ARTIGO

Integração Educação Odontológica e Sistema Único de

Saúde. Uma revisão da literatura.
Arine Lyra1, Eduardo Melo 1, Cecile Soriano 2, Joselma Cordeiro 2

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi revisar a literatura científica sobre a relação entre educação
odontológica e o Sistema Único de Saúde, enfocando questões envolvidas no processo de adequação
dos cursos de graduação em Odontologia às novas diretrizes curriculares nacionais e ao sistema de
saúde pública brasileira. Para tanto, foram identificados 13 artigos científicos, originários de
periódicos indexados na Biblioteca Virtual de Saúde, independente da data, com abordagem
pertinente ao tema, disponibilizados para leitura e no idioma português. Entre os documentos
primários, as Diretrizes Curriculares Nacionais destacam-se por sinalizar para uma mudança
paradigmática na formação de profissional crítico. Os documentos secundários (artigos científicos)
pesquisados evidenciam as possibilidades e limitações da integração ensino-serviço. Assim, conclui-
se que um currículo desarticulado no qual teoria e prática não está em consonância, inviabilizaram a
integração entre o ensino e o serviço. O trabalho dos conteúdos de forma interdisciplinar é
indispensável para que o egresso se aproprie de conceitos como a integralidade de ações voltadas à
promoção, proteção e a recuperação da saúde, sejam no aspecto individual ou no coletivo. Por outro
lado, a ausência de relatos e cenários onde as novas diretrizes já foram implantadas limitou a análise
dos resultados ora apresentados.

Palavras-chave: Integração Ensino-Serviço. Educação em Odontologia. Sistema Único de Saúde

ABSTRACT

The aim of this study was to review the scientific literature on the relationship between dental
education and the Unified Health System, focusing on issues involved in the adaptation of graduate
courses in Dentistry to the new National Curriculum Guidelines and the Brazilian public health
system. There were 13 papers originating in journals indexed in the Virtual Health Library,
regardless of date, relevant approach to the subject, and available for reading in Portuguese. Among
the primary documents, the National Curriculum Guidelines are noted for signaling to a paradigm
shift in the training of critical professionals. The secondary documents (papers) surveyed show the
possibilities and limitations of the teaching-service integration. Thus, we conclude that a disjointed
curriculum in which theory and practice are not in line, have prevented the integration between
education and service. The contents of the work in an interdisciplinary manner is essential for the
egress to appropriate concepts such as completeness of actions to promote, protect and re store
health, whether in individual or collective aspect. On the other hand, the absence of reports and
scenarios where the new guidelines have been implemented limited the analysis of the results
presented here.

Key Word: Teaching-service integration. Unified Health System

1
Alunos do Curso de Especialização em Gestão em Saúde da Universidade de Pernambuco -UPE / Universidade
Aberta do Brasil-UAB
2 Professoras da Universidade de Pernambuco-UPE - Núcleo Integrado de Saúde Coletiva, Curso de Especialização

em Gestão em Saúde / Universidade Aberta do Brasil-UAB

INTRODUÇÃO
A integração entre a educação na Odontologia e o
Sistema único de Saúde (SUS) – Integração Ensino-
Serviço (IES) - pode ser definida como um trabalho
coletivo, pactuado e integrado que engloba desde
estudantes, professores (que atuam na formação
inicial) e equipes dos serviços de saúde, incluindo
gestores. Esta aliança entre os universitários da
área de saúde e os profissionais que atuam nos
serviços públicos visa produzir um conhecimento
técnico-político e elevar o compromisso social das
instituições formadoras (Albuquerque, 2008; Lima,
2010).
O pilar histórico dessa postura deu-se pela através
da mudança do sistema assistencialista à saúde
para modelo sanitário, o qual evidenciou a
necessidade de reformular o processo de formação
de profissionais e de tornar os serviços públicos de
saúde como um ambiente aberto a entrada e
atuação dos alunos (Saliba et al, 2009 ).
Assim, com a redemocratização do país, ocorrida à
partir da década de 1980, novos rumos foram
propostos para nas políticas públicas, surgindo
sujeitos sociais que discutiam um modelo de
atenção à saúde adequado. Ainda na década de 80,
surge o Movimento por Reforma Sanitária, que
reivindicava a proposta de expansão antes limitada
a assistência médica da previdência e dos seus
contribuintes.
Em 1986, na VIII Conferencia Nacional de Saúde, as
novas propostas foram então sistematizadas e
algumas medidas foram tomadas para viabilizar as
propostas finais. Primeiro, a aprovação do capítulo
da saúde na Constituição da República de 1988 e
das Leis Orgânicas. Em seguida, com a mobilização
da opinião pública e dos setores organizados da
sociedade civil.
Com o advento do Sistema Único de Saúde, no final
dos anos 80, e, mais adiante, com o surgimento do
Programa Saúde da Família em 1994, a abordagem
sanitarista volta-se para uma proposta de inversão
do modelo assistencial que, até então, era técnico-
assistencial e restrito à clientela reduzida, para
uma abordagem com ênfase na atenção básica e
partindo do núcleo familiar, portanto do coletivo
(Saliba et al, 2009 ).
Com base nessas tendências, em 2001, a
Odontologia foi inserida na lógica do Programa
Saúde da Família, com o surgimento das equipes
de saúde bucal e por consequência se instalou a
necessidade urgente de um profissional que
estivesse sendo formado de modo compatível com
esse perfil.
Essa afirmativa se justifica na medida em que,
tradicionalmente, a formação acadêmica das
graduações em Odontologia tem sido voltada para
a prática privada da profissão, e baseada no ensino
estruturado em disciplinas isoladas e
essencialmente clínicas.
O currículo tradicional caracteriza-se por grande
rigidez e desarticulação entre teoria e prática,
fruto da fixação minuciosa de conteúdos
disciplinares, descontextualizados e trabalhados
de forma cartesiana. O que leva os egressos,
quando contratados para atuar em serviços
públicos, a se depararem com uma realidade que
desconhecem técnica, operacional e, sobretudo
socialmente (Albuquerque, 2008; Lima, 2010;
Finkler, Caetano, Ramos, 2011)
Sendo assim, o objetivo desta pesquisa foi revisar a
literatura científica sobre a relação entre educação
odontológica e o SUS, especialmente na Integração
Ensino-Serviço, enfocando questões envolvidas no
processo de adequação dos cursos de graduação
em Odontologia às novas diretrizes curriculares
nacionais e ao sistema de saúde pública brasileira.
METODOLOGIA
Após a delimitação do tema, foi realizada uma
busca eficiente da literatura identificando os
artigos mais relevantes através de bases de
referências bibliográficas disponíveis na Biblioteca
Virtual em Saúde (BVS). Este levantamento
bibliográfico serviu de base para construção de
uma revisão narrativa e crítica dos artigos.
O produto final foi composto de documentos
primários ou oficiais (portarias, leis e normas) e de
documentos secundários (publicações em
periódicos). Tais documentos, coletados
diretamente de fontes presentes na base de dados,
foram detectados a partir da inserção das palavras
“Integração Ensino Serviço” no campo de busca e
descritores “educação em Odontologia” e “Sistema
Único de Saúde”, sendo posteriormente
selecionadas apenas as referências que
preencheram os seguintes critérios de inclusão:
pertinência ao tema, disponibilização do material
na íntegra para leitura e cujo idioma fosse o
português.
Depois de identificados, selecionados e coletados,
os artigos julgados relevantes foram avaliados
criticamente, questionados quanto a sua
2
correlação direta com o assunto, aos objetivos a
que se propuseram ao tipo de estudo, aos
resultados alcançados e as conclusões que os
autores obtiveram.
Deve-se salientar que a estratégia de busca
adotada por esta pesquisa objetivou um equilíbrio
entre sensibilidade (uma busca suficientemente
ampla que evite a exclusão de artigos relevantes,
mas que recuperassem alguns não relevantes) e
especificidade (uma busca tão restrita que pudesse
excluir artigos relevantes).
RESULTADOS e DISCUSSÃO
Ao todo, 13 artigos preencheram os critérios de
inclusão deste estudo.
DOCUMENTOS PRIMÁRIOS
Desde 2002, encontra-se em vigência as Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCNs) dos Cursos de
Graduação em Odontologia.
As DCN se constituíram em uma conquista dos
grupos historicamente ligados aos movimentos de
mudança na educação superior para a área da
saúde (Werneck et al, 2010; Finkler, Caetano,
Ramos, 2011)
Estas diretrizes devem fundamentar o
planejamento do curso, na graduação, as quais
sinalizam para uma mudança paradigmática na
formação de um profissional crítico, com
capacidade de:
 —Aprender a conhecer;
 —Aprender a trabalhar em equipe;
 —Aprender a levar em conta a realidade
social.
Neste documento, destacam-se os seguintes artigos
que pretendem potencializar esta integração entre
o pensar, o agir e o transformar:
—Art. 3º - O Curso de Graduação em
Odontologia tem como perfil do formando
egresso/profissional o Cirurgião Dentista, com
formação generalista, humanista, crítica e
reflexiva, para atuar em todos os níveis de
atenção à saúde, com base no rigor técnico e
científico.
—Art. 4º - Atenção à saúde: os profissionais de
saúde, dentro de seu âmbito profissional,
devem estar aptos a desenvolver ações de
prevenção, promoção, proteção e reabilitação
da saúde, tanto em nível individual quanto
coletivo. Sendo capaz de pensar criticamente,
de analisar os problemas da sociedade e de
procurar soluções para os mesmos.
Uma estratégia pedagógica interessante para a
aprendizagem significativa é utilizar a pesquisa.
Assim, podem-se aplicar os conhecimentos
adquiridos durante as aulas. Neste sentido, Lima
(2010), utilizou-se dos conhecimentos da
estatística e a epidemiologia, em articulação na
pesquisa para o delineamento até a análise de
desenhos epidemiológicos. Assim, espera-se a
aproximação entre os acadêmicos e a comunidade,
visando torná-los conhecedores das condições
sociais, ambientais e de morbimortalidade da
população local.
Outro objetivo que pode ser alcançado com
estratégias pedagógicas que sejam centradas na
articulação entre o ensino e a prática no serviço, é
ativar a capacidade intelectual e científica dos
acadêmicos (desenvolvimento do senso crítico).
DOCUMENTOS SECUNDÁRIOS - POSSIBILIDADES
Dentre a literatura analisada, destacam-se as
seguintes possibilidades (Pereira; Fracolli, 2004;
Demarzo et al., 2009; Werneck et al, 2010; Finkler,
Caetano, Ramos, 2011):
 Parceria institucionalizada entre a instituição
de ensino e o serviço assistencial
 Formação de profissionais críticos, capazes
de aprender a aprender, trabalhar em equipe,
levar em conta a realidade social para prestar
atenção humana e de qualidade;
 As múltiplas faces de uma sociedade são
reveladas, dialeticamente, através do
encontro dos alunos com o mundo do
trabalho que ocorre no espaço dos serviços
públicos;
 Transformação do modelo de atenção,
fortalecendo a promoção e a prevenção,
oferecendo atenção integral e fortalecendo a
autonomia dos sujeitos na produção da
saúde;
 Estabelecer diretrizes para a elaboração de
projetos políticos pedagógicos que
contemplem o desenvolvimento de
competências em territorialização,
abordagem centrada na pessoa, práticas de
educação em saúde, trabalho em equipe
interdisciplinar, gestão e planejamento, e
avaliação formativa.
 E, como pode ser operacionalizada esta
formação profissional? Segundo a ABENO, a
formação profissionalizante deverá ser
adequada às realidades em que atuará o
profissional e com espírito crítico e aberto
para eventual absorção de tecnologias, sem
ênfase apenas para tecnologias sofisticadas.
3
Também, indica que o ensino técnico objetivará
competências e destrezas necessárias ao exercício
profissional. A clínica por disciplinas poderá ter
seu lugar, mas haverá ênfase de ensino em clínica
integral, em clínica odontológica, clínica
extramuros na região e fora da região, serviço de
urgência e clínica de férias.
DOCUMENTOS SECUNDÁRIOS - LIMITAÇÕES
Dentre algumas dificuldades, observa-se que, em
que se pesem as reformas universitárias, há ainda
uma característica de produção de conhecimentos
teóricos e metodológicos na universidade. Nos
serviços, as atividades são centradas nos
procedimentos técnico-operativos.
A inserção do estudante então, que se configura,
muitas vezes, em estágios curriculares
supervisionados, acontece de forma que não são
exploradas discussões acerca do cotidiano
vivenciado.
Em alguns casos, a supervisão e a precepção são
solitárias, focando apenas no cotidiano burocrático
(presenças, atas, notas). Desta forma, o usuário,
inclusive, fica marginalizado do processo que
envolve o cuidado e o ensino-aprendizagem
(Werneck et al 2010; Pereira et al, 2009).
É preciso que o compromisso e a decisão de fazer
parte do processo sejam institucionais, e não
somente dos atores isolados. Ou seja, o desafio é
coletivo, estabelecendo-se atribuições, direitos e
deveres de cada esfera envolvida – centros
formadores, gestão, serviços de saúde e
comunidade, objetivando-se atender às
necessidades da formação e da atenção à saúde das
pessoas e comunidades com excelência e
humanização (Demarzo et al., 2009; Saliba et al,
2009).
No sentido de estimular alianças entre as
universidades e os serviços de saúde,
possibilitando um ensino mais próximo da
realidade, o Ministério da Saúde e o Ministério da
Educação propõem projetos com foco no
fortalecimento do SUS (Pereira et al, 2009).
Redirecionar a formação de profissionais fortalece
as políticas públicas de saúde. Assim, programas e
projetos públicos têm sido criados com a
finalidade de possibilitar que o ensino tenha a
lógica da construção do conhecimento a partir da
realidade e na participação ativa do estudante no
processo ensino-aprendizagem, bem como no seu
envolvimento com a transformação da mesma
(Pereira e Fracolli, 2004; Albuquerque, 2008).
Destacam-se o Programa de Incentivo à Mudança
Curricular nos Cursos de Graduação em Medicina
(Promed), em 2002; o projeto Vivências e Estágios
na Realidade do Sistema Único de Saúde do Brasil
(VER-SUS/Brasil), em 2004; o Programa Nacional
de Reorientação da Formação Profissional em
Saúde (Pró-Saúde), em 2005, e o Programa de
Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde),
em 2010 (Pereira e Fracolli, 2004).
Mesmo considerando que estas estratégias estejam
proporcionando avanços significativos,
especialmente na Enfermagem e na Medicina, em
relação à Odontologia, percebe-se um atraso
histórico nestes movimentos de mudança (Finkler,
Caetano, Ramos, 2011)
Acredita-se que, a mudança no processo de
formação destes profissionais possibilitará uma
mudança no modelo de formação tradicional, e
também, alterará os processos de trabalho na
saúde pública. Afinal, o modelo pedagógico
tradicional encontra-se esgotado e não mais
condizente com a mudança necessária para a
formação inicial de um profissional que venha a
atuar no Sistema Único de Saúde.
CONCLUSÃO
Os artigos pesquisados deixaram claro que um
currículo desarticulado no qual teoria e prática
não estão em consonância, inviabilizaram a
integração entre o ensino e o serviço. O trabalho
dos conteúdos de forma interdisciplinar é
indispensável para que o egresso se aproprie de
conceitos como a integralidade de ações voltadas à
promoção, proteção e a recuperação da saúde,
sejam no aspecto individual ou no coletivo. Por
outro lado, a ausência de relatos e cenários onde as
novas diretrizes já foram implantadas limitou a
análise dos resultados ora apresentados.
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4
FINKLER, M.; CAETANO, J.C.; RAMOS, F.R.S. Teaching-
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