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Simples Nacional: noções gerais e

aspectos relevantes

José Hable
Auditor Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal. Conselheiro e
Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais. Mestre em Direito Internacional
Econômico. Pós-Graduado em Direito Tributário. Graduado em Direito, Administração de
Empresas e Agronomia. Professor de Pós-Graduação e Graduação. Autor de Livros.

Ana Cláudia Amorim de Medeiros


Auditora Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal.

Cordélia Cerqueira Ribeiro


Auditora Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal. Conselheira do
Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais. Graduada em Direito.

Raimunda Moura dos Santos Amaral


Auditora Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal.

Silvino Nogueira Filho


Auditor Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal.

Palavras-chave: Simples Nacional. Sistema Tributário Nacional. Microempresas. Pequenas empresas.


Sumário: 1 Introdução – 2 Histórico normativo do tratamento diferenciado e favorecido à microempresa e
empresa de pequeno porte – 3 Simples Nacional – 4 A Lei Complementar nº 147/2014 – 5 Conclusões
– Referências

1 Introdução
O Brasil é conhecido, no mundo todo, como um país de grandes desigualdades
sociais. E, nas palavras de Victor Barau,1 um dos principais motivos desse fato está
no seu “ineficiente e injusto sistema tributário, o qual está para ser reformado desde
que me entendo por gente”.

1
BARAU. (s.d.).

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O Sistema Tributário Nacional (STN) é regulado tendo por base a Constituição


Federal de 1988 (CF/88), mais especificamente seus arts. 145 a 162, que t­rata, no
Capítulo I do Título VI, do Sistema Tributário Nacional, e o Código Tributário Nacional
(CTN), Lei Ordinária nº 5.172/1966, recepcionada como lei complementar (LC)
pela CF/88, nos termos do art. 34, §5º, do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT).
O STN abrange cinco espécies de tributos (imposto, taxa, contribuição de me-
lhoria, empréstimo compulsório e contribuições especiais ou parafiscais), com a prin-
cipal função de arrecadar recursos financeiros para custear as atividades do Estado
na busca da promoção do bem comum.
Defende-se que o STN ideal seria aquele que promove as justiças fiscal e social
com o objetivo de “viabilizar os objetivos fundamentais da República previstos no
artigo 3º da Constituição Federal”.2
É cediço que, no STN brasileiro, as escolhas políticas das bases econômicas
de incidência tributária privilegiam o consumo e a renda dos indivíduos, desonerando
o capital, o lucro e o patrimônio.3 Essa menor participação na tributação sobre o
patrimônio, a exemplo do IPTU, sem dúvida exprime uma preferência do próprio ente
tributante arrecadador ao exigir e cobrar determinados impostos denominados indi-
retos, que, apesar de terem pior qualidade no que se refere à justiça fiscal, são de
mais fácil arrecadação, pois demandam menor reação negativa da população, além
de possuírem uma produtividade fiscal mais elevada.4 Temos como exemplo desses
impostos o ISS e o ICMS, que já vêm embutidos seus valores no próprio preço do
serviço ou mercadoria, passando, por vezes, desapercebidos pela grande maioria da
população.
Nesse caminhar, algumas afirmações, bastante corriqueiras, podem ser coloca-
das, em que se diz que:
1) O tributo é algo necessário e imprescindível à sociedade!
2) O tributo é a principal fonte de recursos para a sociedade!
3) Ninguém gosta de pagar tributos!
4) A carga tributária é muito elevada!
5) O sistema tributário nacional é complexo e injusto!
6) A insatisfação da sociedade é grande pela má-qualidade dos serviços públi-
cos prestados!
Diante de todo esse arcabouço de afirmações, no ano de 1988, com a promul-
gação da Constituição Federal, buscou-se mudar esse panorama no que se refere às
microempresas (ME) e pequenas empresas (EPP), direcionando a elas uma tributação
mais simplificada, unificada e justa para lhes oferecer maior competitividade frente

2
MARANHÃO. 2010.
3
FERREIRA. 2010.
4
TEXTO PARA DISCUSSÃO nº 583. 1998.

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

às demais empresas por meio de um tratamento jurídico diferenciado, que procura


incentivar a simplificação de obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e
creditícias. Assim, criou-se um sistema denominado Simples Nacional, que, de início,
já se pode afirmar, “de simples não tem nada”, ou ainda, “pode ser tudo, menos
simples”.
O Simples Nacional consiste, então, em um sistema de tributação diferenciado,
simplificado e favorecido, que consolida, em um único recolhimento, diversos tributos
federais (IRPJ, CSL, PIS, COFINS, IPI e contribuição previdenciária patronal), estadu-
ais (ICMS) e municipais (ISS), facilitando a vida das microempresas e das empresas
de pequeno porte.5
Neste trabalho, serão colocados e discutidos alguns pontos de relevância re-
lacionados ao Simples Nacional, principalmente quanto à sua legislação, com o his-
tórico normativo, o alcance do conjunto normativo, os questionamentos jurídicos de
sua validade, a fiscalização e o contencioso administrativo e suas competências, a
inscrição do débito na dívida ativa e sua execução judicial. Também serão abordados
o microempreendedor individual e as empresas do Simples Nacional envolvidas nas
operações com ICMS e substituição tributária, entre outros.
Seu objetivo principal, então, é dar uma noção geral do que trata a LC
nº 123/2006, trazendo à discussão aspectos da lei que impactam no seu sistema
de tributação, o Simples Nacional, arrecadação e controles de fiscalização, cobrança,
parcelamento e organização administrativa (principalmente frente às recentes altera-
ções introduzidas pela LC nº 147/2014), além de contextualizar a situação no Distrito
Federal, apontando os principais problemas existentes e sugerir soluções.

2  Histórico normativo do tratamento diferenciado e favorecido


à microempresa e empresa de pequeno porte
Ensina Leandro Pausen6 que, mesmo antes da CF/88, a legislação já previa
tratamento especial, simplificado e privilegiado para as microempresas, incluídas as
obrigações acessórias. Nesse sentido, para melhor compreensão sobre o tema, apre-
sentamos a evolução da legislação pertinente:
1. Lei nº 7.256/1984, que estabeleceu normas integrantes do Estatuto da
Microempresa visando dar tratamento diferenciado, simplificado e favorecido também
no campo tributário.
2. Lei nº 8.864/1994, conforme art. 179 da CF/88, sem revogar expressa-
mente a Lei nº 7.256/84, que estabeleceu normas para ME e para a EPP relativas
ao tratamento diferenciado e simplificado, inclusive no campo fiscal, previdenciário
e trabalhista.

5
CRECI-SE. (s.d.).
6
PAUSEN. 2014, p. 100.

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3. Lei nº 9.317/1996, conforme art. 179 da CF/88, que instituiu o Sistema Inte­
grado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de
Pequeno Porte, chamado de Simples Federal ou só Simples.
4. Lei nº 9.841/1999, que instituiu o Estatuto da ME e da EPP, regulamentando
os artigos 170 e 179 da CF/88, e deixou de cuidar das questões tributárias, tendo
expressamente preservado o Simples.
5. LC nº 123/2006, que institui o Estatuto da ME e EPP, estabelecendo normas
gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado à ME e EPP,
com entrada em vigor em 1º.6.2007.
6. LC nº 128/2008, que institui, para fins de enquadramento no Simples
Nacional, nova redação e revoga alguns preceitos da LC nº 123/06, criando a figu-
ra do microempreendedor individual (MEI) e incluindo dentro do Simples Nacional o
Estatuto do ME, que passou a dar um tratamento diferenciado voltado para o micro-
empreendedor individual.
7. LC nº 147/2014, que, buscando melhorar as condições das micro e peque-
nas empresas e beneficiar outras, ampliando assim o rol de beneficiários do Simples
Nacional, alterou a LC nº 123/2006 e trouxe uma nova sistemática ao estabelecer
novos procedimentos.
Observe-se que, desde 1984, sem qualquer previsão constitucional, já era pre-
ocupação do Governo Federal incentivar as microempresas, proporcionando-lhes um
tratamento diferenciado e mais simplificado em busca do crescimento econômico.
Paulatinamente, acompanhando o crescimento do país e da economia e as con-
sequentes necessidades de seu fomento, com uma participação cada vez maior das
ME e EPP na geração de empregos, o Estatuto da Microempresa inicialmente existen-
te foi criando corpo até chegar no atual Estatuto, instituído pela LC nº 123/2006, o
qual contempla atualmente a ME, a EPP e, ainda, mais recentemente, o MEI.
De acordo com o SEBRAE, as ME, EPP e MEI congregam 99,2% das empresas
do país e são responsáveis por cerca de 60% dos empregos gerados e por 20% da
composição do PIB, motivo indiscutivelmente suficiente para justificar o tratamento
favorecido como forma de fomentar a economia em busca de maior equilíbrio fiscal.

2.1  Fundamentos constitucionais e polêmicas decorrentes


Devido à necessidade e importância já comentadas acima, a CF/88, em seu
texto original, previu a obrigatoriedade de dispensar às ME e EPP tratamento diferen-
ciado, visando incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas,
tributárias, previdenciárias e creditícias nos termos de seu art. 179.7

7
CF/88. “Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às
empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

Em 1995, por meio da Emenda Constitucional (EC) nº 6, foi introduzido o inciso


IX ao art. 170,8 também exigindo tratamento favorecido para as EPP, constituídas sob
as leis brasileiras, com suas sede e administração no país.
E finalmente, com a EC nº 42/2003, foram incluídos a alínea “d” e o parágra-
fo único ao art. 1469 da CF/88, estabelecendo o atual regramento do tratamento
dispensado às ME e EPP: exigência de lei complementar para definir o tratamento
diferenciado e favorecido, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do
ICMS e das contribuições sociais (art. 195, I, §§12 e 13); e, ainda, para definir re-
gime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do
Distrito Federal (DF) e dos Municípios.
A mesma EC nº 42 acrescentou ainda ao ADCT o art. 94,10 estabelecendo que
todos os regimes especiais de tributação existentes, tanto da União quanto dos
Estados, DF e Municípios, perderiam a vigência a partir da entrada em vigor do regime
previsto no art. 146, III, “d”, da CF/88, o que se deu em 1º.7.2007.
Tão logo a LC nº 123/2006 entrou em vigor e um ano após sua publicação,
instituindo o Simples Nacional, nos termos exigidos pelo art. 146, III, “d”, da CF/88,
acima citado, foram inúmeros os questionamentos jurídicos sobre a sua constitu-
cionalidade, tendo as ADIs como principais fundamentos a afronta aos princípios da
isonomia e do pacto federativo.
Tem-se como exemplos a ADI nº 4.033/DF, de 2008, proposta pela Confederação
Nacional do Comércio, e a ADI nº 3.910/2007, proposta pela Federação Brasileira de
Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (FEBRAFITE), esta sob a alegação de
afronta ao princípio do pacto federativo, ou seja, à autonomia financeira e tributária

pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela


eliminação ou redução destas por meio de lei.”
8
CF/88. “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem
por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que
tenham sua sede e administração no país. (Redação dada pela EC 6/1995).”
9
CF/88. “Art. 146. Cabe à lei complementar: III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre: d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as
empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no
art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§12 e 13, e da contribuição a que se refere o art.
239. (incluído pela EC 42, de 19.12.2003) Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d,
também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: (incluído pela EC 42, de 19.12.2003). I - será opcional
para o contribuinte; II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado;
III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos
respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; IV - a arrecadação,
a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional
único de contribuintes.”
10
CF/88. ADCT. “Art. 94: “Os regimes especiais de tributação para microempresas e empresas de pequeno
porte próprios da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cessarão a partir da entrada em
vigor do regime previsto no art. 146, III, d, da Constituição.”

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dos Estados, DF e Municípios, a quem caberia a instituição e manutenção dos regimes


de benefícios ou incentivos tributários destinados aos contribuintes enquadrados
como ME e EPP.
Com relação à primeira ADI, já houve decisão do Supremo Tribunal Federal (STF),
acórdão publicado no DJ em 7.2.2011, nos termos do voto do Min. Rel. Joaquim
Barbosa, o qual defendeu haver pertinência temática entre o benefício e o regime
diferenciado de tributação, que a lista de tributos previstos no art. 146, III, “d”, é
exemplificativa, devendo a interpretação ao dispositivo ser sistemática e teleológica,
c/c art. 170, IX; explica-se também que não há violação ao princípio da isonomia e
que o fomento da ME e EPP foi elevado à condição de princípio constitucional.
Já em relação à segunda ADI, que possui como relator o Min. Gilmar Mendes,
ainda não houve decisão, nem mesmo sobre o pedido de liminar existente. O que
se tem nesta ADI é a manifestação do Ministério Público da União (MPU) pelo não
conhecimento da ação, por entender não ter a FEBRAFITE legitimidade para propô-la
(falta de pertinência temática) e, no mérito, pelo desprovimento da ação, em ampla
defesa da LC nº 123 e EC nº 42.
Vê-se que, embora a matéria seja polêmica, o STF já se posicionou pela sua
constitucionalidade, tanto da LC nº 123/2006 quanto das alterações introduzidas
pela EC nº 42/2003.

2.2  Abrangência e natureza jurídica da Lei Complementar


nº 123/2006
A abrangência da LC nº 123/2006 decorre exatamente do seu fim de propor-
cionar às ME e EPP total desenvolvimento, com todas as facilidades e simplificação
possível, o que envolve todas as áreas de atuação da sociedade empresária.
A mencionada LC alterou regras do Código Civil, do CTN, da Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), da Lei das Licitações e de diversos outros diplomas legais,
materiais e processuais que interferem decisivamente no cotidiano dos empresários.
A LC trata, assim, da instituição de tratamento tributário diferenciado, inclusive
obrigações acessórias, o Simples Nacional; do acesso ao crédito e ao mercado, inclu-
sive na preferência de bens e serviços, tecnologia, associativismo e regras de inclu-
são; cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive obrigações
acessórias; e ainda, do cadastro nacional único de contribuintes, matéria introduzida
mais recentemente pela LC nº 147/2014.
Observe-se que o conjunto normativo contempla também normas de natureza
formal e processual para compor o instrumental necessário às administrações tribu-
tárias para darem execução ao objetivo da lei.
Quanto à natureza jurídica, a LC nº 123/2006 caracteriza-se por ser lei com-
plementar, matéria reservada pela CF/88 e aprovação por maioria absoluta de cada

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

casa do Congresso Nacional; nacional, que impõe observância a todos os entes da


federação; e especial, que prevalece sobre a lei geral.
Isso significa, portanto, que, em caso de conflito entre a LC nº 123/2006 e
outras leis complementares, a exemplo do CTN, ou mesmo entre ela e outras leis
ordinárias, a exemplo da lei de licitações, estas serão derrogadas pelo critério da
posteridade e da especialidade. Contudo, como a abrangência da LC nº 123 é ampla,
matérias não reservadas constitucionalmente à lei complementar poderão ser altera-
das por lei ordinária, como expressamente prevê o seu art. 86.11

3  Simples Nacional
Simples Nacional é o regime de tributação opcional, favorecido e especial, insti-
tuído pela LC nº 123/2006, por força do art. 146, III, “d”, parágrafo único da CF/88.
É destinado exclusivamente às ME e EPP que não incorrerem nas vedações previstas
na mesma lei.
É oficialmente denominado de Regime Especial Unificado de Arrecadação de
Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno
Porte. Foi assim apelidado de SUPERSIMPLES.
Marins e Bertoldi (2007) entendem que o Simples Nacional é “a mais impor-
tante iniciativa de ‘reforma tributária’ ocorrida no Brasil desde a promulgação da
Constituição de 1988”. Defendem que o exame do Simples Nacional e a experiência
decorrente de sua aplicação prática “podem significar novas balizas conceituais e
técnicas para o Sistema Tributário Nacional, inclusive do ponto de vista constitucio-
nal” em virtude de sua influência direta sobre todas as esferas de Governo – federal,
estadual, distrital e municipal.
Questão interessante é que uma empresa pode ser enquadrada como ME e EPP
no Estatuto, de acordo com os limites estabelecidos no art. 3º da LC nº 123/2006,
sem ser optante pelo Simples Nacional, ou seja, pode usufruir dos demais benefícios
da lei e ter um regime normal de tributação.
O Simples Nacional não é um novo tributo, mas, sim, um regime de tributação
que permite ao optante recolher até oito tributos já existentes em um único cálculo
e guia, que são: IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, IPI, Contribuição Patronal Previdenciária
(CPP), ICMS e ISS. Cumpre salientar, contudo, que muitas das hipóteses de incidên-
cia desses tributos estão fora do Simples, a exemplo do IR incidente no ganho de
capital, aplicações financeiras, tributação definitiva; ICMS, na ST e na importação;
PIS, COFINS e IPI, na importação; contribuição previdenciária do empregado, do sócio
ou titular, etc.

LC nº 123/2006. “Art. 86. As matérias tratadas nesta Lei Complementar que não sejam reservadas cons­
11

titucionalmente a lei complementar poderão ser objeto de alteração por lei ordinária.”

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Do ponto de vista operacional, vale destacar, dentre outros, que a fiscalização


do Simples Nacional é feita por meio de um sistema informatizado denominado de
Sistema de Fiscalização (SEFISC). Não obstante, tal sistema somente pode ser utili-
zado para fiscalização de fatos geradores ocorridos até 2012; inclusive, um novo sis-
tema está sendo desenvolvido. Pode também cada unidade federativa (UF) fiscalizar
com sistemas próprios. O DF, por exemplo, não utiliza o SEFISC, mas também não
possui um sistema de fiscalização próprio para o Simples Nacional.
O contencioso administrativo é da competência do órgão julgador integrante da
estrutura administrativa do ente federativo que efetuar o lançamento, o indeferimento
da opção ou a exclusão de ofício.
A inscrição do débito na dívida ativa e a execução judicial são feitas pela PGFN,
podendo, por meio de Convênio, serem feitas pelas próprias UF. Apenas sete UF (GO,
MT, MS, SC, MG, PE, SE) e 230 municípios já fizeram o convênio. O DF, por exemplo,
ainda não o fez.
O parcelamento é admitido na forma regulamentada pelo Comitê Gestor do
Simples Nacional (CGSN) (alteração introduzida pela LC nº 139/2011). No entanto, a
exemplo de várias unidades, também o DF não utiliza o sistema disponível.

4  A Lei Complementar nº 147/2014


A LC nº 147, publicada no DOU em 8.8.2014, alterou substancialmente a LC
nº 123/2006 (em mais de 180 itens, dentre alterações e inclusão de novos artigos,
incisos ou alíneas), definindo a produção de efeito das respectivas alterações. Cabe
ressaltar que as mais importantes alterações somente entrarão em vigor a partir de
1º.1.2016.
As alterações mais significativas e de maior repercussão foram aquelas sofridas
pelo regime de tributação, o Simples Nacional. Essas alterações também alcançaram
todas as demais áreas abrangidas pelo Estatuto: o acesso ao mercado, inclusive ao
mercado externo; o protesto de títulos; o acesso aos juizados especiais; o apoio e a
representação, sempre no sentido de garantir maior facilidade e celeridade nos trâmi-
tes exigidos; divulgação e orientação; obrigatoriedade de se licitar para contratação
de ME e EPP, entre outras.

4.1  As alterações da LC nº 147/2014 nas regras gerais do


Estatuto
Das alterações introduzidas nas regras gerais do Estatuto, vale ressaltar a exi-
gência de cadastro nacional único de contribuintes a que se refere o inciso IV do
parágrafo único do art. 146, in fine, da CF/88 (art. 1º, IV, da lei).

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

O Cadastro Sincronizado Nacional é a integração dos procedimentos cadas-


trais de pessoas jurídicas e demais entidades entre as administrações tributárias
da União, dos Estados, do DF, dos Municípios e demais órgãos e entidades que
fazem parte do processo (convenentes). Ele tem como objetivo a simplificação e
racionalização dos processos de inscrição, alteração e baixa das pessoas jurídicas e
a harmonização das informações cadastrais, permitindo que estas atuem com maior
eficiência, eficácia e menor custo.
Cumpre esclarecer que não haverá um cadastro único, mas, sim, uma sincroni-
zação entre os cadastros dos órgãos convenentes, que continuarão a ter autonomia
e gestão sobre os seus respectivos cadastros.
Outra questão interessante é que outros órgãos têm a faculdade de se agrega-
rem ao projeto: juntas comerciais, prefeituras municipais, cartórios, corpos de bom-
beiros, vigilâncias sanitárias, entre outros.
De acordo com o Boletim PIN nº 4/2014, emitido pela Coordenação de Gestão
de Cadastro (COCAD) da Receita Federal, em balanço feito em dezembro de 2014,
das 27 UFs, apenas 4 delas ainda não estão integradas, dentre elas o DF, São Paulo,
Maranhão e Piauí (este já em fase de teste). A perspectiva é de que, até o final de
2015, a integração esteja completa.

4.2  As alterações no Simples Nacional: Capítulo IV da LC


nº 123/2006
As alterações mais significativas e de maior repercussão feitas pela LC
nº 147/2014, como já mencionado, foram no regime de tributação, Simples Nacional,
e são relativas à universalidade das atividades permitidas ao ingresso no regime;
vedação ao regime – regras da ST; sistemática de tributação, alíquotas e base de
cálculo (anexos I a VI da LC 123); e MEI.

4.2.1  Universalidade das atividades permitidas ao ingresso no


regime de tributação
A LC nº 147/2014 ampliou ao máximo as atividades possíveis de opção pelo
Simples Nacional, o que se denominou na imprensa, com grande repercussão, de
universalidade das atividades do SUPERSIMPLES.
Por outro lado, 149 atividades, para as quais era vedada a opção, passaram a
poder optar pelo regime diferenciado. Dentre elas, estão as empresas prestadoras
de serviços decorrentes do exercício de atividade intelectual; de natureza técnica,
científica, desportiva, artística ou cultural; as que prestam serviços de instrutor, cor-
retor, despachante ou qualquer tipo de intermediação de negócios; as que realizam
atividade de consultoria, profissionais liberais e serviços de saúde, como medicina,

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f­isioterapia, veterinária, serviços de advocacia, etc. Tal alteração contribuiu ainda


mais para o crescente número de empresas que a cada dia optam pelo Simples
Nacional.
A tendência de crescimento de optantes do Simples Nacional em nível de Brasil
é muito grande, passando de 2.500.000 contribuintes em dezembro de 2007 para
mais de 8.000.000 em agosto de 2014. Tal tendência, por exemplo, é acompanhada
pelo DF, no qual pode ser constatado que o Simples Nacional representa cerca de
80,13% do total das pessoas jurídicas inscritas no Cadastro Fiscal do DF (CFDF). E
considerando por tributo, os inscritos no Simples Nacional como contribuintes do
ICMS já representam 86% do total de inscritos no CFDF.12

4.2.2  Vedação ao regime: regras da substituição tributária do


ICMS
É no art. 17 da LC nº 123/2006 que estão relacionadas as hipóteses de ve-
dação de recolhimento de impostos ou contribuições na forma do Simples Nacional.
Este artigo foi um dos que mais sofreu alteração pela LC nº 147/2014, visto à
universalidade das atividades já comentadas e a alteração introduzida nas regras da
Substituição Tributária (ST) do ICMS.
Anteriormente à LC nº 147/2014, todas as operações sujeitas ao regime da
ST do ICMS estavam vedadas ao Simples Nacional. Com a alteração introduzida,
cuja vigência será a partir de 1º de janeiro de 2016, foi estabelecido um rol taxativo
dessas operações. Com isso, todas as operações que não estejam relacionadas no
rol previsto na alínea “a” do inciso XIII do §1º do art. 13 da LC nº 123/2006 serão
tributadas pelo Simples Nacional, mesmo estando as mercadorias sujeitas ao regime
de ST para as demais empresas não optantes do Simples Nacional.
Dentre os beneficiados pelo fim da ST, estão os pequenos negócios dos seg-
mentos de vestuário e confecções, móveis, couro e calçados, brinquedos, decoração,
cama e mesa, produtos óticos, implementos agrícolas, instrumentos musicais, arti-
gos esportivos, alimentos, papelaria, materiais de construção, olarias e bebidas não
alcoólicas; produtos que, em muitas UFs, estão sujeitos ao regime de ST.
Essa alteração da lei complementar é a que tem gerado maior polêmica, tendo
em vista a sua repercussão na sistemática da ST do ICMS, o que provocou a recente
interposição da ADI nº 5.216, em fevereiro de 2015, pela FEBRAFITE, questionando
inúmeros dispositivos da LC nº 147/2014 sob a alegação de afronta ao princípio do
pacto federativo e cerceamento da autonomia e da discricionariedade dos Estados

Dados do “relatório cadastro fiscal”, elaborado pelo Núcleo de Administração do Cadastro Fiscal (NUCAD), da
12

Gerência de Tributos Indiretos (GEIND), da Coordenação de Cadastros e Lançamentos Tributários (CCALT), da


Subsecretaria da Receita (SUREC) da Secretaria de Fazenda do DF – documento interno.

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

e do DF na formação da política tributária e fiscal. É pedido, inclusive, concessão de


liminar para suspender a eficácia do art. 2º da mencionada LC. No mérito, é pedi-
da a declaração de inconstitucionalidade das normas questionadas, dentre outras
a do art. 13, §1º, XIII, “a”, sob a alegação de supressão da autonomia normativa e
administrativo-tributária dos Estados e do DF para tributar, disciplinar e fiscalizar a ST
do ICMS, ao abarcar diversas atividades econômicas sob regime tributário do Simples
Nacional. É alegado também que as alterações mutilam o principal instrumento de
tributação dos Estados e do DF, e subvertem o mais eficiente mecanismo de combate
à sonegação tributária e de praticabilidade da fiscalização do ICMS, o qual fora conce-
bido e implementado gradualmente pelos estados-membros desde a década de 70.
Nessa ADI, ainda não há manifestação do MPU; no entanto, existe a solicitação
do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil para ingresso na ação, na
condição de amicus curiae (os serviços de advocacia foram contemplados com a
alteração), alegando ilegitimidade ativa da requerente por ausência de pertinência
temática e, no mérito, defendendo a constitucionalidade da LC nº 147/2014, sob
os argumentos, dentre outros, de que ela representa para o sistema tributário pátrio
indiscutível ganho em eficiência, justiça, racionalidade, incentivo ao crescimento e,
sobretudo, em justiça social, valorizando a capacidade de trabalho e de iniciativa do
brasileiro.
Importante estudo, intitulado O Impacto da implementação do Simples Nacional
na arrecadação dos Estados e suas implicações operacionais,13 apresentado, em
2014, no Fórum Fiscal dos Estados, do Programa de Estudos ESAF, que teve a partici-
pação da Assessoria de Estudos Econômicos Fiscais da Secretaria de Fazenda do DF,
na pessoa de seu chefe, comprova a distorção da sistemática da ST do ICMS, provo-
cada pela limitação da incidência da ST ou antecipação do recolhimento do ICMS no
Simples Nacional, com consequências desastrosas, inclusive de inversão da cadeia
natural de comercialização e distorção na competitividade.
No estudo, é citado que:

a título de exemplo, é possível vislumbrar o que poderá ocorrer nas


situações em que a indústria, substituta tributária, vende mercadoria
sujeita à substituição tributária, mas que não consta na lista taxativa,
em operação interestadual (alíquota de ICMS de 12%), para o atacadista
por R$1.000,00, e este revende, em operação interna, para o varejista
por R$1.300,00 e este por sua vez revende ao consumidor final por
R$1.700,00, portanto, MVA de 70%.

FÓRUM DOS ESTADOS FFEB 2014. O impacto da implementação do Simples Nacional na Arrecadação dos
13

Estados e suas Implicações Operacionais: publicação em breve. Disponível em: <http://www.esaf.fazenda.


gov.br/estudos_pesquisas/forum-fiscal/ffeb-2014>. Acesso em: 10 jun. 2015.

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Considere que na situação 1, aplica-se a substituição tributária por ser


o adquirente do regime normal e este sujeita-se, em operação interna, à
alíquota de 18% de ICMS.
Já na situação 2, não se aplica a substituição tributária, por ser o
adquirente do Simples Nacional, este sujeita-se ao anexo I da LCP nº
123/06, sendo que o atacadista se encontra na faixa de receita bruta de
R$1.200.000,00 (alíquota de ICMS de 2,84%) e o varejista se encontra
na faixa de receita bruta de R$550.000,00 (alíquota de ICMS de 2,56%).

Concluem os autores do estudo que, em resumo, “uma mesma mercadoria dis-


posta na prateleira do varejista poderá ter tido a incidência da ST, e a outra não, pois
depende de quem o varejista adquiriu e de qual regime tributário está enquadrado
o seu fornecedor”. Pelo estudo, restam comprovadas as sérias consequências que
podem advir das alterações implementadas.

4.2.3  Sistemática de tributação, alíquotas e base de cálculo:


anexos I a VI da LC nº 123/2006
Para efeitos da LC nº 123/2006, considera-se ME e EPP o empresário, a p­ essoa
jurídica (ou a ela equiparada) que aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual
ou inferior a R$360.000,00 e R$3.600.000,00, respectivamente.
A LC nº 147/2014 alterou a regra do limite para exportação de mercadorias e
serviços, e assim, hoje, a EPP pode auferir R$3.600.000,00 no mercado interno (MI)
e R$3.600.000,00 no mercado externo (ME). Para fins de determinação da alíquota,
serão consideradas separadamente as receitas do MI e ME.
Para o enquadramento na condição de ME ou EPP, deve-se considerar o soma-
tório da receita bruta anual de todos os estabelecimentos. Por sua vez, considera-se
receita bruta o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria,
o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não
incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos. Um dos
pontos relevantes das alterações promovidas pela LC nº 147/2014 foi que estabe-
leceu que o critério para o enquadramento nesse regime não será mais o tipo de
atividade, mas, sim, o porte e o faturamento da ME ou EPP.
O art. 18 da LC nº 123/2006, alterado pela LC nº 147/2014, prevê o método
e a sistemática de como o cálculo do imposto a pagar deve ser feito no Simples
Nacional para o que devem ser utilizadas as tabelas dos anexos I a VI da LC, que
também foram alterados pela LC nº 147/2014.
As UFs podem estabelecer sublimites de receita bruta anual (art. 18, §18, da
LC nº 123/2006), prerrogativa, por exemplo, utilizada pelo DF. Nesse sentido, a Lei
Distrital nº 4006/2007 limitou em R$62,50 tanto para o contribuinte do ICMS quanto
do ISS, cujo faturamento bruto anual não ultrapasse R$120.000,00.

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

4.2.4  Microempreendedor Individual (MEI): uma atenção


especial
O Estatuto das ME e EPP, instituído pela LC nº 123/2006, não contemplou, no
princípio, milhões de pequenos empreendedores que atuavam na informalidade e que
ficaram à margem desses benefícios.
Um dos maiores desafios, portanto, era incluir no Estatuto, dentro do Simples
Nacional, um tratamento diferenciado voltado para o MEI, o que ocorreu somente em
2008, com as alterações introduzidas pela LC nº 128/2008.
Assim, fruto das mencionadas alterações, foi criada a figura do MEI, cujo objeti-
vo maior é a inclusão social e previdenciária dos pequenos empreendedores que atu-
avam na informalidade, garantindo-lhes benefícios, especialmente previdenciários, e
tornando-os totalmente legalizados.
Para se enquadrar como MEI, é necessário que o empreendedor individual pre-
encha os seguintes requisitos:
a) ser optante pelo Simples Nacional e cumprir seus requisitos;
b) auferir receita bruta acumulada nos anos-calendários anteriores e em curso
de até R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) – no caso de início de atividade, o limite
deve ser proporcionalmente de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por mês;
c) exercer tão somente as atividades constantes do Anexo XIII da Resolução
CGSN nº 94, de 2011;
d) possuir um único estabelecimento;
e) não participar de outra empresa como titular, sócio ou administrador;
f) não contratar mais de um empregado, que só poderá receber 1 (um) salário
mínimo ou o piso salarial da categoria profissional;
g) não guardar, cumulativamente, com o contratante do serviço relação de pes-
soalidade, subordinação e habitualidade.
Um ponto relevante é que não pode haver cessão ou locação de mão de obra,
ou seja, não podem ser colocados à disposição da empresa contratante, em suas
dependências ou na de terceiros, o MEI e/ou seu empregado para realizar serviços
contínuos relacionados ou não com sua atividade-fim, quaisquer que sejam a natu-
reza e a forma de contratação. Isso para evitar a “pejotização” do trabalhador, que é
uma prática que visa burlar a legislação trabalhista e prejudicar o empregado.
Desenvolveu-se, assim, um sistema simplificado, desburocratizado e gratuito
para incentivar e facilitar sua formalização. O processo é totalmente informatizado,
não sendo necessário o encaminhamento de nenhum documento.
Para inscrever-se, o empresário deve acessar o portal do microempreendedor, no
endereço <www.portaldoempreendedor.gov.br>, clicar na opção “MEI-Microem­preen­
dedor Individual – Formalização/Inscrição” e preencher as informações solicitadas.

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A inscrição também pode ser feita com o auxílio de empresas de contabilidade


que são optantes do Simples Nacional, sem qualquer custo. A relação com o nome
dessas empresas pode ser consultada no portal do empreendedor.
Com a inscrição, o MEI emite o Certificado da Condição de Microempreendedor
Individual (CCMEI), que é o documento comprovante do registro do Microempreendedor
Individual e que vale como alvará provisório, desde que o empreendedor declare que
conhece os prerrequisitos para funcionamento do seu empreendimento no local em
que se estabelecer, bem como que cumpre a legislação municipal.
Após o cadastramento do MEI, todos os documentos necessários – Cadastro
Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) e o número de inscrição na Junta Comercial e
no INSS – são obtidos imediatamente, não sendo necessário encaminhar nenhum
documento (nem sua cópia anexada) à Junta Comercial.
As alterações dos dados cadastrais e a baixa do registro como MEI também são
feitas no portal do empreendedor, de forma online e gratuita.
Os dados no CNPJ são alterados imediatamente, e os arquivos digitais são dis-
ponibilizados para que os Estados e Municípios procedam as alterações cadastrais.
O desenquadramento do MEI pode ser feito por opção do contribuinte ou obri-
gatoriamente quando ele deixar de atender quaisquer dos requisitos necessários à
sua formalização.
A formalização como MEI gera uma série de vantagens para o contribuinte, sen-
do as principais: cobertura previdenciária, menor custo com funcionário, formalização
sem taxas de registro e sem burocracia, acesso a serviços bancários, possibilidade
de compras e vendas em conjunto, controles totalmente simplificados, facilidade na
emissão de alvará, possibilidade de vender/prestar serviço para o Governo e redução
da carga tributária.
O MEI, uma vez formalizado, ingressa no Sistema de Recolhimento em Valores
Fixos Mensais de Tributos Abrangidos pelo Simples Nacional (SIMEI), quais sejam:
contribuição previdenciária no valor atual de R$39,40; ISS, no valor de R$5,00 (se for
prestador de serviço); e ICMS, no valor de R$1,00 (se for do comércio ou indústria).
Esses valores irrisórios demonstram o tratamento tributário diferenciado e al-
tamente benéfico que é dispensado ao MEI. Além disso, o microempreendedor está
isento dos seguintes tributos: IRPJ, CSLL, PIS/PASEP, COFINS e IPI.
O MEI está dispensado da emissão de notas fiscais nas operações com venda
de mercadorias ou prestações de serviço para consumidor final pessoa física e nas
operações com mercadorias para destinatário inscrito no CNPJ quando o destinatário
emitir nota fiscal de entrada. Estará, entretanto, obrigado a emiti-las nas prestações
de serviços para tomador inscrito no CNPJ e nas operações com mercadorias para
destinatário inscrito no CNPJ quando o destinatário não emitir nota fiscal de entrada.
Quanto à nota fiscal eletrônica, o MEI também está dela dispensado, ressal-
vada a possibilidade de emissão facultativa disponibilizada pelo ente federado. Está

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

dispensado também da escrituração dos livros fiscais e contábeis e da Declaração


Eletrônica de Serviços.
O instituto MEI revela-se inquestionavelmente uma política de inclusão social
na medida em que, de forma extremamente simplificada, desburocratizada e gratuita,
cria condições de legalizar as atividades exercidas pelos pequenos empreendedores,
oferecendo-lhes benefícios previdenciários, dos quais eram antes marginalizados, e
impondo-lhes uma carga tributária irrisória. Tanto é assim que a LC nº 147/2014 es-
tabeleceu que o MEI é modalidade de microempresa, e a ele é vedada impor qualquer
restrição em função de sua natureza jurídica.
Entretanto, a simplicidade e a desburocratização própria do sistema, bem como
a falta de meios de controle eficazes, têm propiciado que mal-intencionados utilizem
indevidamente do mecanismo para burlar o fisco e sonegar impostos.
Num trabalho de auditoria, por exemplo, feito pela Secretaria de Estado da
Fazenda do DF, por meio do cruzamento de dados de fornecedores e das operadoras
de cartões de crédito, constatou-se a existência de “laranjas”, de empresas fantas-
mas e que diversas empresas tiveram faturamento muito superior ao limite estipu-
lado pela lei. Nessa operação, inclusive com grande repercussão na imprensa, 179
microempreendedores foram desenquadrados do regime, onde, dentre eles, foram
constatadas compras com valores de até R$20.000.000,00 (vinte milhões de reais).

5 Conclusões
Diante de todo o exposto, pode-se concluir que:
1. O sistema diferenciado e favorecido à ME e à EPP é uma necessidade nacio-
nal, e não fere o princípio da isonomia, o que, por si só, já bastaria para justificar o
regime amparado na CF/88.
2. A universalização das atividades para adesão ao Simples Nacional, sem um
estudo conjunto com Estados, DF e Municípios que vise à renúncia de receita, pode
ferir o pacto federativo na medida em que impacta na arrecadação do ICMS e do ISS,
de controle autônomo de Estados, DF e Municípios, respectivamente, e por consequ-
ência nas finanças destes entes federados.
3. A alteração relativa à ST-ICMS no Simples Nacional, com a imposição de
lista taxativa de produtos que poderão estar sujeitos à ST, fere o pacto federativo na
medida em que cerceia a autonomia e a discricionariedade de Estados e DF quanto
aos critérios de formação da política tributária relativa ao ICMS, imposto de sua
competência, e da política fiscal, visto o impacto na arrecadação e consequente
interferência nas finanças desses entes políticos.
4. De acordo com o estudo apresentado no Fórum Fiscal dos Estados 2014, ci-
tado neste trabalho, a alteração relativa à ST-ICMS poderá gerar os seguintes efeitos
negativos:

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a) distorção na competitividade dependendo do regime tributário do interme­


diário, com a nítida vantagem para os comerciantes que negociarem com as
empresas optantes pelo Simples Nacional. Impacto na carga total do ICMS,
de 34,5%;
b) consequente dualidade, a exemplo de o substituído manter um estoque em
que parte das mercadorias veio com ST, e parte delas, sem. A complexidade
para segregar fisicamente e escriturar corretamente as operações será mais
complicado e oneroso para as empresas. Outro exemplo é o momento em
que uma indústria ou atacadista for vender um produto, pois terá que saber
antecipadamente a qual regime de apuração pertence o seu “cliente” para
que possa realizar a venda com ou sem ST;
c) possibilidade de inversão na cadeia natural de comercialização mediante
a utilização de pequenas empresas optantes pelo Simples Nacional como
meras intermediárias para adquirirem mercadorias das grandes empresas,
com o fim específico de ilidir o recolhimento do ICMS-ST;
d) possibilidade de que novas empresas venham a ser constituídas sob o regime
do Simples Nacional apenas com o objetivo de adquirirem mercadorias sem
a incidência da ST;
e) dificuldade no controle fiscal e de combate à sonegação do ICMS, objetivo
principal do instituto da ST, devido à pulverização da cadeia de comercialização
sobre os produtos não abrangidos pela ST-ICMS e a quantidade expressiva e
crescente de empresas optantes pelo Simples Nacional;
f) inevitável criação de outras obrigações acessórias para as empresas do
Simples Nacional envolvidas nas operações com ST, a exemplo de registro
das operações com ST, considerando o necessário controle fiscal do ICMS-
ST, visto ser responsável por parte significativa da arrecadação.
5. No DF, por exemplo, a equação da representatividade de contribuintes pesso-
as jurídicas inscritos no Simples Nacional na ordem aproximada de 80% do total de
contribuintes pessoas jurídicas do DF para 3% aproximados do total da arrecadação é
aparente, pois reflete a fragilidade do controle sobre esses contribuintes.
6. Essa equação aparente, que tem sido um desestímulo para investimentos
de controle do Simples Nacional, pode ser corrigida com investimentos na área de
tecnologia da informação como ferramenta eficaz de controle.
7. A falta de investimento do DF, por exemplo, no controle do Simples Nacional
fica evidente pela constatação de seu lamentável déficit de participação efetiva
em projetos já implantados em outras UFs, como o Sistema Integrador Nacional
(Redesim), o sistema de parcelamento de débitos, sistema de fiscalização (SEFISC),
convênio para inscrição de débitos na dívida ativa, entre outros, o que contribui para
a permanência da referida equação aparente, em prejuízo da arrecadação.

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Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes

8. As facilidades da norma legal oferecidas ao MEI e a vulnerabilidade do con-


trole administrativo sobre essas facilidades colocam em risco o objetivo finalístico da
norma, em prejuízo da política tributária favorecida e da arrecadação.
9. Uma ferramenta eficaz contra esse problema seria investir em um amplo
projeto de desenquadramento dos falsos MEI e também da ME, utilizando-se de da-
dos informatizados de controle e circularização de informações juntamente com a
imediata adesão à opção de celebração de convênios.
10. A pressão política por incentivo à ME e EPP sem estudos técnicos apro-
fundados com a participação de Estados, DF e Municípios, a exemplo do PLP nº
45/2015, já aprovado no Senado e em trâmite na Câmara dos Deputados, pode gerar
distorções e comprometimento do próprio sistema diferenciado e favorecido vigente.

Referências
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direitos humanos e a democracia. Disponível em: <http://www.escoladegoverno.org.br/artigos/1734-
o-sistema-tributario-nacional>. Acesso em: 20 maio 2015.
BRASIL. Lei nº 7.256, de 1984. Estabelece normas integrantes do estatuto da microempresa,
relativas ao tratamento diferenciado, simplificado e favorecido, nos campos administrativo, tributário,
previdenciário, trabalhista, creditício e de desenvolvimento empresarial. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7256.htm>. Acesso em: 20 maio 2015.
BRASIL. Lei nº 8.864, de 1994. Estabelece normas para as microempresas (ME), e Empresas de
Pequeno Porte (EPP), relativas ao tratamento diferenciado e simplificado, nos campos administrativo,
fiscal, previdenciário, trabalhista; creditício e de desenvolvimento empresarial (art. 179 da Constituição
Federal). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8864.htm>. Acesso em:
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BRASIL. Lei nº 9.317, de 1996. Dispõe sobre o regime tributário das microempresas e das empresas
de pequeno porte, institui o sistema integrado de pagamento de impostos e contribuições das
microempresas e das empresas de pequeno porte - simples e dá outras providências. Disponível em:
<http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/8b6939f8b38f377a03256ca200686171/
4bbaabfebdacbc16032569fa006a8e5d?OpenDocument>. Acesso em: 20 maio 2015.
BRASIL. Lei nº 9.841, de 1999. Institui o estatuto da microempresa e da empresa de pequeno porte,
dispondo sobre o tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido previsto nos arts. 170 e
179 da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 maio 2015.
BRASIL. LC nº 123, de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno
Porte; altera dispositivos das Leis nºs 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, da Consolidação
das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, da Lei nº
10.189, de 14 de fevereiro de 2001, da Lei Complementar nº 63, de 11 de janeiro de 1990; e revoga
as Leis nºs 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e 9.841, de 5 de outubro de 1999. Disponível em:
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janeiro de 2002 – Código Civil , 8.029, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências. Disponível
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Acesso em: 20 maio 2015.

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José Hable Et al

BRASIL. LC nº 147, de 2014. Altera a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, e as


Leis nºs 5.889, de 8 de junho de 1973, 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, 9.099, de 26 de setembro
de 1995, 11.598, de 3 de dezembro de 2007, 8.934, de 18 de novembro de 1994, 10.406, de
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PAUSEN, Leandro. Direito tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da
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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação


Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):

HABLE, José et al. Simples Nacional: noções gerais e aspectos relevantes. Revista
Fórum De Direito Tributário – RFDT, Belo Horizonte, Ano 13, n. 77, p. 15-32,
set./out. 2015.

32 R. Fórum de Dir. Tributário – RFDT | Belo Horizonte, ano 13, n. 77, p. 15-32, set./out. 2015

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