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A ARTE DE CONVIVER COM O LEÃO DO NOVO MUNDO 

SÉRGIO APPROBATO MACHADO JÚNIOR 


 
Estamos todos sob os olhares do leão no mundo novo. Desde que foi implantado, o SPED –
Sistema Público de Escrituração Digital é considerado um divisor de águas na história fiscal
brasileira e, principalmente, no relacionamento fisco-contribuinte. Praticamente um Big
Brother fiscal que avança com monitoramento em tempo real, cruzamento de dados e
aumento progressivo do número de obrigações. Não há como fugir de suas garras nem sobra
espaço para o famoso "jeitinho brasileiro".
A nova ordem requer mudanças de comportamento do empreendedor, em âmbito gerencial e
cultural, além de exigir a adaptação de todos, cidadãos e empresas, ao novo modo de agir e
reportar. É um caminho sem volta.
O grande desafio para os profissionais de Ciências Contábeis é transformar este limão numa
limonada, enxergar oportunidades e fazer avançar a categoria ainda mais neste capítulo da
história. Evidente que o animal será domado – não a sua fome, insaciável –, mas seus
labirintos tecnológicos.
Se os profissionais convivem com uma das malhas tributárias mais esquizofrênicas do planeta,
saberão também assimilar as novidades e transformá-las em ferramentas para o seu
desenvolvimento e de seus clientes.
Nesta fase, a conscientização da sociedade sobre o SPED é vital para o sucesso do sistema. O
governo ainda tem muito a fazer, pois as dificuldades são sentidas por todos, sem nenhuma
contrapartida. Diante disso, e das altas penalidades, o importante é estar preparado.
A profissionalização dos negócios é inevitável e fundamental, além de representar um
horizonte próspero para as empresas. De sua parte, o empreendedor deve trabalhar
estratégias, buscar aprimoramento na prestação de contas e educação fiscal permanente, com
boas assessorias, cursos e qualificação para toda a equipe.
O Brasil hoje é detentor de uma das inteligências artificiais mais poderosas do mundo, sendo
exemplo para outros países. Para o Fisco, os resultados com a implantação do SPED podem ser
medidos pelo aumento da arrecadação e da base de contribuintes, além da redução na
sonegação. Como se vê, o leão continua com muita fome.
Precisamos agora exigir os benefícios ao empreendedor, como a simplificação do sistema, a
redução da carga tributária e incentivos que promovam a competitividade. Não podemos
continuar com a quantidade insuportável de obrigações acessórias. Mas, como isto depende
do governo, permanece apenas a promessa.
Assimilar o avanço tecnológico não significa abandonar a luta por uma legislação mais justa,
sem os remendos que transformam o ambiente de negócios do país num circo dos horrores. A
verdade é que convivemos com um inacreditável cipoal de leis, normas e regulamentos que se
entrelaçam formando a legislação fiscal e tributária confusa do Brasil. Somado a isto está a
sombra da burocracia, resultando num cenário do absurdo, o qual as empresas brasileiras
precisam enfrentar diariamente para sobreviver.
Em 23 anos, mais de 3,7 milhões de normas tributárias foram editadas no Brasil. Atualmente,
uma empresa deve cumprir aproximadamente 3,4 mil normas e a cada nova determinação,
aumenta a carga de impostos.
O SPED não foi uma medida ruim, ao contrário, trouxe transparência. Lamentável foi o modo
como o governo lançou o sistema, sem tempo às organizações para que se preparassem para
os novos tempos.
Mais de 80% das empresas brasileiras são de pequeno e médio porte e sequer foram
consultadas sobre as mudanças que o sistema traria. Além disso, não houve nenhum incentivo
ou linha de financiamento para que pudessem se adaptar.
Como temos no Brasil negócios de todos os portes, muitos ainda não estão prontos para a
nova realidade fiscal. Faltou uma campanha nacional para informar sobre os impactos do
SPED. Em suma, improvisa-se em Brasília e o resto do país que pague a conta.
A tecnologia monitora hoje cada passo das empresas no Brasil e o governo provou ser capaz de
criar todo um aparato para patrulhar o setor privado. Ora, se foi competente para isto, com o
mesmo zelo deve ser capaz também de vigiar o setor público, este sim, carente de fiscalização
e, principalmente, de transparência.
Essa é também uma exigência da voz rouca das ruas.

SÉRGIO APPROBATO MACHADO JÚNIOR é empresário contábil e Presidente do SESCON-SP –


Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e de Assessoramento no Estado de São Paulo e
da AESCON-SP – Associação das Empresas de Serviços Contábeis.

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