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OS ESTUDOS SOCIAIS NO BRASIL: DIFERENTES ABORDAGENS

Samara Anselmo de Albuquerque


Graduanda em Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
Integrante do Laboratório de Estudos sobre Geografia Escolar – LABORGEO/UEPB
e do Grupo de Pesquisa Saberes da Educação Geográfica - GPSEG/UEPB
samara.albuquerque@aluno.uepb.edu.br

Ana Carla Ribeiro da Silva


Graduanda em Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
Integrante do Laboratório de Estudos sobre Geografia Escolar – LABORGEO/UEPB
ana.carla.silva@aluno.uepb.edu.br

INTRODUÇÃO

A análise dos Estudos Sociais no Brasil gerou inúmeras leituras e releituras


antecedentes e subsequentes ao golpe militar de 1964, sendo imprescindível destacar que
dito tema não se remete, unicamente, a essa fase marcada pela censura, perseguição, e
omissão integral da democracia. Deste modo, é necessário questionar como a disciplina
de Estudos Sociais, uma proposta inovadora defendida e elencada por diversos
educadores de referência, transformou-se em uma ferramenta opressora contra a liberdade
de expressão e autonomia da sociedade?
Nesta ocasião, por meio da temática em estudo, realizamos uma discussão e
investigação sobre o itinerário histórico dos Estudos Sociais no Brasil por meio de
distintas abordagens, desde a intenção até sua imposição obrigatória nos currículos
escolares do ensino elementar, na década de 1970. Para tanto, este trabalho objetiva
esclarecer de que maneira um inovador projeto educacional e pedagógico foi corrompido
e distorcido para fins políticos e utilizado para alienação em massa da população.
Com isso, mediante o contexto e no transcorrer da análise, indicamos a existência
de diversos estudiosos e especialistas (ISSLER, 1973; NADAI, 1988; MARTINS, 2002;
RESENDE, 2014 e outros) que discutem o itinerário e as proposituras dos Estudos
Sociais. Por sua vez, para concretização da análise proposta, se detemos a um
embasamento teórico através dos apontamentos, características e concepções de diversos

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autores, apresentando suas ideias e as principais dificuldades enfrentadas por tal ensino.
Diante disso, metodologicamente foi construído um diálogo teórico a partir da pesquisa
bibliográfica. Neste teor, o dilema é, os professores estavam capacitados para fazer as
correlações exigidas por esse novo projeto educacional? Assim, diante tantas
perspectivas, procuraremos ao decorrer do texto destrinchar e evidenciar tais
inquietações.

O ITINERÁRIO HISTÓRICO DA DISCIPLINA DE ESTUDOS SOCIAIS

Os Estudos Sociais, têm sua origem no século XX, nos Estados Unidos, estando
assim relacionado a uma tradição pedagógica, cujo paradigma educacional, apoiava-se na
educação centrada na realidade da criança. Outrossim, as primeiras discussões em torno
da sua introdução no currículo escolar brasileiro, foram realizadas sob influências
estadunidenses oriundas da década de 1920, no contexto do movimento da “Escola
Nova”. Sendo assim, oficializada no Brasil com o manifesto dos pioneiros pela educação.
Em analogia à época, o movimento escolanovista objetivava a renovação do
ensino e recriminava a existência, até então, do uso de práticas e/ou metodologias
mnemônicas. Neste contexto, se tinha como principal difusor, entre os anos de 1930 a
1960, o docente do Colégio Pedro II, Carlos Miguel Delgado de Carvalho, respeitável
professor de Geografia e um dos pioneiros na introdução das concepções de Geografia
Moderna no Brasil.
Neste prisma, os Estudos Sociais trata-se de uma disciplina escolar complexa que
engloba diversos eixos, sendo eles de acordo com o autor Delgado de Carvalho (1953),
Geografia, História, Política, Sociologia, Economia e o Civismo, à princípio seu objetivo
era formar um ser social, com base na sua realidade. De acordo com essas perspectivas
(ISSLER, 1973 apud RESENDE FILHO, 2014) expressa que dito ensino haveria de servir
para habilitar e capacitar o sujeito no exercício de seu futuro papel social e trabalhista.
Refletindo sobre o contexto, qual se instalou os primeiros debates sobre a temática
abordada, a historiadora Maria do Carmo Martins (2000, p. 93) explicita:

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Os Estudos Sociais vinham de uma renovação que se processava nos Estados
Unidos dos anos 1930, principalmente intentada por especialistas nas áreas de
currículos, que faziam críticas à excessiva “cientificidade” com que eram
tratados os conteúdos de ensino. Essa cientificidade, associada ao trabalho
acadêmico, denotava o conhecimento de “herança cultural”, dotando os alunos
de erudição.

Dessa maneira, era indispensável para esse ensino, a articulação entre os


conteúdos abordados e a realidade local e/ou prática do discente , tendo em vista um
melhor aproveitamento do saber. Consequentemente, considerando o ensino tradicional
como reles acúmulo de conhecimento, o qual não poderia ser utilizado na vida social do
sujeito, por estar baseado em uma realidade distante. Nesse sentido, Delgado de Carvalho
(1957 apud SANTOS e NASCIMENTO, 2015, p. 150) em seu livro Introdução
Metodológica aos Estudos Sociais expõe:
O abismo existente entre o progresso material da nossa civilização e o atraso
mental do momento é a tragédia do mundo moderno e cada vez irá se
acentuando, se a Educação não preparar os indivíduos para o meio em que
estão chamados a viver.

Como o autor estabeleceu em seu escrito, até então, a matéria estudada não
condizia com a factual vivência do educando, fato que significava uma falha/defasagem
no então ensino. Este ponto negativo foi evidenciado no movimento escolanovista, no
qual o educador foi signatário. Nesta perspectiva, em 1953 Delgado de Carvalho delibera
que a atual educação em alguns países era incapaz de despertar nos alunos a “curiosidade
e seu interesse pelas matérias do secundário, porque eles ministram ensinamentos
tradicionais e antiquadas que não refletem as preocupações e o momento histórico em que

vivemos” (CARVALHO, 1953 apud RESENDE FILHO, 2014, p. 71).


Assim, essa inovação marcava o dever da existência de uma conformidade com o
enredo social do alunado, desaprovando a excessiva “cientificidade” com que eram
tratados os conteúdos de ensino. É essencial salientar, que a implantação dos Estudos
Sociais como disciplina escolar percorreu inúmeras argumentações e sofreu distintas
modificações e/ou atualizações desde a intenção até sua obrigatoriedade.

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Nestes aspectos, os Estudos Sociais foi previamente introduzido no currículo das
escolas elementares do Distrito Federal, na gestão de Anísio Teixeira, enquanto diretor
da Secretaria de Educação e Cultura do local mencionado. O que garantiu grande
disseminação nacional desse novo projeto educacional que baseava nas ideias oriundas
da Escola Nova, cujo a qual trabalhava uma nova visão da educação, desenvolvendo
alterações metodológicas e programáticas nas escolas.
Nesta ocasião, foram prescritos e elaborados diversos materiais didáticos com
intuito de alcançar maior difusão nas práticas escolares. Um desses materiais foi a
publicação em 1934, do “Programa de Ciências Sociais” para as escolas primárias,
desenvolvido por Anísio Teixeira, o maior discípulo brasileiro de John Dewey1, e até
1955, passou por sucessivas edições. Concomitantemente, em 1962, ressurge com
aperfeiçoamentos e publicado pelo MEC (Ministério da Educação) como um dos manuais
da Biblioteca do Professor Brasileiro titulado nesta ocasião por “Estudos sociais na escola
primária” e por orientação e redação de Josephina de Castro e Silva Gaudenzi.
É notório destacar, que o dito termo “Ciências Sociais”, foi a nomenclatura
pioneira do que se conhece na atualidade por Estudos Sociais. Nesse sentido, foi atraente
o emprego da terminologia do programa de 1934, o qual também levou em consideração
que neste período inicial nos Estados Unidos, os Estudos Sociais representavam uma
contribuição das Ciências Sociais. Assim, durante algum período de tempo não houve
distinção entre tais terminologias, sendo assim, utilizadas como sinônimos uma da outra.
No entanto, ao decorrer do tempo se observou a necessidade em diferenciá-las, obrigação
esta que, posteriormente, foi expressa por Carvalho (1970, apud RESENDE FILHO,
2014, p. 70):
As ciências Sociais são ensinadas sobre a forma de Estudos Sociais. De fato,
entre essas duas expressões existe diferença significativas, embora tenha sido,
durante muito tempo indiferentemente usadas. [...] Os Estudos Sociais têm
campos idênticos, pois trata de relações humanas e compreende as mesmas
disciplinas. Mas seu objetivo não é propriamente a investigação, mas sim o
ensino, a vulgarização. O seu propósito não é fazer progredir a ciência, mas

1
Filósofo norte-americano que influenciou educadores de várias partes do mundo, por defender a
democracia e liberdade de pensamento não apenas no âmbito institucional, mas também no interior das
escolas, acreditando pioneiramente na capacidade de pensar dos alunos.

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educar. Sem ser ciência normativa, as Ciências Sociais guia os estudos sociais
e os levam a conclusões práticas, intuitivas e úteis.

Como o autor delibera em seu texto, embora houvesse muita semelhança, não se
podia considerar os Estudos Sociais como Ciência Social, em virtude dos seus campos de
atuação, uma vez que, a primeira destinava-se a produção de conhecimento e a outra a
sua disseminação. Logo em seguida, Delgado foi um dos responsáveis pela construção do
primeiro currículo de Estudos Sociais instituídos no Brasil e afirma no prefácio da edição
do INEP (1955) que os Estudos Sociais se fundamentavam, inicialmente, no estudo das
famílias e da comunidade, para assim, gradativamente, desenvolver a fronteira social do
educando, garantindo um proveitoso aprendizado e o desenvolvimento pessoal, social e
intelectual.
Em sequência, declara que a vida não exige uma divisão indicada entre as
diferentes disciplinas de ensino e sim uma constante ligação que deve ser constantemente
associada à realidade local dos estudantes sendo, justamente, essa inquietação/observação
que levou ao agrupamento dos fatos que formaram o estudo em questão. Neste âmbito, é
conveniente destacar propriamente suas palavras com relação à temática:
Para que a participação do educando nas atividades do grupo seja consciente,
é necessário que haja um hiato, uma posição, uma ruptura entre o livro, o
programa e a vida. Mas a vida que deve refletir o programa não é um quadro
inexpressivo das atividades humanas, uma nomenclatura que requer apenas
memorização: deve ser a vida contemporânea em sua realidade a
complexidade, a vida de trabalho, em casa e na comunidade. A assimilação
necessária dos conhecimentos só será perfeita quando sentido seu interesse, e
a sua utilidade. (INEP, 1955, p. 12 e 13).

Diante desse registro, o programa de Estudos Sociais publicado em 1962, sob o


título de “Estudos sociais na escola primária", é resultado de aprimoramentos, que levou
em consideração o desenvolvimento de várias abordagens, as quais segundo o guia
deveriam partir da realidade dos educandos. Além disso, primordialmente, adaptadas ao
local e suas correspondentes características, tanto os naturais quanto os sociais, tendo em
vista que, os conteúdos distantes não teriam significado para um aprendizado efetivo. Para
tanto, este documento era composto por objetivos, título para cada série que expressam

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uma realidade, instruções sobre o programa e atividades propostas que contemplavam
instrumentos de estudo e a avaliação do trabalho.
Por sua vez, a observação desse material dispõe da mais significativa formulação
dos Estudos Sociais para a escola primária, e certamente, a mais prudente que se avistou
no plano da educação brasileira, em vista da harmonia entre a organização do programa
com o prisma pedagógico. Nestas circunstâncias, tornando os Estudos Sociais uma área
curricular elaborada com base em cinco temas em ordem de complexidade progressiva,
propícias às etapas de desenvolvimento infantil. Estando essas, subdivididas de 1° à 5°
ano, cada qual com sua temática, o “1° A criança em seu novo ambiente”, “2° A
comunidade e o trabalho”, “3° Novas forma de vida e o aproveitamento de recursos
naturais”, “4° A realidade brasileira” e “5° Cidadania fundada no conhecimento da
realidade brasileira”.
Todavia, estes pontos não se vigoram apenas em Geografia, História ou
Educação Cívica e Moral, mas sim em temáticas que exprimem uma realidade,
estabelecendo uma sucessão natural, os quais deveriam ser abordados sem que
acontecesse formulações de conceitos nem decorações de nomenclaturas e informações.
Neste quesito, Issler (1973, p. 216) delibera: “Não basta conhecer os conteúdos, é preciso
ter consciência do que se pretende e onde se quer chegar. A falta dessa consciência
transforma o trabalho em estudo do óbvio, desinteressante e inútil”.
Para este fim, não bastava ter conhecimento teórico e específico, era necessário à
associação desse fim com a consciência do que se pretendia, assim, o ensino deveria
representar para a vida do educando um significado. Diante as finalidades deste programa,
existia uma assídua preocupação com o professor, o qual seria em geral mentor e
mediador desse meio educacional. Nesse viés, são orientadas ações convenientes às
condições da escola primária brasileira, tais como observação dos trajetos locais,
excursões, jogos didáticos, exercícios cartográficos e outros, sendo possível que o docente
adaptasse ao tema sem a perda da qualidade educativa.
Nestes aspectos, mais uma vez, como ocorreu historicamente na
institucionalização de várias ciências, os Estudos Sociais se instalaram, primariamente,

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no seio do ensino elementar, no qual obteve maior flexibilidade diante da renovação.
Enquanto que no ensino secundário, a resistência fez-se visível, levando em consideração
o acúmulo de conhecimento exigido pelo perfil da universidade, na qual vigora os
aspectos tradicionais e mnemônicos em quem apreciava a decoração bestial de
nomenclaturas e conceitos. Particularidades essas, fortemente criticados por Anísio
Teixeira e Delgado de Carvalho, tendo em vista, suas propostas e ideias inovadoras que
se fundamentaram, eventualmente, nas obras de John Dewey, visionário na concepção de
desenvolvimento crítico do educando.
Diante os pressupostos suscitados, os “Estudos Sociais” seria o salvador do
currículo escolar brasileiro, visto que, proporcionaria o desenvolvimento coeso dos
discentes, por meio da utilização de aspectos interdisciplinares para sua projeção.
Todavia, durante certo período da sua estadia em território brasileiro seus objetivos e
propostas foram, consideravelmente, distorcidos para favorecer fins econômicos e
políticos, sendo por sua vez adotado e articulado durante a o Governo Militar para dissipar
seus ideais e alienar a sociedade, oportunizando, convenientemente, seus interesses, tanto
sociais quanto políticos.

A POLÍTICA EDUCACIONAL ADOTADA APÓS 1964

Segundo a autora Elza Nadai (1998), quando observamos os pronunciamentos que


marcam o itinerário de implantação dos Estudos Sociais, é nítido a distinção de discursos,
antes e após o acontecimento de 1964. Vejamos:
Quando examinamos os discursos daqueles que têm marcado a trajetória da
implantação dos Estudos Sociais nas escolas brasileiras, salta aos nossos olhos
uma diferença fundamental: há um discurso que, elaborado por volta de 1930,
se repete, tanto na argumentação utilizada como nas teses defendidas, até a
década de sessenta. Outro discurso completamente diferente surge na década
de setenta. (NADAI, 1988, p. 8).

Neste aspecto, com a ditadura militar e/ou golpe militar, os Estudos Sociais
ganham força e difusão, sendo múltiplas, vezes debatido, até quando na década de 1970
adentra o currículo escolar da educação básica brasileira, de forma obrigatória, pelo

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parecer 853/71, do Conselho Federal de Educação (CFE) de autoria do conselheiro Valnir
Chagas. Esta obrigatoriedade resulta na substituição e fusão de duas disciplinas escolares,
Geografia e História, porém, neste cenário essa junção não adveio do cuidado pedagógico,
mas para fins de alienação e autocontrole.
Com o afastamento de João Goulart e a ascensão do Governo Militar ao poder em
1964, se iniciam as reformas militares, quais vigoraram-se principalmente nos eixos
educacionais, em virtude do alicerce frágil, qual facilmente se poderia distorcer a fins dos
interesses, de quem detinham o poder. Neste contexto de “por ordem” no país, houve
uma preocupação com os ordenamentos das leis e segurança nacional, como também de
políticas para fins de desenvolvimentos econômico e capitalista.
Desde outrora, sabia-se que deveriam ocorrer investimentos educacionais. Porém,
essa iniciativa somente se deu com a Constituição de 1967, todavia com fins de alienação,
a qual, inicialmente, só abrangeu o 1° grau de ensino e a projeção de recursos destinados
à iniciativa privada. Ainda assim, deixando mútua parcela da população desfavorecida à
mercê da falta de ensinamentos e educação.
Desse modo, em 1971 estabeleceu-se a nova educação no Brasil, em que toda
instituição escolar teria que preocupar-se com a educação moral e cívica da sociedade.
Para isto, tal governo vigiava previamente os conteúdos, com intuito de definir quais
disciplinas deveriam abordar. Nesse âmbito, a criticidade que a história apresentava foi
considerada como ameaça para ideologia de segurança nacional e logo substituída pela
concepção anacrônica de fatos históricos, dando ênfase ao ensinamento de datas
comemorativas e destaque aos heróis nacionais. Já na Geografia os temas eram relativos
apenas aos aspectos físicos da terra e seus fenômenos naturais.
Nesse sentido, os Estudos Sociais foram tomando forma nos currículos escolares,
para tal utilizavam estratégias com finalidade de reforçar os ideais do governo. Assim,
seu objetivo era o de vigiar e instruir o cidadão conforme as exigências sociais do estado,
preparando-o para a sociedade. Diante este cenário de constante monitoramento, o autor
Resende Filho (2014, p. 75) expressa:
[...] conforme as orientações e determinações do Governo, o qual por meio da
censura “vigiava” tudo o que se contrapunha a ele, foram ganhando forma de

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uma história meramente voltada a uma concepção conservadora de fatos
históricos e a valorização de se trabalhar datas comemorativas, bem como
destacar apenas fatos que remetessem aos heróis nacionais, segundo o interesse
do Estado Ditatorial. Na Geografia, a intenção foi realçar as perspectivas
territoriais, voltadas para os aspectos físicos, as regiões e estados, ao
planejamento estatal, limitando-se quando da abordagem política e social.

No que tange às considerações do autor, o governo utilizou os Estudos Sociais, de


forma desordenada, uma vez que o articulou para difundir na sociedade sua ideologia.
Neste papel de difusão, a elaboração de livros didáticos com características, conteúdos e
abordagem a dispor de seus interesses foram um dos métodos adotados para dissipar seus
ideais, qual a partir da época de 1970 passou a ocupar uma categoria de destaque, sendo
utilizado como um guia tanto para o professor como para o aluno.
Diante o governo ditatorial qual vigorava a censura, começou-se a atrelar graves
problemas, os quais, posteriormente, levaram à sua queda. Uma destas, está relacionada
aos professores, uma vez que tinham como responsabilidades repassar os conhecimentos
técnicos que não faziam domínio e nem estavam preparados, em virtude, logicamente, de
não abarcar somente sua área de formação, tendo em vista que, ora trataria de Geografia,
ora História e ora debateria os impasses sociais no Brasil.
Nesse sentido, não existiam professores capacitados em ambas as partes das
disciplinas, que lecionassem em diferentes abordagens os conteúdos propostos, visto que
suas distintas formações acadêmicas impossibilitaram a aplicação desejável à qual
almejava o governo. A vista disso, surgem as insatisfações dos docentes ao ministrarem
as aulas, e assim, iniciaram em seu favor movimentos sociais, que buscavam medidas por
parte do estado, a fim da resolução da problemática.
Nestas perspectivas, a autora Elza Nadai (1998, p. 14) enfatiza que tais
movimentos não visava unicamente proteger seus interesses profissionais, em razão da
diminuição do campo de trabalho, mas “passaram a avaliar também o próprio campo de
trabalho e sua atuação como professores de disciplinas específicas, ou seja, de História e
de Geografia”. Ainda perante a concepção governamental de continuar com tal disciplina,
houve a disponibilização de cursos preparatórios de curto prazo, cujo quais tinham o

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intuito de enfim sanar a insatisfação dos educadores e logo os habilitar para as distintas
articulações de conteúdos, em suma a ação amenizou o cenário, porém não os resolveu.
Intrinsecamente, os Estudos Sociais não obtiveram significativo êxito e duraram
curto prazo em relação às outras disciplinas. Mesmo assim, após a revogação dos
currículos escolares, essa ação não se deu de forma imediata, mas, gradativamente. Desse
modo, apenas o Estado de São Paulo pela sua resistência à implementação, foi o primeiro
a restaurar seu currículo escolar, voltando com a História e a Geografia no ensino
secundário em 1978. Apesar disso, vale ressaltar, que mesmo com o aniquilamento no
currículo, a disciplina abolida continuou sendo ensinada em alguns estados brasileiros até
a década de 1990, principalmente, nas séries iniciais, como uma verdadeira contrariedade
à legislação. Exemplares destas circunstâncias foram observadas no estado da Paraíba,
um dos últimos a eliminar, de fato, os Estudos Sociais das práticas de ensino, em virtude,
obviamente, do cenário de obliterações e atrasos sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em síntese, o desígnio de implantar os Estudos Sociais no Brasil, teve como


intuito uma renovação da metodologia de ensino, apoiada no Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova (1932). Assim, as disciplinas com práticas tradicionais, logo foram alvo
de críticas, em virtude do pressuposto de articular os conteúdos abordados à realidade
local e a prática do aluno, projeto o qual provém dos ideais defendidos pelo educador
estadunidense John Dewey. O planejamento era de integrar as disciplinas, porém tal
junção gerou um procedimento de disputas entre os conhecimentos, para evidenciar quais
eram imprescindíveis a adentrar os currículos escolares, juntamente aos Estudos Sociais.
Desse modo, essa disciplina foi encarregada pelo ensino dos fatos históricos, econômicos
e geográficos.
Perante o estudo em questão, faz-se necessário refletir, o objetivo de cada
disciplina e a formação do intelecto que desenvolva o espírito crítico, tendo em vista o
desenvolvimento da capacidade de dedução, criatividade e argumentação lógica, fato este

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que foi filtrado e censurado no que tange os Estudos Sociais no período de ditadura.
Porém, mesmo diante da prudência dos conteúdos e/ou assuntos abordados, percebemos
fendas, as quais constituíram-se os principais embates de militância a favor de retaliações
dos direitos democráticos. Nesse cenário a insatisfação dos docentes tiveram papel
fundamental no declínio desse projeto ditatorial, os quais lutaram fielmente pela queda
desse sistema incrédulo, em que vigorava a repressão daqueles que eram contrários.
Desta forma, concluímos esse trabalho destacando que apesar das protuberâncias
para a edificação do um ensino ativo e significativo, tal disciplina possuía orifícios de
fragilidades em sua elaboração, fato este que a tornava fácil alvo de adaptações e
articulações para os interesses de quem detinham o poder. No mais, é notório destacar
que a passagem dos Estudos Sociais pela educação brasileira, embora revogada dos
currículos escolares, deixou suas marcas, as quais são avistadas, de forma direta e/ou
indiretamente nas práticas de ensino nacionais, especialmente, nas séries iniciais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ISSLER, Bernardo. Os Estudos Sociais no Brasil. In: _____. A Geografia e os Estudos


Sociais. [Doutorado em Geografia] Presidente Prudente: UNESP, 1973. p. 208 – 222.

MARTINS, Maria do Carmo. A História prescrita e disciplinada nos currículos


escolares: quem legitima esses saberes? São Paulo: EDUSF, 2002.

NADAI, Elza. Estudos Sociais no Primeiro Grau. MEC, Revista em Aberto, Brasília, v.
7, n. 37, 1988. Disponível em:
http://portal.inep.gov.br/documents/186968/485895/Estudos+sociais+no+1%C2%BA+g
rau/4e96a598-50ec-491d-ab72-4ce2c50a9f3d?version=1.3. Acesso em: 21 de Julho de
2021.

RESENDE FILHO, Carlos M. Estudos Sociais no Brasil: origem, difusão e


reestruturação. In: ____. Livro didático de Estudos Sociais: um tipo de artefato de
produção cultural marcado por continuidades e resistências aos ideais da Ditadura Militar
(1970 – 1980). Dissertação (Mestrado em Educação) João Pessoa: UFPB, 2013. 2014. p.
65 – 80.

SANTOS, Beatriz Boclin Marques; NASCIMENTO, Thiago Rodrigues. O ensino de


Estudos Sociais no Brasil: da intenção à obrigatoriedade (1930-1970). Revista História

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& Perspectivas, v. 28, n. 53, 2015. Disponível em:
http://www.seer.ufu.br/index.php/historiaperspectivas/article/view/32771. Acesso em:
21 de Julho de 2021.

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