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05/11/2019 E se a literatura não existisse?

– Instituto de Química de São Carlos

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INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS


Universidade de São Paulo

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GRADUAÇÃO
E se a literatura não existisse?
Apresentação  4 de julho de 2019  Destaques, Notícias
Bacharelado em Química
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RELAÇÕES INTERNACIONAIS
O dinamismo do mundo atual compromete nossa forma de ser e agir? Com tanta falta de tempo, será que
Comissão de Internacionalização estamos perdendo algo importante da vida? De que forma poderíamos evoluir como seres humanos? Segundo
Convênios o professor Rafael Ruiz da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), respostas para essas e outras
Intercâmbio questões relacionadas a nossa existência podem ser encontradas na literatura. O docente, que tratou sobre o
Foreign Scholars tema na última edição do Ciclo de Palestras “Química às 16” do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da
USP, concedeu entrevista exclusiva sobre o assunto. Con ra, abaixo, o bate-papo na íntegra.
INFORMAÇÕES
IQSC: Quais benefícios que a literatura trouxe e/ou traz para a sociedade você destacaria como sendo os mais
Notícias importantes até hoje? Por que?
Eventos
Defesas Rafael: A Literatura, pelo menos a boa literatura, é sempre revolucionária e libertadora. Não acredito que seja
Concursos necessário fazer “literatura engajada” ou “literatura política”. Aliás, penso que essa é uma das formas mais
Licitações tristes de instrumentalizar e rebaixar a Literatura. Uma boa obra sempre nos força a repensar a nossa vida, as
CIPA nossas circunstâncias, as nossas motivações. Sempre nos faz pensar. A Literatura sempre é, como gosto de
Treinamento e Desenvolvimento (T&D) dizer, um sinal de alerta, um amarelo ou um vermelho no nosso dia a dia que nos grita: pare e pense, não
Biossegurança que nessa correria à toa. E quando nos permitimos parar e pensar e nos deixamos surpreender pela
Escrita Cientí ca Literatura, então nos abrimos à possibilidade de uma mudança signi cativa na nossa vida e, portanto, na
Transparência USP nossa sociedade.
Transparência IQSC
IQSC: Como começou sua relação com a literatura e o que mais te encanta na área?
SERVIÇOS
Rafael: Começou quando fazia colegial em Sevilla, na Espanha, com um professor apaixonado pela Literatura e
Acessos (Informática) que, em lugar de pedir chamentos e resumos, lia para nós obras clássicas e fazia os seus comentários e, o
Solicitar Acesso à Sala de Pós-Graduação que mais me surpreendeu, pedia para que nós também falássemos o que tínhamos achado ao ouvir aqueles
CAQI textos. Foi mágico. E acho que foi isso que me encantou. O poder da palavra! A palavra escrita de um bom
Ouvidoria autor penetra na alma e atinge o mais profundo de nós.

MÍDIAS SOCIAIS IQSC: Quais são as suas referências literárias e de que forma elas podem ser utilizadas como ferramentas de
re exão? Poderia nos dar algum exemplo?

Rafael: Gosto de Dostoiévski e de Tolstói. Gosto da forma que tratam isso que é, de certa forma inabarcável, e
que chamamos de “interioridade” ou “intimidade” e que, acredito, estarmos cada vez mais longe de conhecer.
Ambos sempre me ajudaram e me ajudam a entrar em mim mesmo, a me conhecer e, na medida em que isso
é possível, a conhecer também os outros. Não naquilo que é externo, mas na sua profundidade.

Dentre os modernos, gosto de Tolkien, do Senhor dos Anéis e da sua intuição de que precisávamos – e
acredito que foi isso que ele tentou – de um novo mito fundador para poder encontrar sentido nas nossas
vidas no mundo contemporâneo. E gosto de Susanna Tamaro. Suas obras e seus textos têm a força do vivo e
do real. E isso, hoje, faz toda a diferença. Estamos cando muito confusos com tanto mundo virtual, com tanto
avatar e sel es.

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05/11/2019 E se a literatura não existisse? – Instituto de Química de São Carlos
Na Unifesp, no curso de Medicina, organizo junto com meu colega Dante Gallian o que chamamos de
“Laboratório de Humanidades” e é uma experiência única. Um grupo de vinte ou trinta alunos e pro ssionais
da Saúde, discutindo durante um semestre sobre Crime e Castigo, O idiota, Ana Karenina, A morte de Ivan
Ilitch, Odisseia, O retrato de Dorian Gray. No site você pode ver os depoimentos de muitos deles sobre como a
Literatura ajuda na re exão.

Rafael Ruiz acredita que, se a literatura não existisse, a sociedade seria composta por pessoas solitárias e egoístas. Foto:
Henrique Fontes/IQSC

IQSC: Como você avalia o atual cenário cientí co de estudos relacionados à literatura no Brasil? Estamos em
um bom estágio?

Rafael: Acredito que sim. Há muita coisa boa sendo escrita e publicada nas Universidades públicas e por
estudiosos, mas tenho receio de que esse tipo de coisa tenha produzido um “estado de espírito” na sociedade
que acabou levando as pessoas a pensarem que Literatura é coisa de especialista, de que não dá, para o
homem ou a mulher comum, enfrentarem obras clássicas. A Literatura sempre foi escrita para o povo. A boa
Literatura aparecia, na maior parte das vezes, nos jornais e era aguardada com ansiedade. Os textos dos
autores clássicos mexiam com as pessoas diretamente, sem necessidades de críticas, análises e estudos
especializados. Não digo que isso não seja bom e necessário. O que estou dizendo é que a Literatura não é
feita nem escrita para os especialistas, mas para todos. Todos podemos deixar-nos surpreender pelos irmãos
Karamazov, ou pela Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery, para citar uma autora atual.

IQSC: Como você imagina que a sociedade seria se não existisse a literatura?

Rafael: É só ler A História sem Fim, de Michel Ende. Essa é a trama do livro. Surpreendente e apaixonante. Ou
Fahrenheit 451, de Ray Badbury. Seria uma sociedade onde as pessoas seriam muito solitárias e egoístas,
mesmo vivendo todas muito juntas, e onde os sentimentos seriam quase inexistentes. Uma sociedade de
surdos-mudos afetivos. Acredito que estamos caminhando nessa direção. E não percebemos nada disso.

IQSC: Na sua opinião, quais elementos são primordiais para que as pessoas ajam verdadeiramente como bons
seres humanos? Como a literatura pode auxiliar nesse processo?

Rafael: Essa seria uma resposta muito longa, mas, nos tempos que correm, nesses nossos tempos atuais,
acredito que é preciso aprender com Ulisses, ou com Aliocha ou o Príncipe Miskin, ou, então, com Gandalf e
Galadriel. É preciso aprender a ter misericórdia e compaixão. É preciso saber relevar, não dar tanta
importância aos erros, saber passar por cima dos furos dos outros. É preciso, antes de mais nada, saber ter
tempo para ouvir, ouvir mesmo, até o m, ouvir tudo aquilo que o outro quer nos dizer e nos comunicar.
Penso que a velocidade do Twitter, do Instagram ou do Facebook estão encurtando o nosso tempo e a nossa
paciência. Não sabemos mais ter tempo para ouvir ou, como diz Daniel Pennac, em Como um romance, não
sabemos mais ter tempo para ler nem para amar. E esse tempo é sempre um tempo roubado. Roubado à
obrigação de viver. A Literatura ensina a ter e dar tempo ao outro. Isso é que nos torna mais humanos. E
quando não é assim, infelizmente acredito que chegamos ao que tristemente encontramos hoje: intolerância,
ódio e desquali cação. Nada disso nos torna melhores seres humanos.

IQSC: Há espaço para a literatura em todas as áreas de nossas vidas? Há rejeição ou má utilização dela em
algum campo?

Rafael: Não sei como responder a isso. Acho que não se trata de “espaço em todas as áreas”. A nossa vida é
única, ela não deveria ser fragmentada, nem “espacializada” e, muito menos, não deveria ser “setorializada” ou
dividida em papéis. Se houver algum espaço onde possa entrar a Literatura será no meu eu interior e, a partir
daí, ela se comunica com tudo da minha vida. A Literatura me afeta, me modi ca e, por isso, afeta e modi ca
as diferentes áreas da minha vida.

Se é possível utilizá-la mal? Sim. É claro. A Literatura é uma arma perigosa. Ela pode manipular sentimentos,
emoções e pensamentos. Ela pode in uenciar a cometer coisas horríveis como se fossem muito boas. Ela pode
carregar os homens e as mulheres até “O coração das trevas”, como diria Joseph Conrad. Isso também é
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humano, muito humano, aliás. Mas ela também, na minha opinião e seguindo Dostoiévsky, poderá nos salvar.
De que? Como diria Shakespeare, do inverno das nossas desesperanças.

IQSC: Como quebrar velhos paradigmas e preconceitos como, por exemplo, de que a área de humanidades
supostamente não traria retornos palpáveis e imediatos à sociedade?

Rafael: Talvez a resposta não seja a esperada, mas é que simplesmente a Literatura não traz mesmo retornos
palpáveis e imediatos. A Literatura trabalha na longa duração. Ela mexe naquilo que há de mais profundo em
nós. Acho que o primeiro paradigma que devemos quebrar é esse: por que é que ainda insistimos em
encontrar soluções rápidas e imediatas? Isso é falso. A promessa da “Modernidade” de que a técnica e o
progresso seriam imediatos e e cazes já se comprovou falsa. Nada é assim com o homem. Há um tempo
humano, um tempo próprio do homem e da mulher que não é mesmo esse tempo medido pelo relógio ou
pela internet online. Tudo tem o seu tempo. Cada pessoa tem o seu próprio tempo. E a Literatura ensina, a
quem quiser se deixar ensinar, a conhecer esse tempo de cada um. Gosto de lembrar algo que é repetitivo na
Odisseia e que, de alguma forma, é “fundante” na nossa sociedade, vamos chamar de “ibérica”. Sempre que
Ulisses chega a algum lugar, a uma nova ilha ou um novo povo, convidam-no a sentar, oferecem-lhe comida,
bebida, água e vinho… e lhe dizem: senta, come, bebe e, quando estiveres refeito, conta-nos a tua história:
quem és, de onde vens e por que estás aqui. Não é maravilhoso isto? Esse é o tempo humano. O tempo em
que se pode sentar, comer e falar com os amigos sem pressa nenhuma, sem resumir as ideias, sem reduzi-las
a cinco ou seis palavras chaves. Parece-me que esse seria um bom paradigma a ser quebrado.

Entrevista: Henrique Fontes – Assessoria de Comunicação do IQSC/USP

Mais Informações
Assessoria de Comunicação do IQSC/USP
Telefone: (16) 3373-6732
E-mail: jornalismo@iqsc.usp.br

 IQSC, LITERATURA, QUÍMICA ÀS 16, RAFAEL RUIZ GONZALEZ

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