatamente o texto literário nos pontos nodais. A pergunta que você me colocou é,
talvez, a mais importante. Porque mesmo quando o ator já está na condição de ir para
a cena, o texto, no entanto, continua a perturbá-lo. E é como se combinássemos fingir
que a emissão do texto literário não perturbe nem ele, nem nós. Por isso, logo que os
atores entenderem o que fazem os personagens, é preciso liberá-los do texto literário
que os bloqueia.
Então os atores começam a improvisar o texto em torno dos núcleos temáticos
indicados para a improvisação e em conformidade com a estrutura desenhada durante
a análise. Com a condição obrigatória de utilizar o texto literário exato nos nós. Nos
etjudy, entre as várias falas que são ditas pelo ator, têm necessariamente algumas do
autor. Perto do fim do seu trabalho, o próprio ator deixa de usar o texto improvisado.
Muitas vezes, o lugar do texto casual é ocupado por uma pausa. Em Tchekhov a
pausa acontece como atmosfera.
Há pouquíssimo tempo, analisei uma fala de Sonia, do Tio Vânia, de Tchekhov.
É formada por duas preposições diferentes entre si. Em dois fragmentos diferentes de
ação. A segunda preposição, pelo seu significado, é exatamente o oposto da primeira.
No fim da segunda preposição, tem a rubrica: “Abraça-a”.
A primeira frase é um protesto. Contra Elena. A segunda expressa o consenso.
Com Elena.
Não percebemos logo isso, lendo. É preciso adivinhar. Mas entre a primeira e a
segunda tem a r e p a u s a. Talvez um minuto, talvez dois, talvez uma ação enorme.
Se nos limitamos a uma improvisação apenas textual, é impossível encontrar
essa pausa, e menos ainda encontrar a vida que existe dentro dessa pausa. Porque a
improvisação textual joga o espaço pro ar.
Realizei o espetáculo Essa noite improvisamos, de Pirandello12, como uma
composição baseada sobre a improvisação do texto e da ação. É preciso dizer que a
parte improvisada diminui chegando ao final. E a cena final era interpretada seguindo
rigorosamente o texto. Gostaria talvez de trabalhar por muitos anos sobre essa peça.
Talvez, até, sem nunca concluir o trabalho. Penso em montá-la inteira, com todo seu
texto literário, assim como foi escrita. Mas já fizemos um espetáculo em que os três
atos são improvisação. Podemos fazê-la assim também. Assim é melhor.

Cena do Tio Vânia, segundo ato


I. Elena Andreevna Sofia
Sonia 1. O que há?
Elena Andreevna Até quando vai ficar emburrada? Nenhuma de nós duas fez
mal à outra. Por que então ser inimigas? Chega...
Sonia 2. Eu também queria... (Abraça-a). Chega de ficar com raiva.

“Texto de estrutura” da cena


Elena Andreevna Sofia!
Sonia 1. O que há? (Pausa, pode existir um longo ficar em silêncio no lugar do
“texto casual”)
2. Eu também queria... (abraça-a).
Dois fragmentos.
Primeiro (I) – constituído por duas falas. É a exposição do acontecimento de
partida da cena.
Segundo (II) – esse também é constituído por duas falas, com as quais começa
a ação, ou seja, a primeira parte da composição.
Contradição.
As duas frases de Sonia são, na realidade, uma única fala constituída por duas
preposições: 1. e 2.
Trata-se de um monólogo constituído por duas frases, seis palavras (O que há
– Eu também queria) e uma pausa.
Sonia se contrapõe a Elena Andreevna, briga com ela, se cala, de repente,
com ardor e enrubescendo, fala com ela como que “abraçando-a”.
A rubrica “abraça-a” na ação “invisível” é executada antes de acontecer
fisicamente, naquela visível.

12
O espetáculo, todo improvisado, ao qual se refere Vassiliev, Essa noite improvisamos, foi encenado em
Fontanellato, no âmbito de um festival organizado pelo Teatro Due de Parma, em abril de 1990.
A iniciativa de fazer as pazes não pertence a Elena Andreevna, mas sim a
Sonia e a paz entre as duas mulheres depende dela.
A cena feita por Sonia e constituída de intenções (de ações) contrapostas,
totalmente independente dos humores e dos desejos de Elena Andreevna, provoca
uma tempestade em sua alma; Sonia quer se abrir, está apaixonada.
Elena Andreevna fica espantada, surpreendida pela moça “feia”! Que também
estaria pronta a “arriscar”13.

O que vi no espetáculo Essa noite improvisamos, e o que os espectadores


viram, é uma enorme liberdade. É uma leitura subjetiva da peça, ou tudo isso está no
texto? Acredita que a primeira peça de Pirandello que encenaram fosse menos livre?
Para os atores italianos, seus raciocínios parecem complexos e impossíveis de
executar. O que o senhor pode dizer a respeito disso?

Nas estruturas psicológicas, o próprio homem (o personagem) tem peso


demais. Já falei disso. É como se estivesse no interior da pessoa. Por isso, as
palavras sofrem um bloqueio. Nas estruturas lúdicas, essa pessoa é deslocada
adiante, e entre a pessoa do artista que atua e o personagem, cria-se uma distância. A
pessoa do ator conduz o personagem pelo caminho do papel. É como se criasse um
movimento. Quer dizer que eu, ator, “empurro” meu personagem. Graças a essa
liberdade (eu/não eu), é possível a síntese do texto literário e a vida psicológica do
personagem. É como se o personagem se encontrasse em relações mais livres
comigo, como pessoa. E, agora, todas as palavras que o personagem diz se
encontram em conexão livre com minha vida. Não se trata de uma personalidade
desdobrada, em que as palavras perturbam o fluir da vida e o fluir da vida perturba as
palavras. Trata-se de uma estrutura única, absolutamente íntegra: aquela da figura
agente na qual as palavras se manifestam enquanto vida e a vida se manifesta
enquanto palavras. Se essas estruturas são estudadas, como você afirma, isto é, que
meus raciocínios resultariam impossíveis, irreais para um ator italiano, isso parece
bastante discutível. Sobretudo porque se trata de estruturas que pertencem ao drama
europeu e ao teatro lúdico. E eu as descobri e comecei a utilizá-las trabalhando sobre
Pirandello. Depois disso, comecei a consolidá-las utilizando-as no trabalho sobre
Dostoiévski. Isso me ajudou, me livrou do peso que o social tem nas páginas desse
autor, daquilo que nelas aparece de doente. Desse modo, Dostoiévski revelou-se um
autor de uma luminosidade única, muito simples, leve e até mesmo muito cômico.

13
O exemplo do Tio Vânia foi tirado de uma gravação efetuada em setembro de 1991, durante um ensaio
no teatro “Escola de arte dramática”. (n.d.a.)
Desapareceu tudo aquilo que sabia de Dostoiévski desde que eu era um adolescente,
desde que me explicaram que nas páginas desse autor se fala apenas de humilhados
e ofendidos. Para mim foi uma autêntica revolução quando entendi que em
Dostoiévski não existem nem humilhados nem ofendidos, mas gênios absolutos.
Apenas uns Klestakov, de Gogol! Ah, esses fantasmas geniais disseminados nas
páginas de seus romances, colocados ali pelo autor para contar ao mundo algumas
verdades...! Eis então aquilo que lhe respondo.
Penso que hoje, o teatro dramático, assim como o conheço, encontra-se em
uma situação sem escapatória. Parece que o teatro visual parou de dar as
informações que antes fornecia. O teatro textual não pode satisfazer porque é um
teatro morto. Claro que existem bons espetáculos que contam bem uma peça. Mas
acabam sempre resultando inferiores aos espetáculos que não utilizam o texto. Parece
que o próximo caminho que o teatro deve tomar seja aquele da pesquisa da síntese de
vanguarda e classicismo, de ação visual na pausa e de ação no texto literário. No que
me diz respeito, minha pesquisa se mantém na relação entre texto literário e
improvisação. A conexão de liberdade e ausência de liberdade. De exatidão e
anarquia. Penso ser essa a única possibilidade de fazer voltar a vida sobre a cena.

Vocês fazem um training particular?

Sim, fazemos training.


O mais proveitoso resultou ser aquele da classe do coro. Os nossos atores, em
teatro, toda manhã, cantam a liturgia, a missa ortodoxa. É muito, muito útil. Penso que
devemos levar esse coro, essa missa, a um grau de perfeição, porque, antes de mais
nada, predispõe bem o humor das pessoas, permite a elas se isolar das catástrofes
sociais, e mais, se executada de maneira exata, faz com que as pessoas se dirijam às
matérias supremas, ao conhecimento supremo, à mente única, a Deus. Dessa
maneira, se estabelece uma ligação vertical. E acredito que, nesse momento, o ator
comece a cumprir a única função que é própria dele no mundo: aquela de ser um
veículo de cima para baixo. Do vertical ao horizontal. E por isso pretendo trabalhar
para aperfeiçoar esse tipo de training.
As outras cinco horas são usadas para ensaiar, todos os dias. Concebo
também os ensaios como training. Dou um tema sobre o qual trabalhamos. E esse
tema pode ser um autor ou uma peça. Sentamos um de frente para o outro e fazemos
aquilo de que falei.
Dia após dia, observo os trabalhos dos atores. Eles me mostram personagens,
pedaços de cena; realizam um trabalho que parece não se inserir em nenhum projeto
de espetáculo, inútil. Sem nenhum sentido particular. Mas eu sei que não é assim.
O tempo exigido para instaurar relações corretas entre uma companhia teatral
e um autor não é subjetivo, é objetivo. Não podemos torná-lo mais breve, nem mais
longo. É exatamente o quanto ele deve ser, o quanto é preciso ser. E penso que seja
sempre um pouco mais longo do que aquilo que gostaríamos. Um personagem se
educa do mesmo jeito que educamos uma criança pequena. E para isso é preciso
tempo.
Não existimos com a finalidade de fazer uma estreia. A nossa relação com a
peça é a nossa vida, a nossa via de comunicação com o mundo. As peças devem
viver em nós por muito tempo. Parece-me que elas têm um percurso próprio a cumprir;
devem, no início, ser meninas, depois adultas, e só então podem envelhecer. E, então,
somente depois podem ser retiradas do repertório da companhia.
Agora: sobre exatidão e improvisação.
A exatidão tem defeitos.
Se um ator, improvisando, acaba ficando canastrão, não percebemos. Se faz
isso enquanto interpreta um texto exato, ao contrário, se vê, e muito. Quando
interpretamos exatamente, não podemos exagerar. A partir dessa observação,
cheguei à conclusão de que o sentimento humano, quando se encontra numa situação
de contato, tem possibilidades únicas. Quem improvisa pode mentir. E o público
acreditará nele totalmente. Mas quem interpreta com exatidão não pode mentir. Então,
exatamente aqui no meio – entre o mentir e o não mentir – se encontra o calor e o frio,
isto é, a aventura da aceitação do drama enquanto jogo.

Falando da composição, o senhor disse que a conclusão do fragmento


compositivo, o nó e a passagem para um novo pedaço da composição, provocam no
ator novas sensações. O ator deve esquecer todas as sensações anteriores a essas
novas?

É uma pergunta interessante. Está ligada à cognição do “lembrar e não


lembrar”. Preciso dizer que muitas vezes fico chocado com a profissão do ator. Como
diretor, é obvio, estou em conflito com essa profissão. Mas, como homem, fico
chocado pela unicidade dessa profissão. Para um músico as coisas são mais simples
que para um ator. Ele tem sempre, junto de si, seu instrumento. E são dois: o músico e
o instrumento. O ator, em vez disso, toca sobre si. É um único, um ser indivisível: e é
exatamente a partir desse fenômeno único que surgem todos os paradoxos e as
complicações dessa profissão. Com as estruturas lúdicas, eu tento fornecer ao ator um
instrumento. Porque a autêntica improvisação não é possível se o instrumento não se
afasta, pelo menos um pouco, e se não se cria uma distância. Mas essa é apenas
teoria. Na realidade, no entanto, trata-se de um único homem.
Hamlet. Que diabo, você acha que é mais fácil tocar em mim, do que numa
flauta? Me dê o nome de qualquer instrumento que você queira, poderá me desafinar,
mas não me tocar!
Uma das mais complexas questões relativas a essa profissão está fechada nas
palavras: lembrar e não lembrar. Quando um ator joga em cena, deve esquecer tudo.
Este é o paradoxo. Quer dizer que no momento em que está para chegar ao nó da
composição, ao nível da memória não deve fazer nenhuma comparação, porque não é
sua memória a ter que fazer comparações, mas sua organicidade, seu sentimento
imediato. Se é sua memória que compara, significa que o resultado dessa operação
não terá nenhum valor. E agora gostaria de lembrar de quando falei da variante
clássica do método dos etjudy; eis, o limite dessa variante consiste justamente no fato
de que fazemos tudo usando como base a m e m ó r i a. É uma condição obrigatória:
fazemos tudo usando como base a memória e esperando que chegue um sentimento
vivo. E, além disso, depois, é preciso lembrar como interpretamos, analisar e corrigir.
Se, ao contrário, falamos de jogo cênico livre, de teatro natural, ali a memória tem
espaço somente antes da experiência. Enquanto depois, quando a experiência
começa, a memória já não tem mais função alguma. Apenas as sensações funcionam.
E são elas que devem se substituir umas às outras e se transformar. De modo que,
quando o ator chega ao momento nodal, se depare com uma nova qualidade de suas
sensações.

Seu teatro, seu grupo, realiza uma análise literária esplêndida. O senhor
trabalha baseando-se em qualquer Weltanschauung sistemática, em uma ideologia?
Por exemplo, como vocês resolvem os problemas colocados pelo mundo exterior?

Com o isolamento. Não me ocupo dos problemas do mundo exterior. Já faz


seis anos. E isso, me parece, me salvou. Vou contar um episódio. Uma impressão
minha. Cheguei a esta conferência após uma seleção. Estava selecionando o novo
curso. São atores e diretores vindos da periferia e também de Moscou. A primeira vez
que escolhi um grupo de estudantes para meu curso foi em 1982, e naquela época me
espantou muito o repertório apresentado por esses jovens atores e diretores.
Naqueles tempos, encenavam Nabokov, Soljenítsin, Tsvetáieva, Akhmátova; um
repertório que antes daquela época não era apresentado. E isso testemunhava o fato
de que tempos novos tinham chegado. Tinham parado, de uma vez por todas, de
encenar Maiakovski e literatura soviética desse gênero. Sim, aquela vez fiquei
realmente impressionado pelo repertório! Penso que vocês leem jornais e estão
cientes da situação atual na União Soviética. Vou lhes dizer o que encenam agora. Os
russos me surpreenderam mais que tudo! É um repertório no qual se contam as
revoltas. Como aquela de Stepan Razin, que no século XVII sublevou o povo e com
um machado na mão passou por todo o sul da Rússia até os Urais e no fim foi
executado; sim, esse tipo mesmo de repertório. E não o representam assim como o
faziam uma vez, com posições utópico-revolucionárias, com posições libertárias, não.
Leem-no como sangue. Como revolta. Como machado. São representantes da classe
média, de uma classe sem talento. Metem medo. E representam essas coisas com um
certo particular entusiasmo. Um deles, jovem, encenou o monólogo de Raskólnikov.
Aquele em que Raskólnikov conta a Porfírii sobre seu artigo. Escolheu, desse
monólogo, o episódio do homicídio, extraiu-o do texto e o representou, contando
apenas a força do machado, a força do homicídio.
Um dia antes de eu viajar para vir aqui, recebi um telefonema de um conhecido
que edita uma revista, uma nova revista teatral. E me propôs colaborar na publicação
de um importante artigo dedicado a uma história que tem a ver comigo. Vocês têm que
saber, de fato, que em 1980 foi dissolvida à força a companhia do Teatro Stanislávski
de Moscou. Foram os comunistas e os dirigentes do partido que quiseram isso. Os
atores, e todos aqueles que ali trabalhavam, sofreram muito por isso. Foi um momento
trágico da minha vida. Esse meu conhecido me propôs de publicar agora a história do
Teatro Stanislávski. Respondi que quero que todos a conheçam, mas não publicarei
nenhum artigo meu sobre essa história. Ele ficou espantado e me disse: “E não vai me
dar também nem um documento?”. Eu: “Nada. Não falarei com você dessa história e
não quero que seja publicado nada, porque mesmo sem isso já corre bastante
sangue”.
É uma posição minha, tomada em plena consciência. Mas tomada há muito
tempo atrás, quando ensaiava A filha adulta de um jovem. Foi a última peça em que
trabalhei que tratava de problemas sociais. Mais tarde, em Cerceau, conectei os
problemas sociais com aqueles artísticos. O sentido da existência do homem hoje em
dia era contado em um estilo, ou seja, no estilo artístico daquela obra. Depois disso,
desde a estreia de Seis personagens à procura de um autor, parei completamente de
me ocupar de problemáticas sociais. É a minha posição; nem sei quando voltarei
novamente a me ocupar da realidade. Obrigado pela atenção.

Você também pode gostar