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TUDO QUE

VOCÊ PRECISA
SABER SOBRE A
MAIORIDADE
PENAL
Politize!
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INTRO
DUÇÃO sileira. Como ponto de partida,
você vai ficar por dentro do regime
propostas de mudança em relação
à maioridade penal além da PEC
jurídico da maioridade penal 171. São pelo menos cinco, cada
como ele é hoje e suas origens uma buscando enfatizar algum
Ao longo de 2015, a questão da históricas. Depois, vamos tratar problema que a legislação atual
maioridade penal foi um dos um pouco sobre como funciona a não dá conta de resolver. Você verá
pontos de maior movimentação e maioridade penal em outros a descrição das propostas e as
polêmica no Congresso Nacional. países e o que podemos aprender críticas a ela. Finalmente, vamos
A PEC 171/93, que propõe a com esses sistemas. Traremos apresentar os principais argumen-
redução da maioridade penal de também esclarecimentos sobre a tos de quem é a favor da redução
18 para 16 anos em casos de diferença do regime de centros de da maioridade penal (não
crimes hediondos, foi levada ao internação de adolescentes em importando exatamente qual a
Plenário na Câmara, onde foi relação ao sistema prisional bra- proposta envolvida, mas a redução
aprovada em dois turnos. sileiro destinado aos adultos. O em si) e quem defende a ma-
Este e-book tem como objetivo que mudaria para o jovem de 16 ou nutenção da maioridade aos 18
trazer todas as informações perti- 17 anos ao ser transferido de um anos, com a aplicação do ECA
nentes sobre esse debate tão sistema para outro? Você também àqueles com idade inferior a isso.
importante para a sociedade bra- vai descobrir que existem outras

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COMO O BRASIL LIDA COM OS
MENORES DE IDADE ATUALMENTE?
Nesta primeira seção, o Politize Antes de mergulhar de cabeça no tema, vamos entender a
vai esclarecer como o Brasil julga crimes com- diferença entre maioridade penal e responsabilidade
etidos por menores de idade, quais os penal. São parecidos, mas são coisas diferentes!
princípios que guiam o procedimento legal
para esses jovens e como isso pode mudar MAIORIDADE PENAL
com a aprovação da PEC 171/93.
A maioridade penal se refere à idade em que a pessoa
passa a ter responder criminalmente como um adulto, ou
seja, quando ele passa a responder ao Código Penal.

RESPONSABILIDADE PENAL
Já a responsabilidade penal pode ser atribuída a jovens
com idade inferior à da maioridade penal. Para essa
responsabilidade, muitos países também costumam
atribuir uma idade mínima. Assim, um menor de idade
pode ter responsabilidade penal, mesmo sofrendo penas
diferenciadas. São criados dois sistemas:um para jovens,
baseado na responsabilidade penal juvenil; e outro para
adultos, baseado na responsabilidade penal de adultos.

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OK, AGORA VAMOS LÁ:
A MAIORIDADE PENAL
NO BRASIL
A maioridade penal a partir dos 18 anos está estabelecida na Con-
stituição de 1988, no artigo 228, que afirma que os menores de
Mesmo assim, essa inimputabili- idade são inimputáveis e estão sujeitos a norma especial. Mas por
dade (mas que palavrão é esse? que 18 anos, e não qualquer outra idade? Isso tem a ver com a
Veja a definição completa desse chamada doutrina da proteção integral, uma diretriz internacional
juridiquês no nosso dicionário) criada a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Cri-
existe apenas do ponto de vista ança, adotada pela Organização das Nações Unidas em 1989.
do Código Penal, porque, de fato,
a partir dos 12 anos, um adoles- Apesar de que a convenção não determina qual idade deve ser
cente que cometer uma infração escolhida para a maioridade penal, ela define como criança todo
será responsabilizado por seus ser humano com menos de 18 anos de idade. O Brasil e quase
atos. A diferença é que a punição todos os países do mundo são signatários desse tratado e grande
para esse adolescente é mais leve parte deles baseia seu sistema penal para jovens a partir dessa con-
e de outra natureza que a da venção.
punição para um adulto. Entendi- A doutrina da proteção integral aparece mais claramente no artigo
do? 227 da Constituição, que fala sobre a obrigação da família, da socie-
dade e do Estado de assegurar, com prioridade absoluta, à criança,
ao adolescente e ao jovem os seus direitos fundamentais. Por tudo
isso, antes de completar 18 anos de idade, uma pessoa não pode ser
responsabilizada como um adulto no Brasil.

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E QUAL A NORMA
ESPECIAL DEDICADA AOS
MENORES DE 18 ANOS?

Essa norma é o Estatuto da Cri- Como esse estatuto está baseado no que rege a Constitu-
ança e do Adolescente (ECA). O ição, o seu objetivo é que os jovens sejam protegidos e
ECA foi promulgado em 1990 e é tenham seus direitos garantidos. Por isso, a lógica dele é
o instrumento legal que consolida diferente do Código Penal, que tem como objetivo esta-
as garantias da Constituição aos belecer punições adequadas para os vários tipos de crime.
jovens. Ele garante vários direitos O ECA tem um caráter protetivo e pedagógico. As medi-
para crianças e adolescentes, das do ECA prezam pela educação do jovem, e não pela
como direito à saúde, à educação, punição.
à liberdade, entre outros. Além
disso, ele determina as medidas Até a linguagem adotada pelo Estatuto muda em relação
que devem ser tomadas quando o ao Código Penal: o ECA não fala de crimes, e sim de
adolescente comete alguma infrações; também não menciona penas, e sim medidas
infração. socioeducativas.

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PARA QUEM VALEM AS
MEDIDAS DO ECA E O
QUE ELE PREVÊ PARA OS
MENORES INFRATORES?
As medidas socioeducativas do ECA Caso seja julgado culpado, o menor pode ser submetido a
(descritas dos artigos 112 ao 125) são seis tipos diferentes de medidas socioeducativas, segundo
aplicadas para jovens que já têm idade o ECA:
para serem responsabilizados por uma
infração, ou seja, adolescentes com ADVERTÊNCIA
12 anos a 17 anos de idade. OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO CAUSADO
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
Quando um menor de idade é pego LIBERDADE ASSISTIDA
participando de qualquer tipo de
SEMILIBERDADE
crime, ele fica detido por no máximo
45 dias, que é o tempo que o Juiz da INTERNAÇÃO
Infância e da Juventude tem para se
posicionar sobre o caso. As medidas são aplicadas de acordo com a gravidade do
crime cometido. Na hipótese de internação, os menores
infratores ficam no máximo por três anos em centros de
recuperação.

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O QUE PODE MUDAR?


CONHEÇA A PEC 171/93

Agora você já conhece o ECA e todos os princípios que


norteiam a maioridade penal atualmente no Brasil.
Como veremos nesta seção, há muito tempo existe
quem discorde desse regime, entendendo que mesmo
menores de 18 anos devem ser punidos por seus atos.
Em 1993, o deputado federal Benedito Domingos
elaborou a PEC 171, que propõe reduzir a maioridade
penal de 18 anos para 16. A proposta veio apenas três Politize!
anos após a aprovação do Estatuto da Criança e do Ado-
lescente.

Ex-deputado Benedito Domingos.

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Tramitação
A PEC estabelece que os maiores de 16
anos que cometam crimes hediondos
passem a ser julgados de acordo com o
Código Penal (ou seja, podem ser sujeitos
às mesmas penas dos adultos). Alguns
exemplos de crimes hediondos são:
homicídio qualificado, estupro, extorsão e
latrocínio. Assim, nesses casos específi-
cos, o adolescente perde o direito ao trat-
amento diferenciado do ECA, sendo
julgado e condenado como um adulto.
Para os demais crimes, tudo continua Vinte e três anos depois, a PEC nunca esteve tão
como antes: menores de 18 anos não próxima de ser aprovada. Com o apoio do Presi-
estarão sujeitos ao Código Penal, e sim ao dente da Câmara, Eduardo Cunha, ela foi coloca-
ECA. da em análise na Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania (CCJ). Na Comissão, a PEC
resistiu ao argumento de que a maioridade penal
aos 18 anos, prevista no artigo 228 da Constitu-
ição, é cláusula pétrea, e teve sua constitucionali-
dade aprovada.

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Depois disso, ela foi levada a uma comissão Agora, a PEC segue para o Senado, onde
especial, criada apenas para analisar a deverá enfrentar resistência da maior parte
proposta. Nela, ela também foi aprovada, dos senadores. Isso porque já existe naquela
por 21 votos a 6. Com isso, ela foi levada ao casa outra proposta a respeito da maiori-
Plenário da Câmara, onde precisava de três dade penal em análise: o Projeto de Lei 333
quintos dos votos dos deputados para ser de 2015, que tem duas principais provisões
aprovada (aprenda mais sobre as PECs aqui). para o temas. A primeira é agravar a pena de
Foi rejeitada na primeira votação, por uma adultos que aliciam menores de idade para o
margem apertada. Entretanto, graças a uma crime. A segunda é aumentar o tempo
manobra de Eduardo Cunha, presidente da máximo de internação de três para dez anos.
Câmara, voltou a ser colocada em pauta no Dessa forma, o Senado demonstra que não
dia seguinte, quando conseguiu os 20 votos é favorável a reduzir a maioridade penal, e
restantes e foi aprovada no primeiro turno. sim mudar a legislação atual para inibir o
Algumas semanas depois, foi levada ao aliciamento de menores e tornar mais efeti-
segundo turno e novamente conseguiu os vas as medidas previstas pelo ECA.
três quintos requeridos.

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O CAMINHO PARA A APROVAÇÃO

Despachado para
a Comissão de Aprovada pela
PEC 171, Recebido pelo
Constituição, CCJ e despachado
apresentada à presidente da
Cidadania e para Comissão
Câmara Câmara
Justiça (CCJ) da Especial
Câmara

Promulgação e Aprovada pela


publicação → não Comissão Especial
precisa de sanção
presidencial

Plenário do Segundo turno da Primeiro turno da


Aprovação no Senado: votação votação em votação no
plenário do em dois turnos plenário (aprovado Plenário da
Senado (três quintos dos novamente com Câmara (aprovado
votos necessários) mais de três quin- com mais de três
tos dos votos) quintos dos votos)
+ 3/5
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OS CENTROS DE INTERNAÇÃO
AJUDAM NA REABILITAÇÃO
DOS JOVENS INFRATORES?
Atualmente, os menores de 18 anos que tenham
cometido infrações graves são encaminhados para
Centros de Internação, conforme previsto no Estatu-
to da Criança e do Adolescente. Os mais conhecidos
desses centros são as Fundações CASA (Centro de
Atendimento Socioeducativo ao Adolescente),
adotadas no estado de São Paulo.

Com a proposta da PEC 171/93, passaria a existir a


possibilidade de todos os adolescentes com 16 anos
completos serem condenados a penas de adultos, de-
pendendo da gravidade do crime que tivesse sido
cometido (crimes hediondos seriam punidos dessa
forma). Mas qual seria a diferença entre internar o
jovem em um centro socioeducativo e prendê-lo com
os adultos? Veja aqui o que pode mudar na rotina de
um jovem infrator caso a PEC 171/93 seja aprovada
definitivamente.

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CENTROS DE INTERNAÇÃO:
COMO DEVERIAM SER
O ECA prevê que os centros de telectual e moral de pessoas nação, além de estabelecer
internação ofereçam atividades que ainda estão em fase de for- penas para funcionários que
de cunho pedagógico. Isso mação de sua identidade e de cometem maus tratos contra
inclui oferecer educação esco- seu caráter. eles.
lar formal, educação profission-
al, educação física e esportes e Os primeiros centros de inter- Mas os problemas não aca-
atividades envolvendo arte e nação voltados para menores baram com o ECA. Ao longo dos
cultura. Esse é, ou deveria ser, o criminosos surgiu em 1976. anos, casos de violência aos
maior diferencial de centros de Esses centros, que recebiam o internos e o completo descaso
internação em relação aos nome de Febem (Fundação do poder público com esses
presídios para adultos. Existem Estadual para o Bem Estar do centros continuaram a apare-
casos de sucesso, como centros Menor), eram palco de rebe- cer. O caso mais emblemático
de internação em São Paulo e liões e manifestações violentas foi o de São Paulo, que abrigava
no Pará, em que são desenvolvi- dos internos e de inúmeras (e ainda abriga) o maior número
das atividades como oficinas de denúncias de violência. O ECA, de internos do país. Eram fre-
rap e de artesanato. Nesses lug- lei criada em 1990, surgiu em quentes as denúncias de maus
ares, são raros os registros de resposta a esse problema, tratos aos internos do estado, o
rebeliões e de violência. O siste- procurando garantir os direitos que certamente tinha relação
ma de internação proposto pelo dos internos, como acesso a ed- com as frequentes rebeliões:
ECA foi pensado de modo a ucação, lazer e atividades físi- apenas no ano de 2003, foram
garantir o desenvolvimento in- cas dentro dos centros de inter registradas 80 delas em

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CENTROS DE INTERNAÇÃO:
COMO DEVERIAM SER

unidades da Febem em São de 2006, descentralizou as uni-


Paulo. Foi nesse estado em que dades, mudou a administração
se adotaram estratégias repres- e alterou até mesmo o nome da
sivas, como a criação do Cho- instituição, que passou a ser
quinho, que utilizava métodos chamada de Fundação CASA.
da tropa de choque para des- Foram fechados grandes com-
mantelar rebeliões, e o desloca- plexos de internação de meno-
mento de uma tropa de choque res e abertas dezenas de uni-
que era especialmente aciona- dades pequenas, com capaci-
da nas prisões de adultos. dade máxima de 56 internos.
Ambos os grupos foram acusa- Hoje em dia, São Paulo conta
dos de cometerem atrocidades, com a maior estrutura para
como atirar balas de borracha a menores infratores do país: são
queima roupa em internos. 115 unidades e quase 8 mil de-
tentos.
O governo paulista precisou
repensar a estratégia para os
centros de internação. A partir

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OS PROBLEMAS ATUAIS
DOS CENTROS DE INTERNAÇÃO

Infelizmente, na prática nem cularmente dramática nas uni- Goiás, onde foram registradas
sempre os centros funcionam dades do Nordeste. Em 2014, três mortes dentro de centros de
em conformidade com o ECA. A foram registrados mais de 4 mil internação em 2015. É mais
falta de estrutura e investimen- detentos, para uma estrutura uma unidade da federação em
tos torna esses lugares obsole- que abriga no máximo 2.360 que esses centros estão super-
tos, considerados por fun- pessoas. No Rio de Janeiro, o lotados.
cionários e autoridades como sistema de internação de jovens
verdadeiros “depósitos” de opera com 80% da capacidade. Em São Paulo, as denúncias de
menores infratores. maus-tratos dentro das
Como se pode imaginar, ainda Fundações não cessaram, prin-
Alguns problemas de décadas existem motins e violência cipalmente nas unidades
passadas parecem não mudar nesses centros, apesar de que maiores, como a Raposo Tava-
com o passar do tempo. Pesqui- ocorrem em menor número, res, de onde alguns funcionári-
sas mostram que os centros de segundo as estatísticas oficiais. os foram afastados por serem
internação estão lotados em Casos que ganharam o not- acusados de tortura e agressão,
todo o país. A situação é parti- iciário recentemente vêm de no ano de 2015. São muitos os

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OS PROBLEMAS ATUAIS
DOS CENTROS DE INTERNAÇÃO

relatos de violência, medicação excessiva de Tudo isso faz muita gente considerar que o ECA, na
alguns internos e do uso de punições abusivas: um prática, é letra morta, já que na maioria dos casos
exemplo é a “tranca”, que é o castigo em que os de- ele não é cumprido integralmente pelos centros de
tentos são isolados em alguma sala e ficam por internação. Os detentos, na grande maioria dos
dias sem ver o sol. casos, continuam a se sentir como animais, tratados
da pior maneira possível pelos funcionários. Além
É discutível se as internações são efetivas na disso, a maior parte dos centros carece de estrutu-
diminuição da violência entre jovens. No caso de ra para oferecer atividades adequadas no tempo
São Paulo, os dados sobre a reincidência têm mel- livre. A falta do que fazer nesses espaços é uma das
horado: em 2006, estrava em 29%; em 2011, grandes reclamações dos detentos.
chegou a 13%. Entretanto, não se sabe quantos
ex-internados vão parar nas penitenciárias.

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COMO FUNCIONA LÁ FORA?
CONHEÇA ALGUNS SISTEMAS
ALTERNATIVOS DE PUNIÇÃO DE JOVENS
A maioria dos países adota a maioridade penal aos saber mais, preparamos uma tabela comparando as
18 anos, seguindo a Convenção dos Direitos da Cri- idades de responsabilidade juvenil e a responsabili-
ança. Mas ainda encontramos uma diversidade bem dade de adulto em vários países. Veja na tabela a
grande mundo afora, de modo que existe uma seguir:
variação dessa idade entre 12 e 21 anos. Para você

PAÍSES RESPONSABILIDADE COMO FUNCIONA


PENAL

JUVENIL: 14 A Alemanha já testou a redução da maioridade penal para 16 anos,


ALEMANHA
DE ADULTOS: 18 - 21 mas acabou voltando atrás. Hoje em dia, ela começa aos 18 anos.
Mas adolescentes com 14 anos ou mais já possuem responsabilidade
penal juvenil - como vimos no início deste e-book, essa responsabili-
dade implica em punições diferenciadas, tais quais as medidas pre-
vistas no ECA. Mas há ainda outra diferença no sistema alemão: é que
lá existe um sistema de jovens adultos, do qual podem participar
jovens com idade entre 18 e 21 anos. Dependendo do nível de dis-
cernimento do jovem, ele pode ser julgado pela lei juvenil, mesmo já
nessa faixa etária. Vários países adotam esse tipo de sistema, com
variação nas idades estabelecidas. Ao mesmo tempo, um jovem de 14
anos que tenha cometido um crime grave e que demonstre con-
sciência do que fez também pode ser preso como adulto.

ESTADOS JUVENIL: 6 - 12 Cada estado americano possui legislação própria para julgar suas cri-
UNIDOS DE ADULTOS: 12 - 16 anças e adolescentes. Ao lado da Somália, é o único país que não rat-
( varia por estado ) ificou a Convenção dos Direitos da Criança de 1989 da ONU. São
poucos os estados em que há uma idade que determina a maioridade
penal. Em muitos casos, crianças com menos de 10 anos de idade, de-
pendendo da gravidade do crime e de seu grau de discernimento,
podem pegar até mesmo prisão perpétua.

IRÃ JUVENIL: É um caso peculiar, já que meninas começam a ser responsabilizadas


9 (meninas) a partir dos 9 anos, enquanto os meninos são responsabilizados a
15 (meninos) partir dos 15. As crianças podem ser condenadas até mesmo à pena
de morte, mas por pressão internacional, o governo iraniano tem
abandonado essa prática. Muitas vezes, porém, as crianças ficam
presas até os 18 anos e então são mortas.

NOVA ZELÂNDIA JUVENIL: 10 Considerado um dos países mais seguros do mundo, a Nova Zelândia
DE ADULTOS: 17 estabelece a responsabilidade penal juvenil a partir dos 10 anos.
Pode-se dizer que a maioridade penal se inicia aos 17 anos, mas antes
disso há hipóteses em que o adolescente pode ser condenado. Fun-
ciona assim: entre 10 e 13 anos, os jovens são considerados crianças
(children) e presume-se que são incapazes de cometer crimes (o que
pode ser refutado). Crianças nessa faixa etária podem ser processa-
dos apenas por homicídio doloso ou culposo. A partir dos 14 anos, são
tratados como jovens (youth) e podem ser processados por quase
qualquer crime, mas via de regra são julgados na justiça juvenil.

PORTUGAL JUVENIL: 12 A responsabilidade juvenil começa aos 12 anos. Pode-se dizer que a
DE ADULTOS: 16 - 21 maioridade penal começa aos 16, mas os jovens entre 16 e 21 são sub-
metidos a um regime penal especial (semelhante ao sistema de
jovens adultos alemão).

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AS PROPOSTAS PARA ENCARAR A


CRIMINALIDADE ENTRE MENORES

Entre manter a maioridade penal como ela é Como responder a essa questão de uma maneira mais
hoje e reduzi-la para 16 anos em qualquer caso, inteligente? O foco principal, segundo especialistas,
existe uma série de propostas distintas que deve ser separar jovens que cometem crimes graves de
tentam mitigar os efeitos colaterais dessas duas jovens que cometem crimes leves. É quase consensual
opções. Manter a maioridade penal aos 18 anos, que punições mais graves para adolescentes que come-
critica-se, significa não trazer resposta aos tem latrocínio, por exemplo, devem existir, mas isso não
vários casos de crimes graves cometidos por pode afetar aqueles que cometem delitos menores.
adolescentes de 16 e 17 anos que não se assus-
tam com as medidas previstas pelo Estatuto da Pensando nessas questões, apresentamos cinco
Criança e do Adolescente (ECA). Por outro lado, propostas alternativas para a questão da maioridade
reduzir abruptamente a maioridade para 16 penal, que você confere agora com a gente, apresenta-
anos acarretaria graves consequências, colocan- das pela revista Época. Todas elas já foram apresentadas
do adolescentes em convívio direto com adultos em algum momento ao Congresso, mas não chegaram
criminosos e potencializando sua periculosidade tão longe na tramitação quanto a PEC 171/93.
no futuro.

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1. ACOMPANHAMENTO OBRIGATÓRIO PARA


CRIMES CONTRA A VIDA E LATROCÍNIOS

O QUE Sem reduzir a maioridade, essa


proposta alteraria o ECA, que passaria
custódia da instituição por um tempo
maior: após três anos de internação,
MUDA a prever um regime mais prolongado
de acompanhamento de jovens que
passaria para o regime de liberdade
semi-assistida; depois de três anos
cometeram crimes contra a vida e nesse regime, ficaria em regime de
latrocínios. Atualmente, um adoles- liberdade assistida. Assim, a super-
cente pode ficar no máximo três anos visão desse jovem se prolongaria por
internado em uma Fundação Casa; no mais tempo, evitando casos em que
modelo proposto pelo advogado Ariel um jovem que cometeu um delito
de Castro Alves, um adolescente com grave seja solto aos 21 anos sem
mais de 14 anos que tenha cometido qualquer monitoramento.
essa modalidade de crime ficaria sob

CRÍTI Ampliação das vagas por conta da


liberdade semi-assistida. Maior em-
acompanhamento no remi semiaber-
to, enquanto o infrator finge que está
CAS penho dos municípios: atualmente, a
maioria deles finge que cumpre o
no programa.

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2. MAIOR TEMPO DE INTERNAÇÃO


PARA CRIMES GRAVES

O QUE Sem reduzir a maioridade, ado-


lescentes reincidentes em CRÍTI Na prática, a proposta aumenta
custos. Como os infratores
MUDA infrações graves poderiam ficar
internados por mais tempo. O CAS passam mais tempo presos, é
preciso ampliar as unidades de
ECA seria alterado para permitir internação existentes, exigindo
que o jovem ficasse internado investimento. Também não fica
até depois dos 21 anos de idade. claro como seriam essas novas
Novas instalações para esses unidades, que passariam a abri-
internados seriam criadas, com gar infratores mais velhos:
cursos técnicos e possibilidade seriam mais parecidas com
de trabalhar. Atualmente, existe presídios ou com casas de inter-
um projeto de lei que procura nação?
ampliar o tempo máximo de
internação de três para dez anos.

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3. RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL DO MENOR


O QUE Essa proposta não reduziria a maiori-
dade penal, mas traria responsabili-
A responsabilização se daria após
avaliação psicológica do menor por
MUDA dade criminal para adolescentes
maiores de 12 anos que cometessem
uma junta médica. Outra diferença
seria que, caso a pessoa voltasse a
homicídio, latrocínio, estupro, assalto cometer crimes após completar 18
a mão armada e sequestro. A pena anos, sua ficha como menor poderia
aplicada seria igual a um terço ou dois ser resgatada, de modo que ela pode-
terços da aplicada a um adulto e seria ria ser julgada como reincidente, o
cumprida em casas de internação. que não acontece hoje.

CRÍTI A junta representaria um novo custo,


novas vagas de internação teriam de
CAS ser criadas, o que implica em novos
investimentos.

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4. REDUÇÃO DA MAIORIDADE PARA CRIME


HEDIONDO COM CONSTRUÇÃO DE
NOVOS CENTROS

O QUE A proposta reduz a maioridade


para 16 anos em caso de crimes CRÍTI A proposta também cria novos
custos; não se especifica como
MUDA hediondos. O adolescente seria
julgado pela lei penal caso fosse CAS seriam essas novas unidades.
comprovada sua capacidade de
discernimento. Mas a pena seria
cumprida em novos centros,
especializados para presos
dessa faixa etária.

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5. REDUÇÃO DA MAIORIDADE PARA CRIMES


HEDIONDOS E USO DAS CADEIAS EXISTENTES

O QUE a maioridade seria reduzida para


16 anos em caso de crimes hedi- CRÍTI Hoje em dia não existem as men-
cionadas unidades de maior
MUDA ondos, e o adolescente nessa
faixa etária seria julgado de CAS segurança, o que demandaria
mais recursos. Com a trans-
acordo com a lei comum. Entre- ferência do infrator para a
tanto, o menor iniciaria a pena cadeia aos 18 anos, o trabalho
em uma casa de internação, em de ressocialização seria inter-
unidade de maior segurança, e rompido e ficaria prejudicado.
seria transferido para a prisão
comum aos 18 anos.

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OS ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRA


A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Com todas essas informações em mente, A FAVOR DA REDUÇÃO
chegou a hora de debater: por que ser contra ou
a favor da diminuição da idade mínima com que A maior parte da população é a favor. O Datafolha
uma pessoa pode ir para a prisão? divulgou recentemente pesquisa em que 87% dos
Como você viu, essa é uma discussão que tem se entrevistados afirmaram ser a favor da redução da maiori-
desenrolado ao longo de muitos anos no Brasil e dade penal. Apesar de que a visão da maioria não é nec-
que envolve convicções muito enraizadas sobre essariamente a visão mais correta, é sempre importante
responsabilidade individual e sobre a implemen- considerar a opinião popular em temas que afetam o
tação de políticas públicas no país. Afinal, o que é cotidiano.
melhor para o Brasil: manter a maioridade penal
em 18 anos ou reduzi-la para 16 anos de idade? As punições atuais para menores são muito brandas. O
Para você poder formar uma opinião bem em- Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê
basada, o Politize apresenta em detalhe os prin- como medida mais drástica a internação de três anos de
cipais argumentos dos dois lados dessa história. para menores infratores, mesmo aqueles que tenham
cometido crimes hediondos. A falta de uma punição
mais severa para esses casos causa indignação em parte
da população.

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Adolescentes de 16 e 17 anos já têm discerni- giada, podendo cometer crimes sem preocupação. Pode
mento o suficiente para responder por seus também ter sido pela grande diferença de punições
atos. Esse argumento pode aparecer de formas entre menores e maiores que existem casos como o
diferentes. Alguns colocam, por exemplo, que garoto que matou um jovem na véspera de seu
jovens de 16 anos já podem votar, então por que aniversário de 18 anos. Assim, prender jovens de 16 e
não poderiam responder criminalmente, como 17 anos evitaria muitos crimes graves.
qualquer adulto? Ele se pauta na crença de que
adolescentes já possuem a mesma responsabili- Muitos países desenvolvidos adotam maioridade
dade pelos seus próprios atos que os adultos. penal abaixo de 18 anos. Alguns exemplos são: Estados
Unidos, onde a maioria dos estados submetem jovens a
Como os menores sabem que suas punições processos criminais como adultos a partir dos 12 anos
são mais leves que as dos adultos, eles pos- de idade; Nova Zelândia, onde a maioridade começa aos
suem maior disposição a cometer crimes vio- 17 anos; Escócia, que pune maiores de 16; na Suíça, que
lentos. É comum, por exemplo, traficantes se uti- pune maiores de 15. O Brasil deveria seguir o exemplo
lizarem dessa diferença para convencerem desses países e punir pessoas de idades inferiores a 18
menores de que estão em uma posição privile anos também.

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CONTRA A REDUÇÃO
É mais eficiente educar do que punir. Educação do que quando entraram. Apesar de já termos visto que
de qualidade é uma ferramenta muito mais efici- os centros de internação nem sempre funcionam da
ente para resolver o problema da criminalidade forma ideal, elas se propõem a trazer um acompanham-
entre os jovens do que o investimento em mais ento mais adequado, trazendo novas possibilidades
prisões para esses mesmos jovens. O problema para o jovem, que assim tem mais chances de voltar
de criminalidade entre menores só será resolvi- preparado para a vida em sociedade.
do de forma efetiva quando o problema da edu-
cação for superado no país. Por isso, os investi- Crianças e adolescentes estão em um patamar de
mentos não devem ser voltados para a con- desenvolvimento psicológico diferente dos adultos.
strução de novos presídios, e sim de novas esco- Diversas entidades de Psicologia posicionaram-se
las, por exemplo. contra a redução, por entender que a adolescência é
uma fase de transição e maturação do indivíduo e que,
O sistema prisional brasileiro não contribui por isso, indivíduos nessa fase da vida devem ser prote-
para a reinserção dos jovens na sociedade. gidos por meio de políticas de promoção de saúde, edu-
Estima-se que o índice de reincidência nas cação e lazer. A lógica repressiva, segundo as asso-
prisões brasileiras é de 70%. Ou seja, 7 em cada ciações de psicólogos, não combina com a adolescência
10 ex-prisioneiros voltam à cadeia. É mais e só causará mais prejuízos a longo prazo.
provável que os jovens saiam de lá mais
perigosos

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A redução da maioridade penal afeta jovens penal implica em reduzir esses direitos e atestar a
em condições sociais vulneráveis e representa incompetência das autoridades em prover, para todos
um ataque aos direitos da criança e do adoles- os jovens, as condições necessárias para que eles
cente. Esse argumento considera um fato incô- possam se desenvolver, com educação, segurança e com
modo no Brasil: os maiores afetados pela violên- perspectivas para o futuro.
cia do Brasil são negros. A tendência é que esses
jovens, geralmente pobres e moradores das per- Tendência mundial é de maioridade penal aos 18 anos.
iferias das grandes cidades brasileiras, sejam Apesar de que muitos países adotam idades menores
também os maiores afetados pela redução da para que jovens respondam criminalmente, estes são
maioridade penal. Esse já é o perfil predomi- minoria: estudo da Consultoria Legislativa da Câmara
nante nos presídios e nos centros de internação dos Deputados revela que, de um total 57 países anali-
brasileiros. Relacionado a esse argumento está a sados, 61% deles estabelecem a maioridade penal aos
ideia de que a redução seria uma omissão do 18 anos. Estudo da Unicef aponta uma proporção ainda
Estado: através do ECA, o Estado brasileiro maior: em um grupo de 54 países analisados, 78%
garantiu direitos a todas as crianças e adoles- teriam maioridade penal aos 18 anos.
centes brasileiros. A redução da maioridade

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FONTES

http://super.abril.com.br/historia/como-funciona-a-maioridade-penal-em-outros-paises

http://www.crianca.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=323

http://www.brasilpost.com.br/2015/07/06/maioridade-penal-outros-paises_n_7739170.html

http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/07/qual-e-maioridade-penal-em-outros-paises.html

http://epoca.globo.com/ideias/noticia/2015/05/o-jeito-certo-de-discutir-maioridade-penal.html

http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2015-08/aprovada-na-camara-reducao-da-maioridade-deve-ser-engavetada-no-senado

http://pessoas.hsw.uol.com.br/febem.htm

http://www.revistaforum.com.br/2012/06/27/de-febem-a-fundacao-casa/

http://g1.globo.com/goias/noticia/2015/10/centros-de-internacao-registram-morte-de-3-menores-neste-ano-em-go.html

http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2015-06-23/centros-de-internacao-de-menores-lotados-em-todo-o-pais.html

http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm

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