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A proposta desse trabalho surgiu ao longo de minha graduação, nos últimos

semestres que cursei na Universidade do Estado de Mato Grosso retomei um tema que
muito me interessava: O Livro Didático. Das conversas com os professores da área de
educação e ensino de história surgiam debates e ideias que inspiravam a pesquisar esse
importante instrumento de ensino que, nas últimas décadas, foi deveras estudado e
criticado. Muitos aspectos do livro didático ainda estão por ser explorados, seu uso
como principal instrumento de ensino/aprendizagem ainda hoje é marcante na educação
servindo de objeto e/ou fonte de investigação (Bittencourt, 1993).
Uma história do livro didático fundamentada na escola,
pode auxiliar a compreensão de como é construído um
saber escolar, percebendo com clareza os limites da
intervenção dos professores e alunos no processo de
produção do conhecimento. (Brauna, 2013, p. 18.)
A importância, abrangência, qualidade e conteúdo do livro didático bem como
sua estrutura material e linguística, é tema de inúmeras pesquisas das quais fui me
dando conta ao longo do levantamento bibliográfico que executei. Segundo estudo feito
por Moreira (2011) a maioria dessas pesquisas busca oferecer uma “denuncia” do livro
didático.
Como muitos foram escritos no período imediato após o fim da ditadura
Civil/Militar estes trabalham trazem um teor de crítica já acentuado, querendo encontrar
em cada detalhe do livro as provas da intervenção do estado autoritário. Segundo
Brauna:
Deste modo, as análises sobre o livro didático até os anos 1990,
preocupadas em denunciar as características ideológica e o
acumulo de capital das editoras, tiveram como objeto de estudo
o conteúdo dos livros. Esta percepção não levou em
consideração todo o processo pelo qual o livro está submetido,
direcionando sua análise, grosso modo, na representação do
negro ou do bandeirante, entre outros. (Brauna, 2013, p. 20)

São muitos também os trabalhos recentes da década de 2000 até os dias atuais,
podemos dizer portanto que esse tema carrega consigo um grande referencial teórico.
Tamanho é o número de referências que é preciso sempre afunilar quando se pretende
dar conta de um trabalho limitado como uma monografia, nessa perspectiva, muito
influenciada pela minha formação na área da História, busquei pesquisar o livro dentro
da minha própria cidade.
Antes mesmo de terminar a minha graduação já me encontrava, devido à
necessidade, trabalhando como professor de História na rede particular de ensino de
Cáceres, este contato “precoce” com o ambiente escolar, mesmo que privado,
possibilitou-me encarar a situação do ensino primário e secundário, os desafios, a
relação ensino/aprendizagem e principalmente a condição do ensino de história na
região em que moro. Tive contato no meu trabalho com os livros didáticos oferecidos
por algumas das escolas particulares da cidade, estas sempre conveniadas com grandes
marcas e editoras, ao mesmo tempo já conhecia o livro distribuído pela rede pública de
educação, tive oportunidade de lidar com o material pela primeira vez quando cumpria a
disciplina de estágio obrigatório logo nos primeiros meses do 6° semestre do curso de
História da Universidade do Estado de Mato Grosso. De uma maneira geral vivia,
trabalhava e transitava por essas duas realidades e tinha contato com os dois materiais, o
público e o privado.
Mesclando isso com o interesse sobre o tema comecei a me perguntar sobre o
ensino de história, o livro didático e os autores do passado da cidade de Cáceres, a
pergunta inicial que me fiz foi a seguinte: Quais eram os livros didáticos oferecidos na
cidade de Cáceres que circulavam pelas escolas públicas do século passado? Qual era o
teor do conteúdo desses livros? Por causa do meu interesse particular em relação a
ditadura que se instaurou no Brasil de 1964 a 1985 decidi por afunilar mais uma vez a
minha pesquisa, delimitei o tempo que precisava ser estudado e me interessei sobre o
livro didático durante os anos da ditadura Civil/militar.
A partir destes pontos novas perguntas e propostas foram surgindo na pesquisa;
de que maneira a ideologia dominante era veiculada através desse importante
instrumento de escolarização? Quais aspectos do livro didático além do conteúdo
poderiam ser analisados? Como se dava a relação ensino/aprendizagem nas salas de aula
do período em questão e sua relação com o livro?
Ora se tratamos de um período tão conturbado politicamente como foi a ditadura
não podemos ser ingênuos a ponto de acreditar que o que se instaurou no Brasil a partir
de 1964 não tinha ressonâncias e interesses na educação e na disciplina de história em
particular.
Não há dúvidas de que a disciplina de História do Brasil
ocupa um lugar importante na formação de uma
consciência patriótica e de um sentimento nacional. Sua
trajetória como disciplina escolar, desde que foi
introduzida de forma obrigatória no currículo, foi marcada
pelo objetivo político de contribuir para a construção da
ideia do Brasil como uma nação, ou seja, de ter uma
identidade nacional. (Brauna, 2013, p. 79)
Segundo Choppin o livro didático exerce quatro funções, a referencial,
instrumental, ideológica e documental, estas variam de acordo com o ambiente
sociocultural e de acordo com o método de ensino, destas a função ideológica é a mais
antiga (Choppin, 2004, p.553). Sobre a história da disciplina de História sabemos que
sua formação como conteúdo autônomo se deu na maioria dos casos sob um forte
contexto de afirmação nacional, política, revoluções e formação e desconstrução de
identidades nacionais.
Um trabalho só não dá conta de tamanha proposta e de tão vasta temática, além
disso a pesquisa em si foi norteando os rumos de como deveria encarar e escrever o
presente trabalho. Numa rápida olhada na biblioteca Municipal de Cáceres a dificuldade
de se encontrar exemplares de livros didáticos da década de 60 e/ou 70 se mostraram
enormes, o acervo municipal encontrava-se ainda, até o término dessa pesquisa, em fase
de organizar e catalogar as obras, outro problema encontrado foi que nas escolas
públicas mais antigas da cidade ora não existia uma biblioteca ora esta estava sendo
reformada, em ambos os casos os livros didáticos mais antigos já não existiam em
nenhum desses acervos citados.
Me deparei com livros didáticos do período desejado no acervo da biblioteca da
Universidade do estado de Mato Grosso em Cáceres, mesmo que poucos exemplares,
foi um alívio encontrar o material tão perto, os poucos livros que encontrei eram do
autor Antônio José Borges Hermida, enfim meu objeto de estudo ficava claro para mim.
Nesse trabalho optei por estudar os compêndios de história do Brasil e estudos
sociais de Antônio José Borges Hermida, oferecidos para a primeira e segunda série do
curso médio, editado e distribuído pela Companhia Editora Nacional (CEN). O período
escolhido para trabalharmos são os anos que vão de 1968 a 1972, a data escolhida
representa os primeiros anos da repressão foi também durante as décadas 60/70 que os
livros do nosso autor alcançaram seu apogeu em vendas, antes de entrar num longo
declínio.
O autor de livros didáticos do século passado é tema de poucas pesquisas, sua
obra e sua vida não foram amplamente estudadas, no entanto seu nome é citado em
trabalhos comparativos que abordam como tema principalmente outros autores mais
renomados como Sérgio Buarque de Hollanda e Joaquim Silva.
José Borges Hermida se apresentou para mim como um dos autores cuja obra
mais circulou pela cidade de Cáceres, como já foi dito pude encontrar alguns
exemplares do seu trabalho na biblioteca universitária, apesar do “pouco estrelato” os
livros produzidos por Hermida estiveram em circulação no Mato Grosso e no Brasil por
mais de 50 anos atravessando diversas conjunturas políticas e sociais vivenciadas pelo
país ao longo dessas cinco décadas, o que torna por si só ainda mais instigante o estudo
da vida e obra desse professor. De acordo com Ribeiro “desde 1945 até seu falecimento,
(…) dedicou a sua vida à produção de livros didáticos de História para o primeiro e
segundo graus” (Ribeiro, 2008, p.56)

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