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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Direito

Marcos Alves Arruda

A DIVERSIDADE JURÍDICA ENTRE OS TERMOS ELISÃO FISCAL E EVASÃO


FISCAL PELA ÓTICA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 116 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL E DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
TRIBUTÁRIOS PARA DEFINIÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO LÍCITO.
.

Belo Horizonte
2013
Marcos Alves Arruda

A DIVERSIDADE JURÍDICA ENTRE OS TERMOS ELISÃO FISCAL E EVASÃO


FISCAL PELA ÓTICA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 116 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL E DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
TRIBUTÁRIOS PARA DEFINIÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO LÍCITO.

Monografia apresentada ao programa de Pós-


Graduação em Direito Tributário da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de
Especialista em Direito Tributário
Orientador: Marcelo de Oliveira Dávola

Belo Horizonte
2013
Marcos Alves Arruda

A DIVERSIDADE JURÍDICA ENTRE OS TERMOS ELISÃO FISCAL E EVASÃO


FISCAL PELA ÓTICA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 116 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL E DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
TRIBUTÁRIOS PARA DEFINIÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO LÍCITO.

Monografia apresentada ao programa de Pós-


Graduação em Direito Tributário da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de
Especialista em Direito Tributário
Orientador: Marcelo de Oliveira Dávola

Belo Horizonte, 10 de Dezembro de 2013


A todos aqueles que reconhecem a sua
pequenez, limitação e dependência de Jeová,
mas que nunca desistem dos sonhos possíveis.
RESUMO

O trabalho que se segue irá tratar da divergência existente entre termos


considerados sinônimos, quais sejam evasão fiscal e elisão fiscal e a relação de
ambos com o planejamento tributário. Será abordada a visão do direito brasileiro
sobre o tema e a posição jurídica sobre a questão em outros países. Obedecendo a
melhor metodologia a pesquisa buscará a visão doutrinária sobre a chamada lei anti-
elisão incerta no parágrafo único do artigo 116 do código tributário nacional que
apesar de ter constitucionalidade questionada pela doutrina não a tem pelo Supremo
Tribunal Federal. O trabalho terá a pretensão de conceituar o termo sem, entretanto
esgotar o assunto para definir com clareza o limite entre a economia lícita e a
economia ilícita de impostos.

Palavras-Chaves: Direito Tributário. Lei Anti-Elisão. Lei complementar 104 de


10/01/2001. Constitucionalidade do parágrafo único do art.116 CTN – Código
Tributário Nacional. Elisão Fiscal. Evasão Fiscal. Planejamento Tributário.
Pagamento a menor de impostos.
ABSTRACT

The following paper will address the divergence in terms as synonyms, which are tax
evasion and avoidance and relationship with both tax planning. The vision of
Brazilian law on the subject and the legal position on the issue will be addressed in
other countries. Obeying the best methodology to research will seek doctrinal view
on the call anti-avoidance law uncertain in the sole paragraph of article 116 of the
national tax code that despite having questioned the constitutionality doctrine has not
the Supreme Court. Work will claim to conceptualize the term, without exhausting the
subject however to clearly define the boundary between licit and illicit economy tax
savings.

Key Words : Tax Law . Anti - circumvention law . Complementary Law 104 of
10/01/2001 . Constitutionality of sole paragraph of art.116 CTN - National Tax Code .
Tax avoidance. Tax Evasion . Tax Planning . Underpayment of taxes.
LISTA DE ABREVIATURAS

CRB/88 – CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988


CTN – CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
IPVA – IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULO AUTOMOTOR
IPTU – IMPOSTO PREDIAL E TERRITOTIAL URBANO
IR – IMPOSTO DE RENDA
PJ – PESSOA JURÍDICA
IRS – INTERNAL REVENUE SERVICE
IRC – INTERNAL REVENUE CODE
COF9 – CODE OF PRATICE 9
HMRC – HM REVENUE & CUSTOMS
INSS – CONTRIBUIÇÃO PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL
IRPF – IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA FÍSICA
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................................................9
2. A VISÃO SEMÂNTICA E DOUTRINAL SOBRE OS TERMOS ELISÃO FISCAL E
EVASÃO FISCAL ......................................................................................................11
3. A ELISÃO E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL .......................................................15
3.1. Os princípios da Legalidade, da Livre Iniciativa e a Elisão Fiscal...........................15
4. A LEI ANTI-ELISÃO............................................................................................18
5. A DIVERGÊNCIA ENTRE ELISÃO, EVASÃO E PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO
NA DOUTRINA TRIBUTÁRIA BRASILEIRA .............................................................22
6. A ELISÃO FISCAL EM ORDENAMENTOS ESTRANGEIROS.........................23
6.1. Estados Unidos da América......................................................................................23
6.2. Inglaterra...................................................................................................................24
6.3. Alemanha..................................................................................................................25
6.4. França .......................................................................................................................26
6.5. Argentina ..................................................................................................................26
6.6. Portugal.....................................................................................................................28
7. A ELISÃO NA PRÁTICA EMPRESARIAL...........................................................31
8. CONCLUSÃO .....................................................................................................35
9

1. INTRODUÇÃO

De acordo com o Impostômetro da Associação Comercial de São Paulo o


brasileiro já pagou até o mês de novembro de 2013 o equivalente a mais de R$
1.505.176.000.000,00 trilhão em impostos. Este valor seria suficiente para construir
mais de 109 milhões de salas de aula1.
Apesar das possibilidades sociais que os valores arrecadados podem
proporcionar a utilização dos recursos é cada vez mais questionada pelos cidadãos,
em especial pela classe empresarial, que não percebe uma contraprestação clara
por parte do poder público, mas sente que a carga tributária para o seu negócio e
para a sociedade brasileira é cada vez maior. Em virtude disso a busca do
empresariado e também do contribuinte pessoa física pelo menor imposto é
constante. Por causa disso é que advogados tributaristas, contadores e outros,
trabalham de forma incansável para tentar diminuir o impacto dos tributos nos
negócios.
Tecnicamente este trabalho tem nome: elisão ou evasão fiscal. Ambos têm
como fim a redução dos impostos, mas a doutrina os diferenciam e os consideram
majoritariamente como sendo: elisão, a redução lícita, e evasão, a redução ilícita.
Tanto no direito pátrio como no internacional a linha divisória entre um
instituto e outro é muito tênue, o que dificulta sobremaneira a visão do empresário
sobre o que é lícito e o que não é, e a aplicação da lei por parte do fisco nas ações
de fiscalização.
Esta dicotomia tem gerado por vezes disputas judiciais caríssimas acerca do
tema, tem encarecido ainda mais o exercício da atividade econômica no país e
tornado os custos do Estado em buscar o que entende ser ilicitamente não pago a
título de tributos cada vez maiores, sem, entretanto aumentar a eficácia desta busca.
Em 2001 o governo federal brasileiro em mais uma tentativa de minimizar
esta dúvida sobre o que é e o que não é a fuga ilícita de tributos aumentou os
poderes da Receita Federal por editar a Lei Complementar 104 de
10/01/01(BRASIL, 2001) que alterou o art 116 do código tributário nacional com a
seguinte redação:
Art. 116. (..) ...

1
Site acessado em 10/12/2013 em http://www.impostometro.com.br/
10

.
.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar
atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a
ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos
constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem
estabelecidos em lei ordinária. (Parágrafo incluído pela Lcp nº 104, de
10.1.2001)(BRASIL, 2001).

A mudança provocou um grande debate sobre a sua constitucionalidade,


tanto por afetar princípios constitucionais como também por dar a priori a sensação
de que o comando legal concederia poderes de magistratura a servidores
administrativos. Ambas as hipóteses parecem ferir o atual diploma constitucional e
aumentar expressivamente a dúvida sobre o que é evasão fiscal, elisão fiscal,
planejamento tributário e como os três institutos se relacionam entre se e com a
licitude de se planejar e pagar menos tributos.
Para direcionar luz sobre a discussão, sem, no entanto ter a pretensão de
esgotá-la, dissecaremos o artigo supra e o inter-relacionaremos com todo o conjunto
de normas pátrias e internacionais.
Antes porem é preciso definir com clareza os termos evasão e elisão, primeiro
de acordo com a língua brasileira culta e depois de acordo com a visão da doutrina
jurídica. Tais definições serão base para nosso estudo mais aprofundado do
parágrafo único do art. 116 do código tributário nacional e seus desdobramentos.
Por final relacionaremos as teorias e conceitos pesquisados com um caso
prático que demonstrará a impossibilidade do Estado em coibir todas as ações dos
empresários que vise a diminuição dos impostos a serem pagos.
11

2. A VISÃO SEMÂNTICA E DOUTRINAL SOBRE OS TERMOS ELISÃO FISCAL


E EVASÃO FISCAL

A primeira questão a ser vencida é a exata determinação do que são os


termos em sentido jurídico, até porque em sentido semântico os significados são
muito próximos.
Segundo o dicionário Aurélio (FERREIRA, 2008) o vocábulo evasão, que é
um substantivo feminino, denota o “ato de evadir-se; fuga. [Pl.: –sões.]” enquanto
que elisão, também substantivo feminino, está relacionado com “eliminação,
supressão”. Ambas as palavras a princípio poderiam ser utilizadas para explicar o
pagamento a menor de impostos. A primeira por dizer que o contribuinte buscaria a
fuga da materialização do fato gerador, algo lícito, conforme ainda veremos neste
trabalho. A segunda por dizer que o contribuinte eliminaria os fatos necessários a
perfeita formação do fato gerador, ou seja, do fato imponível ao fisco, aquele que
segundo a lei é a chave para fazer nascer a obrigação tributária.
Porem se aprofundarmos nosso estudo semântico dos termos, sem
obviamente perder o foco do nosso trabalho jurídico o vocábulo evasão, que vem do
latim evasione, é o ato de evadir-se, e evadir segundo dicionários renomados, como
Aurélio (FERREIRA, 2008) e o Houaiss(HOUAISS, 2009), está relacionado a “fugir
às ocultas, fugir da prisão, sumir-se”, ou seja, o significado do termo tem uma
conotação valorativa negativa que leva em conta a intenção de quem faz. Seria dizer
que se utilizarmos o termo evadir para explicar que alguém fugiu de uma enchente,
apesar de possivelmente sermos entendidos, a colocação não estaria correta
considerando a melhor língua culta, uma vez que, quem foge de um desastre
natural não sai às escondidas como se preso estivesse.
Portanto podemos afirmar que semanticamente falando o termo que melhor
explica a ilícita fuga do pagamento de impostos é o vocábulo evasão e por
consequência a forma lícita, elisão.
Na doutrina jurídica o entendimento do termo não é tão pacífico como na
gramática parece ser.
Para Ricardo Mariz de Oliveira(MARTINS, 2010, pag.450-454) elisão é o ato
praticado pelo contribuinte para tentar elidir ( suprimir ) o nascimento da obrigação
tributária. Seria dizer sufocar ou matar “o” ou “os” fatos que antecedem e que
formariam o fato gerador da obrigação tributária. Pelo contrário para o Prof. Ricardo
12

evasão seria a fuga da obrigação tributária já existente, ou seja, seria fugir de algo
que já é devido. Daí a lógica semântica do termo; fugir de uma prisão, fugir às
escondidas de algo que sou obrigado por lei a fazer, ou melhor, a pagar.
Contrário ao senso jurídico majoritário, para o grande jurista Hugo de Brito
Machado (MACHADO, 2011), elisão é a ação ilícita, pois para ele só é possível elidir
ou suprimir aquilo que já existe. Para esse grande mestre a elisão suprime o fato
gerador ( fato imponível) e não os fatos que antecedem o fato gerador. No mesmo
viés evasão é a ação lícita, pois foge, evita, o fato gerador e logo não se torna
devedor da obrigação tributária.
Por final poderíamos nos valer dos acórdãos do Supremo Tribunal Federal e
do Superior Tribunal de Justiça para se tentar estabelecer a correta diferença entre
os conceitos que denotam a ação de pagar impostos a menor, lícita ou ilicitamente.
Ocorre que quando nos balizamos na jurisprudência do STF2 e do STJ3, data venia,

2
“A aplicação da multa moratória tem o objetivo de sancionar o contribuinte que não cumpre suas
obrigações tributárias, prestigiando a conduta daqueles que pagam em dia seus tributos aos cofres
públicos. Assim, para que a multa moratória cumpra sua função de desencorajar a elisão fiscal, de
um lado não pode ser pífia, mas, de outro, não pode ter um importe que lhe confira característica
confiscatória, inviabilizando inclusive o recolhimento de futuros tributos.” (RE 582.461, Rel.
Min. Gilmar Mendes, julgamento em 18-5-2011, Plenário, DJE de 18-8-2011, com repercussão
geral.)

“A EC 03/1993, ao introduzir no art. 150 da CF/1988 o § 7º, aperfeiçoou o instituto, já previsto em


nosso sistema jurídico-tributário, ao delinear a figura do fato gerador presumido e ao estabelecer a
garantia de reembolso preferencial e imediato do tributo pago quando não verificado o mesmo fato a
final. A circunstância de ser presumido o fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do
tributo, dado tratar-se de sistema instituído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado
por lei complementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa que a
aproxima o mais possível da realidade. A lei complementar, por igual, definiu o aspecto temporal do
fato gerador presumido como sendo a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte
substituto, não deixando margem para cogitar-se de momento diverso, no futuro, na conformidade,
aliás, do previsto no art. 114 do CTN, que tem o fato gerador da obrigação principal como a situação
definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. O fato gerador presumido, por isso
mesmo, não é provisório, mas definitivo, não dando ensejo a restituição ou complementação do
imposto pago, senão, no primeiro caso, na hipótese de sua não realização final. Admitir o contrário
valeria por despojar-se o instituto das vantagens que determinaram a sua concepção e adoção, como
a redução, a um só tempo, da máquina-fiscal e da evasão fiscal a dimensões mínimas, propiciando,
portanto, maior comodidade, economia, eficiência e celeridade às atividades de tributação e
arrecadação." (ADI 1.851, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 8-5-2002, Plenário,DJ de 22-11-
2002.) No mesmo sentido: RE 453.125-AgR-segundo, Rel. Min.Joaquim Barbosa, julgamento em
4-10-2011, Segunda Turma, DJE de 21-10-2011.
3
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 355.704 - PR (2013/0214029-0)
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : ELAINE FOGACA PIRES
AGRAVADO : LUIS FELIPE DE ANDRADE
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL E VIOLAÇÃO AO ART. 334 DO CP. OCORRÊNCIA.
DESCAMINHO. INSIGNIFICÂNCIA. PARÂMETRO. MÍNIMO LEGAL PARA A EXECUÇÃO
13

há uma clara confusão entre evasão e elisão, pois ambos os termos são utilizados
para denotar ilícitos tributários.
Por exemplo, para o Min. Gilmar Mendes, relator do RE 582.461, que diz in
verbis: “ ... para que a multa moratória cumpra sua função de desencorajar a elisão
fiscal...”, o termo é claramente utilizado para indicar uma ação ilícita, pois, segundo

FISCAL. ARTIGO 20 DA LEI Nº 10.522/02. REITERAÇÃO DELITIVA. SOMA DOS


DÉBITOS CONSOLIDADOS NOS ÚLTIMOS CINCO ANOS. PARÁGRAFO 4º DA NORMA.
AGRAVO A QUE SE CONHECE PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
DECISÃO
.
.
... No presente caso, ao que se tem dos autos, do exame das folhas de
antecedentes criminais (fls. 9/10), colhe-se que restou devidamente
comprovada a existência de procedimento instaurado contra os
acusados pela prática do mesmo delito, o que basta à demonstração da
justa causa para a ação penal porque presentes indícios suficientes
de autoria e materialidade, cabendo ao órgão acusador comprovar, no
curso da ação, que a elisão fiscal reiterada ultrapassa o parâmetro
tido como insignificante. ...

AgRg no AREsp 303509 / PR


AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2013/0051432-4
Relator(a)
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (1131)
Órgão
lgador
T6 - SEXTA TURMA
Data do Julgamento
05/09/2013
Data da Publicação/Fonte
DJe 19/09/2013
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO
ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 334 DO CP. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO DE
PROIBIÇÃO RELATIVA. CIGARRO. CONTRABANDO. PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA COM BASE NO VALOR DA EVASÃO FISCAL.
INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Em sede de contrabando, ou seja, importação ou exportação de
mercadoria proibida, em que, para além da sonegação tributária há
lesão à moral, higiene, segurança e saúde pública, não há como
excluir a tipicidade material tão-somente à vista do valor da
evasão fiscal, ainda que eventualmente possível, em tese, a exclusão do
crime, mas em face da mínima lesão provocada ao bem jurídico ali
tutelado, gize-se, a moral, saúde, higiene e segurança pública.
2. Não tem aplicação o princípio da insignificância na hipótese de
contrabando de produto de proibição relativa em quantidade
suficientemente expressiva para afastar a lesividade mínima à saúde
pública (16.900 maços de cigarros de origem estrangeira).
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
14

ele, a ação de elidir deve ser pedagogicamente punida com multa visando reprimir o
agente e outros a agir da mesma forma.
Em contra partida os Min. Ilmar Galvão e Joaquim Barbosa, nos julgados ADI-
1851 e RE-453.125 respectivamente utilizam o termo evasão fiscal para indicar
também uma ação ilícita do agente contra o instituto da substituição tributária que
entre outras questões tem por objetivo diminuir a fuga ilícita de impostos nas
vendas entre pessoas físicas e ou jurídicas de estados diferentes, como diz o
recorte:
“...Admitir o contrário valeria por despojar-se o instituto ( da substituição
tributária ) das vantagens que determinaram a sua concepção e adoção,
como a redução, a um só tempo, da máquina-fiscal e da evasão fiscal a
dimensões mínimas...”

A mesma divergência ocorre nos julgados do STJ, da Min. Maria Thereza de


Assis Moura que utiliza ambos os termos para explicar a ação ilícita de pagar menos
impostos conforme a integra do acórdão na nota de rodapé nº6.
Apesar da clara e lógica fundamentação das duas correntes supra a primeira
é majoritária e é a corrente na qual me filio, pois se considerarmos o arcabouço
semântico do termo é possível inferirmos que o vocábulo evasão que esta
relacionado a ação de evadir-se no sentido de sair às escondidas explica melhor a
forma ilícita de planejar e pagar menos impostos por meios considerados
fraudulentos..
Portanto para os fins deste trabalho iremos adotar a corrente do Dr. Ricardo
Mariz de Oliveira (MARTINS,2010) e consideraremos elisão como lícita e evasão
como ilícita redução de impostos a pagar.
15

3. A ELISÃO E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Sem desprestigiar nenhum dos princípios constitucionais, principalmente


aqueles afetos à seara tributária, princípios tais como o da legalidade, da livre
iniciativa, do não confisco, do direito a liberdade, entre outros, enfraquecem muito as
possibilidade de uma norma anti-elisão. Ressalte-se que, não dissemos anti-evasão,
mas anti-elisão.

3.1. Os princípios da Legalidade, da Livre Iniciativa e a Elisão Fiscal

A Constituição Federal(BRASIL,1988) diz em seu art. 5º inc. II “ninguém será


obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” .Também
afirma no art. 150, inc. I:

Art. 150. ...... é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios:
I - exigir .....tributo sem lei que o estabeleça;
(BRASIL,1988)

Ou seja, é condição sine qua non no Brasil para que o Estado possa exigir
um tal tributo existir uma lei, devidamente inserida em nosso arcabouço jurídico.
O princípio da Legalidade garante que o cidadão só será obrigado a pagar
tributos se houver uma lei que defina qual e quanto tributo a pagar.
Dentro do mesmo princípio o art. 146, inc. III alínea “a” (BRASIL,1988)
estabelece que “ cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em
matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de
suas espécies, bem como, .....dos .....fatos geradores, bases de cálculo ....;”. A lei
estabelece o caminho legislativo para a definição de fatos importantes relacionados
aos tributos, entre eles o FATO GERADOR, a chamada hipótese de incidência
tributária.
Obedecendo ao princípio da legalidade, mais precisamente aos incisos vistos
no parágrafo anterior, a lei determinará o fato que será considerado como o evento
gerador da obrigação tributária, sem o qual não existirá nenhuma obrigação
tributária. Por exemplo, o IPVA que é o Imposto sobre a Propriedade de Veículo
Automotor só é devido se em 1º de janeiro do ano calendário a pessoa física ou
16

jurídica for proprietária de veículo automotor. O fato gerador neste caso se


aperfeiçoa pela propriedade do veículo automotor e não simplesmente pela posse, é
dizer que se o “contribuinte” tem um veículo automotor, mas decide deixá-lo em
nome de sua mãe, ele não será contribuinte do imposto, pois a propriedade jurídica
não é dele e sim de sua mãe.
Um dos fundamentos inseridos no art. 1º de nossa constituição também baliza
esta questão. O art. 1º da CRB/88 diz : “A República Federativa do Brasil,...tem
como fundamentos: ..IV - ..[a] livre iniciativa”; É dizer que a pessoa jurídica ou física
não é obrigada em momento algum a ter a propriedade de um veículo automotor
para ser contribuinte do IPVA. É dizer que a pessoa física ou jurídica pode em uma
ação de elisão decidir não ter um veículo automotor em função dos autos custos
relacionados ao Imposto que só é devido aos proprietários de veículos automotor. É
faculdade de uma empresa, por exemplo, decidir se terá frota de veículos própria,
sendo contribuinte do IPVA e de outros custos, ou se terá um contrato de locação de
veículos e não será contribuinte do IPVA.
O princípio da livre iniciativa juntamente com o princípio da legalidade
garantem ao cidadão brasileiro e às empresas fazer somente o que a lei determina
e não serem obrigados a praticarem nenhum dos fatos geradores definidos em lei
somente para serem contribuintes de algum dos tributos sem que o queiram. Falar
algo diferente disso é dizer que o Estado tem poderes sobre a nossa iniciativa,
sendo, portanto um Estado ditatorial que utilizaria o imposto com fins confiscatórios,
algo diametralmente contrário a nossa atual ordem constitucional que veda
expressamente a utilização do tributo para o confisco.4
Por final dentro desta visão constitucional ainda existem correntes divergentes
sobre a chamada lei anti-elisão, que na verdade, com a máxima vênia àqueles que
divergem, deveria ser chamada lei anti-evasão.
Segundo Andre Carvalho Estrella citado por Santos (2011) existem pelo
menos duas correntes doutrinárias a respeito do problema ora em tela.

4
CF/88: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios:
[...]
IV – utilizar tributo com efeito de confisco.[7]
17

A primeira que entende que a lei anti-elisão, digo anti-evasão, não atinge
seus objetivos por questões epistemológicas e semânticas já estudadas neste
trabalho.
Na segunda corrente, apoiada por grandes doutrinadores como o ex-ministro
do Supremo, Ives Gandra (MARTINS,2002), Alberto Xavier, Hugo de Brito Machado
(MACHADO, 2007), entre outros entendem que a lei complementar 104/01 (BRASIL,
2001) é totalmente inconstitucional, pois viola princípios basilares da constituição
federal conforme abordados anteriormente.
Mas para termos um melhor argumento sobre a peleja posta iremos adentrar
na própria lei e estudar seus detalhes.
18

4. A LEI ANTI-ELISÃO

Em 10 de janeiro de 2001 entrou em vigor a chamada lei anti-elisão pela


inclusão do parágrafo único ao art. 116 do código tributário nacional com a seguinte
redação in verbis:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato


gerador e existentes os seus efeitos:
I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se
verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos
que normalmente lhe são próprios;
II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja
definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá
desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade
de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos
elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os
procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela
Lcp nº 104, de 10.1.2001)
(BRASIL,2001)

O art. 116 define o que é o fato gerador, tanto em situação de fato ou em


situação de direito. Por exemplo, o fator gerador do Imposto sobre a Renda ( IR )
não esta relacionado necessariamente com uma justificativa jurídica para a
disponibilidade de renda, pois a simples disponibilidade em conta bancária de valor
superior a R$ 140,00 ( valores para o exercício 2014 ) é suficiente para tornar a
obrigação acessória de informar a Receita obrigatória, e caso o contribuinte tenha
em sua conta bancária, no dia 31 de dezembro do ano calendário, valor suficiente
para configurar um aumento do seu patrimônio por meio do extrato fornecido pela
instituição bancária ele pagará o imposto sobre a renda indiferentemente se pode ou
não provar a origem da renda. Este é um fato objetivo, ter ou não ter a
disponibilidade da renda.
Outro fato objetivo é ter ou não ter a propriedade de um imóvel no dia 1º de
janeiro do ano calendário e ser ou não ser contribuinte do IPTU, Imposto Predial e
Territorial Urbano, devido por aqueles que possuem a propriedade de um imóvel em
área urbana.
19

Ocorre que o governo, na busca do equilíbrio do orçamento e das contas


públicas por meio do aumento da arrecadação tenta evitar que o contribuinte exerça
sua faculdade de livre iniciativa e de planejar suas ações com o objetivo de pagar
menos impostos. Para tanto editou o parágrafo único do artigo acima visando evitar
a elisão e a evasão, dos tributos.
Em uma primeira leitura do referido fragmento legal a ideia parece simples: a
autoridade administrativa arrecadadora dos impostos ira subsumir à lei as ações do
contribuinte mesmo quando ele tentar fazer parecer que as suas ações são
diferentes do que diz o fato gerador estabelecido em lei. Alguns termos inseridos no
texto merecem melhor atenção.
A primeira questão a ser posta é a obrigatoriedade de se ter uma lei, ou seja,
pura obediência ao princípio da legalidade, para determinar os atos da autoridade
administrativa. Entretanto a lei não pode delegar a uma autoridade administrativa
dizer o que é o direito, pois quando o texto diz que a autoridade irá desconsiderar é
dizer que o agente irá não considerar o ato objetivo do contribuinte e considerar, ou
valorar o seu ato subjetivo, ou ainda, é afirmar que a autoridade administrativa irá
interpretar a ação do contribuinte como sendo ou não danosa ao fisco. Para a
doutrina é considerar a teoria do objetivo econômico da ação do contribuinte e não a
exata subsunção da ação à lei. Tal condição fere o princípio da legalidade já
abordado neste trabalho e o princípio da divisão dos poderes determinado pela
constituição federal que dá competência apenas ao judiciário para interpretar a lei e
dizer o que é o direito.
Outra questão abordada no parágrafo único do art.116 do CTN é o requisito
subjetivo do tipo. A receita terá que demonstrar a finalidade pretendida pelo
contribuinte em dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo.
O art. 167 do Código Civil Brasileiro diz em verbis:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se


dissimulou, se válido for na substância e na forma.
o
§ 1 Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas
às quais realmente se conferem, ou transmitem;
II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
(BRASIL,1966)
20

Em uma primeira leitura temos uma redação ambígua que se vale de termos
semelhantes para tratar informações diferentes, induzindo o leitor a uma errada ou
incompleta compreensão do artigo. Recorrendo aos verbetes do dicionário Aurélio
(FERREIRA, 2008) a dúvida permanece, pois temos significados parecidos, são
eles:
SIMULAR: Verbo transitivo direto.
1.Fingir (o que não é).
2.Aparentar (1).
3.Reproduzir ou imitar certos aspectos de (situação ou processo), de modo
mais ou menos aproximado e controlado. [C.: 1]
§ si.mu.la.dor (ô) adj. sm.

DISSIMULAR: Verbo transitivo direto.


1.Ocultar ou encobrir com astúcia; encobrir.
2.Não dar a perceber, calando ou simulando.
Verbo intransitivo.
3.Não revelar seus sentimentos ou desígnios. [C.: 1]
§ dis.si.mu.la.ção sf.; dis.si.mu.la.do adj.sm.; dis.si.mu.la.dor (ô) adj. sm.;
dis.si.mu.lá.vel adj2g.
(FERREIRA,2008)

Ocorre que os detalhes dos dois termos separam melhor os significados.

Para Ricardo Mariz de Oliveira na obra Curso de Direito Tributário,


coordenado pelo Meritíssimo Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Dr. Ives
Gandra Martins(MARTINS,2010) “SIMULAR significa aparentar algo que não existe
e DISSIMULAR significa esconder algo que existe.” Por exemplo: o artista simula
um estado de alegria ou tristeza que na verdade não existe e não tem nenhuma
relação com o seu estado de espírito. O estado simulado trata-se apenas de uma
fantasia, não existe aquela “realidade” mostrada. Diferente seria se o mesmo artista
estivesse de luto devido a morte de um ente querido muito próximo e tivesse que
apresentar uma peça teatral de comedia. Ele teria que dissimular sua tristeza e
simular sua alegria, ou seja, ele teria que esconder um estado real, a tristeza, com
um estado irreal, a alegria.
Portanto podemos concluir que na simulação cria-se um estado ou situação
que não existe, totalmente irreal com o fim de tentar fazer uma irrealidade parecer
21

real, fingir que algo existe ou aconteceu. Já na dissimulação cria-se um estado ou


situação que também não existe, mas com o propósito de esconder uma situação
que existe e que não se quer mostrar.
Daí é possível entender o porquê do legislador dizer que se o negócio for
simulado, inexistente, fantasma, será considerado nulo, pois não existindo, não
existirá também o fato imponível que gerará a obrigação tributária. Mas se na
verdade houve uma dissimulação, digo, um negócio menos gravoso para encobrir
um negócio mais gravoso, valerá o negócio mais gravoso se não estiver viciado por
outros defeitos.
A dissimulação é uma espécie da simulação, porque dissimular também é
fingir e enganar, a diferença é que quando apenas crio uma irrealidade estou
simulando, quando simulo uma irrealidade para esconder uma realidade, estou
dissimulando, mas em ambos os casos estou fingindo, enganando ou simulando.
O restante do art. 167 do Código Civil Brasileiro expõe questões objetivas
para a identificação da simulação que será decidida por um juiz.
Por final e não menos importante o parágrafo único do art. 116 do código
tributário nacional mostra a sua obediência ao princípio da legalidade tributária
quando diz ser necessário que todo o procedimento pensado no dispositivo precisa
estar regulamentado por lei para ter plena eficácia.
Posto isso, juntamente com os capítulos anteriores concluímos que a lei anti-
elisão não pode ser assim chamada, pois percebe-se que o dispositivo é redundante
em repetir ações já abordadas e protegidas por outros diplomas legais, além de
promover ação ( dizer o que é o direito ) totalmente descabida a um servidor público,
pois a Constituição Federal confere apenas ao judiciário a competência para
PROCESSAR E JULGAR de forma definitiva e vinculante.
Portanto o parágrafo único do art. 116 do CTN é uma norma anti-evasão, e
não anti-elisão, pois busca coibir a ação daqueles que tem por objetivo pagar menos
tributo não como produto de um planejamento tributário lícito, mas como resultado
de ações já consideradas criminosas como por exemplo: a dissimulação.
22

5. A DIVERGÊNCIA ENTRE ELISÃO, EVASÃO E PLANEJAMENTO


TRIBUTÁRIO NA DOUTRINA TRIBUTÁRIA BRASILEIRA

Tudo, ou quase tudo posto, podemos concluir que para parte majoritária da
doutrina brasileira a elisão fiscal é a forma lícita de economia tributária que pode ser
ou não fruto de um trabalho de planejamento tributário.
Por outro lado a evasão fiscal é a forma ilícita de economia dos tributos que
se vale de ações consideradas criminosas pela lei tributária, civil e penal.
Ocorre que em ambos os casos o que se busca é a economia dos tributos,
ato que em se é constitucionalmente legal, pois o contribuinte pode buscar meios,
lícitos, para diminuir sua carga de tributos. Mas se desconsiderarmos os caminhos
para a busca da redução dos tributos, apenas hipoteticamente, a redução em si é
lícita. Porem a grande dicotomia é saber exatamente o que separam estes dois
institutos. Qual é o marco entre o lícito e o ilícito ?
Para a maioria dos juristas brasileiros a fronteira entre o legal e o ilegal, entre
o lícito e o ilícito está no fato gerador, mais precisamente na ocorrência ou não do
fato gerador. Para Ricardo Mariz de Oliveira e outros (MARTINS,2010) a Elisão
“decorre de ações ou omissões praticadas antes do fato gerador descrito em lei”, ou
seja, é dizer que o contribuinte praticou atos lícitos que impediram a formação do
fato inoponível, e logo da obrigação tributária. A Elisão fiscal será, portanto um
conjunto de atos, também chamados de Planejamento Tributário, que visa escolher
a melhor subsunção dos fatos à lei para um menor pagamento de impostos.
A economia fiscal só não será legítima se atuar após o nascimento da
obrigação fiscal, ou ainda, após o fato gerador da obrigação fiscal já ter se
aperfeiçoado, exceto é claro em situações estabelecidas em lei que permitam uma
mudança do contribuinte com a concomitante economia fiscal mesmo após a
concretude do fato gerador., p.ex: a legislação brasileira permite a PJ escolher ao
final do ano calendário se quer apurar seu imposto sobre a renda com base no lucro
real ou no presumido, adotando legalmente a forma menos onerosa.
23

6. A ELISÃO FISCAL EM ORDENAMENTOS ESTRANGEIROS

6.1. Estados Unidos da América

Nos Estados Unidos da America apesar da diferença no sistema jurídico,


Common Law 5(sistema americano) contra o Civil Law 6(sistema brasileiro) , a
dicotomia entre os termos existe, pois utiliza-se tax avoidance, que literalmente
traduzido significaria: anulação fiscal, para explicar o que temos chamado neste
trabalho de elisão fiscal e tax evasion para explicar a evasão fiscal.
Apesar de não se ter uma lei geral anti-evasão as normas que autorizam o
IRS – Internal Revenue Service ( a Receita Federal Americana ) a desconsiderar
alguns negócios jurídicos estão no IRC – Internal Revenue Code que é muito mais
um resultado de jurisprudência do que um trabalho legislativo.
Para formação desta jurisprudência a doutrina elenca cinco teorias
majoritárias que fundamentam as principais decisões dos tribunais e que municiam
magistrados e IRS a desconsiderar negócios jurídicos que tenham apenas objetivos
evasivos. São elas:
• A Substance Over Form – Teoria segundo a qual a substancia e
finalidade econômica do negócio valem mais do que a forma jurídica que
lhe foi dada.
• Step Transaction – Teoria pela qual a análise do negócio o
considera como parte ou um passo de uma cadeia complexa que visa a
evasão fiscal sem propósito econômico.
• Business Purpose – Teoria que considera o Propósito
Econômico do negócio, ou seja, analisa se a forma data para determinado
negócio guarda relação comercial com o negócio em se e com o negócio da
empresa.

5
No sistema Common Law as normas em sua grande maioria não estão codificadas e o sistema jurídico se vale
precipuamente das construções jurisprudenciais que servem de base inclusive para as instituições fazendárias na
elaboração da legislação tributária. Assim como as autoridades judiciárias as autoridades fazendárias analisam
caso a caso e buscam a harmonização das decisões com a manutenção dos interesses do Estado.
6
O sistema Civil Law adota a codificação como regra sem prejuízo das inúmeras leis esparsas e diferentemente
do sistema Common Law há uma estrita obediência ao princípio da legalidade e da legalidade tributária por
obrigar ao Estado vincular todas as suas ações a lei anterior que a autorize.
24

• Sham Transaction – Teoria que considera a fraude em seu


sentido strictu, pois fala de alteração da realidade fática de um négócio
específico com o fim de mascarar a realidade, ou seja, dissimulá-lo.
• Economic Substance – Teoria que desconsidera qualquer
negócio sem fins econômicos com o fim de simplesmente reduzir impostos,
p.ex: as deduções.

Destarte conclui-se que nos Estados Unidos da América a jurisprudência tem


maior valor que o princípio da legalidade, princípio este que é balizador para a não
aceitação destas teorias no direito pátrio brasileiro, pois em todos os casos não há
uma construção codificada em lei que torna um determinado fato como sendo
imponível ao fisco. Todas as análises da Receita e jurídicas são únicas e para um
determinado caso concreto, não significando decisão automática para outros
processos semelhantes, mas servindo como precedentes jurisprudenciais.
.(FGV,2012;JUNIOR,2005)

6.2. Inglaterra

Seguindo a mesma escola jurídica a Inglaterra também se pauta muito mais


pela jurisprudência do que pelas poucas normas esparsas na legislação tributária.
O código mais importante neste sentido é o COF9 – Code Of Pratice 9
editado pela HM Revenue & Customs (HMRC) que se trata de uma agencia, não
ligada diretamente ao governo executivo, de aplicação da lei tributária.
Os tribunais ingleses se orientam basicamente pela teoria do propósito
negocial, onde o que se busca é o objetivo econômico final e real do negócio e não a
forma jurídica que lhe é dada. Entretanto a vocação do povo Inglês causa um
verdadeiro paradoxo, pois apesar de se ter uma ampla jurisprudência apoiando a
aplicação da bussines purpose, a Inglaterra também é conhecida por seus paraísos
fiscais, o mais famoso: As Ilhas Cayman. Além de claramente apoiar os ricos e
famosos, mais famosos do que ricos, segundo alguns veículos de notícia7 jogadores
famosos montam estratégias para claramente pagarem menos impostos, mas não
são abordados por isso.

7
http://noticias.sapo.cvinfo/artigo/1047768.html
25

Conclusão, o governo inglês classifica de forma seletiva e sem critérios


objetivos o que ele considera ser elisão, digo lícito, e o que considera evasão ou
forma ilícita de não pagar impostos. (FGV,2012;JUNIOR,2005)

6.3. Alemanha

Para o governo Alemão existe claramente uma diferença entre elisão e


evasão. Tanto é que a Corte Constitucional alemã autoriza o contribuinte a planejar
e pagar menos imposto quando o faz de forma lícita. Esta ação é entendida como
sendo elisão, que apesar de não ser um crime pode ir além de seus propósitos
quando, na visão das autoridades, ultrapassa os limites dados por lei.
A elisão no direito alemão será caracterizada se a Receita Federal Alemã
constatar que o contribuinte se valeu de uma forma alternativa para atingir um
mesmo propósito negocial exclusivamente para diminuir a carga tributária, ou seja, é
dizer que o contribuinte não escolheria a forma alternativa se essa não lhe
proporcionasse única e exclusivamente a diminuição do imposto a pagar. A receita
alemã busca, apesar de ter como princípio a legalidade, inclusive em matéria
tributária, o fim econômico do contrato e faz com isso uma análise teleológica de
todo o negócio envolvido.
Por sua vez a evasão fiscal concretiza-se também pela economia de tributos,
porem com atos considerados criminosos. A evasão ocorrerá para o direito alemão
quando o contribuinte se valer de meios fraudulentos como a falsificação ou a
adulteração de documentos, omissão de fatos imponíveis a receita, alterações
fraudulentas de direito e de fato junto à receita promovidas por conluios de
funcionários públicos e contribuintes fraudadores. Estas ações são punidas inclusive
com prisão de até 10 anos para os envolvidos.
Conclusão, para o direito Alemão a elisão é lícita, porem não pode haver
abuso de suas possibilidades e formas. Pois caso aconteça será desconsiderada em
favor do fisco que irá reconhecer o propósito econômico do negócio envolvido e
aplicar a tributação que deveria ter sido paga pelo contribuinte na visão da receita.
Entretanto apesar de ser nestas circunstâncias algo ilícito, não é um crime, logo a
punição ficará na seara administrativa com o correto pagamento do imposto. Por
outro lado a evasão é crime, pois se vale de ações fraudulentas com o dolo de
26

burlar fatos e situações jurídicas visando entre outras coisas o pagamento a menor
de imposto. (FGV,2012;JUNIOR,2005)

6.4. França

Por leis e doutrinas o direito francês estabelece três institutos para explicar
elisão e evasão fiscal.
A chamada Fraude Fiscale é o que este trabalho tem classificado como
evasão fiscal, algo ilícito e taxativamente previsto no art. 64 do Livre de Procédures
Fiscales.8
Por outro lado o que temos chamado de elisão fiscal no Brasil, na França é
fruto de construção doutrinária e jurisprudencial e é chamada de Évasion Fiscale
que se divide em Habilité Fiscale, ação ilícita e Optimisation Fiscale, ação lícita.
A receita francesa tipifica um ato como sendo um ou outro pelo análise de
caso a caso e a conclusão de que o contribuinte cometeu abuso de direito por meio
de um acte de anormal, ou seja, um ato de administração anormal para o negócio
em tela.
O contribuinte tem amplo direito de defesa, porem cabe a ele desconstituir
com provas sólidas a construção da receita e provar que sua ação foi legítima e não
visou apenas a diminuição dos tributos. (FGV,2012;JUNIOR,2005)

6.5. Argentina

Apesar da influência comum dos doutrinadores do direito europeu sobre o


direito tributário argentino e brasileiro, a argentina adota teorias claramente
diferentes das nossas quando o assunto é elisão e evasão fiscal.
As leis argentinas 11.683/98 e 24.769/96 classificam a evasão como sendo
ilícita e o resultado do abuso de direito.
A Elusion também considerada ilícita esta baseada no abuso da forma jurídica
dada ao negócio que poderá ser desconsiderado pela receita com base na análise
completa de todo o negócio.

8
Acessado em:
http://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do;jsessionid=E1D6126B10A245B52A61328944B2287B.tpdjo03v_3
?idSectionTA=LEGISCTA000006180145&cidTexte=LEGITEXT000006069583&dateTexte=20131230. Em
30/12/2013
27

Por final a elisão chamada de Economias de Opcion são formas lícitas de


planejamento tributário que se valem do direito que o contribuinte tem de escolher
seus negócios com o menor custo possível, inclusive o fiscal.
Entretanto a aplicação de técnicas de elisão, digo lícitas, por parte dos
contribuintes não muda o poder da Receita Argentina que de acordo com o artigo
primeiro e segundo da lei 11.683/989 poderá, adotando teorias como a da realidade
econômica, a teoria da ineficácia fiscal das formas jurídicas inadequadas, a teoria da
interpretação teleológica ou a da consideração econômica, desconstruir a forma
jurídica dada a um determinado negócio e cobrar o imposto de acordo com o fim
econômico do contrato.
O contribuinte argentino não tem definido na constituição do país quais são os
impostos a serem pagos, cada província produz o seu código fiscal, sem entretanto
esquecer do único princípio constitucional aplicável ao caso, o art. 16 da constituição
argentina que diz:

Artículo 16

9
DISPOSICIONES GENERALES

Principio de Interpretación y Aplicación de las Leyes

ARTICULO 1º — En la interpretación de las disposiciones de esta ley o de las leyes


impositivas sujetas a su régimen, se atenderá al fin de las mismas y a su significación
económica. Sólo cuando no sea posible fijar por la letra o por su espíritu, el sentido o alcance
de las normas, conceptos o términos de las disposiciones antedichas, podrá recurrirse a las
normas, conceptos y términos del derecho privado.

ARTICULO 2º — Para determinar la verdadera naturaleza del hecho imponible se atenderá a


los actos, situaciones y relaciones económicas que efectivamente realicen, persigan o
establezcan los contribuyentes. Cuando éstos sometan esos actos, situaciones o relaciones a
formas o estructuras jurídicas que no sean manifiestamente las que el derecho privado ofrezca
o autorice para configurar adecuadamente la cabal intención económica y efectiva de los
contribuyentes se prescindirá en la consideración del hecho imponible real, de las formas y
estructuras jurídicas inadecuadas, y se considerará la situación económica real como
encuadrada en las formas o estructuras que el derecho privado les aplicaría con
independencia de las escogidas por los contribuyentes o les permitiría aplicar como las más
adecuadas a la intención real de los mismos.
28

(.....)... La igualdad es la base del impuesto y de las cargas públicas.


(ARGENTINA, 1994)

Para os argentinos é necessário que se tenha equilíbrio na cobrança dos


impostos, equilíbrio este que não será imposto por comandos constitucionais
objetivos, mas pela interpretação da Receita que invariavelmente tenderá cada vez
mais a aumentar a arrecadação dos cofres públicos. (FGV,2012;JUNIOR,2005)

6.6. Portugal

Para o direito português assim como para o brasileiro não há uma


uniformidade entre os termos elisão e evasão, mas majoritariamente o termo elisão
denota a pratica de atos lícitos para fazer a poupança fiscal e evasão os atos ilícitos
para a formação da poupança fiscal.
A Lei Geral Tributária portuguesa diz em seu art. 8º que o fisco português
deve estrita obediência ao princípio da legalidade. O art. 11 proíbe qualquer
interpretação analógica ou extensiva da lei tributária, mas aceita que não tendo
legislação pertinente ao tema poderá ser feita uma interpretação direcionada à
substância econômica do negócio.
Os artigos 38 e 39 da mesma lei diz in verbis:

Artigo 38.º
Ineficácia de actos e negócios jurídicos
1 - A ineficácia dos negócios jurídicos não obsta à tributação, no momento em
que esta deva legalmente ocorrer, caso já se tenham produzido os efeitos económicos
pretendidos pelas partes.
2 - São ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial
ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das
formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam
devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou
à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem
utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas
aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas.
(Lei n.º 30-G/2000 de 29 de Dezembro)
Artigo 39.º
Simulação dos negócios jurídicos
1 - Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio
jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado.
29

2 - Sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente


atribuídos à administração tributária, a tributação do negócio jurídico real constante de
documento autêntico depende de decisão judicial que declare a sua nulidade.
(PORTUGAL,1998)

Na mesma linha de raciocínio pensam os Tribunais Administrativos para


assuntos Tributários. O fragmento do acórdão abaixo demonstra a ideia:

Tribunal Central Administrativo Sul de Portugal


Processo: 04255/10
Secção:15/02/2011

Relator: JOSÉ CORREIA

Ementas: NORMAS ANTI-ABUSO. RAZÃO DE SER E ÂMBITO DE


APLICAÇÃO.
IRC. ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL.
CADUCIDADE. PRINCÍPIO DA BOA FÉ.
ELEMENTOS DAS NORMAS ANTI- ABUSO.
CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS ANTI -ABUSO ÍNSITAS NO
ARTº 38º Nº 2 DA LGT.

(.....)
.
.
IV) -A evasão ou elisão fiscal, dá-se pela prática de actos ou
negócios lícitos mas que a lei fiscal qualifica como não sendo conformes
com a substância da realidade económica que lhe está subjacente, assim
devendo qualificar-se como anómalos, anormais ou abusivos, sendo
também caracterizados como comportamentos "extra legem", em
contraposição com a via da fraude fiscal, caracterizada como "contra legem"
e dos comportamentos tributários evasivos resulta um sério entrave à
concorrência empresarial, uma notória erosão das receitas fiscais, ...... as
formas utilizadas giram em torno de actos e contratos atípicos ou anormais
visando tornear a lei (vg. utilização do regime especial de tributação dos
grupos de sociedades - art°.63 e seg. do C.I.R.C. - através da produção de
30

menos-valias ou da utilização de benefícios fiscais através da transmissão


de prejuízos) ou interpretando-a com fins diversos daqueles que o legislador
tinha em mente, designadamente aproveitando-se da existência de
jurisdições fiscais diferentes para escolher, apenas por motivações de
diminuição do imposto a pagar, a localização mais favorável para a
residência de pessoas singulares ou colectivas ou para nelas instalar
"estruturas" que não desempenham outra função que não seja permitirem
essa diminuição.
V) -A fraude fiscal consiste na realização de actos ou negócios ilícitos
frontalmente contrários à lei fiscal, por isso mesmo também designados
como "contra legem", sendo deles exemplo a não entrega ao Estado dos
tributos cobrados a terceiros, a obtenção de reembolsos de tributos
indevidos, a alteração ou ocultação de factos ou valores que devam constar
de livros de contabilidade ou de declarações fiscais, ou a existência de
negócios simulados, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza.
(....)
.
.

(PORTUGAL,2011)

Em virtude do exposto conclui-se que a lei portuguesa aceita o planejamento


tributário, mas não aceita atos e negócios jurídicos que tenham como objetivo único
ou principal a diminuição dos tributos a serem pagos principalmente por meios
anômalos ou anormais e que a lei ou jurisprudência já entendam como sendo
artificiosos ou fraudulentos contra o fisco. (FGV,2012;JUNIOR,2005)
31

7. A ELISÃO NA PRÁTICA EMPRESARIAL

Na prática empresarial a elisão fiscal, ou seja, a diminuição lícita da carga


tributária, faz parte da rotina do administrador de empresas, do contador e do
advogado tributarista. Implementá-la pode significar a diferença entre a economia
ou não de milhares de reais, entre a viabilidade ou não de um negócio.
Em um case retratando uma venda de uma empresa no Brasil é possível
perceber que uma simples decisão, fruto de planejamento tributário, resultou em
uma economia de mais de R$ 300.000,00..
O estudo tributário foi solicitado e elaborado em função da venda de uma
empresa do setor hospitalar pelo valor aproximado de R$ 24.000.000,00 ( vinte e
quatro milhões de reais ). A dúvida que se tinha era: qual a melhor e lícita forma de
efetuarem o negócio, com a menor carga tributária para todos os envolvidos?
O estudo feito por empresa especializada em planejamento tributário
demonstrou que se o negócio fosse feito nos moldes acordados, ou seja, como uma
simples venda das participações acionárias da empresa, a carga tributária chegaria
a incríveis 78%* de alíquota conforme escalonamento demonstrado abaixo.
SITUAÇÃO ATUAL

1ª SITUAÇÃO

Descrição da Receita Valor Imposto Incidente Alíquota Valor do Imposto


IR SOBRE AUMENTO DE
Valor da Venda R$ 24.000.000,00 15 R$ 3.600.000,00
CAPITAL
IR SOBRE AUMENTO DE
Fundo de Reestruturação R$ 1.309.104,38 15 R$ 196.365,66
CAPITAL
Retirada Pro-Labore a ser
R$ 775.895,62* INSS EMPRESA 20 R$ 155.179,12
distribuída
INSS SÓCIO 11 R$ 85.348,52
IRPF 27,5 R$ 213.371,30

TOTAL DE
TRIBUTOS R$ 4.250.264,59
PARA OS SÓCIOS
FONTE: AUTOR

Sobre o valor da venda de R$ 24.000.000,00 incidiria 15% de imposto de


renda que seriam pagos por cada um dos sócios sobre o aumento de capital. Sobre
32

estes valores haveria deduções, entretanto o bruto descontado continuaria na casa


dos 15% do valor recebido.
Sobre o valor de R$ 1.309.104,38, ( Um milhão, trezentos e nove mil, cento e
quatro reais e trinta e oito centavos ) que é composto pela soma do fundo de
reestruturação da empresa de R$ 795.715,57 ( Setecentos e noventa e cinco mil e
setecentos e quinze reais e cinquenta e sete centavos ) mais R$ 513.388,81 (
Quinhentos e treze mil, trezentos e oitenta e oito reais e oitenta e um centavos ) de
outras receitas também incidiria a alíquota de 15% a título de imposto de renda
sobre o aumento de capital.
Em ambos os casos a legislação vigente10 (BRASIL,2001) obriga aquele que
tem um aumento de capital pela alienação de bens ou direitos, neste caso, direitos,
que calcule e recolha o imposto devido em até 30 dias.
Por final os sócios receberiam o saldo das aplicações, no valor de R$
775.895,62 como pagamento de retirada pró-labore. Sobre esse valor incidiria a
maior carga tributária da negociação: sendo 20% do INSS da empresa, 11% do

10
Estão sujeitas à apuração de ganho de capital as operações que importem:
I - alienação, a qualquer título, de bens ou direitos ou cessão ou promessa de cessão de direitos à
sua aquisição, tais como as realizadas por compra e venda, permuta, adjudicação, desapropriação,
dação em pagamento, procuração em causa própria, promessa de compra e venda, cessão de
direitos ou promessa de cessão de direitos e contratos afins;
II - transferência a herdeiros e legatários na sucessão causa mortis, a donatários na doação,
inclusive em adiantamento da legítima, ou atribuição a ex-cônjuge ou ex-convivente, na dissolução da
sociedade conjugal ou união estável, de de bens e direitos por valor superior àquele pelo qual
constavam na Declaração de Ajuste Anual do de cujus, do doador, do ex-cônjuge ou ex-convivente
que os tenha transferido;
III - alienação de bens ou direitos e liquidação ou resgate de aplicações financeiras, de propriedade
de pessoa física, adquiridos, a qualquer título, em moeda estrangeira.
(Instrução Normativa SRF nº 118, de 27 de dezembro de 2000; Instrução Normativa SRF nº 84,
de 11 de outubro de 2001, art. 3º)
Art. 30 . O imposto devido sobre os ganhos de capital de que trata esta Instrução Normativa deve ser
pago pelo:
I - alienante, se residente no País;
II - procurador do alienante, em nome deste, se este for não-residente no País;
III - inventariante, em nome do espólio, nos casos de transferências causa mortis;
IV - doador, no caso de doação, inclusive em adiantamento da legítima;
V - ex-cônjuge ou ex-convivente a quem, na dissolução da sociedade conjugal ou da união estável,
for atribuído o bem ou direito objeto da tributação;
VI - cedente, na cessão de direitos hereditários.
§ 1º Na hipótese do inciso II do caput, quando o alienante não for inscrito no Cadastro das Pessoas
Físicas (CPF), no Darf é indicado o número de inscrição do procurador.
§ 2º Na hipótese do art. 22, o imposto é recolhido em nome de cada cônjuge, na proporção de
cinqüenta por cento para cada um, ou em nome de um deles, pela totalidade.
§ 3º O pagamento do imposto é efetuado:
I - até o último dia útil do mês subseqüente àquele em que o ganho houver sido percebido, na
hipótese do inciso I do caput;
33

INSS dos sócios e 27,5% de imposto de renda retido na fonte de cada um dos
sócios.
Sobre o INSS dos sócios haveria deduções se o valor já tivesse sido
recolhido, daí o valor de 11% não se aplicaria. No caso de pagamento a maior a
quantidade paga poderia ser restituída.
Somando todas as despesas tributárias chegaremos ao valor absoluto de R$
4.250.264,59 ( quatro milhões, duzentos e cinquenta mil, duzentos e sessenta e
quatro reais e cinquenta e nove centavos ) de impostos a pagar, ou seja, 16,29%
dos R$ 26.085.000,00 a serem distribuídos entre os sócios.
O Planejamento Tributário proposto indicou uma alteração na forma de se
fazer os pagamentos que permitiria uma economia na ordem dos R$ 300.000,00 (
Trezentos mil reais ) com as obrigações tributárias.
A proposta alterou o formato da negociação de um negócio para dois. Num
primeiro ato o interessado na compra foi admitido na sociedade com uma
quantidade de cotas pequenas. Num segundo ato o sócio admitido tornou-se o sócio
remanescente por comprar todas as cotas dos demais sócios e ficar como único
proprietário da empresa. Tal ação substituiria o negócio único de compra e venda da
sociedade por uma admissão de sócio seguida por uma transferência total das cotas
dos demais sócios ao admitido.
Para a operacionalização do planejamento foram transferidos o saldo
aplicado de R$ 775.895,62 como saldo positivo de caixa ao sócio remanescente em
troca do aumento do valor da venda de R$ 24.000.000,00 para R$ 24.775.895,62
que não iria gerar aumento de tributos para os promitentes compradores, mas
proporcionaria aos promitentes vendedores uma economia de R$ 337.514,59(
trezentos e trinta e sete mil e quinhentos e quatorze reais e cinquenta e nove
centavos ) em valores absolutos conforme quadro abaixo.

SITUAÇÃO PROPOSTA

2ª SITUAÇÃO

Descrição da Receita Valor Imposto Incidente Alícota Valor do Imposto


IR SOBRE AUMENTO DE
Valor da Venda R$ 26.085.000,00 CAPITAL 15 R$ 3.912.750,00
34

TOTAL DE
TRIBUTOS R$ 3.912.750,00
PARA OS SÓCIOS

ECONOMIA FISCAL
TOTAL DE IMPOSTOS DA SITUAÇÃO 1 MENOS TOTAL DE
R$ 337.514,59
IMPOSTOS DA SITUAÇÃO 2
FONTE: AUTOR

O planejamento demonstrado acima não se tratou de uma estratégia de


evasão fiscal, que é ilegal, mas de elisão fiscal, ou seja, o planejamento tributário
legal para se pagar a menor quantidade possível de tributos, pois apesar do
pagamento dos tributos cumprirem uma função social, a majoração cada vez maior
dos valores cobrados e a má utilização dos recursos por parte dos governos induz
cada vez mais a sociedade civil organizada a procurar meios legais de melhor
aplicar seus recursos.
35

8. CONCLUSÃO

Os princípios constitucionais da livre iniciativa e da legalidade garantem que é


direito do cidadão brasileiro elidir seus impostos por meios legais por impedir a
concretização do fato gerador da obrigação fiscal. É direito do contribuinte se valer
da lei e não pagar impostos que não estejam previstos em lei. É direito do
contribuinte escolher qual negócio irá praticar para atingir seus fins econômicos
desejados, desde que sejam lícitos, pagando a menor carga tributária. É vedado à
receita usar de meios extra-legens para exigir impostos que os contribuintes não
devem pagar.
É possível concluir que no Brasil não havia a necessidade de mais um
dispositivo legal anti evasão, pois os já existentes eram suficientes para coibir a
evasão fiscal, pois o código tributário nacional juntamente com o código civil, sempre
sob a guarda da constituição federal já preveem os vícios dos negócios jurídicos que
os invalidam e os tornam susceptíveis de nova avaliação pelo fisco.
O parágrafo único do artigo 116 do código tributário nacional acrescentado
pela lei complementar 104 de 10 de janeiro de 2001 mostra-se constitucionalmente
questionável quando delega a autoridades administrativas o poder de processar,
julgar e desconstituir negócios que segundo a opinião da Receita foram constituídos
com o fim de diminuir a carga tributária, como se ilícito fosse querer pagar menos
imposto.
O parágrafo peca, constitucionalmente falando, quando permite que questões
subjetivas relacionadas ao contribuinte sejam avaliadas pela mesma autoridade
administrativa que cobra os impostos. Ainda que tudo seja regulamentado por lei
fere-se o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório quando dá ao
mesmo servidor ou órgão que cobra a exação a competência de julgar se a ação ou
omissão do contribuinte é um ato de evasão ou de elisão fiscal. Como dito no início
deste trabalho a necessidade do governo executivo equilibrar as contas públicas
aumentando cada vez mais suas receitas por arrecadar cada vez mais o coloca no
mínimo como suspeito e na prática como impedido de julgar se as ações dos
contribuintes são ações ou omissões elisivas ou evasivas.
Dizer com clareza se as ações do contribuinte são evasivas ou elisivas é
separar o enorme universo de contribuintes entre aqueles que se planejam
36

licitamente para pagar menos impostos e aqueles que também se planejam


ilicitamente para pagar menos impostos.
Fica claro então que quando se consegue planejar as ações anteriores ao fato
inoponível de tal forma a controlar qual fato ocorrerá e quando ocorrerá, o
contribuinte exerce seu direito constitucional da livre iniciativa que lhe garante o
direito de conduzir seus negócios da melhor forma que lhe aprouver. É legal decidir
retardar, praticar ou não o fato gerador, ou seja, é legal praticar a elisão fiscal e
pagar menos imposto.
Por outro lado torna-se ilegal a ação do contribuinte quando se valendo de
meios fraudulentos ou artificiosos simula ou dissimula os negócios jurídicos na
tentativa de esconder a realização do fato gerador já concretizado procurando para
tal falsear os elementos constitutivos da obrigação tributária. Tais ações são
criminosas e são corretamente conceituadas como evasão fiscal, ou seja, o ato ilícito
de planejar e pagar menos impostos.
Por final conclui-se que apesar de uma alta carga de tributos e um complexo
sistema tributário, cases de sucesso provam que é possível planejar suas ações e
legalmente pagar menos impostos no Brasil e no mundo, ainda que as receitas
fazendárias dos estados soberanos insistam em descumprir preceitos
constitucionais que garantem a todos os contribuintes a livre iniciativa lícita para
constituir e fazer seus negócios da melhor forma possível, não sendo nada vedado
se não houver lei que o faça.
37

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