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Artigo apresentado no III ENCONTRO


DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS – ENET
promovido pelo Instituto de Direito
Tributário de Londrina de 03 a 05 de
setembro de 2008.

TRIBUTAÇÃO, POLÍTICA FISCAL E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Patricia Ayub da Costa*


Sharon Cristine Ferreira de Souza**

Sumário: 01. Introdução; 02. Receitas Tributárias e sua Justificação; 2.1 Impostos; 2.2
Taxas; 2.3 Contribuições de melhoria; 2.4 Contribuições; 2.5. Empréstimos compulsórios;
03. Princípios regentes da Teoria da Tributação; 04. Política Fiscal do Estado e suas
Funções; 4.1 Função Alocativa; 4.2 Função Distributiva ou Redistributiva; 4.3 Função
Estabilizadora; 05. Desenvolvimento Econômico; 06.Conclusão; 07. Referências.

01. Introdução

Os tributaristas geralmente analisam a teoria da tributação por uma ótica


jurídica, sem considerar o ponto de vista das finanças públicas que se utilizam dos
domínios da economia do setor público. Ao fazer essa interdisciplinariedade
objetiva-se analisar a qualidade da tributação para se auferir o grau de justiça fiscal.
A investigação dos financistas é o suporte necessário para o legislador
produzir um sistema tributário de qualidade a fim de que não haja rompimento
social1. Como ensina Paulo de Barros Carvalho, “a realidade jurídica deve estar
próxima da realidade social para que a sociedade atinja os anseios por ela
desejados”2.
Dessa forma, divide-se esse estudo em quatro pontos específicos para se
identificar os balizamentos de um sistema tributário “ideal” que resulte no
desenvolvimento econômico do país: 1) Receitas Públicas e suas justificativas de
cobrança; 2) Princípios da Teoria da Tributação; 3) Política Fiscal e suas funções e
4) Desenvolvimento Econômico.

*
Mestranda em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina. Advogada. Professora de
Direito Internacional. Fundadora e Diretora Executiva do INPRI – Instituto Paranaense de Relações
Internacionais.
**
Mestranda em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina.
1
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação e Política Fiscal in Segurança Jurídica na tributação e estado de
direito. São Paulo: Noeses, 2005, p. 558.
2
apud MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. cit., p. 558.
2

02. Receitas Tributárias e sua Justificação

A República Federativa do Brasil possui como objetivos fundamentais,


previstos no artigo 3º da Constituição Federal, a construção de uma sociedade livre,
justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza
e a redução das desigualdades sociais e regionais; a promoção do bem de todos
sem qualquer tipo de discriminação.
Para que o Estado consiga realizar seus objetivos precisa de
recursos financeiros. A maior fonte de ingressos públicos é a cobrança de tributos,
embora tenham outros, como empréstimos, doações, multas, tarifas públicas etc.

Por intermédio dos ingressos públicos os governos viabilizam em


termos financeiros a realização das funções estatais que provocam
gastos públicos volumosos. Daí por que é imperiosa a busca
incessante de financiamento público. Sem a receita, o gasto fica
comprometido: sem o gasto, os governos não conseguem realizar o
fim almejado pela sociedade, qual seja: o bem comum.3

Dessa forma, as receitas tributárias representam a espécie mais relevante de


ingresso público nas economias modernas e a tributação, por sua vez, está regrada
pelo Direito, que disciplina as relações entre o Fisco e os contribuintes4.
A tributação consiste na expropriação lícita do patrimônio dos contribuintes,
conforme explicitado no artigo 3º do Código Tributário Nacional, para que o Estado
cumpra suas funções e alcance o bem comum.
O sistema tributário nacional é composto por várias espécies (impostos,
taxas, contribuições de melhoria, contribuições e empréstimos compulsórios) de
tributos com suas peculiaridades que devem ser estudados não somente do ponto
de vista jurídico, mas também das finalidades a que se destinam, ou seja, sua
justificação, como será feito no próximo tópico.

3
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 559.
4
“A norma tributária regula a conduta humana consistente na retirada de bens dos particulares para o
Estado, para que este possa satisfazer as necessidades da coletividade”. Ibid., p. 560.
3

2.1 Impostos

A Constituição Federal divide a competência tributária entre os entes


federativos, esclarecendo nos artigos 153, 155 e 156, a instituição de impostos5 pela
União, Estados e Distrito Federal e Municípios, respectivamente.
O artigo 16 do Código Tributário Nacional conceitua imposto como “tributo
cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer
atividade estatal específica, relativa ao contribuinte”.
Assim, os impostos são arrecadados pelo Estado para garantir suas despesas
gerais; não há relação com nenhuma atuação estatal específica e nem está atrelado
a qualquer princípio identificador de benefício direto dos contribuintes pagantes. São
exigidos sobre fatos praticados pelos respectivos sujeitos passivos da regra-matriz
de incidência, tomando por parâmetro a capacidade de pagamento deles.
Por conseguinte, o ente tributante não pode criar um imposto tendo por fato
tributário quaisquer atividades realizadas pelo Estado.

Ainda que não haja essa atividade estatal imediata como razão de
ser da cobrança dos impostos, sempre haverá uma causa mediata
(destinação dos recursos mediante lei orçamentária) que é a
realização do bem comum6.

Em relação aos impostos extraordinários, previstos no art. 154, II, CF,


poderão ser instituídos pela União na iminência ou em caso de guerra externa,
devendo ser suprimidos aos poucos, conforme cesse as causas de sua criação7.

2.2 Taxas

Taxa é um tipo de tributo previsto no art. 145, II, da CF e no art. 77 do CTN


que poderá ser instituído em razão do exercício do poder de polícia ou pela
utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis,
prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. O §2º do art. 145 estabelece
ainda que as taxas não poderão ter base de cálculo própria dos impostos.

5
O §1º do art. 145 da CF determina que os impostos, sempre que possível, devem ter caráter
pessoal e graduação segundo a capacidade econômica do contribuinte.
6
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 562-563.
7
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 563. Essa espécie possui uma justificativa econômica de
suprir os encargos estatais nos casos previstos, o que não os desnatura como imposto, mesmo
possuindo uma finalidade coletiva específica prevista no sistema tributário brasileiro.
4

Assim, a taxa é exigida tendo em vista uma atuação estatal determinada, ou


seja, é cobrada daqueles que provocam uma atuação por parte do Estado e acabam
por beneficiar-se dela, de maneira direta e específica. Sua razão de ser é a
necessidade estatal de cobrir custos pela execução de suas atividades que são
usufruídas por um contribuinte ou grupo determinado deles. É regida pelo princípio
de que quem causa a atividade estatal deve custeá-la, isto é, o princípio do
benefício8. É denominada contraprestacional9.

2.3 Contribuições de melhoria

As contribuições de melhoria estão previstas no art. 145, III, da CF e no art.


81 do CTN10 e são exigidas dos contribuintes quando a atuação estatal provoque um
benefício indireto a um determinado contribuinte.
Ricardo Lobo Torres11 ensina que a contribuição de melhoria é tributo
contraprestacional devido pela realização de obra pública da qual decorre
valorização para o proprietário, tornando-se por isso, tributo afinado com a idéia de
justiça fiscal ao se subordinar ao princípio custo/benefício. Afirma ainda que a esse
tributo não é estranho o princípio da capacidade contributiva, mas que muitas vezes
“influi negativamente, impedindo que a Administração deixe de realizar obras
públicas em favor da população carente em face da impossibilidade do
ressarcimento do custo”.

2.4 Contribuições

Houve uma divisão constitucional entre contribuições de melhoria (art. 145) e


as contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das
categorias profissionais ou econômicas previstas no art. 149.

8
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 563.
9
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 9 ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 361.
Esse autor defende que o princípio da capacidade contributiva também se aplica às taxas, embora
não esteja explicitado pela CF e pacificado doutrinariamente, pois “ao fixar o valor das taxas o Estado
não se limita a repartir custos, senão que deve distribuir equitativamente a responsabilidade fiscal, de
modo a não onerar exageradamente aqueles que possuem renda menor”. Op. Cit., p. 363.
10
Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou
pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de
obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e
como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.
11
TORRES, Ricardo Lobo. Op. Cit., p. 366-367.
5

Essas últimas são espécies tributárias instituídas e arrecadadas pelo Estado


para suportar gastos públicos em áreas específicas e de relevância. Estão
fundamentadas no princípio do benefício e da solidariedade12.

2.5 Empréstimos compulsórios

Estão previstos no art. 148 da CF e no art. 15 do CTN. Têm por função


econômica suprir as necessidades financeiras específicas do Estado quando da
ocorrência de fatos determinados, tais como: calamidade pública, guerra,
investimentos públicos de caráter urgente e de relevante interesse nacional,
possuindo caráter vinculativo à despesa que fundamentou sua instituição.
Segundo Ricardo Lobo Torres13 empréstimo compulsório é

[...]o dever fundamental consistente em prestação pecuniária que,


vinculada pelas liberdades fundamentais, sob a diretiva do princípio
constitucional da capacidade contributiva, com a finalidade de
obtenção de receita para as necessidades públicas e sob promessa
de restituição, é exigido de quem tenha realizado o fato descrito em
lei elaborada de acordo com a competência especificamente
outorgada pela Constituição.

Como se pode observar, a adoção das diferentes sistemáticas tributárias está


a cargo do legislador tributário que deve respeitar o estudo da Ciência das Finanças
que, ao distingui-las, justificam-na. Assim, quanto maior for o entrelaçamento dos
princípios atinentes às finanças públicas com as regras jurídico-tributárias, mais justo
será o referido estatuto tributário.

03. Princípios Regentes da Teoria da Tributação

Quais os princípios que devem reger um sistema tributário considerado “bom”


ou “ideal”? Sua resposta passa pela Teoria Econômica.
Por ser um ato expropriatório, a tributação sempre provoca nas pessoas um
determinado grau de resistência. Nessa perspectiva, os governos devem procurar
implementar um sistema tributário que provoque a menor resistência possível, ou

12
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 564.
13
TORRES, Ricardo Lobo. Op. Cit., p. 374.
6

seja, um sistema tributário ideal, que segundo Roberto Quiroga Mosquera14 seria
regido por quatro princípios: a) simplicidade; b) neutralidade; c) progressividade; e d)
eqüidade.
O princípio da simplicidade consiste em desonerar as pessoas de custos
desnecessários com a interpretação e aplicação das normas tributárias
(contribuintes) e facilitar o trabalho da administração tributária, aumentando a
eficiência da máquina estatal, pois quanto mais singelo o corpo normativo, melhor
será a qualidade da tributação15.
A simplificação pode ser efetivada de diversas formas: redução do número de
tributos16 (único, IVA), instituição de sistemas de tributação na fonte (IR, ICMS, ISS,
COFINS, PIS, INSS etc), implantação de tributação por sistemas estimados de
lucros ou receitas (SIMPLES e LUCRO PRESUMIDO), cumprimento de obrigações
tributárias por meio magnético etc.
Em relação à neutralidade, ressalta-se que a política fiscal de um Estado não
deve provocar desvios ou direcionamentos quanto à alocação de recursos na
economia, sob pena de distorcê-la e tornar o sistema tributário ineficiente17.
Contudo, na prática, a tributação ou sua desoneração podem viabilizar
equalizações em determinadas ocasiões, sendo aconselháveis tais medidas para
obtenção de resultados em outras áreas de atuação dos diversos agentes
econômicos. Assim, embora a concessão de determinado incentivo fiscal seja
tecnicamente contrária à neutralidade sob o ponto de vista fiscal, pode ser adequado
para estimular o crescimento de determinada região. Assim, a neutralidade é
característica fundamental para a existência de um sistema tributário ideal; no
entanto, deve-se estar ciente de que ela está conectada à adoção, por parte do
Estado, da política econômica como um todo18.

14
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 566.
15
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 567.
16
Leon Fredja Szklarowsky indigna-se ao analisar tantas emendas à CF e ao STN: “O sistema
tributário brasileiro atual é uma colcha de retalhos, quase um farrapo do que era, e que a poucos é
dado compreender, dada a diversidade e extrema dificuldade de sua aplicação, bastante onerosa e
burocratizada, provocando brutal injustiça tributária e, por via de conseqüência, a sonegação e a
corrupção desenfreada que devem ser combatidas a todo o custo. Não existem milagres. É preciso,
todavia, a vontade política para iniciar, de vez, essa reforma” (p. 109) e ressalta “um sistema que se
preze deve fundar-se na simplicidade. Este é um princípio de fundamental significação, com a
redução do ônus administrativo do governo e do custo administrativo do contribuinte” (p. 112). A
reforma tributária para um novo século. Revista Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo: Revista dos
Tribunais, a. 11, n. 53, nov./dez. 2003, p. 105-112.
17
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 571-572.
18
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 572.
7

Por sua vez, um sistema tributário deve procurar tributar as pessoas de forma
progressiva19, isto é, aqueles que auferem maior renda devem pagar mais tributos20.
Isso possibilita a distribuição de renda e tem uma profunda conexão com a
igualdade entendida como critério material21. José Maurício Conti22conclui que a
progressividade é princípio “que instrumentaliza a realização da capacidade
contributiva e, por conseqüência, o princípio da igualdade, bem como leva a uma
tributação justa e equitativa”.
Deve-se destacar ainda o papel do princípio da eqüidade. Ricardo Lobo
Torres23 ensina que o princípio da eqüidade é extremamente importante no Direito
Financeiro, podendo aparecer tanto na interpretação quanto na criação legislativa, o
que significa

[...]que na elaboração das normas de direito financeiro deverá ser


observada a maior discriminação possível entre as situações
individuais, a fim de que os princípios abstratos de justiça
(capacidade contributiva, custo/benefício, redistribuição de rendas
etc) alcancem o máximo de concretitude já na fase da promulgação
da norma geral. Não basta que a legislação financeira seja justa; é
necessário que seja também eqüitativa, tributando ou beneficiando
as pessoas de forma bem individualizada, a fim de apreender as
singularidades e as excepcionalidades.

Para Gustavo Miguez de Melo24, eqüidade “é conceito empregado em sua


acepção de Política Fiscal e corresponde ao respeito à capacidade contributiva ou à
justiça fiscal”. A eqüidade de um sistema mensura a parcela que cada cidadão deve
contribuir para o custo do governo, devendo esta parcela ser justa. A economia do

19
Roberto Quiroga Mosquera entende “que a tributação escalonada por diferentes faixas de riqueza,
melhor atende ao princípio de justiça tributária e redistribuição da riqueza de um determinado grupo
social”. Op. Cit., p. 573.
20
Nesse sentido, os tributos podem ser classificados como fixos (quantidade certa invariável e
determinada de dinheiro, sem levar em conta uma base de cálculo) e variáveis (montante da dívida
fiscal depende do valor da respectiva base de cálculo e do percentual de sua alíquota). Esses se
subdividem em: i) progressivos (a alíquota eleva-se à medida que aumenta a base de cálculo do
tributo - o mais justo no todo); ii) proporcionais (a alíquota é uniforme e invariável, assim, cresce ou
diminui, de acordo com o maior ou menor valor da base de cálculo) e iii) regressivos (inversamente
progressivos, quando a alíquota fiscal diminui em relação à base de cálculo do tributo que aumenta.
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 573- 574.
21
Ibid. p. 573.
22
CONTI, José Maurício Conti. Princípios Tributários da Capacidade Contributiva e da Progressividade. São
Paulo: Dialética, 1996, p. 80.
23
TORRES, Ricardo Lobo. Op. Cit., p. 91.
24
Apud CONTI, José Maurício. Op. Cit. p. 73.
8

setor público afere esse grau de justiça por meio de dois princípios25: a) princípio do
benefício26 e b) princípio da capacidade de pagamento27.
Assim, além do estudo dos princípios, faz-se importante analisar a política
fiscal do Estado, tendo por base suas funções alocativa, distributiva e estabilizadora
como parâmetro para a tributação ideal.

04. Política Fiscal do Estado e suas Funções

O Setor Público tem grande participação na vida econômica brasileira, uma


vez que além das receitas tributárias e outras espécies de ingressos públicos, o
Estado intervém sobre a economia mediante regulação, incentivo, planejamento e
fiscalização (art. 174, Constituição Federal).
No Brasil a economia é mista, isto é, o mercado (setor privado) e o Governo
(setor público) interagem amplamente determinando a produção do país, sendo que
o grau de intervenção do Estado – maior ou menor –, varia de acordo com o modelo
estatal adotado por cada país28.
As atividades do Governo influenciam a economia de forma que se realize
uma política econômica com o intuito de atingir seus principais objetivos, quais
sejam, suprir as necessidades da coletividade com recursos provenientes dos
ingressos públicos – receitas advindas da arrecadação fiscal, rendas produzidas por
organizações do Poder Público, multas, tarifas públicas, empréstimos contraídos,
doações, expropriações em casos excepcionais etc –, consoante anteriormente
estudado.
Salienta-se que a Teoria da Tributação analisa a maneira como serão obtidos
os recursos para pagar pelos serviços e bens públicos, e o processo político e o
orçamento determinam o direcionamento dos recursos públicos29.

25
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. Cit., p. 575.
26
Segundo MOSQUERA, op. cit, p. 575, pelo princípio do benefício, cada indivíduo deveria suprir os
custos do Estado na consecução de suas tarefas públicas de maneira proporcional aos benefícios
gerados por estes.
27
Para MOSQUERA, p. 575-576, o princípio da capacidade de pagamento significa uma “regra geral de
tributação para a população, independentemente de uma correlação entre os cidadãos e as melhorias
geradas por atos estatais”. O ônus tributário deve ser tal que os contribuintes com mesma capacidade
de pagamento devem pagar o mesmo nível de impostos (eqüidade horizontal) e pelo contrário, se as
capacidades de pagamento não são iguais, deve-se diferenciar o ônus tributário (eqüidade vertical).
Importante frisar que os economistas não dão uma regra exata para medir a justiça da tributação,
mas vetores que poderão ser utilizados pelos diferentes agentes do Estado.
28
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Economia do Setor Público. São Paulo: Atlas, 1993.
29
Ibid, p. 13.
9

Para que o mister da sociedade seja realizado, faz-se necessário que o


Governo cumpra três funções, a saber: a) função alocativa; b) função distributiva ou
redistributiva; c) função estabilizadora.

4.1 Função Alocativa

Por meio da função alocativa o Governo faz a provisão de determinados bens


e serviços públicos não oferecidos adequadamente mediante o sistema de mercado.
Os bens públicos “são aqueles em que o sistema de preços é ineficiente para induzir
à produção da quantidade ótima”, como por exemplo, defesa nacional; iluminação
pública30.
Os bens públicos não são delimitados pela sua “abrangência ou quantidade” –
prestação direcionada a apenas um indivíduo ou à coletividade –, mas sim por sua
forma de utilização, uma vez que os bens públicos são ilimitados ao consumidor.
Sendo assim, diz-se que no consumo há inexistência de rivalidade, conquanto os
serviços públicos são direcionados à manutenção da lei e da ordem, podendo ser
consumidos simultaneamente por muitas pessoas.
O sistema de mercado pode ser comparado a um grande “leilão” e
caracterizado como um sistema de “racionamento indicativo, no qual os produtores
são guiados pela demanda dos consumidores”31, existindo, assim, o princípio da
exclusão32 como característica própria implícita nesse sistema de trocas.
A explanação trazida serve como parâmetro para se fazer a diferenciação
entre os bens e serviços promovidos pelo Setor Público daqueles existentes e à
disposição dentro do mercado. É interessante verificar o modo como o Poder
Público se utiliza dessa função para oferecer à sociedade serviços essenciais ou,
até mesmo, não tão essenciais, custeados pela própria coletividade por meio das
receitas públicas33.

30
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Economia do Setor Público. São Paulo: Atlas, 1993, p. 18.
31
Op. cit, p. 19.
32
“Entretanto, no caso de bens públicos, o fato de um agente utilizar o serviço que é oferecido não
significa reduzir fisicamente a oferta para os demais. Por exemplo, num país de 100 milhões de
habitantes, se o orçamento para a educação é de 5 bilhões de unidades monetárias e o orçamento
ideal para o atendimento de toda a população é de 8 bilhões, não seria possível concluir-se que parte
da população ficaria excluída do consumo, pois, mesmo a um nível inferior, toda ela teria acesso ao
sistema educacional”. VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de. Fundamentos de Economia. São Paulo:
Saraiva, 1998, p.190.
33
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação e Política Fiscal in Segurança Jurídica na tributação e estado de
direito. São Paulo: Noeses, 2005, p. 577.
10

4.2 Função Distributiva ou Redistributiva

A função distributiva ou redistributiva, esta última conforme nomenclatura


trazida por Carlos Alberto Longo e Roberto Luis Troster34, consiste em ajustamentos
no perfil da distribuição de renda na sociedade.

A distribuição de renda depende da produtividade do trabalho e dos


demais fatores de produção dados pelo mercado. A distribuição de
renda entre indivíduos, portanto, dependerá neste caso somente da
oferta de seus fatores e do preço que eles atingem no mercado35.

Como essa renda é derivada da soma das rendas do trabalho e da


propriedade – sendo que a primeira é dada segundo a produtividade da mão-de-
obra e dos fatores de produção do mercado –, se o mercado funcionasse livremente,
a distribuição não seria igualitária ou justa, pois sempre haveria a referência das
diferenças iniciais de dotações de patrimônio de cada indivíduo.
Nesse diapasão, o Poder Público assumiria o papel de um redistribuidor de
renda, traspassando a renda de parcela mais abastada da população àqueles mais
pobres, mediante a implementação de esquemas de transferências fiscais,
tributação progressiva da renda, subsídios a famílias de baixa renda etc36.
“A tributação é o instrumento mais eficaz para se fazer essas transferências
patrimoniais dentro de determinada comunidade”, fazendo o Estado ora onerar mais
o capital frente ao trabalho, ora mais a propriedade frente ao capital. Onera-se parte
mais bem provida da população para direcionar, depois, os recursos às classes
menos afortunadas da sociedade. Pode-se desonerar uma região com o intuito de
desenvolver economicamente determinada localidade, pode-se conceder incentivos
fiscais, implementar uma política de gastos públicos ou subsídios direcionados a
determinado setor produtivo que se deseje emular, enfim, há várias formas de fazer
da política fiscal um instrumento de distribuição de renda e justiça social37.

34
Op. cit., p. 22.
35
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Op. cit., p. 22.
36
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Op. cit., p. 23-24 e VASCONCELLOS, Marco Antonio
Sandoval de. Op. cit. p. 191.
37
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Op. cit. p 577-578; VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de. op. cit., p.
191.
11

4.3 Função Estabilizadora

A função estabilizadora é instrumento de manipulação dos níveis de preços e


empregos da economia.

A política fiscal é um instrumento da política econômica, porque o


pleno emprego e a estabilidade de preços não ocorrem
automaticamente na economia38.

De acordo com Carlos Alberto Longo e Roberto Luis Troster – adotando-se a


classificação que se mostrou mais útil – a política econômica pode ser colocada
como gênero das espécies “política monetária39” – que engloba, também, a “política
cambial” – e a “política fiscal”40.
Com efeito, observa-se que o Estado intervém na Economia de várias
maneiras, uma vez verificada, ao longo da história, a ineficiência do mercado em se
auto-regular e garantir, de per si, o pleno emprego, a estabilidade macroeconômica
– preços, juros etc – e o crescimento econômico do País. Então, mediante
regulação, garante aos trabalhadores direitos sociais, concede incentivos para
fomentar a geração de empregos em dado setor econômico, faz investimentos
públicos – bens públicos, infra-estrutura – e financiamentos para estimular o setor
privado41.
O equilíbrio entre a arrecadação e o uso das receitas tributárias no bom
atendimento das necessidades públicas mediante a prestação de serviços de
qualidade, denota a boa gestão dos recursos públicos e o equilíbrio das economias
públicas.
Esses conceitos são relevantes quando se pensa em desenvolvimento
econômico, uma vez que o Governo precisa utilizar-se de todos os mecanismos à
disposição visando alcançar um desenvolvimento sustentável, ou seja, mirando não

38
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Op. cit., p. 24.
39
“Ações do governo, quase sempre realizadas por intermédio do banco Central, que tem o objetivo
de controlar as variáveis monetárias da economia”.
40
“Atividades de arrecadação tributária do governo e gastos públicos”.
41
VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de. Fundamentos de Economia.São Paulo: Saraiva, 1998, p.191-
192; “Por intermédio da política fiscal, por exemplo, o governo pode influir na alocação de gastos
públicos em investimento ou consumo (forma direta), ou ainda, aumentando ou diminuindo alíquotas
ou bases de cálculo dos tributos (forma indireta), ocasionando assim diminuição ou aumento da renda
privada, respectivamente” MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação e Política Fiscal in Segurança Jurídica
na tributação e estado de direito. São Paulo: Noeses, 2005, p 579.
12

apenas no crescimento econômico, mas em indicadores sociais, no mínimo,


aceitáveis.

05. Desenvolvimento Econômico

A evolução crescente nos níveis de arrecadação tributária e, em


contrapartida, o crescimento econômico irregular demonstram a ausência de
desenvolvimento econômico no País.
Verifica-se que, no Brasil, o sistema tributário sofre modificações legislativas
somente no intuito de aumentar a arrecadação, porém, o gasto público não diminui e
nem se vê a aplicação desses recursos públicos em infra-estrutura, na distribuição
de renda ou em serviços à coletividade.
Os tributos encontram-se mal distribuídos, gerando desequilíbrio em alguns
setores importantes da sociedade, principalmente naqueles vinculados a atividades
econômicas42.
A exacerbada carga tributária brasileira43 onera o setor produtivo nacional de
forma a proporcionar uma desvantagem competitiva tanto no âmbito interno quanto
no externo, dificultando relações comerciais com parceiros internacionais, sem
mencionar a facilitação e estímulo à evasão fiscal44.
O que se almeja, em realidade, é o desenvolvimento econômico brasileiro,
isto é, um processo de conhecimento social que leve ao máximo de inclusão
possível, não devendo ficar o Estado adstrito somente à noção simplista de
crescimento econômico.
Ou seja, pela leitura constitucional, infere-se deve haver sustentabilidade no
processo de desenvolvimento e não apenas a verificação pura e simples de
crescimento econômico.

42
“No campo da administração tributária e dos deveres tributários dos contribuintes, associa-se a
irregularidade do desenvolvimento da economia brasileira à profusão de tributos, com complexas
obrigações tributárias e acessórias, geralmente pautadas pela excessiva formalidade e pouca
flexibilidade. Essa seria, inclusive, uma das principais causas de altos índices de informalidade na
atividade produtiva, visto que leva à redução do universo de contribuintes” GRILLO, Fabio Artigas. Carga
tributária e desenvolvimento econômico no Brasil. Revista Tributária e de Finanças Públicas. Ano 15, n. 73,
mar./abr. São Paulo: revista dos Tribunais, 2007, p 72.
43
A carga tributária no Brasil é bastante alta, girando em torno de 37,37% - de acordo com o último
dado à disposição no sítio da Receita Federal (vinculado ao Ministério da Fazenda)
http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/estudotributarios/estatisticas/CTB2005.pdf.
44
GRILLO, Fabio Artigas. Carga tributária e desenvolvimento econômico no Brasil. Revista Tributária e de
Finanças Públicas. Ano 15, n. 73, mar./abr. São Paulo: revista dos Tribunais, 2007, p. 72-73.
13

De acordo com as Ciências Econômicas, a manutenção das estruturas do


modo de produção capitalista é o que se entende como crescimento econômico,
sinônimo de ótimo desenvolvimento da produção, principalmente mediante as
inovações tecnológicas, do consumo, os quais impulsionam a produção, o lucro e os
investimentos em produção futura mediante emprego do lucro como capital para
reprodução45.
Todavia, apenas uma política direcionada ao crescimento econômico
mostrou-se perniciosa em razão das externalidades negativas que as atividades do
modo de produção capitalista geram, sobretudo nas searas ambiental e social.
Poluição – problema da absorção do lixo, dos resíduos e de rejeitos –, esgotamento
ou mau uso de fontes de energia, problemas infra-estruturais, desemprego e outros
problemas sociais são apenas alguns exemplos.
A partir da análise desses problemas constrói-se o conceito de
desenvolvimento econômico – neste já incluso o sentido de sustentabilidade –
levando-se em conta não somente o crescimento econômico, mas também a
melhoria e garantia de melhores e mais saudáveis padrões de vida à população
(bem estar social), coordenada com um equilíbrio na distribuição de renda, posse de
bens materiais e aumento da capacidade de consumo. Isso se reverteria em
condições materiais ao bem-estar da sociedade (manutenção da sanidade física e
psíquica dos indivíduos): acesso à alimentação sadia, qualidade da água que se
consome, disponibilidade para o lazer, índice de salubridade do ambiente de
trabalho etc46.
Esse processo de desenvolvimento econômico considera a chamada “auto-
sustentabilidade”, definida como “o processo de desenvolvimento que busca manter-
se durante todo o itinerário e passagem do estágio de subdesenvolvimento até a
chegada à nova condição de desenvolvimento”.47
Há várias formas de se alcançar o desenvolvimento econômico, tais como,
intervenção direta no domínio econômico pela realização de atividade tipicamente
privada; intervenção indireta por regulação – conforme exposto acima –; fomento
econômico etc.

45
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 99.
46
Op. cit, p 110.
47
GRILLO, Fabio Artigas. Carga tributária e desenvolvimento econômico no Brasil. Revista Tributária e de
Finanças Públicas. Ano 15, n. 73, mar./abr. São Paulo: revista dos Tribunais, 2007, p. 75.
14

Armando Castelar Pinheiro48 traz que alguns autores entendem que o


desenvolvimento econômico, para ser alcançado, deve contar com a intervenção do
Estado em muitos setores sociais e econômicos, mas especificamente com uma
estratégia de investimentos em que o Governo se comprometa a criar uma agenda
de desenvolvimento, cujas prioridades seriam a estabilidade macroeconômica;
preços e incentivos corretos – dentro dos parâmetros da livre concorrência e justiça
social –; boas instituições – estabilidade e funcionamento dos mercados; proteção
aos direitos de propriedade; obediência ao princípio da legalidade;
representatividade e estabilidade política e social; investimentos públicos em infra-
estrutura básica e gastos sociais; equilíbrio e justiça social; seguridade; equilíbrio
fiscal; estratégia de desenvolvimento bem definida e comprometimento da liderança
política; e, finalmente, uma máquina pública bem preparada para implementar as
diretrizes de tal estratégia de desenvolvimento.
Em razão do baixo e irregular crescimento econômico, alto nível de
desemprego, uma pesada carga tributária e um sistema fiscal burocrático,
espantando investimentos no Brasil tanto em âmbito interno, quanto de capital
estrangeiro49, o Brasil coloca-se na contramão do desenvolvimento.

06. Conclusão

Além dos instrumentos com os quais o Direito tenta discutir e resolver


problemas sociais, econômicos e políticos, como os apontados neste trabalho, ele
ainda chama à ajuda outras ciências como a Economia e as Finanças Públicas, para
auxiliá-lo nesse afã.
Isso porque existe uma atual situação de crise e, com razão, são feitas muitas
críticas – e requeridas muitas medidas urgentes – ao modo como os governos
brasileiros conduzem a política fiscal e econômica no Brasil: a carga tributária
aumenta, mas não se verifica na prática melhor distribuição de renda ou
contrapartida em serviços públicos de qualidade. A falta de gastos públicos na seara
social denota a falta de compromisso político com o Texto Constitucional, cujos
valores apontam para um desenvolvimento sustentável com uma política fiscal justa.

48
Por que o Brasil cresce pouco? In Reformas no Brasil: balanço e agenda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2004, p.33.
49
O Brasil perde competitividade, estando em 66º lugar no ranking de competitividade do Banco
Mundial (2006), segundo informações de GRILLO, Fabio Artigas. op. cit., p. 94.
15

Juntamente com a injustiça da carga tributária, tem-se um crescimento


econômico irregular e irrisório para um país com as dimensões do Estado brasileiro,
tornando um sonho quase que distante o alcance de um desenvolvimento
econômico efetivo.
Certamente, o prejuízo recai sobre a esfera social, a qual sofre não apenas
com a oneração fiscal, falta de gastos públicos com infra-estrutura e serviços e
desemprego, mas com a falta de competitividade do país no mercado internacional,
um agravante na caminhada direcionada ao desenvolvimento.
Para reverter esse quadro é preciso uma maior participação da sociedade
civil, cobrando políticas públicas que positivem os valores do Estado
constitucionalmente previsto, modelo pelo qual o cidadão brasileiro paga bastante
caro.

07. Referências
CONTI, José Maurício. Princípios Tributários da Capacidade Contributiva e da
Progressividade. São Paulo: Dialética, 1996.
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. São Paulo: Max Limonad,
2001.
GRILLO, Fabio Artigas. Carga tributária e desenvolvimento econômico no Brasil.
Revista Tributária e de Finanças Públicas. Ano 15, n. 73, mar./abr. São Paulo:
revista dos Tribunais, 2007.
LONGO, Carlos Alberto; TROSTER, Roberto Luis. Economia do Setor Público. São
Paulo: Atlas, 1993.
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação e Política Fiscal in Segurança Jurídica na
tributação e estado de direito. São Paulo: Noeses, 2005.
PINHEIRO, Armando Castelar. Por que o Brasil cresce pouco? In Reformas no
Brasil: balanço e agenda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004.
RECEITA FEDERAL. Disponível em:
http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/estudotributarios/estatisticas/CTB2005.pdf
SZKLAROWSKY, Leon Fredja. A reforma tributária para um novo século. Revista
Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, a. 11, n. 53,
nov./dez. 2003, p. 105-112.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 9 ed., Rio de
Janeiro: Renovar, 2002.
VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de. Fundamentos de Economia. São
Paulo: Saraiva, 1998.

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